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Documento 62004CJ0131

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 16 de Março de 2006.
    C. D. Robinson-Steele contra R. D. Retail Services Ltd (C-131/04), Michael Jason Clarke contra Frank Staddon Ltd e J. C. Caulfield e outros contra Hanson Clay Products Ltd (C-257/04).
    Pedidos de decisão prejudicial: Employment Tribunal, Leeds (C-131/04) e Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (C-257/04) - Reino Unido.
    Política social - Protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores - Directiva 93/104/CE - Direito a férias anuais remuneradas - Inclusão de pagamentos por conta das férias na remuneração horária ou diária ("rolled-up holiday pay').
    Processos apensos C-131/04 e C-257/04.

    Colectânea de Jurisprudência 2006 I-02531

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2006:177

    Processos apensos C‑131/04 e C‑257/04

    C. D. Robinson‑Steele e o.

    contra

    R. D. Retail Services Ltd e o.

    [pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Employment Tribunal, Leeds, e pela Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division)]

    «Política social – Protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores – Directiva 93/104/CE – Direito a férias anuais remuneradas – Inclusão de pagamentos por conta das férias na remuneração horária ou diária (‘rolled‑up holiday pay’)»

    Conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl apresentadas em 27 de Outubro de 2005 

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 16 de Março de 2006 

    Sumário do acórdão

    1.     Política social – Protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores – Directiva 93/104 relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho – Direito a férias anuais remuneradas

    (Directiva 93/104 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1)

    2.     Política social – Protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores – Directiva 93/104 relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho – Direito a férias anuais remuneradas

    (Directiva 93/104 do Conselho, artigo 7.°)

    3.     Política social – Protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores – Directiva 93/104 relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho – Direito a férias anuais remuneradas

    (Directiva 93/104 do Conselho, artigo 7.°)

    1.     O artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 93/104, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, opõe‑se a que uma parte da remuneração paga ao trabalhador a título de trabalho prestado seja afectada ao pagamento das férias anuais, não auferindo o trabalhador, a esse título, um pagamento adicional ao efectuado a título do trabalho prestado. Esse direito não pode ser derrogado por acordo.

    (cf. n.° 52, disp. 1)

    2.     O artigo 7.° da Directiva 93/104, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, opõe‑se a que o pagamento do período mínimo de férias anuais na acepção dessa disposição seja objecto de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente e pago juntamente com a remuneração correspondente ao trabalho prestado e não de um pagamento correspondente a um período determinado em que o trabalhador goze efectivamente férias.

    (cf. n.° 63, disp. 2)

    3.     O artigo 7.° da Directiva 93/104, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, não se opõe, em princípio, a que os montantes que tenham sido pagos, de modo transparente e inteligível, a título de férias anuais mínimas na acepção dessa disposição, sob a forma de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente, e pagos juntamente com a remuneração a título de trabalho prestado sejam imputados no pagamento de umas férias determinadas efectivamente gozadas pelo trabalhador.

    Todavia, os Estados‑Membros são obrigados a tomar as medidas adequadas para garantir que não sejam mantidas práticas contrárias ao disposto no artigo 7.° da directiva.

    (cf. n.os 67, 69, disp. 3)




    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    16 de Março de 2006 (*)

    «Política social – Protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores – Directiva 93/104/CE – Direito a férias anuais remuneradas – Inclusão de pagamentos por conta das férias na remuneração horária ou diária (‘rolled‑up holiday pay’)»

    Nos processos apensos C‑131/04 e C‑257/04,

    que têm por objecto dois pedidos de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentados pelo Employment Tribunal, Leeds (Reino Unido) (C‑131/04), e pela Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (Reino Unido) (C‑257/04), por decisões de 9 de Março e 15 de Junho de 2004, entrados no Tribunal de Justiça, respectivamente, em 11 de Março e 16 de Junho de 2004, nos processos

    C. D. Robinson‑Steele (C‑131/04)

    contra

    R. D. Retail Services Ltd,

    Michael Jason Clarke (C‑257/04)

    contra

    Frank Staddon Ltd,

    e

    J. C. Caulfield,

    C. F. Caulfield,

    K. V. Barnes

    contra

    Hanson Clay Products Ltd, anteriormente Marshalls Clay Products Ltd,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: P. Jann, presidente de secção, K. Schiemann, N. Colneric (relatora), K. Lenaerts e E. Juhász, juízes,

    advogada‑geral: C. Stix‑Hackl,

    secretário: L. Hewlett, administradora principal,

    vistos os autos e após a audiência de 15 de Setembro de 2005,

    vistas as observações apresentadas:

    –       em representação da R. D. Retail Services Ltd, por J. Eady, solicitor,

    –       em representação de M. J. Clarke, J. C. Caulfield, C. F. Caulfield e K. V. Barnes, por A. Hogarth, QC,

    –       em representação da Hanson Clay Products Ltd, anteriormente Marshalls Clay Products Ltd, por J. Eady, solicitor,

    –       em representação do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, por R. Caudwell e C. White, na qualidade de agentes, assistidas por T. Linden, barrister,

    –       em representação da Irlanda, por D. J. O’Hagan, na qualidade de agente, assistido por N. Hyland e N. Travers, BL,

    –       em representação do Reino dos Países Baixos, por H. G. Sevenster, na qualidade de agente,

    –       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por M.‑J. Jonczy e N. Yerrell, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 27 de Outubro de 2005,

    profere o presente

    Acórdão

    1       Os pedidos de decisão prejudicial têm por objecto a interpretação do artigo 7.° da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho (JO L 307, p. 18, a seguir «directiva»).

    2       Estes pedidos foram apresentados no âmbito de acções relativas ao pagamento das férias anuais por meio da sua inclusão na remuneração horária ou diária, regime designado pela expressão «rolled‑up holiday pay».

     Quadro jurídico

     Regulamentação comunitária

    3       A directiva foi adoptada com base no artigo 118.°‑A do Tratado CE (os artigos 117.° a 120.° do Tratado CE foram substituídos pelos artigos 136.° CE a 143.° CE). No seu artigo 1.°, n.° 1, estabelece prescrições mínimas de segurança e de saúde em matéria de organização do tempo de trabalho.

    4       A secção II da directiva prevê as medidas que os Estados‑Membros devem tomar para que todos os trabalhadores beneficiem de um período mínimo de descanso diário, de descanso semanal e de férias anuais remuneradas. Regulamenta igualmente o tempo de pausa e a duração máxima semanal de trabalho.

    5       No que respeita às férias anuais, o artigo 7.° da directiva dispõe:

    «1.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que todos os trabalhadores beneficiem de férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas, de acordo com as condições de obtenção e de concessão previstas nas legislações e/ou práticas nacionais.

    2.      O período mínimo de férias anuais remuneradas não pode ser substituído por retribuição financeira, excepto nos casos de cessação da relação de trabalho.»

    6       Nos termos do artigo 15.° da directiva:

    «A presente directiva não impede os Estados‑Membros de aplicarem ou introduzirem disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis à protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores, ou de promoverem ou permitirem a aplicação de convenções colectivas ou acordos celebrados entre parceiros sociais mais favoráveis à protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores.»

    7       O artigo 17.° da directiva prevê a faculdade de derrogar, verificadas determinadas condições, várias das suas disposições, sem todavia mencionar o artigo 7.° da mesma directiva.

    8       O artigo 18.°, n.° 3, da directiva dispõe:

    «Sem prejuízo do direito de os Estados‑Membros desenvolverem, face à evolução da situação, disposições legislativas, regulamentares e contratuais diferentes no domínio do tempo de trabalho, desde que sejam respeitados os requisitos mínimos previstos na presente directiva, a aplicação desta não pode constituir justificação válida para fazer regredir o nível geral de protecção dos trabalhadores.»

     Legislação nacional

    9       O Regulamento de 1998 relativo ao tempo de trabalho (Working Time Regulations 1998, S.I. 1998, n.° 1833, a seguir «Regulations 1998»), adoptado para transpor a directiva para a ordem jurídica interna do Reino Unido, entrou em vigor em 1 de Outubro de 1998.

    10     A regulation 13 das Regulations 1998, intitulada «Direito a férias anuais», dispõe:

    «(1)      [...] [O] trabalhador tem direito a quatro semanas de férias por ano.

    [...]

    (9)      As férias a que o trabalhador tem direito nos termos da presente regulation podem ser gozadas de forma repartida, mas:

    (a)      só podem ser gozadas no ano em que se vencem e

    (b)      não podem ser substituídas por uma retribuição financeira, excepto no caso de cessação da relação de trabalho.

    […]»

    11     A regulation 16 das Regulations 1998, intitulada «Retribuição do período de férias», prevê:

    «(1)      O trabalhador tem direito a retribuição por qualquer período de férias de que beneficie nos termos da regulation 13, no valor correspondente a uma semana de trabalho por cada semana de férias.

    [...]

    (4)      O direito à retribuição de férias prevista no paragraph 1 não afecta o direito do trabalhador à retribuição de férias estipulada no seu contrato (‘retribuição contratual’).

    (5)      A retribuição contratual paga a um trabalhador por um período de férias desonera o empregador de qualquer responsabilidade pela retribuição desse mesmo período de férias nos termos da presente regulation; inversamente, o pagamento da retribuição de um período de férias nos termos da presente regulation desonera o empregador de qualquer responsabilidade pelo pagamento da retribuição contratual correspondente a esse período de férias.

    [...]»

    12     A regulation 30 das Regulations 1998, intitulada «Recurso aos tribunais», dispõe que um trabalhador pode intentar uma acção num Employment Tribunal, nomeadamente quando o seu empregador não lhe permitir o exercício do seu direito a férias nos termos da regulation 13 [regulation 30(l)(a)] ou não lhe pagar a totalidade ou parte de uma soma que lhe é devida nos termos da regulation 16(1) [regulation 30(l)(b)]. A este respeito, a regulation 30(3) a (5) das Regulations 1998 prevê:

    «(3)      Se uma acção intentada num Employment Tribunal nos termos do paragraph 1(a) for julgada procedente, o tribunal

    (a)      declara‑o e

    (b)      pode condenar o empregador no pagamento de uma compensação ao trabalhador.

    (4)      O tribunal fixa a compensação no montante que julgar justo e equitativo, tendo em conta todas as circunstâncias, designadamente:

    (a)      a falta cometida pelo empregador ao não permitir que o trabalhador exerça o seu direito e

    (b)      qualquer prejuízo sofrido pelo trabalhador decorrente dos factos imputados ao empregador.

    (5)      Quando um Employment Tribunal que conheça de uma acção nos termos do paragraph 1(b), verificar que um empregador não efectuou o pagamento previsto na regulation 16(1) […] a um trabalhador, ordena que o empregador pague ao trabalhador o montante que considerar que lhe é devido.»

     Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

     Processo C‑131/04

    13     C. D. Robinson‑Steele trabalhou para a R. D. Retail Services Ltd (a seguir «Retail Services») de 19 de Abril de 2002 a 19 de Dezembro de 2003. A Retail Services disponibiliza os serviços dos seus trabalhadores a grandes empresas do sector da venda a retalho. Os trabalhadores prestam serviços de decoração de lojas e reposição de existências.

    14     C. D. Robinson‑Steele trabalhava por turnos diurnos de doze horas durante cinco dias ou por turnos nocturnos, também de doze horas, durante quatro dias, e fê‑lo continuamente durante o referido período em que esteve ao serviço da demandada, excepto durante uma semana de férias no Natal de 2002, que não foi remunerada separadamente.

    15     As cláusulas do seu contrato de trabalho foram sendo alteradas ao longo da relação de trabalho. A partir de 29 de Junho de 2003, a sua relação de trabalho passou a reger‑se por um contrato designado «Condições aplicáveis à contratação de trabalhadores temporários». A cláusula pertinente desse contrato dispõe: «O direito à remuneração das férias vence‑se de forma proporcional ao tempo de trabalho contínuo prestado, no ano a que dizem respeito as férias, pelo trabalhador temporário contratado. O trabalhador temporário aceita que a remuneração relativa ao direito a férias seja paga simultaneamente com a sua retribuição horária, no montante correspondente a 8,33% do valor desta última.»

    16     O órgão jurisdicional de reenvio explica que, do ponto de vista matemático, a percentagem de 8,33% corresponde exactamente a uma semana de retribuição na sequência de uma prestação contínua de trabalho durante três meses no regime de turnos diurnos e nocturnos em causa.

    17     C. D. Robinson‑Steele recebia o seu salário semanalmente. A remuneração horária era de 6,25 GBP para os turnos diurnos e de 7,75 GBP para os turnos nocturnos. Os recibos de salário continham a seguinte menção: «A retribuição compreende a remuneração das férias e das faltas por doença.»

    18     Em 14 de Janeiro de 2004, C. D. Robinson‑Steele intentou uma acção no Employment Tribunal, Leeds, em que alegava que tinha trabalhado durante 20 meses para a Retail Services e que, relativamente à retribuição das férias anuais, só lhe tinha sido pago o «rolled‑up holiday pay». Isto significa, na maioria dos casos, que as férias não foram gozadas, uma vez que não foram pagas imediatamente antes ou depois nem durante o período de férias.

    19     O Employment Tribunal explica que, se C. D. Robinson‑Steele tiver razão quanto à ilegalidade da cláusula «rolled‑up holiday pay», o conteúdo da sua decisão dependerá da questão de saber se essa violação equivale a uma recusa do empregador de autorizar C. D. Robinson‑Steele a exercer o seu direito a férias anuais ou se significa que o empregador não pagou, no todo ou em parte, a soma devida a título de remuneração de férias.

    20     Esse órgão jurisdicional observa que as disposições nacionais adoptadas para dar execução às obrigações decorrentes da directiva têm vindo a ser objecto de interpretações diferentes pelos tribunais nacionais. O Employment Appeal Tribunal decidiu que uma cláusula contratual de «rolled‑up leave pay» na qual se fixava expressamente um montante ou percentagem a adicionar à retribuição base, não era ilegal à luz da directiva e da regulamentação nacional, decisão que o vincula. O Inner House of the Court of Session (Scotland), no processo MPS Structure LTD/Munro [(2003), IRLR 350], foi de opinião contrária. Segundo o Employment Tribunal, é essencial não só que as férias anuais sejam pagas mas também que o sejam na altura do gozo das férias. O sistema «rolled‑up holiday pay» tem tendência, em violação dos objectivos da directiva, a dissuadir os trabalhadores de gozar as férias que teriam gozado se não existisse essa cláusula.

    21     Foi nessas circunstâncias que o Employment Tribunal, Leeds, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)      O artigo 7.° da [d]irectiva […] é compatível com uma legislação nacional que permite que a retribuição das férias anuais seja incluída na retribuição horária do trabalhador e seja considerada parte da retribuição correspondente ao tempo de trabalho, mas sem ser paga relativamente a um período de férias efectivamente gozado pelo trabalhador?

    2)      O artigo 7.°, n.° 2, [da directiva] obsta a que um órgão jurisdicional nacional considere válidos esses pagamentos do empregador quando pretende conceder uma protecção efectiva ao demandante em conformidade com as competências previstas na legislação nacional?»

     Processo C‑257/04

    22     A sociedade Frank Staddon Ltd (a seguir «Frank Staddon») exerce a sua actividade na indústria da construção. M. J. Clarke trabalhou para essa empresa como pedreiro/cortador de tijolos.

    23     Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, aparentemente, M. J. Clarke trabalhou para a Frank Staddon de 2 de Abril a 23 de Junho de 2001. Depois, esteve de férias até 24 de Julho de 2001, data em que recomeçou a trabalhar para a referida sociedade. Entre 23 de Junho de 2001 e 24 de Julho de 2001, não foi remunerado.

    24     O contrato de M. J. Clarke dispõe: «Todos os montantes devidos a título de pagamento das férias e feriados estão incluídos na remuneração diária.» O mesmo documento contém uma anotação manuscrita sob o título «Remuneração»: «Base 8,689 Férias 0,756 = 85 GBP por dia». De um recibo de salário aparentemente datado de Agosto de 2001 consta o mesmo cálculo.

    25     A remuneração diária de 85 GBP refere‑se apenas ao período que se iniciou em 24 de Julho de 2001. A remuneração diária em 2 de Abril de 2001 era de 80 GBP e ascendia a 82,50 GBP em Junho. Aparentemente, antes de Agosto de 2001, a Frank Staddon não procedeu à discriminação relativa ao montante das férias pagas incluído na remuneração diária.

    26     Por petição apresentada no Employment Tribunal em 20 de Novembro de 2001, M. J. Clarke intentou uma acção em que pediu a condenação da Frank Staddon no pagamento das férias anuais acumuladas durante o período compreendido entre 2 de Abril e 16 de Novembro de 2001.

    27     Por decisão de 19 de Abril de 2002, o Employment Tribunal julgou a acção improcedente. M. J. Clarke interpôs recurso dessa decisão no Employment Appeal Tribunal que, em 25 de Julho de 2003, no essencial, negou provimento ao recurso. Recorreu então para a Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) desta decisão.

    28     Segundo a Court of Appeal, o Employment Tribunal considerou que havia uma interrupção na continuidade do contrato do recorrente devido ao período em que este esteve de férias de 23 de Junho a 24 de Julho de 2001. As partes celebraram um novo contrato em 24 de Julho do mesmo ano. Estas circunstâncias têm efeitos no montante de qualquer reembolso que M. J. Clarke poderia obter se demonstrasse a violação da directiva ou das Regulations 1998, mas não afectam a questão de princípio relativa ao «rolled‑up holiday pay».

    29     Segundo a Court of Appeal, o Employment Appeal Tribunal tinha ordenado que o processo baixasse ao Employment Tribunal a fim de determinar se, antes do mês de Agosto de 2001, tinha havido uma afectação contratual de uma percentagem ou de uma parte da remuneração diária à remuneração das férias e se tinha havido uma interrupção na relação de trabalho de M. J. Clarke.

    30     A sociedade Marshalls Clay Products Ltd (a seguir «Marshalls Clay») exerce a actividade de manufactura de produtos de argila para a indústria de construção. J. C. Caulfield, C. F. Caulfield e K. V. Barnes (a seguir «J. C. Caulfield e o.») eram trabalhadores dessa empresa como operários não qualificados.

    31     Em 1984, a Marshalls Clay adoptou um sistema de trabalho por turnos, dito «continental», que consistia em cada empregado trabalhar quatro dias, seguidos de quatro dias de descanso. No período considerado, a fábrica onde J. C. Caulfield e o. trabalhavam, em Accrington, funcionava sete dias por semana, com excepção do dia de Natal e do dia 26 de Dezembro.

    32     Os empregados eram remunerados apenas pelos quatro dias em que trabalhavam e, portanto, não o eram pelos quatro dias em que não trabalhavam.

    33     Um acordo colectivo local, assinado em 9 de Julho de 1984, na sequência de uma reunião entre a Marshalls Clay e o sindicato GMB, e incorporado no contrato de trabalho de cada empregado, dispunha:

    «3.      FÉRIAS

    A retribuição das férias está incluída na remuneração horária, pelo que não há lugar ao pagamento de retribuição de férias em acréscimo a esta última. As férias são gozadas durante os períodos de descanso previstos no sistema de rotação por turnos. De modo a poderem ser organizados períodos de férias alargados, cada pessoa terá direito a:

    dois períodos de oito dias consecutivos

    e

    um período de dezasseis dias consecutivos.

    Estes períodos são acordados no local. (Isto significa que quando um turno goza um período de férias, quer seja de oito ou dezasseis dias consecutivos, o outro turno estará a trabalhar.)»

    34     Esse acordo colectivo, além disso, dispunha:

    «Actualmente, os operários da Accrington auferem 31 dias de retribuição de férias por ano (para 29 dias de férias). Assim, a proporção em relação aos dias de trabalho (232) é de 13,36%. A retribuição horária inclui 13,36% como retribuição de férias.»

    35     A remuneração horária aplica‑se também às horas extraordinárias de modo que, quando os empregados fazem horas extraordinárias, recebem em função dessas horas, o que também faz parte da convenção colectiva, acréscimos de 30%, 50% ou 100% da remuneração de base e do pagamento de férias.

    36     Segundo o Employment Appeal Tribunal, nos termos desse regime contratual, os empregados podem gozar, embora não tenham que o fazer, dois períodos de férias de oito dias consecutivos ou um período de dezasseis dias, mas apenas acumulando ou juntando os seus dias de descanso e, através de uma série de trocas mutuamente acordadas, trabalhando nos turnos de outros empregados.

    37     Cada um dos recorrentes no processo Caulfield e o. gozou férias em Junho de 2001. Os períodos variaram até 16 dias. Estes recorrentes também tiraram dias de descanso. Nos termos dos acordos de trabalho por turnos em vigor na Marshalls Clay, J. C. Caulfield e o. foram escalados para trabalhar 182 dias por ano. Nos termos das disposições do acordo colectivo no que se refere ao pagamento de férias, 13,36% da remuneração dos recorrentes era relativa às férias pagas. Por outras palavras, por trabalhar 182 dias por ano, cada recorrente recebeu 24,32 dias como pagamento de férias: em cada 7,515 GBP pagas por hora de trabalho, 6,629 GBP referem‑se ao tempo de trabalho efectivo e 88,6 pence constituem o acréscimo por conta do pagamento das férias.

    38     Por petições de 3 de Setembro de 2001, J. C. Caulfield e o. intentaram acções no Employment Tribunal, Manchester, em que pediam a condenação da Marshalls Clay a pagar, a cada um deles, as férias anuais relativas ao período compreendido entre 1 de Outubro de 1998 e 3 de Setembro de 2001.

    39     Por decisão de 12 de Dezembro de 2002, esse tribunal julgou os pedidos de J. C. Caulfield e o. procedentes e ordenou a liquidação posterior do montante da compensação que lhes foi atribuída.

    40     A Marshalls Clay interpôs recurso para o Employment Appeal Tribunal. Este tribunal julgou o recurso procedente. J. C. Caulfield e o. interpuseram então recurso para a Court of Appeal.

    41     Perante este último tribunal, J. C. Caulfield e o. invocaram que os acordos contratuais celebrados objecto deste processo constituem uma violação manifesta da directiva porque não permitem gozar nenhumas férias anuais. Um trabalhador que, durante um ano, fizesse uso da disposição do contrato que prevê um período de férias prolongado de oito ou de dezasseis dias trabalharia tanto – nem um dia a menos – que um colega seu que não gozasse essas férias e que apenas usufruísse, durante todo o ano, do regime dos quatro dias de trabalho/quatro dias de descanso. Entendem que um dia só pode ser considerado um dia de férias se for um dia durante o qual o interessado trabalharia se dele não beneficiasse como tal.

    42     A Court of Appeal considera que as disposições de «rolled‑up holiday pay», por um lado, estão longe de terem o efeito de uma regra totalmente dissuasora de os trabalhadores gozarem férias. Por outro, não há nenhuma razão para que os trabalhadores não consigam, em regra, gerir de modo sensato a remuneração integrada no seu salário a título de férias anuais. Não pode legitimamente supor‑se ou concluir‑se que os trabalhadores não podem realmente planificar as suas férias como entenderem no âmbito de mecanismos de pagamento como os do caso em apreço.

    43     Além disso, esse tribunal observa que os acordos de «rolled‑up holiday pay» em questão foram objecto de negociações completas e correctas entre os parceiros sociais em causa, tendo resultado num acordo colectivo. Esta circunstância faz pender a balança fortemente para o lado da sua licitude.

    44     A Court of Appeal é de opinião de que os contratos em causa nos processos perante si pendentes (sem prejuízo da baixa do processo Clarke para o Employment Tribunal) não são incompatíveis nem com a directiva nem com as Regulations 1998.

    45     Nestas circunstâncias, a Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)      Um acordo contratual entre um empregador e um trabalhador que prevê que uma parte específica da retribuição que lhe é paga corresponde à retribuição de férias do trabalhador [acordo correntemente designado por ‘rolled‑up holiday pay’] constitui uma violação do direito do trabalhador a férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.° da [d]irectiva […] relativa [a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho]?

    2)      A resposta à primeira questão será diferente se o trabalhador foi pago pelo mesmo montante antes e depois da entrada em vigor do acordo contratual em causa, de modo que o efeito deste acordo não foi estabelecer um pagamento adicional mas, em vez disso, consignar parte das retribuições pagas ao trabalhador ao pagamento das férias?

    3)      Se a resposta à primeira questão for afirmativa, constitui violação do direito do trabalhador a férias anuais remuneradas, previsto no artigo 7.° [da directiva], considerar válido o pagamento efectuado, de modo a que compense o benefício concedido nos termos da directiva?

    4)      Para cumprir a obrigação, prevista no artigo 7.° da [d]irectiva […], de garantir que um trabalhador tenha direito a férias anuais remuneradas de, pelo menos, quatro semanas é necessário que a correspondente retribuição seja paga ao trabalhador no período em que este goza as suas férias anuais ou, para cumprir o artigo 7.°, basta que seja paga durante todo o ano em prestações?»

    46     Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 7 de Setembro de 2004, os presentes processos foram apensos.

     Quanto às questões prejudiciais

     Quanto à segunda questão no processo C‑257/04

    47     Na segunda questão, que há que examinar em primeiro lugar, a Court of Appeal pergunta, no essencial, se o artigo 7.° da directiva se opõe a que uma parte da remuneração paga ao trabalhador a título de trabalho prestado seja afectada ao pagamento das férias anuais, não auferindo o trabalhador, a esse título, um pagamento adicional ao efectuado a título do trabalho prestado.

    48     A este respeito, há que recordar que o direito de cada trabalhador a férias anuais remuneradas deve ser considerado um princípio do direito social comunitário que se reveste de uma importância particular, em relação ao qual não podem existir derrogações e cuja aplicação pelas autoridades nacionais competentes apenas pode ser feita dentro dos limites expressamente enunciados na própria directiva (v. acórdão de 26 de Junho de 2001, BECTU, C‑173/99, Colect., p. I‑4881, n.° 43).

    49     O pagamento das férias previsto artigo 7.°, n.° 1, da directiva destina‑se a permitir que o trabalhador goze efectivamente as férias a que tem direito.

    50     O termo «férias anuais remuneradas» constante dessa disposição significa que, durante as férias anuais na acepção da directiva, a remuneração deve ser mantida. Por outras palavras, o trabalhador deve auferir a remuneração normal neste período de descanso.

    51     Nestas condições, há que considerar que um acordo nos temos do qual o montante pago ao trabalhador a título de remuneração do trabalho prestado, por um lado, e de pagamento parcial das férias anuais mínimas, por outro, seja idêntico ao montante pago, antes da entrada em vigor desse acordo, como remuneração única paga a título de trabalho prestado equivale a esvaziar de conteúdo, através da redução do montante dessa remuneração, o direito do trabalhador a férias anuais remuneradas previsto no artigo 7.° da directiva. Esse resultado violaria o artigo 18.°, n.° 3, da directiva.

    52     Por conseguinte, há que responder à segunda questão colocada no processo C‑257/04 que o artigo 7.°, n.° 1, da directiva se opõe a que uma parte da remuneração paga ao trabalhador a título de trabalho prestado seja afectada ao pagamento das férias anuais, não auferindo o trabalhador, a esse título, um pagamento adicional ao efectuado a título do trabalho prestado. Esse direito não pode ser derrogado por acordo.

     Quanto às primeiras questões nos processos C‑131/04 e C‑257/04 e à quarta questão no processo C‑257/04

    53     Nestas questões, os órgãos jurisdicionais de reenvio perguntam, no essencial, se o artigo 7.° da directiva se opõe a que o pagamento do período mínimo de férias anuais na acepção dessa disposição seja objecto de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente e pago juntamente com a remuneração correspondente ao trabalho prestado e não de um pagamento correspondente a um período determinado em que o trabalhador goze efectivamente férias.

    54     A este respeito, há que observar que nenhuma disposição da directiva determina expressamente o momento em que o pagamento das férias anuais deve ser efectuado.

    55     Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, da directiva, os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para que todos os trabalhadores beneficiem de férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas, de acordo com as condições de obtenção e de concessão previstas nas legislações e/ou práticas nacionais.

    56     A determinação do momento em que se deve proceder ao pagamento das férias anuais faz parte dessas condições.

    57     A este respeito, os Estados‑Membros devem assegurar que as modalidades de aplicação nacionais levem em conta os limites decorrentes da própria directiva.

    58     Esta regula o direito a férias anuais e à obtenção de um pagamento correspondente como duas vertentes de um único direito. O objectivo da exigência do pagamento dessas férias é o de colocar o trabalhador, durante as referidas férias, numa situação, relativamente ao salário, comparável à dos períodos de trabalho.

    59     Por conseguinte, sem prejuízo de disposições mais favoráveis nos termos do artigo 15.° da directiva, o momento do pagamento das férias anuais deve ser determinado de modo a que, durante essas férias, o trabalhador esteja, no que diz respeito à sua remuneração, numa situação idêntica às dos períodos de trabalho.

    60     Além disso, há que levar em conta que, por força do artigo 7.°, n.° 2, da directiva, o período mínimo de férias anuais remuneradas não pode ser substituído por retribuição financeira, excepto nos casos de cessação da relação de trabalho. Esta proibição destina‑se a garantir que o trabalhador possa normalmente beneficiar de um descanso efectivo, numa preocupação de protecção eficaz da sua segurança e da sua saúde (v., neste sentido, acórdãos BECTU, já referido, n.° 44, e de 18 de Março de 2004, Merino Gómez, C‑342/01, Colect., p. I‑2605, n.° 30).

    61     Ora, um regime como o que é objecto das questões em causa pode conduzir a situações em que, não estando reunidas as condições previstas no artigo 7.°, n.° 2, da directiva, o período mínimo de férias anuais remuneradas seja, efectivamente, substituído por uma compensação financeira.

    62     Há que acrescentar que o artigo 7.° da directiva não figura expressamente entre as disposições da directiva que podem ser objecto de derrogação (v. acórdão BECTU, já referido, n.° 41). Assim sendo, pouco importa que esse regime de pagamento das férias assente ou não num acordo.

    63     Resulta de todas as considerações precedentes que há que responder à primeira questão colocada nos processos C‑131/04 e C‑257/04 e à quarta questão colocada no processo C‑257/04 que o artigo 7.° da directiva se opõe a que o pagamento do período mínimo de férias anuais na acepção dessa disposição seja objecto de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente e pago juntamente com a remuneração correspondente ao trabalho prestado e não de um pagamento correspondente a um período determinado em que o trabalhador goze efectivamente férias.

     Quanto à segunda questão no processo C‑131/04 e à terceira questão no processo C‑257/04

    64     Nestas questões, os órgãos jurisdicionais de reenvio perguntam, no essencial, se o artigo 7.° da directiva se opõe a que os montantes pagos ao trabalhador a título de férias num regime como o descrito no número anterior do presente acórdão sejam imputados no direito ao pagamento de férias anuais previsto nesse artigo.

    65     Trata‑se, portanto, da questão de saber se os pagamentos a título de período mínimo de férias anuais remuneradas na acepção dessa disposição, já efectuados no âmbito desse regime contrário à directiva, podem ser imputados no direito ao pagamento de um período determinado no decurso do qual o trabalhador goze efectivamente férias.

    66     Nesta hipótese, o artigo 7.° da directiva não se opõe, em princípio, a que montantes que acrescem à remuneração a título de trabalho prestado que foram pagos, de modo transparente e inteligível, a título de remuneração de férias sejam imputados no pagamento de umas férias determinadas.

    67     Todavia, os Estados‑Membros são obrigados a tomar as medidas adequadas para garantir que não sejam mantidas práticas contrárias ao disposto no artigo 7.° da directiva.

    68     De qualquer modo, à luz do carácter imperativo do direito a férias anuais e a fim de garantir o efeito útil do artigo 7.° da directiva, tal imputação não é permitida em caso de falta de transparência ou de inteligibilidade. O ónus da prova nesta matéria cabe ao empregador.

    69     Consequentemente, há que responder à segunda questão colocada no processo C‑131/04 e à terceira questão colocada no processo C‑257/04 que o artigo 7.° da directiva não se opõe, em princípio, a que os montantes que tenham sido pagos, de modo transparente e inteligível, a título de férias anuais mínimas na acepção dessa disposição, sob a forma de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente, e pagos juntamente com a remuneração a título de trabalho prestado sejam imputados no pagamento de umas férias determinadas efectivamente gozadas pelo trabalhador.

     Quanto às despesas

    70     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

    1)      O artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, opõe‑se a que uma parte da remuneração paga ao trabalhador a título de trabalho prestado seja afectada ao pagamento das férias anuais, não auferindo o trabalhador, a esse título, um pagamento adicional ao efectuado a título do trabalho prestado. Esse direito não pode ser derrogado por acordo.

    2)      O artigo 7.° da Directiva 93/104 opõe‑se a que o pagamento do período mínimo de férias anuais na acepção dessa disposição seja objecto de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente e pago juntamente com a remuneração correspondente ao trabalho prestado e não de um pagamento correspondente a um período determinado em que o trabalhador goze efectivamente férias.

    3)      O artigo 7.° da Directiva 93/104 não se opõe, em princípio, a que os montantes que tenham sido pagos, de modo transparente e inteligível, a título de férias anuais mínimas na acepção dessa disposição, sob a forma de prestações ao longo do período anual de trabalho correspondente, e pagos juntamente com a remuneração a título de trabalho prestado sejam imputados no pagamento de umas férias determinadas efectivamente gozadas pelo trabalhador.

    Assinaturas


    * Língua do processo: inglês.

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