Escolha as funcionalidades experimentais que pretende experimentar

Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62019CC0598

    Conclusões do advogado-geral E. Tanchev apresentadas em 29 de abril de 2021.
    Confederación Nacional de Centros Especiales de Empleo (Conacee) contra Diputación Foral de Guipúzcoa e Federación Empresarial Española de Asociaciones de Centros Especiales de Empleo (Feacem).
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Superior de Justicia del País Vasco.
    Reenvio prejudicial — Adjudicação dos contratos públicos — Diretiva 2014/24/UE — Artigo 20.o — Contratos reservados — Legislação nacional que reserva o direito de participar em determinados processos de adjudicação de contratos públicos aos centros especiais de trabalho de iniciativa social — Requisitos adicionais não previstos na diretiva — Princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade.
    Processo C-598/19.

    Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral ;

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2021:349

     CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    EVGENI TANCHEV

    apresentadas em 29 de abril de 2021 ( 1 )

    Processo C‑598/19

    Confederación Nacional de Centros Especiales de Empleo (Conacee)

    contra

    Diputación Foral de Guipúzcoa,

    Federación Empresarial Española de Asociaciones de Centros Especiales de Empleo (Feacem)

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Superior de Justicia del País Vasco (Tribunal Superior de Justiça do País Basco, Espanha)]

    «Reenvio prejudicial — Contratos Públicos — Diretiva 2014/24/UE — Artigos 18.o e 20.o — Legislação nacional que reserva o direito de participação em determinados procedimentos de contratação pública a centros especiais de emprego de iniciativa social — Requisitos adicionais não previstos na diretiva»

    1.

    Com o presente pedido de decisão prejudicial, o Tribunal Superior de Justicia del País Vasco (Tribunal Superior de Justiça do País Basco, Espanha) (a seguir «órgão jurisdicional de reenvio») pede ao Tribunal de Justiça que interprete, pela primeira vez, o artigo 20.o da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos ( 2 ).

    2.

    Através da questão prejudicial pede‑se, em substância, ao Tribunal de Justiça que esclareça se os Estados‑Membros, quando fazem uso da faculdade prevista no artigo 20.o da Diretiva 2014/24 de reservar a determinados operadores o direito de participarem nos procedimentos de contratação pública, devem permitir que todos os operadores económicos que preencham os requisitos que figuram nessa disposição participem nos procedimentos de contratação ou se, pelo contrário, podem restringir ainda mais o âmbito subjetivo dos operadores económicos que podem participar e apresentar propostas para os contratos em causa.

    3.

    Concluí que os Estados‑Membros podem efetivamente definir o âmbito subjetivo dos operadores económicos autorizados a participar nos contratos em questão, através da imposição de critérios mais restritos do que os requisitos estabelecidos pelo artigo 20.o da Diretiva 2014/24, que, segundo a minha análise, são requisitos mínimos. Não obstante, se um Estado‑Membro optar por fazê‑lo, continua obrigado a respeitar as disposições da diretiva, incluindo o artigo 18.o, «Princípios da contratação», bem como os requisitos gerais aplicáveis do direito da União em matéria de contratação pública.

    I. Quadro jurídico

    A.   Direito da União

    4.

    O considerando 1 da Diretiva 2014/24 dispõe:

    «A adjudicação de contratos públicos pelas administrações dos Estados‑Membros ou por conta destas deve respeitar os princípios do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), designadamente os princípios da livre circulação de mercadorias, da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços, bem como os princípios deles decorrentes, como os princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação, do reconhecimento mútuo, da proporcionalidade e da transparência. Contudo, no que se refere aos contratos públicos que ultrapassem um determinado valor, deverão ser estabelecidas disposições que coordenem os procedimentos nacionais de contratação pública, a fim de garantir que esses princípios produzam efeitos práticos e os contratos públicos sejam abertos à concorrência.»

    5.

    O considerando 2 da Diretiva 2014/24 enuncia:

    «A contratação pública desempenha um papel fundamental na Estratégia Europa 2020, estabelecida na Comunicação da Comissão, de 3 de março de 2010, intitulada “Europa 2020, uma estratégia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo” (a seguir designada “Estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo”), como um dos instrumentos de mercado a utilizar para alcançar um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, assegurando simultaneamente a utilização mais eficiente dos fundos públicos. Para o efeito, as regras de contratação pública, adotadas nos termos da [Diretiva 2004/17 ( 3 )] e da [Diretiva 2004/18 ( 4 )] deverão ser revistas e modernizadas a fim de aumentar a eficiência da despesa pública, em particular facilitando a participação das pequenas e médias empresas (PME) na contratação pública, e de permitir que os adquirentes utilizem melhor os contratos públicos para apoiar objetivos sociais comuns. […]»

    6.

    O considerando 36 da Diretiva 2014/24 tem a seguinte redação:

    «O emprego e o trabalho contribuem para a inserção na sociedade e são elementos essenciais para garantir a igualdade de oportunidades para todos. Neste contexto, as entidades cujo objetivo principal seja a integração social e profissional podem desempenhar um papel significativo. O mesmo é válido para outras empresas sociais cujo objetivo principal é apoiar a integração ou reintegração social e profissional das pessoas com deficiência e pessoas desfavorecidas, tais como desempregados, membros de minorias desfavorecidas ou grupos socialmente marginalizados. Contudo, essas entidades ou empresas podem não estar aptas a obter contratos em condições de concorrência normais. Por conseguinte, é conveniente prever que os Estados‑Membros possam reservar a participação em processos de adjudicação de contratos ou certos lotes dos mesmos a essas entidades ou empresas ou reservar‑lhes a execução dos contratos no âmbito de programas de emprego protegido.»

    7.

    O artigo 2.o, n.o 1, ponto 5, da Diretiva 2014/24 define, para efeitos da diretiva, «[c]ontratos públicos» como «contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais autoridades adjudicantes, que tenham por objeto a execução de obras, o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços».

    8.

    O artigo 2.o, n.o 1, ponto 10, da Diretiva 2014/24 define «[o]perador económico» como «qualquer pessoa singular ou coletiva, entidade pública ou agrupamento de tais pessoas e/ou entidades, incluindo agrupamentos temporários de empresas, que realize empreitadas e/ou obras, forneça produtos ou preste serviços no mercado».

    9.

    O artigo 18.o da Diretiva 2014/24, intitulado «Princípios da contratação», dispõe:

    «1.   As autoridades adjudicantes tratam os operadores económicos de acordo com os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação e atuam de forma transparente e proporcionada.

    Os concursos não podem ser organizados no intuito de não serem abrangidos pelo âmbito de aplicação da presente diretiva ou de reduzir artificialmente a concorrência. Considera‑se que a concorrência foi artificialmente reduzida caso o concurso tenha sido organizado no intuito de favorecer ou desfavorecer indevidamente determinados operadores económicos.

    […]»

    10.

    O artigo 20.o da Diretiva 2014/24, intitulado «Contratos reservados», dispõe:

    «1.   Os Estados‑Membros podem reservar o direito a participar em procedimentos de contratação pública a entidades e a operadores económicos cujo objetivo principal seja a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas, ou reservar a execução desses contratos para o âmbito de programas de emprego protegido, desde que pelo menos 30 % dos empregados dessas entidades, operadores económicos e programas sejam trabalhadores com deficiência ou desfavorecidos.

    […]»

    B.   Direito espanhol

    11.

    O artigo 20.o da Diretiva 2014/24 foi transposto para o ordenamento jurídico espanhol pela quarta disposição adicional da Ley 9/2017 de Contratos del Sector Público (Lei 9/2017 relativa aos Contratos do Setor Público) (a seguir «Lei 9/2017»), de 8 de novembro de 2017, que prevê:

    «1.   Por decisão do Conselho de Ministros ou do órgão competente no âmbito das Comunidades Autónomas e das Entidades Locais, são fixadas percentagens mínimas de reserva do direito a participar nos processos de adjudicação de determinados contratos ou de determinados lotes dos mesmos para centros especiais de emprego de iniciativa social e para empresas de inserção, […], que preencham os requisitos referidos na […] legislação [relevante] para adquirir esse estatuto, ou uma percentagem mínima de reserva da execução desses contratos no âmbito de programas de emprego protegido, desde que a proporção de trabalhadores com deficiência ou em situação de exclusão social dos centros especiais de emprego, das empresas de inserção ou dos programas corresponda à prevista na sua legislação de referência e, em qualquer caso, a, pelo menos, 30 %.

    Na referida decisão do Conselho de Ministros ou do órgão competente no âmbito das Comunidades Autónomas e das Entidades Locais são previstas as condições mínimas para garantir o cumprimento do previsto no parágrafo anterior.

    […]

    2.   O anúncio de concurso público deve fazer referência à presente disposição.

    […]»

    12.

    A décima quarta disposição final da Lei 9/2017 dispõe:

    «[…]

    4. São considerados centros especiais de emprego de iniciativa social os que, preenchendo os requisitos previstos nos n.os l e 2 do presente artigo, são promovidos e participados em mais de 50 %, direta ou indiretamente, por uma ou mais entidades públicas ou privadas, sem fins lucrativos ou que tenham o seu caráter social reconhecido nos seus estatutos, sejam associações, fundações, organismos de direito público, cooperativas de iniciativa social ou outras entidades da economia social, bem como aqueles cuja titularidade pertença a sociedades comerciais referidas anteriormente, de modo direto ou indireto […] e desde que, em todos os casos, os seus estatutos ou o acordo social imponham o reinvestimento integral dos seus lucros na criação de oportunidades de emprego para pessoas com deficiência e a melhoria contínua da sua competitividade e da sua atividade de economia social, tendo, em todo o caso, a possibilidade de optar por reinvesti‑los no próprio centro especial de emprego ou noutros centros especiais de emprego de iniciativa social.»

    II. Factos, processo principal e questão prejudicial

    13.

    O litígio no processo principal resulta de uma Decisão de 15 de maio de 2018 (a seguir «Decisão de 15 de maio de 2018») do Consejo de Gobierno de la Diputación Foral de Guipúzcoa (Governo do Conselho Provincial de Guipúzcoa, Espanha) que aprovou as instruções dirigidas aos órgãos adjudicantes da referida instituição. Estas instruções dizem respeito à reserva do direito de participar nos processos de contratação pública, em conformidade com a legislação espanhola que transpõe a Diretiva 2014/24.

    14.

    O recurso no processo principal foi interposto pela Confederación Nacional de Centros Especiales de Empleo (Confederação Nacional de Centros Especiais de Emprego) (a seguir «Conacee»), uma associação que representa centros especiais de emprego em Espanha. Os seus membros incluem, entre outras categorias, centros especiais de emprego de iniciativa «empresarial».

    15.

    Conforme resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe, a legislação espanhola anterior permitia que os centros especiais de emprego em Espanha participassem nos procedimentos de contratação pública para «contratos reservados», fossem eles de caráter não lucrativo ou empresarial ( 5 ). Esta situação mudou com a aprovação da Lei 9/2017.

    16.

    A Lei 9/2017 introduziu uma nova categoria de «centros especiais de emprego de iniciativa social» e reservou a participação nos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o ( 6 ) a esses centros.

    17.

    Para além dos requisitos que os centros especiais de emprego tinham de cumprir para se qualificarem como tal nos termos da lei anterior, os centros especiais de emprego de iniciativa social têm de estar organizados como entidades sem fins lucrativos ou cumprir certos requisitos em matéria de propriedade e também reinvestir os seus lucros nas suas próprias atividades ou em atividades semelhantes dos centros especiais de emprego de iniciativa social.

    18.

    Segundo a Conacee, estes requisitos adicionais excluem uma grande parte dos centros especiais de emprego espanhóis da participação em procedimentos de contratação reservados espanhóis, apesar de preencherem os requisitos estabelecidos no artigo 20.o da Diretiva 2014/24.

    19.

    Neste contexto, a Conacee interpôs recurso da Decisão de 15 de maio de 2018 no Tribunal Superior de Justicia del País Vasco (Tribunal Superior de Justiça do País Basco), alegando, no essencial, que o novo regime espanhol é contrário ao direito da União.

    20.

    O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas acerca da conformidade do novo regime com o direito da União e, especificamente, com o artigo 20.o da Diretiva 2014/24.

    21.

    Nestas circunstâncias, o Tribunal Superior de Justicia del País Vasco (Tribunal Superior de Justiça do País Basco) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Deve o artigo 20.o da Diretiva 2014/24/UE relativa aos contratos públicos ser interpretado no sentido de que o âmbito subjetivo da reserva prevista na referida disposição não pode ser delimitado em termos que excluam do seu âmbito de aplicação entidades e operadores económicos que preencham a condição de, pelo menos, 30 % dos seus empregados serem pessoas com deficiência e cumprirem a finalidade ou objetivo de integração social e profissional dessas pessoas, através da previsão de condições adicionais relacionadas com a constituição, natureza e fins dos referidos sujeitos, com a sua atividade ou investimentos, ou de outro tipo [?]»

    22.

    A Conacee, o Conselho Provincial de Guipúzcoa, o Reino de Espanha e a Comissão apresentaram observações escritas.

    23.

    Foi requerida audiência, mas não se realizou. O Tribunal de Justiça colocou duas questões aos interessados visados no artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia para resposta escrita, a que responderam por escrito a Conacee, o Conselho Provincial de Guipúzcoa, o Reino de Espanha e a Comissão.

    III. Análise

    24.

    Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio procura, em substância, esclarecer se as disposições dessa diretiva ou outras normas aplicáveis do direito da União em matéria de contratação pública impedem os Estados‑Membros de impor limites ou requisitos adicionais às empresas ou operadores económicos que podem participar nos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o, para além das limitações que decorrem desse artigo. O órgão jurisdicional de reenvio tem, designadamente, mas não exclusivamente, dúvidas acerca de «condições adicionais relacionadas com a constituição, natureza e fins dos referidos sujeitos [e] com a sua atividade ou investimentos».

    25.

    Cheguei à conclusão de que há que considerar que o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 estabelece requisitos mínimos cujo cumprimento pelos participantes autorizados ( 7 ) deve ser verificado pelos Estados‑Membros caso optem por fazer uso da faculdade de reservar contratos ao abrigo do referido artigo e que a disposição não impede, por si só, que os Estados‑Membros imponham requisitos ou restrições adicionais aos participantes autorizados, nem a nível geral nem para procedimentos específicos de contratação pública ou lotes individuais dos mesmos. No entanto, ao fazer uso da faculdade prevista no artigo 20.o de reservar contratos, os Estados‑Membros continuam obrigados a cumprir as disposições da Diretiva 2014/24 e as normas gerais do direito da União aplicáveis à contratação pública; neste caso, em especial, o artigo 18.o da diretiva e os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade.

    A.   Observações preliminares

    26.

    Segundo o seu artigo 4.o, a Diretiva 2014/24 aplica‑se aos contratos com um valor estimado igual ou superior a determinados limiares estabelecidos nesse artigo ( 8 ). As contratações que não atinjam os limiares não estão sujeitas às disposições desta diretiva; no entanto, devem respeitar os princípios do Tratado FUE e, em especial, as regras da livre circulação, bem como os princípios delas decorrentes, incluindo os princípios da igualdade de tratamento, do reconhecimento mútuo, da não discriminação e da proporcionalidade ( 9 ).

    27.

    O presente processo refere‑se apenas à contratação pública que se insere no âmbito de aplicação da Diretiva 2014/24. Devo ainda acrescentar que os factos do processo principal parecem envolver exclusivamente operadores espanhóis e que os factos do processo principal sobre os quais o órgão jurisdicional de reenvio deve pronunciar‑se não parecem envolver qualquer elemento transfronteiriço.

    28.

    Nos termos do artigo 20.o da Diretiva 2014/24, os Estados‑Membros podem reservar «o direito a participar em procedimentos de contratação pública» a entidades e a operadores económicos com determinados «objetivo[s] principal[ais]» específicos ou reservar «a execução [dos contratos em causa] para o âmbito de programas de emprego protegido». Esta faculdade está sujeita à condição de que «pelo menos 30 %» dos empregados dessas entidades, operadores económicos ou programas sejam «trabalhadores com deficiência ou desfavorecidos».

    29.

    O Reino de Espanha fez uso desta faculdade e aprovou legislação relativa aos seus centros especiais de emprego que impõe restrições adicionais aos operadores económicos que desejem participar nos procedimentos de contratação reservados ao abrigo do artigo 20.o nesse Estado‑Membro, que a Conacee contesta no processo principal. Esta legislação estipula, em substância, que as entidades ou pessoas em causa não devem ter fins lucrativos e que devem comprometer‑se a reinvestir quaisquer lucros obtidos, quer no próprio centro especial de emprego, quer noutro centro especial de emprego semelhante.

    30.

    O Reino de Espanha estabeleceu ainda um requisito de percentagem de emprego para os centros especiais de emprego relativos a pessoas desfavorecidas significativamente superior (70 %) ao mínimo exigido pelo artigo 20.o da Diretiva 2014/24 (30 %). Este limite não parece ser contestado no processo principal; possivelmente porque os membros da Conacee preenchem efetivamente esse critério.

    31.

    Outros Estados‑Membros aprovaram igualmente legislação que impõe limitações mais rigorosas aos participantes autorizados nos seus procedimentos de contratação pública reservados do artigo 20.o do que as decorrentes do texto da Diretiva 2014/24 ( 10 ).

    B.   Quanto à margem de apreciação dos Estados‑Membros

    32.

    O artigo 20.o da Diretiva 2014/24 estabelece vários critérios aplicáveis aos «participantes autorizados», que devem ser cumpridos se um dado Estado‑Membro optar por fazer uso da faculdade de recorrer aos contratos reservados do artigo 20.o ( 11 ) nos seus procedimentos de contratação. O artigo 20.o, n.o 1, exige que i) os participantes autorizados nesses procedimentos de contratação pública reservados pertençam a uma de duas categorias diferentes de participantes, a saber, «entidades» ou «operadores económicos cujo objetivo principal seja a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas», ou ii) «[os] contratos [sejam executados] [n]o âmbito de programas de emprego protegido». O processo no Tribunal de Justiça refere‑se apenas à categoria de «operadores económicos cujo objetivo principal seja a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas» e à possível imposição de requisitos adicionais de participação a esse grupo de operadores económicos, para além dos requisitos que decorrem explicitamente da diretiva.

    33.

    O artigo 20.o, n.o 1, da Diretiva 2014/24 impõe ainda o requisito de que pelo menos 30 % dos empregados dos participantes autorizados sejam trabalhadores com deficiência ou desfavorecidos.

    34.

    Por último, o artigo 20.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24 impõe aos Estados‑Membros que, quando façam uso da faculdade prevista no artigo 20.o, façam referência expressa a esse artigo no convite à apresentação de propostas. Este requisito não está em causa no presente processo.

    35.

    A Conacee alega, no essencial, que a redação do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 enumera de forma taxativa os requisitos que os operadores económicos devem cumprir para poderem participar em processos de contratação pública reservados por força dessa disposição e que os operadores económicos que cumpram esses critérios não podem, portanto, ser excluídos da participação em razão de requisitos adicionais, tais como o requisito do fim não lucrativo e o requisito do reinvestimento do lucro impostos pela legislação espanhola em causa.

    36.

    A Comissão alega, no essencial, que os Estados‑Membros gozam de uma grande margem de apreciação quando definem na sua legislação nacional o que se deve entender pela expressão «operadores económicos cujo objetivo principal seja a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas» ( 12 ).

    37.

    Não posso partilhar da análise da Comissão. É jurisprudência constante que decorre das exigências tanto da aplicação uniforme do direito da União como do princípio da igualdade que os termos de uma disposição do direito da União que não comporte uma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros para determinar o seu sentido e o seu alcance devem normalmente ser objeto, em toda a União Europeia, de interpretação autónoma e uniforme. Essa interpretação deve ser procurada tendo em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa ( 13 ).

    38.

    Por conseguinte, não considero que os Estados‑Membros gozem de uma ampla margem de apreciação para definir o sentido dos termos do artigo 20.o da Diretiva 2014/24. A meu ver, esses termos devem ser interpretados de modo uniforme. Assim, qualquer margem de apreciação de que os Estados‑Membros possam gozar ao transpor o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 não decorre de uma faculdade que lhes permita aplicar a sua própria interpretação ao significado dos termos da diretiva.

    39.

    Pelo contrário, os requisitos do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 podem ser entendidos como requisitos mínimos que o Estado‑Membro tem de impor aos participantes autorizados para que o recurso pelos Estados‑Membros aos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o seja legal, ou, como alega a Conacee, como uma definição exaustiva dos critérios que determinam que operadores económicos devem ser aceites pelos Estados‑Membros como participantes autorizados, se os Estados‑Membros escolherem fazer uso dos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o

    40.

    Tal como explicarei, a meu ver, os requisitos do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 entendem‑se melhor como requisitos mínimos, que deixam aos Estados‑Membros a liberdade de impor limitações adicionais, que restrinjam o âmbito subjetivo de participantes autorizados nos seus procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o, sujeitos às limitações impostas por outras disposições da Diretiva 2014/24 e outras disposições aplicáveis do direito da União em matéria de contratação pública. Assim, não é o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 que pode limitar a capacidade dos Estados‑Membros de impor requisitos adicionais aos participantes autorizados, mas sim o artigo 18.o da referida diretiva e os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, bem como a proibição de reduzir artificialmente a concorrência.

    41.

    Em primeiro lugar, nada no texto do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 exige literalmente a admissão de todos os operadores económicos que preencham os requisitos desse artigo a um determinado procedimento de contratação pública realizado por um Estado‑Membro para os contratos reservados do artigo 20.o

    42.

    Pelo contrário, o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 oferece uma faculdade aos Estados‑Membros — que eles podem optar por utilizar ou não — e estabelece as condições que os Estados‑Membros devem cumprir se escolherem fazer uso da faculdade prevista nesse artigo. Estas condições referem em termos gerais e não específicos os tipos de empresas ou operadores económicos em benefício dos quais os Estados‑Membros podem reservar procedimentos de contratação e estabelecem uma percentagem mínima para os trabalhadores com deficiência ou desfavorecidos empregados nessas empresas ou operadores económicos.

    43.

    Em segundo lugar, conforme descrita no considerando 36 da Diretiva 2014/24 e no considerando 28 da Diretiva 2004/18, a fundamentação para a inclusão do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 e da sua disposição anterior, o artigo 19.o da Diretiva 2004/18, deve ser entendida nestas duas diretivas no contexto de «garantir a igualdade de oportunidades para todos», sendo o emprego e o trabalho «elementos essenciais» desse objetivo. O artigo 20.o da Diretiva 2014/24 (e a sua disposição anterior, o artigo 19.o da Diretiva 2004/18) permite assim aos Estados‑Membros prosseguirem objetivos de política social e de emprego através de instrumentos de contratação pública.

    44.

    Importa recordar, a este respeito, que os Estados‑Membros gozam de uma ampla margem de apreciação na sua escolha, não só para prosseguir um objetivo específico no domínio da política social e do emprego ( 14 ) mas também na definição das medidas suscetíveis de o realizar ( 15 ). Tendo em conta a fundamentação do artigo 20.o da Diretiva 2014/24, é minha opinião que a definição dos participantes autorizados é, antes de mais, uma questão de política social e de emprego em que os Estados‑Membros gozam de uma ampla margem de apreciação.

    45.

    Devo também salientar que, embora o artigo 20.o, enquanto exceção ao regime geral dos procedimentos de contratação pública ao abrigo da Diretiva 2014/24, deva ser objeto de interpretação estrita, este princípio de interpretação, a meu ver, aplica‑se logicamente à dimensão da exclusão dos procedimentos comuns de contratação no que respeita à parte do mercado abrangido (aspeto não controvertido no presente processo e que, em qualquer caso, não é objeto de quaisquer limitações expressas na Diretiva 2014/24 às quais possa aplicar‑se uma interpretação estrita da exclusão) e à profundidade da exclusão quanto ao âmbito das normas das quais estão isentos os procedimentos de contratação excluídos. Não deve aplicar‑se o referido princípio no sentido de que exige assegurar o maior número possível de participantes autorizados para qualquer procedimento de contratação reservado ao abrigo do artigo 20.o Uma vez que uma parte do mercado de contratação pública foi separada do mercado normal e reservada para os operadores económicos que se presume não serem competitivos devido aos benefícios sociais significativos que proporcionam, não vejo nenhum benefício real para os princípios da economia de mercado, concorrência ou igualdade de tratamento na insistência de que o âmbito subjetivo de participantes permitidos (presumivelmente não competitivos) seja definido da forma mais ampla possível. Do ponto de vista da economia de mercado, é — a meu ver — a dimensão da exclusão que importa, ao passo que a delimitação do âmbito subjetivo dos beneficiários deve ser vista como uma questão — e um instrumento — de política social e de emprego que é objeto de uma ampla margem de apreciação dos Estados‑Membros.

    46.

    Por conseguinte, na minha opinião, uma interpretação literal e teleológica do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 permite concluir que os Estados‑Membros não são obrigados, por força desse artigo, a aceitar a participação de um dado operador económico que preencha os critérios enunciados nesse artigo nos seus procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o No entanto, quaisquer restrições adicionais devem cumprir os requisitos do artigo 18.o da Diretiva 2014/24 e de quaisquer outras disposições ou princípios aplicáveis do direito da União em matéria de contratação pública.

    47.

    Esta conclusão é também apoiada pela génese do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 e pela sua disposição anterior, o artigo 19.o da Diretiva 2004/18, que introduziu o conceito de «contratos reservados» nas diretivas sobre contratação pública ( 16 ).

    48.

    O artigo 20.o da Diretiva 2014/24 e a sua disposição anterior permite ou permitia, respetivamente, que os Estados‑Membros reservassem o direito de participar nos procedimentos de contratação pública ou em determinados lotes dos mesmos a oficinas ou empresas sociais, dada a dificuldade de estas conseguirem contratos em condições normais de concorrência, sendo que a premissa subjacente é que o emprego dos beneficiários finais previstos nos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o — a saber, pessoas com deficiência ou desfavorecidas cuja integração social e profissional deve ser o objetivo principal dos operadores económicos que o Estado‑Membro em causa admita como participantes autorizados — é ou pode ser economicamente desvantajoso para os operadores económicos em causa, na medida em que não se pode esperar que eles sejam capazes de competir em condições normais de mercado. Por conseguinte, os Estados‑Membros podem, sob reserva de certas salvaguardas e limitações, criar o que equivale a um espaço protegido para a contratação pública em que esses operadores concorram apenas com outros operadores em circunstâncias comparáveis.

    49.

    Decorre claramente da leitura isolada do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 que uma situação de concorrência real ou mesmo aproximada entre esses sujeitos só pode ser alcançada se se acrescentarem pormenores às linhas gerais fornecidas por essa disposição da diretiva. Partindo da ideia de que esses operadores económicos podem não ser capazes de competir em condições normais de mercado devido às suas contribuições sociais significativas, deve reconhecer‑se igualmente que os termos «com deficiência ou desfavorecidos» abrangem grupos muito diversos de pessoas e que dentro de cada subconjunto desses grupos os indivíduos variam muito nas suas capacidades e produtividade potencial. Assim, um operador económico que procura ajudar a integração de, apenas a título de exemplo, alguém que sofre de desemprego de longa duração enfrenta desafios muito diferentes de outro operador económico que procura ajudar a integração de uma pessoa que está permanentemente incapacitada, novamente a título de exemplo, por cegueira. Tendo isso em mente, bem como o objetivo mencionado no considerando 36 da Diretiva 2014/24 de «garantir a igualdade de oportunidades para todos», considero que o objetivo do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 é mais bem servido ao permitir que os Estados‑Membros imponham requisitos mais pormenorizados para a participação nos seus procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o

    50.

    Isto torna‑se ainda mais claro se o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 for analisado no contexto da sua disposição anterior, o artigo 19.o da Diretiva 2004/18. O artigo 19.o da Diretiva 2004/18 impôs requisitos consideravelmente mais rigorosos em relação aos trabalhadores dos operadores autorizados em procedimentos de contratação reservados, ao exigir que a maioria dos trabalhadores fossem «deficientes que, por força da natureza ou gravidade das suas deficiências, [não podiam] exercer uma atividade profissional em condições normais», colocando assim a fasquia significativamente mais alta, tanto no que diz respeito à percentagem mínima de trabalhadores desfavorecidos como no que diz respeito à gravidade e à natureza da sua desvantagem.

    51.

    Quando o âmbito de aplicação, ratione personae, para os contratos reservados do artigo 20.o foi alargado com a Diretiva 2014/24, a intenção do legislador da União não era claramente criar um «nivelamento por baixo», em que as empresas sociais que empregam uma percentagem inferior de pessoas menos afetadas — de acordo com os novos requisitos flexíveis — iriam afastar do mercado as empresas sociais, atendendo aos requisitos mais rígidos em vigor ao abrigo da legislação anterior para os procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o No entanto, tendo em conta a premissa do considerando 36 da Diretiva 2014/24 e do considerando 28 da Diretiva 2004/18, que descreve a razão de ser da reserva dos contratos, a saber, que os operadores em causa podem ser incapazes de competir em condições normais de mercado, o resultado expectável, se qualquer operador económico que empregasse apenas 30 % das pessoas menos afetadas pudesse competir em pé de igualdade com os operadores que preenchem os requisitos anteriores, muito mais rigorosos, seria exatamente isso: os operadores económicos que preenchem os requisitos anteriores e mais rigorosos seriam forçados a despedir os seus trabalhadores menos produtivos e presumivelmente mais necessitados até à marca dos 30 %, ou enfrentariam a perspetiva de perder os procedimentos de contratação reservados que lhes são destinados face a outros operadores económicos que assumissem uma responsabilidade social consideravelmente mais ligeira.

    52.

    Deve salientar‑se que esta análise não permite que os Estados‑Membros excluam à vontade os operadores económicos dos seus procedimentos de contratação do artigo 20.o e não prejudica a legalidade da exclusão em bloco dos centros especiais de emprego de iniciativa «empresarial» dos contratos espanhóis do artigo 20.o Esta questão deve ser determinada principalmente à luz das normas e dos princípios estabelecidos no artigo 18.o da Diretiva 2014/24.

    C.   Quanto aos limites à margem de apreciação dos Estados‑Membros

    1. Quanto à aplicabilidade do artigo 18.o da Diretiva 2014/24

    53.

    Os Estados‑Membros não têm liberdade para impor livremente requisitos aos participantes autorizados nos seus procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o Pelo contrário, os procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o estão sujeitos às disposições da Diretiva 2014/24, incluindo o artigo 18.o, e quaisquer requisitos adicionais devem, por conseguinte, ser conformes com o artigo 18.o e com os princípios que nele figuram.

    54.

    Esta conclusão é suportada pela letra do artigo 20.o da Diretiva 2014/24, que não contém qualquer indicação de que os contratos reservados devem ser excluídos da aplicação das restantes disposições da diretiva, e pela colocação desse artigo no capítulo II, «Regras gerais», do título I, e não na secção 3, «Exclusões», do capítulo I, título I, que seria o lugar natural para uma disposição que estabelecesse uma exceção à aplicação da diretiva.

    55.

    Além disso, resulta claro da história do processo legislativo da disposição anterior do artigo 20.o da Diretiva 2014/24, a saber, o artigo 19.o da Diretiva 2004/18, que os procedimentos de contratação reservados não se destinavam a ser dispensados da aplicação das outras disposições da referida diretiva.

    56.

    O artigo 19.o da Diretiva 2004/18, que juntamente com o artigo 28.o da Diretiva 2004/17 introduziu o conceito de «contratos reservados» no direito da União sobre contratação pública, não figurava no projeto original da Comissão relativo àquela diretiva. Teve origem na alteração 9 do Parecer da Comissão da Indústria, do Comércio Externo, da Investigação e da Energia do Parlamento Europeu, de 29 de junho de 2001, sobre a proposta de diretiva, que, na sua redação original, excluía por completo da aplicação da Diretiva 2004/18 todos os «contratos públicos de fornecimento, de serviços ou de empreitadas» adjudicados a «sistemas de emprego protegido» ( 17 ).

    57.

    Esta proposta de alteração foi objeto de diversas modificações e foram formuladas várias justificações para as diferentes propostas da disposição antes de se ter chegado à sua forma definitiva, nomeadamente na redação do artigo 19.o da Diretiva 2004/18. O comentário da Comissão sobre a versão da disposição proposta na «proposta alterada» apresentada em 6 de maio de 2002 ( 18 ) esclarece que «a reserva não implica uma isenção da aplicação de todas as outras disposições da diretiva aplicáveis aos contratos públicos». Isto reflete‑se também no texto da Diretiva 2004/18, tal como adotada, que não exclui os contratos em causa da aplicação da Diretiva 2004/18 (tal como na proposta de alteração original), mas apenas prevê que a participação nos procedimentos de contratação pública para esses contratos pode ser reservada a essas oficinas. As várias fases do processo legislativo conducente à versão final do artigo 19.o da Diretiva 2004/18 mostram ainda uma clara intenção legislativa de que os «contratos reservados» devem permanecer sujeitos a concorrência à escala da União, em conformidade com as restantes disposições da Diretiva 2004/18 e com as «regras pertinentes do Tratado» ( 19 ).

    58.

    As várias justificações apresentadas para a introdução desta nova disposição em diferentes fases do processo legislativo e o considerando 28 da versão definitiva da diretiva deixam claro que a razão de ser do artigo 18.o da Diretiva 2004/18 era que as oficinas e os programas de emprego em causa poderiam não conseguir «obter contratos em condições de concorrência normais». Estas oficinas e programas de emprego, segundo o considerando, «contribuem de forma eficaz para a integração ou reintegração das pessoas com deficiência no mercado de trabalho». No referido considerando, afirma‑se também nesse contexto que «[o] emprego e o trabalho constituem elementos essenciais para garantir a igualdade de oportunidades para todos».

    59.

    A génese legislativa do artigo 19.o da Diretiva 2004/18 e o considerando 28 dessa diretiva demonstram assim que o objetivo da disposição era permitir aos Estados‑Membros recorrer a procedimentos de contratação reservados para proporcionar a certos participantes autorizados contratos que não teriam conseguido obter em condições de mercado normais e que a justificação para este tratamento privilegiado era a contribuição eficaz para a integração ou reintegração dos beneficiários finais do regime, a saber, na redação do artigo 19.o da Diretiva 2004/18, «deficientes que, por força da natureza ou gravidade das suas deficiências, não possam exercer uma atividade profissional em condições normais». Este objetivo fazia parte do propósito maior de «garantir a igualdade de oportunidades para todos». A utilização de contratos reservados devia ter lugar no respeito de todas as outras disposições da Diretiva 2004/18, estando especificamente contemplada a concorrência transfronteiras para os contratos reservados ( 20 ).

    60.

    A Diretiva 2014/24 introduziu diversas alterações no regime dos «contratos reservados» ( 21 ). Assim, o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 reafirma e amplia a faculdade inicialmente atribuída aos Estados‑Membros pelo artigo 19.o da Diretiva 2004/18 de reservar a determinados operadores o direito de participarem em procedimentos de contratação pública. Em comparação com o artigo 19.o da Diretiva 2004/18, o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 amplia substancialmente o círculo de operadores que podem ser admitidos como participantes autorizados em procedimentos de contratação pública para contratos reservados. Não obstante, nenhuma dessas alterações indica qualquer intenção do legislador da União de excluir os procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o da aplicação das restantes disposições da Diretiva 2014/24 ou qualquer intenção de reduzir o grau de responsabilidade social suportada por cada um dos participantes autorizados. Pelo contrário, o âmbito de aplicação subjetiva da disposição é simplesmente alargado ao permitir que mais operadores se qualifiquem como participantes autorizados, presumivelmente com vista a expandir a utilização deste instrumento de política social e de emprego com o objetivo de beneficiar um grupo maior, mais amplo e definido de beneficiários finais (trabalhadores incapacitados ou desfavorecidos).

    61.

    A própria génese legislativa da Diretiva 2014/24 fornece relativamente poucas orientações quanto à interpretação do artigo 20.o O Comité Económico e Social Europeu, no seu parecer sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos contratos públicos» [COM (2011) 896 final], sugeriu algumas alterações que não foram adotadas, incluindo o requisito de que «as oficinas protegidas e os operadores económicos que tenham por objetivo principal a integração social e profissional de trabalhadores com deficiência e desfavorecidos“devem ser promovidos e contar com uma participação maioritária de organizações sem fins lucrativos”», o que justificaria ainda mais esse acesso preferencial aos apoios das autoridades ( 22 ).

    2. Observações gerais sobre o artigo 18.o da Diretiva 2014/24

    62.

    O artigo 18.o da Diretiva 2014/24, intitulado «Princípios da contratação», dispõe, no n.o 1, primeiro parágrafo, que as autoridades adjudicantes devem tratar os operadores económicos de acordo com os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação e devem atuar de «forma […] proporcionada». Trata‑se, em substância, de reiterar os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, que seriam aplicáveis mesmo sem a referida disposição ( 23 ). O artigo 18.o, n.o 1, segundo parágrafo, dispõe que «[o]s concursos não podem ser organizados no intuito de […] reduzir artificialmente a concorrência. Considera‑se que a concorrência foi artificialmente reduzida caso o concurso tenha sido organizado no intuito de favorecer ou desfavorecer indevidamente determinados operadores económicos]». Embora os factos do processo principal pareçam dizer respeito exclusivamente aos operadores espanhóis, há que ter em conta que a Diretiva 2014/24 alarga os princípios da igualdade de tratamento dos proponentes, da proporcionalidade e da não distorção da concorrência às situações internas ( 24 ).

    63.

    No processo principal, Espanha adotou legislação que parece excluir em bloco grande parte de um determinado setor, a saber, os centros especiais de emprego de iniciativa empresarial, dos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o Essa legislação reserva ainda esses contratos exclusivamente para outro subconjunto de centros especiais de emprego, a saber, os chamados centros especiais de emprego de iniciativa social, e reserva o que parece ser um conjunto significativo de contratos públicos para os procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o

    64.

    Isto levanta questões bastante óbvias em termos de conformidade com os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, bem como com a proibição de reduzir artificialmente a concorrência.

    3. Quanto ao artigo 18.o da Diretiva 2014/24 e ao princípio da igualdade de tratamento

    65.

    Segundo jurisprudência constante, o princípio da igualdade de tratamento é um dos princípios fundamentais do direito da União ( 25 ), que os Estados‑Membros devem observar quando atuam no âmbito do direito da União. Este princípio, que figura entre os direitos fundamentais cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça ( 26 ), exige que situações semelhantes ou comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente a menos que a diferença de tratamento seja objetivamente justificada ( 27 ). Como princípio geral de direito da União, o princípio da igualdade de tratamento vincula os Estados‑Membros quando implementam regulamentações da União. Por conseguinte, os Estados‑Membros são obrigados, em toda a medida do possível, a aplicar essas regulamentações em condições que não violem as exigências decorrentes da proteção dos direitos fundamentais na ordem jurídica da União ( 28 ).

    66.

    No domínio do direito da União em matéria de contratação pública, o princípio da igualdade de tratamento tem uma expressão específica no princípio da igualdade dos proponentes, que impõe que estes disponham das mesmas oportunidades na formulação dos termos das suas propostas ( 29 ). Como salientou o advogado‑geral Y. Bot nas Conclusões que apresentou no processo Wall ( 30 ), o princípio da igualdade de tratamento entre os proponentes tem como objetivo favorecer o desenvolvimento de uma concorrência sã e efetiva entre as empresas que participam num concurso. O respeito desse princípio deve permitir garantir uma comparação objetiva das propostas e impõe‑se em todas as fases do processo. Dito de outra forma, as regras do jogo devem ser conhecidas por todos os potenciais proponentes e devem aplicar‑se a todos da mesma forma.

    67.

    A exclusão de um grupo de potenciais proponentes dos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o num Estado‑Membro em benefício de outro grupo de proponentes, como a exclusão espanhola dos centros especiais de emprego de iniciativa empresarial em benefício dos centros especiais de emprego da iniciativa social, só é, portanto, admissível se esses dois grupos de potenciais proponentes não estiverem em situações semelhantes ou comparáveis ou se a diferença de tratamento for objetivamente justificada.

    68.

    Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio, o único competente para se pronunciar sobre os factos do litígio no processo principal, verificar se os centros especiais de emprego de iniciativa «empresarial» e os centros especiais de emprego de iniciativa social se encontram em situações semelhantes ou comparáveis e/ou se a diferença de tratamento é objetivamente justificada. Os centros especiais de emprego de iniciativa «empresarial» parecem ter cumprido anteriormente e continuar a cumprir atualmente as mesmas funções sociais que as exigidas aos centros especiais de emprego de iniciativa social. Por conseguinte, à primeira vista, não parece irrazoável considerar que estes dois grupos de centros especiais de emprego se encontram numa situação semelhante ou comparável no que diz respeito à sua capacidade de cumprir a função de ajudar a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas. Ao mesmo tempo, existem diferenças na organização dos centros especiais de emprego de iniciativa «empresarial» e dos centros especiais de emprego de iniciativa social, nomeadamente no que diz respeito à natureza não lucrativa destes últimos e à exigência de reinvestimento dos lucros, o que poderia apoiar a conclusão de que os dois grupos de entidades não se encontram em situações semelhantes ou comparáveis, ou que qualquer diferença de tratamento é objetivamente justificada. Em última análise, trata‑se de uma apreciação que implica uma interpretação da lei espanhola aplicável e que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio fazer.

    4. Quanto ao artigo 18.o da Diretiva 2014/24 e ao princípio da proporcionalidade

    69.

    Tal como o Tribunal de Justiça indicou na sua jurisprudência, o objetivo da legislação nacional relativa aos procedimentos de contratação pública é, de uma forma geral, garantir a igualdade de tratamento dos proponentes. Por conseguinte, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, tal legislação não deve exceder o necessário para alcançar o objetivo pretendido ( 31 ).

    70.

    Quando os Estados‑Membros adotam legislação nacional que transpõe o artigo 20.o da Diretiva 2014/24 e separam «contratos reservados» nos procedimentos de contratação pública em benefício dos provedores de emprego protegido, essa legislação prossegue, pelo menos, dois objetivos: a igualdade de tratamento dos proponentes, referida no número anterior, e a política social e laboral de colocação de contratos reservados à disposição dos provedores de emprego protegido.

    71.

    Tal como acontece com o princípio da igualdade de tratamento, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio, o único competente para se pronunciar sobre os factos do processo principal, verificar se a imposição dos requisitos adicionais constitui, de facto, o meio adequado para atingir objetivos legítimos prosseguidos pelo Estado‑Membro em relação à maximização dos objetivos sociais de integração ou reintegração de pessoas com deficiência ou desfavorecidas e, em caso afirmativo, se esses requisitos vão além do necessário para atingir esses objetivos.

    72.

    Na minha opinião, os requisitos de os participantes num procedimento de contratação reservado do artigo 20.o estarem constituídos como entidades sem fins lucrativos ou serem participados por entidades dessa natureza e reinvestirem os lucros obtidos com os contratos reservados do artigo 20.o podem ser considerados meios adequados para promover o objetivo legítimo de integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas. Ambos os requisitos estão relacionados com a condição do artigo 20.o, n.o 1, de o «objetivo principal» dos operadores económicos autorizados (distintos das «oficinas protegidas») ser «a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas». Uma entidade com fins lucrativos tem geralmente entre os seus «objetivos» gerar lucros para os seus proprietários. Não é descabido considerar que o objetivo do lucro pode desviar o foco do objetivo social. Assim, o requisito relativo à inexistência de fins lucrativos ou propriedade final do participante autorizado por uma entidade sem fins lucrativos parece servir um propósito legítimo. O requisito de reinvestimento dos lucros nas mesmas empresas sociais ou em empresas sociais semelhantes, cujo objetivo seja a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas, atende ainda mais claramente a esse propósito, e dada a transferência inerente de fundos públicos que é previsível nos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o (o próprio fundamento da disposição de que os participantes autorizados podem não ser capazes de competir em termos normais de preço/qualidade sugere que as autoridades contratantes paguem mais em compras feitas nos termos dos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o), o reinvestimento dos lucros correlativos para benefício final dos objetivos sociais relevantes parece especialmente adequado.

    73.

    O requisito de emprego de 70 % imposto pela legislação espanhola evidentemente também contribui para atingir o objetivo final prosseguido pelos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o, a saber, «a integração ou reintegração social e profissional das pessoas com deficiência e pessoas desfavorecidas» ( 32 ).

    74.

    Por conseguinte, a meu ver, os referidos requisitos parecem adequados para atingir o fim desejado. No entanto, o requisito de os centros especiais de emprego assumirem a forma jurídica específica de entidade sem fins lucrativos ou cumprirem os requisitos de propriedade em questão parece, em minha opinião, ir além do necessário para atingir esses objetivos. É difícil compreender como é que a exclusão de um amplo subconjunto de operadores económicos que no passado serviram, atualmente servem e no futuro pretendem servir exatamente esses objetivos sociais e esse segmento de população, apenas devido à forma jurídica de constituição desses operadores económicos ou à forma jurídica dos seus proprietários finais, não vai além do necessário para garantir a realização do objetivo legítimo de integração social e profissional ou de reinserção profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas. Isto aplica‑se, por maioria de razão, se o requisito de reinvestimento dos lucros for mantido.

    75.

    Por conseguinte, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, considero que os requisitos relativos à forma jurídica ou à propriedade dos operadores económicos que são aceites como participantes autorizados nos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o de um Estado‑Membro, como os requisitos espanhóis em causa no processo principal, são contrários ao princípio da proporcionalidade.

    5. Quanto ao artigo 18.o da Diretiva 2014/24 e à proibição de reduzir artificialmente a concorrência

    76.

    Nos termos do artigo 18.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2014/24, os concursos não podem ser organizados no intuito de reduzir artificialmente a concorrência. Considera‑se que a concorrência foi reduzida artificialmente caso o concurso tenha sido organizado no intuito de favorecer ou desfavorecer indevidamente determinados operadores económicos.

    77.

    É evidente que os centros especiais de emprego de iniciativa social são favorecidos pela legislação espanhola em causa e que os centros especiais de iniciativa empresarial são desfavorecidos. Também parece óbvio que isso é intencional. No entanto, o artigo 18.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2014/24 não proíbe todo e qualquer favorecimento ou desfavorecimento intencional. A proibição aplica‑se apenas quando a intenção é favorecer ou desfavorecer «indevidamente» determinados operadores económicos.

    78.

    O Tribunal de Justiça ainda não esclareceu o significado de «indevidamente» (ou «artificial») para os efeitos do artigo 18.o da Diretiva 2014/24. Algumas orientações para a interpretação desses conceitos podem, no entanto, ser extraídas dos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade. Embora os conceitos de igualdade de tratamento e «concorrência não reduzida artificialmente» sejam obviamente distintos, um «favorecimento» ou «desfavorecimento» de qualquer (quaisquer) operador(es) económico(s) em relação a outro(s) implica uma diferença de tratamento. É difícil pensar num «favorecimento» ou «desfavorecimento» que seja feito «indevidamente» e, ao mesmo tempo, «objetivamente justificado» ou vice‑versa, de modo que parece haver alguma sobreposição desses dois conceitos distintos. Da mesma forma, no que diz respeito à relação entre concorrência reduzida artificialmente e proporcionalidade, é difícil pensar num favorecimento ou desfavorecimento de qualquer (quaisquer) operador(es) económico(s) em relação a outro(s) que «devidamente» vá além do necessário para atingir os objetivos legítimos prosseguidos. Parece, portanto, que existe também alguma sobreposição entre a concorrência reduzida artificialmente e a violação da proporcionalidade.

    79.

    Pode parecer tentador definir «reduzir artificialmente a concorrência» apenas com referência aos dois princípios mencionados no número anterior. No entanto, a inclusão da proibição de reduzir artificialmente a concorrência no artigo 18.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2014/24 seria supérflua se abrangesse apenas comportamentos já proibidos pelos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade. Por conseguinte, a meu ver, deve atribuir‑se um alcance mais amplo à proibição de reduzir artificialmente a concorrência.

    80.

    Conforme acima discutido no contexto da análise da proporcionalidade no n.o 74, a redução da concorrência decorrente da exclusão dos centros especiais de emprego de iniciativa empresarial dos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o espanhóis não parece ser proporcional a um objetivo legítimo no que se refere ao requisito de os operadores económicos em causa assumirem a forma de entidades sem fins lucrativos ou serem, em última instância, ou detidos ou parcialmente detidos por entidades sem fins lucrativos. Independentemente do alcance exato da proibição de reduzir artificialmente a concorrência, este requisito parece, a meu ver, infringi‑la. No entanto, cabe, em última análise, ao órgão jurisdicional de reenvio decidir se, no processo que lhe foi submetido, existe a intenção de favorecer e/ou desfavorecer indevidamente.

    81.

    No que diz respeito ao requisito de reinvestimento dos lucros, tal poderia, a meu ver, ser considerado uma redução artificial da concorrência, ainda que a minha análise de que esse requisito pode cumprir as normas da igualdade de tratamento e da proporcionalidade seja aceite. Se o requisito for imposto não apenas para servir o objetivo legítimo de promover a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas mas também for intencionalmente concebido de forma a beneficiar um grupo de potenciais proponentes em detrimento de outros por razões não relacionadas com o fim legítimo prosseguido ( 33 ), a meu ver, deve ser considerado como uma forma de favorecer um grupo e desfavorecer o outro indevidamente e de reduzir artificialmente a concorrência. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se assim é.

    IV. Conclusão

    82.

    À luz destas considerações, sugiro ao Tribunal de Justiça que responda ao órgão jurisdicional de reenvio nos seguintes termos:

    O artigo 20.o da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos, não se opõe a uma legislação nacional que subordina o direito de participar nos procedimentos de contratação pública reservados nos termos desse artigo a requisitos adicionais, para além dos especificados no mesmo artigo.

    No entanto, esses requisitos adicionais devem cumprir todos os requisitos aplicáveis do direito da União, incluindo o artigo 18.o da Diretiva 2014/24 e os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, e não devem reduzir artificialmente a concorrência.

    A este respeito, o requisito de apenas os operadores económicos que sejam entidades sem fins lucrativos ou detidas total ou parcialmente por entidades sem fins lucrativos poderem participar em procedimentos de contratação reservados parece, à primeira vista, ir além do necessário para atingir o objetivo legítimo de promover a integração social e profissional de pessoas com deficiência e desfavorecidas.

    A exclusão intencional de um amplo segmento de operadores económicos por razões não relacionadas com o objetivo legítimo de promover a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas parece, à primeira vista, reduzir artificialmente a concorrência.


    ( 1 ) Língua original: inglês.

    ( 2 ) JO 2014, L 94, p. 65.

    ( 3 ) Diretiva 2004/17/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (JO 2004, L 134, p. 1).

    ( 4 ) Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114).

    ( 5 ) A Conacee refere‑se à Ley estatal 31/2015 por la que se modifica y actualiza la normativa en materia de autoempleo y se adoptan medidas de fomento y promoción del trabajo autónomo y de la Economía Social (Lei nacional 31/2015, que Altera e Atualiza a Regulamentação sobre o Autoemprego e Adota Medidas para Promover e Incentivar o Trabalho Independente e sobre a Economia Social), de 9 de setembro de 2015.

    ( 6 ) Por comodidade, referir‑me‑ei aos procedimentos de contratação pública que são reservados nos termos do artigo 20.o da Diretiva 2014/24 como «procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o».

    ( 7 ) Referir‑me‑ei às empresas e operadores económicos que um Estado‑Membro autorize a participar nos seus procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o como «participantes autorizados».

    ( 8 ) Os montantes dos limiares estão sujeitos a revisões bienais, em conformidade com o artigo 6.o da Diretiva 2014/24. Os contratos públicos adjudicados por entidades adjudicantes que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais e que se inserem no âmbito dessas atividades são abrangidos pela Diretiva 2014/25/UE e, em geral, não pela Diretiva 2014/24. O artigo 4.o, alínea d), prevê um limiar significativamente mais elevado para os contratos públicos de certos «serviços sociais e outros serviços específicos» enumerados. Estes contratos são objeto de um regime especial de contratação ao abrigo do capítulo I, título III, da Diretiva 2014/24.

    ( 9 ) V., neste sentido, considerando 1 da Diretiva 2014/24.

    ( 10 ) A Comissão assinala no ponto 16 das suas observações, como exemplos, que a República Francesa, a República Checa e a República da Croácia têm exigências mais rigorosas relativamente à percentagem de trabalhadores deficientes ou desfavorecidos, e que a República Checa, a este respeito, conta apenas as pessoas deficientes e não outras pessoas desfavorecidas.

    ( 11 ) Para simplificar, referir‑me‑ei aos contratos obtidos por proponentes no âmbito dos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o como «contratos reservados do artigo 20.o».

    ( 12 ) N.o 14 das observações da Comissão: « […] [L]es États membres sont en droit de préciser dans leur législation ce qu’il convient d’entendre par “opérateurs économiques dont l’objet principal est l’intégration sociale et professionnelle de personnes handicapées ou défavorisées”» («Os Estados‑Membros têm o direito de estabelecer na sua legislação o que se deve entender pela expressão “operadores económicos cujo objetivo principal seja a integração social e profissional de pessoas com deficiência ou desfavorecidas”»).

    ( 13 ) Acórdão de 4 de junho de 2020, Remondis (C‑429/19, EU:C:2020:436, n.o 24).

    ( 14 ) Isto corresponde à escolha do legislador da União de tornar facultativo para os Estados‑Membros o recurso aos procedimentos de contratação reservados do artigo 20.o

    ( 15 ) Acórdão de 19 de setembro de 2018, Bedi (C‑312/17, EU:C:2018:734, n.o 59 e jurisprudência aí referida).

    ( 16 ) A Diretiva 2014/24 foi adotada juntamente com a Diretiva 2014/23/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à adjudicação de contratos de concessão (JO 2014, L 94, p. 1), e a Diretiva 2014/25/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais e que revoga a Diretiva 2004/17/CE (JO 2014, L 94, p. 243), cujos artigos 24.o e 38.o, respetivamente, coincidem quase literalmente com o artigo 20.o da Diretiva 2014/24. A Diretiva 2004/18 foi adotada juntamente com a Diretiva 2004/17/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (JO 2004, L 134, p. 1), cujo artigo 28.o coincide quase literalmente com o artigo 19.o da Diretiva 2004/18.

    ( 17 ) Parecer da Comissão dos Assuntos Jurídicos e do Mercado Interno sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos públicos de fornecimento, dos contratos públicos de serviços e dos contratos de empreitada de obras públicas [COM(2000) 275 — C5‑0367/2000 — 2000/0115(COD)], disponível em https://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=‑//EP//TEXT+REPORT+A5‑2001‑0378+0+DOC+XML+V0//EN (último acesso em 23 de março de 2021).

    ( 18 ) Proposta alterada de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos públicos de fornecimento, dos contratos públicos de serviços e dos contratos de empreitadas de obras públicas [COM(2002) 236 final — 2000/0115(COD), JO 2002, C 203 E, p. 210] alteração 36.

    ( 19 ) V., por exemplo, alteração 9 original e posterior justificação da alteração de compromisso de A. P. Vallelersundi, referida na nota 20, infra. Veja‑se uma compilação da génese legislativa do artigo 19.o da Diretiva 2004/18 in Hebly, Jan M., European Public Procurement — Legislative History of the «Classic» Directive 2004/18/EC, pp. 603 e segs.

    ( 20 ) V. justificação da alteração de compromisso 29 por A. P. Vallelersundi, em que o texto proposto passa da isenção de contratos adjudicados a locais de trabalho e programas protegidos para o conceito de «contratos reservados» para esses mesmos locais de trabalho e programas: «também é necessário que a adjudicação desses contratos […] esteja aberta a todas as oficinas e programas protegidos situados em qualquer lugar [da União] e não se converta em mais uma variante de preferências regionais ou locais». Este ponto de vista está implicitamente salvaguardado no comentário da Comissão à alteração 36 da proposta alterada de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à coordenação dos processos de adjudicação de fornecimentos públicos, de prestação de serviços públicos e de empreitadas de obras públicas [COM(2002) 236 final — 2000/0115(COD), JO 2002, C 203 E, p. 210]: «[A] alteração pode ser aceite, se for modificada para esclarecer que a reserva não implica uma isenção da aplicação de todas as outras disposições da diretiva aplicáveis aos contratos públicos».

    ( 21 ) A Diretiva 2014/24, para além das alterações incluídas no artigo 20.o, introduziu no capítulo I, «Serviços sociais e outros serviços específicos» (artigos 74.o a 77.o), do título III, «Regimes especiais de contratação pública», um tipo diferente de contratos reservados para determinados serviços de saúde, sociais e culturais. Este regime é distinto e separado das disposições em causa no presente processo, mas é possível que o legislador espanhol tenha visto no artigo 77.o, n.o 2, alínea b), um modelo para o requisito do «reinvestimento dos lucros» imposto pela legislação espanhola.

    ( 22 ) Pontos 4.10 e 4.11 do Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos contratos públicos celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais [COM(2011) 895 final — 2011/0439 (COD)]; proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos contratos públicos [COM(2011) 896 final — 2011/0438 (COD)]; e proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à adjudicação de contratos de concessão [COM(2011) 897 final — 2011/0437 (COD)] (JO 2012, C 191, p. 84).

    ( 23 ) Esta disposição é uma extensão da disposição anterior, o artigo 2.o da Diretiva 2004/18, que exigia apenas um tratamento igual e não discriminatório dos operadores económicos e transparência, mas que não mencionava proporcionalidade.

    ( 24 ) V., a este respeito, Conclusões do advogado‑geral M. Szpunar apresentadas no processo Grupo Hospitalario Quirón (C‑552/13, EU:C:2015:394, n.os 40 e segs.) a propósito do artigo 23.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18, respeitante ao acesso dos proponentes em condições de igualdade e à inexistência de entraves injustificados à concorrência no âmbito das especificações técnicas.

    ( 25 ) Acórdãos de 19 de outubro de 1977, Ruckdeschel e o. (117/76 e 16/77, EU:C:1977:160, n.o 7); de 16 de dezembro de 2008, Arcelor Atlantique et Lorraine e o. (C‑127/07, EU:C:2008:728, n.o 23); e de 17 de dezembro de 2020, Centraal Israëlitisch Consistorie van België e o. (C‑336/19, EU:C:2020:1031, n.o 85).

    ( 26 ) Acórdãos de 12 de dezembro de 2002, Rodríguez Caballero (C‑442/00, EU:C:2002:752, n.o 32), e de 17 de janeiro de 2008, Velasco Navarro (C‑246/06, EU:C:2008:19, n.o 32).

    ( 27 ) Acórdãos de 25 de novembro de 1986, Klensch e o. (201/85 e 202/85, EU:C:1986:439, n.o 9); de 12 de dezembro de 2002, Rodríguez Caballero (C‑442/00, EU:C:2002:752, n.o 32 e jurisprudência aí referida); e de 17 de dezembro de 2020, Centraal Israëlitisch Consistorie van België e o. (C‑336/19, EU:C:2020:1031, n.o 85).

    ( 28 ) Acórdão de 12 de dezembro de 2002, Rodríguez Caballero (C‑442/00, EU:C:2002:752, n.o 30). V., também, Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Wall (C‑91/08, EU:C:2009/659, n.os 35 e 36).

    ( 29 ) Acórdão de 2 de junho de 2016, Pizzo (C‑27/15, EU:C:2016:404, n.o 36).

    ( 30 ) C‑91/08, EU:C:2009/659, n.o 38.

    ( 31 ) V., neste sentido, Acórdãos de 8 de fevereiro de 2018, Lloyd’s of London (C‑144/17, EU:C:2018:78, n.o 32); de 2 de maio de 2019, Lavorgna (C‑309/18, EU:C:2019:350, n.o 24 e jurisprudência aí referida); de 30 de janeiro de 2020, Tim (C‑395/18, EU:C:2020:58, n.o 45); e de 14 de maio de 2020, T‑Systems Magyarország (C‑263/19, EU:C:2020:373, n.o 71).

    ( 32 ) Considerando 36 da Diretiva 2014/24.

    ( 33 ) Tais razões poderiam, apenas a título de exemplo, derivar de uma vontade política ou ideológica de favorecer um grupo ou um tipo de empresa em detrimento de outros.

    Início