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Documento 61993CJ0319
Judgment of the Court of 12 December 1995. # Hendrik Evert Dijkstra v Friesland (Frico Domo) Coöperatie BA and Cornelis van Roessel and others v De coöperatieve vereniging Zuivelcoöperatie Campina Melkunie VA and Willem de Bie and others v De Coöperatieve Zuivelcoöperatie Campina Melkunie BA. # References for a preliminary ruling: Gerechtshof Leeuwarden and Arrondissementsrechtbank 's-Hertogenbosch - Netherlands. # Competition - Statutes of dairy cooperative associations - Fee payable on withdrawal or expulsion - Interpretation of Article 2 of Regulation no 26. # Joined cases C-319/93, C-40/94 and C-224/94.
Acórdão do Tribunal de 12 de Dezembro de 1995.
Hendrik Evert Dijkstra contra Friesland (Frico Domo) Coöperatie BA e Cornelis van Roessel e outros contra De coöperatieve vereniging Zuivelcoöperatie Campina Melkunie VA e Willem de Bie e outros contra De Coöperatieve Zuivelcoöperatie Campina Melkunie BA.
Pedidos de decisão prejudicial: Gerechtshof Leeuwarden e Arrondissementsrechtbank 's-Hertogenbosch - Países Baixos.
Concorrência - Estatutos da cooperativas leiteiras - Regime de compensação pela saída - Interpretação do artigo 2.º do Regulamento n.º 26.
Processos apensos C-319/93, C-40/94 e C-224/94.
Acórdão do Tribunal de 12 de Dezembro de 1995.
Hendrik Evert Dijkstra contra Friesland (Frico Domo) Coöperatie BA e Cornelis van Roessel e outros contra De coöperatieve vereniging Zuivelcoöperatie Campina Melkunie VA e Willem de Bie e outros contra De Coöperatieve Zuivelcoöperatie Campina Melkunie BA.
Pedidos de decisão prejudicial: Gerechtshof Leeuwarden e Arrondissementsrechtbank 's-Hertogenbosch - Países Baixos.
Concorrência - Estatutos da cooperativas leiteiras - Regime de compensação pela saída - Interpretação do artigo 2.º do Regulamento n.º 26.
Processos apensos C-319/93, C-40/94 e C-224/94.
Colectânea de Jurisprudência 1995 I-04471
Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:1995:433
Acórdão do Tribunal de 12 de Dezembro de 1995. - Hendrik Evert Dijkstra contra Friesland (Frico Domo) Coöperatie BA e Cornelis van Roessel e outros contra De coöperatieve vereniging Zuivelcoöperatie Campina Melkunie VA e Willem de Bie e outros contra De Coöperatieve Zuivelcoöperatie Campina Melkunie BA. - Pedidos de decisão prejudicial: Gerechtshof Leeuwarden e Arrondissementsrechtbank 's-Hertogenbosch - Países Baixos. - Concorrência - Estatutos da cooperativas leiteiras - Regime de compensação pela saída - Interpretação do artigo 2.º do Regulamento n.º 26. - Processos apensos C-319/93, C-40/94 e C-224/94.
Colectânea da Jurisprudência 1995 página I-04471
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
++++
1. Agricultura ° Regras de concorrência ° Regulamento n. 26 ° Derrogação prevista para os acordos, decisões e práticas de sociedades cooperativas de um único Estado-Membro ° Alcance autónomo ° Acordo ou decisão, excluído do benefício da derrogação, abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado que não foi objecto de uma isenção ° Nulidade ° Efeito retroactivo
(Tratado CE, artigos 39. e 85. ; Regulamento n. 26 do Conselho, artigo 2. , n. 1)
2. Agricultura ° Regras de concorrência ° Regulamento n. 26 ° Acordos, decisões e práticas de sociedades cooperativas de um único Estado-Membro ° Execução ° Repartição das competências entre a Comissão e os órgãos jurisdicionais nacionais
(Tratado CE, artigo 85. ; Regulamento n. 26 do Conselho, artigo 2. , n. 1)
1. Resulta da génese da fundamentação do Regulamento n. 26, relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas, que a inaplicabilidade do artigo 85. do Tratado aos acordos, decisões e práticas de agricultores, de associações de agricultores ou de associações destas associações está exclusivamente sujeita às condições enunciadas no artigo 2. , n. 1, segundo período, do referido regulamento. Se um acordo ou decisão cair no âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado e se as condições da derrogação prevista no artigo 2. , n. 1, segundo período, do mesmo regulamento não estiverem preenchidas, e não beneficiar de uma isenção em conformidade com o artigo 85. , n. 3, tal acordo é nulo e essa nulidade produz efeitos retroactivos.
Com efeito, a interpretação do segundo período no sentido de que o mesmo não tem alcance autónomo iria precisamente contra a vontade do legislador, na medida em que aos acordos que deviam ser objecto de um regime mais flexível seriam aplicadas condições mais rigorosas, uma vez que deveriam preencher as condições enunciadas tanto no primeiro como no segundo período. Além disso, dificilmente a Comissão poderia verificar que um acordo põe em perigo a realização dos objectivos do artigo 39. do Tratado se, por força da derrogação enunciada no primeiro período, estiver já provado que esse acordo ou essa decisão é necessário à realização desses objectivos.
2. Um órgão jurisdicional nacional, perante o qual é invocada a nulidade da cláusula contida nos estatutos de uma cooperativa agrícola por violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, quando a cooperativa invoca o artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26, relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas, pode prosseguir a instância e decidir o litígio que lhe é submetido nos casos em que é manifesto que as condições de aplicação do artigo 85. , n. 1, não estão preenchidas ou ainda verificar a nulidade da cláusula controvertida, nos termos do artigo 85. , n. 2, se tiver a certeza que essa cláusula não preenche as condições para beneficiar da derrogação prevista do artigo 2. , n. 1, deste mesmo regulamento, nem de uma isenção nos termos do artigo 85. , n. 3. Em caso de dúvida, o órgão jurisdicional nacional pode, quando tal seja oportuno e conforme às disposições processuais nacionais, obter informações complementares da Comissão ou dar às partes a possibilidade de pedirem à Comissão que se pronuncie.
Nos processos apensos C-319/93, C-40/94 e C-224/94,
que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo Gerechtshof te Leeuwarden e pelo Arrondissementsrechtbank te 's-Hertogenbosch (Países Baixos), destinados a obter, nos litígios pendentes nestes órgãos jurisdicionais entre
Hendrik Evert Dijkstra (C-319/93)
e
Friesland (Frico Domo) Cooeperatie BA,
entre
Cornelis van Roessel e o. (C-40/94)
e
De cooeperatieve vereniging Zuivelcooeperatie Campina Melkunie BA,
e entre
Willem de Bie e o. (C-224/94)
e
De Cooeperatie Zuivelcooeperatie Campina Melkunie BA,
uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 do Conselho, de 4 de Abril de 1962, relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas (JO 1962, 30, p. 993; EE 08 F1 p. 29),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, C. N. Kakouris, D. A. O. Edward, J.-P. Puissochet e G. Hirsch, presidentes de secção, J. C. Moitinho de Almeida (relator), P. J. G. Kapteyn, C. Gulmann, J. L. Murray, P. Jann e L. Sevón, juízes,
advogado-geral: G. Tesauro,
secretário: H. A. Ruehl, administrador principal,
vistas as observações escritas apresentadas:
° em representação de H. Dijkstra (C-319/93), por P. E. Mazel, advogado em Leeuwarden,
° em representação da Friesland (Frico Domo) Cooeperatie BA (C-319/93), por M. B. W. Biesheuvel, advogado em Haia,
° em representação de W. de Bie e o. (C-224/94), por I. W. VerLoren van Themaat, advogado em Amsterdão,
° em representação da De cooeperatieve vereniging Zuivelcooeperatie Campina Melkunie BA (C-40/94 e C-224/94), por T. R. Ottervanger, advogado em Roterdão,
° em representação do Governo neerlandês (C-40/94), por A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,
° em representação do Governo francês (C-319/93), por C. de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e J.-M. Belorgey, encarregado de missão na mesma direcção, na qualidade de agentes,
° em representação do Governo dinamarquês (C-40/94), por P. Biering, chefe de direcção no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,
° em representação da Comissão das Comunidades Europeias (C-319/93, C-40/94 e C-224/94), por B. J. Drijber, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,
vistos os relatórios para audiência nos processos C-319/93 e C-40/94, visto o relatório do juiz-relator no processo C-224/94,
ouvidas as alegações de H. E. Dijkstra (C-319/93), representado por P. E. Mazel, de C. van Roessel e o. (C-40/94), representados por P. J. L. J. Duijsens, advogado em Haia, da Friesland (Frico Domo) Cooeperatie BA (C-319/93), representada por M. B. W. Biesheuvel, da De cooeperatieve vereniging Zuivelcooeperatie Campina Melkunie BA (C-40/94), representada por T. R. Ottervanger, do Governo neerlandês, representado por J. W. de Zwaan, consultor jurídico adjunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, do Governo francês, representado por J.-M. Belorgey, e da Comissão, representada por B. J. Drijber, na audiência de 21 de Fevereiro de 1995,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 12 de Setembro de 1995,
profere o presente
Acórdão
1 Por três despachos de 12 de Maio de 1993, 21 de Janeiro e 29 de Julho de 1994, que deram entrada no Tribunal de Justiça respectivamente em 18 de Junho de 1993, 31 de Janeiro e 2 de Agosto de 1994, o Gerechtshof te Leeuwarden (C-319/93) e o Arrondissementsrechtbank te 's-Hertogenbosch (C-40/94 e C-224/94) colocaram, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, actual Tratado CE, várias questões prejudiciais sobre a interpretação do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 do Conselho, de 4 de Abril de 1962, relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas (JO 1962, 30, p. 993; EE 08 F1 p. 29, a seguir "Regulamento n. 26").
2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de litígios que opõem criadores de gado leiteiro às cooperativas agrícolas de que eram membros quanto à obrigação, que lhes é imposta pelos estatutos das cooperativas, de pagarem uma compensação pela saída em caso de abandono ou de exclusão das mesmas.
3 Quando esses criadores foram excluídos ou abandonaram a cooperativa de que faziam parte, foi-lhes imposto o pagamento de uma compensação pela saída de um montante igual, consoante os casos, a 10% do preço do leite que tinham recebido da cooperativa em média por ano, no decurso dos cinco últimos exercícios, ou a 4% do preço do leite que tinham recebido no decurso do exercício anterior ao ano da sua saída.
4 Perante os órgãos jurisdicionais nacionais, os demandantes nos processos principais sustentaram que o regime de compensação pela saída é, designadamente, incompatível com os artigos 85. e 86. do Tratado CEE. Alguns alegaram em especial que a compensação pela saída exigida pelas cooperativas cria, de facto, uma obrigação de entrega exclusiva durante um período indeterminado que restringe a liberdade económica dos seus membros e constitui, assim, um entrave para os concorrentes da cooperativa.
5 Além disso, fizeram referência ao procedimento inciado pela Comissão contra a Zuivelcooeperatie Campina BA, nos termos do artigo 85. do Tratado CEE. Esse procedimento terminou com a aceitação de um compromisso assumido pela cooperativa de modificar as cláusulas do seus estatutos que regem as condições de saída dos seus membros, a fim de permitir a estes últimos rescindirem a sua filiação em três datas no decurso de um exercício, mediante um pré-aviso de dois anos, sem serem devedores de qualquer compensação pela saída, ou em 1 de Abril, mediante um pré-aviso de três anos, com a obrigação de pagarem uma compensação pela saída de 4% (XXI Relatório sobre a Política de Concorrência, 1991, n.os 83 e 84).
6 Por último, os demandantes nos processos principais sustentaram ainda que o referido regime de compensação pela saída não pode beneficiar da excepção prevista no artigo 2. do Regulamento n. 26, nos termos do qual:
"1. O disposto no n. 1 do artigo 85. do Tratado é inaplicável aos acordos, decisões e práticas referidos no artigo anterior que façam parte integrante de uma organização nacional de mercado ou que sejam necessários à realização dos objectivos enunciados no artigo 39. do Tratado. Não se aplica em especial aos acordos, decisões e práticas dos agricultores, de associações de agricultores ou de associações destas associações pertencentes a um único Estado-Membro, na medida em que, sem incluir a obrigação de praticar um determinado preço, digam respeito à produção ou à venda de produtos agrícolas ou à utilização de instalações comuns de armazenagem, de tratamento ou de transformação de produtos agrícolas, a menos que a Comissão verifique que, deste modo, a concorrência é excluída ou que os objectivos do artigo 39. do Tratado são postos em perigo.
2. Após ter consultado os Estados-Membros e ouvido as empresas ou associações de empresas interessadas, bem como qualquer outra pessoa singular ou colectiva cuja audição lhe pareça necessária, a Comissão, sem prejuízo do controlo pelo Tribunal de Justiça, tem competência exclusiva para verificar, por meio de decisão que será publicada, quais os acordos, decisões e práticas em relação aos quais se encontram preenchidas as condições previstas no n. 1.
3. A Comissão procederá a esta verificação quer oficiosamente, quer a pedido de uma autoridade competente de um Estado-Membro ou de uma empresa ou associação de empresas interessadas.
..."
7 A este respeito, salientam, por um lado, que não estão satisfeitas as exigências formuladas no artigo 2. , n. 1, primeiro período, e, por outro, que o segundo período desta mesma disposição não tem significado autónomo visto que as cooperativas agrícolas devem estar sujeitas às mesmas exigências a que o primeiro período subordina a aplicação do regime derrogatório.
8 Os órgãos jurisdicionais nacionais salientam que a aplicação do artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26 sempre suscitou dúvidas e deu origem a duas interpretações diferentes.
9 Segundo a primeira interpretação, literal, o artigo 2. , n. 1, segundo período, não teria qualquer função autónoma. O termo "em especial" no início do período significaria que este se limita a dar um exemplo dos acordos que beneficiam do regime de isenção estabelecido no artigo 2. , n. 1, primeiro período. Nalgumas das suas decisões a Comissão teria adoptado esta interpretação.
10 De acordo com a segunda interpretação, baseada na génese do Regulamento n. 26 e seguida pela Comissão nas suas primeiras decisões, bem como nalgumas das suas decisões mais recentes, o artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26 teria alcance autónomo. Dada a importância das cooperativas no sector agrícola, estabeleceria assim uma excepção distinta dos casos de inaplicabilidade do artigo 85. previstos no primeiro período. Este segundo período instituiria, aliás, uma inversão do ónus da prova em favor das cooperativas de agricultores uma vez que, relativamente aos acordos como os descritos no primeiro período, caberia à Comissão provar que os referidos acordos excluem a concorrência ou põem em perigo os objectivos do Tratado. Dado que o objectivo da disposição é estabelecer um regime mais flexível para as cooperativas agrícolas, uma interpretação diferente conduziria a um encargo mais pesado para as cooperativas, na medida em que tanto as condições do primeiro período como as do segundo deveriam estar preenchidas.
11 Nestas condições, considerando que estes litígios suscitam problemas de interpretação do direito comunitário, os órgão jurisdicionais nacionais decidiram suspender as instâncias e colocar ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
° Nos processos C-319/93, C-40/94 e C-224/94:
"1) O segundo período do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas, período esse que se refere a acordos, decisões ou práticas de agricultores, de associações de agricultores ou de associações destas associações pertencentes a um único Estado-Membro, tem significado autónomo, de modo que o juiz nacional deve presumir a sua validade, enquanto a Comissão não tiver verificado que através dos mesmos a concorrência é excluída ou que os objectivos do artigo 39. do Tratado CEE são postos em perigo?
2) Em caso afirmativo, para uma verificação pela Comissão de que é esse o caso, exige-se que a mesma consubstancie a sua apreciação numa decisão, segundo o disposto no artigo 2. , n. 2?
3) Em caso negativo, deve o juiz nacional, se num litígio submetido à sua apreciação, em que se invoca a nulidade de um acordo ou de uma decisão de uma cooperativa agrícola por violação do artigo 85. do Tratado CEE e a cooperativa invocar o disposto no segundo período do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26, submeter o assunto à apreciação da Comissão?"
° No processo C-224/94, foram colocadas questões complementares:
"(I) O artigo 2. , n. 2, do Regulamento n. 26, conjugado com o artigo 1. do mesmo regulamento, deve ser interpretado no sentido de que, enquanto a Comissão não declarar, nos termos da referida disposição, mediante decisão, que um acordo preenche os requisitos positivos da excepção previstos no artigo 2. , n. 1, o artigo 85. , n. 1, do Tratado CEE é directamente aplicável por força do artigo 1. do referido regulamento?
(II) É diferente a resposta à questão anterior se a Comissão verificar, nos termos do final do segundo período do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 que a concorrência é excluída ou que os objectivos do artigo 39. do Tratado CEE são postos em perigo?
(III) Em caso de resposta negativa às duas primeiras questões, o juiz nacional dispõe de competência autónoma para declarar a inaplicabilidade do regime de excepção previsto no artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26, dado que a Comissão deu a conhecer, de modo diferente de uma decisão, que o artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 não é aplicável, ou o referido juiz deve pedir à Comissão uma decisão formal e suspender a instância até que a Comissão se pronuncie mediante decisão?"
12 Por despacho de 1 de Dezembro de 1994, o Tribunal de Justiça ordenou, nos termos do artigo 43. do Regulamento de Processo, a apensação dos processos C-319/93 e C-40/94 para efeitos da fase oral e do acórdão.
13 Por despacho de 14 de Julho de 1995, o Tribunal de Justiça ordenou, nos termos do artigo 43. do Regulamento de Processo, a apensação dos processos C-319/93, C-40/94 e C-224/94 para efeitos do acórdão.
14 A análise das perguntas colocadas demonstra que os órgãos jurisdicionais nacionais se questionam, por um lado, sobre a interpretação do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 e, em especial, do seu segundo período e, por outro, sobre as competências da Comissão e dos órgãos jurisdicionais nacionais no âmbito da aplicação do referido artigo.
Quanto à interpretação do artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26
15 Preliminarmente, convém recordar que, em conformidade com o artigo 42. do Tratado, as disposições do capítulo relativo às regras de concorrência só são aplicáveis à produção e ao comércio dos produtos agrícolas, enumerados na lista constante do anexo II do Tratado (artigo 38. , n. 3), na medida em que tal seja determinado pelo Conselho.
16 Com base nestas disposições, o Conselho adoptou o Regulamento n. 26 que, no seu artigo 1. , prevê que os artigos 85. a 90. do Tratado, bem como as disposições tomadas em sua execução, se aplicam a todos os acordos, decisões e práticas relativos à produção e ao comércio dos produtos em questão, sem prejuízo do disposto no artigo 2. do mesmo regulamento.
17 A este respeito, há que salientar que para interpretar o artigo 2. , n. 1, segundo período, há que ter em conta a sua génese, bem como a fundamentação do Regulamento n. 26.
18 Em primeiro lugar, resulta da génese do referido regulamento que o legislador, ao acrescentar, a pedido do Parlamento Europeu, esse segundo período, que não figurava na proposta inicial do regulamento da Comissão, quis instituir uma excepção em benefício dos acordos, decisões e práticas de agricultores, desde que os mesmos preencham as condições aí enunciadas, a menos que a Comissão verifique que o acordo exclui a concorrência ou põe em perigo os objectivos do artigo 39. do Tratado.
19 Esta vontade de proteger as cooperativas agrícolas resulta em seguida da fundamentação do Regulamento n. 26 e nomeadamente do seu quarto considerando, nos termos do qual convém prestar uma atenção especial à situação das associações de agricultores.
20 A interpretação do segundo período no sentido de que o mesmo não tem alcance autónomo iria precisamente contra a vontade do legislador na medida em que aos acordos que deviam ser objecto de um regime mais flexível seriam aplicadas condições mais rigorosas, uma vez que deveriam preencher as condições enunciadas tanto no primeiro como no segundo período. Além disso, dificilmente a Comissão poderia verificar que um acordo põe em perigo a realização dos objectivos do artigo 39. do Tratado se, por força da derrogação enunciada no primeiro período, estiver já provado que esse acordo ou essa decisão é necessário à realização desses objectivos.
21 Além disso, há que afastar o argumento segundo o qual os referidos acordos podem beneficiar de uma validade provisória enquanto a Comissão não tiver verificado que a concorrência foi excluída ou que os objectivos do artigo 39. foram postos em perigo, uma vez que o artigo 2. , n. 1, segundo período, só institui uma inversão do ónus da prova a favor dos agricultores.
22 Por conseguinte, se se verificar que um acordo ou uma decisão cai no âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, e que as condições da derrogação prevista no artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26 não estão preenchidas, e que não beneficia de uma isenção em conformidade com o artigo 85. , n. 3, do Tratado, tal acordo ou decisão é nulo nos termos do artigo 85. , n. 2. Essa nulidade tem efeitos ex tunc (v., nomeadamente, acórdão de 6 de Fevereiro de 1973, Brasserie de Haecht, 48/72, Colect., p. 19, n. 27).
23 É tendo em conta este regime que o Conselho, quando o considera oportuno, prevê uma excepção ao princípio segundo o qual a nulidade dos acordos proibidos pelo artigo 85. , n. 1, produz efeitos retroactivos. Aliás, é assim que o Regulamento n. 1360/78 do Conselho, de 19 de Junho de 1978, relativo aos agrupamentos de produtores e suas uniões (JO L 166, p. 1; EE 03 F14 p. 125), dispõe, no seu artigo 17. , que uma decisão que verifique, por força do artigo 2. do Regulamento n. 26, que o artigo 85. , n. 1, do Tratado é aplicável aos acordos previstos por esse regulamento só será aplicada a contar da data da verificação.
24 Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que a inaplicabilidade do artigo 85. do Tratado aos acordos, decisões e práticas de agricultores, de associações de agricultores ou de associações destas associações está exclusivamente sujeita às condições enunciadas no artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26. Se um acordo ou decisão cair no âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado e se as condições da derrogação prevista no artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26 não estiverem preenchidas, e não beneficiar de uma isenção em conformidade com o artigo 85. , n. 3, tal acordo é nulo e essa nulidade produz efeitos retroactivos.
Quanto à competência para aplicar o artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26
25 Quanto à repartição das competências entre a Comissão e os órgãos jurisdicionais nacionais para aplicar o artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26, há que sublinhar antes de mais que, por força dos n.os 2 e 3 desta mesma disposição, a Comissão, sem prejuízo da fiscalização pelo Tribunal de Justiça, tem competência exclusiva para declarar que um acordo preenche as condições previstas no n. 1.
26 Em contrapartida, a Comissão não dispõe de qualquer competência exclusiva para a aplicação do artigo 85. , n. 1. Como o Tribunal já salientou no seu acórdão de 28 de Fevereiro de 1991, Delimitis (C-234/89, Colect., p. I-935, n. 45), a Comissão partilha com os órgãos jurisdicionais nacionais a competência para aplicar essa disposição. Efectivamente, como o Tribunal de Justiça o precisou no acórdão de 30 de Janeiro de 1974, BRT (127/73, Colect., p. 33), o artigo 85. , n. 1, produz efeitos directos nas relações entre particulares e cria directamente direitos na esfera jurídica dos particulares que esses órgãos jurisdicionais nacionais devem proteger.
27 Seguidamente, há que examinar as consequências desta repartição de competências quanto à aplicação concreta das regras de concorrência comunitárias pelos órgãos jurisdicionais nacionais à luz dos princípios enunciados pelo Tribunal de Justiça no acórdão Delimitis, já referido.
28 A este respeito, há que ter em conta o facto de os órgãos jurisdicionais nacionais perante os quais é invocado que um acordo entre agricultores ou suas associações é abrangido pela derrogação especial prevista pelo Regulamento n. 26 poderem ser levados a tomar decisões contrárias às adoptadas ou previstas pela Comissão para a aplicação do artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26, ou, eventualmente, para a aplicação do artigo 85. , n.os 1 e 3. Essas decisões contraditórias seriam todavia contrárias ao princípio geral da segurança jurídica e devem, assim, ser evitadas quando os órgãos jurisdicionais se pronunciam sobre acordos ou práticas que podem ainda ser objecto de uma decisão da Comissão.
29 A fim de conciliar a necessidade de evitar decisões contraditórias com a obrigação, do juiz nacional, de decidir dos pedidos da parte no litígio que invoca a nulidade de um acordo, o juiz nacional pode ter em conta aquando da aplicação do artigo 85. as seguintes considerações.
30 Se as condições de aplicação do artigo 85. , n. 1, não estiverem manifestamente preenchidas, o juiz nacional pode prosseguir a instância para decidir quanto ao acordo controvertido.
31 Pelo contrário, se o juiz nacional considerar que o acordo preenche as condições de aplicação do artigo 85. , n. 1, deve verificar, em conformidade com o artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26, se se trata de um acordo de agricultores, de associações de agricultores ou de associações destas associações pertencentes a um único Estado-Membro que, sem incluir a obrigação de praticar um determinado preço, diz respeito à produção ou à venda de produtos agrícolas ou à utilização de instalações comuns de armazenagem, de tratamento ou de transformação de produtos agrícolas.
32 Se o juiz nacional verificar que o acordo preenche essas condições e que é manifesto, tendo em conta os critérios enunciados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e pela prática da Comissão, a qual não resulta aliás apenas das decisões por ela adoptadas mas também, nomeadamente, dos seus relatórios sobre política da concorrência e das suas comunicações, que o acordo exclui a concorrência ou põe em perigo os objectivos do artigo 39. , pode declarar a sua nulidade em conformidade com o artigo 85. , n. 2, do Tratado se esse acordo não puder em caso algum ser objecto de uma decisão de isenção nos termos do artigo 85. , n. 3.
33 A este respeito, convém recordar que um acordo só pode ser objecto de tal decisão se tiver sido notificado ou se não estiver sujeito à obrigação de notificação. Um acordo não está sujeito à obrigação de notificação, nos termos do artigo 4. , n. 2, do Regulamento n. 17/62, quando nele participem apenas empresas de um único Estado-Membro e quando tal acordo não diga respeito à importação nem à exportação entre Estados-Membros. Os estatutos de cooperativas leiteiras podem preencher essas condições.
34 Se, em contrapartida, o juiz nacional considerar que o acordo controvertido pode ser abrangido pela derrogação mencionada no artigo 2. , n. 1, segundo período, pode decidir suspender a instância quer para permitir às partes em questão solicitarem à Comissão uma decisão nos termos do n. 3 do mesmo artigo, quer para obter ele próprio informações sobre a situação do procedimento que essa instituição terá eventualmente iniciado e sobre a probabilidade de ela se pronunciar oficialmente sobre o acordo controvertido, quer ainda para obter dados económicos e jurídicos que essa instituição esteja em condições de lhe fornecer.
35 De qualquer modo, o órgão jurisdicional nacional pode suspender a instância para submeter ao Tribunal de Justiça um pedido prejudicial nos termos do artigo 177. do Tratado.
36 Assim, há que responder à terceira questão que um órgão jurisdicional nacional, perante o qual é invocada a nulidade da cláusula contida nos estatutos de uma cooperativa agrícola por violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, quando a cooperativa invoca o artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26, pode prosseguir a instância e decidir o litígio que lhe é submetido nos casos em que é manifesto que as condições de aplicação do artigo 85. , n. 1, não estão preenchidas ou ainda verificar a nulidade da cláusula controvertida, nos termos do artigo 85. , n. 2, se tiver a certeza que essa cláusula não preenche as condições para beneficiar da derrogação prevista no artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 nem de uma isenção nos termos do artigo 85. , n. 3. Em caso de dúvida, o órgão jurisdicional nacional pode, quando tal seja oportuno e conforme às disposições processuais nacionais, obter informações complementares da Comissão ou dar às partes a possibilidade de pedirem à Comissão que se pronuncie.
37 Tendo em conta as respostas dadas às primeira e terceira questões prejudiciais, não há que responder às outras questões.
Quanto às despesas
38 As despesas efectuadas pelos Governos neerlandês, francês e dinamarquês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
pronunciando-se sobre as questões que lhe foram submetidas pelo Gerechtshof te Leeuwarden, por despacho de 12 de Maio de 1993 (C-319/93), e pelo Arrondissementsrechtbank te 's-Hertogenbosch, por despachos de 21 de Janeiro e 29 de Julho de 1994 (C-40/94 e C-224/94), declara:
1) A inaplicabilidade do artigo 85. do Tratado aos acordos, decisões e práticas de agricultores, de associações de agricultores ou de associações destas associações está exclusivamente sujeita às condições enunciadas no artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26. Se um acordo ou decisão cair no âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado e se as condições da derrogação prevista no artigo 2. , n. 1, segundo período, do Regulamento n. 26 não estiverem preenchidas, e não beneficiar de uma isenção em conformidade com o artigo 85. , n. 3, tal acordo é nulo e essa nulidade produz efeitos retroactivos.
2) Um órgão jurisdicional nacional, perante o qual é invocada a nulidade da cláusula contida nos estatutos de uma cooperativa agrícola por violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, quando a cooperativa invoca o artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26, pode prosseguir a instância e decidir o litígio que lhe é submetido nos casos em que é manifesto que as condições de aplicação do artigo 85. , n. 1, não estão preenchidas ou ainda verificar a nulidade da cláusula controvertida, nos termos do artigo 85. , n. 2, se tiver a certeza que essa cláusula não preenche as condições para beneficiar da derrogação prevista no artigo 2. , n. 1, do Regulamento n. 26 nem de uma isenção nos termos do artigo 85. , n. 3. Em caso de dúvida, o órgão jurisdicional nacional pode, quando tal seja oportuno e conforme às disposições processuais nacionais, obter informações complementares da Comissão ou dar às partes a possibilidade de pedirem à Comissão que se pronuncie.