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Document 62021CJ0323

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 12 de janeiro de 2023.
Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid e K. contra B. e o.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Raad van State.
Reenvio prejudicial — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional — Apresentação de múltiplos pedidos de proteção internacional em três Estados‑Membros — Artigo 29.o — Prazo de transferência — Decurso do prazo — Transferência da responsabilidade pela análise do pedido — Artigo 27.o — Via de recurso — Alcance da fiscalização jurisdicional — Possibilidade de o requerente invocar a transferência da responsabilidade pela análise do pedido.
Processos apensos C-323/21 a C-325/21.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:4

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

12 de janeiro de 2023 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional — Apresentação de múltiplos pedidos de proteção internacional em três Estados‑Membros — Artigo 29.o — Prazo de transferência — Decurso do prazo — Transferência da responsabilidade pela análise do pedido — Artigo 27.o — Via de recurso — Alcance da fiscalização jurisdicional — Possibilidade de o requerente invocar a transferência da responsabilidade pela análise do pedido»

Nos processos apensos C‑323/21, C‑324/21 e C‑325/21,

que têm por objeto pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos), por Decisões de 19 de maio de 2021, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 25 de maio de 2021, nos processos

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid

contra

B (C‑323/21),

F (C‑324/21),

e

K

contra

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (C‑325/21),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Arabadjiev, presidente de secção, L. Bay Larsen (relator), vice‑presidente do Tribunal de Justiça, P. G. Xuereb, A. Kumin e I. Ziemele, juízes,

advogado‑geral: J. Richard de la Tour,

secretário: V. Giacobbo, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 5 de maio de 2022,

vistas as observações apresentadas:

em representação de B, por P. J. J. A. Hendriks, advocaat,

em representação do Governo neerlandês, por K. Bulterman, H. S. Gijzen e A. Hanje, na qualidade de agentes,

em representação do Governo francês, por A.‑L. Desjonquères e J. Illouz, na qualidade de agentes,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por D. G. Pintus, avvocato dello Stato,

em representação do Governo suíço, por S. Lauper e N. Marville‑Dosen, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por C. Cattabriga e S. Noë, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 8 de setembro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação do artigo 27.o, n.o 1, e do artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31, a seguir «Regulamento Dublim III»).

2

Estes pedidos de decisão prejudicial foram apresentados no âmbito de litígios que opõem, por um lado, o Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Secretário de Estado da Segurança e Justiça, Países Baixos) (a seguir «Secretário de Estado»), respetivamente a B e a F, nacionais de países terceiros, e, por outro, K, igualmente nacional de país terceiro, ao Secretário de Estado a respeito de decisões adotadas por este último destinadas, por um lado, a indeferir sem análise os pedidos de proteção internacional apresentados por B e K, bem como a transferi‑los para Itália e, por outro, a reter F para efeitos de afastamento.

Quadro jurídico

3

Os considerandos 4, 5 e 19 do Regulamento Dublim III enunciam:

«(4)

As conclusões do Conselho [Europeu, na sua reunião extraordinária] de Tampere [de 15 e 16 de outubro de 1999,] precisaram igualmente que o [Sistema Europeu Comum de Asilo (SECA)] deverá incluir, a curto prazo, um método claro e operacional para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise dos pedidos de asilo.

(5)

Este método deverá basear‑se em critérios objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa. Deverá, permitir, nomeadamente, uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e a não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional.

[…]

(19)

A fim de garantir a proteção efetiva dos direitos das pessoas em causa, deverão ser previstas garantias legais e o direito efetivo de recurso contra as decisões de transferência para o Estado‑Membro responsável, nos termos, nomeadamente, do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A fim de garantir o respeito do direito internacional, o direito efetivo de recurso contra essas decisões deverá abranger a análise da aplicação do presente regulamento e da situação jurídica e factual no Estado‑Membro para o qual o requerente é transferido.»

4

O artigo 3.o, n.o 1, deste regulamento dispõe:

«Os Estados‑Membros analisam todos os pedidos de proteção internacional apresentados por nacionais de países terceiros ou por apátridas no território de qualquer Estado‑Membro, inclusive na fronteira ou nas zonas de trânsito. Os pedidos são analisados por um único Estado‑Membro, que será aquele que os critérios enunciados no Capítulo III designarem como responsável.»

5

O artigo 18.o, n.o 1, do referido regulamento prevê:

«O Estado‑Membro responsável por força do presente regulamento é obrigado a:

[…]

(b)

Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência;

(c)

Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o nacional de um país terceiro ou o apátrida que tenha retirado o seu pedido durante o processo de análise e que tenha formulado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência;

(d)

Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o nacional de um país terceiro ou o apátrida cujo pedido tenha sido indeferido e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência.»

6

O artigo 20.o, n.o 5, do mesmo regulamento tem a seguinte redação:

«O Estado‑Membro a que tiver sido apresentado pela primeira vez o pedido de proteção internacional é obrigado, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o e a fim de concluir o processo de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional, a retomar a cargo o requerente que se encontre presente noutro Estado‑Membro sem título de residência ou aí tenha formulado um pedido de proteção internacional, após ter retirado o seu primeiro pedido apresentado noutro Estado‑Membro durante o processo de determinação do Estado responsável.»

7

O artigo 23.o, n.os 1 a 3, do Regulamento Dublim III dispõe:

«1.   Se o Estado‑Membro ao qual foi apresentado um novo pedido de proteção internacional pela pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), considerar que o responsável é outro Estado‑Membro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

2.   O pedido de retomada a cargo é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac […]

Se o pedido de retomada a cargo se basear em elementos de prova diferentes dos dados obtidos através do sistema Eurodac, deve ser enviado ao Estado‑Membro requerido no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido de proteção internacional […]

3.   Se o pedido de retomada a cargo não for apresentado nos prazos previstos no n.o 2, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional cabe ao Estado‑Membro em que o pedido tiver sido apresentado.»

8

Nos termos do artigo 24.o, n.o 1, deste regulamento:

«Se o Estado‑Membro em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), e em que não foi apresentado nenhum novo pedido de proteção internacional, considerar que o Estado‑Membro responsável é outro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c), ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.»

9

O artigo 27.o, n.o 1, do referido regulamento tem a seguinte redação:

«O requerente ou outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), tem direito a uma via de recurso efetiva, sob a forma de recurso ou de pedido de revisão, de facto e de direito, da decisão de transferência, para um órgão jurisdicional.»

10

O artigo 29.o, n.os 1 e 2, do mesmo regulamento prevê:

«1.   A transferência do requerente […] do Estado‑Membro requerente para o Estado‑Membro responsável efetua‑se em conformidade com o direito nacional do Estado‑Membro requerente, após concertação entre os Estados‑Membros envolvidos, logo que seja materialmente possível e, o mais tardar, no prazo de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa por outro Estado‑Membro ou da decisão final sobre o recurso ou revisão, nos casos em que exista efeito suspensivo […]

[…]

2.   Se a transferência não for executada no prazo de seis meses, o Estado‑Membro responsável fica isento da sua obrigação de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, e a responsabilidade é transferida para o Estado‑Membro requerente. Este prazo pode ser alargado para um ano, no máximo, se a transferência não tiver sido efetuada devido a retenção da pessoa em causa, ou para 18 meses, em caso de fuga.»

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Processo C‑323/21

11

Em 3 de julho de 2017, B apresentou um pedido de proteção internacional na Alemanha. As autoridades alemãs apresentaram às autoridades italianas um pedido de retomada a cargo de B com o fundamento de que este tinha solicitado anteriormente essa proteção em Itália. Em 4 de outubro de 2017, as autoridades italianas aceitaram esse pedido, o que determinou o início do prazo de seis meses para transferir B para Itália. Esse prazo foi posteriormente prorrogado até 4 de abril de 2019 devido à fuga de B.

12

Em 17 de fevereiro de 2018, B apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Em 17 de março de 2018, o Secretário de Estado apresentou às autoridades italianas um pedido de retomada a cargo de B. Em 1 de abril de 2018, as autoridades italianas aceitaram esse pedido. Por carta de 29 de junho de 2018, o Secretário de Estado comunicou a fuga de B a estas autoridades, o que implicou a prorrogação do prazo de transferência até 1 de outubro de 2019.

13

Em 9 de julho de 2018, B apresentou um segundo pedido de proteção internacional na Alemanha. Em 14 de setembro de 2018, as autoridades alemãs adotaram uma decisão ao abrigo do Regulamento Dublim III, que não foi objeto de recurso.

14

Em 27 de dezembro de 2018, B apresentou um segundo pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Por Decisão de 8 de março de 2019, o Secretário de Estado indeferiu o pedido sem exame por considerar que a República Italiana continuava a ser o Estado‑Membro responsável pela sua análise.

15

Em 29 de abril de 2019, B foi transferido para Itália.

16

B interpôs recurso contra a Decisão do Secretário de Estado de 8 de março de 2019 para o tribunal competente. Por Sentença de 12 de junho de 2019, este tribunal deu provimento ao recurso e anulou a referida decisão por considerar que a República Federal da Alemanha se tinha tornado, em 4 de abril de 2019, o Estado‑Membro responsável em razão do decurso do prazo de transferência previsto no artigo 29.o do Regulamento Dublim III.

17

O Secretário de Estado interpôs recurso desta sentença para o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Países Baixos), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Em apoio deste recurso, alegou, nomeadamente, por um lado, que o cálculo do prazo de transferência devia ser efetuado tendo em conta a relação entre o Reino dos Países Baixos e a República Italiana e, por outro, que tinha começado a correr um novo prazo de transferência em relação à República Federal da Alemanha na data em que B tinha apresentado um pedido de proteção internacional nos Países Baixos.

18

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que é pacífico que a República Italiana era o Estado‑Membro responsável à data de apresentação do segundo pedido de proteção internacional de B nos Países Baixos, isto é, em 27 de dezembro de 2018. Em contrapartida, sublinha que as partes no processo principal se opõem quanto ao eventual termo do prazo de transferência, em 4 de abril de 2019, findo um período de 18 meses, a contar da aceitação pela República Italiana do primeiro pedido de retomada a cargo, a saber o pedido apresentado para esse efeito pelas autoridades alemãs.

19

No caso em apreço, dado que coexistiram dois «acordos válidos» de retomada a cargo com dois prazos de transferência diferentes é necessário clarificar a relação entre estes dois prazos. Para este efeito, importa determinar se o primeiro Estado‑Membro que apresentou um pedido de retomada a cargo ainda deve ser considerado o «Estado‑Membro requerente», na aceção do artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, ou se esta qualidade deve ser reservada ao último Estado‑Membro a apresentar este pedido. Se for acolhida a segunda interpretação, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se este último Estado‑Membro está de algum modo vinculado ao prazo de transferência imposto ao primeiro Estado‑Membro.

20

Nestas condições, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

a)

Deve o conceito de “Estado‑Membro requerente” na aceção do artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento [Dublim III] ser interpretado no sentido de que esse é o último Estado‑Membro (in casu, o terceiro Estado‑Membro, a saber, os Países Baixos) que apresentou a outro Estado‑Membro um pedido de tomada ou de retomada a cargo?

b)

Em caso de resposta negativa: o facto de ter sido celebrado anteriormente um acordo de tomada a cargo entre dois Estados‑Membros (in casu, a Alemanha e a Itália) afeta as obrigações jurídicas do terceiro Estado‑Membro (in casu, os Países Baixos) por força do Regulamento Dublim relativamente ao estrangeiro ou aos Estados‑Membros abrangidos pelo acordo anterior? Em caso afirmativo, quais?

2)

Em caso de resposta negativa à [primeira questão], deve o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento [Dublim III], lido à luz do considerando 19 do referido regulamento, ser interpretado no sentido de que se opõe à procedência do argumento apresentado por um requerente de proteção internacional, no âmbito do recurso judicial interposto de uma decisão de transferência, de que a transferência não pode ter lugar porque o prazo para a transferência previamente acordada entre dois Estados‑Membros (in casu, a Alemanha e a Itália) já expirou?»

Processo C‑324/21

21

Em 24 de novembro de 2017, F apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. O Secretário de Estado apresentou às autoridades italianas um pedido de retomada a cargo de F, com o fundamento de que este tinha solicitado anteriormente essa proteção em Itália. Em 19 de dezembro de 2017, as autoridades italianas aceitaram esse pedido, o que determinou o início do prazo de seis meses para transferir F para Itália. Por carta de 12 de abril de 2018, o Secretário de Estado comunicou a fuga de F a estas autoridades, o que implicou a prorrogação do prazo de transferência até 19 de junho de 2019.

22

Em 29 de março de 2018, F apresentou um pedido de proteção internacional na Alemanha. O órgão jurisdicional de reenvio não tem conhecimento da eventual tramitação deste pedido.

23

Em 30 de setembro de 2018, F apresentou um segundo pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Por Decisão de 31 de janeiro de 2019, o Secretário de Estado indeferiu este pedido sem exame por considerar que a República Italiana continuava a ser o Estado‑Membro responsável pela sua análise.

24

Após ter deixado o centro de requerentes de asilo no qual estava alojado, F foi interpelado, e posteriormente retido, por Decisão do Secretário de Estado de 1 de julho de 2019, com vista à sua transferência para Itália.

25

F interpôs recurso desta decisão para o tribunal competente. Por Sentença de 16 de julho de 2019, esse tribunal deu provimento ao recurso e anulou a referida decisão por considerar que o Reino dos Países Baixos se tinha tornado, em 19 de junho de 2019, o Estado‑Membro responsável em razão do decurso do prazo de transferência de F para Itália.

26

O Secretário de Estado interpôs recurso desta sentença para o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Em apoio deste recurso, alegou, nomeadamente, que o Reino dos Países Baixos dispunha de um novo prazo para transferir F para Itália, prazo que tinha começado a correr a partir da data em que F apresentou um pedido de proteção internacional na Alemanha. Por conseguinte, considerou que a República Italiana continuava a ser o Estado‑Membro responsável.

27

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que é pacífico que a República Italiana devia ser considerada o Estado‑Membro responsável, pelo menos até 19 de junho de 2019.

28

Todavia, atendendo aos argumentos invocados pelo Secretário de Estado, interroga‑se sobre a pertinência que poderia revestir a circunstância de, antes do decurso do prazo de transferência de F para Itália, este último ter apresentado um novo pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro.

29

Nestas condições, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 29.o do Regulamento [Dublim III] ser interpretado no sentido de que um prazo de transferência em curso, conforme referido no artigo 29.o, n.os 1 e 2, começa a correr de novo no momento em que o estrangeiro, depois de ter obstruído a transferência por um Estado‑Membro por ter fugido, apresenta um novo pedido de proteção internacional noutro (in casu num terceiro) Estado‑Membro?»

Processo C‑325/21

30

Em 6 de setembro de 2018, K apresentou um pedido de proteção internacional em França. As autoridades francesas apresentaram às autoridades austríacas um pedido de retomada a cargo de K, com o fundamento de que este tinha solicitado anteriormente esta proteção na Áustria. Em 4 de outubro de 2018, as autoridades austríacas aceitaram esse pedido, o que determinou o início do prazo de seis meses para transferir K para a Áustria. Posteriormente, K fugiu e não foi transferido para a Áustria.

31

Em 27 de março de 2019, K apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos. Em 3 de maio de 2018, o Secretário de Estado apresentou às autoridades austríacas um pedido de retomada a cargo de K. Em 10 de maio de 2019, estas autoridades indeferiram esse pedido por considerarem que a República Francesa, ao não ter informado a República da Áustria de que a transferência de K não podia ocorrer num prazo de seis meses, era, desde 4 de abril de 2019, data do termo do prazo de transferência de K para a Áustria, o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de K.

32

Em 20 de maio de 2019, o Secretário de Estado apresentou às autoridades francesas um pedido de retomada a cargo de K. Estas autoridades indeferiram esse pedido por considerarem que o prazo de transferência de seis meses para a Áustria ainda não tinha decorrido no dia em que K apresentou um pedido de proteção internacional nos Países Baixos.

33

Em 31 de maio de 2019, o Secretário de Estado pediu às autoridades austríacas e às autoridades francesas que reconsiderassem as suas respostas aos pedidos de retomada a cargo que lhes tinham sido respetivamente dirigidos. O pedido dirigido às autoridades austríacas referia que tinha começado a correr um novo prazo de transferência entre a República Francesa e a República da Áustria a contar da apresentação, por K, de um pedido de proteção internacional nos Países Baixos e que, por esse motivo, a República da Áustria era o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional de K. Em 3 de junho de 2019, as autoridades austríacas aceitaram retomar K a cargo.

34

Por Decisão de 24 de julho de 2019, o Secretário de Estado indeferiu sem exame o pedido de proteção internacional apresentado por K.

35

K interpôs recurso contra essa decisão para o tribunal competente. Por Sentença de 17 de outubro de 2019, este tribunal negou provimento ao recurso declarando que o Secretário de Estado tinha considerado corretamente que a República da Áustria era o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional de K.

36

K interpôs recurso dessa sentença para o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Em apoio deste recurso, alegou que a apresentação de um pedido de proteção internacional num terceiro Estado‑Membro não pode obstar ao decurso do prazo de transferência previsto entre dois outros Estados‑Membros.

37

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que é pacífico que as autoridades francesas não informaram as autoridades austríacas da fuga de K nem do facto de que não podiam proceder à sua transferência num prazo de seis meses. Por conseguinte, atendendo ao decurso deste prazo, a República da Áustria já não podia ser considerada o Estado‑Membro responsável a partir de 4 de abril de 2019.

38

Interroga‑se, contudo, sobre a questão de saber se é pertinente o facto de, antes do decurso do prazo de transferência, a pessoa em causa ter apresentado um novo pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro.

39

Nestas condições, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 29.o do Regulamento [Dublim III] ser interpretado no sentido de que um prazo de transferência em curso, conforme referido no artigo 29.o, n.os 1 e 2, começa a correr de novo no momento em que o estrangeiro, depois de ter obstruído a transferência por um Estado‑Membro por ter fugido, apresenta um novo pedido de proteção internacional noutro (in casu, num terceiro) Estado‑Membro?

2)

Em caso de resposta negativa à [primeira questão], deve o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento [Dublim III], lido à luz do considerando 19 do referido regulamento, ser interpretado no sentido de que se opõe à procedência do argumento apresentado por um requerente de proteção internacional, no âmbito do recurso judicial interposto de uma decisão de transferência, de que a transferência não pode ter lugar porque o prazo para a transferência previamente acordada entre dois Estados‑Membros (in casu, a França e a Áustria) já expirou, daí resultando que o prazo no qual os Países Baixos podem transferir expirou?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão nos processos C‑323/21 e C‑325/21 e à questão única no processo C‑324/21

40

Com a sua primeira questão nos processos C‑323/21 e C‑325/21 e com a sua questão única no processo C‑324/21, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 29.o do Regulamento Dublim III deve ser interpretado no sentido de que, quando um prazo para a transferência de um nacional de um país terceiro tiver começado a correr entre um Estado‑Membro requerido e um primeiro Estado‑Membro requerente, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por essa pessoa é transferida para o Estado‑Membro requerente em razão do decurso desse prazo, mesmo quando a referida pessoa tenha, entretanto, apresentado num terceiro Estado‑Membro um novo pedido de proteção internacional que tenha conduzido à aceitação, pelo Estado‑Membro requerido, de um pedido de retomada a cargo formulado por esse terceiro Estado‑Membro. Com a sua primeira questão no processo C‑323/21, o órgão jurisdicional de reenvio interroga igualmente o Tribunal de Justiça sobre as eventuais consequências do decurso do referido prazo para o mencionado terceiro Estado‑Membro.

41

A título preliminar, importa salientar que, em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, todos os pedidos de proteção internacional apresentados por nacionais de países terceiros ou por apátridas no território de qualquer Estado‑Membro são analisados por um único Estado‑Membro.

42

Consequentemente, quando um requerente de proteção internacional se encontra no território de um Estado‑Membro diferente daquele ao qual incumbe analisar o seu pedido, os procedimentos previstos no Regulamento Dublim III visam, nomeadamente, permitir a sua transferência para este último Estado‑Membro.

43

A este respeito, o artigo 29.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublim III prevê que a transferência da pessoa em causa se efetua logo que seja materialmente possível e, o mais tardar, no prazo de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa por outro Estado‑Membro ou da decisão final sobre o recurso ou revisão, nos casos em que exista efeito suspensivo.

44

O artigo 29.o, n.o 2, deste regulamento esclarece que, se a transferência não for executada no prazo de seis meses, o Estado‑Membro responsável fica isento da sua obrigação de tomada ou retomada a cargo da pessoa em causa, e a responsabilidade é transferida para o Estado‑Membro requerente.

45

Assim, o artigo 29.o do Regulamento Dublim III não enuncia regras específicas para as situações em que, apesar de um pedido de retomada a cargo de um nacional de um país terceiro apresentado por um Estado‑Membro requerente já ter sido aceite por outro Estado‑Membro, essa pessoa apresenta um pedido de proteção internacional num terceiro Estado‑Membro.

46

Para apreciar se, nessa situação, a apresentação de um pedido de proteção internacional num terceiro Estado‑Membro, ou o seguimento dado a este pedido, devem ser tidos em conta para efeitos da aplicação destas disposições, é necessário determinar as regras que regem os procedimentos a executar ao abrigo do Regulamento Dublim III em caso de apresentação sucessiva de pedidos de proteção internacional em vários Estados‑Membros.

47

O âmbito de aplicação do procedimento de retomada a cargo é definido nos artigos 23.o e 24.o do Regulamento Dublim III. Resulta do artigo 23.o, n.o 1, e do artigo 24.o, n.o 1, deste regulamento que este procedimento é aplicável às pessoas referidas no artigo 20.o, n.o 5, ou no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) a d), do referido regulamento (Acórdão de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.o 46).

48

O artigo 20.o, n.o 5, do mesmo regulamento prevê, nomeadamente, que este se aplica a um requerente que formule um pedido de proteção internacional num Estado‑Membro após ter retirado o seu primeiro pedido apresentado noutro Estado‑Membro durante o processo de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido. Esta disposição também se aplica à situação em que um requerente abandonou o Estado‑Membro onde apresentou o seu primeiro pedido, antes de estar concluído o processo de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido, sem informar a autoridade competente do primeiro Estado‑Membro da sua intenção de desistir do seu pedido (v., neste sentido, Acórdão de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.os 46 e 50).

49

Quanto ao artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) a d), do Regulamento Dublim III, este refere‑se a uma pessoa que, por um lado, apresentou um pedido de proteção internacional que está em fase de análise, retirou esse pedido em fase de análise ou viu esse pedido ser indeferido, e que, por outro, apresentou um pedido noutro Estado‑Membro ou se encontra, sem possuir um título de residência, no território de outro Estado‑Membro (Acórdão de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.o 51 e jurisprudência referida).

50

O artigo 20.o, n.o 5, e o artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) a d), deste regulamento são, assim, complementares, uma vez que a primeira destas disposições se aplica à situação em que o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional ainda não foi determinado, ao passo que a segunda diz respeito aos casos em que a responsabilidade pela análise do pedido já foi estabelecida (v., neste sentido, Acórdão de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.os 52, 66 e 67).

51

Nestas condições, uma vez que o artigo 23.o, n.o 1, do referido regulamento diz respeito, de um modo geral, ao Estado‑Membro no qual foi apresentado um novo pedido de proteção internacional que considera que outro Estado‑Membro é responsável em conformidade com o artigo 20.o, n.o 5, ou com o artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) a d), do mesmo regulamento, deve considerar‑se que o procedimento de retomada a cargo é aplicável não só ao segundo Estado‑Membro no qual o nacional de um país terceiro apresentou este pedido, mas também a um terceiro Estado‑Membro no qual foi posteriormente apresentado um novo pedido de proteção internacional.

52

No que se refere às modalidades dos procedimentos de retomada a cargo instaurados na sequência da apresentação sucessiva de pedidos de proteção internacional em vários Estados‑Membros, importa salientar que o legislador da União não estabeleceu, nas disposições relativas à instauração e à tramitação do procedimento de retomada a cargo, isto é os artigos 23.o a 25.o do Regulamento Dublim III, nenhuma distinção consoante este procedimento seja instaurado pelo segundo Estado‑Membro no qual tenha sido apresentado um pedido de proteção internacional por um nacional de um país terceiro ou por um terceiro Estado‑Membro no qual esse pedido tenha sido apresentado posteriormente.

53

Ora, na falta de qualquer disposição específica, não se pode estabelecer uma distinção, não prevista neste regulamento, entre estas duas situações (v., por analogia, Acórdão de 10 de setembro de 2015, FCD e FMB, C‑106/14, EU:C:2015:576, n.o 50).

54

Consequentemente, nas referidas situações, os Estados‑Membros envolvidos nos procedimentos de retomada a cargo são obrigados a respeitar os prazos imperativos estipulados pelo legislador da União para enquadrar estes procedimentos.

55

Com efeito, estes prazos contribuem, de modo determinante, para a realização do objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional enunciado no considerando 5 do Regulamento Dublim III, garantindo que os referidos procedimentos serão executados sem demora injustificada, e testemunham a importância especial que o referido legislador atribuiu à determinação rápida do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional bem como o facto de, atendendo ao objetivo de garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e a não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional, importa, segundo o referido legislador, que esses pedidos sejam, sendo caso disso, apreciados por um Estado‑Membro diferente do designado como responsável nos termos dos critérios enunciados no capítulo III desse regulamento (v., neste sentido, Acórdão de 13 de novembro de 2018, X e X, C‑47/17 e C‑48/17, EU:C:2018:900, n.os 69 e 70).

56

Daqui resulta, em primeiro lugar, que os prazos imperativos enunciados no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III devem ser respeitados tanto pelo segundo como pelo terceiro Estado‑Membro no qual foi apresentado um pedido de proteção internacional por um nacional de um país terceiro, sempre que tais Estados‑Membros apresentem um pedido de retomada a cargo.

57

Contudo, visto que alguns dos processos principais dizem respeito a situações em que um nacional de um país terceiro apresentou vários pedidos de proteção internacional no mesmo Estado‑Membro, importa salientar que, quando um requerente apresenta um novo pedido de proteção internacional num Estado‑Membro depois de este último ter adotado uma decisão de transferência desse requerente, a execução desta decisão continua, em princípio, a ser possível, sem que seja necessário que o Estado‑Membro em causa apresente um novo pedido de retomada a cargo, mesmo que o referido requerente tenha, entretanto, apresentado um pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro.

58

Com efeito, se não fosse reconhecido tal efeito a uma decisão de transferência, isso permitiria a qualquer nacional de um país terceiro contra o qual foi adotada uma decisão de transferência por um Estado‑Membro subtrair‑se definitivamente à sua execução, antes de a mesma poder produzir os seus efeitos, apresentando um pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro, e regressando depois ao primeiro Estado‑Membro, correndo o risco de paralisar completamente o mecanismo de tratamento dos pedidos de proteção internacional instituído pelo Regulamento Dublim III e de prejudicar a realização do objeto de celeridade no tratamento destes pedidos.

59

Por conseguinte, o Estado‑Membro que adotou uma decisão de transferência que ainda não foi executada e cujo prazo de execução ainda não decorreu não pode obter a transferência da responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional pelo simples facto de, na sequência da apresentação de um novo pedido de proteção internacional no seu território, não ter formulado um novo pedido de retomada a cargo nos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III.

60

Em contrapartida, esse pedido deve ser obrigatoriamente apresentado para permitir que se proceda à transferência de um nacional de um país terceiro que foi objeto de uma decisão de transferência para o Estado‑Membro em causa sempre que essa decisão já tiver sido executada (v., por analogia, Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan, C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 51).

61

Nessa situação, na falta de apresentação de um pedido de retomada a cargo nos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, o Estado‑Membro ao qual foi apresentado um novo pedido de proteção internacional passa a ser, em conformidade com o artigo 23.o, n.o 3, deste regulamento, o Estado‑Membro responsável pela análise deste pedido, sem que seja relevante a questão do eventual decurso do prazo de transferência previsto no artigo 29.o, n.o 1, do referido regulamento.

62

Em segundo lugar, decorre das considerações que figuram nos n.os 52 a 54 do presente acórdão que as regras relativas aos prazos de transferência enunciadas no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublim III são aplicáveis no contexto dos procedimentos de retomada a cargo instaurados quando o nacional em causa de um país terceiro tenha apresentado sucessivamente pedidos de proteção internacional em vários Estados‑Membros.

63

A este respeito, importa recordar que o prazo de transferência de seis meses previsto no artigo 29.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III visa nomeadamente deixar, atendendo à complexidade prática e às dificuldades organizacionais ligadas à execução da transferência de um nacional de país terceiro, o tempo necessário aos dois Estados‑Membros em causa para se concertarem com vista à realização dessa transferência, e, mais concretamente, ao Estado‑Membro requerente para regular as modalidades de realização da referida transferência [v., neste sentido, Acórdão de 22 de setembro de 2022, Bundesrepublik Deutschland (Suspensão administrativa da decisão de transferência), C‑245/21 e C‑248/21, EU:C:2022:709, n.o 58 e jurisprudência referida].

64

Por conseguinte, e dado que esta disposição não prevê um regime específico para o caso de terem sido sucessivamente aceites vários pedidos de retomada a cargo, o prazo de transferência aplicável a um Estado‑Membro requerente deve ser contado a partir da data em que o pedido apresentado por esse Estado‑Membro tenha sido aceite pelo Estado‑Membro requerido, mesmo quando já tenha começado a correr um prazo para a transferência de um nacional de um país terceiro entre outro Estado‑Membro requerente e esse Estado‑Membro requerido.

65

Além disso, nessa situação, uma vez que os diferentes procedimentos de retomada a cargo são conduzidos de maneira independente por cada um dos Estados‑Membros requerentes e que o Regulamento Dublim III não prevê um mecanismo de coordenação que permita derrogar as regras enunciadas no artigo 29.o deste regulamento, o prazo de transferência resultante do facto de um primeiro pedido de retomada a cargo ter sido aceite pelo Estado‑Membro requerido não pode ser interrompido ou prorrogado pelo facto de um novo pedido de retomada a cargo, formulado por outro Estado‑Membro, ter sido aceite pelo referido Estado‑Membro requerido.

66

É certo que, como sublinha o órgão jurisdicional de reenvio, a partir da data em que a pessoa visada por uma decisão de transferência abandona o território de um Estado‑Membro para permanecer fora desse território, o Estado‑Membro em causa já não tem condições materiais para realizar a transferência, o que significa que o prazo de transferência previsto no artigo 29.o do Regulamento Dublim III pode então decorrer sem que o referido Estado‑Membro tenha disposto de todo o período de tempo considerado adequado pelo legislador da União para regular as modalidades de realização da transferência.

67

No entanto, o referido legislador teve expressamente em conta o risco de a pessoa em causa se subtrair à execução da decisão de transferência mediante fuga e previu, no artigo 29.o, n.o 2, desse regulamento, que, nesta situação, o Estado‑Membro requerente pode, a título excecional, alargar o prazo de transferência até um máximo de 18 meses [v., neste sentido, Acórdão de 22 de setembro de 2022, Bundesrepublik Deutschland (Suspensão administrativa da decisão de transferência), C‑245/21 e C‑248/21, EU:C:2022:709, n.o 67].

68

Esta solução, que constitui a expressão do equilíbrio estabelecido pelo referido legislador entre os diferentes objetivos do Regulamento Dublim III e os interesses concorrentes em presença, é válida para todos os casos de fuga e aplica‑se, por conseguinte, tanto quando a pessoa em causa se encontra em fuga e permanece no território do Estado‑Membro requerente como quando abandona este território durante a sua fuga.

69

Além disso, importa recordar que o mesmo legislador não considerou que a impossibilidade material de proceder à execução da decisão de transferência devia ser considerada suscetível de justificar a interrupção ou a suspensão do prazo de transferência previsto no artigo 29.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III [v., neste sentido, Acórdão de 22 de setembro de 2022, Bundesrepublik Deutschland (Suspensão administrativa da decisão de transferência), C‑245/21 e C‑248/21, EU:C:2022:709, n.o 65 e jurisprudência referida].

70

Consequentemente, o Tribunal de Justiça declarou que o prazo de transferência previsto nesta disposição devia aplicar‑se em situações em que a transferência da pessoa em causa fosse impossível [v., neste sentido, Acórdãos de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o., C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127, n.o 89; de 31 de março de 2022, Bundesamt für Fremdenwesen und Asyl e o. (Internamento de um requerente de asilo num hospital psiquiátrico), C‑231/21, EU:C:2022:237, n.o 62, e de 22 de setembro de 2022, Bundesrepublik Deutschland (Suspensão administrativa da decisão de transferência), C‑245/21 e C‑248/21, EU:C:2022:709, n.o 70].

71

Nestas condições, a circunstância de a pessoa em causa ter, durante a sua fuga, apresentado um novo pedido de proteção internacional num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro requerente ou de ter sido aceite um novo pedido de retomada a cargo na sequência da apresentação deste pedido não é suscetível, na falta de uma regra prevista para o efeito pelo Regulamento Dublim III, de justificar a interrupção ou a prorrogação de um dos prazos imperativos previstos no artigo 29.o deste regulamento. Tal circunstância não implica, aliás, de modo algum, que a referida pessoa permaneça duradouramente fora do território do primeiro Estado‑Membro requerente, impedindo‑o assim de proceder à transferência, como ilustram os factos em causa nos processos principais C‑323/21 e C‑324/21.

72

Logo, decorrido o prazo de transferência resultante da aceitação de um pedido de retomada a cargo formulado por um Estado‑Membro requerente, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional é transferida, em conformidade com o artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, para esse Estado‑Membro requerente, mesmo que, entretanto, tenha sido apresentado um novo pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro ou tenha sido aceite um novo pedido de retomada a cargo na sequência da apresentação desse pedido.

73

Em terceiro lugar, uma transferência da responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro, decorrente da aplicação dos artigos 23.o ou 29.o do Regulamento Dublim III, deve ser devidamente considerada por todos os Estados‑Membros no momento em que instauram eventuais procedimentos de retomada a cargo relativos a esse requerente.

74

Daqui decorre, em primeiro lugar, que, tendo em conta que o artigo 20.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III só se aplica, como resulta do n.o 50 do presente acórdão, quando o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional ainda não tiver sido determinado, um pedido de retomada a cargo não pode ser validamente dirigido, em conformidade com os artigos 18.o e 23.o deste regulamento, ao Estado‑Membro no qual um nacional de um país terceiro apresentou o seu primeiro pedido de proteção internacional depois de a responsabilidade pela análise deste pedido ter sido transferida para outro Estado‑Membro. Neste caso, é a este último Estado‑Membro que deve ser dirigido um eventual pedido de retomada a cargo.

75

Uma vez que as disposições do Regulamento Dublim III que estabelecem prazos imperativos contribuem, à semelhança dos critérios enunciados no capítulo III deste regulamento, para determinar o Estado‑Membro responsável na aceção do referido regulamento (v., neste sentido, Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab, C‑670/16, EU:C:2017:587, n.o 53), a regra enunciada no n.o 74 do presente acórdão aplica‑se, nomeadamente, quando a transferência da responsabilidade pela análise de um pedido de proteção internacional resulta destas disposições e, nomeadamente, dos artigos 23.o ou 29.o do mesmo regulamento.

76

Particularmente, numa situação em que o prazo de transferência resultante do facto de o pedido de retomada a cargo formulado por um primeiro Estado‑Membro requerente ter sido aceite pelo Estado‑Membro requerido decorreu antes de o novo pedido de retomada a cargo apresentado por outro Estado‑Membro ter sido aceite, este último deverá dirigir o seu pedido a esse primeiro Estado‑Membro requerente, uma vez que este deve, em aplicação do artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, ser considerado o Estado‑Membro responsável.

77

No que respeita, em segundo lugar, à situação em que a transferência da responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional para um Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro requerido ocorreu depois de um pedido de retomada a cargo apresentado por um terceiro Estado‑Membro ter sido aceite, importa recordar, por um lado, que o Regulamento Dublim III se baseia no princípio essencial, enunciado no seu artigo 3.o, n.o 1, segundo o qual um pedido de proteção internacional só deve ser analisado por um único Estado‑Membro, o que implica que um único Estado‑Membro pode ser considerado, num dado momento, o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional (v., neste sentido, Acórdão de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.o 78).

78

Por outro lado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que não se pode proceder à transferência de um nacional de um país terceiro para um Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro responsável quando a transferência da responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional resulte do decurso de um prazo de procedimento posteriormente à aceitação do pedido de retomada a cargo e da adoção de uma decisão de transferência [v., neste sentido, Acórdãos de 25 de outubro de 2017, Shiri, C‑201/16, EU:C:2017:805, n.o 43, e de 15 de abril de 2021, État belge (Elementos posteriores à decisão de transferência), C‑194/19, EU:C:2021:270, n.o 47].

79

Por conseguinte, a transferência da responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro a um Estado‑Membro, em aplicação dos artigos 23.o ou 29.o do Regulamento Dublim III, obsta à execução de uma decisão que implique a transferência da pessoa em causa para outro Estado‑Membro.

80

Dito isto, nessa situação, importa sublinhar que o Estado‑Membro cuja decisão de transferência não é suscetível de ser executada pode dirigir um pedido de retomada a cargo ao Estado‑Membro para o qual a referida responsabilidade foi transferida.

81

É certo que o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III prevê a transferência da responsabilidade pela análise de um pedido de proteção internacional para o Estado‑Membro em que foi apresentado um novo pedido de proteção internacional quando este Estado‑Membro se abstém de apresentar, nos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, deste regulamento, um pedido de retomada a cargo.

82

Todavia, não se pode considerar que um Estado‑Membro que dirigiu, dentro desses prazos, um pedido de retomada a cargo ao Estado‑Membro que era, nessa data, responsável pela análise de um pedido de proteção internacional não tenha formulado esse pedido em tempo útil.

83

Daqui decorre, por um lado, que a regra que figura no artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III não é aplicável a esse Estado‑Membro.

84

A aplicação desta regra em tal situação não seria, aliás, conforme com o objetivo dos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, deste regulamento, a saber garantir que o Estado‑Membro requerente inicie o procedimento de retomada a cargo num prazo razoável a partir da data em que dispõe das informações que lhe permitam enviar um pedido de retomada a cargo a um outro Estado‑Membro (v., neste sentido, Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan, C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 63).

85

Daqui resulta, por outro lado, que a transferência de responsabilidade evocada no n.o 79 do presente acórdão determina, para o Estado‑Membro em cujo território o requerente se encontra, o início de um novo prazo, ao abrigo do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, para apresentar um pedido de retomada a cargo ao Estado‑Membro para o qual a referida responsabilidade foi transferida.

86

Atentas todas estas considerações, há que responder à primeira questão nos processos C‑323/21 e C‑325/21 e à questão única no processo C‑324/21 que os artigos 23.o e 29.o do Regulamento Dublim III devem ser interpretados no sentido de que, quando um prazo para a transferência de um nacional de um país terceiro tiver começado a correr entre um Estado‑Membro requerido e um primeiro Estado‑Membro requerente, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por essa pessoa é transferida para o Estado‑Membro requerente em razão do decurso desse prazo, mesmo quando a referida pessoa tenha, entretanto, apresentado num terceiro Estado‑Membro um novo pedido de proteção internacional que tenha conduzido à aceitação, pelo Estado‑Membro requerido, de um pedido de retomada a cargo formulado por esse terceiro Estado‑Membro, desde que essa responsabilidade não tenha sido transferida para o referido terceiro Estado‑Membro em razão do decurso dos prazos previstos nesse artigo 23.o

87

Na sequência dessa transferência da referida responsabilidade, o Estado‑Membro no qual se encontra a pessoa em causa não pode proceder à transferência desta última para um Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro que passou a ser responsável, mas pode, em contrapartida, no respeito dos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, deste regulamento, apresentar um pedido de retomada a cargo a esse último Estado‑Membro.

Quanto à segunda questão prejudicial nos processos C‑323/21 e C‑325/21

88

Com a sua segunda questão nos processos C‑323/21 e C‑325/21, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, lido à luz do considerando 19 deste regulamento, deve ser interpretado no sentido de que um nacional de um país terceiro que tenha apresentado um pedido de proteção internacional sucessivamente em três Estados‑Membros pode invocar, no âmbito de um recurso interposto, ao abrigo do artigo 27.o, n.o 1, do referido regulamento, contra uma decisão de transferência para o primeiro desses Estados‑Membros adotada a seu respeito pelo terceiro dos referidos Estados‑Membros, o facto de, posteriormente à adoção dessa decisão de transferência, a responsabilidade pela análise do seu pedido ter sido transferida, em razão do decurso do prazo de transferência previsto no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do mesmo regulamento, para o segundo desses mesmos Estados‑Membros.

89

O artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III prevê que o requerente de proteção internacional tem direito a uma via de recurso efetiva, sob a forma de recurso ou de pedido de revisão, de facto e de direito, da decisão de transferência, para um órgão jurisdicional.

90

O alcance desse recurso é precisado no considerando 19 deste regulamento, que indica que, a fim de garantir o respeito do direito internacional, o recurso efetivo instituído pelo referido regulamento contra as decisões de transferência deverá abranger, por um lado, a análise da aplicação do mesmo regulamento e, por outro, a análise da situação de facto e de direito no Estado‑Membro para o qual o requerente é transferido [Acórdãos de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.o 39, e de 15 abril de 2021, État belge (Elementos posteriores à decisão de transferência), C‑194/19, EU:C:2021:270, n.o 33].

91

Atendendo, nomeadamente, à evolução geral ocorrida no sistema de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros devido à adoção do Regulamento Dublim III e aos objetivos prosseguidos por este regulamento, o artigo 27.o, n.o 1, do referido regulamento deve ser interpretado no sentido de que o recurso nele previsto contra uma decisão de transferência deve poder ter por objeto tanto o respeito das regras de atribuição da responsabilidade pela análise de um pedido de proteção internacional como as garantias processuais previstas pelo mesmo regulamento [Acórdãos de 2 de abril de 2019, H. e R., C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.o 40, e de 15 de abril de 2021, État belge (Elementos posteriores à decisão de transferência), C‑194/19, EU:C:2021:270, n.o 34].

92

Além disso, o Tribunal de Justiça declarou que, atento, por um lado, o objetivo mencionado no considerando 19 do Regulamento Dublim III de garantir, em conformidade com o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais, uma proteção efetiva das pessoas em causa e, por outro, o objetivo, enunciado no considerando 5 do referido regulamento, de assegurar com celeridade a determinação do Estado‑Membro responsável pelo tratamento do pedido de proteção internacional, o requerente deve poder dispor de uma via de recurso efetiva e rápida que lhe permita invocar circunstâncias posteriores à adoção da decisão de transferência, quando a tomada em consideração destas for determinante para a correta aplicação do referido regulamento [Acórdão de 15 de abril de 2021, État belge (Elementos posteriores à decisão de transferência), C‑194/19, EU:C:2021:270, n.o 35 e jurisprudência referida].

93

Essa via de recurso efetiva deve, nomeadamente, permitir ao requerente de proteção internacional invocar, no Estado‑Membro em cujo território se encontra, o decurso do prazo de transferência, previsto no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublim III, relativamente a outro Estado‑Membro requerente, uma vez que resulta do n.o 79 do presente acórdão que a tomada em consideração do decurso deste prazo é determinante para a correta aplicação deste regulamento.

94

Dito isto, há que recordar que os Estados‑Membros não estão necessariamente obrigados, em aplicação do artigo 27.o do referido regulamento, a organizar o seu sistema de recurso de modo que a exigência de tomada em consideração de circunstâncias determinantes posteriores à adoção da decisão de transferência seja garantida no âmbito do exame do recurso que permita pôr em causa a legalidade da decisão de transferência, desde que possa ser garantida uma tutela jurisdicional suficiente sob outras formas, no âmbito do sistema jurisdicional nacional considerado no seu conjunto [v., neste sentido, Acórdão de 15 de abril de 2021, État belge (Elementos posteriores à decisão de transferência), C‑194/19, EU:C:2021:270, n.os 37 e 46].

95

Essa outra forma de tutela jurisdicional suficiente deve garantir, na prática, à pessoa em causa que as autoridades competentes do Estado‑Membro em cujo território esta pessoa se encontra não possam, quando o decurso do prazo de transferência relativamente a um primeiro Estado‑Membro requerente implique que este se tenha tornado o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional, proceder à transferência da referida pessoa para outro Estado‑Membro. A referida via de recurso deve igualmente assegurar que as autoridades competentes do Estado‑Membro em cujo território se encontra a pessoa em causa sejam obrigadas a tomar as providências necessárias para retirar as consequências da transferência da responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional [v., neste sentido, Acórdão de 15 de abril de 2021, État belge (Elementos posteriores à decisão de transferência), C‑194/19, EU:C:2021:270, n.o 47].

96

Consequentemente, há que responder à segunda questão nos processos C‑323/21 e C‑325/21 que o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, lido à luz do considerando 19 deste regulamento, bem como o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais devem ser interpretados no sentido de que um nacional de um país terceiro que tenha apresentado um pedido de proteção internacional sucessivamente em três Estados‑Membros deve poder dispor, no terceiro desses Estados‑Membros, de uma via de recurso efetiva e rápida que lhe permita invocar o facto de a responsabilidade pela análise do seu pedido ter sido transferida, em razão do decurso do prazo de transferência, previsto no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do referido regulamento, para o segundo desses Estados‑Membros.

Quanto às despesas

97

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

1)

Os processos C‑323/21, C‑324/21 e C‑325/21 são apensados para efeitos do acórdão.

 

2)

Os artigos 23.o e 29.o do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida,

devem ser interpretados no sentido de que:

quando um prazo para a transferência de um nacional de um país terceiro tiver começado a correr entre um Estado‑Membro requerido e um primeiro Estado‑Membro requerente, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por essa pessoa é transferida para o Estado‑Membro requerente em razão do decurso desse prazo, mesmo quando a referida pessoa tenha, entretanto, apresentado num terceiro Estado‑Membro um novo pedido de proteção internacional que tenha conduzido à aceitação, pelo Estado‑Membro requerido, de um pedido de retomada a cargo formulado por esse terceiro Estado‑Membro, desde que essa responsabilidade não tenha sido transferida para o referido terceiro Estado‑Membro em razão do decurso dos prazos previstos nesse artigo 23.o

Na sequência dessa transferência da referida responsabilidade, o Estado‑Membro no qual se encontra a pessoa em causa não pode proceder à transferência desta última para um Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro que passou a ser responsável, mas pode, em contrapartida, no respeito dos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, deste regulamento, apresentar um pedido de retomada a cargo a esse último Estado‑Membro.

 

3)

O artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 604/2013, lido à luz do considerando 19 desse regulamento, bem como o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia devem ser interpretados no sentido de que um nacional de um país terceiro que tenha apresentado um pedido de proteção internacional sucessivamente em três Estados‑Membros deve poder dispor, no terceiro desses Estados‑Membros, de uma via de recurso efetiva e rápida que lhe permita invocar o facto de a responsabilidade pela análise do seu pedido ter sido transferida, em razão do decurso do prazo de transferência, previsto no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do referido regulamento, para o segundo desses Estados‑Membros.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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