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Document 62022CJ0457

Acórdão do Tribunal de Justiça (Nona Secção) de 14 de março de 2024.
Comissão Europeia contra República da Eslovénia.
Incumprimento de Estado — Artigo 258.° TFUE — Diretiva (UE) 2018/1972 — Código Europeu das Comunicações Eletrónicas — Falta de transposição e de comunicação das medidas de transposição — Artigo 260.°, n.° 3, TFUE — Pedido de condenação no pagamento de uma quantia fixa e de uma sanção pecuniária compulsória — Critérios para determinar o montante da sanção — Desistência parcial.
Processo C-457/22.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:237

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção)

14 de março de 2024 ( *1 )

«Incumprimento de Estado — Artigo 258.o TFUE — Diretiva (UE) 2018/1972 — Código Europeu das Comunicações Eletrónicas — Falta de transposição e de comunicação das medidas de transposição — Artigo 260.o, n.o 3, TFUE — Pedido de condenação no pagamento de uma quantia fixa e de uma sanção pecuniária compulsória — Critérios para determinar o montante da sanção — Desistência parcial»

No processo C‑457/22,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos dos artigos 258.° e do 260.°, n.o 3, TFUE, que deu entrada em 8 de julho de 2022,

Comissão Europeia, representada por M. Kocjan, U. Małecka, L. Malferrari e E. Manhaeve, na qualidade de agentes,

demandante,

contra

República da Eslovénia, representada por T. Mihelič Žitko, na qualidade de agente,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot, exercendo funções de presidente de secção, S. Rodin e L. S. Rossi (relatora), juízes,

advogada‑geral: T. Ćapeta,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com a sua petição, a Comissão Europeia pede que o Tribunal de Justiça se digne:

declarar que, ao não ter adotado as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à Diretiva (UE) 2018/1972 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, que estabelece o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (JO 2018, L 321, p. 36), ou, em qualquer caso, ao não ter informado a Comissão dessas disposições, a República da Eslovénia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 124.o, n.o 1, desta diretiva;

condenar a República da Eslovénia, ao abrigo do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, a pagar uma sanção pecuniária compulsória de 6256,17 euros por dia a partir da data de prolação do acórdão no presente processo, uma vez que este Estado‑Membro não cumpriu a sua obrigação de comunicar as medidas de transposição da referida diretiva;

condenar a República da Eslovénia, ao abrigo do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, no pagamento de uma quantia fixa de 1390,77 euros por dia, multiplicada pelo número de dias em que persiste o incumprimento descrito no primeiro travessão, no montante mínimo de 383000 euros, e

condenar a República da Eslovénia nas despesas.

Quadro jurídico

2

Os considerandos 2 e 3 da Diretiva 2018/1972 enunciam:

«(2)

A aplicação das cinco diretivas que formam parte do atual quadro regulamentar das redes e serviços de comunicações eletrónicos [...] está sujeit[a] a revisão periódica pela Comissão, com vista, em especial, a determinar a eventual necessidade de alteração à luz da evolução tecnológica e do mercado.

(3)

Na sua comunicação de 6 de maio de 2015 que estabelece uma Estratégia para o Mercado Único Digital para a Europa, a Comissão sustentou que a revisão do quadro regulamentar das telecomunicações incidiria sobre as medidas que visam promover o investimento nas redes de banda larga de elevado débito, que adotam uma abordagem mais coerente à escala do mercado interno no respeitante à política e à gestão do espetro de radiofrequências, que criam condições para a realização de um verdadeiro mercado interno, abordando a questão da fragmentação regulamentar, que garantem uma defesa dos consumidores eficaz, condições de concorrência equitativas para todos os intervenientes no mercado e a aplicação coerente das regras, além de estabelecer um quadro regulamentar institucional mais eficaz.»

3

O artigo 1.o desta diretiva, com a epígrafe «Objeto, âmbito de aplicação e finalidade», prevê:

«1.   A presente diretiva estabelece um quadro harmonizado para a regulação das redes de comunicações eletrónicas, dos serviços de comunicações eletrónicas, dos recursos conexos e dos serviços conexos e de certos aspetos dos equipamentos terminais. A presente diretiva prevê as atribuições das autoridades reguladoras nacionais e, se for caso disso, de outras autoridades competentes e fixa um conjunto de procedimentos para assegurar a aplicação harmonizada do quadro regulamentar em toda a União [Europeia].

2.   A presente diretiva destina‑se a:

a)

Instaurar um mercado interno dos serviços e redes de comunicações eletrónicas que conduza a uma implantação e aceitação das redes de capacidade muito elevada, a uma concorrência sustentável e à interoperabilidade dos serviços de comunicações eletrónicas, bem como à acessibilidade e segurança das redes e serviços, de que resultem benefícios para os utilizadores finais; e

b)

Assegurar a oferta em toda a União de serviços de boa qualidade acessíveis ao público, através de uma concorrência e de uma possibilidade de escolha efetivas, e atender às situações em que as necessidades dos utilizadores finais, incluindo aqueles cuja deficiência os impede de aceder aos serviços em pé de igualdade com os demais, não sejam convenientemente satisfeitas pelo mercado, bem como estabelecer os direitos necessários dos utilizadores finais.

[...]»

4

O artigo 124.o da referida diretiva, com a epígrafe «Transposição», dispõe, no seu n.o 1:

«Os Estados‑Membros adotam e publicam, até 21 de dezembro de 2020, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva. Os Estados‑Membros comunicam imediatamente à Comissão o texto dessas disposições.

Os Estados‑Membros aplicam essas disposições a partir de 21 de dezembro de 2020.

As disposições adotadas pelos Estados‑Membros devem fazer referência à presente diretiva ou ser acompanhadas dessa referência aquando da sua publicação oficial. Tais disposições devem igualmente mencionar que as remissões, nas disposições legislativas, regulamentares e administrativas em vigor, para as diretivas revogadas pela presente diretiva se entendem como remissões para [a] presente diretiva. Os Estados‑Membros estabelecem o modo como deve ser feita a remissão e formulada a menção.»

Procedimento pré‑contencioso e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

5

Uma vez que a República da Eslovénia não forneceu informações relativas à adoção das disposições necessárias para transpor a Diretiva 2018/1972 para o direito esloveno, em conformidade com o artigo 124.o da mesma, a Comissão enviou a este Estado‑Membro, em 4 de fevereiro de 2021, uma Notificação para Cumprir.

6

Após terem solicitado e obtido uma prorrogação do prazo de resposta a esta notificação para cumprir, as autoridades eslovenas responderam, em 4 de junho de 2021, referindo, nomeadamente, que a Diretiva 2018/1972 teria de ser transposta por uma lei que seria publicada e comunicada à Comissão, o mais tardar, em dezembro de 2021 (a seguir «lei de transposição»).

7

Em 23 de setembro de 2021, a Comissão enviou um parecer fundamentado à República da Eslovénia. Em 5 de novembro de 2021, as autoridades eslovenas solicitaram uma prorrogação do prazo de resposta a este parecer fundamentado e informaram a Comissão de que a adoção da referida lei tinha sofrido um atraso devido a um incidente ocorrido durante o processo legislativo interno, pelo que a mesma seria publicada e comunicada em março de 2022.

8

A Comissão atendeu a este pedido e prorrogou o prazo até 23 de fevereiro de 2022.

9

Na sua carta de resposta ao parecer fundamentado, de 18 de fevereiro de 2022, as autoridades eslovenas alegaram que a transposição da Diretiva 2018/1972 estava novamente atrasada devido a circunstâncias imprevistas. Referiram, nomeadamente, que o projeto de lei de transposição seria adotado em abril de 2022, e que a lei seria posteriormente publicada e comunicada à Comissão. Por outro lado, em 18 de março de 2022, as autoridades transmitiram uma tabela de correspondência entre as disposições deste projeto de lei e certas disposições da diretiva em causa. Em 25 de março de 2022, a Comissão apresentou observações a respeito do referido projeto de lei.

10

Uma vez que a República da Eslovénia não tinha adotado as disposições necessárias para dar cumprimento à referida diretiva, a Comissão decidiu, em 6 de abril de 2022, propor a presente ação no Tribunal de Justiça.

11

Em 12 de abril de 2022, as autoridades eslovenas informaram a Comissão de que a votação do projeto de lei de transposição tinha sido suspensa devido a um pedido de um grupo de deputados para realizar um referendo consultivo sobre este projeto.

12

Em 14 de junho de 2022, as autoridades eslovenas informaram a Comissão dos desenvolvimentos na transposição da Diretiva 2018/1972. Referiram, nomeadamente, que, na sequência da mudança de legislatura, todos os processos legislativos iniciados na legislatura anterior, incluindo o processo relativo ao projeto de lei de transposição, tinham sido encerrados, que tinha sido apresentado um novo projeto de lei de transposição e que o mesmo não tinha sido, nem seria, objeto de um referendo. Estas autoridades não comunicaram nenhum calendário para a adoção deste novo projeto de lei.

13

Em 8 de julho de 2022, a Comissão propôs a presente ação.

14

A República da Eslovénia pede que o Tribunal de Justiça se digne, a título principal, reduzir o montante das sanções pecuniárias cuja aplicação é pedida pela Comissão e, a título subsidiário, negar provimento à totalidade dos pedidos desta última.

15

Com a sua tréplica de 19 de dezembro de 2022, a República da Eslovénia informou o Tribunal de Justiça de que, em 28 de setembro de 2022, a lei de transposição tinha sido adotada, que tinha informado a Comissão deste facto no mesmo dia e que a lei tinha entrado em vigor em 10 de novembro de 2022.

16

Em 19 de dezembro de 2022, a fase escrita do presente processo foi encerrada.

17

Por requerimento de 20 de junho de 2023, a Comissão informou o Tribunal de Justiça de que a transposição da Diretiva 2018/1972 pela República da Eslovénia podia ser considerada concluída em 10 de novembro de 2022 e desistiu parcialmente da sua ação, desistindo do seu pedido de fixação de uma sanção pecuniária compulsória, adaptando simultaneamente o seu pedido de condenação deste Estado‑Membro no pagamento de uma quantia fixa no montante de 958240,53 euros.

18

Em 31 de julho de 2023, a República da Eslovénia apresentou as suas observações a respeito da desistência parcial da Comissão e da adaptação dos pedidos desta última.

Quanto à ação

Quanto ao incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE

Argumentos das partes

19

A Comissão recorda que, em conformidade com o artigo 288.o, terceiro parágrafo, TFUE, os Estados‑Membros são obrigados a adotar as disposições necessárias para assegurar a transposição das diretivas para os respetivos ordenamentos jurídicos nacionais, dentro dos prazos nelas fixados, e a comunicar de imediato essas disposições à Comissão.

20

A Comissão esclarece que a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado.

21

Ora, no caso em apreço, no termo daquele prazo, ou mesmo na data da propositura da presente ação, a República da Eslovénia ainda não tinha adotado as disposições necessárias para transpor a Diretiva 2018/1972 para o seu direito nacional e, em todo o caso, não as tinha comunicado à Comissão.

22

No entender da Comissão, a República da Eslovénia não contesta verdadeiramente o incumprimento de que é acusada, limitando‑se a apresentar circunstâncias de ordem prática e interna para o justificar. Contudo, estas circunstâncias não são suscetíveis de justificar a não transposição de uma diretiva no prazo nela previsto.

23

De facto, a República da Eslovénia não contesta verdadeiramente o incumprimento e limita‑se a descrever o desenrolar dos trabalhos que culminaram na adoção da lei de transposição, que entrou em vigor em 10 de novembro de 2022. Sublinha, no entanto, que, durante todo o processo, cooperou sempre de forma leal com a Comissão e manteve esta última informada dos desenvolvimentos deste processo, cujo atraso se deveu a circunstâncias imprevistas que este Estado‑Membro explicou à Comissão na sua resposta ao parecer fundamentado.

Apreciação do Tribunal de Justiça

24

Segundo jurisprudência constante, a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro em causa tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, não podendo as alterações posteriores ser tomadas em consideração pelo Tribunal de Justiça [Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 15 e jurisprudência referida].

25

Por outro lado, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente declarado que, se uma diretiva previr expressamente a obrigação de os Estados‑Membros assegurarem que as disposições necessárias à sua transposição incluam uma remissão para essa diretiva ou sejam acompanhadas dessa remissão aquando da sua publicação oficial é, de qualquer modo, necessário que os Estados‑Membros adotem um ato positivo de transposição da diretiva em causa [Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 16 e jurisprudência referida].

26

No caso em apreço, o prazo de resposta ao parecer fundamentado, conforme prorrogado pela Comissão, terminou em 23 de fevereiro de 2022. Por conseguinte, há que apreciar a existência ou não do incumprimento alegado à luz do estado da legislação interna em vigor nessa data [v., neste sentido, Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 17 e jurisprudência referida].

27

A este respeito, é facto assente que, na referida data, a República da Eslovénia não tinha adotado as medidas necessárias para assegurar a transposição da Diretiva 2018/1972 nem, por conseguinte, comunicado estas medidas à Comissão.

28

Para justificar o seu incumprimento, a República da Eslovénia, por um lado, invoca um incidente ocorrido durante o processo legislativo, uma mudança de legislatura e um pedido de organização de um referendo consultivo e, por outro, sublinha o espírito de colaboração e de cooperação leal de que sempre deu provas em relação à Comissão.

29

Ora, estes argumentos não permitem justificar o incumprimento imputado pela Comissão.

30

Com efeito, por um lado, as circunstâncias de natureza constitucional interna invocadas pela República da Eslovénia não podem ser relevantes, uma vez que, segundo jurisprudência constante, práticas ou situações da ordem interna de um Estado‑Membro não podem justificar a inobservância das obrigações e dos prazos resultantes das diretivas da União nem, portanto, a sua transposição tardia ou incompleta [Acórdão de 13 de janeiro de 2021, Comissão/Eslovénia (MiFID II),C‑628/18, EU:C:2021:1, n.o 79 e jurisprudência referida].

31

Por outro lado, o facto de a República da Eslovénia ter cooperado com a Comissão também não é relevante para apreciar a existência do referido incumprimento imputado a este Estado‑Membro, uma vez que os Estados‑Membros e as instituições da União têm, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, o dever de cooperar entre si, e que este dever inclui também a transposição correta e completa das diretivas, nos prazos nelas previstos.

32

Por conseguinte, há que concluir que, ao não ter adotado, no termo do prazo estabelecido no parecer fundamentado, conforme prorrogado pela Comissão, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à Diretiva 2018/1972 e, consequentemente, ao não ter comunicado estas disposições à Comissão, a República da Eslovénia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 124.o, n.o 1, desta diretiva.

Quanto aos pedidos apresentados ao abrigo do artigo 260.o, n.o 3, TFUE

Quanto ao pedido de condenação no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória

33

Conforme salientado no n.o 17 do presente acórdão, a Comissão reconheceu, no seu requerimento de 20 de junho de 2023, que se podia considerar que a transposição da Diretiva 2018/1972 pela República da Eslovénia ficou concluída em 10 de novembro de 2022 e, por conseguinte, retirou o seu pedido de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória.

34

Atento o exposto, já não há que decidir quanto a este pedido.

Quanto ao pedido de condenação no pagamento de uma quantia fixa

– Argumentos das partes

35

A Comissão alega, por um lado, que a Diretiva 2018/1972 foi adotada de acordo com o processo legislativo ordinário e que, por conseguinte, está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE e, por outro, que o incumprimento pela República da Eslovénia das obrigações previstas no artigo 124.o, n.o 1, desta diretiva constitui manifestamente uma falta de comunicação das medidas de transposição da referida diretiva, na aceção do artigo 260.o, n.o 3, TFUE.

36

A Comissão recorda que, no ponto 23 da sua Comunicação 2011/C 12/01, intitulada «Aplicação do artigo 260.o, n.o 3, [TFUE]» (JO 2011, C 12, p. 1) (a seguir «Comunicação de 2011»), esclareceu que as sanções que proporá nos termos do artigo 260.o, n.o 3, TFUE serão calculadas de acordo com o mesmo método utilizado para as ações intentadas no Tribunal de Justiça em conformidade com o artigo 260.o, n.o 2, TFUE, conforme estabelecido nos pontos 14 a 18 da sua Comunicação SEC(2005) 1658, intitulada «Aplicação do artigo [260.° TFUE] (a seguir «Comunicação de 2005»).

37

Por conseguinte, a determinação da sanção deve basear‑se, em primeiro lugar, na gravidade da infração, em segundo lugar, na sua duração e, em terceiro lugar, na necessidade de assegurar o efeito dissuasivo da própria sanção, para evitar reincidências.

38

Em primeiro lugar, quanto à gravidade da infração, em conformidade com o ponto 16 da Comunicação de 2005 e a Comunicação de 2011, a Comissão fixa o coeficiente de gravidade tendo em conta dois parâmetros, a saber, por um lado, a importância das regras da União objeto da infração e, por outro, as suas consequências para os interesses gerais e individuais em causa.

39

Assim, por um lado, a Comissão salienta que a Diretiva 2018/1972 é o principal ato legislativo no domínio das comunicações eletrónicas. Antes de mais, o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (a seguir «CECE») moderniza o quadro regulamentar da União para as comunicações eletrónicas, reforçando as escolhas e os direitos dos consumidores, garantindo padrões mais elevados de serviços de comunicação, promovendo o investimento em redes de capacidade muito elevada e o acesso sem fios à conectividade de capacidade muito elevada em toda a União. Em seguida, o CECE estabelece regras para a organização do setor das comunicações eletrónicas, incluindo a sua estrutura institucional e governação. As suas disposições reforçam o papel das autoridades reguladoras nacionais, estabelecendo um conjunto mínimo de competências para tais autoridades, e reforçando a sua independência através do estabelecimento de critérios para nomeações e obrigações de comunicação de informações. Além disso, o CECE assegura ainda uma gestão eficaz e eficiente do espetro radioelétrico (a seguir «espetro»). Tais disposições reforçam a coerência das práticas dos Estados‑Membros no que diz respeito a aspetos essenciais da autorização de espetro. As referidas disposições promovem a concorrência entre infraestruturas e a implantação de redes de capacidade muito elevada em toda a União. Por último, o CECE regulamenta diferentes aspetos da oferta de serviços de comunicações eletrónicas, incluindo as obrigações de serviço universal, os recursos de numeração e os direitos dos utilizadores finais. O reforço destas regras visa aumentar a segurança e a proteção dos consumidores, em especial no que diz respeito ao acesso a estes serviços a preços acessíveis.

40

Por outro lado, a não transposição da Diretiva 2018/1972 para o direito esloveno, primeiro, prejudica a prática regulamentar em toda a União no que diz respeito à governação do sistema de comunicações eletrónicas, à autorização do espetro e às regras de acesso ao mercado. Como consequência, as empresas não beneficiam de processos mais consistentes e previsíveis para a concessão ou renovação dos direitos de utilização do espetro existentes, nem da previsibilidade regulamentar que resulta da duração mínima de 20 anos das licenças de utilização do espetro. Estas deficiências influenciam diretamente a disponibilidade e a adoção de redes de capacidade muito elevada na União. Segundo, os consumidores não podem usufruir de uma série de benefícios tangíveis que lhes são conferidos por esta diretiva, como soluções relativas ao acesso à oferta de serviços de comunicações a preços acessíveis, a exigência de lhes fornecer informações claras sobre os contratos, a obrigação de clareza das tarifas, a facilitação da mudança de fornecedor de redes para promover preços de retalho mais acessíveis e a obrigação de os operadores oferecerem um acesso equivalente aos serviços de comunicação para os utilizadores finais com deficiência.

41

Uma vez que a República da Eslovénia comunicou à Comissão as medidas de transposição de um número muito reduzido de artigos da Diretiva 2018/1972, a Comissão propõe um coeficiente de gravidade de 9.

42

Em segundo lugar, no que respeita à duração do incumprimento, a Comissão sustenta que esta corresponde ao período que começa no dia seguinte ao termo do prazo de transposição da Diretiva 2018/1972, isto é, em 22 de dezembro de 2020, e vai até à data em que o incumprimento declarado no n.o 32 do presente acórdão em causa cessou, isto é, o dia anterior ao dia em que a República da Eslovénia cumpriu as suas obrigações, em 10 de novembro de 2022, ou seja, a data em que a lei de transposição entrou em vigor, conforme referido no n.o 15 do presente acórdão. Resulta do exposto que o incumprimento durou 688 dias.

43

Em terceiro lugar, quanto à capacidade de pagamento da República da Eslovénia, a Comissão aplicou o fator «n» previsto na sua Comunicação 2019/C 70/01, intitulada «Alteração do método de cálculo relativo aos pagamen[t]os de uma quantia fixa e de uma sanção pecuniária propostos pela Comissão em processos por infração submetidos ao Tribunal de Justiça da União Europeia» (JO 2019, C 70, p. 1). Este fator tem em conta dois elementos, a saber, o produto interno bruto (PIB) e o peso institucional do Estado‑Membro em causa, expresso pelo número de lugares atribuídos a este Estado‑Membro no Parlamento Europeu.

44

Ainda que o Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado — Ferroníquel) (C‑51/20, EU:C:2022:36), já tenha posto em causa a relevância tanto deste segundo elemento como do coeficiente de ajustamento de 4,5 previstos naquela comunicação, a Comissão decidiu, contudo, aplicar no caso em apreço os critérios nela previstos, enquanto se aguarda a adoção de uma nova comunicação que tenha em conta esta jurisprudência recente do Tribunal de Justiça.

45

Assim, em conformidade com a Comunicação 2022/C 74/02 da Comissão, intitulada «Atualização dos dados utilizados no cálculo das quantias fixas e das sanções pecuniárias compulsórias que a Comissão proporá ao Tribunal de Justiça da União Europeia no âmbito dos processos por infração» (JO 2022, C 74, p. 2) (a seguir «Comunicação de 2022»), o fator «n» para a República da Eslovénia é de 0,17.

46

No que respeita à fixação do montante da quantia fixa, resulta do ponto 20 da Comunicação de 2005 que esta deve ter pelo menos um montante fixo mínimo, refletindo o princípio de que qualquer caso de incumprimento persistente do direito da União representa em si mesmo, independentemente de qualquer circunstância agravante, uma violação do princípio da legalidade numa comunidade de direito, que exige uma sanção efetiva. Em conformidade com a Comunicação de 2022, a quantia fixa mínima para a República da Eslovénia é de 383000 euros.

47

Em aplicação do método estabelecido nas Comunicações de 2005 e de 2011, se o resultado do cálculo da quantia fixa excedesse esta quantia fixa mínima, a Comissão propunha ao Tribunal de Justiça que determinasse a quantia fixa através da multiplicação de um montante diário pelo número de dias correspondente à duração da infração, neste caso 688 dias.

48

Assim, o montante diário da quantia fixa deve ser calculado multiplicando a quantia fixa de base uniforme para efeitos do cálculo do montante diário da quantia fixa pelo coeficiente de gravidade e pelo fator «n». Ora, esta quantia fixa de base uniforme é, de acordo com a Comunicação de 2022, de 909 euros. No caso em apreço, o coeficiente de gravidade é de 9. O fator «n» é de 0,17. Resulta do exposto que o montante da quantia fixa é de 1390,77 euros por dia.

49

Por conseguinte, o montante da quantia fixa é de 958240,53 euros.

50

A República da Eslovénia considera que este montante é excessivo.

51

Antes de mais, no que respeita ao coeficiente de gravidade, o efeito da não transposição da Diretiva 2018/1972 para o direito esloveno nos interesses gerais e individuais não é tão relevante como a Comissão sustenta.

52

Com efeito, a República da Eslovénia afirma ter enviado à Comissão, em 18 de março de 2022, um quadro de correspondências no qual enumerou as disposições do direito esloveno pelas quais a diretiva foi transposta parcialmente. Ora, tendo em conta a aplicação destas disposições, as consequências da não transposição da referida diretiva não são tão graves como a Comissão alega.

53

Por outro lado, os esforços contínuos da República da Eslovénia para atingir os objetivos da Diretiva 2018/1972 com a maior brevidade possível refletem‑se igualmente nos progressos constantes deste Estado‑Membro no que respeita à sua classificação no índice de referência DESI (Digital Economy and Society Index) (Índice de Digitalidade da Economia e da Sociedade) elaborado pela Comissão, que acompanha o estado geral da digitalização na União e os progressos em matéria de competitividade digital de cada Estado‑Membro.

54

Em seguida, no que respeita ao coeficiente de duração da infração, a República da Eslovénia alega que, contrariamente ao método utilizado pela Comissão, o período a ter em conta para determinar esta duração não é o que começa no dia seguinte ao do termo do prazo de transposição fixado na diretiva em causa, mas, à luz da jurisprudência, o prazo que começa a correr na data do termo do prazo fixado no parecer fundamentado.

55

Por último, quanto ao fator «n», a República da Eslovénia baseia‑se, nomeadamente, nos n.os 111 a 117 do Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado — Ferroníquel) (C‑51/20, EU:C:2022:36), para sustentar que a Comissão considerou, erradamente, o peso institucional deste Estado‑Membro na União e aplicou o coeficiente de ajustamento de 4,5 previsto na Comunicação 2019/C 70/01, mencionada no n.o 43 do presente acórdão.

56

A Comissão contrapõe, afirmando, por um lado, que, no que respeita à gravidade da infração em causa, propôs a adoção de um coeficiente de 9, tendo em conta a transposição parcial notificada pela República da Eslovénia. A transposição de seis artigos da Diretiva 2018/1972, que contém 127 artigos, não justifica, de facto, a adoção de um coeficiente de gravidade inferior, tanto mais que não se pode considerar que todos os artigos mencionados pela República da Eslovénia na sua contestação assegurem uma transposição completa. Por outro lado, a progressão da República da Eslovénia na classificação do índice de referência DESI não é relevante para determinar a gravidade da infração.

57

Por outro lado, no que respeita à duração da infração, a Comissão recorda que, em conformidade com o ponto 17 da Comunicação de 2005 e com os pontos 27 e 31 da Comunicação de 2011, o período a considerar para determinar essa duração e calcular o respetivo coeficiente é, efetivamente, o período entre o dia seguinte ao termo do prazo de transposição fixado na diretiva em causa e o dia em que a Comissão decidiu propor uma ação no Tribunal de Justiça.

58

Isto não impede que o Tribunal de Justiça tenha em conta um período diferente e, com efeito, determine a duração de um incumprimento, considerando como data de termo do mesmo a data em que aprecia os factos, e não a data em que a Comissão propõe a ação. Uma vez que a Comissão não se podia basear na primeira data, devia utilizar outras datas de início e de termo para determinar a duração e calcular o respetivo coeficiente.

59

A Comissão considera que o cálculo deste coeficiente deve ter em conta a totalidade do período decorrido desde a data do termo do prazo de transposição da diretiva em causa. No âmbito dos processos por incumprimento, o objetivo de tomar em conta a data do termo do prazo fixado no parecer fundamentado consiste em apurar, para poder declarar a existência de um incumprimento, ao abrigo do artigo 260.o, n.o 1, TFUE, se naquela data específica o incumprimento persistia. No entanto, por definição, a duração de um incumprimento não se limita à referida data, prolongando‑se antes durante todo o período da infração, que não começa apenas na data do termo do prazo fixado no parecer fundamentado, mas antes a partir do termo do prazo de transposição da diretiva em causa. Por conseguinte, não se pode considerar que o incumprimento só existe a partir do termo do prazo fixado no parecer fundamentado.

60

Esta abordagem é conforme com o princípio da igualdade de tratamento. Se a data de início de um incumprimento a considerar para efeitos do cálculo do coeficiente da respetiva duração e da aplicação de uma sanção fosse a do termo do prazo fixado no parecer fundamentado, então, a duração do incumprimento estaria dependente da duração do procedimento pré‑contencioso. Isto poderia conduzir a uma desigualdade de tratamento entre os Estados‑Membros sujeitos ao mesmo prazo de transposição.

61

A Comissão sublinha igualmente que a data relevante para determinar a duração de uma infração depende do objeto da infração. O processo previsto no artigo 260.o, n.o 2, TFUE, tem por objeto a não execução de acórdãos do Tribunal de Justiça, pelo que o ponto de referência cronológico relevante é a data da prolação do acórdão. Em contrapartida, no caso do processo previsto no artigo 260.o, n.o 3, TFUE, a infração reside na falta de notificação das medidas de transposição de uma diretiva por um Estado‑Membro, de modo que o ponto de referência cronológico relevante é a data a partir da qual o Estado‑Membro não cumpriu a sua obrigação de comunicar as medidas de transposição.

62

Na sua tréplica, a República da Eslovénia afirma que a aplicação de uma sanção pecuniária já não se justifica, uma vez que a Diretiva 2018/1972 foi plenamente transposta para o direito esloveno em 10 de novembro de 2022.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

63

Tendo presente que, conforme resulta do n.o 32 do presente acórdão, é facto assente que, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, a República da Eslovénia não tinha comunicado à Comissão as medidas de transposição completa da Diretiva 2018/1972, na aceção do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, o incumprimento declarado a este título está abrangido pelo âmbito de aplicação desta disposição.

64

É jurisprudência constante que a finalidade da condenação no pagamento de uma quantia fixa ao abrigo da referida disposição assenta na apreciação das consequências da não execução das obrigações do Estado‑Membro em causa para os interesses privados e públicos, em especial quando o incumprimento tiver persistido por um longo período [v., neste sentido, Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 54 e jurisprudência referida].

65

No que respeita à oportunidade de impor uma quantia fixa no caso em apreço, cabe recordar que incumbe ao Tribunal de Justiça, em cada processo e em função das circunstâncias do caso que deve apreciar, bem como do nível de persuasão e de dissuasão que considere necessário, decretar as sanções pecuniárias adequadas, nomeadamente para evitar a repetição de infrações análogas ao direito da União [Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 69 e jurisprudência referida].

66

No presente processo, há que considerar que, não obstante o facto de a República da Eslovénia ter cooperado com os serviços da Comissão durante todo o procedimento pré‑contencioso e de ter mantido estes últimos informados das razões que a impediram de assegurar a transposição da Diretiva 2018/1972 para o direito esloveno, o conjunto dos elementos de facto e de direito que envolvem o incumprimento declarado, nomeadamente a falta total de comunicação das medidas necessárias à transposição completa desta diretiva no termo do prazo estabelecido no parecer fundamentado e mesmo na data da propositura da presente ação, constitui um indicador de que a prevenção efetiva da repetição futura de infrações análogas ao direito da União pode exigir a adoção de uma medida dissuasiva, como a imposição de uma quantia fixa [v., por analogia, Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 70 e jurisprudência referida].

67

Por conseguinte, é oportuno aplicar uma quantia fixa à República da Eslovénia.

68

No que diz respeito ao cálculo dessa quantia fixa, há que recordar que, no exercício do seu poder de apreciação na matéria, tal como delimitado pelas propostas da Comissão, cabe ao Tribunal de Justiça estabelecer o montante da quantia fixa em cujo pagamento um Estado‑Membro pode ser condenado por força do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, de forma que seja, por um lado, adequada às circunstâncias e, por outro, proporcionada à infração cometida. Entre os fatores pertinentes para esse efeito figuram, designadamente, elementos como a gravidade do incumprimento declarado, o período durante o qual este subsistiu, bem como a capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa [Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 73 e jurisprudência referida].

69

No que diz respeito, em primeiro lugar, à gravidade da infração, há que recordar que a obrigação de adotar as medidas nacionais para assegurar a transposição completa de uma diretiva e a obrigação de comunicar essas medidas à Comissão constituem obrigações essenciais dos Estados‑Membros para assegurar a plena efetividade do direito da União e que o incumprimento destas obrigações deve, como tal, ser considerado de uma certa gravidade [Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 74 e jurisprudência referida].

70

No caso em apreço, importa observar que, como resulta do n.o 32 do presente acórdão, no termo do prazo estabelecido no parecer fundamentado, conforme prorrogado, ou seja, em 23 de fevereiro de 2022, a República da Eslovénia não tinha cumprido as obrigações de transposição que lhe incumbiam por força da Diretiva 2018/1972, pelo que a plena efetividade do direito da União não foi assegurada. À gravidade deste incumprimento acresce que, naquela data, a República da Eslovénia não tinha ainda comunicado nenhuma medida de transposição desta diretiva.

71

Além disso, como salienta a Comissão, a Diretiva 2018/1972 é o principal ato legislativo no domínio das comunicações eletrónicas.

72

Em especial, antes de mais, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2018/1972, esta «estabelece um quadro harmonizado para a regulação das redes de comunicações eletrónicas, dos serviços de comunicações eletrónicas, dos recursos conexos e dos serviços conexos e de certos aspetos dos equipamentos terminais. […] [P]revê as atribuições das autoridades reguladoras nacionais e, se for caso disso, de outras autoridades competentes e fixa um conjunto de procedimentos para assegurar a aplicação harmonizada do quadro regulamentar em toda a União».

73

Em seguida, nos termos do artigo 1.o, n.o 2, desta diretiva, esta destina‑se a, por um lado, instaurar um mercado interno dos serviços e redes de comunicações eletrónicas que conduza a uma implantação e aceitação das redes de capacidade muito elevada, a uma concorrência sustentável e à interoperabilidade dos serviços de comunicações eletrónicas, bem como à acessibilidade e segurança das redes e serviços, de que resultem benefícios para os utilizadores finais, e, por outro, assegurar a oferta em toda a União de serviços de boa qualidade acessíveis ao público, através de uma concorrência e de uma possibilidade de escolha efetivas, e atender às situações em que as necessidades dos utilizadores finais, incluindo aqueles cuja deficiência os impede de aceder aos serviços em pé de igualdade com os demais, não sejam convenientemente satisfeitas pelo mercado, bem como estabelecer os direitos necessários dos utilizadores finais.

74

Por último, conforme decorre dos considerandos 2 e 3 da referida diretiva, esta introduz alterações no quadro regulamentar em vigor antes da sua adoção para refletir a evolução tecnológica e do mercado.

75

Ora, como a Comissão alega, com razão, a não transposição da Diretiva 2018/1972 pela República da Eslovénia, primeiro, prejudica a prática regulamentar em toda a União no que diz respeito à governação do sistema de comunicações eletrónicas, à autorização do espetro e às regras de acesso ao mercado. Como consequência, as empresas não beneficiam de processos mais consistentes e previsíveis para a concessão ou renovação dos direitos de utilização do espetro existentes, nem da previsibilidade regulamentar que resulta da duração mínima de 20 anos das licenças de utilização do espetro. Estas deficiências influenciam diretamente a disponibilidade e a adoção de redes de capacidade muito elevada na União. Segundo, os consumidores não podem usufruir de uma série de benefícios tangíveis que lhes são conferidos por esta diretiva, tais como soluções relativas ao acesso à oferta de serviços de comunicações a preços acessíveis, a exigência de informações claras sobre os contratos, a obrigação de clareza das tarifas, a facilitação da mudança de fornecedor de redes para promover preços de retalho mais acessíveis, e a obrigação de os operadores oferecerem um acesso equivalente aos serviços de comunicação para os utilizadores finais com deficiência.

76

No que respeita, em segundo lugar, à duração da infração, há que recordar que esta deve, em princípio, ser avaliada tendo em conta a data em que o Tribunal de Justiça aprecia os factos e que deve considerar‑se que esta apreciação dos factos ocorreu na data do encerramento do processo [v., neste sentido, Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva dados pessoais — Domínio penal), C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 79 e jurisprudência referida].

77

No que respeita, por um lado, ao início do período que deve ser tido em conta para fixar o montante da quantia fixa a aplicar nos termos do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, o Tribunal de Justiça declarou que, ao contrário da sanção pecuniária compulsória diária, a data a considerar para efeitos da avaliação da duração do incumprimento em causa não é a do termo do prazo fixado no parecer fundamentado, mas a data em que termina o prazo de transposição previsto pela diretiva em questão [v., neste sentido, Acórdãos de 16 de julho de 2020, Comissão/Roménia (Luta contra o branqueamento de capitais),C‑549/18, EU:C:2020:563, n.o 79, e de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais),C‑550/18, EU:C:2020:564, n.o 90].

78

No caso em apreço, não se contesta validamente que, no termo do prazo de transposição previsto no artigo 124.o da Diretiva 2018/1972, ou seja, em 21 de dezembro de 2020, a República da Eslovénia não tinha adotado as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para assegurar a transposição desta diretiva, nem as tinha, por conseguinte, comunicado à Comissão.

79

Por outro lado, nas suas observações a respeito da adaptação dos pedidos da Comissão, a República da Eslovénia não contesta que a transposição da Diretiva 2018/1972 para o direito esloveno pode considerar‑se concluída em 10 de novembro de 2022.

80

Resulta do exposto que o incumprimento declarado no n.o 32 do presente acórdão se manteve entre 22 de dezembro de 2020 e 11 de novembro de 2022, ou seja, durante um período de 688 dias, o que constitui um período muito longo.

81

Não obstante, é necessário ter em conta que este período de tempo pode ter resultado, em parte, das circunstâncias excecionais associadas à pandemia de COVID‑19. A República da Eslovénia sustenta, sem ser contestada, que estas circunstâncias, imprevisíveis e alheias à sua vontade, atrasaram o processo legislativo necessário à transposição da Diretiva 2018/1972 e, consequentemente, prolongaram a duração deste incumprimento.

82

Em terceiro lugar, no que toca à capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que importa ter em conta o PIB desse Estado‑Membro, conforme se apresenta à data da apreciação dos factos pelo Tribunal de Justiça. [v., neste sentido, Acórdãos de 16 de julho de 2020, Comissão/Roménia (Luta contra o branqueamento de capitais),C‑549/18, EU:C:2020:563, n.o 85, e de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais),C‑550/18, EU:C:2020:564, n.o 97].

83

A Comissão propõe que seja tido em conta, além do PIB da República da Eslovénia, o seu peso institucional na União, expresso pelo número de votos de que este Estado‑Membro dispõe no Parlamento Europeu. A Comissão considera ainda que deve ser utilizado um coeficiente de ajustamento de 4,5 para assegurar o caráter proporcionado e dissuasivo das sanções que solicita ao Tribunal de Justiça que sejam aplicadas ao referido Estado‑Membro.

84

No entanto, o Tribunal de Justiça esclareceu recentemente de forma bastante clara, por um lado, que a tomada em consideração do peso institucional do Estado‑Membro em causa não se afigura indispensável para garantir uma dissuasão suficiente e levar esse Estado‑Membro a alterar o seu comportamento atual ou futuro e, por outro, que a Comissão não demonstrou os critérios objetivos com base nos quais fixou o valor do coeficiente de ajustamento de 4,5 [v., neste sentido, Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado — Ferroníquel), C‑51/20, EU:C:2022:36, n.os 115 e 117].

85

Atendendo a todas as circunstâncias do presente processo e à luz do poder de apreciação que o artigo 260.o, n.o 3, TFUE reconhece ao Tribunal de Justiça, o qual prevê que este não pode, relativamente a uma quantia fixa cujo pagamento impõe, exceder o montante indicado pela Comissão, há que considerar que a prevenção efetiva da repetição futura de infrações análogas à que resulta da violação do artigo 124.o da Diretiva 2018/1972 e que prejudica a plena eficácia do direito da União é suscetível de exigir a imposição do pagamento de uma quantia fixa no montante de 800000 euros.

86

Por conseguinte, há que condenar a República da Eslovénia no pagamento à Comissão de uma quantia fixa no montante de 800000 euros.

Quanto às despesas

87

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. De acordo com o artigo 141.o, n.o 1, deste regulamento, a parte que desistir é condenada nas despesas se a outra parte o tiver requerido nas suas observações sobre a desistência. Todavia, este artigo 141.o, n.o 2, prevê que, a pedido da parte que desiste, as despesas são suportadas pela outra parte, se tal se justificar tendo em conta a atitude desta última. Por último, nos termos do referido artigo 141.o, n.o 4, na falta de pedido sobre as despesas, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas.

88

No caso em apreço, embora a Comissão tenha pedido a condenação da República da Eslovénia e o incumprimento tenha sido declarado, esta instituição desistiu parcialmente da sua ação, não tendo solicitado que este Estado‑Membro suporte as despesas relativas à presente ação. Por outro lado, nas suas observações sobre a desistência da Comissão, o referido Estado‑Membro não pediu que esta fosse condenada nas despesas.

89

Não obstante, cumpre salientar que a desistência da Comissão foi motivada pela atitude da República da Eslovénia, visto que este Estado‑Membro só adotou e comunicou à Comissão as medidas de transposição completa da Diretiva 2018/1972 após a propositura da presente ação, e que esta atitude foi determinante para que o pedido de condenação do referido Estado‑Membro no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória ficasse sem objeto e que a Comissão o retirasse.

90

Nestas circunstâncias, e por não ser possível estabelecer uma distinção pertinente entre as despesas relativas ao incumprimento declarado no n.o 32 do presente acórdão e as despesas relativas à desistência parcial da Comissão, há que decidir que a República da Eslovénia suportará, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) decide:

 

1)

Ao não ter adotado as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à Diretiva (UE) 2018/1972 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, que estabelece o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, e, por conseguinte, ao não ter informado a Comissão dessas disposições, a República da Eslovénia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 124.o, n.o 1, desta diretiva.

 

2)

A República da Eslovénia é condenada a pagar à Comissão Europeia uma quantia fixa no montante de 800000 euros.

 

3)

A República da Eslovénia é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: esloveno.

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