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Document 62014CJ0287

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Sexta Secção) de 9 de junho de 2016.
    Eurospeed Ltd contra Szegedi Törvényszék.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Gyulai Törvényszék.
    Reenvio prejudicial — Transportes rodoviários — Regulamento (CE) n.° 561/2006 — Responsabilidade do condutor pelas infrações à obrigação de utilização de tacógrafo.
    Processo C-287/14.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:420

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

    9 de junho de 2016 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Transportes rodoviários — Regulamento (CE) n.o 561/2006 — Responsabilidade do condutor pelas infrações à obrigação de utilização de tacógrafo»

    No processo C‑287/14,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Gyulai törvényszék (Tribunal de Gyula, Hungria), por decisão de 4 de junho de 2014, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de junho de 2014, no processo

    Eurospeed Ltd

    contra

    Szegedi Törvényszék,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

    composto por: E. Levits, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, M. Berger (relator) e S. Rodin, juízes,

    advogado‑geral: Y. Bot,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Eurospeed Ltd, por D. Irinkov, ügyvéd,

    em representação do Governo húngaro, por M. Z. Fehér, G. Szima e M. Bóra, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por G. Galluzzo, avvocato dello Stato,

    em representação da Comissão Europeia, por L. Havas e J. Hottiaux, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do princípio da responsabilidade dos Estados‑Membros pelos danos causados a particulares por uma violação do direito da União Europeia e do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, relativo à harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários, que altera os Regulamentos (CEE) n.o 3821/85 e [CE] n.o 2135/98 do Conselho e revoga o Regulamento (CEE) n.o 3820/85 do Conselho (JO 2006, L 102, p. 1).

    2

    O pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Eurospeed Ltd ao Szegedi törvényszék (Tribunal de Szeged, Hungria) a respeito da indemnização pelas consequências danosas de uma coima aplicada por este a três trabalhadores da Eurospeed, em cujos direitos esta sociedade se sub‑rogou, como punição por infrações às obrigações resultantes do Regulamento n.o 561/2006.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    Nos termos dos considerandos 17, 27 e 31 do Regulamento n.o 561/2006:

    «17)

    O presente regulamento pretende melhorar as condições sociais dos empregados abrangidos pelo mesmo, bem como a segurança rodoviária em geral. Este objetivo é alcançado sobretudo mediante as disposições relativas aos tempos de condução máximos por dia, por semana e por períodos de duas semanas consecutivas, a disposição que impõe um período de repouso semanal regular aos condutores pelo menos uma vez em cada período de duas semanas consecutivas e as disposições que preveem que em caso algum o período de repouso diário poderá ser menor do que um período ininterrupto de nove horas. Uma vez que este pacote de disposições garante um repouso adequado, e tendo ainda em conta a experiência prática da aplicação da lei nos últimos anos, deixa de ser necessário um sistema de compensação para períodos de repouso diário reduzido.

    […]

    27)

    No interesse de uma execução clara e eficaz, é desejável assegurar disposições uniformes sobre a responsabilização das empresas transportadoras e dos condutores por infrações ao presente regulamento. Essa responsabilização poderá resultar em sanções de caráter penal, civil ou administrativo, consoante o regime aplicável em cada Estado‑Membro.

    […]

    31)

    O Regulamento (CEE) n.o 3821/85 [do Conselho, de 20 de dezembro de 1985, relativo à introdução de um aparelho de controlo no domínio dos transportes rodoviários (JO 1985, L 370, p. 8; EE 07 F4 p. 28)] deverá ser alterado, a fim de esclarecer as obrigações específicas das empresas de transporte e dos condutores e de promover a segurança jurídica, bem como de facilitar a aplicação das normas relativas aos limites dos tempos de condução e períodos de repouso nos controlos de estrada.»

    4

    O artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 561/2006 prevê:

    «O tempo gasto pelo condutor para se deslocar para ou de um veículo abrangido pelo presente regulamento que não esteja junto à residência do condutor ou junto à empresa onde o condutor está normalmente baseado não será contado como repouso nem como pausa, a menos que o condutor se encontre num transbordador (ferry) ou comboio e tenha acesso a um beliche ou cama.»

    5

    O artigo 10.o, n.os 1, 2 e 3, do Regulamento n.o 561/2006 dispõe:

    «1.   É proibido remunerar os condutores assalariados, mesmo sob a forma de concessão de prémios ou de suplementos de salário, em função das distâncias percorridas e/ou do volume das mercadorias transportadas, se essa remuneração for de natureza tal que comprometa a segurança rodoviária e/ou favoreça a violação do presente regulamento.

    2.   As empresas de transportes devem organizar o trabalho dos condutores a que se refere o n.o 1 de modo a que estes possam cumprir o disposto no Regulamento [n.o 3821/85] e no capítulo II do presente regulamento. As empresas transportadoras devem dar instruções adequadas aos condutores e efetuar controlos regulares, para assegurar o cumprimento quer do Regulamento [n.o 3821/85], quer do capítulo II do presente regulamento.

    3.   As empresas de transportes são responsáveis por qualquer infração cometida pelos condutores da empresa, ainda que essa infração tenha sido cometida no território de outro Estado‑Membro ou de um país terceiro.

    Sem prejuízo do direito que lhes assiste de responsabilizarem plenamente as empresas de transportes, os Estados‑Membros podem tornar esta responsabilidade dependente da infração aos n.os 1 e 2 por parte da empresa de transportes. Os Estados‑Membros podem tomar em consideração quaisquer provas suscetíveis de demonstrar que não existem fundados motivos para imputar à empresa de transportes a responsabilidade pela infração cometida.»

    6

    De acordo com o artigo 19.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 561/2006:

    «1.   Os Estados‑Membros devem determinar o regime de sanções aplicável às violações do disposto no presente regulamento e no Regulamento [n.o 3821/85] e tomar todas as medidas necessárias para assegurar a sua aplicação. Essas sanções devem ser eficazes, proporcionadas, dissuasivas e não discriminatórias. Nenhuma infração ao presente regulamento e ao Regulamento [n.o 3821/85] será sujeita a mais de uma sanção ou processo. Os Estados‑Membros devem notificar à Comissão as referidas medidas e as regras sobre sanções até à data fixada no segundo parágrafo do artigo 29.o A Comissão informará os Estados‑Membros em conformidade.

    2.   Os Estados‑Membros devem dotar as autoridades competentes da capacidade de aplicar sanções às empresas e/ou aos condutores por infrações ao presente regulamento detetadas no seu território que ainda não tenham sido sujeitas a sanções, ainda que tais infrações tenham sido cometidas no território de outro Estado‑Membro ou de um país terceiro.

    A título de derrogação, sempre que seja detetada uma infração:

    que não tenha sido cometida no território do Estado‑Membro em questão, e

    que tenha sido cometida por uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro ou num país terceiro, ou por um condutor cujo local de afetação se situe noutro Estado‑Membro ou num país terceiro,

    em vez de impor uma sanção, os Estados‑Membros podem, até 1 de janeiro de 2009, notificar dos factos relativos à infração a autoridade competente do Estado‑Membro ou do país terceiro em que esteja sediada a empresa ou em que o condutor tenha o seu local de afetação.»

    7

    Nos termos do artigo 22.o, n.o 3, do Regulamento n.o 561/2006:

    «Os Estados‑Membros devem enviar regularmente informações relevantes sobre a interpretação e aplicação a nível nacional do presente regulamento à Comissão, que as disponibilizará aos outros Estados‑Membros, em formato eletrónico.»

    8

    O artigo 15.o, n.o 7, do Regulamento n.o 3821/85, conforme alterado pelo Regulamento n.o (CE) n.o 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006 (JO 2006, L 102, p. 1) (a seguir «Regulamento n.o 3821/85, conforme alterado»), dispõe:

    «a)

    Sempre que o condutor conduza um veículo equipado com um aparelho de controlo em conformidade com o [A]nexo I, deve poder apresentar, a pedido dos agentes encarregados do controlo:

    i)

    as folhas de registo da semana em curso e as utilizadas pelo condutor nos 15 dias anteriores;

    ii)

    o cartão de condutor, se o possuir; e

    iii)

    qualquer registo manual e impressão efetuados durante a semana em curso e nos 15 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento e no Regulamento [n.o 561/2006].

    No entanto, após 1 de janeiro de 2008, os períodos referidos nas subalíneas i) e iii) abrangerão o dia em curso e os 28 dias anteriores.

    b)

    Sempre que o condutor conduza um veículo equipado com um aparelho de controlo de acordo com o [A]nexo 1 B, deve poder apresentar, a pedido dos agentes encarregados do controlo:

    i)

    o cartão de condutor de que é titular,

    ii)

    qualquer registo manual e impressão efetuados durante a semana em curso e nos 15 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento e no Regulamento [n.o 561/2006], e

    iii)

    as folhas de registo correspondentes ao período referido na alínea anterior, no caso de ter conduzido um veículo equipado com um aparelho de controlo de acordo com o anexo I.

    No entanto, após 1 de janeiro de 2008, os períodos referidos na subalínea ii) devem abranger o dia em curso e os 28 dias anteriores;

    c)

    Os agentes autorizados para o efeito podem verificar o cumprimento do Regulamento [n.o 561/2006] através da análise das folhas de registo ou dos dados, visualizados ou impressos, registados pelo aparelho de controlo ou pelo cartão de condutor ou, na falta destes meios, através da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de qualquer disposição, como as previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 16.o»

    Direito húngaro

    9

    O artigo 20.o da közúti közlekedésről szóló 1988. évi I. törvény (Lei n.o I de 1988, relativa à circulação rodoviária, a seguir «lei da circulação rodoviária») refere:

    «(1)   Está sujeito a coima quem infringir as disposições da presente lei, normas jurídicas específicas e atos de direito comunitário relativos:

    […]

    d)

    à utilização do aparelho de controlo e do disco de tacógrafo no domínio dos transportes rodoviários, e dos cartões necessários aos tacógrafos digitais,

    […]

    (2)   A competência para conduzir o procedimento de aplicação de coimas pertence (em função da sua competência de fiscalização definida no n.o 11): à autoridade responsável pelos transportes, à polícia, à autoridade aduaneira, à autoridade de proteção contra catástrofes, à autoridade responsável pelo emprego e à autoridade de vigilância dos espaços públicos.

    (3)   As disposições previstas na norma jurídica específica que rege a atividade de fiscalização da autoridade responsável pelo procedimento são aplicáveis ao procedimento de aplicação de coimas previsto no n.o 2, salvo disposição em contrário no presente artigo.

    (4)   Com exceção do locatário ou condutor de um veículo particular alugado a um gestor de frota automóvel, na aceção da lei da taxa de registo, se a taxa de registo do veículo tiver sido paga e o condutor do veículo particular fizer prova disso mediante certificado da autoridade aduaneira — quem violar uma disposição do n.o 1, alíneas a) a j), e l), será sujeito a coima de 10000 a 800000 forints [húngaros (HUF)] e, no caso da alínea k), de 10000 a 300000 [HUF]. Uma norma jurídica específica fixará o montante máximo das coimas a aplicar nos casos de infração às diversas disposições e da coima a aplicar, no mesmo procedimento, por vários atos ou omissões ilícitos. Não será aplicada qualquer coima passados dois anos sobre a prática do ato ilícito (prescrição).

    (5)   O responsável da infração a uma das disposições acima referidas está obrigado ao pagamento da coima. Quando puder ser demonstrada a responsabilidade de várias pessoas, estas estão obrigadas ao pagamento do montante da coima fixado na norma jurídica específica na proporção da respetiva quota de responsabilidade na infração. Se não for possível determinar a sua quota de responsabilidade, a obrigação de pagamento da coima recai sobre elas em partes iguais. Não existe obrigação de pagamento da coima em caso de razão imperiosa alheia a quem efetua o transporte rodoviário e este não a tenha previsto nem pudesse razoavelmente prever.

    […]»

    10

    No artigo 48.o, n.o 3, alínea a), ponto 15, da lei da circulação rodoviária, o legislador habilitou o governo para fixar por decreto‑lei, nomeadamente, «o montante das coimas aplicáveis nos casos de infração às disposições relativas ao transporte rodoviário de mercadorias, ao transporte de mercadorias a granel e a certas regras da circulação rodoviária, e ainda às regras gerais das funções da administração no contexto da aplicação de coimas».

    11

    O artigo 5.o do közúti árufuvarozáshoz, személyszállításhoz és a közúti közlekedéshez kapcsolódó egyes rendelkezések megsértése esetén kiszabható bírságok összegéről, valamint a bírságolással összefüggő hatósági feladatokról szóló 156/2009. kormányrendelet (Decreto‑Lei n.o 156/2009, relativo ao montante das coimas a aplicar nos casos de violação de certas disposições relativas ao transporte rodoviário de mercadorias e de pessoas e à circulação rodoviária, e ainda às funções da autoridade pública ligadas à aplicação de coimas), de 29 de julho de 2009 (a seguir «Decreto‑Lei n.o 156/2009»), dispõe o seguinte:

    «Quanto ao artigo 20.o, n.o 1, alínea d), da lei [da circulação rodoviária], o montante da coima fixado nos termos do anexo 4 desse mesmo decreto deve — salvo disposição legislativa ou regulamentar em sentido contrário — ser pago pela pessoa que violou uma disposição relativa ao aparelho de controlo e ao disco de tacógrafo ou à respetiva utilização, prevista:

    […]

    e)

    no Regulamento [n.o 3821/85]

    […]»

    12

    Segundo o tribunal de reenvio, os n.os I2 e I3 do anexo 4 do Decreto‑Lei n.o 156/2009 têm a seguinte redação:

    «I2: Ato sujeito a coima: o condutor não apresenta as informações registadas no disco ou no cartão de condutor quanto ao dia em curso. Montante da coima 400000 [HUF]. Responsável pelo pagamento da coima: o condutor.

    I3: Ato sujeito a coima: o condutor não apresenta as informações registadas no disco quanto aos vinte e oito dias anteriores. Montante da coima 400000 [HUF]. Responsável pelo pagamento da coima: o condutor; o transportador.»

    13

    O artigo 340.o, n.o 1, da Polgári perrendtartásról szóló 1952. évi III. törvény (Lei n.o III de 1952, que aprova o Código de Processo Civil, a seguir «Código de Processo Civil» prevê:

    «Com exceção dos casos previstos no n.o 2, não cabe recurso da sentença.»

    14

    Segundo o artigo 340.o/A, n.o 2, desse código:

    «Não cabe recurso de cassação [...]

    […]

    b)

    nos processos de fixação de coimas [...], quando a obrigação de pagamento no procedimento administrativo ou na decisão de fixação da coima ou ainda o montante da reparação não seja superior a 1 milhão de [HUF].»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    15

    A Eurospeed é uma empresa de transportes registada na Bulgária. Emprega como condutores Ivaylo Todorov Dishev, Deyan Todorov Dishev e Stoyan Dimov, nacionais búlgaros.

    16

    Por ocasião de um trajeto efetuado entre a República Checa e a Bulgária, os veículos pesados, matriculados na República Checa e conduzidos pelas pessoas mencionadas no n.o 15 do presente acórdão, foram fiscalizados na fronteira da Hungria com a Roménia por agentes da Nemzeti Adó‑ és Vámhivatal Csongrád Megyei Vám‑ és Pénzügyőri Igazgatósága (Direção Departamental das Alfândegas e das Finanças de Csongrád, Hungria).

    17

    Nessa fiscalização, Ivaylo Todorov Dishev e Diyan Todorov Dishev não apresentaram o disco de tacógrafo nem o registo manual com a descrição das suas atividades ao longo dos vinte e oito dias anteriores.

    18

    Nestas condições, a Direção Departamental das Alfândegas e das Finanças de Csongrád considerou que esses dois condutores tinham infringido o artigo 15.o, n.o 7, do Regulamento n.o 3821/85, conforme alterado, e o artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 561/2006, tendo aplicado a cada um deles uma coima de 400000 HUF (cerca de 1280 euros).

    19

    Quanto a S. Dimov, que não tinha apresentado um documento válido capaz de demonstrar a natureza da atividade que exercia antes de 12 de abril de 2013, data em que tinha sido contratado pela Eurospeed como condutor, essa mesma direção entendeu que o interessado tinha infringido as disposições do artigo 15.o, n.o 7, do Regulamento n.o 3821/85, conforme alterado, e aplicou‑lhe uma coima de 400000 HUF (cerca de 1280 euros).

    20

    A Nemzeti Adó‑ és Vámhivatal Regionális Vám‑ és Pénzügyőri Főigazgatósága (Direção Principal Regional das Alfândegas e das Finanças, que pertence à Administração Nacional dos Impostos e Alfândegas, Hungria), por decisões de 30 de maio, 31 de maio e 3 de junho de 2013, confirmou as decisões da Direção Departamental das Alfândegas e das Finanças de Csongrád.

    21

    O recurso interposto dessas decisões pelos condutores em causa no principal não teve provimento no Szegedi Közigazgatási és munkaügyi bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szeged, Hungria). Em particular, esse tribunal rejeitou o argumento de que as coimas deveriam ter sido aplicadas à Eurospeed e não aos condutores.

    22

    De acordo com os artigos 340.° e 340.°/A do Código de Processo Civil, da sentença do Szegedi Közigazgatási és munkaügyi bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szeged) não cabia recurso de segunda instância nem de cassação.

    23

    A Eurospeed, que pagou as coimas aplicadas aos seus trabalhadores, interpôs recurso para o Gyulai törvényszék (Tribunal de Gyula, Hungria) e pede, como indemnização pelas consequências danosas da violação do direito da União pelo Szegedi Közigazgatási és munkaügyi bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szeged), o pagamento de uma quantia de 1248000 HUF (cerca de 3992 euros), correspondente ao montante das coimas e da taxa de justiça, acrescidos de juros de mora sobre essa quantia.

    24

    A esse respeito, a Eurospeed alega nomeadamente que o Szegedi Közigazgatási és munkaügyi bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szeged) violou o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 561/2006 ao negar provimento ao recurso dos seus trabalhadores, uma vez que as coimas não deviam ser aplicadas a estes mas sim a ela própria. Em apoio desta alegação, a Eurospeed invoca várias decisões nacionais das quais entende resultar que, nessa situação de facto, a coima não deve ser aplicada ao condutor mas sim à empresa de transporte sua empregadora. A coima só seria aplicada ao condutor no caso de a empresa de transporte estar isenta de responsabilidade.

    25

    O Szegedi törvényszék (Tribunal de Szeged), do qual o Szegedi Közigazgatási és munkaügyi bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szeged) constitui uma unidade organizacional, conclui pela negação de provimento ao recurso, entendendo que, à luz da jurisprudência da Kúria (Supremo Tribunal, Hungria), uma coima pode ser legalmente aplicada ao condutor do veículo. De qualquer forma, considera que não houve violação suficientemente flagrante e manifesta de uma norma jurídica.

    26

    O tribunal de reenvio refere nomeadamente que, no caso de o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 561/2006 vir a ser interpretado no sentido de que se opõe a que as sanções previstas pelos Estados‑Membros por infrações às obrigações resultantes desse regulamento possam ser aplicadas, exclusivamente ou não, ao condutor de um veículo, a regulamentação nacional em causa no processo principal pode ser considerada incompatível com o direito da União. Assim, pode eventualmente existir responsabilidade do Estado por violação desse direito.

    27

    Nestas condições, o Gyulai törvényszék (Tribunal de Gyula) suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    O facto de recair sobre um Estado‑Membro a obrigação de reparação decorrente de uma violação do direito da União impede, quando da apreciação de uma ação de indemnização intentada com esse fundamento, que as regras relativas a essa responsabilidade sejam aplicadas ao órgão do Estado‑Membro que efetivamente cometeu a violação em questão?

    2)

    Em caso de resposta negativa à primeira questão, o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento [n.o 561/2006] impede a adoção por um Estado‑Membro de disposições de direito nacional que, em caso de infração às obrigações previstas pelo referido regulamento, estabelecem uma sanção aplicável à empresa de transportes ou, em sua substituição, igualmente ao condutor do veículo que efetivamente cometeu a infração em questão?

    3)

    Em caso de resposta afirmativa à segunda questão, pode considerar‑se que viola manifestamente o direito da União uma decisão de um órgão jurisdicional nacional proferida em contencioso administrativo que, em vez de assentar no artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 561/2006, assenta em disposições de direito interno contrárias a esta disposição?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à segunda questão

    28

    Com a sua segunda questão, que convém analisar em primeiro lugar, o tribunal de reenvio pergunta, em substância, se o Regulamento n.o 561/2006, nomeadamente o seu artigo 10.o, n.o 3, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que, em vez ou além da empresa de transporte que emprega o condutor, responsabiliza esse condutor pelas infrações que ele próprio cometeu a esse regulamento.

    29

    Resulta da decisão de reenvio que a Eurospeed e o tribunal de reenvio interpretam o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 561/2006 no sentido de que se opõe à aplicação de sanções a um condutor que cometeu infrações a esse regulamento.

    30

    Ora, esta interpretação não pode ser acolhida.

    31

    Em primeiro lugar, há que lembrar que o artigo 19.o, n.o 2, desse regulamento dispõe que qualquer Estado‑Membro deve permitir que as autoridades competentes apliquem sanções a empresas e/ou a condutores por infrações a esse mesmo regulamento detetadas no seu território e que ainda não tenham sido sujeitas a sanções.

    32

    Assim, resulta claramente da redação dessa disposição que o Regulamento n.o 561/2006 sujeita tanto as empresas de transporte como os condutores a obrigações determinadas e responsabiliza as primeiras e os segundos pelas infrações às respetivas obrigações.

    33

    A este respeito, não se pode considerar, como sugere o tribunal de reenvio, que o artigo 19.o, n.o 2, do Regulamento n.o 561/2006 visa unicamente o caso de a infração ser praticada no território de outro Estado‑Membro. Com efeito, uma vez que o artigo 19.o, n.o 2, primeiro período, desse regulamento prevê expressamente que existe a possibilidade de as autoridades competentes de um Estado‑Membro aplicarem uma sanção a uma empresa e/ou a um condutor por uma infração a esse mesmo regulamento, «ainda que ta[l] infra[ção] tenha[...] sido cometida[...] no território de outro Estado‑Membro ou de um país terceiro», isso implica, a contrario, que um Estado‑Membro, de qualquer forma, pode aplicar uma sanção a uma empresa, a um condutor ou a ambos por uma infração cometida no seu território. Contrariamente à interpretação dada pelo tribunal de reenvio, não se pode interpretar o facto de essa disposição estender a possibilidade de aplicar sanções às infrações ao Regulamento n.o 561/2006 cometidas fora do território do Estado‑Membro em causa no sentido de que restringe o âmbito das infrações passíveis de sanção às cometidas no território de outro Estado.

    34

    Esta interpretação é confirmada nomeadamente pelo considerando 27 do Regulamento n.o 561/2006, segundo o qual, no interesse de uma execução clara e eficaz, é desejável assegurar disposições uniformes sobre a responsabilização das empresas transportadoras e dos condutores por infrações a esse regulamento, podendo essa responsabilização resultar em sanções de caráter penal, civil ou administrativo, consoante o regime aplicável em cada Estado‑Membro. Resulta inequivocamente da redação desse considerando que os Estados‑Membros podem prever um regime de responsabilidade dos condutores pelas infrações a esse regulamento e que dispõem, no que respeita à natureza das sanções aplicáveis, de uma margem de apreciação.

    35

    Do mesmo modo, segundo o considerando 31 do Regulamento n.o 561/2006, o Regulamento n.o 3821/85 deverá ser alterado, a fim de esclarecer as obrigações específicas das empresas de transporte e dos condutores e de promover a segurança jurídica, bem como de facilitar a aplicação das normas relativas aos limites dos tempos de condução e períodos de repouso nos controlos de estrada. Resulta da redação desse considerando que o Regulamento n.o 561/2006, que também altera o Regulamento n.o 3821/85, visa, em particular, os condutores no que respeita às obrigações que devem respeitar por força deste último regulamento. Na medida em que, por um lado, os Estados‑Membros são obrigados, nos termos do artigo 19.o, n.o 1, do Regulamento n.o 561/2006, a aprovar regras quanto às sanções por infrações a esse regulamento, de forma a que essas sanções sejam eficazes, proporcionadas, dissuasivas e não discriminatórias, e, por outro lado, esse regulamento não exclui a responsabilidade dos condutores, daí resulta que esses Estados podem aprovar disposições que permitam aplicar sanções aos condutores, exclusivamente ou não.

    36

    Por outro lado, refira‑se que o artigo 15.o do Regulamento n.o 3821/85, conforme alterado, estabelece obrigações a que estão sujeitos os condutores e que estes devem respeitar sob pena de serem responsabilizados.

    37

    Em segundo lugar, quanto ao artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 561/2006, invocado pelo tribunal de reenvio, há que observar que essa disposição, que aprova regras específicas em matéria de responsabilidade das empresas de transporte, não pode ser interpretada isoladamente, mas sim em conjugação com as disposições do artigo 10.o, n.os 1 e 2, desse regulamento, que impõem a essas empresas obrigações sobre a remuneração dos condutores e a organização do seu trabalho. Além disso, embora, de acordo com o artigo 10.o, n.o 3, segundo parágrafo, primeiro período, do Regulamento n.o 561/2006, os Estados‑Membros tenham o direito de responsabilizar plenamente as empresas de transporte pelas infrações cometidas pelos seus condutores, não resulta dessa ou de qualquer outra disposição desse regulamento que os Estados‑Membros sejam obrigados a imputar a plena responsabilidade dessas infrações a essas empresas. Assim, não se pode inferir do seu artigo 10.o, n.o 3, que esse regulamento se opõe a que um Estado‑Membro permita que as autoridades competentes apliquem sanções aos condutores que cometam infrações a esse mesmo regulamento.

    38

    Em terceiro lugar, no que respeita ao considerando 17 do Regulamento n.o 561/2006, basta observar, por um lado, que, embora seja verdade que esse regulamento visa, nomeadamente, melhorar as condições de trabalho do pessoal do setor rodoviário (v., neste sentido, acórdãos de 3 de outubro de 2013, Lundberg, C‑317/12, EU:C:2013:631, n.o 31, e de 13 de março de 2014, A. Karuse, C‑222/12, EU:C:2014:142, n.o 29), nada dá a entender que o legislador da União tenha querido isentar os condutores de qualquer responsabilidade pelas infrações que cometem, em particular quando estas estejam exclusivamente ligadas ao exercício das suas funções.

    39

    Por outro lado, refira‑se que o Regulamento n.o 561/2006 prossegue igualmente o objetivo de melhorar a segurança rodoviária em geral. Os dois objetivos desse regulamento, a saber, melhorar as condições de trabalho e melhorar a segurança rodoviária, traduzem‑se ambos, portanto, na obrigação de equipar, em princípio, os veículos afetos ao transporte rodoviário de um aparelho de controlo homologado que permita fiscalizar os tempos de condução e de descanso dos condutores. Ora, uma interpretação desse regulamento no sentido de que se opõe à possibilidade de aplicar sanções aos condutores por violarem as suas obrigações resultantes desse regulamento obstaria, nomeadamente, à realização do objetivo de melhorar a segurança rodoviária em geral.

    40

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça já implicitamente admitiu, nos acórdãos de 9 de fevereiro de 2012, Urbán (C‑210/10, EU:C:2012:64), de 3 de outubro de 2013, Lundberg (C‑317/12, EU:C:2013:631), e de 13 de março de 2014, A. Karuse (C‑222/12, EU:C:2014:142), a possibilidade de os Estados‑Membros aplicarem essa sanção aos condutores.

    41

    Resulta de todas estas considerações que há que responder à segunda questão que o Regulamento n.o 561/2006 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional que, em vez ou além da empresa de transporte que emprega o condutor, responsabiliza esse condutor pelas infrações que ele próprio cometeu a esse regulamento.

    Quanto à primeira e terceira questões

    42

    Tendo em conta a resposta dada à segunda questão, não há que responder à primeira e terceira questões.

    Quanto às despesas

    43

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:

     

    O Regulamento (CE) n.o 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, relativo à harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários, que altera os Regulamentos (CEE) n.o 3821/85 e [CE] n.o 2135/98 do Conselho e revoga o Regulamento (CEE) n.o 3820/85 do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional que, em vez ou além da empresa de transporte que emprega o condutor, responsabiliza esse condutor pelas infrações que ele próprio cometeu a esse regulamento.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: húngaro.

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