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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62015CC0274

Conclusões da advogada-geral J. Kokott apresentadas em 6 de outubro de 2016.
Comissão Europeia contra Grão-Ducado do Luxemburgo.
Incumprimento de Estado — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 132.°, n.° 1, alínea f) — Isenção de IVA das prestações de serviços realizadas aos seus membros por agrupamentos autónomos de pessoas — Artigo 168.°, alínea a), e artigo 178.°, alínea a) — Direito à dedução dos membros do agrupamento — Artigo 14.°, n.° 2, alínea c), e artigo 28.° — Membro que age em seu nome mas por conta do agrupamento.
Processo C-274/15.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2016:750

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 6 de outubro de 2016 ( 1 )

Processo C‑274/15

Comissão Europeia

contra

Grão‑Ducado do Luxemburgo

«Direito fiscal — Imposto sobre o valor acrescentado — Artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2006/112/CE — Isenção fiscal dos serviços prestados por determinados agrupamentos aos seus membros — Prestação de serviços diretamente necessários ao exercício de uma atividade isenta ou não tributável — Dedução do imposto dos membros do agrupamento — Atuação de um membro do agrupamento em seu próprio nome mas por conta do agrupamento»

I – Introdução

1.

A presente ação intentada pela Comissão Europeia contra o Grão‑Ducado do Luxemburgo tem por objeto o alcance de várias normas de isenção fiscal de IVA do direito luxemburguês relacionadas com a isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado ( 2 ) (a seguir «Diretiva IVA») ( 3 ). Na origem desta isenção está a decisão do legislador da União de, por norma, não permitir que as empresas que realizam prestações de serviços isentas, como é o caso de hospitais, médicos, escolas ou bancos, deduzam o imposto pago a montante. Desta forma, sendo certo que os serviços prestados por estas empresas não são tributados, não é menos verdade que os serviços que lhes são prestados são onerados com IVA. Esta situação conduz a que os serviços prestados ao consumidor final fiquem apenas em parte isentos, uma vez que o IVA, cuja dedução não é possível, é normalmente incluído na formação do preço, sendo então que o seu destinatário acaba, indiretamente, por suportá‑lo.

2.

Esta impossibilidade de dedução do imposto pago a montante, pelos referidos empresários, tem por consequência que a aquisição de elementos (tributáveis) do serviço, que poderiam ser prestados pelos próprios, pode influenciar negativamente a formação do preço, em montante equivalente ao do IVA não dedutível (por exemplo, a limpeza de um consultório médico com recurso a pessoal próprio conduz a um aumento de custos em montante equivalente ao dos custos de pessoal, mas já a limpeza com recurso a uma empresa de limpeza externa conduz a um aumento de custos em montante equivalente ao dos custos de pessoal suportados por essa empresa, ao da respetiva margem de lucro e ao do IVA). Por conseguinte, existe em regra um interesse económico em ser o próprio a prestar o serviço em vez de o adquirir a um outro empresário, com sujeição a IVA. Em suma, no atual sistema do IVA, em que vigora uma isenção fiscal sem dedução do imposto pago a montante, a empresa que presta serviços isentos é tratada como um consumidor final, que também não é devedor de IVA mas que também não pode deduzi‑lo, ainda que preste serviços remunerados ou venda bens.

3.

Contudo, uma vez que também em relação a empresas que prestam serviços isentos são imagináveis situações em que pode ser economicamente razoável, ou mesmo obrigatório, não prestar certas partes do serviço sozinho, mas em conjunto com outras empresas isentas (por exemplo, vários médicos com consultório comum partilham um aparelho de grandes dimensões), o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA isenta também estes serviços do agrupamento, que são prestados aos seus membros. Desta forma, a impossibilidade de dedução do imposto não se reflete na formação do preço, o que por seu turno faz com que se mantenha intocado o alcance da isenção, em relação ao consumidor final, independentemente de o serviço ter sido prestado exclusivamente por uma empresa isenta ou em conjunto por várias empresas isentas.

4.

Na presente ação impõe‑se agora esclarecer se o Grão‑Ducado do Luxemburgo, ao transpor esta isenção e outras normas relevantes do Direito da União em matéria de IVA, para ir ao encontro dos interesses económicos das suas empresas, não foi longe de mais e instituiu um regime que não respeita as regras da concorrência.

II – Quadro jurídico

Direito da União

5.

O artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva IVA descreve o conceito da tributação do valor acrescentado nos seguintes termos:

«Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.»

6.

Segundo o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA, estão sujeitas a IVA «[a]s prestações de serviços efetuadas a título oneroso no território de um Estado‑Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade». Nos termos da alínea a) da mesma disposição aplica‑se o mesmo às «entregas de bens».

7.

Nos termos do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, os Estados‑Membros isentam de IVA as seguintes operações:

«As prestações de serviços efetuadas por agrupamentos autónomos de pessoas que exerçam uma atividade isenta ou relativamente à qual não tenham a qualidade de sujeito passivo, tendo em vista prestar aos seus membros os serviços diretamente necessários ao exercício dessa atividade, quando os referidos agrupamentos se limitarem a exigir dos seus membros o reembolso exato da parte que lhes corresponde nas despesas comuns, desde que tal isenção não seja suscetível de provocar distorções de concorrência.»

8.

O artigo 168.o da Diretiva IVA determina o seguinte, quanto à dedução do IVA que recai sobre os elementos constitutivos do preço (dedução do imposto pago a montante):

«Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado‑Membro em que efetua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor os montantes seguintes:

a)

O IVA devido ou pago nesse Estado‑Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo;

[…]»

9.

O artigo 178.o da Diretiva IVA prevê o seguinte ( 4 ), a propósito do processo de dedução:

«Para poder exercer o direito à dedução, o sujeito passivo deve satisfazer as seguintes condições:

a)

Relativamente à dedução referida na alínea a) do artigo 168.o, no que respeita às entregas de bens e às prestações de serviços, possuir uma fatura emitida em conformidade com os artigos 220.° a 236.°, 238.°, 239.° e 240.°;

[…]»

10.

A Diretiva IVA contém ainda disposições especiais em matéria de contratos de comissão, que têm importância para o caso em apreço. Assim, por um lado, releva o artigo 14.o, n.o 2, que prevê o seguinte quanto a entregas de bens:

«Para além da operação referida no n.o 1, são consideradas entregas de bens as seguintes operações:

c)

A transmissão de um bem efetuada nos termos de um contrato de comissão de compra ou de venda.»

11.

Por outro lado, o artigo 28.o da Diretiva IVA estatui o seguinte, a propósito das prestações de serviços:

«Quando um sujeito passivo participe numa prestação de serviços agindo em seu nome mas por conta de outrem, considera‑se que recebeu e forneceu pessoalmente os serviços em questão.»

12.

Todas as disposições ora relevantes constavam já da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ‑ sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme ( 5 ) (a seguir «Sexta Diretiva»), que foi objeto de nova codificação através da Diretiva IVA. Por conseguinte, a jurisprudência do Tribunal de Justiça, proferida a propósito da Sexta Diretiva, tem igualmente aplicação ao caso em apreço.

Direito luxemburguês

13.

O artigo 44.o, n.o 1, alínea y), da Lei de 12 de fevereiro de 1979 relativa ao IVA (a seguir «Lei luxemburguesa do IVA») prevê uma isenção fiscal cujo conteúdo é idêntico ao da versão em língua francesa do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA.

14.

Para precisar o alcance desta isenção foi aprovado o Regulamento Grão‑Ducal de 21 de janeiro de 2004, relativo à isenção de IVA dos serviços prestados pelos agrupamentos autónomos de pessoas aos seus membros (a seguir «regulamento luxemburguês»).

15.

Segundo o artigo 1.o do regulamento luxemburguês, um agrupamento autónomo de pessoas, na aceção do artigo 44.o, n.o 1, alínea y), da Lei luxemburguesa do IVA, tem de gozar de personalidade jurídica própria [alínea a)] ou de atuar em nome próprio em relação aos seus membros e terceiros [alínea b)]. O Regulamento Grão‑Ducal, de 7 de agosto de 2012, aditou um segundo parágrafo a este artigo. Nele se prevê que o regulamento não se aplica a agrupamentos autónomos cujos serviços sirvam, em relação a um ou mais membros, principalmente para execução de operações tributadas.

16.

O artigo 2.o do regulamento luxemburguês estabelece condições para a aplicação da isenção fiscal prevista no artigo 44.o, n.o 1, alínea y), da Lei luxemburguesa do IVA. Prevê‑se, na alínea a), primeira frase, que a atividade do agrupamento tem de ser composta exclusivamente por serviços diretamente necessários ao exercício da atividade dos membros. Neste sentido, a atividade dos membros tem de ser isenta ou, então, não podem ter, relativamente à mesma, a qualidade de sujeito passivo. Mas segundo a alínea a), segunda frase, também preenchem este pressuposto as pessoas que, no âmbito da sua atividade isenta ou não tributável, realizam igualmente operações tributadas, desde que estas não excedam 30% da totalidade do volume de negócios. O artigo 3.o do regulamento luxemburguês regula outros detalhes deste limiar, no sentido de que em determinadas circunstâncias o referido limite pode ascender a um máximo de 50%.

17.

Além disso, o artigo 4.o do regulamento luxemburguês concede ainda a estas pessoas o direito à dedução do imposto pago pelo agrupamento relativamente aos serviços que lhe foram prestados. Segundo a Circular administrativa n.o 707 de 29 de janeiro de 2004 (a seguir «circular administrativa luxemburguesa»), que determina os documentos que os membros deverão apresentar para o referido efeito, esta transmissão do direito à dedução do imposto tem em vista garantir a neutralidade fiscal.

18.

Por fim, existe uma nota de 18 de dezembro de 2008 ‑ redigida pelo grupo de trabalho para o IVA, que funciona no âmbito do Comité d’Observation des Marchés (Comité de Observação dos Mercados, a seguir «Cobma»), e que segundo o seu texto foi elaborada em colaboração com a Administration de l’Enregistrement et des Domaines (administração tributária luxemburguesa), que também versa sobre a isenção fiscal dos agrupamentos autónomos de pessoas (a seguir «nota do Cobma»). Nessa nota é tratada, entre outras, a questão de saber qual o nome que deve constar da fatura emitida por um terceiro e que se refere a despesas comuns, nos casos em que o agrupamento não tem personalidade jurídica própria. Aí se esclarece que, caso um membro adquira serviços a terceiros em seu próprio nome mas por conta do agrupamento, a afetação da despesa ao agrupamento fica excluída do âmbito de aplicação do IVA.

III – Antecedentes do litígio

19.

Por ofício de 7 de abril de 2011 a Comissão comunicou ao Grão‑Ducado do Luxemburgo que tinha dúvidas acerca da conformidade com o direito da União de várias disposições de direito luxemburguês relacionadas com a transposição da isenção fiscal a que se refere o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA.

20.

A Comissão manteve as suas reservas e, por parecer fundamentado de 27 de janeiro de 2012, instou o Grão‑Ducado do Luxemburgo a tomar as medidas necessárias à adaptação das suas disposições legais às regras do direito da União, no prazo de dois meses.

21.

A Comissão entende, em primeiro lugar, que o Grão‑Ducado do Luxemburgo não respeita o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, na medida em que a isenção prevista no direito luxemburguês também se aplica nos casos em que o agrupamento presta serviços não diretamente necessários à atividade isenta ou não tributável de um membro. Em segundo lugar, contradiz o artigo 168.o, alínea a), e o artigo 178.o, alínea a), da Diretiva IVA conceder aos membros do agrupamento um direito à dedução do imposto relativamente a serviços que foram prestados e faturados não aos membros mas ao agrupamento. Em terceiro lugar, os serviços prestados a um membro, ainda que por conta do agrupamento, têm, nos termos do artigo 14.o, n.o 2, alínea c), e do artigo 28.o da Diretiva IVA, de ser tratados como duas prestações sucessivas e não podem se considerados neutros em matéria de IVA.

IV – Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

22.

Uma vez que o Grão‑Ducado do Luxemburgo não deu cumprimento ao exigido pela Comissão, no prazo fixado para o efeito, esta intentou a 8 de junho de 2015 ação no Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 258.o, segundo parágrafo, TFUE, na qual pede ao Tribunal de Justiça:

declare que, ao prever o regime de IVA relativo aos agrupamentos autónomos de pessoas, tal como definido pelo artigo 44.o, n.o 1, alínea y), da Lei luxemburguesa do IVA, pelos artigos 1.° a 4.° do regulamento luxemburguês, pela circular administrativa luxemburguesa, na parte em que comenta os artigos 1.° a 4.° do regulamento luxemburguês e pela nota do Cobma, incumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva IVA, em especial dos artigos 2.°, n.o 1, alínea c), e 132.°, n.o 1, alínea f), dos artigos 1.°, n.o 2, segundo parágrafo, 168.°, alínea a), 178.°, alínea a), e dos artigos 14.°, n.o 2, alínea c), e 28.° desta diretiva;

condene o Grão‑Ducado do Luxemburgo nas despesas.

23.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo pede que:

julgue a ação parcialmente inadmissível e, quanto ao mais, improcedente, ou, subsidiariamente, totalmente improcedente;

condene a Comissão nas despesas.

24.

As partes apresentaram observações escritas no Tribunal de Justiça e, em 30 de junho de 2016, alegações orais.

V – Apreciação

A – Quanto ao primeiro fundamento da ação: utilização da prestação de serviços pelos membros do agrupamento

25.

Através do seu primeiro fundamento a Comissão invoca a violação do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), e do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA.

26.

De acordo com o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA, em regra todas as prestações de serviços efetuadas por um sujeito passivo estão sujeitas a IVA. O artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA prevê uma isenção para prestações de serviços efetuadas por agrupamentos autónomos aos seus membros. Porém, esta isenção apenas se aplica quando os serviços são diretamente necessários ao exercício de uma atividade isenta ou excluída do âmbito de aplicação do IVA.

27.

Segundo a Comissão, nos termos do artigo 2.o, alínea a), e do artigo 3.o do regulamento luxemburguês, a isenção fiscal consagrada no artigo 44.o, n.o 1, alínea y), da Lei luxemburguesa do IVA também se aplica quando os serviços prestados pelo agrupamento são utilizados em relação à atividade tributada de um membro, desde que o volume de negócios da atividade tributada não exceda 30% ou, em alguns casos, 45% da totalidade do volume de negócios.

1. Admissibilidade do primeiro fundamento da ação

28.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo sustenta que o primeiro fundamento da ação é inadmissível.

29.

Entende que a Comissão, através do primeiro fundamento da ação, ampliou o objeto da ação em relação ao parecer fundamentado. Enquanto neste apenas se censurava o facto de também se isentarem do imposto serviços prestados pelo agrupamento que beneficiam principal ou mesmo exclusivamente o exercício de uma atividade tributada dos membros, a ação não se restringe a esta imputação. A Comissão passou a criticar, em geral, o facto de se admitir a isenção fiscal de serviços prestados pelo agrupamento no contexto de operações tributadas de um seu membro.

30.

Resulta de jurisprudência constante que, nos termos do artigo 258.o TFUE, o objeto de uma ação por incumprimento é delimitado no parecer fundamentado da Comissão, de forma que a ação deve basear‑se nos mesmos fundamentos e argumentos desse parecer ( 6 ). Contudo, a Comissão pode precisar as suas alegações iniciais na petição, desde que não amplie o objeto do litígio ( 7 ).

31.

Resulta de forma clara do seu parecer fundamentado que a Comissão considera que o direito luxemburguês não dá cumprimento à condição do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, segundo a qual o agrupamento tem de prestar serviços diretamente necessários ao exercício de uma atividade do seu membro que seja isenta ou relativamente à qual não tenha a qualidade de sujeito passivo ( 8 ). A Comissão, ao referir, na sua petição, a propósito deste fundamento, que as disposições de direito luxemburguês são ilícitas sempre que os serviços prestados beneficiem uma operação tributada de um membro, está apenas a precisar, em termos admissíveis, a censura que já anteriormente formulara.

32.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo alega ainda que a conduta da Comissão durante o procedimento pré‑contencioso violou o princípio da cooperação leal, a que se encontra sujeita nos termos do artigo 4.o, n.o 3, TUE. Refere que o Grão‑Ducado — depois do termo do prazo fixado para o efeito pela Comissão, no seu parecer fundamentado — informou a Comissão acerca de um aditamento ao artigo 1.o do regulamento luxemburguês ( 9 ), em reação à primeira censura contida no parece fundamentado. A Comissão, durante dezoito meses, não comunicou qualquer reserva a esta alteração, até à comunicação de propositura da ação.

33.

Segundo jurisprudência constante, em regra cabe dentro da margem de livre apreciação da Comissão escolher o momento em que a ação por incumprimento é intentada ( 10 ). O presente caso não se afigura constituir exceção, porventura por se entender que a Comissão, em virtude da sua conduta no procedimento pré‑contencioso, limitou os direitos de defesa do Grão‑Ducado do Luxemburgo. Mais concretamente, a Comissão não tem o dever de se pronunciar, antes da propositura da ação, sobre a adequação das medidas corretivas adotadas pelo Estado‑Membro depois do termo do prazo fixado no parecer fundamentado. Efetivamente, apenas a situação jurídica do Estado‑Membro tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado releva para efeitos de apreciação da existência de um incumprimento ( 11 ) e, por conseguinte, da procedência da ação.

34.

O primeiro fundamento da ação é portanto admissível.

2. Procedência do primeiro fundamento da ação

35.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo alega, subsidiariamente, que o primeiro fundamento da ação também não procede do ponto de vista do mérito.

36.

Segundo o Grão‑Ducado, a isenção do imposto a que se refere o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA é aplicável a agrupamentos cujos membros, para além da sua atividade isenta ou excluída do âmbito de aplicação do IVA, também exercem uma atividade tributada. Contudo, no caso dos serviços prestados por um agrupamento, estão em causa, pela sua própria natureza, despesas comuns, que não podem ser afetadas a uma específica atividade dos respetivos membros. Se, a esta luz, só se isentarem serviços unicamente relacionados com atividades isentas ou excluídas do âmbito de aplicação do IVA, então, na prática, a isenção não tem aplicação.

37.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo faz ainda referência ao aditamento introduzido no regulamento luxemburguês, através da introdução de um n.o 2 ao artigo 1.o ( 12 ), mas esta alegação não releva para efeitos da presente ação. O que é decisivo para a sua apreciação é a situação jurídica luxemburguesa no final de março de 2012, no momento em que expirou o prazo fixado no parecer fundamentado ( 13 ). Sucede que a referida disposição foi introduzida posteriormente, a 7 de agosto de 2012.

38.

Assim, para efeitos de apreciação do primeiro fundamento da ação impõe‑se distinguir duas diferentes condições do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, que resultam inequivocamente da sua letra.

39.

Em primeiro lugar, esta isenção do imposto pressupõe que os membros do agrupamento exerçam uma atividade isenta ou relativamente à qual não tenham a qualidade de sujeito passivo.

40.

Mas além disso, em segundo lugar, a prestação de serviços, para ser isenta, tem de ter por objeto serviços diretamente necessários ao exercício da atividade isenta ou relativamente à qual o membro em questão não tem a qualidade de sujeito passivo. Se, portanto, um membro de um agrupamento exerce, para além de uma atividade isenta, uma atividade tributada, pode continuar a beneficiar de isenção relativamente a serviços que lhe são prestados pelo agrupamento. Contudo, têm de ser diretamente necessários ao exercício da atividade isenta e não ao exercício da atividade tributada.

41.

Em relação a esta segunda condição, que é cumulativa, não existe qualquer razão para, na interpretação do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, nos afastarmos da formulação literal — aliás clara — da disposição. É que a propósito desta disposição o Tribunal de Justiça já declarou, dentro da mesma linha, que, atendendo à necessária interpretação restritiva das isenções no direito em matéria de IVA, é incompatível com a finalidade da disposição interpretar o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA em termos tais que alarguem o seu alcance para além da sua redação precisa ( 14 ).

42.

É verdade que uma interpretação restritiva não pode privar a isenção dos seus efeitos e torná‑la inaplicável na prática ( 15 ). Mas não é o que sucede no caso em apreço. Ao contrário do que afirma o Grão‑Ducado do Luxemburgo, os serviços prestados por um agrupamento aos seus membros não constituem necessariamente despesas comuns e, portanto, não são necessariamente imputáveis à totalidade das suas atividades. Efetivamente, só será assim quando um membro delega no agrupamento o exercício de tarefas que se enquadram na sua atividade de administração geral, como é o caso, por exemplo, da contabilidade. Mas um membro pode também delegar no agrupamento outras atividades, como por exemplo a operação de um equipamento médico de grande dimensão, que apenas tem relação direta com o exercício da sua atividade isenta.

43.

Uma vez que o artigo 2.o, alínea a), do regulamento luxemburguês prevê a isenção também para os casos em que prestação de serviços não é diretamente necessária ao exercício da atividade isenta ou não tributável de um membro do agrupamento, viola o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), e o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA.

44.

Pelo exposto, procede o primeiro fundamento da ação.

B – Quanto ao segundo fundamento da ação: dedução do imposto dos membros do agrupamento

45.

Com o segundo fundamento da ação a Comissão invoca a violação do artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, do artigo 168.o, alínea a), e do artigo 178.o, alínea a), da Diretiva IVA.

46.

De acordo com a Comissão, segundo os termos do artigo 4.o do regulamento luxemburguês, os membros de um agrupamento que exercem uma atividade tributada têm direito a deduzir o imposto pago a montante relativamente aos serviços que foram prestados não aos próprios, mas ao agrupamento, no quadro do exercício da respetiva atividade. Porém, de acordo com as disposições da Diretiva IVA e a jurisprudência do Tribunal de Justiça, neste contexto só o agrupamento é que goza do direito à dedução do imposto, não sendo possível transmiti‑lo para os membros do agrupamento. Além disso, o exercício do direito à dedução do imposto depende, nos termos do artigo 178.o, alínea a), da Diretiva IVA, da posse de uma fatura emitida em nome próprio e não em nome de outra pessoa (concretamente, do agrupamento).

47.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo invoca em sua defesa o teor literal da isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA. Segundo esta norma, as despesas do agrupamento não são as despesas próprias, mas sim as «despesas comuns» dos membros. Segundo o acórdão PPG Holdings ( 16 ), o que importa, para que possa ser reconhecido o direito à dedução do imposto, é, em última análise, quem suportou as despesas em causa ‑ ora, no presente caso quem as suportou foram os membros. O Grão‑Ducado do Luxemburgo acrescenta que se não se reconhecesse aos próprios membros o direito à dedução do imposto se estaria a violar o princípio da neutralidade fiscal, uma vez que o próprio agrupamento não pode deduzir o imposto pago a montante, em seu benefício.

48.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo estabelece, a este propósito, um paralelismo com a compropriedade de imóveis. Também nesse caso os comproprietários, individualmente considerados, gozam do direito à dedução relativamente aos serviços que sejam prestados ao conjunto dos comproprietários.

49.

À defesa do Grão‑Ducado do Luxemburgo subjaz manifestamente o pressuposto de que um agrupamento não é um sujeito passivo, pois é uma entidade «transparente». Por essa razão, as prestações realizadas ao agrupamento, do ponto de vista do IVA, são feitas diretamente aos seus membros. Um agrupamento na aceção do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA — e só relativamente a esses se aplica o regime da dedução do imposto pago a montante aqui em causa — tem de ser um sujeito passivo no sentido do artigo 9.o da Diretiva IVA.

50.

O Tribunal de Justiça já declarou sobre o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), que uma interpretação que vá para além da sua letra, que é clara, não é compatível com a finalidade desta Diretiva ( 17 ). Do seu teor literal resulta que as prestações sejam efetuadas pelo agrupamento «autónomo» enquanto tal, sendo portanto distinto dos seus membros. Dado que a isenção fiscal só é aplicável a prestações que sejam realizadas pelo próprio agrupamento, o agrupamento deve ser sujeito passivo na aceção do artigo 9.o da Diretiva IVA. De outro modo nem existiriam prestações de serviços tributáveis, na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA, que pudessem ser passíveis de isenção. Tributáveis são as prestações de serviços efetuadas «por um sujeito passivo agindo nessa qualidade».

51.

Outra interpretação levaria a que a isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea f) da Diretiva IVA abrangesse igualmente prestações realizadas pelos membros de um agrupamento — que por essa razão não seria autónomo do ponto de vista do IVA — entre si. O que alargaria fortemente esta isenção e, consoante a definição de agrupamento, também tornasse isentas, por exemplo, as prestações realizadas entre sociedades de um grupo. Isso poderia ainda considerar‑se compatível com a finalidade do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), que é a de evitar «que a pessoa que oferece certos serviços seja sujeita ao pagamento do referido imposto quando tenha sido levada a colaborar com outros profissionais através de uma estrutura comum encarregue das atividades necessárias à realização dos referidos serviços» ( 18 ). Mas tal interpretação colidiria, como já vimos, não apenas com o teor literal da isenção mas também com o artigo 11.o da Diretiva IVA, que prevê um regime especial para grupos, sujeito a outras condições, e com o princípio geral da interpretação estrita das isenções fiscais afirmado em jurisprudência constante ( 19 ).

52.

Por conseguinte, devem distinguir‑se os agrupamentos autónomos, na aceção do artigo 132, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, que têm, enquanto tais, a qualidade de sujeito passivo, de simples comportamentos em comum de várias pessoas, em que o agrupamento não tem a qualidade de sujeito passivo. Será provavelmente esse o caso da compropriedade que o Grão‑Ducado do Luxemburgo invocou como comparação. Essa situação deveria ser qualificada como mera atuação em conjunto de várias pessoas ( 20 ).

53.

Se porém o agrupamento a que se refere a regulamentação em análise constituir um sujeito passivo distinto das pessoas que o compõem, então só ele tem o direito à dedução do imposto pago a montante relativamente às prestações de serviços que lhe foram realizadas a montante. Com efeito, nos termos do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA, um sujeito passivo tem direito à dedução do imposto pago a montante em relação aos «bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados […]» ( 21 ).

54.

É certo que ‑ como resulta nomeadamente do acórdão PPG Holdings, invocado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo ‑ pode considerar‑se existir uma utilização pelo próprio dessas prestações a montante ainda que o sujeito passivo tenha delegado serviços que também beneficiam um terceiro ( 22 ). No entanto, daí não brota, de modo algum, um direito à dedução do imposto a favor daquele que nem sequer delegou os referidos serviços e portanto a quem os mesmos não foram prestados, na aceção do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA.

55.

Por fim, o regime constante do artigo 4.o do regulamento luxemburguês também não se afigura necessário para salvaguarda do princípio da neutralidade fiscal. Efetivamente, este princípio significa apenas, na sua componente da neutralidade quanto à carga fiscal ( 23 ), que o empresário deve ficar inteiramente liberto do encargo do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas ( 24 ). Neste sentido, o agrupamento não pode invocar direito à dedução do imposto, nos termos do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, caso preste serviços isentos aos seus membros. Já se o agrupamento prestar serviços necessários ao exercício de uma atividade tributada dos seus membros, então os mesmos não são isentos nos termos do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA ( 25 ). Neste caso, o agrupamento, em relação aos serviços que lhe são prestados, tem direito a dedução do imposto, nos termos do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA, do mesmo modo que o têm os seus membros, em relação aos serviços prestados pelo agrupamento.

56.

Para além da violação do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA, cuja verificação se acabou de constatar, considera‑se que o artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva IVA, que foi igualmente enunciado pela Comissão neste contexto, não assume relevância autónoma, atenta a sua natureza meramente programática.

57.

De resto, afigura‑se não existir a alegada violação, pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, do artigo 178.o, alínea a), da Diretiva IVA.

58.

Nos termos do artigo 178.o, alínea a), da Diretiva IVA, o sujeito passivo, para poder exercer o seu direito à dedução nos termos do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA, tem de possuir uma fatura emitida em conformidade com os artigos 220.° a 236.°, 238.°, 239.° e 240.° Contudo, não é possível extrair desta disposição, ao contrário do que alega a Comissão, que a fatura tem de se encontrar emitida em nome do sujeito passivo que invoca o direito à dedução do imposto perante a administração fiscal. O artigo 226.o, n.o 5, da Diretiva IVA prevê, unicamente, que o nome do destinatário tem de ser mencionado na fatura.

59.

Ora, o direito luxemburguês não diverge desta previsão, pelo facto de reconhecer aos membros de um agrupamento um direito à dedução do imposto que não lhes cabe, nos termos do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA. Por outras palavras: ao fazer‑se constar o agrupamento como destinatário não se está a mencionar um nome errado na fatura; na realidade, o que a menção do nome correto evidencia é que o membro em questão não tem direito à dedução, por não ser o destinatário do serviço. Já se o Grão‑Ducado do Luxemburgo ordenasse a menção na fatura do membro em questão, não obstante não ser o destinatário do serviço, então, aí sim, verificar‑se‑ia uma violação do artigo 226.o, n.o 5, da Diretiva IVA.

60.

Pelo exposto, procede o segundo fundamento da ação, mas apenas na parte em que foi invocada a violação do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva IVA.

C – Quanto ao terceiro fundamento da ação: falta de tributação dos serviços prestados pelos membros ao agrupamento

61.

A Comissão alega, por fim, no terceiro fundamento da ação, terem sido violados o artigo 14.o, n.o 2, alínea c), e o artigo 28.o da Diretiva IVA.

62.

Segundo estas disposições, quando um sujeito passivo que age como intermediário em seu nome mas por conta de outrem realiza prestações a terceiros ou as recebe, considera‑se que foram efetuadas duas prestações de serviços sujeitas a IVA, idênticas e sucessivas. Na nota do Cobma refere‑se, porém, que quando um membro adquire serviços em seu próprio nome mas por conta do agrupamento, a imputação da despesa ao agrupamento não produz efeitos em matéria de IVA.

1. Admissibilidade do terceiro fundamento da ação

63.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo deduz também a exceção de inadmissibilidade do terceiro fundamento da ação.

64.

Segundo alega, a nota do Cobma não é imputável ao Grão‑Ducado do Luxemburgo. O Cobma é um grémio informal, que se encontra organizado de forma particular e que não é reconhecido pelo Estado. Esta conclusão não é minimamente posta em causa pelo facto de a página de «internet» da administração tributária luxemburguesa remeter para a nota do Cobma. Efetivamente, tal só sucede no quadro da rubrica «Atualidades», que dá informações acerca de artigos de imprensa.

65.

A Comissão contrapõe que a administração tributária luxemburguesa é coautora da nota do Cobma, como aliás resulta do respetivo texto. Por conseguinte, o conteúdo da nota espelha a leitura jurídica e a prática seguidas pela administração tributária luxemburguesa.

66.

Uma vez que o Grão‑Ducado do Luxemburgo não contestou a alegação da Comissão, segundo a qual o conteúdo controvertido da nota do Cobma corresponde à leitura jurídica e à prática seguidas pela administração tributária luxemburguesa, não é necessário apurar, aqui, se a própria nota é imputável ao Grão‑Ducado do Luxemburgo. Efetivamente, um Estado‑Membro pode incumprir o direito da União não apenas através de normas jurídicas mas também por via da prática administrativa.

67.

No mesmo sentido, pode ficar em aberto a questão de saber se a alegada falta de imputabilidade ‑ a proceder ‑ afetaria a admissibilidade ou a procedência do terceiro fundamento da ação. Desta forma, o terceiro fundamento da ação é, em todo o caso, admissível.

2. Procedência do terceiro fundamento da ação

68.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo alega, contra a procedência do terceiro fundamento da ação, que a argumentação da Comissão só procederia se o agrupamento e os seus membros fossem independentes um do outro. Mas é exatamente isso que não sucede no caso dos agrupamentos sem personalidade jurídica, que subsistem exclusivamente com base em contrato entre os respetivos membros, e é apenas em relação a estes agrupamentos que se refere ‑ ao contrário do que alega a Comissão ‑ a passagem controvertida da nota do Cobma. É que tais agrupamentos atuam exclusivamente através dos membros que os gerem e não formam necessariamente um sujeito passivo distinto deles. Foi aliás em termos comparáveis que o Tribunal de Justiça decidiu, no âmbito do processo EDM ( 26 ).

69.

O alegado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo tem de ser integralmente rejeitado. Tal como já foi referido, o artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva IVA, ao qual se refere a nota do Cobma, tem precisamente como pressuposto que o agrupamento constitua um sujeito passivo distinto dos respetivos membros ( 27 ).

70.

Segundo o artigo 14.o, n.o 2, alínea c), é considerada uma entrega de bens, nomeadamente, a transmissão de um bem efetuada nos termos de um contrato de comissão de compra. Nos termos do artigo 28.o da Diretiva IVA ficciona‑se, no caso de prestações de serviços, que um sujeito passivo, que aja em seu nome mas por conta de outrem, recebeu e forneceu pessoalmente os serviços em questão. Tal como já foi decidido pelo Tribunal de Justiça no acórdão Henfling e o., a propósito da comissão de venda, o artigo 28.o cria uma ficção jurídica de duas prestações de serviços idênticas que são realizadas sucessivamente pelo comitente ao comissário e por este ao cliente ( 28 ). O mesmo se aplica, inversamente, a propósito da comissão de compra, a que se refere a nota do Cobma.

71.

Resulta das citadas disposições que, no caso de uma comissão de compra ‑ ou seja, os poderes conferidos a terceiro para que este adquira um bem ou uma prestação de serviços em seu nome mas por conta do comitente ‑, em termos de direito em matéria de IVA tudo se processa como se se verificasse um novo fornecimento do bem ou uma nova prestação de serviços, agora do adquirente para o comitente. Não está de acordo com este regime a prática seguida pela administração tributária luxemburguesa, que considera a relação entre o agrupamento e o membro, em linha com a nota do Cobma, como neutra em matéria de IVA. Na medida em que o agrupamento deva reembolsar despesas suportadas com a referida aquisição, subsiste, nesta parte, um contrato de comissão, que se impõe tratar em sintonia com o artigo 14.o, n.o 2, alínea c), e o artigo 28.o da Diretiva IVA.

72.

Desta forma, a prática seguida pela administração tributária luxemburguesa, tal como resulta do regime censurado pela Comissão e plasmado na nota do Cobma, viola o artigo 14.o, n.o 2, alínea c), e o artigo 28.o da Diretiva IVA. Esta conclusão é verdadeira quer o referido regime se aplique à totalidade dos agrupamentos quer se aplique apenas ‑ tal como foi alegado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo ‑ aos agrupamentos sem personalidade jurídica. Neste sentido, a controvérsia entre as partes acerca da abrangência do âmbito de aplicação do regime luxemburguês é irrelevante para a decisão da presente ação.

73.

Por conseguinte, o terceiro fundamento da ação também é procedente.

D – Conclusão e despesas

74.

Em consequência, a ação deve ser julgada totalmente procedente, em relação ao primeiro e ao terceiro fundamentos, e parcialmente procedente, em relação ao segundo fundamento da ação.

75.

Sobre as despesas deverá decidir‑se ao abrigo do artigo 138.o, n.o 3, do Regulamento de Processo. Segundo o aí estatuído, em regra, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma delas suporta as suas próprias despesas. Contudo, tendo em conta as circunstâncias do caso, devem ser imputadas ao Grão‑Ducado do Luxemburgo a totalidade das despesas, ao abrigo da segunda frase da disposição em apreço, uma vez que a improcedência parcial da Comissão, relativamente à imputação de violação adicional do artigo 178.o, alínea a), da Diretiva IVA ( 29 ), não assume importância significativa.

VI – Conclusão

76.

Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que decida a ação intentada pela Comissão contra o Grão‑Ducado do Luxemburgo nos seguintes termos:

1.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo, tendo introduzido e mantido em vigor disposições nos termos das quais isentou do IVA as prestações de serviços efetuadas por agrupamentos autónomos de pessoas aos seus membros, mesmo nos casos em que esses serviços não eram diretamente necessários para o exercício de uma atividade isenta dos membros ou de uma atividade relativamente à qual estes não têm a qualidade de sujeito passivo, incumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), e do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2006/112/CE.

2.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo, tendo introduzido e mantido em vigor disposições que permitem a um membro, na aceção do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2006/12/CE, invocar direito à dedução do imposto pago a montante em relação a serviços que foram prestados não ao próprio, mas ao agrupamento, incumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE.

3.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo, ao prosseguir uma prática administrativa que, no caso da aquisição de bens e de serviços por um membro, na aceção do artigo 132.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2006/112/CE, em seu nome mas por conta do agrupamento, considera a afetação da despesa ao agrupamento como neutra em matéria de IVA, incumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 14.o, n.o 2, alínea c), e do artigo 28.o da Diretiva 2006/112/CE.

4.

No mais, a ação é julgada improcedente.

5.

O Grão‑Ducado do Luxemburgo suporta as despesas.


( 1 ) Língua original: alemão.

( 2 ) JO 2006, L 347, p. 1.

( 3 ) O Tribunal de Justiça, nas últimas décadas, só se pronunciou por três vezes sobre esta isenção fiscal e seus múltiplos pressupostos (acórdãos de 15 de junho de 1989, Stichting Uitvoering Financiële Acties, 348/87, EU:C:1989:246, de 20 de novembro de 2003, Taksatorringen, C‑8/01, EU:C:2003:621, e de 11 de dezembro de 2008, Stichting Centraal Begeleidingsorgaan voor de Intercollegiale Toetsing, C‑407/07, EU:C:2008:713). Contudo, atualmente correm termos junto do Tribunal de Justiça nada mais nada menos que quatro processos com o mesmo objeto. Trata‑se, para além do presente processo, dos processos C‑326/15, DNB Banka, C‑605/15, Aviva, e C‑616/15, Comissão/Alemanha.

( 4 ) Na redação em vigor antes da alteração introduzida pela Diretiva 2010/45/UE do Conselho, de 13 de julho de 2010, que altera a Diretiva 2006/112/CE relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado no que respeita às regras em matéria de faturação (JO 2010, L 189, p. 1), que segundo o seu artigo 2.o, n.o 1, segundo parágrafo, só se aplica a partir de 1 de janeiro de 2013 e que, portanto, não releva para o presente processo.

( 5 ) JO 1977, L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54.

( 6 ) V., entre outros, os acórdãos de 15 de dezembro de 1982, Comissão/Dinamarca (211/81, EU:C:1982:437, n.o 14), de 26 de abril de 2005, Comissão/Irlanda (C‑494/01, EU:C:2005:250, n.o 35), e de 16 de abril de 2015, Comissão/Alemanha (C‑591/13, EU:C:2015:230, n.o 19).

( 7 ) V. os acórdãos de 11 de setembro de 2001, Comissão/Irlanda (C‑67/99, EU:C:2001:432, n.o 23), de 19 de dezembro de 2013, Comissão/Polónia (C‑281/11, EU:C:2013:855, n.o 88), e de 16 de abril de 2015, Comissão/Alemanha (C‑591/13, EU:C:2015:230, n.o 19).

( 8 ) V. n.os 20 e 21 e 68 e 69 do parecer fundamentado.

( 9 ) V. n.o 15 das presentes conclusões.

( 10 ) V., entre outros, os acórdãos de 10 de dezembro de 1968, Comissão/Itália (7/68, EU:C:1968:51, p. 642), de 1 de junho de 1994, Comissão/Alemanha (C‑317/92, EU:C:1994:212, n.o 4), e de 16 de abril de 2015, Comissão/Alemanha (C‑591/13, EU:C:2015:230, n.o 14).

( 11 ) V., entre outros, os acórdãos de 10 de setembro de 1996, Comissão/Alemanha (C‑61/94, EU:C:1996:313, n.o 42), de 26 de abril de 2005, Comissão/Irlanda (C‑494/01, EU:C:2005:250, n.o 29), e de 26 de maio de 2016, Comissão/Grécia (C‑244/15, EU:C:2016:359, n.o 47).

( 12 ) V. n.o 15 das presentes conclusões.

( 13 ) V. n.o 33 das presentes conclusões.

( 14 ) Acórdão de 15 de junho de 1989, Stichting Uitvoering Financiële Acties (348/87, EU:C:1989:246, n.os 13 e 14), a propósito do artigo 13.o, ponto A, n.o 1, alínea f), da Sexta Diretiva.

( 15 ) V. os acórdãos de 20 de novembro de 2003, Taksatorringen (C‑8/01, EU:C:2003:621, n.o 62), e de 11 de dezembro de 2008, Stichting Centraal Begeleidingsorgaan voor de Intercollegiale Toetsing (C‑407/07, EU:C:2008:713, n.o 30), ambos a propósito do artigo 13, ponto A, n.o 1, alínea f), da Sexta Diretiva; v. além disso, a propósito de outras isenções fiscais, os acórdãos de 14 de junho de 2007, Horizon College (C‑434/05, EU:C:2007:343, n.o 16), e de 9 de dezembro de 2015, Fiscale Eenheid X (C‑595/13, EU:C:2015:801, n.o 68).

( 16 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, PPG Holdings (C‑26/12, EU:C:2013:526).

( 17 ) Acórdão de 15 de junho de 1989, Stichting Uitvoering Financiële Acties (348/87, EU:C:1989:246, n.os 13 e 14) sobre o artigo 13.o A, n.o 1, alínea f) da Sexta Diretiva.

( 18 ) Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Stichting Centraal Begeleidingsorgaan voor de Intercollegiale Toetsing (C‑407/07, EU:C:2008:713, n.o 37).

( 19 ) V., entre outros, acórdãos de 26 de junho de 1990, Velker International Oil Company (C‑185/89, EU:C:1990:262, n.o 19), de 16 de setembro de 2004, Cimber Air (C‑382/02, EU:C:2004:534, n.o 25), e de 2 de julho de 2015, De Fruytier (C‑334/14, EU:C:2015:437, n.o 18).

( 20 ) V., a este respeito, o acórdão de 21 de abril de 2005, HE (C‑25/03, EU:C:2005:241, n.os 54 a 56; v. ainda, sobre a relação, do ponto de vista do IVA, entre uma sociedade e os respetivos sócios no que tange à qualidade de sujeito passivo, os acórdãos de 27 de janeiro de 2000, Heerma (C‑23/98, EU:C:2000:46), e de 18 de outubro de 2007, van der Steen (C‑355/06, EU:C:2007:615).

( 21 ) Sublinhado nosso.

( 22 ) V. o acórdão de 18 de julho de 2013, PPG Holdings (C‑26/12, EU:C:2013:526, n.os 19 a 29).

( 23 ) V., a propósito das várias implicações deste princípio, o acórdão de 15 de novembro de 2012, Zimmermann (C‑174/11, EU:C:2012:716, n.os 46 a 48), bem como, ainda, os acórdãos de 17 de maio de 2001, Fischer e Brandenstein (C‑322/99 e C‑323/99, EU:C:2001:280, n.o 76), e de 2 de julho de 2015, NLB Leasing (C‑209/14, EU:C:2015:440, n.o 40).

( 24 ) V., entre outros, os acórdãos de 14 de fevereiro de 1985, Rompelman (268/83, EU:C:1985:74, n.o 19), de 15 de novembro de 2012, Zimmermann (C‑174/11, EU:C:2012:716, n.o 47), e de 28 de julho de 2016, Astone (C‑332/15, EU:C:2016:614, n.o 29).

( 25 ) V. n.os 40 a 42 das presentes conclusões.

( 26 ) Acórdão de 29 de abril de 2004, EDM (C‑77/01, EU:C:2004:243).

( 27 ) V. n.os 49 a 52 das presentes conclusões.

( 28 ) Acórdão de 14 de julho de 2011, Henfling e o. (C 464/10, EU:C:2011:489, n.o 35).

( 29 ) V. n.os 57 a 59 das presentes conclusões.

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