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Documento 62002CJ0309

Acórdão do Tribunal (Grande Secção) de 14 de Dezembro de 2004.
Radlberger Getränkegesellschaft mbH & Co. e S. Spitz KG contra Land Baden-Württemberg.
Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Stuttgart - Alemanha.
Ambiente - Livre circulação de mercadorias - Embalagens e resíduos de embalagens - Directiva 94/62/CE - Obrigações de depósito e de retoma para embalagens de tara perdida em função da percentagem global de embalagens reutilizáveis.
Processo C-309/02.

Colectânea de Jurisprudência 2004 I-11763

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2004:799

Arrêt de la Cour

Processo C‑309/02

Radlberger Getränkegesellschaft mbH & Co. e S. Spitz KG

contra

Land Baden‑Württemberg

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Stuttgart)

«Ambiente – Livre circulação de mercadorias – Embalagens e resíduos de embalagens – Directiva 94/62/CE – Obrigações de depósito e de retoma para embalagens de tara perdida em função da percentagem global de embalagens reutilizáveis»

Sumário do acórdão

1.        Ambiente – Resíduos – Embalagens e resíduos de embalagens – Directiva 94/62 – Faculdade concedida aos Estados‑Membros de incentivar o uso de sistemas de reutilização de embalagens – Admissibilidade das disposições nacionais – Condições

(Directiva 94/62 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigos 1.°, n.° 2, e 5.°)

2.        Ambiente – Resíduos – Embalagens e resíduos de embalagens – Directiva 94/62 – Direito de os produtores e distribuidores continuarem a participar num determinado sistema de gestão dos resíduos de embalagens – Inexistência – Substituição de um sistema existente de gestão dos resíduos de embalagens – Admissibilidade – Condições

(Directiva 94/62 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 7.°)

3.        Livre circulação de mercadorias – Restrições quantitativas – Medidas de efeito equivalente – Legislação nacional que substitui um sistema integrado de recolha de resíduos de embalagens por um sistema de depósito e de recuperação individual – Justificação – Protecção do ambiente – Condição – Respeito do princípio da proporcionalidade

(Artigos 28.° CE e 30.° CE)

1.        O artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62, relativa a embalagens e resíduos de embalagens, não se opõe a que os Estados‑Membros adoptem medidas destinadas a privilegiar os sistemas de reutilização de embalagens.

Em conformidade com o artigo 5.° da referida directiva, essas medidas devem respeitar não só as exigências decorrentes das outras disposições da mesma, nomeadamente o artigo 7.°, mas também as obrigações resultantes das disposições do Tratado, nomeadamente do artigo 28.° CE.

(cf. n.os 36, 37, disp. 1)

2.        O artigo 7.° da Directiva 94/62, relativa a embalagens e resíduos de embalagens, embora não conferindo aos produtores e aos distribuidores em causa qualquer direito de continuarem a participar num determinado sistema de gestão dos resíduos de embalagens, opõe‑se à substituição de um sistema integrado de recolha desses resíduos por um sistema de depósito e de recuperação individual, quando o novo sistema não for igualmente apto para atingir os objectivos da referida directiva ou quando a passagem para esse novo sistema não for feita sem rupturas e sem pôr em risco a possibilidade de os operadores económicos dos sectores abrangidos participarem efectivamente no novo sistema a partir da entrada em vigor deste último.

(cf. n.os 43, 46, 48, 50, disp. 2)

3.        O artigo 28.° CE opõe‑se a uma regulamentação nacional quando esta prevê a substituição de um sistema integrado de recolha de resíduos de embalagens por um sistema de depósito e de recuperação individual, sem que os produtores e distribuidores em causa disponham de um período de transição razoável para se adaptarem a esse sistema e sem que lhes seja assegurado que, no momento da mudança do sistema de gestão dos resíduos de embalagens, possam efectivamente participar num sistema operacional. Efectivamente, esta regulamentação só pode ser justificada por razões atinentes à protecção do ambiente se os meios que empregar não forem além do necessário para atingir os objectivos visados.

(cf. n.os 79, 83, disp. 3)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)
14 de Dezembro de 2004(1)

«Ambiente – Livre circulação de mercadorias – Embalagens e resíduos de embalagens – Directiva 94/62/CE – Obrigações de depósito e de retoma para embalagens de tara perdida em função da percentagem global de embalagens reutilizáveis»

No processo C‑309/02,que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE,apresentado pelo Verwaltungsgericht Stuttgart (Alemanha), por decisão de 21 de Agosto de 2002, entrado no Tribunal de Justiça em 29 de Agosto de 2002, no processo

Radlberger Getränkegesellschaft mbH & Co.,S. Spitz KG

contra

Land Baden‑Württemberg,



O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),,



composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann e K. Lenaerts (relator), presidentes de secção, C. Gulmann, J.‑P. Puissochet, R. Schintgen, N. Colneric, S. von Bahr e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,

advogado-geral: D. Ruiz‑Jarabo Colomer,
secretário: M.-F. Contet, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 2 de Março de 2004,vistas as observações escritas apresentadas:

em representação da Radlberger Getränkegesellschaft mbH & Co. e da S. Spitz KG, por R. Karpenstein, Rechtsanwalt,

em representação do Land Baden‑Württemberg, por L.‑A. Versteyl, Rechtsanwalt,

em representação do Governo alemão, por W.‑D. Plessing e A. Tiemann, na qualidade de agentes, assistidos por D. Sellner, Rechtsanwalt,

em representação do Governo austríaco, por E. Riedl, na qualidade de agente,

em representação do Governo francês, por G. de Bergues e D. Petrausch, na qualidade de agentes,

em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por M. Fiorilli, avvocato dello Stato,

em representação do Governo neerlandês, por S. Terstal e C. Wissels, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. Grunwald e M. Konstantinidis, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral apresentadas na audiência de 6 de Maio de 2004,

profere o presente



Acórdão



1
O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens (JO L 365, p. 10), e do artigo 28.° CE.

2
Este pedido foi apresentado no âmbito de uma acção intentada pela Radlberger Getränkegesellschaft mbH & Co. e pela S. Spitz KG, sociedades austríacas produtoras de bebidas, contra o Land Baden‑Württemberg.


Enquadramento jurídico

A Directiva 94/62

3
Segundo o seu artigo 1.°, n.° 1, a Directiva 94/62 tem por objecto a harmonização das disposições nacionais respeitantes à gestão de embalagens e de resíduos de embalagens, a fim de, por um lado, prevenir e reduzir o seu impacte no ambiente, em todos os Estados‑Membros e nos países terceiros, assegurando assim um elevado nível de protecção do ambiente, e, por outro lado, garantir o funcionamento do mercado interno e evitar entraves ao comércio e distorções e restrições de concorrência na Comunidade.

4
Nos termos do seu artigo 1.°, n.° 2, esta directiva prevê «medidas que visam como primeira prioridade prevenir a produção de resíduos de embalagens e prevê igualmente, como princípios fundamentais, a reutilização das embalagens, a reciclagem e as outras formas de valorização dos resíduos de embalagens, e por conseguinte a redução da eliminação final desses resíduos».

5
O artigo 5.° da referida directiva dispõe:

«Os Estados‑Membros podem incentivar o uso de sistemas de reutilização das embalagens susceptíveis de serem reutilizadas em moldes que respeitem o ambiente, nos termos do Tratado.»

6
O artigo 7.° da Directiva 94/62 determina o seguinte:

«1.     Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para assegurar a criação de sistemas que garantam:

a)
A recuperação e/ou a recolha das embalagens usadas e/ou dos resíduos de embalagens provenientes do consumidor ou de qualquer outro utilizador final ou do fluxo de resíduos, de forma a canalizá‑los para as soluções alternativas de gestão mais adequadas;

b)
A reutilização ou valorização incluindo a reciclagem das embalagens e/ou dos resíduos de embalagens recolhidos;

a fim de atingir os objectivos definidos na presente directiva.

Estes sistemas serão abertos à participação dos operadores económicos dos sectores abrangidos e à participação das autoridades públicas competentes e aplicar‑se‑ão também aos produtos importados em condições não discriminatórias, incluindo as modalidades ou quaisquer tarifas de acesso aos sistemas, e serão concebidos de modo a evitar entraves ao comércio ou distorções da concorrência, nos termos do Tratado.

2.       As medidas referidas no n.° 1 farão parte de uma política extensiva a todas as embalagens e resíduos de embalagens e terão especialmente em conta as exigências em matéria de protecção do ambiente e de defesa da saúde, segurança e higiene dos consumidores, a protecção da qualidade, da autenticidade e das características técnicas das mercadorias embaladas e dos materiais utilizados, bem como a protecção dos direitos de propriedade industrial e comercial.»

7
O artigo 18.° da mesma directiva tem a seguinte redacção:

«Os Estados‑Membros não impedirão a colocação no mercado do seu território de embalagens que estejam em conformidade com o disposto na presente directiva.»

A legislação nacional

8
O Verordnung über die Vermeidung und Verwertung von Verpackungsabfällen (regulamento relativo à prevenção e à valorização dos resíduos de embalagens), de 21 de Agosto de 1998 (BGBl. 1998 I, p. 2379, a seguir «VerpackV»), prevê diversas medidas de prevenção e de redução do impacte dos resíduos de embalagens no ambiente. Tendo, nomeadamente, como objectivo transpor a Directiva 94/62, o VerpackV substituiu o Verordnung über die Vermeidung von Verpackungsabfällen (regulamento relativo à prevenção dos resíduos de embalagens), de 12 de Junho de 1991 (BGBl. 1991 I, p. 1234).

9
O § 6, n.os 1 e 2, do VerpackV estabelece as seguintes obrigações:

«1. O distribuidor é obrigado a retomar gratuitamente, no lugar de entrega efectiva ou nas suas imediações, as embalagens usadas vazias, utilizadas pelos consumidores finais, a submetê‑las a um processo de valorização em conformidade com as exigências definidas no ponto 1 do anexo I e a cumprir as exigências definidas no ponto 2 do anexo I. As exigências relativas à valorização poderão também ser cumpridas através de uma reutilização ou entrega ao distribuidor ou ao produtor, nos termos do n.° 2. O distribuidor deve assinalar ao consumidor final privado a possibilidade de restituição da embalagem, nos termos da primeira frase, através de letreiros com indicações facilmente reconhecíveis e legíveis. A obrigação decorrente da primeira frase limita‑se aos tipos, formas e dimensões das embalagens e às embalagens de artigos que o distribuidor mantém na sua gama de produtos. Para os distribuidores com uma superfície de venda inferior a 200 m², a obrigação de retoma limita‑se a embalagens de marcas que o distribuidor comercializa. No caso da venda por correspondência, a retoma deverá ser garantida através de possibilidades adequadas de restituição, disponíveis a uma distância aceitável para o consumidor final. No caso de envio das mercadorias e nos catálogos, deve ser chamada a atenção para a possibilidade de restituição. Se as embalagens de venda não forem provenientes do consumidor final privado, pode ser acordado de outra forma relativamente ao lugar de entrega e à determinação dos custos. Se os distribuidores não cumprirem as obrigações decorrentes da primeira frase, por meio da retoma no local de entrega, devem garanti‑las através de um sistema nos termos do n.° 3. Para os distribuidores de embalagens relativamente aos quais esteja excluída a possibilidade de participação num sistema nos termos do n.° 3, são válidas as exigências relativas à valorização correspondentes ao § 4, n.° 2, em derrogação do disposto na primeira frase.

2. Os produtores e os distribuidores são obrigados a retomar gratuitamente, no lugar de entrega efectiva, as embalagens retomadas pelos distribuidores nos termos do n.° 1, a submetê‑las a um processo de valorização em conformidade com as exigências definidas no ponto 1 do anexo I e a cumprir as exigências definidas no ponto 2 do anexo I. As exigências relativas à valorização poderão também ser cumpridas através de reutilização das embalagens. As obrigações decorrentes da primeira frase limitam‑se aos tipos, formas e dimensões das embalagens, assim como às embalagens de produtos que os respectivos produtores e distribuidores colocam no mercado, aplicando‑se, mutatis mutandis, o n.° 1, oitava a décima frases.»

10
Segundo o n.° 3 da mesma disposição, as obrigações de retoma e de valorização também podem, em princípio, ser cumpridas através da participação do produtor ou do distribuidor num sistema integrado de recolha de embalagens de venda usadas. Incumbe à autoridade regional competente verificar se esse sistema preenche as condições prescritas pelo VerpackV quanto à sua percentagem de cobertura.

11
Segundo o § 8, n.° 1, do VerpackV, os distribuidores que comercializem produtos alimentares líquidos acondicionados em embalagens de bebidas não reutilizáveis são obrigados a cobrar ao comprador um depósito no valor mínimo de 0,25 euros por embalagem, imposto sobre o valor acrescentado incluído. O valor mínimo do depósito é de 0,50 euros, imposto sobre o valor acrescentado incluído, quando o volume de acondicionamento seja superior a 1,5 litros. O depósito deve ser cobrado por cada um dos distribuidores nas diversas fases da comercialização, até à venda ao consumidor final. O depósito é devolvido no acto de entrega das embalagens em conformidade com o § 6, n.os 1 e 2, do VerpackV.

12
Por força do § 9, n.° 1, do VerpackV, este depósito obrigatório não é aplicável às embalagens relativamente às quais o produtor ou o distribuidor estejam isentos da obrigação de retoma por força da sua participação num sistema integrado de recolha como o indicado no referido § 6, n.° 3.

13
No entanto, o VerpackV prevê, no seu § 9, n.° 2, casos em que, relativamente a determinadas bebidas, é eliminada a possibilidade de recurso ao § 6, n.° 3. Esta disposição tem a seguinte redacção:

«Quando, no território em que se aplica o presente regulamento, a percentagem das bebidas acondicionadas em embalagens reutilizáveis, como cerveja, águas minerais (incluindo águas de nascente, águas de mesa e águas minerais), refrigerantes com gás, sumos de fruta […] ou vinho […], desça, em termos globais, para uma percentagem inferior a 72% no decurso do ano civil, deve proceder‑se a uma nova avaliação das percentagens pertinentes de embalagens reutilizáveis no período de doze meses seguinte à divulgação da não obtenção da percentagem de embalagens reutilizáveis exigida. Quando a percentagem das embalagens reutilizáveis no território federal seja inferior à percentagem prevista na primeira frase, considera‑se revogada a decisão adoptada nos termos do § 6, n.° 3, em todo o território federal, a contar do primeiro dia do sexto mês seguinte à publicação prevista no n.° 3, quanto às bebidas relativamente às quais a percentagem de embalagens reutilizáveis fixada em 1991 não tenha sido atingida […]»

14
De acordo com o § 9, n.° 3, do VerpackV, o Governo alemão publica anualmente as percentagens pertinentes, indicadas no n.° 2 do referido § 9, de bebidas acondicionadas em embalagens ecológicas. Segundo o n.° 4 do mesmo § 9, a autoridade competente procede, mediante requerimento ou oficiosamente, a uma nova avaliação em conformidade com o § 6, n.° 3, quando, após uma decisão de revogação, seja novamente atingida a percentagem pertinente de bebidas acondicionadas nesse tipo de embalagens.


Litígio no processo principal e questões prejudiciais

15
As demandantes no processo principal exportam para a Alemanha, em embalagens de tara perdida valorizáveis, refrigerantes com gás, sumos de fruta e outras bebidas sem gás, assim como água de mesa. Para efeitos da valorização dessas embalagens, aderiram ao sistema global de recolha de resíduos gerido pela sociedade «Der Grüne Punkt – Duales System Deutschland AG», ficando, por isso, isentas da obrigação de cobrar o depósito previsto no § 8, n.° 1, do VerpackV para as bebidas distribuídas na Alemanha em embalagens de tara perdida.

16
Segundo um comunicado do Governo alemão de 28 de Janeiro de 1999, a percentagem de embalagens de bebidas reutilizáveis desceu, em 1997, pela primeira vez, para um nível inferior a 72%, a saber, 71,33%. Tendo esta percentagem permanecido, por dois períodos consecutivos, designadamente, entre Fevereiro de 1989 e Janeiro de 2000 e entre Maio de 2000 e Abril de 2001, abaixo dos 72%, na totalidade do território federal, o referido governo anunciou, em 2 de Julho de 2002, a cobrança, a partir de 1 de Janeiro de 2003, de um depósito obrigatório pelas águas minerais, as cervejas e os refrigerantes, em observância ao § 9, n.° 3, do VerpackV. A partir desta data e nos termos do VerpackV, as demandantes no processo principal eram, portanto, obrigadas a cobrar o depósito prescrito no § 8, n.° 1, desse regulamento pela maioria das embalagens de bebidas que distribuíam na Alemanha e, em seguida, a recuperar e a proceder à valorização das embalagens vazias.

17
Em 23 de Maio de 2002, as demandantes no processo principal intentaram no Verwaltungsgericht Stuttgart uma acção contra o Land Baden‑Württemberg, na qual sustentam que o regime de quotas de embalagens reutilizáveis, previsto no VerpackV, e as obrigações de depósito e de retoma dele decorrentes são contrários aos artigos 1.°, n.os 1 e 2, 5.°, 7.° e 18.° da Directiva 94/62, bem como ao artigo 28.° CE. A República Federal da Alemanha foi chamada a intervir na causa.

18
Segundo o tribunal de reenvio, caso se adopte a interpretação defendida pelas demandantes no processo principal, segundo a qual o artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62 estabelece uma presunção de equivalência entre a reutilização das embalagens e a sua valorização, coloca‑se a questão de saber se o sistema do VerpackV é compatível com a referida directiva, na medida em que esse sistema dificulta a comercialização de embalagens de tara perdida quando a percentagem de embalagens reutilizáveis desça abaixo de um nível determinado. Esse tribunal observa que os produtores estabelecidos noutro Estado‑Membro estão sujeitos a encargos superiores aos dos produtores alemães caso decidam comercializar as suas bebidas em embalagens reutilizáveis. Salienta que, segundo as demandantes no processo principal, a regulamentação alemã afecta já a situação dos produtores estabelecidos noutro Estado‑Membro, enquanto a obrigação de cobrar um depósito estiver suspensa, pelo facto de os distribuidores alemães terem tendência para excluir as embalagens de tara perdida da sua gama de bebidas a fim de impedir que a percentagem de embalagens reutilizáveis desça abaixo dos 72%.

19
Nestas circunstâncias, o Verwaltungsgericht Stuttgart decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)
O artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62 [...] deve ser interpretado no sentido de que proíbe os Estados‑Membros, em caso de obtenção a nível nacional de uma percentagem de embalagens reutilizáveis inferior a 72%, de darem preferência a sistemas de reutilização de embalagens de bebidas em detrimento de embalagens de tara perdida valorizáveis, através da revogação da possibilidade de isenção da obrigação imposta de retoma, gestão e cobrança de depósito pelas embalagens de bebidas de tara perdida vazias, decorrente da participação num sistema de recuperação e gestão, para os sectores de bebidas em que a percentagem de embalagens reutilizáveis seja inferior à percentagem verificada em 1991?

2)
O artigo 18.° da Directiva 94/62 [...] deve ser interpretado no sentido de que proíbe os Estados‑Membros, em caso de obtenção a nível nacional de uma percentagem de embalagens reutilizáveis inferior a 72%, de colocarem entraves à comercialização de bebidas em embalagens de tara perdida valorizáveis, através da revogação da possibilidade de isenção da obrigação imposta de retoma, gestão e cobrança de depósito pelas embalagens de bebidas de tara perdida vazias, decorrente da participação num sistema de recuperação e gestão, para os sectores de bebidas em que a percentagem de embalagens reutilizáveis seja inferior à percentagem verificada em 1991?

3)
O artigo 7.° da Directiva 94/62 [...] deve ser interpretado no sentido de que outorga um direito de participação num sistema já existente de recuperação e gestão de embalagens de bebidas usadas, aos produtores e distribuidores de bebidas em embalagens de tara perdida valorizáveis, de modo a estes poderem assim cumprir a obrigação, imposta por lei, de cobrança de depósito por embalagens de bebidas de tara perdida e de retoma de embalagens de bebidas usadas?

4)
O artigo 28.° CE deve ser interpretado no sentido de que proíbe os Estados‑Membros de adoptarem medidas nos termos das quais, em caso de obtenção a nível nacional de uma percentagem de embalagens de bebidas reutilizáveis inferior a 72%, se revoga a possibilidade de isenção da obrigação imposta de retoma, gestão e cobrança de depósito pelas embalagens de bebidas de tara perdida vazias, decorrente da participação num sistema de recuperação e de gestão, para os sectores de bebidas em que a percentagem de embalagens reutilizáveis seja inferior à percentagem verificada em 1991?»


Quanto aos requerimentos de reabertura da fase oral

20
Por cartas que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça, respectivamente, em 14 e 17 de Junho de 2004, o Governo alemão e o demandado no processo principal requereram ao Tribunal de Justiça que ordenasse a reabertura da fase oral do processo, ao abrigo do artigo 61.° do Regulamento de Processo.

21
Como fundamento do seu requerimento, o Governo alemão afirma que as conclusões apresentadas em 6 de Maio de 2004 pelo advogado‑geral compreendem uma série de elementos que não foram objecto das fases escrita e oral e que conduzem a uma apreciação inexacta dos argumentos que invocou perante o Tribunal de Justiça. O demandado no processo principal também salienta no seu requerimento que as referidas conclusões incidem sobre alguns elementos que não foram discutidos e sobre os quais o Tribunal de Justiça não foi, portanto, suficientemente esclarecido.

22
A este respeito, recorde‑se que o Tribunal de Justiça pode oficiosamente ou sob proposta do advogado‑geral, ou ainda a pedido das partes, ordenar a reabertura da fase oral, nos termos do artigo 61.° do seu Regulamento de Processo, se considerar que não está suficientemente esclarecido ou que o processo deve ser decidido com base num argumento que não foi debatido entre as partes (v. acórdãos de 10 de Fevereiro de 2000, Deutsche Post, C‑270/97 e C‑271/97, Colect., p. I‑929, n.° 30; de 19 de Fevereiro de 2002, Wouters e o., C‑309/99, Colect., p. I‑1577, n.° 42; de 18 de Junho de 2002, Philips, C‑299/99, Colect., p. I‑5475, n.° 20; e de 12 de Dezembro de 2002, Sieckmann, C‑273/00, Colect., p. I‑11737, n.° 22).

23
Todavia, no caso em apreço, o Tribunal de Justiça, após ouvir o advogado‑geral, considera dispor de todos os elementos necessários para responder às questões submetidas e que esses elementos foram discutidos perante ele.

24
Por conseguinte, indeferem‑se os requerimentos do Governo alemão e do demandado no processo principal, destinados a obter a reabertura da fase oral.


Quanto às questões prejudiciais

Quanto à admissibilidade das questões prejudiciais

25
O demandado no processo principal sustenta que o Tribunal de Justiça deve julgar as questões prejudiciais inadmissíveis com fundamento na inadmissibilidade da acção principal, uma vez que esta foi intentada contra o Land Baden‑Württemberg. Com efeito, não tendo qualquer competência legislativa ou regulamentar própria na matéria em causa, este último limita‑se a aplicar a legislação federal. Segundo o referido demandado, a acção deveria ter sido intentada contra o Estado federal, no tribunal competente para este efeito, ou seja, o Verwaltungsgericht Berlin.° Em processos paralelos, alguns tribunais alemães já declararam a inadmissibilidade de acções análogas.

26
Quanto a esta questão, deve recordar‑se que, tendo em conta a repartição de competências entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, não incumbe ao Tribunal de Justiça verificar se a decisão pela qual foi chamado a pronunciar‑se foi adoptada em conformidade com as regras de organização e de processo judiciais de direito nacional (v. acórdãos de 3 de Março de 1994, Eurico Itália e o., C‑332/92, C‑333/92 e C‑335/92, Colect., p. I‑711, n.° 13; de 16 de Setembro de 1999, WWF e o., C‑435/97, Colect., p. I‑5613, n.° 33; e de 3 de Outubro de 2000, Gozza e o., C‑371/97, Colect., p. I‑7881, n.° 30). O Tribunal de Justiça deve ater‑se à decisão de reenvio que emana de um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro, enquanto tal decisão não tiver sido revogada no quadro dos meios processuais eventualmente previstos no direito nacional (acórdão de 14 de Janeiro de 1982, Reina, 65/81, Recueil, p. 33, n.° 7).

27
No presente caso, decorre do despacho de reenvio que o Verwaltungsgericht Stuttgart considera que a acção principal é, pelo menos, parcialmente admissível.

28
Além disso, é pacífico que existe um nexo directo entre, por um lado, as quatro questões prejudiciais, relativas à interpretação dos artigos 1.°, 7.° e 18.° da Directiva 94/62 e do artigo 28.° CE, submetidas a fim de permitir ao tribunal de reenvio apreciar a compatibilidade da legislação alemã em causa com estas disposições, e, por outro, o objecto da acção principal, destinado a obter a declaração de que as demandantes no processo principal não são obrigadas a submeter‑se às obrigações de depósito e de retoma individual das suas embalagens de tara perdida.

29
Por conseguinte, o pedido de decisão prejudicial é admissível.

Quanto à primeira questão

30
Na sua primeira questão, o tribunal de reenvio questiona, no essencial, se o artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62 se opõe a que um Estado‑Membro privilegie os sistemas de reutilização de embalagens através da aplicação de um sistema como o previsto nos §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, do VerpackV.

31
A este respeito, deve recordar‑se que, embora o artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62 preveja, como «primeira prioridade», medidas que visam prevenir a produção de resíduos de embalagens, enumera, como «[outros] princípios fundamentais», a reutilização das embalagens, a reciclagem e as outras formas de valorização de resíduos de embalagens.

32
O oitavo considerando desta directiva refere que, «na expectativa de resultados científicos e tecnológicos em matéria de processos de valorização, deve‑se optar, de preferência, pela reutilização e pela reciclagem, preferíveis em termos de impacte ambiental; que, por esse motivo, devem ser criados, nos Estados‑Membros, sistemas que garantam o retorno de embalagens usadas e/ou de resíduos de embalagens; que as análises do ciclo de vida devem ser completadas o mais rapidamente possível de modo a justificar uma hierarquia bem definida entre embalagens reutilizáveis, recicláveis e valorizáveis».

33
Resulta do exposto que a Directiva 94/62 não estabelece uma hierarquia entre a reutilização das embalagens, por um lado, e a valorização dos resíduos de embalagens, por outro.

34
No entanto, deve observar‑se que o artigo 5.° da Directiva 94/62 autoriza os Estados‑Membros a adoptarem medidas que incentivem o uso de sistemas de reutilização de embalagens susceptíveis de serem reutilizadas em moldes que respeitem o ambiente.

35
Decorre da própria redacção deste artigo 5.° que essa política de incentivo à reutilização de embalagens só é autorizada na medida em esteja em conformidade com o Tratado.

36
Assim, as medidas adoptadas por um Estado‑Membro em execução do artigo 5.° da referida directiva devem respeitar não só as exigências das outras disposições da mesma, nomeadamente o artigo 7.°, objecto da terceira questão prejudicial, mas também as obrigações resultantes das disposições do Tratado, nomeadamente do artigo 28.° CE, objecto da quarta questão prejudicial.

37
Por conseguinte, deve responder‑se à primeira questão que o artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62 não se opõe a que os Estados‑Membros adoptem medidas destinadas a privilegiar os sistemas de reutilização de embalagens.

38
Face ao exposto, há que responder primeiro à terceira e à quarta questão prejudicial.

Quanto à terceira questão

39
Na sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 7.° da Directiva 94/62 concede aos produtores e aos distribuidores de bebidas acondicionadas em embalagens de tara perdida valorizáveis, e autorizados a eximirem‑se das suas obrigações de depósito e de retoma através da sua participação num sistema integrado de recolha das embalagens, o direito de continuarem a participar nesse sistema integrado de forma a cumprirem as suas obrigações legais.

40
Cumpre recordar que, no seu artigo 7.°, n.° 1, a Directiva 94/62 impõe aos Estados‑Membros a adopção das medidas necessárias para assegurar a criação de sistemas que garantam, por um lado, a recuperação e/ou a recolha das embalagens usadas e/ou dos resíduos de embalagens e, por outro, a reutilização ou a valorização das embalagens ou dos resíduos de embalagens recolhidos. Ainda segundo esta disposição, estes sistemas devem ser abertos à participação dos operadores económicos dos sectores abrangidos e à participação das autoridades públicas competentes, aplicar‑se aos produtos importados em condições não discriminatórias e ser concebidos de modo a evitar entraves ao comércio ou distorções da concorrência, nos termos do Tratado.

41
O artigo 7.°, n.° 2, da referida directiva exige que as medidas referidas no n.° 1 do mesmo artigo façam parte de uma política extensiva a todas as embalagens e resíduos de embalagens e precisa que essas medidas devem ter especialmente em conta as exigências em matéria de protecção do ambiente e de defesa da saúde dos consumidores, de segurança e de higiene, em matéria de protecção da qualidade, da autenticidade e das características técnicas das mercadorias embaladas e dos materiais utilizados, bem como em matéria de protecção dos direitos de propriedade industrial e comercial.

42
O referido artigo 7.° deixa aos Estados‑Membros a escolha, no que se refere às embalagens de tara perdida, entre um sistema de depósito e de recuperação individual, por um lado, e um sistema integrado de recolha das embalagens, por outro, ou ainda a opção por uma combinação dos dois sistemas em função do tipo de produtos, desde que os sistemas escolhidos tenham como objectivo canalizar as embalagens para as soluções de gestão dos resíduos mais adequadas e façam parte de uma política extensiva a todas as embalagens e resíduos de embalagens.

43
Esta disposição não confere aos produtores e aos distribuidores em causa qualquer direito de continuarem a participar num determinado sistema de gestão dos resíduos de embalagens.

44
Com efeito, a Directiva 94/62 não obsta a que um Estado‑Membro preveja a alteração dos sistemas de gestão dos resíduos de embalagens implantados no seu território, de forma a garantir a solução de gestão dos resíduos mais adequada.

45
Embora a Directiva 94/62 autorize, portanto, um Estado‑Membro a prever a substituição, em função das circunstâncias, de um sistema de recolha de embalagens nas imediações do domicílio dos consumidores ou dos pontos de venda por um sistema de depósito e de recuperação individual, é necessário, porém, que essa substituição respeite certas condições.

46
Por um lado, o novo sistema deve igualmente ser apto para atingir os objectivos da Directiva 94/62. Mais especificamente, quando o novo sistema seja, como no caso em apreço, um sistema de depósito e de recuperação individual, o Estado‑Membro em causa deve assegurar a existência de um número suficiente de pontos de entrega, para que os consumidores que tenham comprado produtos acondicionados em embalagens de tara perdida sujeitas a depósito possam recuperar o montante do depósito mesmo que não voltem ao local de compra inicial.

47
A este respeito, importa observar que o § 6, n.° 1, primeira frase, do VerpackV dispõe que o distribuidor é obrigado a retomar gratuitamente, no ponto de entrega efectiva ou nas suas imediações, as embalagens vendidas («am Ort der tatsächlichen Übergabe oder in dessen unmittelbarer Nähe»). Embora seja verdade que as frases seguintes da referida disposição acrescentam regras mais precisas, nomeadamente quanto aos limites desta obrigação em razão das características das embalagens em causa e em função da superfície de venda do distribuidor em questão, o certo é que o alcance da obrigação de retoma não deixa de ser ambíguo.

48
Por outro lado, a passagem para o novo sistema deve ser feita sem rupturas e sem pôr em risco a possibilidade de os operadores económicos dos sectores abrangidos participarem efectivamente no novo sistema desde a sua entrada em vigor. Note‑se, a este respeito, que o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 94/62 obriga cada Estado‑Membro a garantir aos produtores e aos distribuidores em causa, a todo o momento e sem discriminação, o acesso a um sistema de gestão dos resíduos de embalagens.

49
Assim, incumbe ao Estado‑Membro que procede à substituição do sistema existente de gestão dos resíduos de embalagens por outro assegurar que os produtores e os distribuidores em causa disponham de um prazo razoável de transição para o novo sistema, de forma a poderem adaptar os seus métodos de produção e as suas cadeias de distribuição às exigências do novo sistema.

50
Por conseguinte, deve responder‑se à terceira questão que o artigo 7.° da Directiva 94/62, embora não conferindo aos produtores e aos distribuidores em causa qualquer direito de continuarem a participar num determinado sistema de gestão dos resíduos de embalagens, se opõe à substituição de um sistema integrado de recolha desses resíduos por um sistema de depósito e de recuperação individual, quando o novo sistema não for igualmente apto para atingir os objectivos da referida directiva ou quando a transição para esse novo sistema não for feita sem rupturas e sem pôr em risco a possibilidade de os operadores económicos dos sectores abrangidos participarem efectivamente no novo sistema a partir da entrada em vigor deste último.

Quanto à quarta questão

51
Na sua quarta questão, o tribunal de reenvio pergunta, em suma, se o artigo 28.° CE se opõe a uma regulamentação nacional, como a prevista nos §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, do VerpackV, que faz depender da percentagem de embalagens reutilizáveis no mercado em causa a possibilidade de os produtores e os distribuidores que utilizam embalagens de tara perdida cumprirem as suas obrigações de depósito e de retoma, bem como de valorização, mediante a sua participação num sistema integrado de recolha.

Quanto à aplicabilidade do artigo 28.° CE

52
Segundo o Governo alemão, não pode existir um conflito entre o artigo 28.° CE e a regulamentação nacional em causa, visto que, no que se refere à reutilização das embalagens, a Directiva 94/62 e, em particular, os seus artigos 5.°, 9.° e 18.° têm por objectivo e por efeito proceder a uma harmonização total da matéria em questão.

53
Tendo em conta a circunstância de que toda e qualquer medida nacional, num domínio que foi objecto de uma harmonização exaustiva a nível comunitário, deve ser apreciada à luz das disposições dessa medida de harmonização e não das do direito primário (acórdãos de 12 de Outubro de 1993, Vanacker e Lesage, C‑37/92, Colect., p. I‑4947, n.° 9; de 13 de Dezembro de 2001, DaimlerChrysler, C‑324/99, Colect., p. I‑9897, n.° 32; e de 11 de Dezembro de 2003, Deutscher Apothekerverband, C‑322/01, ainda não publicado na Colectânea, n.° 64), há que determinar, portanto, se a harmonização realizada pela Directiva 94/62 exclui o exame da compatibilidade da regulamentação nacional em causa com o artigo 28.° CE.

54
Há que observar a este respeito que, relativamente à reutilização das embalagens, o artigo 5.° da Directiva 94/62 se limita a permitir aos Estados‑Membros que incentivem, nos termos do Tratado, o uso de sistemas de reutilização das embalagens susceptíveis de serem reutilizadas em moldes que respeitem o ambiente.

55
Com excepção da definição do conceito de «reutilização» de embalagens, de certas disposições gerais sobre as medidas de prevenção dos resíduos de embalagens e das disposições relativas aos sistemas de recuperação, de recolha e de valorização, constantes, respectivamente, dos seus artigos 3.°, n.° 5, 4.° e 7.°, a Directiva 94/62 não regula, em relação aos Estados‑Membros dispostos a utilizarem a faculdade conferida pelo seu artigo 5.°, a organização de sistemas que privilegiem as embalagens reutilizáveis.

56
Contrariamente à marcação e à identificação das embalagens e às exigências relativas à composição e ao carácter reutilizável ou valorizável destas últimas, regidas pelos artigos 8.° a 11.° e pelo anexo II da Directiva 94/62, a organização dos sistemas nacionais destinados a favorecer a reutilização das embalagens não se encontra, portanto, totalmente harmonizada.

57
Esses sistemas podem, por conseguinte, ser apreciados à luz das disposições do Tratado relativas à livre circulação de mercadorias.

58
Aliás, o artigo 5.° da Directiva 94/62 permite aos Estados‑Membros privilegiarem os sistemas de reutilização das embalagens apenas «nos termos do Tratado».

59
Relativamente ao artigo 18.° da mesma directiva, deve observar‑se que, na medida em que esta disposição se limita a garantir a livre circulação, no território dos Estados‑Membros, de embalagens que respeitem as exigências relativas à marcação, à composição e ao carácter reutilizável e valorizável das mesmas, também não obsta a que os sistemas nacionais de gestão dos resíduos de embalagens sejam apreciados à luz do artigo 28.° CE, caso sejam susceptíveis de afectar as condições de comercialização dos produtos em causa.

Quanto à existência de um entrave às trocas comerciais

60
Há que apreciar se o artigo 28.° CE se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que permite aos produtores e aos distribuidores que utilizam embalagens de tara perdida cumprirem as suas obrigações de depósito e de retoma, participando num sistema integrado de recolha, em função da evolução da proporção global de bebidas acondicionadas em embalagens de tara perdida no mercado alemão bem como da proporção de bebidas em causa comercializadas nessas embalagens no mesmo mercado.

61
A este respeito, há que observar, em primeiro lugar, que essa regulamentação é indistintamente aplicável aos produtos nacionais e aos produtos provenientes de outros Estados‑Membros e prevê as mesmas exigências em matéria de depósito e de retoma para os produtores estabelecidos noutros Estados‑Membros e para os produtores nacionais.

62
Em segundo lugar, contrariamente à percentagem máxima de bebidas susceptíveis de serem comercializadas em embalagens não aprovadas, que estava em causa no acórdão de 20 de Setembro de 1988, Comissão/Dinamarca (302/86, Colect., p. 4607), no caso em apreço no processo principal, as percentagens não limitam a quantidade de produtos que podem ser importados num certo tipo de embalagens. Com efeito, o VerpackV não proíbe a comercialização de produtos acondicionados em embalagens de tara perdida para além das percentagens indicadas, limitando‑se a prever que a inobservância dessas percentagens conduz a uma mudança do sistema de gestão das embalagens de tara perdida.

63
No entanto, deve observar‑se que, não obstante os §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, do VerpackV serem efectivamente aplicáveis a todos os produtores e distribuidores que exercem a sua actividade no território nacional, não afectam da mesma forma a comercialização de bebidas produzidas na Alemanha e a de bebidas provenientes de outros Estados‑Membros.

64
Com efeito, se a passagem de um sistema de gestão das embalagens para outro implica, em regra, custos com a marcação ou a rotulagem das embalagens, uma regulamentação, como a que está causa no processo principal, que obriga os produtores e distribuidores que utilizam embalagens de tara perdida a substituir a sua participação num sistema integrado de recolha pela adopção de um sistema de depósito e de recuperação individual, implica, para todos os produtores e distribuidores que utilizam essas embalagens, custos suplementares ligados à organização da retoma das embalagens, do reembolso dos montantes do depósito e da eventual compensação dos referidos montantes entre distribuidores.

65
Ora, é pacífico que a utilização de embalagens de tara perdida por produtores não estabelecidos na Alemanha é consideravelmente superior à dos produtores alemães.

66
A este respeito, o tribunal de reenvio observa que o recurso a embalagens reutilizáveis implica normalmente, para um produtor de bebidas estabelecido noutro Estado‑Membro, custos superiores aos que são suportados por um produtor alemão, uma vez que os custos ligados à organização de um sistema de depósito e ao transporte são mais significativos se o produtor estiver estabelecido a uma certa distância dos pontos de venda.

67
Em consequência, a substituição, no que se refere às embalagens de tara perdida, de um sistema integrado de recolha de embalagens por um sistema de depósito e de recuperação individual é susceptível de criar entraves à comercialização, no mercado alemão, de bebidas importadas de outros Estados‑Membros (v., neste sentido, quanto às embalagens reutilizáveis de bebidas, acórdão Comissão/Dinamarca, já referido, n.° 13).

68
Nesta matéria, não é relevante que as disposições em causa prevejam obrigações de depósito e de retoma individual para as embalagens de tara perdida sem proibirem as importações de bebidas acondicionadas nessas embalagens e que, além disso, exista a possibilidade de os produtores recorrerem a embalagens reutilizáveis. Com efeito, uma medida susceptível de criar entraves às importações deve ser qualificada como uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, mesmo que o entrave seja pequeno ou existam outras possibilidades de escoamento dos produtos (acórdão de 5 de Abril de 1984, Van de Haar e Kaveka de Meern, 177/82 e 178/82, Recueil, p. 1797, n.° 14).

69
Neste contexto, não é pertinente afirmar, como faz o Governo alemão, que o aumento das importações na Alemanha de águas minerais naturais acondicionadas em embalagens de tara perdida, no período anterior à imposição das obrigações de depósito e de retoma individual, demonstra a inexistência de uma discriminação dos produtores de bebidas estabelecidos noutros Estados‑Membros. Com efeito, mesmo quando esta tendência seja observada no mercado alemão, a mesma não é susceptível de excluir o facto de os §§ 8 e 9 do VerpackV constituírem, para os produtores de bebidas estabelecidos noutros Estados‑Membros, um obstáculo à comercialização dos seus produtos na Alemanha.

70
Contrariamente ao que sustentam o demandado no processo principal e o Governo alemão, os §§ 8 e 9 do VerpackV não podem ser equiparados a disposições nacionais que limitam ou proíbem determinadas «modalidades de venda» na acepção do acórdão de 24 de Novembro de 1993, Keck e Mithouard (C‑267/91 e C‑268/91, Colect., p. I‑6097, n.os 16 e segs.).

71
Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que a necessidade, decorrente das medidas em causa, de modificar a embalagem ou o rótulo dos produtos importados exclui que essas medidas sejam relativas às modalidades de venda desses produtos na acepção do acórdão Keck e Mithouard, já referido (v. acórdãos de 3 de Junho de 1999, Colim, C‑33/97, Colect., p. I‑3175, n.° 37, de 16 de Janeiro de 2003, Comissão/Espanha, C‑12/00, Colect., p. I‑459, n.° 76, e de 18 de Setembro de 2003, Morellato, C‑416/00, Colect., p. I‑9343, n.° 29).

72
Ora, conforme foi afirmado no n.° 64 do presente acórdão, a substituição da participação num sistema integrado de recolha pela implementação de um sistema de depósito e de recuperação individual obriga os produtores em causa a modificarem determinadas indicações nas suas embalagens.

73
Em todo o caso, uma vez que as disposições do VerpackV não afectam da mesma forma a comercialização das bebidas produzidas na Alemanha e a das bebidas provenientes de outros Estados‑Membros, não podem ser subtraídas ao âmbito de aplicação do artigo 28.° CE (v. acórdão Keck e Mithouard, já referido, n.os 16 e 17).

Quanto às justificações assentes na protecção do ambiente

74
Em seguida, há que examinar se, como é afirmado pelo demandado no processo principal e pelo Governo alemão, uma regulamentação como a prevista nos §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, da VerpackV pode ser justificada por razões atinentes à protecção do ambiente.

75
Segundo jurisprudência assente, as medidas nacionais susceptíveis de criarem entraves ao comércio intracomunitário podem ser justificadas por exigências imperativas ligadas à protecção do ambiente, desde que as medidas em causa sejam proporcionadas ao objectivo prosseguido (acórdãos Comissão/Dinamarca, já referido, n.os 6 e 9, e de 14 de Julho de 1998, Aher‑Waggon, C‑389/96, Colect., p. I‑4473, n.° 20).

76
A este respeito, deve observar‑se que a obrigação de implantar um sistema de depósito e de recuperação das embalagens vazias é um elemento indispensável de um sistema que visa assegurar a reutilização das embalagens (acórdão Comissão/Dinamarca, já referido, n.° 13).

77
No que se refere às embalagens não reutilizáveis, note‑se que, como o demandado no processo principal e o Governo alemão afirmam, a implementação de um sistema de depósito e de recuperação individual é susceptível de aumentar a percentagem de retorno das embalagens vazias e conduz a uma triagem selectiva dos resíduos de embalagens, contribuindo assim para melhorar a valorização destas últimas. Além disso, na medida em que a cobrança de um depósito incita o consumidor a devolver as embalagens vazias nos pontos de venda, contribui para a redução dos resíduos na natureza.

78
Acresce que, na medida em que a regulamentação em causa no processo principal faz depender a entrada em vigor de um novo sistema de gestão dos resíduos de embalagens da proporção das embalagens reutilizáveis no mercado alemão, cria uma situação em que todo e qualquer aumento de vendas de bebidas acondicionadas em embalagens de tara perdida nesse mercado aumenta a probabilidade de superveniência de uma mudança de sistema. Na medida em que a regulamentação referida encoraja assim os produtores e distribuidores em causa a recorrerem a embalagens reutilizáveis, contribui para a redução dos resíduos a eliminar, que constitui um dos objectivos gerais da política de protecção do ambiente.

79
No entanto, para que essa regulamentação respeite o princípio da proporcionalidade, é necessário verificar se os meios que utiliza são aptos para realizar os objectivos a atingir e se não ultrapassam aquilo que é necessário para os atingir (v. acórdão de 14 de Julho de 1998, Safety Hi‑Tech, C‑284/95, Colect., p. I‑4301, n.° 57).

80
A este respeito, importa observar que, para que uma regulamentação nacional satisfaça este último critério, deve permitir aos produtores e aos distribuidores em causa, antes da entrada em vigor do sistema de depósito e de recuperação individual, adaptar os seus métodos de produção e a gestão dos resíduos de embalagens de tara perdida às exigências do novo sistema. Embora um Estado‑Membro possa certamente deixar aos referidos produtores e distribuidores o ónus de implantar esse sistema, organizando a retoma das embalagens, o reembolso dos montantes do depósito e a eventual compensação destes últimos entre distribuidores, é ainda necessário que o Estado‑Membro em questão assegure que, no momento da mudança do sistema de gestão dos resíduos de embalagens, todos os produtores ou distribuidores em causa possam efectivamente participar num sistema operacional.

81
Cumpre concluir que uma regulamentação, como o VerpackV, que faz depender a implantação de um sistema de depósito e de recuperação individual de uma percentagem de reutilização das embalagens, seguramente vantajoso no plano ecológico, apenas respeita o princípio da proporcionalidade se, ao incentivar a reutilização das embalagens, conferir aos produtores e aos distribuidores em causa um período de transição razoável para se adaptarem a esse sistema e assegurar que, no momento da mudança do sistema de gestão dos resíduos de embalagens, todos os produtores ou distribuidores em questão possam efectivamente participar num sistema operacional.

82
Incumbe ao juiz nacional pronunciar‑se sobre a questão de saber se a mudança de sistema de gestão dos resíduos de embalagens, como a prevista nos §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, do VerpackV, permite aos produtores e aos distribuidores em causa participarem num sistema operacional nas condições supramencionadas.

83
Por conseguinte, deve responder‑se à quarta questão que o artigo 28.° CE se opõe a uma regulamentação nacional, como a que consta dos §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, do VerpackV, que prevê a substituição de um sistema integrado de recolha de resíduos de embalagens por um sistema de depósito e de recuperação individual, sem que os produtores e distribuidores em causa disponham de um período de transição razoável para se adaptarem a esse sistema e sem que lhes seja assegurado que, no momento da mudança do sistema de gestão dos resíduos de embalagens, possam efectivamente participar num sistema operacional.

Quanto à segunda questão

84
Atendendo à resposta dada à quarta questão, deixa de ser necessário responder à segunda questão.


Quanto às despesas

85
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas para apresentação das observações ao Tribunal de Justiça, com excepção das despesas das referidas partes, não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)
O artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens, não se opõe a que os Estados‑Membros adoptem medidas destinadas a privilegiar os sistemas de reutilização de embalagens.

2)
O artigo 7.° da Directiva 94/62, embora não conferindo aos produtores e aos distribuidores em causa qualquer direito de continuarem a participar num determinado sistema de gestão dos resíduos de embalagens, opõe‑se à substituição de um sistema integrado de recolha desses resíduos por um sistema de depósito e de recuperação individual, quando o novo sistema não for igualmente apto para atingir os objectivos da referida directiva ou quando a passagem para esse novo sistema não for feita sem rupturas e sem pôr em risco a possibilidade de os operadores económicos dos sectores abrangidos participarem efectivamente no novo sistema a partir da entrada em vigor deste último.

3)
O artigo 28.° CE opõe‑se a uma regulamentação nacional, como a que consta dos §§ 8, n.° 1, e 9, n.° 2, do Verordnung über die Vermeidung und Verwertung von Verpackungsabfällen (regulamento relativo à prevenção e à valorização dos resíduos de embalagens), que prevê a substituição de um sistema integrado de recolha de resíduos de embalagens por um sistema de depósito e de recuperação individual, sem que os produtores e distribuidores em causa disponham de um período de transição razoável para se adaptarem a esse sistema e sem que lhes seja assegurado que, no momento da mudança do sistema de gestão dos resíduos de embalagens, possam efectivamente participar num sistema operacional.

Assinaturas.


1
Língua do processo: alemão.

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