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Documento 62008CJ0393

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 1 de Julho de 2010.
    Emanuela Sbarigia contra Azienda USL RM/A e outros.
    Pedido de decisão prejudicial: Tribunale amministrativo regionale per il Lazio - Itália.
    Legislação nacional que regula os horários de abertura e os dias de encerramento das farmácias - Dispensa - Poder de decisão das autoridades competentes.
    Processo C-393/08.

    Colectânea de Jurisprudência 2010 I-06337

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2010:388

    Processo C‑393/08

    Emanuela Sbarigia

    contra

    Azienda USL RM/A e o.

    (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunale amministrativo regionale per il Lazio)

    «Legislação nacional que regula os horários de abertura e os dias de encerramento das farmácias – Dispensa – Poder de decisão das autoridades competentes»

    Sumário do acórdão

    1.        Questões prejudiciais – Admissibilidade – Limites

    (Artigo 234.° CE)

    2.        Questões prejudiciais – Competência do Tribunal de Justiça

    (Artigo 234.° CE)

    3.        Concorrência – Regras comunitárias – Obrigações dos Estados‑Membros

    (Artigos 10.° CE, 81.° CE e 82.° CE)

    1.        Compete exclusivamente aos órgãos jurisdicionais nacionais, chamados a conhecer do litígio e que devem assumir a responsabilidade pela decisão judicial a proferir, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submetam ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas tenham por objecto a interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir. Daqui decorre que as questões relativas à interpretação do direito da União gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar‑se a responder a um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas.

    (cf. n.os 19, 20)

    2.        Quando, no âmbito de uma questão prejudicial, todos os elementos do litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio estão confinados ao interior de um único Estado‑Membro, a resposta ao órgão jurisdicional de reenvio pode, no entanto, ser útil, nomeadamente no caso de o direito nacional impor que sejam reconhecidos a um cidadão do mesmo Estado‑Membro os mesmos direitos que aqueles que, na mesma situação, seriam conferidos pelo direito da União a um cidadão de outro Estado‑Membro.

    A hipótese evocada no número anterior visa os direitos que um cidadão de outro Estado‑Membro poderia invocar com base no direito da União se se encontrasse na mesma situação que a recorrente no processo principal, que explora uma farmácia numa zona municipal específica e fosse confrontado com uma decisão da Administração nacional competente que aplica uma regulamentação nacional a um pedido que não põe, de modo algum, em causa o sistema geral de regulamentação dos horários de abertura e das férias das farmácias, instituído por esta regulamentação, mas que visa unicamente obter, a título de excepção a este sistema geral, a autorização de renunciar a qualquer período de encerramento.

    Assim, tendo em conta as circunstâncias específicas do processo principal, a interpretação do artigo 49.° CE, pedida pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua decisão, não é manifestamente pertinente para a solução do litígio no processo principal.

    (cf. n.os 23‑25)

    3.        As disposições do direito comunitário em matéria de concorrência, nomeadamente os artigos 81.° CE a 86.° CE, revelam‑se manifestamente inaplicáveis no caso de uma regulamentação nacional relativa à eventual concessão de uma derrogação no que respeita aos períodos de abertura de uma farmácia situada numa zona municipal específica. Tal regulamentação não pode, em si mesma ou por efeito da sua aplicação, afectar o comércio entre os Estados‑Membros na acepção dos artigos 81.° CE e 82.° CE.

    (cf. n.os 29, 32)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    1 de Julho de 2010 (*)

    «Legislação nacional que regula os horários de abertura e os dias de encerramento das farmácias – Dispensa – Poder de decisão das autoridades competentes»

    No processo C‑393/08,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Itália), por decisão de 21 de Maio de 2008, entrado no Tribunal de Justiça em 10 de Setembro de 2008, no processo

    Emanuela Sbarigia

    contra

    Azienda USL RM/A,

    Comune di Roma,

    Assiprofar – Associazione Sindacale Proprietari Farmacia,

    Ordine dei Farmacisti della Provincia di Roma,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: A. Tizzano, presidente de secção, E. Levits (relator), A. Borg Barthet, J.‑J. Kasel e M. Berger, juízes,

    advogado‑geral: N. Jääskinen,

    secretário: R. Şereş, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 17 de Dezembro de 2009,

    vistas as observações apresentadas:

    –        em representação de E. Sbarigia, por V. Cerulli Irelli e M. Di Giandomenico, avvocati,

    –        em representação da Comune di Roma, por R. Murra, avvocato,

    –        em representação da Assiprofar – Associazione Sindacale Proprietari Farmacia, por M. Luciani e I. Perego, avvocati,

    –        em representação da Ordine dei Farmacisti della Provincia di Roma, por S. Cicciotti, avvocato,

    –        em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por M. Russo, avvocato dello Stato,

    –        em representação do Governo helénico, por S. Spyropoulos, Z. Chatzipavlou e V. Karra, na qualidade de agentes,

    –        em representação do Governo neerlandês, por C. M. Wissels e D. J. M. de Grave, na qualidade de agentes,

    –        em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer e T. Kröll, na qualidade de agentes,

    –        em representação da Comissão Europeia, por E. Traversa e C. Cattabriga, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 11 de Março de 2010,

    profere o presente

    Acórdão

    1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 49.° CE, 81.° CE a 86.° CE, 152.° CE e 153.° CE.

    2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe E. Sbarigia, proprietária de uma farmácia, à Azienda Unità Sanitaria Locale «Roma A» (a seguir «ASL RM/A»), autoridade competente da comuna de Roma, a propósito da decisão da ASL RM/A que indefere os pedidos apresentados por E. Sbarigia a fim de obter a autorização de renúncia aos horários e aos períodos de encerramento, nomeadamente ao de encerramento anual de Verão de 2006.

     Quadro jurídico

    3        A legislação aplicável no processo principal é a Lei Regional do Lácio n.° 26, de 30 de Julho de 2002, que regula os horários, o serviço de turnos e as férias das farmácias abertas ao público (Legge Regionale Lazio n.° 26 del 30 juglio 2002, Disciplina dell’orario, dei turni e delle ferie delle farmacie aperte al pubblico, Bollettino Ufficiale della Regione Lazio n.° 23, suplemento ordinário n.° 5, de 20 de Agosto de 2002, e GURI n.° 24, série especial n.° 3, de 14 de Junho de 2003, a seguir «L.R. 26/02»).

    4        Os artigos 2.° a 8.° da L.R. 26/02 fixam os horários de abertura, o serviço voluntário de turnos, o encerramento semanal e as férias anuais das farmácias. São, nomeadamente, impostos horários máximos de abertura, a obrigação de encerramento aos domingos e um meio dia por semana, bem como nos dias feriados, e um período mínimo de férias anuais.

    5        O artigo 10.° da L.R. 26/02 tem a seguinte redacção:

    «1.      Na comuna de Roma, cada [Unidade Sanitária Local (a seguir «USL»)] adopta as medidas da sua própria competência previstas pela presente lei, com o prévio acordo das outras USL interessadas.

    2.      Para os estabelecimentos situados em zonas municipais específicas, o horário semanal de abertura ao público, as férias das farmácias urbanas e o meio dia de descanso semanal […] podem ser alterados por decisão da USL territorialmente competente, com o acordo do presidente da comuna em causa, da ordem provincial dos farmacêuticos e das organizações profissionais provinciais mais representativas das farmácias públicas e privadas.»

     Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    6        E. Sbarigia é proprietária de uma farmácia situada numa zona do centro histórico de Roma, chamada «Tridente». Este bairro, totalmente pedonal, encontra‑se no coração da zona turística desta cidade.

    7        Em razão desta localização e do aumento significativo do número de clientes durante os meses de Julho e Agosto, a recorrente no processo principal apresentou, em 31 de Maio de 2006, um pedido à ASL RM/A, territorialmente competente, com fundamento no artigo 10.°, n.° 2, da L.R. 26/02, a fim de obter a autorização de renúncia ao período de encerramento nas férias de Verão de 2006. Este pedido foi indeferido por decisão de 22 de Junho de 2006, da qual E. Sbarigia interpôs recurso no órgão jurisdicional de reenvio.

    8        Enquanto aguardava a decisão deste recurso, E. Sbarigia solicitou, mediante segundo pedido ampliado, datado de 18 de Outubro de 2006, a dispensa de encerramento por férias anuais e dias feriados, bem como a extensão dos horários de abertura semanal a todo o ano. A este respeito, E. Sbarigia alega que, em 8 de Setembro de 2006, foi concedida uma autorização semelhante a outra farmácia situada nas imediações da estação ferroviária «Termini», cuja clientela específica era a mesma que a da sua farmácia.

    9        A ASL RM/A indeferiu igualmente este segundo pedido, através da decisão n.° 119945/P, de 22 de Março de 2007, contra a qual E. Sbarigia apresentou fundamentos de recurso complementares e requereu medidas de suspensão.

    10      Por despacho de 22 de Junho de 2007, o órgão jurisdicional de reenvio deferiu o pedido de suspensão da execução da decisão de 22 de Março de 2007, a fim de que a ASL RM/A procedesse ao seu reexame.

    11      Em consequência, a ASL RM/A adoptou a decisão n.° 40249, de 1 de Agosto de 2007, através da qual indeferiu de novo o pedido da recorrente no processo principal com base no artigo 10.°, n.° 2, da L.R. 26/02, mediante parecer desfavorável da Comune di Roma, da Ordine dei Farmacisti della Provincia di Roma (Ordem dos Farmacêuticos da província de Roma) assim como das associações profissionais Assiprofar – Associazione Sindacale Proprietari Farmacia (a seguir «Assiprofar») e Confservizi.

    12      E. Sbarigia interpôs recurso desta última decisão invocando novos fundamentos de recurso no âmbito do processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio.

    13      Segundo o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio), o facto de considerar o serviço farmacêutico como um serviço público que garante a protecção da saúde dos utilizadores não é suficiente para justificar as disposições restritivas relativas às modalidades de abertura das farmácias. Uma liberalização dos horários e dos períodos de abertura de todas as farmácias – aliás, preconizada num relatório apresentado em 1 de Fevereiro de 2007 pela Autoritá garante della concorrenza e del mercato (Autoridade nacional garante da concorrência e do mercado) – permitiria aumentar a oferta em geral (uma vez que os planos de repartição garantem uma repartição geográfica equilibrada das farmácias) em proveito dos clientes.

    14      Além disso, as disposições da L.R. 26/02 parecem excessivas e injustificadas. Com efeito, o interesse público e as exigências relacionadas com o serviço farmacêutico estariam indubitavelmente melhor protegidos através de medidas de liberalização das modalidades de abertura das farmácias, favoráveis ao desenvolvimento da concorrência.

    15      Assim, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à compatibilidade das restrições em causa no processo principal com os princípios do direito comunitário em matéria de livre concorrência das empresas, por um lado, assim como com a acção da União Europeia que visa a melhoria e a protecção da saúde, por outro. Em particular, considera que, em sentido contrário a este objectivo, o quadro legislativo relativo à organização do serviço farmacêutico actualmente em vigor na Região do Lácio impede um contributo eficaz para a protecção da saúde pública.

    16      Nestas condições, o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as duas seguintes questões prejudiciais:

    «1)      A imposição [aos farmacêuticos] das proibições de renúncia às férias anuais e de abertura [ao público das farmácias] para além dos limites máximos actualmente permitidos pelas disposições da [L.R. 26/02], e a exigência, por força do [n.° 2] do artigo 10.° desta lei, para a concessão da excepção à referida proibição [na comuna] de Roma, de uma apreciação discricionária prévia da [A]dministração (efectuada em acordo com as entidades e os organismos indicados nesse artigo), sobre a especificidade da zona do município em que se situam as farmácias requerentes, são compatíveis com os princípios comunitários de protecção da livre concorrência e da livre prestação de serviços, consagrados, entre outros, nos artigos 49.° CE [e] 81.° CE [a] 86.° CE?

    2)      A imposição ao serviço público farmacêutico, ainda que com o objectivo de protecção da saúde dos utentes, de requisitos, como os estabelecidos na [L.R. 26/02], que limitam ou proíbem a possibilidade de alargamento diário, semanal e anual do período de abertura dos estabelecimentos farmacêuticos individuais, é compatível com os artigos 152.° CE e 153.° CE?»

     Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

    17      Nas suas observações escritas, os Governos italiano e helénico contestam a admissibilidade do presente pedido de decisão prejudicial. Na audiência, a Assiprofar e, de forma implícita, a Ordine dei Farmacisti della Provincia di Roma emitiram a mesma opinião.

    18      Em particular, o Governo italiano afirma que o órgão jurisdicional de reenvio não fornece nenhuma precisão sobre a situação de facto e de direito que o levou a interrogar‑se sobre a compatibilidade da disposição nacional pertinente com as disposições do Tratado CE que menciona. O Governo helénico, a Assiprofar e a Ordine dei Farmacisti della Provincia di Roma afirmam, por seu turno, que, na falta de um elemento transfronteiriço, as questões prejudiciais não apresentam nenhuma relação com o direito da União.

    19      A este respeito, importa recordar que compete exclusivamente aos órgãos jurisdicionais nacionais, chamados a conhecer do litígio e que devem assumir a responsabilidade pela decisão judicial a proferir, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submetam ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas tenham por objecto a interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir (v. acórdão de 10 de Março de 2009, Hartlauer, C‑169/07, Colect., p. I‑1721, n.° 24 e jurisprudência referida).

    20      Daqui decorre que as questões relativas à interpretação do direito da União gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar‑se a responder a um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (v., neste sentido, acórdãos de 5 de Dezembro de 2006, Cipolla e o., C‑94/04 e C‑202/04, Colect., p. I‑11421, n.° 25, e de 7 de Junho de 2007, van der Weerd e o., C‑222/05 a C‑225/05, Colect., p. I‑4233, n.° 22).

    21      Ora, no que diz respeito à excepção de inadmissibilidade suscitada pelo Governo italiano, impõe‑se declarar que a decisão de reenvio descreve suficientemente o quadro jurídico e factual do litígio no processo principal e que as indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio permitem determinar o alcance das questões submetidas. Assim, a referida decisão deu aos interessados a possibilidade efectiva de apresentar observações em conformidade com o artigo 23.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, como o comprova, aliás, o conteúdo das observações apresentadas no Tribunal de Justiça.

    22      Daqui decorre que esta excepção não pode ser acolhida.

    23      Seguidamente, no que diz respeito aos argumentos suscitados pela Assiprofar, pela Ordine dei Farmacisti della Provincia di Roma e pelo Governo helénico, segundo os quais todos os elementos do litígio no processo principal estão circunscritos ao interior de um único Estado‑Membro, importa recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a resposta deste Tribunal pode ser útil ao órgão jurisdicional de reenvio mesmo em tais circunstâncias, designadamente no caso de o direito nacional lhe impor que conceda a um nacional os mesmos direitos que o direito da União reconhece a um nacional de outro Estado‑Membro que se encontre na mesma situação (v., designadamente, acórdãos de 30 de Março de 2006, Servizi Ausiliari Dottori Commercialisti, C‑451/03, Colect., p. I‑2941, n.° 29; Cipolla e o., já referido, n.° 30; e de 1 de Junho de 2010, Blanco Pérez e Chao Gómez, C‑570/07 e C‑571/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 36).

    24      No caso em apreço, a hipótese evocada na jurisprudência referida no número anterior do presente acórdão visa, no contexto do processo principal, os direitos que um cidadão de outro Estado‑Membro poderia invocar com base no direito da União se se encontrasse na mesma situação que E. Sbarigia, que explora uma farmácia numa zona municipal específica da comuna de Roma, e fosse confrontado com uma decisão da Administração nacional competente que aplica o artigo 10.°, n.° 2, da L.R. 26/02 a um pedido que não põe, de modo algum, em causa o sistema geral de regulamentação dos horários de abertura e das férias das farmácias, instituído por esta lei, mas que visa unicamente obter, a título de excepção a este sistema geral, a autorização de renunciar a qualquer período de encerramento.

    25      Assim, tendo em conta as circunstâncias específicas do processo principal, a interpretação do artigo 49.° CE, pedida pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua decisão, não é manifestamente pertinente para a solução do litígio no processo principal.

    26      Com efeito, como observou o advogado‑geral nos n.os 72 e 73 das suas conclusões, resulta de jurisprudência assente que um nacional de um Estado‑Membro que exerça, de modo estável e continuado, uma actividade profissional num outro Estado‑Membro está abrangido pelo capítulo do Tratado CE relativo ao direito de estabelecimento e não pelo capítulo relativo aos serviços (v., designadamente, acórdãos de 21 de Junho de 1974, Reyners, C‑2/74, Colect., p. 325, n.° 21, e de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, C‑55/94, Colect., p. I‑4165, n.° 28).

    27      Além disso, no que se refere, precisamente, à liberdade de estabelecimento, apesar de o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio não ter pedido expressamente ao Tribunal de Justiça a interpretação do artigo 43.° CE, é evidente que a interpretação deste artigo também não é pertinente no âmbito do litígio pendente no órgão jurisdicional de reenvio.

    28      Com efeito, no caso em apreço, como já foi salientado no n.° 23 do presente acórdão, a farmácia em causa é um estabelecimento estável situado na zona pedonal do centro da cidade de Roma, cujo proprietário, mesmo na hipótese de ser nacional de outro Estado‑Membro, já exercia uma actividade profissional continuada. Portanto, o exercício do direito de estabelecimento consagrado no artigo 43.° CE não está manifestamente em causa no processo principal.

    29      Após esta precisão, cumpre declarar que também as outras disposições do direito comunitário em matéria de concorrência, cuja interpretação é pedida pelo órgão jurisdicional de reenvio, nomeadamente os artigos 81.° CE a 86.° CE, se revelam manifestamente inaplicáveis num contexto como o do processo principal.

    30      Com efeito, há que salientar, em primeiro lugar, que os artigos 83.° CE a 85.° CE não revestem qualquer pertinência no âmbito do litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio, já que se trata quer de disposições de carácter meramente processual (artigos 83.° CE e 85.° CE) quer de disposições transitórias (artigo 84.° CE).

    31      Em segundo lugar, no que se refere aos artigos 81.° CE e 82.° CE, embora seja verdade que estes dizem unicamente respeito ao comportamento das empresas e não visam medidas legislativas ou regulamentares que emanam dos Estados‑Membros, não é menos certo que estes artigos, lidos em conjugação com o artigo 10.° CE, que institui um dever de cooperação, impõem aos Estados‑Membros que não tomem nem mantenham em vigor medidas, mesmo de natureza legislativa ou regulamentar, susceptíveis de eliminar o efeito útil das regras de concorrência aplicáveis às empresas (v. acórdão Cipolla e o., já referido, n.° 46 e jurisprudência referida).

    32      Todavia, a este respeito, é evidente que a regulamentação nacional em causa no processo principal, relativa à eventual concessão de uma derrogação no que respeita aos períodos de abertura de uma farmácia situada numa zona municipal específica da comuna de Roma, não pode, em si mesma ou por efeito da sua aplicação, afectar o comércio entre os Estados‑Membros na acepção dos artigos 81.° CE e 82.° CE (v., a contrario, acórdãos de 17 de Outubro de 1972, Vereniging van Cementhandelaren/Comissão, 8/72, Colect., p. 333, n.° 29; de 10 de Dezembro de 1991, Merci convenzionali porto di Genova, C‑179/90, Colect., p. I‑5889, n.os 14 e 15; e de 19 de Fevereiro de 2002, Arduino, C‑35/99, Colect., p. I‑1529, n.° 33).

    33      Consequentemente, deve considerar‑se que, na medida em que diz respeito às disposições dos artigos 81.° CE e 82.° CE, a primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio é inadmissível.

    34      Em terceiro lugar, do facto de as ditas disposições do direito da União em matéria de concorrência não serem aplicáveis no processo principal resulta que o artigo 86.° CE também não é aplicável.

    35      No que se refere ao artigo 28.° CE, evocado por alguns interessados que apresentaram observações no Tribunal de Justiça, impõe‑se declarar, com a preocupação de ser exaustivo, que, pelas razões evocadas no n.° 32 do presente acórdão, devem igualmente excluir‑se, à partida, a afectação do comércio entre os Estados‑Membros e, portanto, a possibilidade de entrave à livre circulação de mercadorias.

    36      Daqui decorre que a interpretação do artigo 28.° CE não é pertinente para a solução do litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio.

    37      Por fim, no que diz respeito aos artigos 152.° CE e 153.° CE, evocados pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua segunda questão, basta salientar que, como alegou o advogado‑geral nos n.os 48 a 51 das suas conclusões, e como salientaram quase todos os interessados que apresentaram observações no presente processo, os referidos artigos têm por destinatários as instituições da União e os Estados‑Membros, e não podem manifestamente ser invocados para examinar a conformidade de medidas nacionais com o direito da União.

    38      Decorre do exposto que o presente pedido de decisão prejudicial é inadmissível.

     Quanto às despesas

    39      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

    O pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunale amministrativo regionale per il Lazio, por decisão de 21 de Maio de 2008, é inadmissível.

    Assinaturas


    * Língua do processo: italiano.

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