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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 61990CJ0362

    Acórdão do Tribunal de 31 de Março de 1992.
    Comissão das Comunidades Europeias contra República Italiana.
    Incumprimento de Estado - Contratos públicos de fornecimento - Admissibilidade.
    Processo C-362/90.

    Colectânea de Jurisprudência 1992 I-02353

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:1992:158

    RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

    apresentado no processo C-362/90 ( *1 )

    I — Enquadramento jurídico, matéria de facto e tramitação processual

    1.

    O artigo 23.°, n.° 1, da Directiva 77/62/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1976, relativa à coordenação dos processos de celebração dos contratos de fornecimento de direito público (JO 1977, L 13, p. 1; EE 17 F1 p. 29), determina que

    «a capacidade técnica do fornecedor pode ser comprovada por uma ou várias das maneiras seguintes, conforme a natureza, a quantidade e a utilização dos produtos a fornecer:

    a)

    lista dos principais fornecimentos efectuados durante os três últimos anos, os seus montantes, datas e destinatários públicos ou privados :

    ...».

    O artigo 14.° da mesma direttiva dispõe que,

    «nos concursos limitados, o anúncio deverá incluir pelo menos:

    ...

    d)

    as informações a incluir no pedido de participação sob forma de declarações ulteriormente verificáveis e relativas à situação do fornecedor, bem como as informações e formalidades necessárias que permitam avaliar as condições mínimas de carácter econòmico e técnico que as entidades adjudicantes fixarem aos fornecedores para a sua selecção; essas informações e formalidades não podem ir além das referidas nos artigos 20.°, 22.° e 23.°».

    2.

    A Unità Sanitaria locale (USL) XI — Genova 2 publicou na Gazzetta ufficiale della Repubblica italiana (GURI), Foglio delle inserzioni n.° 238, de 10 de Outubro de 1988, um anúncio de concurso público para o fornecimento de vários produtos, entre os quais carne de vaca fresca, no montante de 5800000000 LIT.

    Este anúncio estabelecia, como condição mínima de admissão ao concurso, o fornecimento, durante os três últimos anos (1985, 1986, 1987), de produtos idênticos de montante igual, pelo menos, ao séxtuplo do valor de cada fornecimento pedido, devendo 50 % desse montante ser constituído por fornecimentos efectuados a administrações públicas.

    3.

    A Comissão considerou que esta condição mínima, na medida em que só se referia aos fornecimentos efectuados a administrações públicas, era contrária ao artigo 23.° da Directiva 77/62, que deveria ser entendido no sentido de que contém uma enumeração exaustiva dos meios de prova que as entidades adjudicantes podem exigir no que toca à comprovação da capacidade técnica dos fornecedores. Por força do artigo 14.°, alínea d), da mesma directiva, esta condição não deveria, portanto, ter sido indicada no anúncio do concurso que a USL mandou publicar.

    Nestas condições, a Comissão, por carta de 10 de Fevereiro de 1989, notificou o Governo italiano, nos termos do artigo 169.° do Tratado CEE, para apresentar, no prazo de quinze dias, observações sobre o incumprimento que lhe era imputado.

    Por carta de 30 de Junho de 1989, o Governo italiano respondeu defendendo que o comportamento da USL XI — Gênova 2 estava em conformidade com uma disposição precisa da legislação italiana, que fora adoptada para transpor a Directiva 77/62 para a ordem jurídica italiana, ou seja, com o artigo 13.° da Lei n.° 113, de 30 de Março de 1981 (GURI n.° 93, de 3.4.1981), e não parecia, além disso, lesar de modo algum as expectativas legítimas das empresas dos outros Estados-membros que estivessem em condições de demonstrar que satisfaziam as condições exigidas.

    Considerando que as observações do Governo italiano não eram susceptíveis de modificar a posição que tomara na notificação de incumprimento, a Comissão convidou a República Italiana, no parecer fundamentado de 27 de Março de 1990, a tomar as medidas necessárias para proceder em conformidade com o parecer, no prazo de quinze dias a contar da respectiva notificação.

    Não tendo a República Italiana dado qualquer seguimento ao referido parecer fundamentado, a Comissão, por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 11 de Dezembro de 1990, intentou a presente acção.

    Com base no relatório preliminar do juiz-relator, ouvido o advogado-geral, o Tribunal decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução.

    II — Pedidos das partes

    A Comissão, demandante, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    declarar que, tendo a Unità Sanitaria locale XI — Génova 2 imposto que 50 % do montante minimo de fornecimentos efectuado durante os três últimos anos, e exigido para a admissão à participação num concurso público de fornecimento, fosse constituído por fornecimentos efectuados a administrações públicas, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 77/62/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1976, relativa à coordenação dos processos de celebração dos contratos de fornecimento de direito público;

    condenar a República Italiana nas despesas da instância.

    Na contestação, o Governo italiano, demandado, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    negar provimento à acção;

    condenar a Comissão nas despesas.

    Na tréplica, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    julgar a acção inadmissível ou, subsidiariamente, negar-lhe provimento;

    condenar a demandante nas despesas.

    III — Fundamentos e argumentos das partes

    Quanto à admissibilidade

    Na contestação, o Governo italiano salienta que, segundo as suas informações, todos os efeitos do contrato de fornecimento resultante do concurso público em causa cessaram em 31 de Dezembro de 1989 e que os anúncios de concurso para oš anos de 1990 e 1991 não contêm a condição que a Comissão considera incompatível com a Directiva 77/62. Deduz daqui que o objecto do litígio deixou de existir e sugere à Comissão que eventualmente desista da, instância.

    Na réplica, porém, a Comissão recusa desistir, com o fundamento de que nada garante que a condição impugnada não seja retomada no futuro, como o atesta o facto de o Governo italiano contestar o fundamento jurídico da posição da Comissão.

    Na tréplica, o Governo italiano requer que a acção seja julgada inadmissível, alegando que o incumprimento que lhe é imputado cessou em 31 de Dezembro de 1989, isto é, antes do termo do prazo que lhe tinha sido fixado no parecer fundamentado para proceder em conformidade com ele.

    Quanto ao mérito

    1.

    Na petição, a Comissão recorda os argumentos apresentados na fase pré-contenciosa. A seu ver, resulta do artigo 23.° da Directiva 77/62 que todos os fornecimentos destinados ao sector público ou a particulares deveriam ser tomados em consideração, em pé de igualdade, para a avaliação da capacidade técnica dos candidatos. Por essa razão, a condição em causa, de que 50 % do montante mínimo de fornecimentos exigido para participar no concurso fosse composto por fornecimentos efectuados a administrações públicas, constitui um meio de prova da capacidade técnica que não consta da lista exaustiva prevista no artigo 23.°, pelo que, por força do artigo ,14.°, alínea d), não deveria ter sido indicada no anúncio do concurso.

    2.

    Na contestação, o Governo italiano sublinha, em primeiro lugar, que na acção, a Comissão imputa a este governo, na realidade, a violação da lei nacional de execução da Directiva 77/62 por um organismo público e não a violação da directiva pelo próprio Governo italiano. Alega que as consequências de tal violação resultam do direito nacional, que dispõe das soluções necessárias para garantir o restabelecimento da legalidade tanto na ordem jurídica nacional como na ordem jurídica comunitária.

    Seguidamente, o Governo italiano defende, a título subsidiário, que, de qualquer modo, o incumprimento que lhe é imputado não existe. Considera que a Comissão confunde os meios de prova da capacidade técnica do fornecedor com os critérios de apreciação dos factos provados. Segundo o Governo italiano, o artigo 23.° da directiva indica os meios de prova e não limita de modo algum a possibilidade de as entidades adjudicantes apreciarem as provas produzidas em conformidade com critérios predeterminados e não discriminatórios. Por conseguinte, o facto de o artigo 23.°, n.° 1, alínea a), da directiva prever que o destinatário dos fornecimentos principais possa ser público ou privado, não exclui a possibilidade de as entidades adjudicantes atribuírem maior importância, na sua apreciação, aos fornecimentos a um destinatário público. Ora, vendo as coisas deste modo, as entidades adjudicantes podem razoavelmente considerar que os fornecimentos a um destinatário público oferecem maiores garantias quanto à capacidade técnica do fornecedor. Aliás, a Comissão não contesta o outro critério previsto no anúncio do concurso, que constitui igualmente um critério de apreciação e não um meio de prova, segundo o qual a admissão ao concurso estava subordinada ao fornecimento, durante os últimos três anos, de produtos idênticos «... de montante igual, pelo menos, ao séxtuplo do valor de cada fornecimento pedido...».

    O Governo italiano assinala, por fim, que a condição em causa não é discriminatória, dado que se refere, em geral a «administrações públicas», seja qual for o lugar em que estejam estabelecidas na Comunidade.

    3.

    Na réplica, a Comissão sublinha, antes de mais, que a execução correcta e tempestiva de uma directiva pelos Estados-membros não esgota a obrigação de resultado a alcançar, nos termos do artigo 189.°, terceiro parágrafo, do Tratado CEE, mas que a realização do «efeito útil» da directiva implica a obrigação de os Estados-membros velarem pela aplicação da directiva pelos seus nacionais, que devem proceder nas suas actividades em conformidade com esta. A Comissão remete, neste contexto, para o acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Março de 1987, Comissão/Itália (199/85, Colect., p. 1039).

    Para refutar o argumento do Governo italiano segundo o qual teria confundido os meios de prova da capacidade técnica do fornecedor com o critério de avaliação dos factos provados, a Comissão remete para o artigo 17.°, n.° 1, da Directiva 77/62, o qual, em seu entender, estabelece uma distinção entre, por um lado, a atribuição do contrato, que é feita com base nos critérios previstos nos artigos 25.° e seguintes, após verificação da aptidão dos fornecedores, e, por outro, a própria verificação, efectuada de acordo com os critérios de capacidade económica, financeira e técnica referidos nos artigos 22.°, 23.° e 24.° Ora, segundo a Comissão, se os fornecedores não tivessem o direito de fazer prova dá sua capacidade técnica invocando os fornecimentos efectuados tanto aos destinatários públicos como aos privados, o critério em causa já não seria um critério de verificação da capacidade técnica, mas sim um critério de exclusão a priori, arbitrário e preventivo.

    Quanto à condição relativa ao montante dos fornecimentos efectuados durante os três últimos anos, trata-se de um meio de prova expressamente previsto no artigo 23.° da directiva, cabendo a fixação do nível quantitativo desse montante (o séxtuplo do valor de cada fornecimento pedido) às entidades adjudicantes.

    A Comissão remete finalmente para o acórdão de 20 de Setembro de 1988, Beentjes (31/87, Colect., p. 4635), no qual o Tribunal fez uma interpretação semelhante das disposições equivalentes da Directiva 71/305/CEE do Conselho, de 26 de Julho de 1971, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO L 185, p. 5; EE 17 Fl p. 9).

    4.

    Na tréplica, o Governo italiano considera que, ao alegar que ele não deveria apenas ter transposto a Directiva 77/62 para o direito italiano, mas que deveria ter igualmente assegurado o seu «efeito útil», a Comissão formula uma acusação diferente da que constava do parecer fundamentado e da petição. Além disso, a referência ao acórdão de 10 de Março de 1987, Comissão/Itália, já referido, não é, em seu entender, pertinente, dado que a questão de saber se se pode imputar a um Estado-membro uma violação da Directiva 77/62 por um organismo publico não foi aí examinada. No presente caso, em que a obrigação de garantir o «efeito útil» da directiva foi cumprida de maneira integral e exacta e em que «todas as medidas necessárias para assegurar o pleno efeito da directiva, em conformidade com o objectivo que ela prossegue» (v. acórdão de 10 de Abril de 1984, von Colson e Kamann, n.° 15, 14/83, Recueil, p. 1891), foram adoptadas, não há fundamentos para acusar um Estado-membro de violação da directiva quando a regra nacional de execução da referida directiva é violada por outros sujeitos. Uma confirmação do exposto encontra-se na Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro dè 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos dé recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos (JO L 395, p. 33). Para garantir a aplicação efectiva das disposições das directivas relativas aos contratos de direito público de obras de fornecimentos, a Directiva 89/665 confia antes de mais num sistema nacional de recurso que está à disposição dos interessados e só em segundo lugar, para os casos de violações graves e manifestas, põe à disposição da Comissão um processo especial.

    Quanto ao artigo 23.° da Directiva 77/62, o Governo italiano esclarece que ele estabelece limites externos à capacidade de as entidades adjudicantes pretenderem comprovar a capacidade técnica dos fornecedores e. que, no âmbito desses limites externos, as entidades adjudicantes podem determinar de antemão critérios de apreciação considerados mais consentâneos com o objecto do contrato a adjudicar e que não sejam discriminatórios.

    No que respeita concretamente à adjudicação de um contrato de fornecimento de direito público a um organismo público de saúde, é inteiramente legítimo atribuir mais importância, na apreciação da capacidade técnica, aos fornecedores que dispõem de uma experiência nesse sector especial de fornecimento. A Directiva 77/62 não impede que as entidades adjudicantes exijam aos fornecedores um certo nível qualitativo de capacidade técnica, tal como não impede que se fixe um nível quantitativo. E isso que resulta do n.° 17 do acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 1988, Beentjes, já referido, nos termos do qual o objectivo das disposições correspondentes da Directiva 71/305 «... não é delimitar a competência dos Estados-membros para fixar o nível de capacidade económica, financeira e técnica requerido com vista à participação nas diferentes empreitadas de obras públicas...».

    F. A. Schockweiler

    Juiz-relator


    ( *1 ) Língua do processo: italiano.

    Início

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    31 de Março de 1992 ( *1 )

    No processo C-362/90,

    Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por Guido Berardis, e em seguida por Antonio Aresu, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

    demandante,

    contra

    República Italiana, representada pelo professor Luigi Ferrari Bravo, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Ivo Braguglia, avvocato dello Stato, com domicilio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de Itália, 5, rue Marie-Adélaide,

    demandada,

    que se destina a obter a declaração de que, pelo facto de a Unità Sanitaria locale XI — Génova 2 ter imposto que 50 % do montante mínimo de fornecimentos efectuado durante os três últimos anos, e exigido para a admissão à participação num concurso público de fornecimento, fosse constituído por fornecimentos efectuados a administrações públicas, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 77/62/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1976, relativa à coordenação dos processos de celebração dos contratos de fornecimento de direito público (TO 1977, L 13, p. 1; EE 17 Fl p. 29),

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

    composto por: O. Due, presidente, R. Joliet, F. A. Schockweiler e P. J. G. Kapteyn, presidentes de secção, G. F. Mancini, C. N. Kakouris, G. C. Rodríguez Iglesias, M. Diez de Velasco e J. L. Murray, juízes,

    advogado-geral: C. O. Lenz

    secretário: J. A. Pompe, secretário adjunto

    visto o relatório para audiência,

    ouvidas as alegações das partes na audiência de 16 de Janeiro de 1992,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 26 de Fevereiro de 1992, :

    profere o presente

    Acórdão

    1

    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 11 de Dezembro de 1990, a Comissão das Comunidades Europeias, em aplicação do artigo 169.° do Tratado CEE, intentou uma acção que se destina a obter a declaração de que, pelo facto de a Unità Sanitaria locale XI — Genova 2 (a seguir «USL») ter imposto que 50 % do montante minimo de fornecimentos efectuado durante os três últimos anos, e exigido para a admissão à participação num concurso público de fornecimento, fosse constituído por fornecimentos efectuados a administrações públicas, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 77/62/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1976, relativa à coordenação dos processos de celebração dos contratos de fornecimento de direito público (JO 1977, L 13, p. 1;EE 17 Fl p. 29).

    2

    A USL fez publicar na Gazzetta ufficiale della Repubblica italiana, parte II, n.° 238, de 10 de Outubro de 1988, um anúncio de concurso para o fornecimento de vários produtos, entre os quais carne de vaca fresca, no montante de 5800000000 LIT. Este anuncio subordinava a admissão ao concurso à condição de os potenciais concorrentes terem procedido, durante os três últimos anos (1985, 1986, 1987), ao fornecimento de produtos idênticos e num montante igual, pelo menos, ao séxtuplo do valor de cada fornecimento a que pretendiam concorrer, devendo 50 % desse montante ser constituído por fornecimentos efectuados a administrações públicas.

    3

    A Comissão considerou que esta condição, na medida em que se referia ao fornecimento dos produtos em causa a administrações públicas até ao limite de 50 %, era contrária ao artigo 23.° da Directiva 77/62, norma que contém uma enumeração exaustiva dos meios de prova que as entidades adjudicantes podem exigir para comprovação da capacidade técnica dos fornecedores, e que, por força do artigo 14.°, alínea d), da mesma directiva, esta condição não devia, portanto, constar do anúncio de concurso da USL.

    4

    Nos termos do artigo 169.° do Tratado, a Comissão, por carta de 10 de Fevereiro de 1989, notificou o Governo italiano para apresentar, no prazo de quinze dias, observações sobre o incumprimento que lhe era imputado. Considerando que as observações que o Governo italiano lhe transmitiu por carta de 30 de Junho de 1989 não eram suficientes, a Comissão convidou a República Italiana, pelo parecer fundamentado de 27 de Março de 1990, a tomar as medidas necessárias para proceder em conformidade com este parecer, no prazo de quinze dias a contar da respectiva notificação.

    5

    Para mais ampla exposição dos factos do litígio, da tramitação processual, bem como dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

    6

    Na contestação, o Governo italiano alegou que a acção da Comissão era destituída de objecto, dado que todos os efeitos do contrato de fornecimento subsequente ao concurso para o ano de 1989 cessaram em 31 de Dezembro de 1989 e que os anúncios de concurso para os anos de 1990 e 1991, publicados no Jornal Oficial S 213, de 4 de Novembro de 1989, e Jornal Oficial S 216, de 3 de Novembro de 1990, não continham a condição em causa. Por conseguinte, pediu à Comissão que desistisse da instância e, no caso de. a Comissão prosseguir com a sua acção, requereu ao Tribunal que lhe negasse o provimento. Na tréplica, acrescentou que o incumprimento que lhe era imputado cessara antes do termo do prazo de quinze dias que a Comissão fixara no parecer fundamentado de 27 de Março de 1990 e, perante a recusa da Comissão em desistir, concluiu pedindo que a acção fosse julgada inadmissível.

    7

    Na réplica, a Comissão negou que a acção fosse destituída de objecto, na medida em que, tendo em conta as objecções formuladas pelo Governo italiano quanto ao mérito da causa, não estava de modo algum demonstrado que a condição controvertida não seria, no futuro, inserida noutro anúncio de concurso. Na audiência, a Comissão indicou ainda que formulara, em 17 de Agosto de 1989, um primeiro parecer fundamentado e que só havia formulado o parecer fundamentado de 27 de Março de 1990 para que nele fosse tida em conta a resposta do Governo italiano à notificação de incumprimento, que chegou ao conhecimento deste em 6 de Julho de 1989.

    8

    A título preliminar, há que declarar que a circunstância de o Governo italiano só na tréplica ter expressamente requerido que o pedido fosse julgado inadmissível não pode impedir o Tribunal de analisar a admissibilidade desse pedido. Com efeito, os argumentos invocados a este respeito pelo referido Governo já tinham sido apresentados na contestação, na qual expressamente requerera que fosse negado provimento à acção. Por conseguinte, a Comissão teve possibilidade de responder a estes argumentos na réplica. Por outro lado, e como quer que seja, o Tribunal pode examinar oficiosamente se as condições previstas no artigo 169.° do Tratado para intentar uma acção por incumprimento estão preenchidas.

    9

    A este propósito, há que lembrar, em primeiro lugar, que resulta da própria letra do artigo 169.°, segundo parágrafo, do Tratado, que a Comissão só pode recorrer ao Tribunal de Justiça, intentando uma acção por incumprimento, se o Estado-membro em causa não proceder em conformidade com o parecer fundamentado no prazo que lhe for fixado pela Comissão para esse fim.

    10

    Há que observar, em segundo lugar, que, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, o objecto da acção intentada ao abrigo do artigo 169.° do Tratado CEE, é obter a declaração de que o Estado em causa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado e de que não pôs termo a esse incumprimento no prazo fixado para esse efeito no parecer fundamentado da Comissão (acórdão de 13 de Dezembro de 1990, Comissão/Grécia, n.° 40, C-347/88, Colect., p. I-4747). Do mesmo modo, o Tribunal sempre tem declarado que a existência de um incumprimento devia ser apreciada em função da situação do Estado-membro, tal como se apresenta no termo do prazo fixado no parecer fundamentado (acórdão de 27 de Novembro de 1990, Comissão/Grécia, n.° 13, C-200/88, Colect., p. I-4299).

    11

    Ora, no presente caso, é pacífico que, por um lado, todos os efeitos do anúncio de concurso em causa tinham cessado em 31 de Dezembro de 1989, ou seja, antes do parecer fundamentado de 27 de Março de 1990. Por outro lado, dos anúncios de concurso para os anos de 1990 e 1991, publicados, respectivamente, em 4 de Novembro de 1989, isto é, antes do parecer fundamentado, e em 3 de Novembro de 1990, isto é, antes da propositura da presente acção, já não constava a condição em causa.

    12

    Há que declarar, além disso, que a Comissão não actuou em tempo útil para evitar, mediante os procedimentos de que dispõe, que o incumprimento imputado produzisse efeitos, nem sequer invocou a existência de circunstâncias que a tenham impedido de terminar o processo pré-contencioso, previsto no artigo 169.° do Tratado, antes de o referido incumprimento ter deixado de existir. O facto, alegado na audiência, de já ter formulado um primeiro parecer fundamentado em 17 de Agosto de 1989 é a este respeito irrelevante, dado que este parecer não foi mencionado no decurso do processo e que o pedido não se baseia nele. Além disso, esta circunstância não pode constituir um elemento de direito ou de facto que se tenha revelado durante o processo, na acepção do artigo 42.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, de modo que qualquer fundamento que nela se baseie deve ser considerado extemporâneo e, por conseguinte, julgado inadmissível.

    13

    Resulta do exposto que, na data em que expirou o prazo fixado no parecer fundamentado da Comissão, de 27 de Março de 1990, o incumprimento imputado já não existia. Por conseguinte, o pedido da Comissão deve ser julgado inadmissível.

    Quanto às despesas

    14

    Por força do disposto no n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená-la nas despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    decide:

     

    1)

    Julgar a acção inadmissível.

     

    2)

    Condenar a Comissão nas despesas.

     

    Due

    Joliet

    Schockweiler

    Kapteyn

    Mancini

    Kakouris

    Rodríguez Iglesias

    Díez de Velasco

    Murray

    Proferido em audiencia pública no Luxemburgo, em 31 de Março de 1992.

    O secretário

    J.-G. Giraud

    O presidente

    O. Due


    ( *1 ) Língua do processo: italiano.

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