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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62019CJ0515

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 15 de abril de 2021.
    Eutelsat SA contra Autorité de régulation des communications électroniques et des postes (ARCEP) e Inmarsat Ventures SE.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Conseil d'État (França).
    Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações — Sector das telecomunicações — Utilização harmonizada do espetro radioelétrico nas bandas de frequências nos 2 GHz para a implementação de sistemas que oferecem serviços móveis via satélite — Decisão n.o 626/2008/CE — Artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b) — Artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii) — Artigo 7.o, n.os 1 e 2 — Artigo 8.o, n.os 1 e 3 — Sistemas móveis por satélite — Conceito de “estação terrestre móvel” — Conceito de “componentes terrestres complementares” — Conceito de “qualidade requerida” — Função respetiva dos componentes de satélite e terrestres — Obrigação de um operador selecionado de sistemas móveis por satélite servir uma certa percentagem da população e do território — Incumprimento — Incidência.
    Processo C-515/19.

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2021:273

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    15 de abril de 2021 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações — Sector das telecomunicações — Utilização harmonizada do espetro radioelétrico nas bandas de frequências nos 2 GHz para a implementação de sistemas que oferecem serviços móveis via satélite — Decisão n.o 626/2008/CE — Artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b) — Artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii) — Artigo 7.o, n.os 1 e 2 — Artigo 8.o, n.os 1 e 3 — Sistemas móveis por satélite — Conceito de “estação terrestre móvel” — Conceito de “componentes terrestres complementares” — Conceito de “qualidade requerida” — Função respetiva dos componentes de satélite e terrestres — Obrigação de um operador selecionado de sistemas móveis por satélite servir uma certa percentagem da população e do território — Incumprimento — Incidência»

    No processo C‑515/19,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), por Decisão de 28 de junho de 2019, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 8 de julho de 2019, no processo

    Eutelsat SA

    contra

    Autorité de régulation des communications électroniques et des postes (ARCEP),

    Inmarsat Ventures SE, anteriormente Inmarsat Ventures Ltd,

    sendo intervenientes:

    Viasat Inc.,

    Viasat UK Ltd,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: A. Arabadjiev, presidente de secção, A. Kumin (relator), T. von Danwitz, P. G. Xuereb e I. Ziemele, juízes,

    advogado‑geral: H. Saugmandsgaard Øe,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Eutelsat SA, por L. de la Brosse e C. Barraco‑David, avocats,

    em representação da Inmarsat Ventures SE, por C. Spontoni, N. Brice e É. Barbier de La Serre, avocats,

    em representação da Viasat Inc. e da Viasat UK Ltd, por L. Panepinto, P. de Bandt, H. Farge, avocats, e J. Ruiz Calzado, abogado,

    em representação do Governo francês, por A.‑L. Desjonquères, E. de Moustier e P. Dodeller, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo belga, por P. Cottin e J.‑C. Halleux, na qualidade de agentes, assistidos por S. Depré, avocat,

    em representação do Governo do Reino Unido, por S. Brandon, na qualidade de agente, assistido por J. Morrison, barrister,

    em representação da Comissão Europeia, por É. Gippini Fournier, G. Braun e L. Nicolae, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 12 de novembro de 2020,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b), do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii), do artigo 7.o, n.os 1 e 2, e do artigo 8.o, n.os 1 e 3, da Decisão n.o 626/2008/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de junho de 2008, relativa à seleção e autorização de sistemas que oferecem serviços móveis por satélite (MSS) (JO 2008, L 172, p. 15; a seguir «Decisão MSS»).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Eutelsat SA à Autorité de régulation des communications électroniques et des postes (Autoridade Reguladora das Comunicações Eletrónicas e Postais) (ARCEP, França) a respeito da decisão de esta última conceder à Inmarsat Ventures SE, anteriormente Inmarsat Ventures Ltd (a seguir «Inmarsat»), direitos de utilização para componentes terrestres complementares (a seguir «CTC») de sistemas móveis por satélite.

    Quadro jurídico

    Direito internacional

    Constituição da UIT

    3

    A União Internacional das Telecomunicações (UIT) é uma agência especializada das Nações Unidas, encarregada das tecnologias da informação e da comunicação. Como resulta, designadamente, do artigo 1.o da sua Constituição, é no âmbito da UIT que são atribuídos, mundialmente, o espetro radioelétrico e as órbitas dos satélites e que são elaboradas normas técnicas, a fim de assegurar a interconexão das redes e das tecnologias.

    4

    Em conformidade com o artigo 2.o da Constituição da UIT, esta é composta pelos Estados‑Membros da UIT e pelos membros dos Sectores. Atualmente, são membros da UIT 193 Estados, incluindo todos os Estados‑Membros da União Europeia, que é, ela própria, um «membro de Sector».

    5

    O artigo 4.o dessa Constituição, com a epígrafe «Instrumentos da [UIT]», dispõe, no seu n.o 3:

    «As disposições da presente Constituição e da Convenção são ainda completadas pelas dos regulamentos administrativos adiante enumerados, que regulamentam a utilização das telecomunicações e vinculam todos os Estados‑Membros:

    […]

    Regulamento das Radiocomunicações.

    […]»

    Regulamento das Radiocomunicações

    6

    As Conferências Mundiais de Radiocomunicações (CMR) têm por missão examinar e, se necessário, rever o Regulamento das Radiocomunicações referido no artigo 4.o da Constituição da UIT. Esse regulamento, na sua versão resultante da CMR que se realizou em Genebra (Suíça) em 23 de janeiro de 2012 (CMR‑12) (a seguir «Regulamento das Radiocomunicações»), contém um capítulo I, com a epígrafe «Terminologia e características técnicas», que inclui o artigo 1.o desse regulamento, com a epígrafe «Termos e definições». Este artigo está dividido em secções, incluindo a secção III com a epígrafe «Serviços radioelétricos». As secções estão, elas próprias, divididas em números. Dessa secção III consta, nomeadamente, o n.o 1.25 do referido artigo 1.o, com a seguinte redação:

    «serviço móvel por satélite: serviço de radiocomunicações:

    entre estações terrenas móveis e uma ou várias estações espaciais, ou entre estações espaciais utilizadas por este serviço; ou

    entre estações terrenas móveis, através de uma ou de várias estações espaciais.

    Este serviço pode, além disso, incluir as ligações de conexão necessárias para a sua exploração.»

    7

    O artigo 1.o do Regulamento das Radiocomunicações inclui uma secção IV, com a epígrafe «Estações e sistemas radioelétricos», que contém, nomeadamente, os seus números 1.61, 1.63, 1.64, 1.67 e 1.68, com a seguinte redação:

    «1.61 estação: um ou vários emissores ou recetores ou um conjunto de emissores e recetores, incluindo os aparelhos acessórios, necessários para assegurar um serviço de radiocomunicação ou para o serviço de radioastronomia, num dado local.

    Cada estação é classificada dependendo do serviço em que participa de forma permanente ou temporária.

    […]

    1.63 estação terrena: estação situada quer na superfície da Terra quer na parte principal da atmosfera e destinada a comunicar:

    Com uma ou mais estações espaciais; ou

    Com uma ou várias estações da mesma natureza, com o auxílio de um ou de vários satélites refletores ou de outros objetos espaciais.

    1.64 estação espacial: estação situada sobre um objeto que se encontra, se destina a ir, ou foi, além da parte principal da atmosfera terrestre.

    […]

    1.67 estação móvel: estação do serviço móvel destinada a ser utilizada quando em movimento ou durante paragens em pontos não determinados.

    1.68 estação terrena móvel: estação terrena do serviço móvel por satélite destinada a ser utilizada quando em movimento ou durante paragens em pontos não determinados.»

    Direito da União

    Decisão MSS

    8

    Nos termos dos considerandos 1, 4, 5, 18 e 19 da Decisão MSS:

    «(1)

    Tal como confirmado pelo Conselho nas suas conclusões de 3 de dezembro de 2004, a utilização efetiva e coerente do espetro radioelétrico é essencial para o desenvolvimento dos serviços de comunicações eletrónicas e contribui para estimular o crescimento, a competitividade e o emprego; o acesso ao espetro tem de ser facilitado para melhorar a eficiência, promover a inovação e oferecer maior flexibilidade aos utilizadores e maior escolha aos consumidores, tendo simultaneamente em conta objetivos de interesse geral.

    […]

    (4)

    A Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (Diretiva‑Quadro) [(JO 2002, L 108, p. 33)] tem por objetivo incentivar uma utilização eficiente e assegurar uma gestão efetiva das radiofrequências e dos recursos de numeração, removendo os obstáculos que ainda se colocam ao fornecimento das redes e serviços correspondentes, assegurando a não discriminação e encorajando o estabelecimento e desenvolvimento de redes transeuropeias e a interoperabilidade dos serviços pan‑europeus.

    (5)

    A introdução de novos sistemas que oferecem serviços móveis por satélite (MSS) contribuirá para o desenvolvimento do mercado interno e reforçará a concorrência aumentando a disponibilidade de serviços pan‑europeus e a conectividade de extremo a extremo, para além de incentivar um investimento eficiente. Os MSS constituem uma plataforma inovadora e alternativa para vários tipos pan‑europeus de telecomunicações e de serviços de radiodifusão/multidifusão, independentemente da localização dos utilizadores finais, como o acesso à Internet/Intranet de alta velocidade, os serviços móveis multimédia, a proteção civil e a assistência em catástrofes. Estes serviços poderão, em especial, melhorar a cobertura das zonas rurais na Comunidade, reduzindo assim a “clivagem digital” em termos geográficos, reforçando a diversidade cultural e o pluralismo dos órgãos de comunicação social e contribuindo, ao mesmo tempo, para a competitividade das indústrias europeias das tecnologias da informação e das comunicações, em conformidade com os objetivos da estratégia de Lisboa renovada. […]

    […]

    (18)

    Os [CTC] são parte integrante dos sistemas móveis por satélite e são usados, regra geral, para melhorar a oferta de serviços deste tipo em áreas onde não é possível manter uma linha de vista contínua com o satélite, devido às obstruções causadas por edifícios e pelo terreno na linha do horizonte. […] A autorização dos [CTC] deverá ser, pois, condicionada sobretudo pelas circunstâncias locais. Por esse motivo, a seleção e a autorização de tais componentes deverão ser feitas a nível nacional, respeitando as condições estabelecidas pelo direito comunitário, o que não deverá prejudicar o direito de as autoridades competentes dos Estados‑Membros exigirem aos candidatos selecionados a apresentação de informação técnica que esclareça o modo como determinados componentes terrestres complementares poderão melhorar a disponibilidade dos MSS propostos nas zonas geográficas onde as comunicações com uma ou mais estações espaciais não possam ser asseguradas com a qualidade exigida, desde que tal informação técnica não tenha sido já facultada nos termos do disposto no título II.

    (19)

    A escassez do espetro radioelétrico disponível implica que o número de empresas que podem ser selecionadas e autorizadas seja também necessariamente limitado. Contudo, se o procedimento de seleção levar a concluir que não há escassez de espetro radioelétrico, todos os candidatos elegíveis deverão ser selecionados. A escassez do espetro radioelétrico disponível poderá eventualmente traduzir‑se no facto de qualquer fusão de operadores ou aquisição de um operador que ofereça MSS por outro implicar uma redução significativa da concorrência, razão pela qual tais operações devem ser sujeitas a um escrutínio rigoroso ao abrigo das leis da concorrência.»

    9

    O artigo 1.o dessa decisão tem a seguinte redação:

    «1.   O objeto da presente decisão é facilitar o desenvolvimento de um mercado interno competitivo para os serviços móveis por satélite (MSS) na Comunidade e assegurar a cobertura gradual em todos os Estados‑Membros.

    A presente decisão cria um procedimento comunitário para a seleção comum dos operadores de sistemas móveis por satélite que utilizem o espetro radioelétrico de 2 GHz nos termos da Decisão 2007/98/CE [da Comissão, de 14 de fevereiro de 2007, relativa à utilização harmonizada do espetro de radiofrequências nas bandas de frequências nos 2 GHz para a implementação de sistemas que fornecem serviços móveis via satélite (JO 2007, L 43, p. 32)], compreendendo o espetro radioelétrico de 1980 MHz a 2010 MHz no caso das comunicações Terra‑espaço e de 2170 MHz a 2200 MHz no caso das comunicações espaço‑Terra. Estabelece igualmente normas para a autorização coordenada pelos Estados‑Membros dos operadores selecionados para utilizar o espetro radioelétrico consignado no âmbito daquelas bandas de frequências para a oferta de sistemas móveis por satélite.

    2.   Os operadores de sistemas móveis por satélite são selecionados através de um procedimento comunitário, nos termos do disposto no título II.

    3.   Os operadores de sistemas móveis por satélite selecionados são autorizados pelos Estados‑Membros, nos termos do disposto no título III.

    […]»

    10

    O artigo 2.o, n.o 2, da referida decisão dispõe:

    «[…] Por conseguinte, entende‑se por:

    a)

    “Sistemas móveis por satélite”, as redes de comunicações eletrónicas e os recursos conexos capazes de oferecer serviços de radiocomunicações entre uma estação terrestre móvel e uma ou mais estações espaciais, ou entre estações terrestres móveis por meio de uma ou mais estações espaciais, ou entre uma estação terrestre móvel e um ou mais [CTC] utilizados em locais fixos. Tal sistema deve incluir, no mínimo, uma estação espacial;

    B)

    “[CTC]” dos sistemas móveis por satélite, as estações terrestres utilizadas em locais fixos para melhorar a disponibilidade dos MSS em áreas geográficas situadas na zona de cobertura (footprint) do ou dos respetivos satélites e onde não seja possível assegurar as comunicações com uma ou várias estações espaciais com a qualidade requerida.»

    11

    O título II da Decisão MSS, com a epígrafe «Procedimento de seleção», inclui, nomeadamente, os artigos 3.o e 4.o dessa decisão. O artigo 3.o, n.o 1, da referida decisão prevê:

    «É organizado pela Comissão um procedimento de seleção comparativo para a seleção dos operadores de sistemas móveis por satélite […]»

    12

    O artigo 4.o, n.o 1, da mesma decisão dispõe:

    «Aplicam‑se os seguintes critérios de admissibilidade:

    […]

    b)

    As candidaturas devem identificar a quantidade de espetro radioelétrico solicitada, que não deverá exceder 15 MHz tanto no caso das comunicações Terra‑espaço como no caso das comunicações espaço‑Terra para cada candidato e incluir declarações e provas relativas ao espetro radioelétrico solicitado, ao cumprimento das etapas exigidas e aos critérios de seleção;

    c)

    As candidaturas devem incluir um compromisso assinado pelo requerente, segundo o qual:

    […]

    ii)

    o MSS estará disponível em todos os Estados‑Membros a, pelo menos, 50 % da população e em, pelo menos, 60 % do território de cada um, em prazo a definir pelo requerente que não deverá exceder sete anos a contar da data de publicação da decisão aprovada pela Comissão [relativa à seleção dos candidatos.]»

    13

    O título III da Decisão MSS, com a epígrafe «Autorização», inclui os artigos 7.o e 8.o dessa decisão. Nos termos do artigo 7.o desta última:

    «1.   Os Estados‑Membros asseguram que os candidatos selecionados disponham, de acordo com o calendário e a área de serviço a que se vincularam, nos termos do disposto na alínea c) do n.o 1 do artigo 4.o e da legislação nacional e comunitária, do direito de utilizar as radiofrequências específicas identificadas na decisão da Comissão [relativa à seleção dos candidatos] e do direito de explorarem um sistema móvel por satélite. Os Estados‑Membros informam os candidatos selecionados desses direitos.

    2.   Os direitos previstos no n.o 1 ficam sujeitos às seguintes condições comuns:

    […]

    c)

    Os candidatos selecionados devem cumprir os compromissos assumidos nos respetivos processos de candidatura e no decurso do procedimento de seleção comparativo, independentemente de o total combinado do espetro radioelétrico solicitado exceder a quantidade disponível;

    […]»

    14

    O artigo 8.o da referida decisão prevê:

    «1.   Os Estados‑Membros asseguram, nos termos do direito comunitário e das respetivas legislações nacionais, que as respetivas autoridades competentes concedam aos candidatos selecionados ao abrigo do título II e autorizados a utilizar o espetro ao abrigo do artigo 7.o as autorizações necessárias para a oferta de [CTC] de sistemas móveis por satélite no seu território.

    […]

    3.   As autorizações nacionais emitidas para a exploração de [CTC] de sistemas móveis por satélite na banda de frequência de 2 GHz ficam sujeitas às seguintes condições comuns:

    a)

    Os operadores devem utilizar o espetro radioelétrico atribuído para o fornecimento de [CTC] de sistemas móveis por satélite;

    b)

    Os [CTC] devem ser parte integrante de um sistema de comunicações móveis por satélite e ser controlados pelo mecanismo de gestão dos recursos e da rede de comunicações por satélite, utilizar o mesmo sentido de transmissão e as mesmas partes das bandas de frequências que os correspondentes componentes de satélite, e não implicar um aumento das necessidades de espetro do respetivo sistema de comunicações móveis por satélite;

    c)

    A exploração independente dos [CTC] em caso de falha do componente satélite do respetivo sistema de comunicações móveis por satélite não deve exceder 18 meses;

    d)

    Os direitos de utilização e as autorizações são concedidos por um período que não pode exceder a data de caducidade da autorização do sistema móvel por satélite que lhes está associado.»

    Decisão de Seleção

    15

    Nos termos do artigo 2.o da Decisão 2009/449/CE da Comissão, de 13 de maio de 2009, relativa à seleção dos operadores de sistemas pan‑europeus que permitem a oferta de serviços de comunicações móveis por satélite (MSS) (JO 2009, L 149, p. 65; a seguir «Decisão de Seleção»):

    «Como resultado da primeira fase de seleção do procedimento de seleção comparativo previsto no título II da Decisão [MSS], as empresas Inmarsat Ventures Limited e Solaris Mobile Limited são candidatos elegíveis.

    Como, no total, o espetro radioelétrico requerido pelos candidatos elegíveis selecionados em resultado da primeira fase de seleção do procedimento de seleção comparativo previsto no título II da Decisão [MSS] não excede o espetro radioelétrico disponível, identificado no n.o 1 do artigo 1.o da Decisão [MSS], a Inmarsat Ventures Limited e a Solaris Mobile Limited são selecionadas.»

    16

    O artigo 3.o dessa decisão tem a seguinte redação:

    «As frequências que cada um dos candidatos selecionados é autorizado a utilizar em cada Estado‑Membro de acordo com o título III da Decisão [MSS] são as seguintes:

    a)

    Inmarsat Ventures Limited: de 1980 a 1995 MHz para as comunicações Terra‑espaço e de 2170 a 2185 MHz para as comunicações espaço‑Terra;

    […]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    17

    Na sequência do procedimento de seleção previsto no título II da Decisão MSS, a Inmarsat foi selecionada, ao abrigo do artigo 2.o, segundo parágrafo, da Decisão de Seleção, como um dos operadores de sistemas móveis por satélite.

    18

    Essa empresa desenvolveu um sistema denominado «European Aviation Network» (EAN) cuja finalidade é prestar serviços de conectividade nos aviões durante o voo que sobrevoam a União e que permite assegurar um serviço móvel destinado a aviões por meio de transmissões por satélite, recebidas por um terminal situado acima da fuselagem dos aviões, e de transmissões efetuadas a partir de CTC instalados no território da União, recebidas por um terminal situado abaixo da fuselagem dos aviões.

    19

    Por Decisão de 21 de outubro de 2014, a ARCEP autorizou a Inmarsat a utilizar, no território da França metropolitana, as frequências referidas no artigo 3.o, alínea a), da Decisão de Seleção. Além disso, por Decisão de 22 de fevereiro de 2018 (a seguir «Decisão de 22 de fevereiro de 2018»), essa autoridade atribuiu à Inmarsat autorização para explorar CTC de sistemas móveis por satélite.

    20

    A Eutelsat, concorrente da Inmarsat, interpôs no órgão jurisdicional de reenvio, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), um recurso de anulação da Decisão de 22 de fevereiro de 2018, com fundamento, nomeadamente, numa violação do direito da União.

    21

    A esse respeito, a Eutelsat deduz principalmente três fundamentos. Sustenta, em primeiro lugar, que o sistema EAN previsto pela Inmarsat não constitui um sistema móvel por satélite, uma vez que os seus CTC não são parte integrante do mesmo. Em segundo lugar, os CTC autorizados pela Decisão de 22 de fevereiro de 2018 não apresentam um caráter complementar em relação à componente de satélite dessa rede. Em terceiro lugar, o facto de a Inmarsat não ter prestado serviços móveis por satélite na data prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii), da Decisão MSS obsta à emissão da autorização para explorar CTC de sistemas móveis por satélite.

    22

    A Viasat Inc. e a Viasat UK Ltd (a seguir, conjuntamente, «Viasat») intervieram em apoio do recurso de anulação interposto pela Eutelsat.

    23

    O órgão jurisdicional de reenvio considera, antes de mais, que a resposta a dar ao primeiro fundamento mencionado no n.o 21 do presente acórdão exige, nomeadamente, uma determinação dos critérios jurídicos que permitem identificar uma «estação terrestre móvel», na aceção da Decisão MSS, a fim de verificar se se pode considerar que o sistema EAN preenche esses critérios.

    24

    Em seguida, segundo esse órgão jurisdicional, a resposta ao segundo fundamento referido no n.o 21 do presente acórdão impõe que se clarifiquem a respetiva função dos componentes de satélite e terrestres de um sistema móvel por satélite, ao abrigo do artigo 2.o, n.o 2, da Decisão MSS, e o conceito de «qualidade requerida», na aceção da alínea b) desse artigo 2.o, n.o 2.

    25

    Por último, o referido órgão jurisdicional considera que a resposta ao terceiro fundamento mencionado no n.o 21 do presente acórdão exige que se precise a incidência de um possível incumprimento da data‑limite prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii), da Decisão MSS, pelo operador selecionado, em conformidade com o título II desta, na cobertura do território através de um sistema móvel por satélite e, especialmente, que se determine, no caso de um tal incumprimento, se as autoridades competentes dos Estados‑Membros devem recusar conceder autorizações para explorar CTC ou se podem, pelo menos, recusar conceder essas autorizações.

    26

    Nestas condições, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Que critérios jurídicos permitem identificar uma estação terrestre móvel na aceção da Decisão [MSS]? Deve esta decisão ser interpretada no sentido de que exige que uma estação terrestre móvel que comunica com um [CTC] possa igualmente, sem utilizar material distinto, comunicar com um satélite? Em caso de resposta afirmativa, como deve ser apreciada a unicidade do material?

    2)

    Devem as disposições [do artigo 2.o, n.o 2,] da mesma decisão ser interpretadas no sentido de que um sistema móvel por satélite deve [assentar], a título principal, em componentes de satélite, ou permitem considerar que a função respetiva dos componentes de satélite e terrestres é indiferente, incluindo numa configuração em que o componente de satélite apenas é útil quando as comunicações com os componentes terrestres não podem ser asseguradas? Podem ser instalados [CTC] de modo a cobrir todo o território da [União], pelo motivo de as estações espaciais não permitirem assegurar a qualidade requerida das comunicações em nenhum ponto, na aceção [do n.o 2, alínea b),] do mesmo artigo?

    3)

    Na hipótese de se comprovar que o operador selecionado em conformidade com o título II dessa decisão não respeitou os compromissos de cobertura do território definidos [no artigo 7.o, n.o 2,] no prazo previsto [no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii)], devem as autoridades competentes dos Estados‑Membros recusar conceder autorizações para explorar [CTC]? Em caso de resposta negativa, podem recusar conceder essas autorizações?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à segunda questão

    27

    A fim de responder à segunda questão, que deve ser examinada em primeiro lugar, importa precisar que é pacífico que, no caso em apreço, o sistema desenvolvido pela Inmarsat, embora dotado de um satélite, se baseia, em termos de capacidade dos dados transmitidos, essencialmente nas comunicações com estações terrestres, cobrindo estas últimas a totalidade do território europeu dos Estados‑Membros. Assim, as estações terrestres em causa no processo principal que a Inmarsat foi autorizada a explorar como CTC de sistemas móveis por satélite estendem‑se, com a Decisão de 22 de fevereiro de 2018, a todo o território da França metropolitana.

    28

    Por outro lado, como salientou o advogado‑geral no n.o 67 das suas conclusões, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que o satélite instalado pela Inmarsat no âmbito do seu sistema móvel por satélite só se destina a ser utilizado nas zonas não cobertas pelas estações terrestres exploradas por essa empresa, a saber, nomeadamente, por cima dos mares.

    29

    Por conseguinte, com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Decisão MSS deve ser interpretado no sentido de que um sistema móvel por satélite deve assentar, a título principal, quanto à capacidade dos dados transmitidos, no componente de satélite desse sistema e consoante os CTC de sistemas móveis por satélite possam ser instalados de forma a cobrir a totalidade do território da União, uma vez que o componente de satélite não permite assegurar as comunicações em nenhum local desse território com a «qualidade requerida», na aceção dessa disposição.

    30

    Importa recordar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS, os «sistemas móveis por satélite» são definidos como as redes de comunicações eletrónicas e os recursos conexos capazes de oferecer serviços de radiocomunicações entre uma estação terrestre móvel e uma ou várias estações espaciais, ou entre estações terrestres móveis por meio de uma ou várias estações espaciais, ou entre uma estação terrestre móvel e um ou vários CTC utilizados em locais fixos. Essa disposição precisa igualmente que tais sistemas devem incluir, no mínimo, uma estação espacial.

    31

    Por outro lado, nos termos do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), dessa decisão, os «CTC dos sistemas móveis por satélite» são as estações terrestres utilizadas em locais fixos para melhorar a disponibilidade dos serviços móveis por satélite em áreas geográficas situadas na zona de cobertura do ou dos respetivos satélites e onde não seja possível assegurar as comunicações com uma ou várias estações espaciais com a qualidade requerida.

    32

    Quanto às autorizações necessárias para a oferta de CTC de sistemas móveis por satélite, o artigo 8.o, n.o 1, da Decisão MSS prevê que incumbe às autoridades competentes dos Estados‑Membros conceder essas autorizações, com efeitos nos respetivos territórios nacionais, aos candidatos selecionados ao abrigo do título II desta decisão e autorizados a utilizar o espetro ao abrigo do artigo 7.o da referida decisão.

    33

    Em conformidade com o artigo 8.o, n.o 3, da mesma decisão, as referidas autorizações ficam sujeitas a condições comuns, enumeradas nas alíneas a) a d) dessa disposição. Exige‑se, assim, nomeadamente, que os operadores utilizem o espetro radioelétrico atribuído para o fornecimento de CTC de sistemas móveis por satélite. Além disso, os CTC devem ser parte integrante de um sistema de comunicações móveis por satélite, devem ser controlados pelo mecanismo de gestão dos recursos e da rede de comunicações por satélite, devem utilizar o mesmo sentido de transmissão e as mesmas partes das bandas de frequências que os correspondentes componentes de satélite, e não devem implicar um aumento das necessidades de espetro do respetivo sistema de comunicações móveis por satélite. Além disso, a exploração independente dos CTC em caso de falha do componente de satélite do respetivo sistema de comunicações móveis por satélite não deve exceder 18 meses.

    34

    Antes de mais, resulta das disposições acima recordadas que um «sistema móvel por satélite», na aceção da Decisão MSS, deve obrigatoriamente incluir, no mínimo, uma estação espacial, ao passo que a exploração de CTC é apenas facultativa. Além disso, quando um operador pretenda recorrer a CTC, as condições comuns previstas no artigo 8.o, n.o 3, dessa decisão devem ser cumpridas.

    35

    A esse respeito, importa observar que nem o artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Decisão MSS nem o artigo 8.o, n.os 1 e 3, desta definem, em termos de capacidade dos dados transmitidos, a relação entre o componente de satélite de um sistema móvel por satélite, por um lado, e o componente terrestre desse sistema, por outro.

    36

    Especialmente, não se pode retirar nenhuma conclusão, quanto a este aspeto, da utilização do termo «complementar» na expressão «componentes terrestres complementares», uma vez que, como salientou o advogado‑geral no n.o 77 das suas conclusões, esse termo é omisso quanto à importância relativa dos dois componentes.

    37

    Por conseguinte, não se pode considerar que um sistema móvel por satélite, de que fazem parte tanto um satélite como CTC, deve assentar, a título principal, em termos de capacidade dos dados transmitidos, no componente de satélite desse sistema.

    38

    Em seguida, quanto ao alcance da cobertura dos CTC, importa salientar, antes de mais, que, em conformidade com o artigo 8.o, n.o 1, da Decisão MSS, as autoridades competentes dos Estados‑Membros apenas concedem as autorizações necessárias para a oferta de CTC de sistemas móveis por satélite para os respetivos territórios nacionais.

    39

    Em conformidade com a condição prevista no artigo 8.o, n.o 3, alínea a), dessa decisão, comum a todas as autorizações emitidas pelos Estados‑Membros, o operador deve utilizar o espetro radioelétrico atribuído para o fornecimento de CTC de sistemas móveis por satélite. Por conseguinte, as estações terrestres que um operador pede para explorar como CTC devem corresponder a «CTC dos sistemas móveis por satélite», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da referida decisão.

    40

    Esta última disposição inclui duas exigências principais para que uma estação terrestre possa ser qualificada de «CTC dos sistemas móveis por satélite». Em termos de localização, essa estação terrestre deve ser utilizada num local fixo e abranger uma área geográfica situada na zona de cobertura do ou dos satélites do sistema móvel por satélite em causa. Além disso, de um ponto de vista funcional, deve ser utilizada para melhorar a disponibilidade do serviço móvel por satélite nas áreas onde as comunicações com o componente de satélite desse sistema não podem ser asseguradas com a qualidade requerida.

    41

    Daqui resulta que, desde que se cumpram essas exigências e as outras condições comuns, previstas no artigo 8.o, n.o 3, da Decisão MSS, estejam preenchidas, não se pode deduzir do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), nem de nenhuma outra disposição dessa decisão nenhuma limitação quanto ao número de CTC que podem ser explorados ou à extensão da sua cobertura geográfica.

    42

    No que respeita, neste contexto, ao conceito de «qualidade requerida» que figura no referido artigo 2.o, n.o 2, alínea b), e especificamente referido pelo órgão jurisdicional de reenvio, a Comissão sustenta, nas suas observações escritas, que este deve ser interpretado em relação ao componente de satélite do sistema móvel por satélite em causa. Assim, a «qualidade requerida» deve ser entendida como o nível de capacidade máxima de transmissão de dados que esse componente estaria em condições de fornecer em circunstâncias normais de exploração comercial, em condições ideais de comunicação, num determinado local onde se situa uma estação terrestre.

    43

    Esta interpretação, dado que não encontra fundamento na redação do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Decisão MSS, não pode ser acolhida.

    44

    Pelo contrário, tendo em conta o contexto em que se insere o referido artigo 2.o, n.o 2, alínea b), bem como os objetivos prosseguidos pela Decisão MSS, impõe‑se considerar que a «qualidade requerida», na aceção desta disposição, é determinada, em primeiro lugar, em função do nível de qualidade necessário para oferecer o serviço proposto pelo operador do sistema móvel por satélite em causa.

    45

    Com efeito, em conformidade com o artigo 8.o, n.o 3, alínea b), da Decisão MSS, lido à luz do considerando 18, os CTC são parte integrante do sistema móvel por satélite. A esse respeito, os serviços oferecidos por um tal sistema constituem, como resulta do considerando 5 dessa decisão, uma plataforma inovadora e alternativa para vários tipos pan‑europeus de telecomunicações e de serviços de radiodifusão/multidifusão, como o acesso à Internet/intranet de alta velocidade ou serviços móveis multimédia. Além disso, resulta dos considerandos 1 e 5 da referida decisão que esta visa promover a inovação e os interesses dos consumidores.

    46

    Ora, a prestação de tais serviços, inovadores e de qualidade, requer sempre mais capacidade. Além disso, não se afigura tecnicamente possível nem comercialmente viável para o operador de um sistema móvel por satélite satisfazer pedidos de capacidade e, por conseguinte, de qualidade acrescidas reforçando unicamente o componente de satélite do seu sistema, dado que a quantidade de espetro radioelétrico de que esse operador dispõe é limitada e, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Decisão MSS, não deverá exceder 15 MHz para as comunicações Terra‑espaço e de 15 MHz para as comunicações espaço‑Terra.

    47

    Nestas circunstâncias, a exploração reforçada de estações terrestres, que são, atendendo às suas propriedades técnicas intrínsecas, mais eficientes em termos de capacidade, pode ser mais bem adaptada para responder a essas necessidades e permite, por outro lado, uma utilização mais eficaz das radiofrequências, objetivo sublinhado no considerando 4 da Decisão MSS.

    48

    Há ainda que salientar, a esse respeito, que o princípio da neutralidade tecnológica, que importa ter em conta neste domínio, exige que a interpretação das disposições em causa não restrinja a inovação e o progresso tecnológico.

    49

    De resto, a redação do considerando 18 da Decisão MSS não se opõe a tal interpretação dado que, ao enunciar que os CTC são usados, regra geral, para melhorar a oferta de serviços deste tipo em áreas onde não é possível manter uma linha de vista contínua com o satélite, devido às obstruções causadas por edifícios e pelo terreno na linha do horizonte, se limita a referir um certo tipo de utilização possível de CTC, sem, no entanto, excluir outros.

    50

    Contudo, importa acrescentar que, por força do artigo 1.o, n.o 1, da Decisão MSS, esta tem por objeto facilitar o desenvolvimento de um mercado interno competitivo para os serviços móveis por satélite, objetivo igualmente sublinhado pelos considerandos 5 e 19 dessa decisão. Ora, tendo em conta esse objetivo, o direito de explorar CTC conferido ao operador de um tal sistema móvel por satélite não deve levar a distorções da concorrência no mercado em causa.

    51

    Por conseguinte, incumbe à autoridade nacional competente, a única habilitada a conceder as autorizações necessárias para a oferta de CTC de sistemas móveis por satélite, examinar de que forma a exploração de CTC pedida pode provocar uma distorção de concorrência e acompanhar as referidas autorizações de limitações e obrigações adequadas e necessárias para que a concorrência não seja falseada, ou mesmo, se for caso disso, recusar a autorização.

    52

    Daqui resulta que a autoridade competente de um Estado‑Membro está habilitada a autorizar que CTC de sistemas móveis por satélite sejam explorados de modo que cubram a totalidade do território desse Estado‑Membro, com o fundamento de que, em nenhum local desse território, o componente de satélite do sistema móvel por satélite em causa permite assegurar as comunicações com a «qualidade requerida», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Decisão MSS, entendida como o nível de qualidade necessário para oferecer o serviço proposto pelo operador desse sistema, desde que a concorrência não seja falseada.

    53

    Por último, cabe igualmente a essa autoridade verificar se é cumprida a condição comum prevista no artigo 8.o, n.o 3, alínea c), dessa decisão, segundo a qual qualquer exploração independente dos CTC está limitada no caso de falha do complemento de satélite desse sistema e não deve exceder 18 meses.

    54

    Com efeito, resulta desta disposição, lida em conjugação com o artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Decisão MSS, que, como salientou o advogado‑geral no n.o 72 das suas conclusões, um sistema móvel por satélite deve não só ser dotado de um componente de satélite mas também ser efetivamente utilizado.

    55

    Daqui resulta que o componente de satélite de um sistema móvel por satélite deve funcionar, na prática, conjuntamente com os CTC e que a sua função não se pode limitar, na realidade, a fazer com que, do ponto de vista formal, estejam preenchidas as condições previstas na Decisão MSS.

    56

    Por conseguinte, a autoridade nacional competente é obrigada a verificar se o componente de satélite do sistema móvel por satélite em causa apresenta uma utilidade real e concreta, no sentido de que esse componente deve ser necessário para o funcionamento do referido sistema, sem prejuízo, como foi precisado no n.o 33 do presente acórdão, do funcionamento autónomo dos CTC em caso de falha do componente de satélite, que não deve exceder 18 meses.

    57

    Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Decisão MSS, lido em conjugação com o artigo 8.o, n.os 1 e 3, dessa decisão, deve ser interpretado no sentido de que um sistema móvel por satélite não deve assentar a título principal, em termos de capacidade dos dados transmitidos, no componente de satélite desse sistema e de que CTC de sistemas móveis por satélite podem ser instalados de forma a cobrir a totalidade do território da União, pelo motivo de que esse componente de satélite não permite assegurar as comunicações em nenhum local desse território com a «qualidade requerida», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da referida decisão, entendida como o nível de qualidade necessário para oferecer o serviço proposto pelo operador desse sistema, desde que a concorrência não seja falseada e que esse componente de satélite apresente uma utilidade real e concreta, no sentido de que tal componente deve ser necessário para o funcionamento do sistema móvel por satélite, sob reserva de um funcionamento autónomo dos CTC em caso de falha do componente de satélite, que não deve exceder 18 meses.

    Quanto à primeira questão

    58

    Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o conceito de «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS, deve ser interpretado no sentido de que é exigido que, para ser abrangida por este conceito, tal estação possa estar em condições de comunicar, sem utilizar material distinto, tanto com um CTC como com um satélite.

    59

    A título preliminar, importa recordar que, no caso em apreço, no âmbito do sistema desenvolvido pela Inmarsat, os aviões equipados desse sistema são dotados de um terminal de receção situado acima da fuselagem e de um terminal de receção situado abaixo deste. Enquanto o primeiro terminal recebe comunicações por satélite, o segundo recebe as que são efetuadas a partir dos CTC. Além disso, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que os dois terminais estão ligados por um gestor de comunicação.

    60

    A este respeito, a Eutelsat e a Viasat alegam, em substância, por um lado, que o terminal de receção situado abaixo da fuselagem não pode ser considerado uma «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS, uma vez que esse terminal de receção não está em condições de comunicar com um satélite. Por outro lado, segundo essas partes, não é possível considerar os dois terminais, bem como o gestor de comunicação, no seu conjunto, como constituindo uma tal estação.

    61

    Importa salientar que, ao passo que a Decisão MSS não fornece precisões quanto ao conteúdo do conceito de «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), dessa decisão, o Regulamento das Radiocomunicações fornece uma definição desse conceito.

    62

    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os diplomas do direito da União devem ser interpretados, tanto quanto possível, à luz do direito internacional (Acórdão de 4 de setembro de 2014, Zeman, C‑543/12, EU:C:2014:2143, n.o 58 e jurisprudência referida). Isto aplica‑se especialmente quando esse texto recorre a conceitos específicos utilizados num acordo internacional celebrado sob a égide de uma organização internacional, como a UIT, da qual todos os Estados‑Membros da União são membros e da qual a própria União é um «membro de Sector».

    63

    Por conseguinte, para efeitos da interpretação do conceito de «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS, importa ter em conta a definição fornecida pelo Regulamento das Radiocomunicações.

    64

    Nos termos do número 1.68 do artigo 1.o do Regulamento das Radiocomunicações, uma «estação terrena móvel» consiste numa estação terrestre do serviço móvel por satélite destinada a ser utilizada quando em movimento ou durante paragens em pontos não determinados. A esse respeito, as expressões «estação», «estação terrena» e «serviço móvel por satélite» são elas próprias definidas, respetivamente, nos números 1.61, 1.63 e 1.25 desse artigo 1.o

    65

    Decorre de todas essas disposições que uma estação terrestre móvel, na aceção do Regulamento das Radiocomunicações, se caracteriza por quatro elementos distintos, em termos de estrutura, localização, mobilidade e função.

    66

    Em primeiro lugar, no que respeita à sua estrutura, tal estação consiste num ou vários emissores ou recetores ou num conjunto de emissores e recetores, incluindo os aparelhos acessórios.

    67

    Em segundo lugar, quanto à sua localização, uma estação terrestre móvel encontra‑se quer na superfície da Terra quer na parte principal da atmosfera.

    68

    Em terceiro lugar, no que diz respeito ao aspeto relativo à sua mobilidade, essa estação destina‑se a ser utilizada quando em movimento ou durante paragens em pontos não determinados.

    69

    Em quarto lugar, no tocante ao aspeto funcional de uma estação terrestre móvel, importa salientar que, no âmbito da oferta de certos tipos de serviços de radiocomunicações, esta se destina a permitir a comunicação entre estações espaciais, ou a comunicar com uma ou várias estações espaciais, ou com outras estações da mesma natureza, através de uma ou várias estações espaciais.

    70

    Ora, no que respeita a este aspeto funcional e como salientou o advogado‑geral no n.o 46 das suas conclusões, diversamente do Regulamento das Radiocomunicações, o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS não engloba, no que respeita aos serviços de radiocomunicações a que se refere essa disposição, as comunicações entre estações espaciais, ao passo que inclui as comunicações entre uma estação terrestre móvel e um ou vários CTC. Além disso, a referida disposição prevê que os sistemas móveis por satélite incluem, no mínimo, uma estação espacial.

    71

    Por conseguinte, há que considerar que uma «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS, é uma estação, a saber, um ou vários emissores ou recetores ou um conjunto de emissores e recetores, incluindo os aparelhos acessórios, situada quer na superfície da Terra quer na parte principal da atmosfera, destinada a ser utilizada quando em movimento ou durante paragens em pontos não determinados, que deve ter a capacidade de comunicar com uma ou várias estações espaciais, ou com outras estações da mesma natureza, por meio de uma ou várias estações espaciais, e que pode ter a capacidade de comunicar com um ou vários CTC.

    72

    No que diz respeito a uma configuração como a que está em causa no processo principal, importa observar que um conjunto composto de dois terminais de receção distintos ligados por um gestor de comunicação, o primeiro situado acima da fuselagem de um avião e que comunica com uma estação espacial, o segundo situado abaixo dessa fuselagem e que comunica com CTC, cumpre essas exigências.

    73

    Em contrapartida, como salientou o advogado‑geral, em substância, no n.o 57 das suas conclusões, não é pertinente, a este respeito, a circunstância de os elementos individuais não formarem um todo fisicamente indissociável.

    74

    Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o conceito de «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão MSS, deve ser interpretado no sentido de que não é exigido que, para ser abrangida por esse conceito, tal estação possa estar em condições de comunicar, sem utilizar material distinto, tanto com um CTC como com um satélite.

    Quanto à terceira questão

    75

    Com a sua terceira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 8.o, n.o 1, da Decisão MSS, lido em conjugação com o artigo 7.o, n.o 1, da mesma decisão, deve ser interpretado no sentido de que, no caso de se demonstrar que um operador selecionado em conformidade com o título II da referida decisão e autorizado a utilizar o espetro radioelétrico ao abrigo do artigo 7.o da mesma decisão não forneceu serviços móveis por satélite através de um sistema móvel por satélite até à data‑limite prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii), da Decisão MSS, as autoridades competentes dos Estados‑Membros devem ou, pelo menos, podem recusar conceder a esse operador as autorizações necessárias ao fornecimento de CTC de sistemas móveis por satélite com o fundamento de que este não respeitou o compromisso assumido na sua candidatura.

    76

    Na medida em que, no seu Acórdão de 5 de março de 2020, Viasat UK e Viasat (C‑100/19, EU:C:2020:174), o Tribunal de Justiça já foi chamado a examinar uma questão idêntica, a resposta dada pelo Tribunal de Justiça a essa questão, como figura na parte decisória desse acórdão, é plenamente transponível para a presente questão prejudicial.

    77

    Nessas condições, há que responder à terceira questão prejudicial que o artigo 8.o, n.o 1, da Decisão MSS, lido em conjugação com o artigo 7.o, n.o 1, da mesma decisão, deve ser interpretado no sentido de que, no caso de se demonstrar que um operador selecionado em conformidade com o título II da referida decisão e autorizado a utilizar o espetro radioelétrico ao abrigo do artigo 7.o desta mesma decisão não forneceu serviços móveis por satélite através de um sistema móvel por satélite até à data‑limite prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii), da Decisão MSS, as autoridades competentes dos Estados‑Membros não estão habilitadas a recusar conceder a esse operador as autorizações necessárias ao fornecimento de CTC de sistemas móveis por satélite com o fundamento de que este não respeitou o compromisso assumido na sua candidatura.

    Quanto às despesas

    78

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) e b), da Decisão n.o 626/2008/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de junho de 2008, relativa à seleção e autorização de sistemas que oferecem serviços móveis por satélite (MSS), lido em conjugação com o artigo 8.o, n.os 1 e 3, dessa decisão, deve ser interpretado no sentido de que um sistema móvel por satélite não deve assentar a título principal, em termos de capacidade dos dados transmitidos, no componente de satélite desse sistema e de que componentes terrestres complementares de sistemas móveis por satélite podem ser instalados de forma a cobrir a totalidade do território da União Europeia, pelo motivo de que esse componente de satélite não permite assegurar as comunicações em nenhum local desse território com a «qualidade requerida», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da referida decisão, entendida como o nível de qualidade necessário para oferecer o serviço proposto pelo operador desse sistema, desde que a concorrência não seja falseada e que esse componente de satélite apresente uma utilidade real e concreta, no sentido de que tal componente deve ser necessário para o funcionamento do sistema móvel por satélite, sob reserva de um funcionamento autónomo dos componentes terrestres complementares em caso de falha do componente de satélite, que não deve exceder 18 meses.

     

    2)

    O conceito de «estação terrestre móvel», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Decisão n.o 626/2008, deve ser interpretado no sentido de que não é exigido que, para ser abrangida por esse conceito, tal estação possa estar em condições de comunicar, sem utilizar material distinto, tanto com um componente terrestre complementar como com um satélite.

     

    3)

    O artigo 8.o, n.o 1, da Decisão n.o 626/2008, lido em conjugação com o artigo 7.o, n.o 1, da mesma decisão, deve ser interpretado no sentido de que, no caso de se demonstrar que um operador selecionado em conformidade com o título II da referida decisão e autorizado a utilizar o espetro radioelétrico ao abrigo do artigo 7.o desta mesma decisão não forneceu serviços móveis por satélite através de um sistema móvel por satélite até à data‑limite prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), ii), da Decisão n.o 626/2008, as autoridades competentes dos Estados‑Membros não estão habilitadas a recusar conceder a esse operador as autorizações necessárias ao fornecimento de componentes terrestres complementares de sistemas móveis por satélite com o fundamento de que este não respeitou o compromisso assumido na sua candidatura.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

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