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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62019CC0544

    Conclusões do advogado-geral Richard de la Tour apresentadas em 18 de novembro de 2020.
    «ЕCOTEX BULGARIA» EOOD contra Teritorialna direktsia na Natsionalnata agentsia za prihodite.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Administrativen sad - Blagoevgrad.
    Reenvio prejudicial — Artigo 63.o TFUE — Livre circulação de capitais — Diretiva (UE) 2015/849 — Âmbito de aplicação — Regulamentação nacional que exige a realização de pagamentos superiores a um certo montante exclusivamente por transferência ou depósito numa conta de pagamento — Artigo 65.o TFUE — Justificação — Combate à fraude e à evasão fiscais — Proporcionalidade — Sanções administrativas de caráter penal — Artigo 49.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Princípios da legalidade e da proporcionalidade dos delitos e das penas.
    Processo C-544/19.

    Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2020:931

     CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    JEAN RICHARD DE LA TOUR

    apresentadas em 18 de novembro de 2020 ( 1 )

    Processo C‑544/19

    «ЕCOTEX BULGARIA» EOOD

    contra

    Teritorialna direktsia na Natsionalna agentsia za prihodite — Sofia,

    sendo interveniente

    Prokuror ot Okrazhna prokuratura — Blagoevgrad

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Administrativen sad Blagoevgrad (Tribunal Administrativo de Blagoevgrad, Bulgária)]

    «Reenvio prejudicial — Artigo 63.o TFUE — Liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos — Diretiva (UE) 2015/849 — Estado não membro da Zona Euro — Legislação nacional que proíbe a realização, no território nacional, de um pagamento em numerário quando este seja de montante igual ou superior ao limiar estabelecido e que exige o recurso a uma transferência ou a um depósito numa conta de pagamento — Distribuição de dividendos de uma empresa a um acionista ou a um sócio sob a forma de um pagamento em numerário que ultrapassa o limiar estabelecido pela legislação nacional — Aplicação de uma sanção administrativa de caráter penal — Compatibilidade da legislação nacional — Combate à fraude e à evasão e elisão fiscais — Proporcionalidade»

    I. Introdução

    1.

    Em que medida é conforme com o direito da União uma legislação nacional que proíbe que qualquer pessoa singular ou coletiva realize, no território nacional, um pagamento em numerário quando este seja de montante igual ou superior ao limiar fixado e que exige que, para este efeito, se recorra a outros meios de pagamento sob pena de ser aplicada uma sanção?

    2.

    Esta é, em substância, a questão suscitada pelo Administrativen sad Blagoevgrad (Tribunal Administrativo de Blagoevgrad, Bulgária) no presente processo.

    3.

    Esta questão é atual, pois o Tribunal de Justiça, reunido em formação de Grande Secção, deverá pronunciar‑se muito brevemente sobre as condições e os limites dentro dos quais a União Europeia e os Estados-Membros da Zona Euro podem, no exercício das suas respetivas competências, adotar regulamentações que prevejam limitações à utilização de numerário, isto é, de notas e de moedas emitidas pelos bancos centrais, como meio de pagamento ( 2 ).

    4.

    Todavia, o presente processo distingue‑se dos processos apensos Hessischer Rundfunk (C‑422/19 e C‑423/19) por a legislação nacional em causa no processo principal dizer respeito à República da Bulgária, que não é um Estado-Membro da Zona Euro. A República da Bulgária tem o estatuto de «Estado‑Membro que beneficia de uma derrogação», nos termos do artigo 139.o, n.o 2, TFUE e não está vinculada pelas disposições do direito da União que regulam a emissão de moeda e a utilização da moeda única, designadamente o estatuto de curso legal das notas e moedas expressas em euros. No entanto, a República da Bulgária integra o mercado interno da União e, como tal, tem de respeitar as liberdades de circulação que lhe são inerentes.

    5.

    A questão submetida ao Tribunal de Justiça inscreve‑se igualmente num contexto que se segue ao Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 12 de junho de 2018, sobre as restrições aos pagamentos em numerário ( 3 ), bem como aos pareceres elaborados, a este respeito, pelo Banco Central Europeu (BCE) ( 4 ) a pedido dos Ministérios das Finanças do Reino da Bélgica, da República da Bulgária e do Reino dos Países Baixos ( 5 ).

    6.

    No presente processo, o Tribunal de Justiça é, por um lado, convidado a clarificar se uma legislação, como a que está em causa no processo principal, é abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva (UE) 2015/849 ( 6 ) ou se deve ser examinada à luz das disposições previstas no artigo 63.o TFUE, que garante a liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos.

    7.

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça é convidado a pronunciar‑se sobre a conformidade do regime sancionatório estabelecido pela referida legislação à luz, nomeadamente, do princípio da proporcionalidade das penas e do direito à ação consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

    8.

    Nas presentes conclusões, irei expor as razões pelas quais considero que uma legislação como a que está em causa no processo principal não é abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2015/849. Basearei a minha apreciação não só nos objetivos que o legislador da União visa prosseguir no quadro desta diretiva mas também na economia e na redação da mesma. Assim, proporei ao Tribunal de Justiça que examine a conformidade de tal legislação à luz da liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos consagrada no artigo 63.o TFUE.

    9.

    A este respeito, explicarei que a legislação nacional em causa constitui, em si mesma, uma restrição a esta liberdade que pode ser justificada pelas necessidades impostas pelo combate à fraude e à evasão e elisão fiscais. Explicarei, todavia, que tal legislação apenas poderá atingir verdadeiramente este objetivo se for acompanhada de medidas que tenham em conta a inclusão bancária das pessoas mais vulneráveis, bem como de medidas derrogatórias a favor das pessoas que, por razões legítimas, não podem recorrer aos meios de pagamento exigidos pelo legislador nacional. Apresentarei também as razões pelas quais o regime sancionatório estabelecido no âmbito desta legislação é suscetível de constituir uma medida contrária ao princípio da proporcionalidade enunciado no artigo 49.o, n.o 3, da Carta.

    II. Quadro jurídico

    A. Diretiva 2015/849

    10.

    Nos termos do seu artigo 1.o, n.o 1, a Diretiva 2015/849 visa prevenir a utilização do sistema financeiro da União para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo.

    11.

    Nos termos do seu artigo 2.o, n.o 1, ponto 3, alínea e), esta diretiva é aplicável a «outras pessoas que comercializam bens, na medida em que sejam efetuados ou recebidos pagamentos em numerário de montante igual ou superior a 10000 [euros], independentemente de a transação ser efetuada através de uma operação única ou de várias operações que aparentam uma ligação entre si».

    12.

    O artigo 4.o, n.o 1, da referida diretiva prevê:

    «Os Estados‑Membros asseguram, de acordo com a abordagem baseada no risco, que o âmbito da presente diretiva é alargado, no todo ou em parte, a profissões e categorias de empresas distintas das entidades obrigadas a que se refere o artigo 2.o, n.o 1, que exerçam atividades particularmente suscetíveis de ser[em] utilizadas para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo».

    13.

    O artigo 5.o da Diretiva 2015/849 enuncia:

    «Os Estados‑Membros podem aprovar ou manter em vigor, nas matérias reguladas pela presente diretiva, disposições mais rigorosas para prevenir o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, dentro dos limites do direito da União».

    B. Direito búlgaro

    1.   ZOPB

    14.

    Nos termos do artigo 1.o da zakon za ogranichavane na plashtaniyata v broy (Lei Relativa às Limitações aos Pagamentos em Numerário) ( 7 ), esta lei regula as restrições aos pagamentos em numerário no território búlgaro ( 8 ).

    15.

    Sob reserva das exceções expressamente enumeradas no artigo 2.o da ZOPB, o artigo 3.o dispõe:

    «(1)   Os pagamentos no território do país são efetuados exclusivamente através de transferência ou de depósito numa conta de pagamento sempre que forem:

    1.

    […] de montante igual ou superior a 10000 [leva búlgaros] BGN [5113 euros];

    2.

    […] de montante inferior a 10000 BGN [5113 euros], correspondendo este montante a uma fração de uma prestação pecuniária contratual cujo montante seja igual ou superior a 10000 BGN [5113 euros].

    (2)   […] O n.o 1 aplica‑se igualmente aos casos de pagamentos efetuados em moeda estrangeira cujos montantes convertidos em BGN sejam iguais ou superiores a 10000 BGN [5113 euros]. A conversão em BGN é efetuada com base na taxa de câmbio do Balgarska narodna banka [Banco Nacional da Bulgária] em vigor no dia do pagamento».

    16.

    O artigo 5.o da ZOPB enuncia:

    «(1)   Qualquer pessoa que pratique ou consinta na prática de uma infração ao artigo 3.o fica sujeita a uma coima correspondente a 25 % do montante total do pagamento realizado, no caso das pessoas singulares, ou a uma sanção pecuniária correspondente a 50 % do montante total do pagamento realizado, no caso das pessoas coletivas.

    (2)   Em caso de reincidência da infração referida no n.o 1, o montante da coima corresponde a 50 % do montante do pagamento realizado e o montante da sanção pecuniária corresponderá a 100 % do montante do pagamento realizado.»

    17.

    O artigo 6.o da ZOPB prevê:

    «(1)   Os autos das infrações abrangidas pela presente lei são lavrados pelas autoridades da Natsionalna agentsia za prihodite [Agência Nacional das Receitas Públicas, Bulgária]. As decisões que aplicam sanções administrativas são adotadas pelo diretor executivo da Agência Nacional das Receitas Públicas ou pelos funcionários por si mandatados.

    (2)   A zakon za administrativnite narushenia i nakazania [Lei Relativa às Infrações e às Sanções Administrativas, Bulgária ( 9 )] determina o estabelecimento das decisões que aplicam sanções administrativas, a sua adoção, os meios de recurso contra as mesmas e sua execução».

    2.   ZANN

    18.

    Nos termos do artigo 27.o da ZANN:

    «(1)   A sanção administrativa é determinada de acordo com as disposições da presente lei dentro dos limites da sanção prevista em caso de prática da infração.

    (2)   Na determinação da sanção deve ser tida em conta a gravidade da infração, os motivos da sua prática e outras circunstâncias atenuantes e agravantes, bem como a situação patrimonial do infrator.

    (3)   As circunstâncias atenuantes implicam a aplicação de uma sanção mais leve e as circunstâncias agravantes implicam uma sanção mais pesada.

    […]

    (5)   Não é […] permitido fixar a sanção abaixo do montante mínimo previsto para as sanções de coima e de privação temporária do direito de exercer uma determinada profissão ou atividade».

    19.

    O artigo 28.o, alínea a), da ZANN prevê que, em caso de infrações administrativas de gravidade diminuta, a autoridade investida do poder sancionatório se pode abster de aplicar sanções, embora deva advertir o infrator, oralmente ou por escrito, de que, em caso de repetição da infração, lhe será aplicada uma sanção administrativa.

    20.

    Nos termos do artigo 63.o, n.o 1, da ZANN, o Rayonen sad (Tribunal Regional Bulgária), em formação de juiz singular, aprecia o mérito da causa e decide mediante sentença através da qual pode confirmar, alterar ou revogar a decisão que aplicou a sanção administrativa ou o auto eletrónico. A decisão pode ser objeto de recurso a interpor no Administrativen sad (Tribunal Administrativo, Bulgária) com base nos fundamentos previstos no nakazatelno‑protsesualen kodeks (Código de Processo Penal búlgaro) e de acordo com as modalidades previstas no capítulo 12 do administrativnoprotsesualen kodeks (Código de Processo Administrativo búlgaro).

    III. Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    21.

    A «ECOTEX BULGARIA» EOOD ( 10 ) é uma sociedade unipessoal de direito búlgaro, cujo capital é detido por KS, cidadão grego. Em 14 de março de 2018, foi decidido, durante a assembleia geral da Ecotex, que KS receberia, sob a forma de dividendos, o montante de 100000 BGN (51130 euros) pago em numerário através de autorizações de saídas de caixa.

    A. Procedimento administrativo contra a Ecotex

    22.

    Na sequência de uma inspeção solicitada em 8 de dezembro de 2017 pela autoridade competente em matéria de receitas da Teritorialna direktsia na Natsionalna agentsia za prihodite — Sofia (Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas de Sófia, Bulgária), foi determinado que as transações financeiras realizadas com os clientes da sociedade, provenientes principalmente da Grécia e de Chipre, tinham sido efetuadas por via bancária. Foi também determinado que, ao abrigo da Decisão de 14 de março de 2018, e durante o período compreendido entre 14 de março de 2018 e 22 de março de 2018, tinha sido pago em numerário o montante de 95000 BGN (cerca de 48573,50 euros), a KS, a título de nove autorizações de saída de caixa relativas, cada uma, ao pagamento em numerário de 10000 BGN (5113 euros), bem como de uma autorização de saída de caixa no montante de 5000 BGN (2556,50 euros). A Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas de Sófia, Divisão de Blagoevgrad, notificou, em 5 de junho de 2018, a abertura de um procedimento penal de natureza administrativa e em 26 de junho de 2018 adotou um auto que declara a existência de uma infração às disposições previstas na ZOPB.

    23.

    Em 10 de julho de 2018, a Ecotex contestou este auto alegando que se podia considerar que a infração revestia uma gravidade diminuta na aceção do artigo 28.o da ZANN, uma vez que o pagamento da quantia de 10000 BGN (5113 euros) efetuado em 14 de março de 2018 excedia em apenas 0,01 BGN (cerca de 0,005 euros) a limitação relativa aos pagamentos em numerário prevista na ZOPB.

    24.

    Em 3 de setembro de 2018, o vice‑diretor da Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas de Sófia aplicou à Ecotex, ao abrigo do artigo 5.o, n.o 1, da ZOPB, uma sanção pecuniária para cada uma das infrações constatadas. Resulta da decisão de reenvio que cada um dos pagamentos no montante de 10000 BGN (5113 euros) foi qualificado de «infração» e que, em consequência, foram aplicadas nove sanções administrativas. De acordo com as disposições nacionais, cada sanção corresponde a 5000 BGN (2556,50 euros), isto é, a 50 % do montante pago em numerário.

    25.

    A Ecotex requereu a anulação desta decisão de 3 de setembro de 2018 do vice‑diretor da Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas de Sófia no Rayonen sad Petrich (Tribunal Regional de Petritch, Bulgária), que confirmou a referida decisão. A Ecotex interpôs recurso de cassação no órgão jurisdicional de reenvio.

    B. Recurso interposto no órgão jurisdicional de reenvio

    26.

    Perante o órgão jurisdicional de reenvio, a Ecotex voltou a sublinhar que, atendendo à importância reduzida da infração, a sanção de 50 % do montante total do pagamento realizado em numerário era desproporcionada. A Ecotex sustentou igualmente que o direito aos dividendos da sociedade não constitui uma transação ou um contrato e não está, por conseguinte, abrangido pelo conceito de «pagamento» na aceção do artigo 3.o, n.o 1, ponto 1, da ZOPB.

    27.

    A Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas de Sófia observou, por seu lado, que se deve entender que o conceito de «pagamento» previsto no artigo 3.o, n.o 1, ponto 1, da ZOPB designa, sem exceções, qualquer pagamento ou qualquer operação financeira, independentemente da natureza destes últimos.

    28.

    Por seu turno, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha, a título preliminar, que a ZOPB transpôs para o direito interno a Diretiva 2005/60/CE ( 11 ), que foi revogada a partir de 26 de junho de 2017 pela Diretiva 2015/849 ( 12 ). Considera, por conseguinte, que o artigo 3.o, n.o 1, ponto 1, da ZOPB deve ser interpretado à luz do artigo 63.o TFUE e das disposições pertinentes da Diretiva 2015/849.

    29.

    Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio recorda que o conceito de «movimento de capitais» também inclui o recebimento de dividendos de ações e de lucros de sociedades comerciais. Assim, questiona‑se sobre se o artigo 63.o TFUE, que proíbe nomeadamente as medidas que são suscetíveis dissuadir os não residentes de investirem num Estado‑Membro ou de manterem tais investimentos, se opõe a uma disposição como a prevista no artigo 3.o, n.o 1, ponto 1, da ZOPB, que impõe uma limitação aos pagamentos em numerário.

    30.

    Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se se a limitação dos pagamentos em numerário, prevista no artigo 3.o, n.o 1, ponto 1, da ZOPB, é abrangida pelo âmbito de aplicação material da Diretiva 2015/849 e, em caso afirmativo, se os Estados‑Membros podem fixar livremente um limiar de pagamentos em numerário que seja inferior a 10000 euros.

    31.

    Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se sobre se as modalidades relativas, por um lado, à determinação do montante da coima prevista em caso de violação da limitação dos pagamentos em numerário e, por outro, à fiscalização jurisdicional exercida sobre uma decisão de condenação violam o princípio da proporcionalidade das penas e o direito à ação consagrados na Carta.

    C. Questões prejudiciais

    32.

    Atendendo às considerações acima expostas, o Administrativen sad Blagoevgrad (Tribunal Administrativo de Blagoevgrad) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Deve o artigo 63.o TFUE ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual os pagamentos no território nacional, de montante igual ou superior a 10000 [BGN 5113 euros], só podem ser efetuados por transferência ou depósito bancário e que limita os pagamentos em numerário de dividendos resultantes de lucros não distribuídos num montante igual ou superior a 10000 BGN [5113 euros]? Caso o artigo 63.o TFUE não se oponha a esta disposição: esta limitação é justificada pelos objetivos da Diretiva […] 2015/849?

    2)

    Deve o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva […] 2015/849 ser interpretado, tendo em conta o considerando 6, bem como os seus artigos 4.o e 5.o, no sentido de que não se opõe a uma disposição geral nacional, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual os pagamentos no território nacional, de montante igual ou superior a 10000 BGN [5113 euros], só podem ser efetuados por transferência ou depósito bancário, sem ter em consideração a pessoa e o motivo para o pagamento em numerário e que abrange, em simultâneo, todos os pagamentos em numerário entre pessoas singulares e coletivas em causa?

    a)

    Em caso de resposta afirmativa a esta questão, o artigo 2.o, n.o 1, ponto 3, alínea e), da Diretiva […] 2015/849, tendo em conta o considerando 6, bem como os seus artigos 4.o e 5.o, permite que os Estados‑Membros prevejam novas limitações gerais adicionais para os pagamentos em numerário no território nacional, numa disposição nacional como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual os pagamentos em numerário no território nacional, de montante igual ou superior a 10000 BGN [5113 euros], só podem ser efetuados por transferência ou depósito bancário se o motivo para o pagamento em numerário for um “lucros não distribuídos” (dividendos)?

    b)

    Em caso de resposta afirmativa a esta questão, o artigo 2.o, n.o 1, ponto 3, alínea e), da Diretiva […] 2015/849, tendo em conta o considerando 6 e o seu artigo 5.o, permite que os Estados‑Membros prevejam limitações aos pagamentos em numerário numa disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual os pagamentos no território nacional, de montante igual ou superior a 10000 BGN [5113 euros], só podem ser efetuados por transferência ou depósito bancário se o limiar dos referidos pagamentos for inferior a 10000 euros?

    3)

    a)

    Devem o artigo 58.o, n.o 1, e o artigo 60.o, n.o 4, da Diretiva […] 2015/849 ser interpretados, à luz do artigo 49.o, n.o 3, da [Carta], no sentido de que se opõem a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, que estabelece um montante fixo para as sanções administrativas por violação das limitações aplicáveis aos pagamentos em numerário e não permite uma apreciação diferenciada que tenha em conta as circunstâncias concretas relevantes?

    b)

    Em caso de resposta no sentido de que o artigo 58.o, n.o 1[,] e o artigo 60.o, n.o 4, da Diretiva […] 2015/849 não se opõem, à luz do artigo 49.o, n.o 3, da [Carta], a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, que estabelece um montante fixo para as sanções administrativas por violação das limitações aplicáveis aos pagamentos em numerário, devem o artigo 58.o e o artigo 60.o, n.o 4, da Diretiva […] 2015/849, tendo em conta o princípio da efetividade e o direito à ação nos termos do artigo 47.o da [Carta] ser interpretados no sentido de que se opõem a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, que restringe a fiscalização judicial, quando essa disposição não permite ao tribunal, em caso de recurso [contra a sanção aplicada], fixar uma sanção administrativa por violação das limitações aplicáveis aos pagamentos em numerário adequada às circunstâncias concretas relevantes, inferior ao montante mínimo previsto?»

    33.

    Os Governos búlgaro, checo, espanhol, italiano e húngaro, bem como a Comissão apresentaram observações escritas.

    34.

    Foi decidido, em acordo com o juiz relator, em aplicação do artigo 62.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, submeter questões ao Governo búlgaro, bem como, em aplicação do artigo 101.o, n.o 1, deste regulamento, apresentar um pedido de esclarecimentos ao órgão jurisdicional de reenvio, tendo as respostas por escrito sido recebidas no prazo concedido.

    IV. Análise

    35.

    Antes de proceder à análise das questões prejudiciais, considero que é útil fazer uma observação preliminar relativa à ordem pela qual estas questões devem ser examinadas.

    36.

    No caso em apreço, a primeira e a segunda questões referem‑se, respetivamente, à conformidade com as disposições do Tratado FUE relativas à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos, bem como com o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2015/849, lido em conjunto com o considerando 6 e com os artigos 4.o e 5.o desta diretiva, de uma legislação nacional que, à semelhança da legislação búlgara, prevê uma limitação geral dos pagamentos em numerário efetuados no território nacional, limitação essa que abrange as distribuições de dividendos.

    37.

    Ora, recordo que, em conformidade com jurisprudência constante, qualquer medida nacional relativa a um domínio que tenha sido objeto de harmonização exaustiva a nível da União deve ser apreciada à luz das disposições dessa medida de harmonização e não à luz das disposições do direito primário ( 13 ).

    38.

    Nestas circunstâncias, proponho que seja invertida a ordem das primeira e segunda questões prejudiciais.

    39.

    Em primeiro lugar, analisarei a segunda questão para determinar se a legislação nacional em causa no processo principal está efetivamente abrangida pelo domínio harmonizado pela Diretiva 2015/849. Pelas razões que passo a expor, não é o que sucede no presente caso, uma vez que esta legislação não está, a meu ver, abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva.

    40.

    Posteriormente, em segundo lugar, analisarei as primeira e terceira questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio unicamente sob a perspetiva do direito primário e dos direitos fundamentais.

    41.

    Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a examinar a conformidade da legislação nacional em causa no processo principal com as regras relativas à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos consagrada no artigo 63.o TFUE. Na medida em que esta legislação nacional constitui, pelas razões que passo a desenvolver, uma restrição a esta liberdade, determinarei se a mesma pode ser justificada por uma razão legítima e, eventualmente, em que medida é que é adequada para garantir a realização dos objetivos que prossegue e é proporcionada. É neste contexto que serei levado a examinar a problemática suscitada na terceira questão prejudicial. Com efeito, com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 47.o da Carta, que garante o direito à ação, e o artigo 49.o, n.o 3, da mesma, que consagra o princípio da proporcionalidade das penas, se opõem a um regime sancionatório como o que foi introduzido pelo artigo 5.o da ZOPB, uma vez que não permite que nem a autoridade nacional responsável por punir a prática da infração [primeira parte da questão, alínea a)] nem o órgão jurisdicional nacional que conhece do recurso da decisão adotada por esta última [segunda parte da questão, alínea b)] procedam a uma individualização da coima.

    A. Exame da legislação nacional em causa no processo principal à luz das disposições da Diretiva 2015/849

    42.

    Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, ponto 3, alínea e), da Diretiva 2015/849, lido em conjunto com o considerando 6 e com os artigos 4.o e 5.o desta diretiva, um Estado‑Membro pode, relativamente a todos os pagamentos efetuados no território nacional de montante igual ou superior ao limiar fixado, proibir os particulares e as empresas de realizarem pagamentos em numerário e exigir que procedam a uma transferência ou a um depósito numa conta de pagamento.

    43.

    O juiz de reenvio questiona o Tribunal de Justiça na medida em que a Diretiva 2015/849 é aplicável, nos termos do seu artigo 2.o, n.o 1, ponto 3, alínea e), aos pagamentos em numerário efetuados ou recebidos por pessoas que comercializem bens, num montante igual ou superior a 10000 euros. Esta diretiva prevê, além disso, no seu artigo 4.o, que os Estados‑Membros possam alargar este âmbito de aplicação às profissões e categorias de empresas que exerçam atividades suscetíveis de serem utilizadas para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo. Por último, a referida diretiva dispõe, no seu artigo 5.o, que os Estados‑Membros possam igualmente adotar, em matérias reguladas pela mesma diretiva, disposições mais rigorosas para prevenir estas atividades criminosas. Por outro lado, decorre do considerando 6 da Diretiva 2015/849 que os Estados‑Membros devem «poder adotar limiares mais baixos, novas limitações gerais para a utilização de numerário e outras disposições mais rigorosas».

    44.

    A questão a que o Tribunal de Justiça deve responder é, deste modo, a de saber se a legislação nacional em causa no processo principal é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação de uma destas disposições.

    45.

    Penso que não, atendendo aos objetivos que o legislador da União visa prosseguir ao abrigo da Diretiva 2015/849, à economia desta e à redação dos artigos 2.o, 4.o e 5.o desta diretiva, aos quais o órgão jurisdicional de reenvio se refere.

    46.

    No que diz respeito, em primeiro lugar, aos objetivos da Diretiva 2015/849, esta visa prevenir os riscos suscetíveis de afetar a integridade, o bom funcionamento, a reputação e a estabilidade do sistema financeiro resultantes da utilização deste sistema para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo ( 14 ). Para este fim, esta diretiva procede a uma harmonização das medidas de diligência e de controlo que os Estados‑Membros devem instituir a respeito das categorias profissionais mais expostas à manipulação de fundos provenientes de crimes graves e à recolha de fundos ou bens para fins terroristas. Embora os crimes fiscais relacionados com impostos diretos e indiretos figurem entre as atividades criminosas abrangidas pelo âmbito de aplicação da referida diretiva ( 15 ), tal sucede, no entanto, na condição de que estas infrações sejam puníveis com uma pena ou uma medida de segurança privativa da liberdade ( 16 ). Por conseguinte, o legislador da União visa prevenir a prática de infrações à regulamentação fiscal muito mais graves do que aquelas que resultam da violação de uma limitação aos pagamentos em numerário.

    47.

    Por sua vez, a legislação nacional em causa no processo principal visa combater a fraude e a evasão e elisão fiscais, ao exigir que os pagamentos de montante igual ou superior a 10000 BGN (5113 euros) não sejam efetuados em numerário, mas por transferência ou depósito numa conta de pagamento, de modo que garanta a rastreabilidade das transações financeiras. Como o Governo búlgaro salienta nas suas observações, a ZOPB, tal como indicado nos motivos do projeto legislativo, tem por objetivo limitar a economia paralela e, particularmente, as situações em que os fluxos de dinheiro não são inscritos em registos contabilísticos e, nessa medida, não ficam sujeitos a impostos nem a contribuições para a segurança social. A este respeito, este Governo indica que a ZOPB não prevê nenhuma medida em matéria de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. Não constitui uma medida de transposição da Diretiva 2015/849 e não contém nenhuma remissão para a mesma, uma vez que esta diretiva foi transposta para o direito nacional, por um lado, através da zakon za merkite sreshtu izpiraneto na pari (Lei sobre Medidas de Combate ao Branqueamento de Capitais) ( 17 ) e, por outro, através da zakon za merkite sreshtu finantsiraneto na terorizma (Lei sobre Medidas de Combate ao Financiamento do Terrorismo) ( 18 ).

    48.

    Há que constatar que os objetivos prosseguidos pelo legislador da União no âmbito da Diretiva 2015/849 e pelo legislador búlgaro no âmbito da ZOPB são claramente diferentes.

    49.

    No que diz respeito, em segundo lugar, à economia da Diretiva 2015/849, esta visa estabelecer medidas que, atendendo ao objetivo que prosseguem, se distinguem, pela sua natureza e pelos destinatários a que se destinam, das medidas implementadas através da legislação nacional em causa no processo principal.

    50.

    As medidas adotadas no âmbito desta diretiva assentam numa abordagem baseada no risco de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo ( 19 ).

    51.

    No que se refere à natureza destas medidas, consistem em obrigações de diligência, de controlo, de informação, de comunicação e de conservação de registos cujo conteúdo e alcance são descritos pormenorizadamente nos capítulos II a V da Diretiva 2015/849 ( 20 ).

    52.

    Em contrapartida, a ZOPB limita‑se a regulamentar a utilização por pessoas singulares ou coletivas dos meios de pagamento no território nacional. Nenhuma das medidas previstas nesta diretiva exige que os Estados‑Membros regulem a utilização dos meios de pagamento no seu território. Embora seja certo que, em aplicação do artigo 5.o da referida diretiva, estes últimos «possam aprovar ou manter […] disposições mais rigorosas para prevenir o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo», tal sucede apenas na estrita medida, referida expressamente pelo legislador da União neste artigo, em que estas disposições se insiram «nas matérias reguladas pela [mesma] diretiva» e se inscrevam «dentro dos limites do direito da União». Ora, pelas razões que expus, uma legislação como a que está em causa, que enuncia uma limitação geral dos pagamentos em numerário no território para efeitos de combate à fraude e evasão e elisão fiscais, não está abrangida pelo âmbito de aplicação regido pela Diretiva 2015/849.

    53.

    No que diz respeito, agora, ao âmbito de aplicação ratione personae destas duas regulamentações, a legislação nacional em causa no processo principal é aplicável a qualquer pessoa singular ou coletiva, independentemente da qualidade ao abrigo da qual efetue um pagamento, bem como da existência e, se for caso disso, da natureza da transação a que tal pagamento diz respeito.

    54.

    Ora, há que constatar que as medidas de diligência, de controlo, de informação, de comunicação e de conservação de registos previstas na Diretiva 2015/849 têm como destinatário um círculo restrito de entidades, identificáveis tanto pelo seu grau de exposição aos riscos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, como pelo grau de vulnerabilidade das suas transações. É certo que, no âmbito deste círculo, figuram, no artigo 2.o, n.o 1, ponto 3, alínea e), desta diretiva, «as outras pessoas que comercializam bens, na medida em que sejam efetuados ou recebidos pagamentos em numerário de montante igual ou superior a 10000 euros». É igualmente certo que, no considerando 6 da referida diretiva, o legislador da União indica que «os Estados‑Membros deverão poder adotar limiares mais baixos, novas limitações gerais para a utilização de numerário e outras disposições mais rigorosas». Todavia, esta última referência não permite incluir no âmbito de aplicação da Diretiva 2015/849 uma legislação como a que está em causa, tanto devido à sua imprecisão como à inexistência de força vinculativa das disposições contidas nos considerandos de uma diretiva.

    55.

    Além disso, embora o legislador da União autorize, no artigo 4.o da Diretiva 2015/849, os Estados‑Membros a alargar o âmbito de aplicação da diretiva, tal sucede apenas na medida em que, como refere expressamente, esta extensão esteja de acordo com a abordagem baseada no risco e diga respeito a profissões e categorias de empresas «que exerçam atividades particularmente suscetíveis de ser utilizadas para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo». Por outras palavras, esta disposição permite que um Estado‑Membro imponha medidas de diligência e de controlo a uma categoria mais ampla de empresas, com base na sua própria avaliação do risco que pode efetuar nos termos do artigo 7.o desta diretiva, mas não permite, a meu ver, que sirva de base a uma legislação como a que está em causa no processo principal que, aplicando‑se a todas as pessoas singulares ou coletivas, regula a utilização de meios de pagamento no território nacional para combater a fraude e a evasão e elisão fiscais.

    56.

    À luz destes elementos, considero, por conseguinte, que uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que, para combater a fraude e a evasão e elisão fiscais, proíbe as pessoas singulares ou coletivas de efetuarem, no território nacional, um pagamento em numerário quando este seja de montante igual ou superior ao limiar fixado e exige que estas últimas efetuem uma transferência ou um depósito numa conta de pagamento, não está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2015/849.

    57.

    Uma vez que não existem, atualmente, no direito da União, atos legislativos relativos às condições e às modalidades segundo as quais os Estados não membros da Zona Euro, como a República da Bulgária, podem limitar os pagamentos em numerário no respetivo território nacional ( 21 ), é apenas à luz do direito primário e, especialmente, das regras relativas às liberdades de circulação, que há que examinar a legislação nacional em causa.

    B. Exame da legislação nacional em causa no processo principal à luz do artigo 63.o TFUE

    58.

    Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se o artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que proíbe a realização no território nacional de um pagamento em numerário quando o montante deste seja igual ou superior ao limiar fixado e que exige, para este efeito, o recurso a uma transferência ou a um depósito numa conta de pagamento, incluindo quando esteja em causa a distribuição de dividendos de uma sociedade.

    59.

    Não havendo regras comuns ou harmonizadas, os Estados que não membros da Zona Euro, como a República da Bulgária, são livres de limitar os pagamentos em numerário nos seus territórios. São, todavia, obrigados, como qualquer Estado‑Membro, a respeitar as regras do mercado interno e, especialmente, as regras do Tratado relativas às liberdades de circulação ( 22 ).

    60.

    No âmbito do processo principal, a compatibilidade da legislação nacional deve ser apreciada face à liberdade de circulação que é diretamente restringida ( 23 ).

    61.

    No presente caso, as autoridades nacionais competentes aplicaram a legislação em causa por ocasião da distribuição de dividendos, os quais constituem um rendimento do capital que, segundo jurisprudência constante, deve ser compreendido à luz das regras relativas à livre circulação de capitais ( 24 ). Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que proceda à sua análise à luz das regras relativas à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos enunciadas no artigo 63.o TFUE.

    62.

    Conforme o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a fazer, há, por conseguinte, que determinar se a legislação em causa deve ser analisada como uma restrição à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos, na aceção do artigo 63.o TFUE, e, sendo caso disso, se tal restrição pode ser justificada.

    1.   Quanto à existência de uma restrição à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos

    63.

    Nos termos do artigo 63.o TFUE, são proibidas, entre os Estados‑Membros bem como entre os Estados‑Membros e países terceiros, todas as restrições à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos.

    64.

    Conforme decorre dos termos desta disposição, a sua violação pressupõe a existência tanto de capitais e de pagamentos com dimensão transfronteiriça como de uma restrição a estes últimos.

    65.

    Em primeiro lugar, penso que a legislação nacional em causa no processo principal é suscetível de dizer respeito aos capitais e aos pagamentos com uma dimensão transfronteiriça, devido à sua generalidade.

    66.

    É certo, como salientam os Governos búlgaro e checo nas suas observações, que a legislação nacional em causa no processo principal se limita a enquadrar as modalidades dos pagamentos efetuados no território de um Estado‑Membro. Assinalo, todavia, que esta legislação é aplicável a todas as pessoas singulares ou coletivas que efetuem um pagamento neste território, independentemente da nacionalidade, da residência das primeiras ou da sede das segundas, ou ainda da qualidade em que estas últimas atuam. Consequentemente, a referida legislação é aplicável inclusivamente na hipótese de o pagamento ser efetuado por uma pessoa singular ou coletiva que tenha a sua residência ou estabelecimento num Estado‑Membro que não a Bulgária, ou a favor desta, por exemplo, no âmbito de uma prestação transfronteiriça de serviços.

    67.

    Além disso, o artigo 3.o da ZOPB diz respeito tanto aos pagamentos efetuados em leva búlgaros como aos que são efetuados em moeda estrangeira e aplica‑se independentemente do tipo e da natureza da transação a que se o pagamento diz respeito ( 25 ). Assim, em conformidade com as Orientações relativas à aplicação da ZOPB ( 26 ), esta legislação foi, no caso em apreço, aplicada à distribuição de dividendos de uma sociedade legalmente estabelecida no território nacional a favor do sócio único desta, o qual, no presente caso, é de nacionalidade grega. Ora, não me parece que se possa contestar de forma séria que a distribuição, sob a forma de um pagamento em numerário, de dividendos provenientes de uma sociedade estabelecida na Bulgária a favor de um sócio, que é cidadão de outro Estado‑Membro, constitui um movimento de capitais e um pagamento com uma dimensão transfronteiriça na aceção do artigo 63.o TFUE ( 27 ).

    68.

    Em segundo lugar, é, a meu ver, inegável que a legislação nacional em causa constitui uma restrição à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos, não obstante a ausência de discriminação em razão da nacionalidade das pessoas singulares ou coletivas visadas.

    69.

    Com efeito, uma legislação que regula, de um modo geral, a utilização dos meios de pagamento, proibindo os particulares e as empresas de efetuarem um pagamento em numerário quando o montante deste for igual ou superior a 10000 BGN (5113 euros) e exigindo, para este efeito, que recorram aos meios de pagamento expressamente indicados pelo legislador, sob pena de serem punidos, restringe, por si só, a liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos.

    70.

    Por um lado, saliento que o curso legal das moedas e das notas implica, em princípio, a aceitação obrigatória dos pagamentos em numerário. A utilização de moedas e de notas é, assim, reconhecida como um meio ao qual qualquer devedor de uma obrigação de pagamento pode recorrer livremente.

    71.

    Assim, na Zona Euro, de acordo com a Recomendação da Comissão, de 22 de março de 2010, sobre o alcance e consequências do curso legal das notas e moedas em euros ( 28 ), este curso legal implica, no caso de obrigação de pagamento, que o credor não pode recusar um pagamento efetuado em numerário e que o devedor pode cumprir tal obrigação mediante a entrega de notas e moedas em euros ( 29 ). A Comissão realça, por conseguinte, que «a aceitação de notas e moedas em euros como meio de pagamento deve ser a regra nas transações no comércio retalhista» ( 30 ).

    72.

    A este respeito, segundo as conclusões de um estudo realizado em 2016 pelo BCE ( 31 ), as transações em numerário continuam a ser o meio de pagamento mais acessível, mas também o mais generalizado, especialmente nalguns sectores económicos, sendo utilizado por muitas pequenas e médias empresas ( 32 ). Na Zona Euro, cerca de 79 % dos pagamentos realizados nos pontos de venda foram efetuados em numerário, representando os pagamentos por cartão bancário cerca de 19 % e os outros meios de pagamento cerca de 2 %. Em termos de montantes, a quota de mercado dos pagamentos em numerário era de cerca de 54 %, ascendendo a 39 % para os pagamentos por cartão bancário e a cerca de 7 % para os outros meios pagamento ( 33 ). De acordo com este estudo, 10 % das transações em numerário analisadas diziam respeito a bens ou a serviços de montante igual ou superior a 100 euros ( 34 ).

    73.

    Por outro lado, uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal tem por efeito não apenas excluir os pagamentos em numerário e outros meios legais de pagamento, como o cartão bancário, mas também exigir aos particulares e às empresas que efetuem uma transferência ou um depósito numa conta de pagamento.

    74.

    Há que constatar que o leque de soluções de pagamento adotadas pelo legislador búlgaro não é amplo e exige, designadamente, que o particular seja titular de uma conta bancária e que efetue o pagamento por intermédio desta conta. Ora, o limite de 10000 BGN (5113 euros) não exclui, por si só, a possibilidade de o particular preferir efetuar um pagamento de tal montante em numerário ou por cartão bancário, por razões relacionadas com a imediatez, a facilidade ou a gratuitidade do modo de pagamento, a efetuar uma transferência. A legislação nacional em causa parece‑me, pois, ser suscetível de dissuadir um particular, que reside, por exemplo, numa zona fronteiriça, de se deslocar ao Estado‑Membro vizinho para adquirir mercadorias a comerciantes ou recorrer a prestadores de serviços que irão exigir, para efeitos do pagamento, o recurso a uma transferência ou a um depósito numa conta de pagamento.

    75.

    De igual modo, do ponto de vista de uma sociedade, recordo que, de acordo com a liberdade contratual de que os acionistas ou os sócios dispõem, estes são em princípio livres de determinar as modalidades de pagamento dos dividendos e, especialmente, a sua forma. Ora, uma regra jurídica como a do artigo 3.o da ZOPB tem por efeito restringir a liberdade de que estes últimos beneficiam de pagar tais dividendos em numerário, sob pena de expor a sociedade a uma coima particularmente severa.

    76.

    É incontestável que a transferência bancária apresenta vantagens para efeitos dos pagamentos transfronteiriços por permitir, nomeadamente, que os particulares e as sociedades evitem o transporte de montantes consideráveis em numerário. Contudo, não deixa de ser certo que estas operações de pagamento podem estar sujeitas a uma série de comissões bancárias. Embora a República da Bulgária seja hoje um Estado-Membro da Área Única de Pagamentos em euros [Single Euro Payments Area (SEPA)] ( 35 ), relembro que não é um Estado-Membro da Zona Euro. Nestas circunstâncias, as vantagens previstas no âmbito da SEPA, como a realização da transferência transfronteiriça no prazo de um dia útil a contar da receção da ordem de transferência pelo banco do emitente ou ainda a aplicação de preços competitivos, só se aplicam aos pagamentos em euros. No que se refere aos pagamentos em leva búlgaros, a legislação búlgara que rege as comissões referentes às transferências transfronteiriças continua assim a ser aplicável. Ora, é razoável pensar que a legislação em causa terá, assim, por efeito onerar os dividendos distribuídos aos acionistas ou aos sócios que não disponham de uma conta bancária no território nacional com comissões adicionais relacionadas com a execução de uma transferência transfronteiriça expressa em moeda nacional.

    77.

    À luz destes elementos, parece‑me, por conseguinte, que uma legislação como a que está em causa no processo principal é suscetível de restringir a liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos assegurada pelo artigo 63.o TFUE.

    78.

    No entanto, resulta de jurisprudência constante que tal restrição pode ser conforme com este artigo se for justificada por um motivo legítimo ou por uma razão imperiosa de interesse geral e, se assim suceder, se for adequada para garantir a realização do objetivo por si prosseguido, se não for além do que é necessário para o alcançar e se for conforme com os direitos fundamentais, o que cumpre verificar de seguida ( 36 ).

    79.

    A este respeito, aqui ficam algumas das precisões que posso fazer quanto ao preenchimento destas condições no âmbito do litígio no processo principal, uma vez que compete ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, para este efeito, as verificações necessárias.

    2.   Justificação da restrição

    80.

    Resulta da redação do artigo 65.o, n.o 1, alínea b), TFUE ( 37 ), bem como da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a necessidade de prevenir a fraude e a evasão fiscais constitui um motivo legítimo suscetível de justificar uma restrição à livre circulação de capitais.

    81.

    No Acórdão de 30 de abril de 2020, Société Générale ( 38 ), o Tribunal de Justiça declarou que a necessidade de garantir uma cobrança eficaz do imposto constitui um objetivo legítimo que pode justificar uma restrição às liberdades fundamentais. Segundo o Tribunal de Justiça, um Estado‑Membro está, deste modo, autorizado a aplicar medidas que permitam a verificação, de forma clara e precisa, do montante do imposto devido, desde que, todavia, essas medidas sejam adequadas para garantir a realização do objetivo prosseguido e não vão além do que é necessário para o atingir ( 39 ).

    82.

    No Acórdão de 26 de fevereiro de 2019, X (Sociedades intermediárias estabelecidas em países terceiros) ( 40 ), o Tribunal de Justiça declarou igualmente que uma medida nacional que restrinja a livre circulação de capitais pode ser justificada pela necessidade de evitar a fraude e a evasão fiscais quando vise especificamente os expedientes puramente artificiais, desprovidos de realidade económica, que tenham sido criados com o único objetivo de elidir o imposto normalmente devido sobre os lucros gerados por atividades exercidas no território nacional do Estado‑Membro em causa ( 41 ).

    83.

    No presente caso, as disposições previstas no artigo 3.o da ZOPB devem permitir combater a economia paralela assegurando a cobrança do imposto e das contribuições para a segurança social através da rastreabilidade das operações financeiras. Como o Governo búlgaro explica e ilustra nas suas observações ( 42 ), esta legislação visa, particularmente, combater as práticas de evasão e elisão fiscais, limitando as situações nas quais quantias significativas não são inscritas nos registos contabilísticos, escapando assim à tributação devida a título do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, bem como ao pagamento de contribuições obrigatórias para a segurança social. O Governo búlgaro pretende abranger os casos em que as declarações financeiras de uma sociedade são falsificadas com o intuito de ludibriar os serviços da Agência Nacional das Receitas Públicas ou os casos em que os salários são artificialmente reduzidos para efeitos da respetiva declaração aos organismos responsáveis pela cobrança das contribuições para a segurança social. A obrigação de proceder à distribuição de dividendos através de uma transferência bancária ou de um depósito numa conta de pagamento deve, deste modo, evitar a distribuição «oculta» de dividendos e, assim, garantir que estes últimos são tributados uma única vez e no território fiscal apropriado.

    84.

    À luz destes elementos, penso que a legislação em causa no processo principal pode ser justificada por um motivo legítimo, relativo ao combate à fraude e à evasão e elisão fiscais.

    85.

    Importa agora determinar se esta legislação é adequada para garantir a realização do objetivo prosseguido e se não vai além do que é necessário para o alcançar.

    3.   Aptidão da legislação nacional em causa no processo principal para atingir os objetivos que prossegue

    86.

    Recordo que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma legislação nacional só é apta a garantir a realização do objetivo invocado se responder verdadeiramente à intenção de o alcançar de maneira coerente e sistemática ( 43 ).

    87.

    Apesar de não existir, atualmente, consenso quanto à questão de saber se as restrições aos pagamentos em numerário têm um impacto real no volume de fraude e de evasão e elisão fiscais ( 44 ), sublinho que a questão, neste caso, não é a de saber se a legislação búlgara permite erradicar estes fenómenos, visto que a origem e a natureza destes últimos são proteiformes, mas sim avaliar a aptidão desta legislação para os combater. Ora, parece‑me que vários elementos são suscetíveis de demonstrar que a legislação em causa foi elaborada para combater a fraude e a evasão e elisão fiscais de forma coerente e sistemática, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça.

    88.

    No que diz respeito, em primeiro lugar, ao âmbito de aplicação desta legislação, este permite apreender e, se for caso disso, punir as fraudes fiscais da forma mais ampla possível. Recordo que, sob reserva das exceções previstas no artigo 2.o da ZOPB, a referida legislação é aplicada uniformemente a todas as pessoas e empresas que efetuem um pagamento no território nacional cujo montante seja igual ou superior ao limiar de 10000 BGN (5113 euros). Todos os intervenientes e todos os sectores económicos estão, por conseguinte, sujeitos a obrigações idênticas, independentemente da natureza e do objeto da transação a que o pagamento diz respeito.

    89.

    Além disso, saliento que o limite de 10000 BGN (5113 euros) é aplicável independentemente de a transação ser efetuada através de uma operação única ou de várias operações que aparentam uma ligação entre si, o que permite apreender os comportamentos daqueles que tentam contornar a regulamentação aplicável e fracionam o pagamento do montante devido tantas vezes quantas forem necessárias para que esta não seja abrangida pelo âmbito de aplicação da ZOPB. Relembro que, no âmbito do processo principal, a Ecotex procedeu à distribuição de dividendos da empresa num montante total de 100000 BGN (51130 euros), dos quais 95000 BGN (cerca de 48573,50 euros) foram pagos em numerário em nove tranches de 10000 BGN (5113 euros) e numa tranche de 5000 BGN (2556,50 euros).

    90.

    Em segundo lugar, no que respeita às modalidades de pagamento estabelecidas pela legislação em causa para efeitos dos pagamentos de montante igual ou superior a 10000 BGN (5113 euros), estas permitem efetivamente assegurar a identificação das transações e a aplicação das regras fiscais.

    91.

    Com efeito, o legislador búlgaro exige que se utilizem meios de pagamento que garantam a rastreabilidade das operações financeiras ( 45 ).

    92.

    Por um lado, a transferência bancária e o depósito numa conta de pagamento permitem levantar o anonimato das transações financeiras e assegurar a sua rastreabilidade para efeitos de contabilização e tributação pelas autoridades tributárias do Estado, ao contrário dos pagamentos em numerário que não permitem determinar os parâmetros da transação (partes, montante, objeto, data). A este respeito, o Governo búlgaro afirma que a transferência bancária e o depósito numa conta de pagamento são incentivados pela lei, uma vez que são controláveis e podem ser identificados e analisados para efeitos de controlos fiscais, sendo que não impedem nem atrasam a conclusão da operação de pagamento devido à rapidez e ao conforto das transações efetuadas através do sistema bancário búlgaro.

    93.

    Por outro lado, embora o legislador búlgaro tenha excluído do mecanismo por si estabelecido outros meios de pagamento, por exemplo, os pagamentos através de cheque e de cartão bancário, esta escolha pode ser justificada atendendo à percentagem muito elevada de fraude associada a estas duas formas de pagamento ( 46 ).

    94.

    Neste contexto, o mecanismo estabelecido pela legislação em causa parece contribuir para o combate à fraude e à evasão e elisão fiscais.

    95.

    No entanto, tal legislação só pode atingir verdadeiramente este objetivo se as exigências que enuncia puderem ser cumpridas.

    96.

    Ora, proibir os pagamentos em numerário e exigir o recurso a uma transferência bancária ou a um depósito numa conta de pagamento para combater a fraude e a evasão e elisão fiscais pressupõe que os particulares disponham ou estejam em condições de se dotar de uma conta bancária ( 47 ). É forçoso constatar que algumas pessoas não podem beneficiar dos serviços bancários ou renunciam a estes ( 48 ). Sobre esta questão, não posso deixar de partilhar as considerações tecidas pelo advogado‑geral G. Pitruzzella nas suas conclusões nos processos apensos Dietrich e Häring ( 49 ). Depois de ter sublinhado que a Diretiva 2014/92 ( 50 ) reconhece que qualquer pessoa que resida legalmente na União tem o direito de abrir uma conta de pagamento com características básicas (devendo essa conta incluir o serviço de execução de operações de pagamento como transferências e levantamentos dentro da União) e incentiva os consumidores vulneráveis sem conta bancária a participar no mercado bancário de retalho, o advogado‑geral G. Pitruzzella referiu‑se aos dados recentes segundo os quais o número de pessoas que ainda não têm acesso a serviços financeiros básicos na União e na Zona Euro, embora sendo minoritário, não é marginal.

    97.

    Nestas circunstâncias, parece‑me essencial que o órgão jurisdicional de reenvio se certifique de que a legislação em causa no processo principal seja acompanhada de medidas que tomem em consideração a inclusão bancária dos particulares. Nos termos do considerando 46 e do artigo 18.o, n.o 4, da Diretiva 2014/92, o referido órgão deve, nomeadamente, certificar‑se de que é oferecida às pessoas vulneráveis sem conta bancária a possibilidade de acederem a uma conta bancária, com características básicas, com condições mais vantajosas do que aquelas que são aplicadas a qualquer outro particular, por exemplo, a título gratuito ( 51 ). Este aspeto é ainda mais importante porque a sanção aplicada em caso de violação do artigo 3.o da ZOPB é severa.

    98.

    Isto implica igualmente uma certa flexibilidade desta legislação. Embora destaque que, no artigo 2.o da ZOPB, o legislador búlgaro prevê uma exceção a favor das «pessoas com uma incapacidade de exercício geral ou especial», penso que também importa verificar se existem medidas especiais ou derrogatórias que possam ser invocadas por pessoas que, por motivos legítimos que não o acima referido, relativos, por exemplo, à sua situação de precariedade ou ao seu estatuto (como os requerentes de proteção internacional), não podem proceder a uma transferência ou a um depósito numa conta de pagamento. Nestas circunstâncias, apreciadas casuisticamente, não me parece impossível garantir a rastreabilidade de um pagamento em numerário, identificando o montante, o motivo da transação e as partes envolvidas (exigindo, por exemplo, uma prova de identidade).

    99.

    Por último, em terceiro e último lugar, no que respeita ao regime sancionatório previsto no artigo 5.o da ZOPB, há que constatar que este visa punir, através de uma coima particularmente severa, a violação da regulamentação relativa à limitação dos pagamentos em numerário enunciada no artigo 3.o da ZOPB. Decorre das indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que a coima aplicável é aliás uma sanção administrativa de caráter penal ( 52 ). É indubitável que este regime sancionatório foi estabelecido com o intuito de combater, através da prevenção e da dissuasão, os riscos de fraude e de evasão e elisão fiscais. Saliento que, no Acórdão de 19 de julho de 2012, Rēdlihs ( 53 ), o Tribunal de Justiça considerou perfeitamente legítimo que os Estados‑Membros prevejam nas respetivas legislações sanções adequadas destinadas a punir o incumprimento da obrigação de inscrição no registo dos sujeitos passivos de IVA, a fim de assegurar a cobrança exata do imposto e evitar a fraude ( 54 ).

    100.

    Nestas circunstâncias, e sob reserva das verificações que compete ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, parece‑me que uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que proíbe os pagamentos em numerário em benefício dos pagamentos através de transferência ou de depósito numa conta de pagamento quando o montante seja igual ou superior a 10000 BGN (5113 euros) e pune a violação de tal proibição, constitui uma medida apta a alcançar, de forma efetiva e coerente, o objetivo prosseguido por esta legislação.

    4.   Proporcionalidade da legislação em causa no processo principal

    101.

    Cumpre, neste momento, apreciar se a legislação em causa não vai além do que é necessário para alcançar os objetivos que prossegue.

    102.

    Com efeito, quando uma regulamentação nacional é suscetível de entravar uma ou mais das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado e o Estado‑Membro em causa invoca razões imperiosas de interesse geral para justificar esse entrave, a regulamentação nacional em causa só pode, segundo o Tribunal de Justiça, beneficiar das exceções assim previstas se respeitar os direitos fundamentais cuja observância é assegurada pelo Tribunal de Justiça, incluindo o princípio da proporcionalidade ( 55 ).

    103.

    A meu ver, este exame pressupõe uma análise da proporcionalidade, por um lado, da medida destinada a exigir que os particulares e as empresas disponham de uma conta bancária e, por outro, do regime sancionatório previsto no artigo 5.o da ZOPB.

    a)   Proporcionalidade do requisito relativo à titularidade de uma conta bancária

    104.

    Como já referi, o cumprimento dos requisitos enunciados no artigo 3.o da ZOPB implica, nomeadamente, que os particulares disponham ou se dotem de uma conta bancária a fim de procederem à transferência ou ao depósito numa conta de pagamento de quantias iguais ou superiores a 10000 BGN (5113 euros) ( 56 ).

    105.

    Em primeiro lugar, penso que para examinar a proporcionalidade deste requisito se deve tomar em consideração a inclusão bancária e a existência das medidas referidas nos n.os 97 e 98 das presentes conclusões.

    106.

    Em segundo lugar, sou da opinião de que a proporcionalidade deste requisito deve ser examinada à luz do limiar de 10000 BGN (5113 euros) enunciado no artigo 3.o, n.o 1, ponto 1, da ZOPB.

    107.

    Este limiar não me parece exageradamente baixo, uma vez que não conduz a uma situação em que os particulares ficam impedidos de pagar as suas compras de produtos de primeira necessidade ou de produtos de consumo corrente. Tal poderia ter sido o caso se a República da Bulgária tivesse decidido reduzir este limiar para 1000 BGN (511,30 euros), em conformidade com o projeto legislativo que submeteu, para emissão de parecer, ao BCE em 27 de junho de 2017 ( 57 ).

    108.

    O limiar de 10000 BGN (5113 euros) permite às pessoas excluídas dos serviços bancários ou às pessoas mais vulneráveis que não têm acesso aos serviços financeiros básicos pagar em numerário as suas compras correntes, mas também prestações mais onerosas, sem que sejam obrigadas a dispor de uma conta bancária e sem que corram o risco de lhes ser aplicada uma coima particularmente severa.

    109.

    À luz destes elementos, e sob reserva, uma vez mais, das verificações que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar quanto à existência das medidas referidas nos n.os 97 e 98 das presentes conclusões, a exigência, imposta pela legislação em causa, de ser titular de uma conta bancária, para realizar pagamentos de montante igual ou superior a 10000 BGN (5113 euros) não me parece desproporcionada.

    110.

    Em contrapartida, a conclusão é distinta no que diz respeito à proporcionalidade do regime sancionatório previsto no artigo 5.o da ZOPB.

    b)   Proporcionalidade do regime sancionatório previsto no artigo 5.o da ZOPB

    111.

    A questão relativa à proporcionalidade do regime sancionatório previsto no artigo 5.o da ZOPB é expressamente referida pelo órgão jurisdicional de reenvio na primeira parte da sua terceira questão prejudicial [alínea a)].

    112.

    Com efeito, o referido órgão pretende saber se a exigência de proporcionalidade das penas prevista no artigo 49.o, n.o 3, da Carta deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que, para responder a uma violação das disposições que preveem uma limitação aos pagamentos em numerário, prevê um regime sancionatório em cujo âmbito a autoridade nacional responsável por punir a prática da infração não pode tomar em consideração as circunstâncias específicas do caso, sendo a coima expressa em percentagem do montante total do pagamento efetuado em violação das referidas disposições.

    1) Observações preliminares

    113.

    Tal como a Comissão, não creio que as disposições previstas no artigo 51.o, n.o 1, da Carta se opõem a que o Tribunal de Justiça aprecie o regime sancionatório em questão à luz, nomeadamente, do artigo 49.o, n.o 3, da Carta.

    114.

    Embora seja certo que a legislação nacional em causa no processo principal não está abrangida por um domínio harmonizado pelo direito da União, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que os direitos fundamentais garantidos pela Carta se destinam a ser aplicados em todas as situações reguladas pelo direito da União e que devem nomeadamente ser respeitados quando uma regulamentação nacional se enquadra no âmbito de aplicação desse direito ( 58 ). Assim, conforme já recordei, quando uma regulamentação nacional é suscetível de entravar uma ou mais das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado e o Estado‑Membro em causa invoca razões imperiosas de interesse geral para justificar esse entrave, a regulamentação nacional em causa só pode, no entender do Tribunal de Justiça, beneficiar das exceções assim previstas se respeitar os direitos fundamentais cuja observância é assegurada pelo Tribunal de Justiça ( 59 ). Ora, resulta dos desenvolvimentos expostos nos n.os 63 a 78 das presentes conclusões que a legislação em causa no processo principal constitui uma restrição à liberdade de movimento dos capitais e dos pagamentos, na aceção do artigo 63.o TFUE, suscetível de ser justificada pela necessidade de combater a fraude e evasão e elisão fiscais.

    115.

    Além disso, relembro que o Tribunal de Justiça declarou que, na falta de harmonização da legislação da União no domínio das sanções aplicáveis em caso de inobservância dos requisitos previstos num regime instituído por esta legislação, os Estados‑Membros são competentes para escolher as sanções que se lhes afigurem adequadas, na condição de exercerem as suas competências no respeito do direito da União e dos seus princípios gerais ( 60 ). Ora, recordo igualmente que o princípio da proporcionalidade a que se refere o órgão jurisdicional de reenvio constitui não só um princípio geral do direito da União ( 61 ) mas também um direito fundamental que está consagrado no artigo 49.o, n.o 3, da Carta sob a perspetiva da proporcionalidade das penas.

    116.

    A este respeito, penso que uma sanção como a prevista no artigo 5.o da ZOPB pode ser examinada à luz do princípio da proporcionalidade das penas enunciado no artigo 49.o, n.o 3, da Carta. Neste contexto, baseio‑me nos três critérios que o Tribunal Justiça considera pertinentes para apreciar a natureza penal de uma sanção, a saber, a qualificação jurídica da infração no direito interno, a própria natureza da infração e, por último, o grau de severidade da sanção suscetível de ser aplicada ao interessado ( 62 ).

    117.

    Desde logo, a coima a que fica exposta uma pessoa que viole as disposições previstas no artigo 3.o da ZOPB é uma sanção administrativa que, a meu ver, tem uma natureza claramente penal. Resulta da decisão de reenvio que a sanção administrativa é aplicada no âmbito de um processo penal. O órgão jurisdicional de reenvio refere, com efeito, que a constatação da infração administrativa em causa no processo principal está na origem de um processo penal com caráter administrativo, o que parece também ser confirmado pela redação do artigo 63.o da ZANN ( 63 ). Decorre igualmente das Orientações relativas à aplicação da ZOPB que a decisão através da qual é aplicada uma sanção é uma decisão penal. Em seguida, a sanção aplicada nos termos do artigo 5.o da ZOPB não se limita a reparar os danos causados pela infração. Embora esta sanção prossiga, como o Governo búlgaro assinala nas suas observações, uma finalidade preventiva, parece‑me também que tem por objetivo reprimir as violações à proibição de princípio enunciada no artigo 3.o da ZOPB. Por último, a sua severidade corrobora esta asserção. Com efeito, saliento que a sanção administrativa em causa no processo principal assume, em conformidade com o artigo 5.o da ZOPB, a forma de uma coima que corresponde, caso o infrator seja uma pessoa singular, a 25 % do montante total do pagamento efetuado e, em caso de reincidência da infração, a 50 % deste montante e, se o infrator for uma pessoa coletiva, a 50 % do montante total do pagamento efetuado e, em caso de reincidência da infração, a 100 % deste montante. Parece‑me que esta sanção apresenta um grau de severidade elevado ou mesmo muito elevado, o que é típico das sanções de natureza penal segundo o Tribunal de Justiça ( 64 ).

    118.

    À luz destes elementos, parece‑me, por conseguinte, que o regime sancionatório instituído pelo artigo 5.o da ZOPB pode ser apreciado à luz do princípio da proporcionalidade assegurado pela Carta no seu artigo 49.o, n.o 3.

    2) Exame da proporcionalidade do regime sancionatório

    119.

    No Acórdão de 31 de maio de 2018, Zheng ( 65 ), relativo a uma sanção aplicada em razão da violação do sistema de controlo do dinheiro líquido que entra e sai da União, o Tribunal de Justiça declarou que o princípio da proporcionalidade se impõe não só no que diz respeito à determinação dos elementos constitutivos de uma infração mas também das regras relativas ao montante das coimas e à apreciação dos elementos que podem entrar em linha de conta para as fixar ( 66 ).

    120.

    Para avaliar se o regime sancionatório em causa é conforme com o princípio da proporcionalidade, há que tomar em consideração, nomeadamente, a natureza e a gravidade da infração que estas sanções visam punir, bem como as modalidades de determinação do seu montante.

    121.

    No que respeita, em primeiro lugar, à natureza e à gravidade da infração que a sanção aplicada nos termos do artigo 5.o da ZOPB visa punir, sublinho que esta tem como objetivo punir apenas a violação da regulamentação relativa à limitação dos pagamentos em numerário, exigindo o recurso a uma transferência ou a um depósito numa conta de pagamento quando o montante a pagar seja igual ou superior a 10000 BGN (5113 euros). Não resulta de nenhum elemento dos autos, nem sequer dos termos do artigo 5.o da ZOPB, que esta sanção depende da constatação da existência de uma fraude fiscal. Também não parece haver dúvidas de que a sanção em causa tem por objetivo assegurar a cobrança do imposto ou das contribuições para a segurança social junto do sujeito passivo destes. Do mesmo modo, nenhum elemento dos autos permite determinar se as autoridades competentes podem proceder à cobrança do imposto e das contribuições para a segurança social devidos, independentemente da aplicação da sanção em causa.

    122.

    Em segundo lugar, no que respeita às modalidades de determinação do montante da sanção em causa, recordo que esta sanção constitui uma percentagem cujo valor corresponde, no caso das pessoas singulares, a 25 % do montante total do pagamento efetuado em violação do artigo 3.o da ZOPB e, em caso de reincidência da infração, a 50 % desse montante e, no caso das pessoas coletivas, a 50 % do montante total do pagamento efetuado em violação do artigo 3.o da ZOPB e, em caso de reincidência, a 100 % desse montante.

    123.

    O montante da sanção parece ser neste caso o resultado de um cálculo simples baseado no montante total do pagamento efetuado em violação das modalidades de pagamento definidas no artigo 3.o da ZOPB, sem que, aliás, seja possível ter em conta elementos suscetíveis de serem incluídos na apreciação da gravidade da infração e das circunstâncias do caso concreto.

    124.

    Com efeito, parece resultar dos esclarecimentos prestados pelo órgão jurisdicional de reenvio, bem como das respostas dadas pelo Governo búlgaro às questões submetidas pelo Tribunal de Justiça, que é apenas no âmbito da apreciação da gravidade diminuta da infração cometida, prevista no artigo 28.o, alínea a), da ZANN ( 67 ), que a autoridade nacional responsável por punir a infração e a autoridade judicial perante a qual foi interposto recurso de uma decisão de condenação podem tomar em consideração todos os elementos e circunstâncias do caso concreto referidos no artigo 27.o, n.os 2 e 3, da ZANN ( 68 ).

    125.

    Por outras palavras, com exceção da situação na qual a infração cometida seja de gravidade diminuta, o cálculo do montante da coima é um exercício puramente mecânico que não permite nem à autoridade nacional responsável por punir a prática da infração nem à autoridade judicial, no âmbito da sua fiscalização jurisdicional, ajustar o montante da coima e limitar a sua severidade ao estritamente necessário face à gravidade da infração cometida.

    126.

    Ora, recordo que o princípio da proporcionalidade exige que se proceda à individualização da sanção e impõe, particularmente, que se avalie a natureza da adequação da coima à luz de todas as circunstâncias do processo. Este princípio exige não só ao legislador nacional mas também a todos os intervenientes no processo que as suas condutas sejam estruturadas em coerência com este princípio. É o que resulta do Acórdão de 20 de março de 2018, Menci ( 69 ), no qual o Tribunal de Justiça declarou que, embora uma regulamentação nacional pareça, em princípio, suscetível de assegurar a conciliação necessária entre os diferentes interesses em causa, essa regulamentação deve também ser aplicada pelas autoridades e pelos órgãos jurisdicionais nacionais de maneira a que a sanção, no caso concreto e para a pessoa em causa, não seja excessiva face à gravidade da infração cometida ( 70 ).

    127.

    Por conseguinte, o princípio da proporcionalidade previsto no artigo 49.o, n.o 3, da Carta exige, por um lado, que o legislador nacional, ao prever uma regra, não puna a violação desta com uma coima desproporcionada e, por outro, que o juiz nacional, em sede de apreciação de um recurso da decisão de condenação, não aplique uma sanção desproporcionada face à infração cometida.

    128.

    Por último, considero que uma coima que corresponde a 100 % do montante do pagamento efetuado em violação das disposições previstas no artigo 3.o do ZOPB é manifestamente excessiva. Tal coima tem um efeito confiscatório que vai muito além do que me parece ser necessário para punir a violação de uma regulamentação relativa à limitação dos pagamentos em numerário, independentemente da questão de saber se tal violação constitui uma fraude fiscal. Esta sanção pode inclusivamente ser suficiente para pôr em risco as finanças de uma pequena empresa. No Acórdão de 31 de maio de 2018, Zheng ( 71 ), o Tribunal de Justiça declarou que «ainda que [uma] coima seja calculada tendo em conta determinadas circunstâncias agravantes, desde que estas respeitem o princípio da proporcionalidade, o facto de que o seu montante máximo possa ascender ao dobro do montante em dinheiro líquido não declarado e de que, em todo o caso, como no caso vertente, a coima possa ser fixada num montante que corresponde a quase 100 % deste montante ultrapassa os limites do que é necessário para garantir o respeito do dever de declaração» ( 72 ).

    129.

    À luz destes elementos, tendo, por conseguinte, a considerar que uma norma de direito nacional que permite a aplicação de uma coima, calculada com base numa percentagem fixa aplicável ao montante total do pagamento efetuado em violação da proibição de pagamento em numerário, e que exclui qualquer ajuste do montante desta coima em função das circunstâncias específicas do caso concreto é contrária ao princípio da proporcionalidade.

    130.

    É à luz de todos estes elementos que proponho, neste momento, ao Tribunal Justiça que declare, sob reserva das verificações realizadas pelo órgão jurisdicional nacional, que o artigo 63.o TFUE não se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa, justificada pela necessidade de combater a fraude e a evasão e elisão fiscais, se esta for adequada para garantir a realização deste objetivo e se não exceder o necessário para o alcançar.

    131.

    Caberá ao órgão jurisdicional nacional verificar se estas condições estão preenchidas, tendo em conta as considerações seguintes:

    tal legislação só pode alcançar verdadeiramente o referido objetivo se for acompanhada, por um lado, de medidas que tenham em conta a inclusão bancária dos particulares. A este respeito, o órgão jurisdicional nacional deverá certificar‑se, nomeadamente, de que as pessoas mais vulneráveis sem conta bancária têm a possibilidade de aceder a uma conta bancária com características básicas, em condições mais vantajosas do que aquelas que são aplicadas aos outros consumidores, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 4, da Diretiva 2014/92. Por outro lado, o órgão jurisdicional nacional deverá verificar se esta legislação é acompanhada de medidas especiais ou derrogatórias a favor de pessoas que, por razões legítimas que não relativas a uma incapacidade, não possam efetuar uma transferência ou um depósito numa conta de pagamento;

    tal legislação pode constituir uma medida contrária ao princípio da proporcionalidade na medida em que preveja que o montante da coima a que as pessoas singulares ou coletivas ficam sujeitas em caso de violação da regulamentação relativa à limitação dos pagamentos em numerário é calculado com base numa percentagem fixa aplicável ao montante total do pagamento que tenha sido efetuado em violação desta regulamentação e na medida em que exclua qualquer ajuste do montante desta coima em função das circunstâncias concretas do caso.

    V. Conclusão

    132.

    À luz das considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda ao Administrativen sad Blagoevgrad (Tribunal Administrativo de Blagoevgrad, Bulgária) da seguinte forma:

    1)

    Uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal que, para combater a fraude e a evasão e elisão fiscais, proíbe as pessoas singulares ou coletivas de efetuarem, no território nacional, um pagamento em numerário quando este seja de montante igual ou superior ao limiar fixado e exige que estas últimas efetuem uma transferência ou um depósito numa conta de pagamento não está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, e que revoga a Diretiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e a Diretiva 2006/70/CE da Comissão.

    2)

    O artigo 63.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa, justificada pela necessidade de combater a fraude e a evasão e elisão fiscais, se esta for adequada para garantir a realização deste objetivo e se não exceder o necessário para o alcançar.

    Incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar se estas condições estão preenchidas, tendo em conta as seguintes considerações:

    tal legislação só pode alcançar verdadeiramente o referido objetivo se for acompanhada, por um lado, de medidas que tenham em conta a inclusão bancária dos particulares. A este respeito, o órgão jurisdicional nacional deverá certificar‑se, nomeadamente, de que as pessoas mais vulneráveis sem conta bancária têm a possibilidade de aceder a uma conta bancária com características básicas, em condições mais vantajosas do que aquelas que são aplicadas aos outros consumidores, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 4, da Diretiva 2014/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014, relativa à comparabilidade das comissões relacionadas com as contas de pagamento, à mudança de conta de pagamento e ao acesso a contas de pagamento com características básicas. Por outro lado, o órgão jurisdicional nacional deverá verificar se esta legislação é acompanhada de medidas especiais ou derrogatórias a favor de pessoas que, por razões legítimas que não relativas a uma incapacidade, não possam efetuar uma transferência ou um depósito numa conta de pagamento;

    tal legislação pode constituir uma medida contrária ao princípio da proporcionalidade na medida em que preveja que o montante da coima a que as pessoas singulares ou coletivas ficam sujeitas em caso de violação da regulamentação relativa à limitação dos pagamentos em numerário é calculado com base numa percentagem fixa aplicável ao montante total do pagamento que tenha sido efetuado em violação desta regulamentação e na medida em que exclua qualquer ajuste do montante desta coima em função das circunstâncias concretas do caso.


    ( 1 ) Língua original: francês.

    ( 2 ) Trata‑se dos processos apensos Hessischer Rundfunk (C‑422/19 e C‑423/19), atualmente pendentes no Tribunal de Justiça, relativos à compatibilidade com o artigo 2.o, n.o 1, TFUE, lido em conjugação com o artigo 3.o, n.o 1, TFUE; do artigo 128.o, n.o 1, terceiro parágrafo, TFUE; do artigo 16.o, primeiro parágrafo, do Protocolo (n.o 4) relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, e do artigo 10.o, segundo período, do Regulamento (CE) n.o 974/88 do Conselho, de 3 de maio de 1998, relativo à introdução do euro (JO 1998, L 139, p. 1), da legislação alemã que prevê que o devedor da taxa de radiodifusão não pode proceder ao pagamento desta em numerário, mas apenas através de uma cobrança por débito direto, de uma transferência bancária pontual ou de uma ordem de pagamento permanente.

    ( 3 ) COM(2018) 483 final, a seguir «Relatório sobre as restrições aos pagamentos em numerário». Neste relatório, a Comissão Europeia sublinha que vários Estados‑Membros, a maioria membros da Zona Euro, adotaram legislações que restringem os pagamentos efetuados em numerário. Estas medidas são bastante heterogéneas, tanto no que se refere à sua natureza como ao seu âmbito de aplicação, sendo que os limiares dos pagamentos em numerário variam entre 500 euros e 15000 euros (n.o 2.2.2 deste relatório). V., especialmente, o estudo de impacto da Ecorys intitulado «Study on an EU initiative for a restriction on payments in cash», de 15 de dezembro de 2017, disponível no seguinte endereço Internet: https://ec.europa.eu/info/sites/info/files/economyfinance/final_report_study_on_an_eu_initative_ecorys_180206.pdf (p. 67), e ao qual a Comissão se refere.

    ( 4 ) Os Estados-Membros da Zona Euro são obrigados a consultar o BCE sobre qualquer projeto de disposição legal relativo aos meios de pagamento, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, segundo travessão, da Decisão 98/415/CE do Conselho, de 29 de junho de 1998, relativa à consulta do Banco Central Europeu pelas autoridades nacionais sobre projetos de disposições legais (JO 1998, L 189, p. 42).

    ( 5 ) V., no que respeita ao Reino da Bélgica, Avis de la Banque centrale européenne, du 30 mai 2017, relatif à la limitation de l’utilisation des espèces (CON/2017/20); no que respeita à República da Bulgária, Opinion of the European Central Bank, of 11 July 2017, on limitation of cash payments (CON/2017/27) e, por último, no que respeita ao Reino dos Países Baixos, Opinion of the European Central Bank, of 30 December 2019, on limitation to cash payments (CON/2019/46).

    ( 6 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, e que revoga a Diretiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e a Diretiva 2006/70/CE da Comissão (JO 2015, L 141, p. 73).

    ( 7 ) DV n.o 16, de 22 de fevereiro de 2011, a seguir «ZOPB».

    ( 8 ) V., igualmente, Orientações do Ministerstvo na finansite (Ministério das Finanças, Bulgária), de 4 de abril de 2011, relativas à aplicação da ZOPB (a seguir «Orientações relativas à aplicação da ZOPB»), disponíveis no seguinte endereço Internet: https://www.minfin.bg/upload/9272/Ukazanie.PDF.

    ( 9 ) DV n.o 92, de 28 de novembro de 1969; a seguir «ZANN».

    ( 10 ) A seguir «Ecotex».

    ( 11 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro de 2005, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo (JO 2005, L 309, p. 15), conforme alterada pela Diretiva 2010/78/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010 (JO 2010, L 331, p. 120).

    ( 12 ) V. artigo 66.o da Diretiva 2015/849.

    ( 13 ) V. Acórdão de 18 de setembro de 2019, VIPA (C‑222/18, EU:C:2019:751, n.o 52 e jurisprudência referida).

    ( 14 ) Artigo 1.o e considerando 5 da Diretiva 2015/849.

    ( 15 ) As atividades criminosas estão definidas no artigo 3.o, ponto 4), da Diretiva 2015/849.

    ( 16 ) V. artigo 3.o, ponto 4), alínea f), e considerando 11 da Diretiva 2015/849.

    ( 17 ) DV n.o 27, de 27 de março de 2018.

    ( 18 ) DV n.o 16, de 18 de fevereiro de 2003.

    ( 19 ) V. considerandos 23 e 30, bem como artigo 1.o da Diretiva 2015/849.

    ( 20 ) A Comissão e os Estados‑Membros são deste modo obrigados a identificar, a avaliar e a compreender os riscos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, a fim de os atenuar e, eventualmente, a congelar, apreender ou a declarar perdidos a favor do Estado os produtos do crime. Para este efeito, os Estados‑Membros devem exigir às instituições de crédito, primeiro, que apliquem, em função da sua avaliação dos riscos, medidas de diligência quanto à clientela (capítulo II), segundo, que comuniquem as informações sobre os beneficiários efetivos das transações (capítulo III) e, terceiro, que declarem as transações financeiras suspeitas a uma unidade de informação financeira que os Estados‑Membros são especialmente obrigados a instituir (capítulo IV). A fim de assegurar o cumprimento destas obrigações, o legislador da União reconhece, no que respeita às autoridades nacionais competentes, poderes de supervisão e de controlo reforçados em relação às instituições de crédito, e exige, além disso, que os Estados‑Membros prevejam sanções em caso de incumprimento às referidas obrigações.

    ( 21 ) V. Relatório sobre as restrições relativas aos pagamentos em numerário (ponto 2.2.1).

    ( 22 ) V., por analogia, Acórdão de 22 de novembro de 2018, Vorarlberger Landes‑ und Hypothekenbank (C‑625/17, EU:C:2018:939, n.o 27 e jurisprudência referida).

    ( 23 ) V. Acórdão de 7 de setembro de 2017, Eqiom et Enka (C‑6/16, EU:C:2017:641, n.o 44, e jurisprudência referida).

    ( 24 ) V., a este respeito, Acórdão de 6 de junho de 2000, Verkooijen (C‑35/98, EU:C:2000:294, n.o 26 e seguintes), no qual o Tribunal de Justiça declarou que uma operação deste tipo está indissociavelmente ligada a um movimento de capitais.

    ( 25 ) A parte III, ponto 1, das Orientações relativas à aplicação da ZOPB esclarece que a ZOPB regula a limitação de todos os pagamentos nas relações civis e económicas no país, pelo que o tipo de transações, de contratos ou de operações não é, em princípio, pertinente à luz do âmbito da lei, sendo apenas juridicamente pertinente o montante do pagamento previsto, determinável ou efetuado.

    ( 26 ) V. parte IV, ponto 6, destas Orientações.

    ( 27 ) Salvo erro da minha parte, os documentos apresentados pelo órgão jurisdicional de reenvio ao Tribunal de Justiça não permitem determinar o lugar de residência de KS.

    ( 28 ) JO 2010, L 83, p. 70.

    ( 29 ) Ponto 1, alíneas a) e c), desta recomendação.

    ( 30 ) Ponto 2 da referida recomendação.

    ( 31 ) Reunidas no relatório do BCE intitulado «The use of cash by households in the euro area», disponível no seguinte endereço Internet: https://www.ecb.europa.eu/pub/pdf/scpops/ecb.op201.en.pdf.

    ( 32 ) V. ponto 4 do Relatório sobre as restrições relativas aos pagamentos em numerário, no qual também se refere que «o numerário continua a ser o meio de pagamento mais comum na área do euro e continua a representar uma reserva de valor significativa» (ponto 2.1, que se refere ao relatório do BCE intitulado «The use of cash by households in the euro area»).

    ( 33 ) V. Relatório do BCE «The use of cash by households in the euro area», p. 19.

    ( 34 ) V. Relatório do BCE «The use of cash by households in the euro area», p. 25.

    ( 35 ) V. Regulamento (UE) n.o 260/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de março de 2012, que estabelece requisitos técnicos e de negócio para as transferências a crédito e os débitos diretos em euros e que altera o Regulamento (CE) n.o 924/2009 (JO 2012, L 94, p. 22), alterado pelo Regulamento n.o 248/2014, de 26 de fevereiro de 2014 (JO 2014, L 84, p. 1). Como o Tribunal de Justiça salientou no Acórdão de 5 de setembro de 2019, Verein für Konsumenteninformation (C‑28/18, EU:C:2019:673, n.o 18), a SEPA destina‑se a desenvolver, para os pagamentos expressos em euros, os serviços de pagamento comuns à escala da União para substituir os serviços de pagamento nacionais.

    ( 36 ) V. Acórdão de 26 de fevereiro de 2019, X (Sociedades intermediárias estabelecidas em países terceiros) (C‑135/17, EU:C:2019:136, n.o 70 e jurisprudência referida). V., igualmente, Acórdão de 8 de maio de 2019, PI (C‑230/18, EU:C:2019:383, n.o 64 e jurisprudência referida).

    ( 37 ) O artigo 65.o, n.o 1, alínea b), TFUE estabelece que o disposto no artigo 63.o TFUE não prejudica o direito de os Estados‑Membros «[t]omarem todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública».

    ( 38 ) C‑565/18, EU:C:2020:318.

    ( 39 ) V. Acórdão de 30 de abril de 2020, Société Générale (C‑565/18, EU:C:2020:318, n.o 38 e jurisprudência referida). V., igualmente, Acórdão de 23 de fevereiro de 1995, Bordessa e o. (C‑358/93 e C‑416/93, EU:C:1995:54, n.os 19 a 21).

    ( 40 ) C‑135/17, EU:C:2019:136.

    ( 41 ) V. Acórdão de 26 de fevereiro de 2019, X (Sociedades intermediárias estabelecidas em países terceiros) (C‑135/17, EU:C:2019:136, n.o 73 e jurisprudência referida).

    ( 42 ) Os motivos expostos pelo Governo búlgaro nos n.os 53 e seguintes das suas observações são idênticos àqueles que expôs ao BCE no seu pedido de parecer (v. nota de pé de página 5 das presentes conclusões).

    ( 43 ) V. Acórdãos de 25 de abril de 2013, Jyske Bank Gibraltar (C‑212/11, EU:C:2013:270, n.o 66 e jurisprudência referida), e de 19 de dezembro de 2018, Stanley International Betting et Stanleybet Malta (C‑375/17, EU:C:2018:1026, n.o 51 e jurisprudência referida).

    ( 44 ) No seu Relatório sobre as restrições relativas aos pagamentos em numerário, a Comissão indica que tais restrições só têm um impacto limitado na fraude fiscal (n.o 5.2) na medida em que, primeiro, esta depende de outros fatores sociais, económicos e políticos; segundo, uma parte significativa da fraude fiscal não é realizada através de transações efetuadas em numerário, mas através de estruturas e de operações jurídicas sofisticadas que apresentam frequentemente uma dimensão internacional; e, terceiro, uma limitação de pagamentos em numerário não é necessariamente dissuasiva. Em contrapartida, na sua Resolução, de 26 de março de 2019, sobre crimes financeiros e a elisão e a evasão fiscais [2018/2121/(INI), n.o 13], o Parlamento Europeu reconheceu que «apesar das vantagens que apresentam — como a acessibilidade e a rapidez —, as operações em numerário continuam a representar um risco muito elevado em termos de branqueamento de capitais e evasão fiscal, nomeadamente a fraude ao [imposto sobre o valor acrescentado (IVA)]». Nos seus Pareceres sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às informações que acompanham as transferências de fundos» e sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo» (JO 2013, C 271, p. 31, n.o 4.3), o Comité Económico e Social Europeu já tinha sublinhado que os pagamentos em numerário facilitam a economia paralela, ao passo que os meios de pagamento que não em numerário são mais transparentes no plano fiscal e económico, menos onerosos para o conjunto da sociedade, além de práticos, seguros e inovadores.

    ( 45 ) V., a este respeito, disposições enunciadas pelo legislador da União no âmbito do Regulamento (UE) 2015/847 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, relativo às informações que acompanham as transferências de fundos e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1781/2006 (JO 2015, L 141, p. 1). Em França, segundo o rapport annuel de 2018 de l’Observatoire de la sécurité des moyens de paiement de la Banque de France (disponível no seguinte endereço Internet: https://www.banque‑france.fr/sites/default/files/medias/documents/819172_osmp2018_web_3.pdf), a transferência bancária continua a ser o meio de pagamento menos fraudulento, embora veicule os montantes mais significativos (p. 35).

    ( 46 ) Segundo o rapport annuel de 2018 de l’Observatoire de la sécurité des moyens de paiement» de la Banque de France (v. nota de pé de página anterior), o cheque constitui o meio de pagamento mais fraudulento, à frente do cartão bancário, apesar de ser muito menos utilizado (p. 33, bem como pp. 19 e 48 deste relatório).

    ( 47 ) Qualquer empresa legalmente constituída dispõe, em princípio, de uma conta bancária. Trata‑se, com efeito, de uma obrigação para efeitos de inscrição nos registos comerciais e para efeitos de IVA.

    ( 48 ) V., a este respeito, Diretiva 2014/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014, relativa à comparabilidade das comissões relacionadas com as contas de pagamento, à mudança de conta de pagamento e ao acesso a contas de pagamento com características básicas (JO 2014, L 257, p. 214), na qual o legislador da União sublinha que alguns clientes não abrem uma conta de pagamento, quer por esta lhes ser negada, quer por não lhes serem oferecidos produtos adequados (considerando 7). V., igualmente, a título ilustrativo, em França, o rapport annuel de 2019 de l’Observatoire de l’inclusion bancaire» de la Banque de France, disponível no seguinte endereço Internet: https://publications.banque‑france.fr/sites/default/files/medias/documents/oibwebvf.pdf («L’accès au compte et à des services bancaires adaptés», p. 9).

    ( 49 ) C‑422/19 e C‑423/19, EU:C:2020:756, especialmente, n.os 136 a 138.

    ( 50 ) V., especialmente, artigo 2.o, n.o 2, artigo 16.o e considerandos 9, 46 e 48 desta diretiva.

    ( 51 ) Nos termos do artigo 18.o, n.o 4, desta diretiva, os Estados‑Membros podem exigir às instituições de crédito que apliquem valores diferenciados em função do nível de inclusão bancária do consumidor, permitindo designadamente condições mais vantajosas para os consumidores vulneráveis sem conta bancária. No considerando 46 da referida diretiva, o legislador da União precisa que «a fim de assegurar a disponibilidade das contas de pagamento com características básicas para o maior número possível de consumidores, estas deverão ser gratuitas ou ter comissões razoáveis. Para incentivar os consumidores vulneráveis sem conta bancária a participarem no mercado bancário de retalho, os Estados‑Membros deverão poder prever que as contas de pagamento com características básicas sejam oferecidas a esses consumidores em condições particularmente vantajosas, por exemplo a título gratuito».

    ( 52 ) V., a este respeito, Acórdão de 20 de março de 2018, Menci (C‑524/15, EU:C:2018:197, n.o 31).

    ( 53 ) C‑263/11, EU:C:2012:497.

    ( 54 ) V. Acórdão de 19 de julho de 2012, Rēdlihs (C‑263/11, EU:C:2012:497, n.o 45).

    ( 55 ) V. Acórdão de 8 de maio de 2019, PI (C‑230/18, EU:C:2019:383, n.o 64 e jurisprudência referida).

    ( 56 ) Como já indiquei, qualquer empresa legalmente constituída dispõe, em princípio, de uma conta bancária, na medida em que se trata de uma obrigação para efeitos de inscrição nos registos comerciais e para efeitos de IVA.

    ( 57 ) V. nota de pé de página 5 das presentes conclusões. O BCE considerou que esta redução era desproporcionada, tendo em conta o impacto potencialmente negativo no sistema de pagamento em numerário (ponto 2.11 deste parecer).

    ( 58 ) V. Acórdão de 8 de maio de 2019, PI (C‑230/18, EU:C:2019:383, n.o 63 e jurisprudência referida).

    ( 59 ) V. Acórdão de 8 de maio de 2019, PI (C‑230/18, EU:C:2019:383, n.o 64 e jurisprudência referida).

    ( 60 ) V. Acórdão de 2 de junho de 2016, Kapnoviomichania Karelia (C‑81/15, EU:C:2016:398, n.o 48 e jurisprudência referida).

    ( 61 ) V. Acórdão de 21 de fevereiro de 2008, Netto Supermarkt (C‑271/06, EU:C:2008:105, n.o 18 e jurisprudência referida).

    ( 62 ) V., a este respeito, análise efetuada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 20 de março de 2018, Menci (C‑524/15, EU:C:2018:197, n.os 26 a 33).

    ( 63 ) Nos termos deste artigo, o Rayonen sad (Tribunal Regional), em formação de juiz singular, aprecia o mérito da causa e decide mediante sentença através da qual pode confirmar, alterar ou anular a decisão que aplicou a sanção administrativa ou a decisão eletrónica que tenha aplicado a sanção administrativa. A sentença é suscetível de recurso de cassação a interpor no Administrativen sad (Tribunal Administrativo) com os fundamentos previstos no Código de Processo Penal e de acordo com as modalidades previstas no capítulo 12 do Código de Procedimento Administrativo.

    ( 64 ) V. Acórdão de 20 de março de 2018, Menci (C‑524/15, EU:C:2018:197, n.o 32).

    ( 65 ) C‑190/17, EU:C:2018:357.

    ( 66 ) V. Acórdão de 31 de maio de 2018, Zheng (C‑190/17, EU:C:2018:357, n.o 40 e jurisprudência referida).

    ( 67 ) Recordo que, nos termos do artigo 28.o, alínea a), da ZANN, a autoridade nacional responsável por punir a prática da infração está autorizada a não aplicar uma sanção caso a infração seja diminuta, podendo limitar‑se a efetuar uma advertência.

    ( 68 ) Decorre dos termos do artigo 27.o, n.o 2, da ZANN, conforme explicados pelo órgão jurisdicional de reenvio, que a autoridade nacional responsável por punir a prática da infração deve ter em conta o perigo que o ato praticado encerra (natureza, gravidade e a duração da infração) bem como o autor, a natureza da infração praticada (dolosa ou negligente), os motivos da mesma, quaisquer outras circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como a situação patrimonial do autor. No contexto destes esclarecimentos, o órgão jurisdicional de reenvio indica que a legislação nacional em causa não enumera exaustivamente as circunstâncias atenuantes ou agravantes.

    ( 69 ) C‑524/15, EU:C:2018:197.

    ( 70 ) V. Acórdão de 20 de março de 2018, Menci (C‑524/15, EU:C:2018:197, n.o 58).

    ( 71 ) C‑190/17, EU:C:2018:357.

    ( 72 ) N.o 45 deste acórdão.

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