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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 61989CJ0287

    Acórdão do Tribunal de 7 de Maio de 1991.
    Comissão das Comunidades Europeias contra Reino da Bélgica.
    Regime dos preços de venda a retalho do tabaco manufacturado - Artigo 30.º do Tratado.
    Processo C-287/89.

    Colectânea de Jurisprudência 1991 I-02233

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:1991:188

    RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

    apresentado no processo C-287/89 ( *1 )

    I — Matéria de facto e tramitação processual

    A — Enquadramento jurídico

    1. Regulamentação comunitária

    No presente processo são mencionadas as seguintes disposições:

    os artigos 30.o e seguintes do Tratado CEE relativos às restrições quantitativas à importação entre os Estados-membros e às medidas de efeito equivalente;

    a Directiva 72/464/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972, relativa aos impostos que incidem sobre o consumo de tabacos manufacturados com excepção dos impostos sobre o volume de negócios (JO L 303, p. 1; EE 09 Fl p. 39).

    Esta directiva, adoptada com fundamento nos artigos 99.o e 100.o do Tratado, refere, no seu primeiro considerando, que o objectivo do Tratado é estabelecer uma união económica em que exista uma concorrência sã e que apresente características análogas às de um mercado interno e que, no que se refere ao sector dos tabacos manufacturados, a realização deste objectivo pressupõe que a aplicação, nos Estados-membros, dos impostos que incidem sobre o consumo dos produtos deste sector não falseie as condições de concorrência e não crie obstáculos à livre circulação na Comunidade.

    A directiva fixa os princípios gerais da harmonização, em várias fases, das estruturas do imposto sobre o consumo a que os Estados-membros submetem os tabacos manufacturados, bem como as disposições especiais aplicáveis no decurso de cada uma das fases dessa harmonização. A segunda fase de harmonização começou em 1 de Julho de 1978 [artigo 3.o da Directiva 77/805/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977 (JO L 338, p. 22; EE 09 Fl p. 100)], foi sucessivamente prorrogada pela Directiva 80/1275/CEE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1980 (JO L 375, p. 76; EE 09 Fl p. 127), pela Directiva 81/463/CEE do Conselho, de 24 de Junho de 1981 (JO L 183, p. 32), pela Directiva 82/2/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1981 (JO 1982, L 5, p. 11), pela Directiva 82/877/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1982 (JO L 369, p. 36), pela Directiva 84/217/CEE do Conselho, de 10 de Abril de 1984 (JO L 104, p. 18) e pela Directiva 86/246/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1986 (JO L 164, p. 26). Esta ùltima directiva, aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1986, não fixou data-limite para a prorrogação.

    Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da directiva: «Tanto os cigarros nacionais como os importados serão sujeitos, em cada Estado-membro, a um imposto sobre o consumo específico, constituído por um elemento proporcional, calculado sobre o preço máximo de venda a retalho, incluindo os direitos aduaneiros e por um elemento específico calculado por unidade de produto.» Nos termos do n.o 4 deste mesmo artigo, o imposto específico sobre o consumo de cigarros pode incluir uma imposição mínima cujo limite máximo será determinado, para cada fase, pelo Conselho, sob proposta da Comissão. Essa imposição mínima não pode, na segunda fase de harmonização, ser superior a 90 % do montante acumulado do elemento proporcional e do elemento específico que o Estado-membro cobrar em relação aos cigarros da classe de preço mais procurada (artigo 10.o-B da directiva). Durante essa mesma fase, os Estados-membros podem excluir os direitos aduaneiros da base de cálculo do imposto sobre o consumo específico.

    O artigo 5.o da directiva dispõe:

    «1.

    Os fabricantes importadores fixarão livremente os preços máximos de venda a retalho de cada um dos seus produtos. Esta disposição não obsta, todavia, à aplicação das legislações nacionais sobre o controlo de nível de preços ou sobre a observância dos preços impostos.

    2.

    Todavia, a fim de facilitar a cobrança do imposto sobre o consumo específico, os Estados-membros podem fixar uma tabela de preços de venda a retalho por grupo de tabacos manufacturados, desde que cada tabela seja suficientemente extensa e diversificada para corresponder à diversidade dos produtos comunitários. Cada tabela será válida para todos os produtos incluídos no grupo de tabacos manufacturados a que se refere, sem distinção baseada na qualidade, na apresentação, na origem dos produtos ou das matérias utilizadas, nas características das empresas ou em qualquer outro critério.»

    2. Regulamentação nacional

    A cobrança do imposto sobre consumo de tabacos manufacturados na Bélgica é regida por uma lei de 31 de Dezembro de 1947 relativa ao regime fiscal do tabaco (Moniteur belge de 31.12.1947) e por um regulamento anexo a uma portaria ministerial de 22 de Janeiro de 1948(Moniteur belge de 18.2.1948).

    Esta cobrança é assegurada pelo sistema denominado das «cintas fiscais».

    Essas cintas indicam o preço de venda a retalho.

    A fim de facilitar a cobrança do imposto, foi estabelecido uma tabela desses preços de venda a retalho e a correspondente tabela das cintas fiscais para cada uma das categorias de produtos.

    Duranto o período considerado, a tabela era fixada por portaria do ministro das Finanças de 26 de Março de 1986(Moniteur belge de 28.3.1986, p. 4111).

    As classes mais baixas dessa tabela eram as seguintes:

    Preço de venda a retalho em BFR

    Número de cigarros contidos na embalagem

    59

    20

    67

    25

    125

    50

    240

    100

    Estes preços de venda a retalho foram aumentados por uma portaria de 20 de Dezembro de 1988 do ministro das Finanças (Moniteur belge de 30.12.1988, p. 17901) para :

    65 BFR

    74 BFR

    135 BFR

    270 BFR

    B — Antecedentes do litígio

    O indeferimento, em Dezembro de 1986, pelo ministro das Finanças do Reino da Bélgica de um pedido apresentado por um importador, a sociedade Bene BV (a seguir «Bene»), de cintas fiscais mencionando um preço de venda inferior ao previsto para a classe mais baixa da tabela fixada pela portaria ministerial de 26 de Março de 1986, já citada, está na origem do litígio (o pedido da Bene era respeitante ao preço de venda de 48 BFR por um maço de vinte cigarros e de 58 BFR por um maço de vinte cinco cigarros).

    A Comissão considerou que, nessas condições, os importadores de tabacos manufacturados não podiam fixar preços de venda a retalho dos seus produtos a níveis inferiores aos fixados pela administração belga, o que tinha por efeito neutralizar a vantagem concorrencial resultante de preços de custo inferiores.

    Em 15 de Dezembro de 1987, o Reino da Bélgica foi notificado da violação do artigo 30.o do Tratado CEE, pela Comissão, com fundamento no artigo 169.o, primeiro parágrafo, do Tratado.

    Na sua resposta de 29 de Janeiro de 1988, o Reino da Bélgica contestou o fundamento dessa notificação de incumprimento alegando, nomeadamente, que a decisão litigiosa era baseada no facto de que os preços propostos pela Bene se afastavam largamente dos preços geralmente pedidos no mercado belga para produtos de tabaco manufacturado por empresas europeias com níveis comparáveis de produtividade.

    A Comissão formulou, em 23 de Novembro de 1988, um parecer fundamentado, nos termos do artigo 169.o do Tratado.

    O Reino da Bélgica recusou dar cumprimento a esse parecer sustentanto, na carta de 1 de Fevereiro de 1989 do seu representante permanente junto das Comunidades Europeias, que a tabela das cintas fiscais correspondia às exigências do artigo 5.o da directiva, atrás referido, pelas seguintes razões:

    «1)

    Os diferentes tipos de preços que figuram nessa tabela reflectem os preços de venda a retalho que são efectivamente praticados em todo o mercado belga.

    2)

    A tabela é suficientemente lata e diversificada, uma vez que até agora não levantou qualquer problema de aplicação. A prova disso é a reduzida procura de que são objecto as cintas para cigarros pertencentes às classes de preços menos elevadas.

    3)

    O leque dos preços que figura na tabela permite aos fabricantes e aos importadores o exercício de uma sã concorrência, na acepção do preâmbulo da Directiva 72/464.

    4)

    A tabela belga, como qualquer outra tabela, inclui necessariamente uma classe de preços inferior, que, num sistema quase exclusivamente ad valorem, como o que é praticado pela Bélgica, constitui um elemento primordial de natureza essencialmente fiscal, adequado a assegurar a manutenção de um certo nível de receitas do imposto que incide sobre o consumo e do IVA.»

    Não tendo ficado convencida com estes argumentos, a Comissão intentou uma acção no Tribunal de Justiça registada em 18 de Setembro de 1989.

    C — Tramitação processual perante o Tribunal de Justiça

    Com base no relatório preliminar do juiz relator, ouvido o advogado-geral, o Tribunal decidiu iniciar a fase oral do processo. Além disso, convidou a Comissão e o Reino da Bélgica a responder a várias questões antes da audiência.

    II — Pedidos das partes

    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    declarar que o Reino da Bélgica, ao recusar fornecer ao importador de tabacos manufacturados cintas fiscais indicando preços inferiores aos preços mínimos fixados, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 30.o do Tratado CEE;

    condenar o Reino da Bélgica nas despesas.

    O Reino da Bélgica conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    negar provimento à acção;

    condenar a Comissão nas despesas.

    III — Resumo dos fundamentos e argumentos das partes

    A — Quanto ao fondamento da acção

    A Comissão reconhece que a acção é exclusivamente baseada no artigo 30.o do Tratado e não nas disposições da Directiva 72/464, já citada. O artigo 5.o desta directiva apenas retoma, no âmbito das normas aplicáveis à cobrança do imposto sobre o consumo de tabacos manufacturados, os princípios impostos pelo artigo 30.o Consequentemente, não é útil invocar uma acusação específica baseada no incumprimento das disposições da directiva.

    O Governo belga regista que a Comissão limita a acção apenas à violação do artigo 30.o, mas contesta o raciocínio da Comissão para justificar essa limitação. Considera que, no presente processo, a existência de uma violação do artigo 30.o está subordinada à prova de que o Reino da Bélgica não cumpriu as disposições do artigo 5.o da directiva.

    B — Quanto à compatibilidade de uma regulamentação nacional que impõe preços mínimos com as disposições do artigo 30.o do Tratado CEE e da Directiva 72/464

    1. O artigo 30.o do Tratado

    O Governo belga, baseando-se nas conclusões apresentadas pelo advogado-geral Van Gerven no processo C-145/88 [acórdão de 23 de Novembro de 1989, B & Q pic, anteriormente B & Q (Retail) Limited, Colect., p. 3851], distingue as medidas nacionais discriminatórias pela sua finalidade e objecto, as medidas que colocam os produtos importados numa situação desfavorável em relação aos produtos nacionais (acórdão de 20 de Fevereiro de 1979, Rewa-Central, chamado «Cassis de Dijon», 120/78, Recueil, p. 649) e, por ùltimo, as regulamentações que, enquanto tais ou enquanto elementos do contexto jurídico e económico geral, podem ter por efeito proteger o mercado nacional ou tornar o acesso a esse mercado inadmissivelmente mais difícil, menos rentável ou menos atraente para os relação aos operadores económicos de outros Estados-membros (acórdão de 11 de Julho de 1985, Cinéthèque e outros, 60/84 e 61/84, Recueil, p. 2605).

    Nesta última hipótese, quando a regulamentação nacional não encerra, por si, o mercado nacional, a que o artigo 30.o é automaticamente aplicável, mas se limita a tornar o acesso ao mercado nacional mais difícil, o Governo belga considera, citando o advogado-geral nas conclusões atrás referidas n.o 23, que:

    «A proibição contida no artigo 30.o apenas é aplicável se resultar do contexto jurídico e económico geral que compromete a interpenetração económica dos mercados nacionais, pretendida pelo Tratado. Neste caso, a compartimentação do mercado deve considerar-se suficientemente provável com base em determinado número de dados quantitativos que demonstram que a aplicação da regulamentação tem esse “efeito de reforço da compartimentação”, tornando o mercado inacessível (oneroso, não rentável) a tal ponto que seja de recear que a maior parte dos produtos importados desapareça do mercado.»

    O Governo belga deduz daqui que num caso como o em apreço, a Comissão, para provar a violação do artigo 30.o, deve demonstrar, por meio de dados quantitativos, que a regulamentação em causa tem um efeito perturbador no mercado comunitário tornando mais difícil o acesso ao mercado nacional.

    De resto, mesmo nesse caso, como teria admitido o advogado-geral nas conclusões atrás referidas, o artigo 36.o do Tratado e as «exigências imperativas» referidas na jurisprudência «Cassis de Dijon» poderiam ser invocadas para justificar a regulamentação em causa.

    Segundo a Comissão, uma regulamentação nacional que imponha preços mínimos, indistintamente aplicável aos produtos nacionais e aos produtos importados, constitui uma medida de efeito equivalente, na acepção do artigo 30.o do Tratado, quando o preço mínimo entrave, de facto, o escoamento dos produtos importados. É, nomeadamente, esse o caso quando o preço mínimo for fixado a um nível que não permita repercutir o preço de custo inferior do produto importado no preço de venda aos consumidores (acórdão de 24 de Janeiro de 1978, Tiggele, 82/77, Recueil, p. 25; acórdão de 29 de Janeiro de 1985, Cullet, 231/83, Recueil, p. 305).

    Só uma das razões previstas pelo artigo 36.o do Tratado pode, se for caso disso, justificar legalmente tal regulamentação nacional (acórdão de 29 de Janeiro de 1985, 231/83, atrás referido).

    Quanto às conclusões do advogado-geral, no processo 145/88, invocadas pelo demandado, a Comissão salienta que:

    essas conclusões, na medida em que expunham as condições em que pode ser provada a violação do artigo 30.o do Tratado, não foram seguidas pelo Tribunal de Justiça;

    as conclusões não diziam respeito a uma regulamentação relativa aos preços. No caso referido pela jurisprudência atrás referida (acórdão de 24 de Janeiro de 1978, 82/77), a regulamentação deve, pelo contrário, ser considerada como tendo ipso facto por efeito restringir as trocas comerciais;

    para provar a violação do artigo 30.o do Tratado, a Comissão deve apenas demonstrar que a regulamentação nacional relativa aos preços não permite escoar lucrativamente os produtos importados ou repercutir a vantagem que esses produtos podem apresentar devido aos preços de custo pouco elevados (acórdão de 13 de Novembro de 1986, Edah BV, 80/85 e 159/85, Colect., p. 3359; acórdão de 9 de Junho de 1988, Comissão/Itália, 56/87, Colect., p. 2919).

    2. Quanto à Directiva 72/464

    Segundo o Governo belga, o artigo 5.o da directiva permite aos Estados-membros fixar uma tabela de preços, a fim de facilitar a cobrança dos impostos que incidem sobre o consumo de tabacos manufacturados. Essa faculdade está ligada ao facto de cada tabela ser suficientemente extensa e diversificada para ter em consideração a realidade económica e para permitir aos fabricantes e importadores fixar livremente os seus preços.

    A Comissão sustenta, baseando-se no primeiro considerando da directiva, que a cobrança dos impostos que incidem sobre os tabacos manufacturados não deve falsear as condições de concorrência e não deve criar obstáculos à livre circulação na Comunidade.

    C — Quanto à aplicação da tabeh instituída peL reguLmentação nacional belga

    A Comissão invoca os seguintes argumentos :

    a)

    A recusa das autoridades belgas de pôr à disposição de importadores, como a Bene, cintas fiscais que indiquem um preço de venda a retalho inferior ao preço mínimo determinado pela regulamentação nacional conduz à fixação de um preço de venda mínimo para os cigarros e aos outros tabacos. Esse preço mínimo impede, de facto, a Bene de repercutir sobre os preços de venda aos consumidores o benefício concorrencial resultante de um menor preço de custo.

    Nisso consubstancia-se a violação das disposições do artigo 30.o

    b)

    Os argumentos invocados pelo Governo belga, aquando do processo pré-contencioso, para justificar a aplicação dessa regulamentação nacional, não podem obter acolhimento.

    Em primeiro lugar, as diferentes classes de preços da tabela não reflectem, contrariamente às disposições do artigo 5.o da directiva, a realidade do mercado belga dos cigarros. Existe, como o demonstra o caso da Bene, um pedido para cintas fiscais de uma classe de preço inferior à classe mínima da tabela. A Comissão sustenta que essa tabela é fixada pelas autoridades belgas após consulta da Federação dos Fabricantes de Tabacos da Bélgica à qual a Bene não aderiu.

    Nem a circunstância de a Bene ter cumprido essa regulamentação, nem o facto de os pedidos de cintas correspondentes às classes mais baixas da tabela serem muito reduzidos permitem provar a adequação da tabela ao mercado.

    De resto, deve salientar-se que, aquando de um aumento dos preços da tabela, como resulta da citada portaria ministerial de 20 de Dezembro de 1988, as empresas são obrigadas a aumentar os seus preços de venda mesmo não tendo havido um aumento concomitante do preço de custo dos seus produtos.

    Em segundo lugar, as exigências de uma sã concorrência não estão entre as razões que podem legalmente justificar a aplicação dessa tabela:

    a sã concorrência e a lealdade nas transacções comerciais não são, efectivamente, mencionadas no artigo 36.o do Tratado;

    supondo que a lealdade das transacções possa ser invocada, em tal caso, com fundamento na citada jurisprudência «Cassis de Dijon», compete ao Reino da Bélgica provar que os preços propostos pela Bene não são compatíveis com uma concorrência leal. No caso em apreço, a única verificação do Governo belga, segundo a qual os preços propostos por Bene se afastaram demasiado dos preços praticados por outras empresas europeias similares, é insuficiente na medida em que não se apoia numa análise precisa das condições de produção da empresa em causa;

    pelo contrário, a tabela é incompatível com as exigências de uma sã concorrência mencionadas no primeiro considerando da Directiva 72/464 e com a integração económica dos Estados-membros, prevista no Tratado, na medida em que tem por efeito proibir a concorrência através dos preços no mercado dos cigarros;

    a circunstância invocada pelo Governo belga de mais de 60 % do conjunto das cintas fiscais emitidas para os maços de vinte e cinco cigarros indicarem o preço de 73 BFR revela uma concorrência extremamente limitada no mercado. Em terceiro lugar, a necessidade de instituir uma tabela de preços que inclua uma classe de preço mínimo que permita assegurar um determinado nível de receitas fiscais não pode ser invocada. Tal razão não é prevista pelo artigo 36.o do Tratado. De resto, e de qualquer modo, as razões puramente orçamentais não constituem uma «exigência imperativa» na acepção da citada jurisprudência «Cassis de Dijon» (ver acórdão de 7 de Fevereiro de 1984, Duphar BV e outros, 238/82, Recueil, p. 523).

    O Governo belga sem repetir integralmente os fundamentos de defesa invocados aquando do processo pré-contencioso, refuta os argumentos aduzidos pela Comissão fazendo as seguintes considerações.

    a)

    A Comissão, ao não apresentar qualquer dado numérico susceptível de provar a perturbação do mercado, não fez a prova do incumprimento do artigo 30.o do Tratado.

    b)

    A tabela de preços fixada pela regulamentação nacional é conforme às disposições do artigo 5.o da Directiva 72/464:

    os fabricantes e os importadores de cigarros podem escolher livremente o preço dos seus produtos. Diferentes importadores podem, assim, fixar preços diferentes para um único e mesmo produto; podem livremente alterar o preço inicialmente escolhido;

    a tabela é suficientemente lata e diversificada e corresponde à realidade do mercado dos cigarros na Bélgica.

    Sobre este último aspecto, o Governo belga sustenta que os pedidos de cintas fiscais para as classes mais baixas da tabela são reduzidos, como resulta da tabela:

    Cigarros

    Preço (em BFR)

    1987 (em %)

    1988 (em %)

    25 unidades

    70

    1,591

    1,422

     

    71

    0

    0

     

    72

    0

    0

     

    73

    62,990

    60,680

    20 unidades

    61

    0,003

    0,097

     

    62

    2,006

    1,825

     

    63

    0,007

    0

     

    64

    0

    0

     

    65

    0,250

    0,103

     

    66

    0,954

    0,972

     

    67

    22,467

    23,629

    D — Quanto à prática da Bene

    O Governo belga alega que, embora a Bene tenha fornecido às autoridades belgas um esquema global da formação dos seus preços, sempre recusou fornecer pormenores relativos, nomeadamente, aos custos de produção e aos preços das matérias-primas. Além disso, a Bene utilizou a possibilidade prevista pela regulamentação nacional de vender cinco maços de vinte cigarros reunidos numa única embalagem exterior, na qual é aposta a cinta fiscal correspondente à classe de preço mais baixa dos maços de cem cigarros. Deste modo, a Bene, de facto, pôde comercializar os seus produtos ao preço que ela própria tinha solicitado, embora o seu pedido dissesse inicialmente respeito a maços individuais de vinte cigarros.

    A Comissão considera que este último argumento não tem qualquer efeito sobre a solução do litígio. O facto de obrigar o importador a vender em pacotes de cem cigarros ocasiona custos suplementares e altera as condições de comercialização dos produtos. Nesse aspecto, as exigências do artigo 30.o do Tratado não são de qualquer modo respeitadas.

    IV — Respostas das partes às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça

    A — Respostas da Comissão

    Primeira questão

    Solicitou-se à Comissão que especificasse as razões de facto e de direito que a levaram a invocar o incumprimento apenas das disposições do artigo 30.o do Tratado com a exclusão das disposições da Directiva 72/464 do Conselho.

    Resposta

    A Comissão refere, em primeiro lugar, que, no àmbito do processo anterior 298/86 (acórdão de 14 de Julho de 1988, Comissão/Bélgica, atrás referido), tinha já invocado o fundamento segundo o qual a recusa das autoridades belgas de fornecer cintas fiscais mencionando um preço inferior ao das classes mais baixas da tabela a um fabricante que considerava poder importar cigarros a esse preço era incompatível com as disposições do artigo 30.o do Tratado.

    A Comissão considera que esse fundamento, que foi indeferido pelo Tribunal de Justiça por razões processuais, é solidamente fundado, de facto. Foi por essa razão que uma nova acção por incumprimento, baseada nesse fundamento, foi intentada perante o Tribunal de Justiça.

    Em segundo lugar, a Comissão visa exclusivamente na sua acção a prática administrativa belga em relação à empresa Bene e a sua incompatibilidade com as disposições do artigo 30.o do Tratado. Não invoca, em contrapartida, a incompatibilidade da legislação belga relativa a cintas fiscais para cigarros com as disposições do artigo 5.o da Directiva 72/464. Tendo em consideração a formulação geral dessas disposições da directiva e os poucos elementos concretos de que dispunha a Comissão, a prova dessa incompatibilidade seria difícil de fazer.

    Em terceiro lugar, o acórdão do Tribunal decidindo essa acção poderia constituir uma indicação importante para determinar as condições de aplicação do artigo 5.o da directiva.

    Por último, o facto de a Comissão entender concentrar-se, no caso em apreço, nos efeitos concretos da existência de uma tabela de cintas fiscais associada à recusa de fornecer cintas a um preço inferior ao preço mínimo dessa tabela, quer dizer, sobre os efeitos da restrição da concorrência e de limitação das importações decorrentes de um preço mínimo, tem consequências sobre a questão de saber se esses efeitos podem ser considerados incompatíveis com o artigo 5.o da Directiva 72/464. O artigo 5.o reconhece a liberdade de os fabricantes e importadores fixarem os preços máximos de venda a retalho, e a «tabela de preços de venda a retalho» poderia, deste modo, analisar-se igualmente como uma tabela de preços máximos de venda a retalho. Se assim fosse, a tabela estaria sempre suficientemente aberta para a baixa de preços; mas isso não é relevante, dada a recusa de fornecer cintas abaixo de um determinado nível de preços. E esta recusa que é crucial na opinião da Comissão.

    Segunda questão

    Solicitou-se à Comissão que fornecesse os dados numéricos quanto ao preço de custo dos cigarros importados pela sociedade Bene BV no decurso do ano de 1986.

    Resposta

    A Comissão juntou aos autos uma declaração feita por um gabinete de peritos de contabilidade, Paardekooper e Hoffman, indicando o preço de custo-padrão, relativo ao ano de 1986, do produto Texas HB Filter relativo a mil unidades.

    B — Respostas do Governo belga

    Primeira questão

    Solicitou-se ao Governo belga que apresentasse cópia do pedido de cintas fiscais apresentado pela sociedade Bene, da correspondência trocada entre a administração belga e essa sociedade quanto às justificações das propostas de preços dessa última e da decisão do ministro das Finanças de 16 de Dezembro de 1986 que indefere o pedido de cintas.

    Resposta

    O Governo belga juntou aos autos cópia do pedido de cintas fiscais apresentado por Bene, da correspondência trocada entre essa sociedade e as autoridades belgas e da decisão do ministro das Finanças, de 12 de Dezembro de 1986, indeferindo esse pedido.

    Segunda questão

    Solicitou-se ao Governo belga que apresentasse cópia da legislação e das regulamentações nacionais, em vigor em 1986, que fixam o regime dos impostos que incidem sobre o consumo, aplicável aos tabacos manufacturados.

    Resposta

    O Governo belga juntou aos autos cópia da lei de 31 de Dezembro de 1947 relativa ao regime fiscal do tabaco e da portaria ministerial de 22 de Janeiro de 1948 que regulamenta a cobrança dos impostos que incidem sobre o consumo dos tabacos manufacturados.

    Terceira questão

    Solicitou-se ao Governo belga que indicasse de modo específico o processo segundo o qual é fixada a tabela dos preços dos tabacos manufacturados, bem como os elementos de cálculo que permitem fixar as classes mais baixas dessa tabela.

    Resposta

    O Governo belga informou que a tabela dos preços dos tabacos manufacturados não assenta em cálculos. Aquando de um aumento dos preços solicitado pelo sector em causa e concedido pelo ministro dos Assuntos Económicos, as autoridades belgas examinam qual o preço de venda a retalho que será aplicado aos produtos mais vendidos. A partir desse dado, as tabelas existentes são adoptadas de modo que um determinado número de classes se mantenham abaixo desses produtos mais vendidos, de modo que as tabelas sejam suficientemente diferenciadas para cobrir a diversidade dos produtos provenientes da Comunidade.

    Aquando da adaptação de preços de 1 de Abril de 1986, três classes de preços inferiores foram assim mantidas para as embalagens de vinte e cinco unidades e seis classes de preços para as embalagens de vinte unidades. Actualmente, existem, respectivamente, quatro e dez classes de preços inferiores.

    E a administração das alfândegas e dos impostos sobre os consumos específicos que propõe ao ministro das Finanças as novas tabelas assim fixadas. Se o ministro aceitar a proposta, as tabelas são publicadas numa portaria ministerial.

    F. Grévisse

    Juiz relator


    ( *1 ) Lingua do processo: neerlandês.

    Início

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    7 de Maio de 1991 ( *1 )

    No processo C-287/89,

    Comissão das Comunidades Europeias, representada por Pieter Jan Kuijper, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo, no gabinete de Guido Berardis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

    demandante,

    contra

    Reino da Bélgica, representado por Jan Devadder, consultor adjunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Comércio Externo e da Cooperação ao Desenvolvimento, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada da Bélgica, 4, rue des Girondins,

    demandado,

    que tem por objecto obter a declaração de que o Reino da Bélgica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 30.° do Tratado CEE, ao recusar fornecer ao importador de tabacos manufacturados cintas fiscais indicando preços inferiores aos preços mínimos fixados,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    composto por: O. Due, presidente, G. C. Rodríguez Iglesias e M. Diez de Velasco, presidentes de secção, Sir Gordon Slynn, C. N. Kakouris, R. Joliét, F. Grévisse, M. Zuleeg e P. J. G. Kapteyn, juízes,

    advogado-geral : J. Mischo

    secretário: J.-G. Giraud

    visto o relatório para audiência,

    ouvidos os representantes das partes nas suas alegações na audiência de 28 de Fevereiro de 1991,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 14 de Março de 1991,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 18 de Setembro de 1989, a Comissão intentou, nos termos do artigo 169.° do Tratado CEE, uma acção que visa obter a declaração de que o Reino da Bélgica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 30.° do Tratado CEE, ao recusar fornecer a um importador de tabacos manufacturados cintas fiscais indicando preços inferiores aos preços mínimos impostos.

    2

    Na Bélgica, os tabacos manufacturados estão sujeitos a imposto sobre o consumo específico cuja cobrança é assegurada pelo sistema denominado das «cintas fiscais». Essas cintas, que são apostas nas embalagens de venda, indicam o preço de venda a retalho. Um regulamento anexo a uma portaria ministerial de 22 de Janeiro de 1948(Moniteur belge de 18.2.1948, p. 1275) fixa uma tabela que refere diferentes classes de preços de venda a retalho para os produtos em questão, e nomeadamente para maços de cigarros, e o montante correspondente dos impostos devidos pelo fabricante ou pelo importador.

    3

    Em 12 de Dezembro de 1986, o ministro das Finanças belga recusou fornecer a um importador, a sociedade Bene BV (a seguir «Bene»), cintas fiscais indicando um preço de venda inferior à classe mais baixa da tabela tal como resultava da referida portaria de 22 de Janeiro de 1948, alterada por uma portaria ministerial de 26 de Março de 1986(Moniteur belge de 28.3.1986, p. 4111). As classes mais baixas dessa tabela eram de 59 FB para os maços de vinte cigarros e de 67 FB para os maços de vinte e cinco cigarros. O pedido da Bene era respeitante a cintas fiscais mencionando respectivamente um preço de 48 FB e de 58 FB.

    4

    Considerando que as autoridades belgas não tinham cumprido as disposições do artigo 30.° do Tratado, a Comissão intentou a presente acção com o fundamento no artigo 169.° do Tratado.

    5

    Para mais ampla exposição da legislação nacional em causa, da tramitação processual, bem como dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos do processo apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

    6

    A Comissão sustenta que as autoridades belgas, ao recusarem fornecer à Bene cintas fiscais indicando preços de venda inferiores aos previstos pelas classes mais baixas da tabela, teriam, de facto, imposto a essa empresa preços mínimos de venda a retalho. Esses preços teriam sido fixados a um nível não permitindo à Bene repercutir sobre o preço de venda a vantagem concorrencial resultante de um preço de custo inferior. De acordo com a jurisprudência constante do Tribunal, a fixação de preços mínimos nessas condições constitui uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação e é, por isso, proibida pelas disposições do artigo 30.° do Tratado.

    7

    O Governo belga alega que a Comissão não apresenta qualquer dado numérico susceptível de provar que a aplicação da tabela, suficientemente extensa e diversificada para corresponder às exigências da Directiva 72/464/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972, relativa aos impostos que incidem sobre o consumo de tabacos manufacturados com excepção dos impostos sobre o volume de negócios (JO L 303, p. 1 ; EE 09 Fl p. 39), teve um efeito perturbador no mercado, tornando mais difícil o acesso ao mercado nacional. Segundo o demandado, Bene recusou-se sempre a fornecer pormenores relativos aos seus custos de produção e aos preços das suas matérias-primas. Além disso, sendo a tabela degressiva em função do número de cigarros contidos na embalagem colocada à venda, Bene pôde, de facto, comercializar os seus produtos aos preços desejados, vendendo maços de vinte cigarros numa embalagem de cem cigarros contendo cinco maços.

    8

    Antes de decidir do mérito do incumprimento alegado, convém determinar as obrigações que incumbem aos Estados-membros em matéria de preços de venda a retalho dos tabacos manufacturados.

    9

    Os entraves às importações entre Estados-membros, resultantes dos impostos indirectos, são referidos pelo artigo 99.° do Tratado que, na sua redacção anterior ao Acto Único Europeu, impunha à Comissão a obrigação de procurar os meios para harmonizar, no interesse do mercado comum, as legislações nacionais aplicáveis na matéria, em conjugação com o artigo 100.°, relativo à aproximação das legislações (ver acórdão de 16 de Novembro de 1977, SA GB-Inno-BM, n.° 50, 13/77, Recueil, p. 2115).

    10

    Foi com fundamento nestas disposições do Tratado que o Conselho adoptou a Directiva 72/464, atrás referida.

    11

    Esta directiva tem por objectivo fixar os princípios gerais de harmonização do regime de tributação dos tabacos que, devido às suas características, tem por efeito criar obstáculos à livre circulação dos tabacos e ao estabelecimento de condições normais de concorrência neste mercado especial, como é reconhecido pelo segundo considerando do preâmbulo. Com efeito, segundo este considerando, os impostos que incidem sobre o consumo dos tabacos manufacturados «não são neutros do ponto de vista da concorrência e frequentemente constituem sérios obstáculos à interpenetração dos mercados». Assim, é com vista a estabelecer «uma concorrência sã» no mercado comum (primeiro considerando), a eliminar dos regimes actuais «os factores susceptíveis de criar obstáculos à livre circulação e falsear as condições de concorrência, tanto no plano nacional como no plano intracomunitário» (terceiro considerando) e a concretizar «a abertura dos mercados nacionais dos Estados-membros» (quinto considerando) que a directiva adopta como base do sistema «um regime de preços formados livremente para todos os grupos de tabacos manufacturados» (oitavo considerando).

    12

    E com este objectivo (acórdão de 21 de Junho de 1983, Comissão/França, n.° 18, 90/82, Recueil, p. 2011) que o artigo 5.° desta directiva dispõe no seu n.° 1: «Os fabricantes e importadores fixarão livremente os preços máximos de venda a retalho de cada um dos seus produtos. Esta disposição não obsta, todavia, à aplicação das legislações nacionais sobre controlo do nível de preços ou sobre a observância de preços impostos.»

    13

    Como resulta desse acórdão do Tribunal de 21 de Junho de 1983 (n.os 22 e 23), a expressão «controlo do nível dos preços» só pode visar as legislações nacionais de carácter geral, destinadas a travar a subida dos preços. Quanto à expressão «observância de preços impostos», deve ser compreendida como designando um preço que, uma vez determinado pelo fabricante ou pelo importador e aprovado pela autoridade pública, se impõe como preço máximo e deve ser respeitado como tal em todas as fases do circuito de distribuição, até à venda ao consumidor (acórdão de 16 de Novembro de 1977, SA GB-Inno-BM, atrás referido, n.° 64). Resulta desta jurisprudência que as disposições atrás referidas da directiva não autorizam os Estados-membros a fixar os preços dos tabacos manufacturados violando a regra da livre fixação dos preços pelo fabricante ou pelo importador.

    14

    Embora o artigo 5.°, n.° 2, da Directiva 72/464 Estados-membros a fixar uma tabela de preços de venda a retalho por grupo de tabacos manufacturados, o alcance destas disposições é limitado. Elas têm exclusivamente por objectivo facilitar a cobrança do imposto sobre o consumo específico e impõem que cada tabela seja suficientemente extensa e diversificada para corresponder realmente à diversidade dos produtos comunitários.

    15

    Em contrapartida, não têm nem por objecto nem por efeito permitir aos Estados-membros impor aos importadores de tabacos manufacturados um preço mínimo de venda a retalho em condições que não têm em consideração as disposições do artigo 30.° do Tratado.

    16

    Convém recordar, a este respeito, que a proibição, fixada por estas disposições, de medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas visa, segundo a jurisprudência constante do Tribunal, qualquer medida susceptível de entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, as importações entre Estados-membros (acórdão de 11 de Julho de 1974, Dassonville, n.° 5, 8/74, Recueil, p. 837).

    17

    No que se refere à aplicação destes princípios a uma regulamentação estatal que fixa um preço mínimo indistintamente aplicável aos produtos nacionais e aos produtos importados, o Tribunal considera que constitui uma medida de efeito equivalente, na acepção do artigo 30.° do Tratado, um preço mínimo que se situe a um nível tal que neutralize a vantagem concorrencial que resulta para o importador de preços de custo inferiores (ver acórdãos de 24 de Janeiro de 1978, Van Tiggele, n.° 14, 82/77, Recueil, p. 25, e de 29 de Janeiro de 1985, Cullet, n.° 23, 231/83, Recueil, p. 305).

    18

    No caso em apreço, resulta dos documentos apresentados que as autoridades belgas solicitaram a Bene, por carta de 1 de Agosto de 1986, todos os elementos respeitantes aos preços de venda a retalho dos seus produtos.

    19

    Por carta de 24 de Setembro de 1986, Bene apresentou, em resposta a esse pedido, um documento com dados numéricos elaborado por um gabinete de peritos de contabilidade cujas conclusões eram de que não havia, por parte da empresa em causa, «manipulações dos preços com o objectivo de criar uma concorrência desleal».

    20

    Sem refutar os dados numéricos e as conclusões desse documento, o ministro das Finanças, por carta de 12 de Dezembro de 1986, indeferiu o pedido de cintas fiscais apresentado por Bene afirmando que «as tabelas actuais são suficientemente diversificadas para permitir uma sã concorrência entre os diversos fabricantes e importadores».

    21

    Resulta desta última carta que, contrariamente à obrigação que lhes incumbia de cumprir as disposições do artigo 30.° do Tratado, as autoridades belgas pura e simplesmente entenderam aplicar os preços mais baixos previstos pela tabela sem terem em consideração os preços de custo da Bene e a possibilidade dessa empresa repercutir a vantagem concorrencial daí resultante sobre os preços de venda a retalho dos seus produtos.

    22

    Da carta resulta, ainda, que as autoridades belgas cometeram também um erro de direito ao não tomarem em consideração o princípio enunciado pelo artigo 5.°, n.° 1, atrás referido, da Directiva 72/464 segundo o qual os fabricantes e importadores fixam livremente os preços máximos de venda a retalho de cada um dos seus produtos.

    23

    Os argumentos alegados na contestação pelo Governo belga não podem ser acolhidos.

    24

    Em primeiro lugar, contrariamente ao que alega o demandado, a Comissão não é de modo nenhum obrigada, para justificar a sua acção, a apresentar dados numéricos que provem a existência de uma perturbação no mercado. A tomada em consideração, nas condições acima expostas, dos preços menos elevados da tabela belga constitui, por si só, uma medida susceptível de entravar potencialmente as importações proibida pelo artigo 30.° do Tratado.

    25

    Em segundo lugar, a circunstância da tabela nacional ser extensa e diversificada não é bastante para provar que os preços das classes mais baixas dessa tabela correspondem, em todos os casos, às exigências do artigo 30.° do Tratado.

    26

    Em terceiro lugar, mesmo admitindo que a resposta da Bene na sua carta de 24 de Setembro de 1986 seja incompleta, essa circunstância não era susceptível de justificar a recusa de fornecer as cintas fiscais pelas razões dadas pelo ministro das Finanças. Competia a este último ou pedir informações complementares à empresa, ou provar que as propostas da Bene eram contrárias às exigências de lealdade das transacções comerciais.

    27

    Por último, nenhuma razão permite subordinar o benefício dos preços solicitados por Bene a uma alteração das condições de comercialização e de apresentação dos produtos dessa empresa.

    28

    Resulta do que precede que, ao recusar, pela decisão de 12 de Dezembro de 1986, fornecer à empresa Bene cintas fiscais que indiquem preços de venda de tabacos manufacturados inferiores aos previstos na tabela nacional, o Reino da Bélgica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 30.° do Tratado.

    Quanto às despesas

    29

    Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo o Reino da Bélgica sido vencido, há que condená-lo nas despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    decide:

     

    1)

    Ao recusar, pela decisão de 12 de Dezembro de 1986, fornecer à empresa Bene cintas fiscais que indiquem preços de venda de tabacos manufacturados inferiores aos previstos na tabela nacional, o Reino da Bélgica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 30.° do Tratado CEE.

     

    2)

    O Reino da Bélgica é condenado nas despesas.

     

    Due

    Rodríguez Iglesias

    Diez de Velasco

    Slynn

    Kakouris

    Joliét

    Grévisse

    Zuleeg

    Kapteyn

    Proferido em audiencia pública no Luxemburgo, em 7 de Maio de 1991.

    O secretário

    J.-G. Giraud

    O presidente

    O. Due


    ( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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