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Document 62022CJ0135
Judgment of the Court (Tenth Chamber) of 7 September 2023.#Patrick Breyer v European Research Executive Agency.#Appeal – Access to documents of the institutions of the European Union – Regulation (EC) No 1049/2001 – First indent of Article 4(2) – Exception to the right of access – Protection of commercial interests – Framework Programme for Research and Innovation ‘Horizon 2020’ (2014-2020) – Documents relating to the ‘iBorderCtrl: Intelligent Portable Border Control System’ research project – Decision of the European Research Executive Agency (REA) refusing access to certain information – Overriding public interest.#Case C-135/22 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 7 de setembro de 2023.
Patrick Breyer contra Agência de Execução Europeia da Investigação (REA).
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Acesso aos documentos das instituições da União Europeia — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão — Exceção ao direito de acesso — Proteção dos interesses comerciais — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação “Horizonte 2020” (2014‑2020) — Documentos relativos ao projeto de investigação “iBorderCtrl: Intelligent Portable Border Control System” — Decisão da Agência de Execução Europeia da Investigação (REA) que recusa o acesso a certas informações — Interesse público superior.
Processo C-135/22 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 7 de setembro de 2023.
Patrick Breyer contra Agência de Execução Europeia da Investigação (REA).
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Acesso aos documentos das instituições da União Europeia — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão — Exceção ao direito de acesso — Proteção dos interesses comerciais — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação “Horizonte 2020” (2014‑2020) — Documentos relativos ao projeto de investigação “iBorderCtrl: Intelligent Portable Border Control System” — Decisão da Agência de Execução Europeia da Investigação (REA) que recusa o acesso a certas informações — Interesse público superior.
Processo C-135/22 P.
Court reports – general
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:640
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)
7 de setembro de 2023 ( *1 )
«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Acesso aos documentos das instituições da União Europeia — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão — Exceção ao direito de acesso — Proteção dos interesses comerciais — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação “Horizonte 2020” (2014‑2020) — Documentos relativos ao projeto de investigação “iBorderCtrl: Intelligent Portable Border Control System” — Decisão da Agência de Execução Europeia da Investigação (REA) que recusa o acesso a certas informações — Interesse público superior»
No processo C‑135/22 P,
que tem por objeto um recurso de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 25 de fevereiro de 2022,
Patrick Breyer, residente em Kiel (Alemanha), representado por J. Breyer, Rechtsanwalt,
recorrente,
sendo as outras partes no processo:
Agência de Execução Europeia da Investigação (REA), representada por V. Canetti e S. Payan‑Lagrou, na qualidade de agentes, assistidas por R. van der Hout e C. Wagner, Rechtsanwälte,
recorrida em primeira instância,
apoiada por:
Comissão Europeia, representada por F. Erlbacher, A.‑C. Simon e A. Spina, na qualidade de agentes,
interveniente no presente recurso,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),
composto por: D. Gratsias, presidente de secção, M. Ilešič e I. Jarukaitis (relator), juízes,
advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 |
Com o seu recurso, Patrick Breyer pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 15 de dezembro de 2021, Breyer/REA (T‑158/19, a seguir acórdão recorrido, EU:T:2021:902), pelo qual este último negou parcialmente provimento ao recurso de anulação da Decisão da Agência de Execução Europeia da Investigação (REA) de 17 de janeiro de 2019 [ARES (2019) 266593] (a seguir «decisão recorrida»), que lhe recusou conceder o acesso a certos documentos relativos ao projeto «iBorderCtrl: Intelligent Portable Control System» (a seguir «projeto iBorderCtrl»), estabelecido no âmbito do programa‑quadro de investigação e inovação «Horizonte 2020» (2014‑2020) (a seguir «Programa Horizonte 2020») |
Quadro jurídico
Regulamento (CE) n.o 1049/2001
2 |
O Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001 L 145, p. 43), define os princípios, as condições e os limites do direito de acesso aos documentos dessas instituições. |
3 |
O considerando 2 do mesmo regulamento tem a seguinte redação: «Esta abertura permite assegurar uma melhor participação dos cidadãos no processo de decisão e garantir uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da Administração perante os cidadãos num sistema democrático. A abertura contribui para o reforço dos princípios da democracia e do respeito dos direitos fundamentais consagrados no artigo 6.o do Tratado UE e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [(a seguir “Carta”)].» |
4 |
O artigo 2.o, n.o 1, do referido regulamento prevê que todos os cidadãos da União Europeia têm direito de acesso aos documentos das instituições, sob reserva dos princípios, das condições e limites estabelecidos no mesmo regulamento. |
5 |
O artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, sob a epígrafe «Exceções», dispõe, no seu n.o 2: «As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a proteção de:
[…] exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação.» |
6 |
O artigo 6.o, n.o 1, deste regulamento prevê que «[o] requerente não é obrigado a declarar as razões do pedido». |
Regulamento (CE) n.o 58/2003
7 |
O artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 58/2003 do Conselho, de 19 de dezembro de 2002, que define o estatuto das agências de execução encarregadas de determinadas funções de gestão de programas comunitários (JO 2003, L 11, p. 1), dispõe, no seu n.o 1, primeiro parágrafo: «A agência de execução está sujeita ao Regulamento [n.o 1049/2001] quando lhe for apresentado um pedido de acesso a um documento na sua posse.» |
Regulamento (UE) n.o 1290/2013
8 |
O Regulamento (UE) n.o 1290/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que estabelece as regras de participação e difusão relativas ao «Horizonte 2020 — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação (2014‑2020)» e revoga o Regulamento (CE) n.o 1906/2006 (JO 2013, L 347, p. 81), foi revogado com efeito em 1 de janeiro de 2021, ou seja, posteriormente à adoção da decisão recorrida, pelo Regulamento (UE) 2021/695 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de abril de 2021, que estabelece o Horizonte Europa — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação, que define as suas regras de participação e difusão, e que revoga os Regulamentos (UE) n.o 1290/2013 e (UE) n.o 1291/2013 (JO 2021, L 170, p. 1). Por conseguinte, este primeiro regulamento continua a ser, de qualquer modo, aplicável no presente caso. |
9 |
O artigo 3.o do Regulamento n.o 1290/2013 dispunha: «Sem prejuízo das condições estabelecidas nos acordos, decisões ou contratos de execução, os dados, conhecimentos e informações comunicados como confidenciais no âmbito de uma ação devem ser mantidos confidenciais, tomando na devida consideração a legislação da União em matéria de proteção e de acesso a informações classificadas.» |
10 |
O artigo 4.o, n.o 1, deste regulamento previa: «Sem prejuízo do disposto no artigo 3.o e quando tal lhe for solicitado, a Comissão [Europeia] põe à disposição das instituições, organismos, serviços ou agências da União ou de qualquer Estado‑Membro ou Estado associado todas as informações úteis que estejam na sua posse relativas aos resultados obtidos por participantes numa ação que tenham beneficiado de financiamento da União, desde que se verifiquem as duas condições seguintes:
[…]» |
11 |
O artigo 43.o, n.os 2 e 3, do referido regulamento dispunha: «2. Sem prejuízo das restrições decorrentes da proteção dos direitos de propriedade intelectual, das regras em matéria de segurança extrínseca ou de interesses legítimos, os participantes devem difundir os resultados de que sejam proprietários o mais rapidamente possível e por meios adequados. A convenção de subvenção pode fixar prazos para este efeito. As obrigações de exploração adicionais são estabelecidas na convenção de subvenção e devem constar do programa de trabalho ou do plano de trabalho. No que diz respeito à difusão de resultados por meio de publicações científicas, o acesso deve ser facultado nos termos e condições constantes da convenção de subvenção. […] No que diz respeito à difusão de dados da investigação, a convenção de subvenção pode, no contexto do livre acesso a esses dados e à sua preservação, fixar os termos e condições em que deve ser facultado livre acesso a esses resultados, em especial no que diz respeito à investigação de ponta realizada no âmbito do [Conselho Europeu de Investigação (CEI)] e das tecnologias futuras e emergentes (FET) ou noutras áreas relevantes, tendo em conta os legítimos interesses dos participantes e as eventuais restrições associadas às regras de proteção de dados e às regras de segurança e de proteção de direitos de propriedade intelectual. Nestes casos, o programa de trabalho ou o plano de trabalho devem mencionar se é necessária a difusão dos dados da investigação por livre acesso. Deve ser dado aviso prévio de qualquer atividade de difusão aos outros participantes. Na sequência da notificação, os participantes podem opor‑se se demonstrarem que os seus interesses legítimos em relação aos seus resultados ou conhecimentos preexistentes seriam significativamente prejudicados devido à difusão prevista. Nesses casos, a difusão não [se] pode realizar, salvo se forem tomadas medidas adequadas para salvaguardar os referidos interesses legítimos. A convenção de subvenção fixa prazos para este efeito. 3. Para efeitos de acompanhamento e difusão pela Comissão ou pelo organismo de financiamento competente, os participantes devem prestar todas as informações sobre as suas atividades relacionadas com a exploração e difusão e fornecer os documentos necessários, nas condições estabelecidas na convenção de subvenção. Sob reserva dos legítimos interesses dos participantes que as tenham fornecido, as informações devem ser tornadas públicas. A convenção de subvenção deve, nomeadamente, fixar prazos para a referida prestação de informações.» |
Antecedentes do litígio
12 |
Os antecedentes do litígio e o conteúdo da decisão recorrida estão expostos nos n.os 1 a 8 do acórdão recorrido. Para efeitos do presente processo, podem ser resumidos da seguinte forma. |
13 |
Em 19 de abril de 2016, a REA celebrou, no âmbito do Programa Horizonte 2020, a convenção de subvenção n.o 700626 (a seguir «convenção de subvenção») com os membros de um consórcio com vista ao financiamento do projeto iBorderCtrl por um período de 36 meses a contar de 1 de setembro de 2016. |
14 |
Este projeto tinha por objeto testar novas tecnologias destinadas a aumentar a eficiência da gestão dos controlos nas fronteiras externas da União assegurando uma gestão mais rápida dos viajantes e uma deteção mais rápida das atividades ilegais. |
15 |
Em 5 de novembro de 2018, o recorrente apresentou à Comissão, com base no Regulamento n.o 1049/2001, um pedido de acesso a vários documentos relativos quer à autorização do projeto quer ao seu desenrolar. Este pedido foi transmitido em 7 de novembro seguinte à REA. |
16 |
Em 23 de novembro de 2018, a REA informou o recorrente de que recusava o seu pedido de acesso, no seu todo para um dos documentos pedidos, estando este acessível ao público, e de modo parcial para um outro documento pedido. A agência indicou‑lhe também que indeferia o seu pedido de acesso no que respeita a outros documentos elaborados no decurso do projeto, baseando‑se, por um lado, na proteção da vida privada e da integridade do indivíduo, na medida em que alguns desses documentos continham dados pessoais de pessoas singulares que participavam no projeto e, por outro, na proteção de interesses comerciais dos membros do consórcio, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, desse regulamento. |
17 |
Em 26 de novembro de 2018, o recorrente enviou um pedido confirmativo de acesso, aceitando a ocultação dos nomes das pessoas singulares implicadas no projeto. |
18 |
Com a decisão recorrida, a REA concedeu um acesso parcial a certos documentos pedidos e recusou o seu pedido de acesso quanto ao restante. |
Tramitação processual no Tribunal Geral e acórdão recorrido
19 |
Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de março de 2019, P. Breyer interpôs um recurso de anulação da decisão recorrida, acusando a REA, por um lado, no que respeita aos documentos relativos à autorização do projeto iBorderCtrl, de não se ter pronunciado sobre o seu pedido de acesso e, por outro, no que respeita aos documentos relativos ao desenrolar desse projeto, de apenas lhe ter concedido um acesso parcial a uma primeira série de documentos e de lhe ter recusado o acesso a uma segunda série de documentos, invocando a proteção dos interesses comerciais dos membros do consórcio. |
20 |
O recorrente tinha invocado dois fundamentos de recurso, dos quais só o primeiro é pertinente para a apreciação do presente recurso. |
21 |
O primeiro fundamento, que acusava a REA de ter recusado o acesso ou de só ter concedido um acesso parcial aos documentos relativos ao desenrolar do projeto, estava dividido em duas partes, a primeira relativa à inexistência de prejuízo para a proteção de interesses comerciais na aceção do artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 e, a segunda, relativa à existência de um interesse público superior que justificava a divulgação dos documentos em causa na aplicação do artigo 4.o, n.o 2, último segmento de frase, deste regulamento. |
22 |
Com o acórdão recorrido, o Tribunal Geral anulou parcialmente a decisão recorrida e negou provimento ao recurso de P. Breyer quanto ao restante. |
Tramitação processual no Tribunal de Justiça e pedidos das partes no recurso
23 |
Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 4 de julho de 2022, foi admitida a intervenção da Comissão em apoio dos pedidos da REA. |
24 |
Com o seu recurso, o recorrente pede que o Tribunal de Justiça se digne:
|
25 |
A REA, apoiada pela Comissão, pede que o Tribunal de Justiça se digne:
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Quanto ao recurso
26 |
O recorrente invoca um único fundamento de recurso baseado, em substância, no facto de o Tribunal Geral ter cometido um erro de direito na ponderação dos interesses em presença, recusando‑lhe, erradamente, um acesso completo aos documentos no que respeita à execução do projeto iBorderCtrl, enquanto o interesse público no acesso à informação se sobrepõe aos interesses comerciais dos participantes nesse projeto. |
27 |
A REA contesta a admissibilidade do recurso no seu todo. |
Quanto à admissibilidade
Argumentos das partes
28 |
A REA alega, antes de mais, que uma vez que o Tribunal Geral, com o acórdão recorrido, deferiu parcialmente os pedidos do recorrente, este último não pode beneficiar da anulação desse acórdão na sua totalidade. |
29 |
Em seguida, a REA expõe que as alegações do recorrente não dizem respeito à fundamentação do acórdão recorrido mas ao contexto político mais amplo do recurso, que assentam em considerações gerais e que não identificam claramente os erros de direito cometidos pelo Tribunal Geral. O recorrente limita‑se a reproduzir os argumentos, maioritariamente de natureza material, já invocados no Tribunal Geral, referindo‑se, além disso, a aspetos factuais não constatados por este último e sem descrever com precisão, em conformidade com o artigo 168.o, n.o 1, alínea d), e com o artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, os fundamentos e os argumentos jurídicos. |
30 |
A REA sustenta, por último, que o objeto do recurso é ilegalmente ampliado, na medida em que o recorrente se limitou a criticar os n.os 181 a 205 do acórdão recorrido, sem descrever os fundamentos e os argumentos jurídicos que pretendia invocar contra as outras partes desse acórdão. |
31 |
O recorrente objeta que não contesta o acórdão recorrido na parte em que deu provimento ao seu recurso, que o seu recurso descreve os erros cometidos pelo Tribunal Geral, sem se limitar a reiterar os argumentos invocados em primeira instância, e que a ponderação correta dos interesses em presença não é uma questão de facto, mas uma questão de direito, suscetível de ser fiscalizada pelo Tribunal de Justiça. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
32 |
Primeiro, importa desde logo salientar que, embora tivesse inicialmente pedido a anulação integral do acórdão recorrido, o recorrente especificou, no n.o 2 das suas observações sobre o articulado de intervenção da Comissão, que só pedia a anulação desse acórdão na parte em que não tivesse dado provimento ao seu recurso. |
33 |
Por outro lado, resulta do artigo 56.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, que o recurso só pode ser interposto por uma parte que tenha sido total ou parcialmente vencida. |
34 |
Tendo o recorrente sido parcialmente vencido, o seu recurso do acórdão recorrido na parte em que nega parcialmente provimento ao seu recurso da decisão recorrida é, por conseguinte, nesta medida, admissível. |
35 |
Segundo, importa recordar que resulta do artigo 256.o, n.o 1, segundo parágrafo, TFUE, do artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, bem como do artigo 168.o, n.o 1, alínea d), e do artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo que um recurso de uma decisão do Tribunal Geral deve indicar com precisão os pontos criticados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos que sustentam especificamente esse pedido, sob pena de inadmissibilidade do recurso ou do fundamento em causa (Acórdão de 23 de novembro de 2021, Conselho/Hamas, C‑833/19 P, EU:C:2021:950, n.o 50 e jurisprudência referida). |
36 |
Assim, não respeita as exigências de fundamentação resultantes dessas disposições um recurso que se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e os argumentos já alegados no Tribunal Geral (Acórdão de 17 de dezembro de 2020, Alemanha/Comissão, C‑475/19 P e C‑688/19 P, EU:C:2020:1036, n.o 33). |
37 |
Todavia, as questões de direito examinadas em primeira instância podem ser de novo discutidas em sede de recurso, desde que o recorrente conteste a interpretação ou a aplicação do direito da União feita pelo Tribunal Geral. Com efeito, se um recorrente não pudesse assim basear o seu recurso em fundamentos e argumentos já utilizados no Tribunal Geral, o processo de recurso ficaria privado de uma parte do seu sentido (Acórdãos de 3 de dezembro de 2015, Itália/Comissão, C‑280/14 P, EU:C:2015:792, n.o 43, e de 10 de novembro de 2022, Comissão/Valencia Club de Fútbol, C‑211/20 P, EU:C:2022:862, n.o 32 e jurisprudência referida). |
38 |
Há que observar, a este respeito, que, com o seu recurso que indica de modo preciso os elementos criticados do acórdão recorrido, o recorrente não pretende obter um simples reexame da petição apresentada no Tribunal Geral, mas contesta os fundamentos que figuram em pontos específicos desse acórdão, formulando argumentos jurídicos destinados a demonstrar que o Tribunal Geral cometeu erros de direito no que respeita à qualificação dos interesses públicos invocados em apoio do pedido de divulgação e à ponderação dos interesses em presença. |
39 |
Ora, é ponto assente que a qualificação jurídica de um facto ou de um ato pelo Tribunal Geral é uma questão de direito que pode ser suscitada no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal Geral (Acórdão de 12 de maio de 2022, Klein/Comissão, C‑430/20 P, EU:C:2022:377, n.o 41). No caso em apreço, é o que sucede com a questão de saber se os interesses invocados pelo recorrente devem ser considerados interesses públicos superiores, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, último segmento de frase, do Regulamento n.o 1049/2001. |
40 |
Terceiro, há que afastar a argumentação da REA relativa à inadmissibilidade do recurso pelo facto de o seu objeto ter sido irregularmente alargado. Como foi sublinhado no n.o 32 do presente acórdão, na última versão dos seus articulados, o recorrente só pede a anulação do acórdão recorrido na parte em que este último negou parcialmente provimento ao seu recurso. Por outro lado, a circunstância de apenas contestar certos números do acórdão recorrido não pode constituir uma causa de inadmissibilidade do seu recurso ou do seu fundamento. |
41 |
O recurso é, por consequência, admissível. |
Quanto ao mérito
Argumentos das partes
42 |
O fundamento único do recorrente, pelo qual alega que o Tribunal Geral, ao recusar‑lhe o acesso completo aos documentos relativos à execução do projeto iBorderCtrl, quando existia um interesse público superior que justificava a sua divulgação, violou o artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, divide‑se em duas partes. |
43 |
Em primeiro lugar, o recorrente sustenta que o Tribunal Geral considerou erradamente que não tinha demonstrado a existência de um interesse público superior, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, último segmento de frase, do Regulamento n.o 1049/2001, enquanto invocava diferentes interesses que, em seu entender, correspondiam a essa qualificação. |
44 |
Primeiro, o recorrente expõe que existe um interesse público superior que justifica o acesso aos documentos que dizem respeito a um projeto inteiramente financiado por fundos públicos. |
45 |
O interesse público em poder debater a oportunidade de um financiamento público de um projeto tão invasivo e discutível quanto o projeto iBorderCrtl é tanto mais caracterizado quanto o financiamento público poderia ser consagrado a outros projetos de investigação menos controversos. |
46 |
Segundo, o recorrente sustenta que existe um interesse público em examinar o fundamento científico e a fiabilidade da tecnologia utilizada no âmbito do projeto iBorderCtrl, que é suposto permitir a deteção automatizada das mentiras graças a uma análise das microexpressões do rosto dos viajantes que respondem às questões que lhes são colocadas antes da sua entrada na União. |
47 |
O recorrente invoca, terceiro, a existência de um interesse público superior ligado ao impacto que as tecnologias utilizadas no âmbito do projeto iBorderCtrl são suscetíveis de ter nos direitos fundamentais. |
48 |
A transparência impõe‑se na medida em que essas tecnologias exigem o recurso a testes e experiências, implicam a utilização de dados biométricos e podem ter efeitos discriminatórios, em especial em relação às pessoas em situação de vulnerabilidade. |
49 |
Além disso, segundo o recorrente, o caráter experimental do projeto iBorderCtrl implica, como em matéria de ensaios clínicos, que o público seja informado desde a fase de investigação para que se possa instaurar um debate público sobre a pertinência das tecnologias utilizadas e que as questões de ética e de proteção dos direitos fundamentais possam ser abordadas. |
50 |
Quarto, o recorrente sustenta que existe um interesse superior de natureza científica, mediática, política e democrática na divulgação dos documentos do projeto. |
51 |
Em conformidade com o «princípio da universalidade da ciência», um interesse científico prende‑se com a divulgação de todos os resultados da investigação para que estes possam ser discutidos e criticados, tanto mais que existe um debate científico sobre a questão de saber se a tecnologia, muito controversa, de deteção visual das mentiras produz resultados concludentes. |
52 |
A existência de vários estudos consagrados a estas tecnologias demonstra, assim, simultaneamente o elevado grau de interesse que suscitam no meio científico e o caráter pouco concludente dos seus resultados. O grande número de reportagens consagradas ao projeto iBorderCtrl revela, por sua vez, o grande interesse mediático por este tipo de projeto, enquanto os trabalhos do Parlamento Europeu demonstram o interesse político que suscita. |
53 |
Por outro lado, a tecnologia utilizada, inicialmente destinada aos controlos nas fronteiras, poderia ser utilizada noutros domínios para investigar as pessoas e controlar as suas declarações. Por conseguinte, há um interesse democrático e político em determinar se a utilização destas tecnologias de controlo de massa, atualmente proibidas, é desejável e se lhes deve ser dada uma base jurídica. |
54 |
O recorrente salienta, por outro lado, que numerosas informações sobre o projeto iBorderCtrl já foram divulgadas, incluindo por participantes no projeto. Em seu entender, não é conforme ao interesse público que sejam assim divulgadas informações seletivas, sem que um terceiro independente possa proceder a verificações objetivas. |
55 |
Nestas condições, o recorrente considera que, na ponderação dos interesses em presença, os interesses comerciais dos membros do consórcio «não são particularmente significativos» e devem passar para segundo plano à luz do interesse do público na transparência. |
56 |
Em especial, o interesse público é particularmente preponderante para os documentos com uma fraca relação com segredos de negócios, como as avaliações éticas e jurídicas da tecnologia, os planos de comunicação pública, o relatório relativo à gestão da qualidade ou os documentos relativos à autorização do projeto de investigação. |
57 |
Em segundo lugar, o recorrente expõe que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar, nos n.os 194 a 200 do acórdão recorrido, que as disposições do Regulamento n.o 1290/2013 e do Regulamento (UE) n.o 1291/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de11 de dezembro de 2013, que cria o Horizonte 2020 — Programa‑Quadro de Investigação e Inovação (2014‑2020) e que revoga a Decisão n.o 1982/2006/CE (JO 2013, L 347, p. 104), bem como as disposições da convenção de subvenção eram suficientes para satisfazer esse interesse, uma vez que os participantes no projeto tinham a obrigação de divulgar os seus resultados, nomeadamente através de publicações científicas livremente acessíveis, que a REA efetuava ações de comunicação e de publicidade, relativamente às quais podiam ser utilizados resumos de relatórios, que as instituições, os órgãos e os organismos da União e os Estados‑Membros dispunham de um direito de acesso às informações, que era exercido um controlo sobre a legalidade do desenvolvimento desse projeto e, por último, que as avaliações éticas e jurídicas do referido projeto eram sujeitas a um conselheiro para a ética independente. |
58 |
Alega, antes de mais, que a obrigação de publicação que incumbe aos participantes no projeto de investigação em causa não pode satisfazer o interesse público no acesso à informação, uma vez que todos os documentos relativos a esse projeto devem ser publicados, incluindo os relativos ao estado da investigação e aos materiais e aos métodos utilizados, e que essa obrigação não se estende às informações comerciais consideradas dignas de proteção. |
59 |
Na sua opinião, o público, que financia o projeto, deve ter acesso em tempo útil a todas as informações desde a fase de investigação e de desenvolvimento. Esta abordagem corresponde, aliás, à prática da Comissão para os artigos científicos ligados a projetos financiados ao abrigo do programa Horizonte 2020 e à sistemática do Regulamento n.o 1290/2013, cujo artigo 43.o, n.o 2, prevê que os participantes neste programa devem difundir os resultados de que sejam proprietários o mais rapidamente possível e por meios adequados. O recorrente observa também, neste sentido, que o Regulamento n.o 1049/2001 não prevê exceções ao direito de acesso à informação para os projetos de investigação e de desenvolvimento em curso e que os imperativos de proteção dos interesses comerciais dos participantes não são maiores durante o projeto do que após a sua conclusão. |
60 |
Assim, acusa o Tribunal Geral de ter declarado que os participantes no projeto iBorderCtrl podiam manter secretas todas as informações relativas especificamente ao sistema, incluindo as relativas à sua legalidade e à sua aceitabilidade ética, bem como a todos os riscos e aos inconvenientes que apresenta. |
61 |
Em seguida, sustenta que as atividades de comunicação e de publicidade da REA também não são suscetíveis de satisfazer o interesse público no acesso à informação, uma vez que esta agência é obrigada a respeitar a confidencialidade das informações comercialmente sensíveis e que as informações que publica, frequentemente de caráter «publicitário», não permitem um debate independente ou crítico. |
62 |
Por último, o recorrente considera que o direito de as instituições, os órgãos e os organismos da União e dos Estados‑Membros terem acesso à informação não pode satisfazer o interesse do público em ser informado, porque não se trata de um acesso público à informação. |
63 |
A REA, apoiada pela Comissão, considera, por um lado, que o Tribunal Geral verificou devidamente e fundamentou a falta de demonstração, pelo recorrente, da existência de um interesse público superior que justificasse a divulgação dos documentos pedidos e, por outro, que o recorrente não conseguiu identificar erros de direito cometidos pelo Tribunal Geral, suscetíveis de pôr em causa o acórdão recorrido. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
64 |
A título preliminar, há que salientar que o recorrente só contesta o acórdão recorrido na parte em que recusou reconhecer a existência de um interesse público superior suscetível de justificar a divulgação de certos documentos ou de partes de documentos relativamente aos quais a REA tinha concluído que estavam abrangidos pelo regime de exceção previsto no artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001. |
65 |
As apreciações do Tribunal Geral, que figuram nos n.os 117, 135, 146, 152, 164, 172 e 178 do acórdão recorrido, segundo as quais foi sem cometer um erro de direito que a REA considerou que a divulgação das informações contidas em certos documentos ou partes de documentos era suscetível de prejudicar os interesses comerciais dos membros do consórcio, não são, portanto, postas em causa no âmbito do presente recurso, cujo fundamento único deve ser examinado. |
66 |
Como prevê expressamente o artigo 23.o do Regulamento n.o 58/2003, as agências de execução, como a REA, são obrigadas a respeitar as regras fixadas pelo Regulamento n.o 1049/2001. |
67 |
Em conformidade com o seu considerando 1, este último regulamento inscreve‑se na vontade de o legislador da União, expressa no artigo 1.o, segundo parágrafo, TUE, assinalar uma nova etapa no processo de criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões serão tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos (Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento, C‑761/18 P, EU:C:2021:52, n.o 36 e jurisprudência referida). |
68 |
Este objetivo fundamental da União está igualmente repercutido, por um lado, no artigo 15.o, n.o 1, TFUE, que prevê, nomeadamente, que a atuação das instituições, órgãos e organismos da União se pauta pelo maior respeito possível do princípio da abertura, princípio igualmente reafirmado no artigo 10.o, n.o 3, TUE e no artigo 298.o, n.o 1, TFUE, e, por outro, no artigo 42.o da Carta, por consagração do direito de acesso aos documentos (Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento, C‑761/18 P, EU:C:2021:52, n.o 37 e jurisprudência referida). |
69 |
Além disso, decorre do considerando 2 do Regulamento n.o 1049/2001 que esta abertura permite conferir às instituições da União uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade perante os cidadãos da União num sistema democrático. Ao permitir que as divergências entre vários pontos de vista sejam abertamente debatidas, contribui, além disso, para aumentar a confiança desses cidadãos (Acórdão de 4 de setembro de 2018, ClientEarth/Comissão, C‑57/16 P, EU:C:2018:660, n.o 75 e jurisprudência referida). |
70 |
Para este efeito, o artigo 1.o deste regulamento prevê que este tem por objetivo conferir ao público um direito de acesso aos documentos das instituições da União que seja o mais amplo possível, sob reserva de um regime de exceções baseadas em razões de interesse público ou privado, as quais, uma vez que derrogam o princípio estabelecido neste artigo, devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (v., neste sentido, Acórdão de 4 de setembro de 2018, ClientEarth/Comissão (C‑57/16 P, EU:C:2018:660, n.os 76 a 78). |
71 |
Entre essas exceções ao direito de acesso, figura a enunciada no artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, nos termos do qual as instituições da União recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a proteção de «interesses comerciais das pessoas singulares ou coletivas, incluindo a propriedade intelectual», exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação. |
72 |
O regime das exceções previsto nesse artigo 4.o assenta, portanto, numa ponderação dos interesses em confronto numa determinada situação: por um lado, os interesses que são favorecidos pela divulgação dos documentos em questão e, por outro, os que são ameaçados por essa divulgação, pelo que a decisão tomada sobre um pedido de acesso a documentos depende da questão de saber qual o interesse que deve prevalecer no caso concreto (Acórdãos de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 42, e de 27 de fevereiro de 2014, Comissão/EnBW, C‑365/12 P, EU:C:2014:112, n.o 63). |
73 |
Importa verificar, no caso em apreço, se o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao efetuar essa ponderação e ao recusar qualificar os interesses invocados pelo recorrente de interesses públicos superiores que justificam a divulgação dos documentos em causa. |
74 |
A este respeito, importa antes de mais salientar que foi com razão que o Tribunal Geral enunciou, no n.o 187 do acórdão recorrido, que cabe a quem alega a existência de um interesse público superior invocar, em concreto, as circunstâncias que justificam a divulgação dos documentos em causa (v., neste sentido, Acórdão de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 94). |
75 |
Foi também com razão que o Tribunal Geral recordou, no n.o 188 do acórdão recorrido, que, embora o interesse público superior suscetível de justificar a divulgação de um documento não tenha necessariamente de ser distinto dos princípios subjacentes ao Regulamento n.o 1049/2001, no entanto, apenas considerações gerais não podem ser suscetíveis de demonstrar que o princípio da transparência apresenta uma acuidade particular que poderia prevalecer sobre as razões justificativas da recusa de divulgação dos documentos (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.os 92 e 93; de 16 de julho de 2015, ClientEarth/Comissão, C‑612/13 P, EU:C:2015:486, n.os 92 e 93, e de 14 de julho de 2016, Sea Handling/Comissão, C‑271/15 P, EU:C:2016:557, n.o 95). |
76 |
Em primeiro lugar, há que observar que o fundamento do recurso assenta em parte em considerações gerais relativas à necessidade de publicar todas as informações relativas a projetos que beneficiam de um financiamento público e ao interesse científico ligado à publicação dos resultados de uma investigação tecnológica por força do «princípio da universalidade da ciência». |
77 |
A este respeito, importa salientar que a circunstância de um projeto de investigação beneficiar de um financiamento por fundos da União e ter por objeto o desenvolvimento de uma nova tecnologia é, em princípio, suscetível de revelar a existência de um interesse real do público no acesso aos documentos relativos a esse projeto. Todavia, como foi recordado no n.o 75 do presente acórdão, a exposição de tal motivo de ordem geral não basta para demonstrar que esse interesse deve necessariamente prevalecer sobre as razões justificativas da recusa de divulgação desses documentos. |
78 |
Em segundo lugar, há que observar que o Tribunal Geral não negou a existência de um interesse científico, mediático e do público em geral na difusão das informações relativas ao projeto iBorderCtrl, mas declarou, nos n.os 193, 197 e 200 do acórdão recorrido, que esse interesse era satisfeito pelo sistema de difusão dos resultados previsto pelo Regulamento n.o 1290/2013 e pela convenção de subvenção. |
79 |
O Tribunal Geral baseou‑se, por um lado, nos n.os 194 e 195 do acórdão recorrido, nas obrigações de publicação dos resultados que incumbem aos participantes no projeto e, por outro, no n.o 196 desse acórdão, nos direitos de acesso das instituições da União e dos Estados‑Membros às informações relativas aos resultados do projeto. |
80 |
Quanto às obrigações que incumbem aos participantes no projeto, o Tribunal Geral salientou, antes de mais, que o artigo 43.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1290/2013 e o artigo 29.1 da convenção de subvenção previam uma obrigação de esses participantes difundirem por meios adequados os resultados do projeto, sem prejuízo das restrições decorrentes, nomeadamente, da proteção dos direitos de propriedade intelectual, das regras em matéria de segurança extrínseca ou dos interesses legítimos. |
81 |
Além disso, o Tribunal Geral constatou que o alcance da obrigação de difusão dos resultados da investigação que incumbe aos referidos participantes era especificado pela convenção de subvenção. Referiu‑se ao artigo 29.2 desta convenção, que estipulava que deve ser garantido um livre acesso às publicações científicas dos resultados avaliados por pares, e ao artigo 38.2.1 da referida convenção, que previa que a REA podia, no respeito da confidencialidade das informações, utilizar as informações relativas ao projeto e os documentos, nomeadamente os resumos destinados à publicação e os elementos a fornecer ao público, para as suas atividades de comunicação e de publicidade. O Tribunal Geral mencionou igualmente o artigo 20.3, alínea a), iii), e o artigo 20.4, alínea a), da convenção de subvenção, segundo os quais os participantes deviam submeter à REA, com os relatórios periódicos técnicos e financeiros, os resumos contendo, nomeadamente, um panorama geral dos resultados e da sua difusão, destinados à publicação pela REA. |
82 |
No que respeita aos direitos de acesso às informações relativas aos resultados do projeto, o Tribunal Geral salientou, por um lado, que o artigo 4.o do Regulamento n.o 1290/2013 e o artigo 36.1 da convenção de subvenção previam, nas condições aí enunciadas, o acesso das instituições, dos órgãos e dos organismos da União e dos Estados‑Membros às informações relativas aos resultados obtidos por participantes que tenham recebido financiamento da União e, por outro, que o artigo 49.o deste regulamento assegurava às mesmas instituições, órgãos e organismos da União, bem como aos Estados‑Membros, direitos de acesso, para os fins de elaboração, execução e acompanhamento das políticas e dos programas da União, a esses resultados. |
83 |
Neste contexto, há que verificar se o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que os interesses públicos invocados pelo recorrente em apoio do seu pedido de divulgação estavam satisfeitos com o sistema de difusão dos resultados previsto pelo Regulamento n.o 1290/2013 e pela convenção de subvenção. |
84 |
Como foi recordado no n.o 79 do presente acórdão, o Tribunal Geral baseou‑se, antes de mais, nas obrigações de publicação dos resultados que incumbem aos participantes no projeto. |
85 |
A este respeito, há que salientar, primeiro, que, contrariamente ao que alega o recorrente, o Tribunal Geral não declarou que todas as informações relativas especificamente ao projeto iBorderCtrl, incluindo as relativas à sua legalidade e à sua aceitabilidade ética, podiam ser mantidas secretas. |
86 |
À luz do n.o 194 do acórdão recorrido, afigura‑se que o Tribunal Geral apenas declarou que a obrigação de difusão dos resultados da investigação que incumbe aos participantes no projeto, prevista no artigo 43.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1290/2013 e no artigo 29.1 da convenção de subvenção, era limitada pela proteção da propriedade intelectual, das regras de segurança ou dos interesses legítimos. |
87 |
No que respeita mais especificamente aos documentos relativos às implicações éticas e jurídicas do projeto, resulta dos n.os 113 a 118 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral só aprovou a decisão controvertida no que respeita aos que continham informações relativas às ferramentas e às tecnologias concretamente elaboradas pelos membros do consórcio no âmbito do projeto iBorderCtrl. Em contrapartida, o Tribunal Geral anulou essa decisão na parte em que tinha recusado o acesso às informações relativas à apreciação geral ética e jurídica de sistemas que utilizam meios tecnológicos inovadores, como a deteção automatizada das mentiras. |
88 |
Quanto ao argumento do recorrente de que os critérios desenvolvidos pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido levam a que toda uma série de documentos relativos aos resultados do projeto, entre os quais, em particular, os relativos aos resultados dos testes‑piloto, sejam mantidos secretos, o mesmo assenta numa extrapolação injustificada das constatações do Tribunal Geral para documentos diferentes dos que foram objeto do pedido de divulgação e, portanto, da decisão controvertida. |
89 |
Segundo, a argumentação do recorrente segundo a qual a obrigação de publicação que incumbe aos participantes no projeto não pode satisfazer o interesse público, uma vez que essa obrigação não permite a publicação das informações comerciais consideradas dignas de proteção, não pode ser acolhida. Com efeito, acolher esta argumentação equivale a presumir o primado dos interesses públicos invocados em apoio do pedido sobre os interesses que justificaram a recusa de divulgação, ao passo que, como recordado no n.o 74 do presente acórdão, cabe a quem alega a existência de um interesse público superior fazer a respetiva prova. |
90 |
Terceiro, a comparação feita pelo recorrente com projetos anteriores de investigação e desenvolvimento «semelhantes», que confirmam que as publicações dos participantes nesses projetos não permitem um debate público, procede de uma consideração geral, relativa a outros projetos, imprópria para demonstrar, no que respeita especificamente ao projeto iBorderCtrl, a insuficiência, à luz da exigência de transparência, das informações comunicadas com fundamento no Regulamento n.o 1290/2013 e na convenção de subvenção. |
91 |
Quarto, o recorrente não demonstra em que é que a análise do Tribunal Geral de que era possível realizar uma discussão pública esclarecida sobre os diferentes aspetos do projeto iBorderCtrl em fase de desenvolvimento com base nos resultados difundidos em aplicação desse regulamento e dessa convenção estaria viciada por um erro de direito. |
92 |
A este respeito, importa, antes de mais, observar que não resulta do acórdão recorrido que o Tribunal Geral tenha considerado que o Regulamento n.o 1049/2001 previa uma exceção geral ao direito de acesso à informação para os projetos de investigação e de desenvolvimento em curso. |
93 |
Em seguida, há que salientar que, com a sua argumentação, o recorrente invoca, em substância, a existência de um interesse público superior, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, último segmento de frase, do Regulamento n.o 1049/2001, em conhecer todas as informações relativas a todas as fases de um projeto de investigação tecnológica financiado por fundos públicos, que se sobrepõe sistematicamente aos interesses comerciais das empresas que participam nesse projeto. Esta argumentação só pode ser acolhida perante uma presunção de que se considera que tais informações apresentam um interesse público superior. Na falta dessa presunção, como foi recordado nos n.os 74 e 89 do presente acórdão, é ao recorrente que cabe invocar, em concreto, as circunstâncias que justificam a divulgação dos documentos em causa. |
94 |
A este respeito, há que constatar que nenhum elemento do fundamento é suscetível de demonstrar que é juridicamente errada a apreciação do Tribunal Geral, que figura no n.o 202 do acórdão recorrido, segundo a qual o recorrente não demonstrou que o princípio da transparência apresentava, no caso em apreço, uma acuidade particular que primasse sobre o interesse legítimo à proteção dos interesses comerciais dos membros do consórcio que participavam no projeto. |
95 |
Por conseguinte, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito na medida em que considerou que os interesses públicos invocados pelo recorrente podiam ser satisfeitos pelas obrigações de publicação dos resultados do projeto iBorderCtrl impostas aos participantes nesse projeto pelo artigo 43.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1290/2013, bem como pelo artigo 20.3., alínea a), iii), o artigo 20.4., alínea a), e os artigos 29.1, 29.2 e 38.2.1 da convenção de subvenção. |
96 |
Em contrapartida, o Tribunal Geral considerou erradamente, no n.o 196 do acórdão recorrido, que esses interesses eram garantidos pelos direitos de colocação à disposição e de acesso previstos em benefício das instituições, órgãos e organismos da União, bem como dos Estados‑Membros, pelos artigos 4.o e 49.o do Regulamento n.o 1290/2013, bem como pelo artigo 36.1 da convenção de subvenção, ao passo que, por um lado, esses direitos e, por outro, o direito de acesso aos documentos previsto no Regulamento n.o 1049/2001 não têm os mesmos beneficiários nem as mesmas finalidades. |
97 |
Com efeito, por força do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), e n.o 2, do Regulamento n.o 1290/2013, o direito de colocação à disponibilização de informações na posse da Comissão sobre os resultados gerados por um participante no âmbito de uma ação que tenha beneficiado de financiamento da União está reservado às instituições, aos órgãos e aos organismos da União, bem como aos Estados‑Membros. Apenas lhes permite aceder, mediante pedido, às informações que sejam pertinentes para efeitos da política pública, as quais, uma vez comunicadas, permanecem confidenciais, a menos que se tornem públicas ou sejam postas à disposição do público pelos participantes. Do mesmo modo, resulta do artigo 49.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1290/2013 que os direitos de acesso aos resultados de um participante que tenha beneficiado de um financiamento da União previstos por esta disposição são reservados às instituições, aos órgãos e aos organismos da União, unicamente para «fins devidamente justificados de elaboração, execução e acompanhamento das políticas e programas da União». |
98 |
Pelo contrário, o direito de acesso previsto no Regulamento n.o 1049/2001 é reconhecido, por força do artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento, a todos os cidadãos da União e a todas as pessoas singulares ou coletivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro. Além disso, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do referido regulamento, o requerente não é obrigado a declarar as razões do pedido. |
99 |
Como alega com razão o recorrente, o direito de disponibilização previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 1290/2013 não pode, portanto, satisfazer o interesse público invocado em apoio de um pedido de acesso aos documentos apresentado com base no Regulamento n.o 1049/2001 por um cidadão da União ou por uma pessoa singular ou coletiva que resida ou tenha a sua sede social num Estado‑Membro. |
100 |
Todavia, os fundamentos expostos pelo Tribunal Geral no n.o 196 do acórdão recorrido são subsidiários relativamente aos enunciados nos seus n.os 194 e 195, tendo o Tribunal Geral considerado acertadamente, como resulta dos n.os 84 a 95 do presente acórdão, que os interesses públicos invocados pelo recorrente podiam ser satisfeitos pelas obrigações de publicação impostas aos participantes nos projetos de investigação pelo artigo 43.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1290/2013 e pelo artigo 20.3, alínea a), iii), pelo artigo 20.4, alínea a), bem como pelos artigos 29.1, 29.2 e 38.2.1 da convenção de subvenção. Com efeito, tais obrigações, diretamente impostas a esses participantes, permitem tornar públicas as informações relativas aos resultados das pesquisas, independentemente das eventuais ações de difusão que possam ser levadas a cabo pela União ou pelos Estados‑Membros na sequência do exercício do seu direito de acesso a essas informações. |
101 |
Por conseguinte, o argumento apresentado pelo recorrente a este respeito destina‑se a ser rejeitado. Com efeito, em conformidade com jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, no âmbito de um recurso, um fundamento dirigido contra um fundamento do acórdão recorrido, cuja parte decisória se baseia de forma juridicamente bastante noutros fundamentos, é inoperante e deve, por conseguinte, ser rejeitado (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de maio de 2003, T. Port/Comissão, C‑122/01 P, EU:C:2003:259, n.o 17 e jurisprudência referida, e de 6 de outubro de 2021, Banco Santander/Comissão, C‑52/19 P, EU:C:2021:794, n.o 127). |
102 |
Em terceiro lugar, no que respeita ao argumento do recorrente que assenta na existência de um interesse público superior resultante das violações que o projeto iBorderCtrl seria suscetível de causar aos direitos fundamentais, o Tribunal Geral rejeitou este argumento ao considerar, no n.o 198 do acórdão recorrido, que as disposições pertinentes aplicáveis aos projetos de investigação e inovação financiados a título do programa Horizonte 2020 impunham aos participantes a obrigação de respeitar os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos, em particular, pela Carta, e à Comissão uma obrigação de garantir o respeito desses direitos e princípios. O Tribunal Geral acrescentou que essas exigências estavam, aliás, refletidas no facto de as avaliações jurídicas e éticas do projeto iBorderCtrl estarem especificamente incluídas nas etapas obrigatórias do seu desenvolvimento, uma vez que as próprias questões éticas eram supervisionadas por um conselheiro em ética independente. |
103 |
O Tribunal Geral referiu‑se, nomeadamente, ao artigo 19.o do Regulamento n.o 1291/2013, ao artigo 14.o do Regulamento n.o 1290/2013, lido à luz do seu considerando 9, e ao artigo 34.o da convenção de subvenção. |
104 |
Ao fazê‑lo, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito. |
105 |
Com efeito, a circunstância de os participantes no projeto iBorderCtrl serem obrigados a respeitar os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos, em particular, pela Carta, e de a Comissão ser intimada a garantir o respeito desses direitos e princípios, não é suscetível de fazer presumir a inexistência de violação dos referidos direitos e princípios e de afastar a existência de um interesse público superior atinente à divulgação dos documentos relativos a esse projeto devido às possíveis incidências técnicas utilizadas na proteção dos direitos fundamentais. |
106 |
Embora traduza a importância atribuída pelo legislador da União à preservação destes últimos direitos, a recordação da obrigação de os participantes no projeto respeitarem os direitos fundamentais e da obrigação da Comissão de garantir o respeito desses direitos não pode justificar que terceiros sejam privados da possibilidade de pedir acesso a esses documentos a fim de, nomeadamente, verificar se os participantes no projeto e as instituições da União respeitaram as suas respetivas obrigações. |
107 |
No entanto, o fundamento enunciado no n.o 198 do acórdão recorrido tem caráter supérfluo. |
108 |
Com efeito, o Tribunal Geral constatou no n.o 199 desse acórdão, por um lado, que o recorrente não alegava que os direitos fundamentais das pessoas que participavam nos testes‑piloto no âmbito do projeto iBorderCtrl não tinham sido respeitados e, por outro, que o interesse público que invocava, que dizia respeito, na realidade, a uma eventual implantação futura em condições reais dos sistemas baseados em técnicas e tecnologias desenvolvidas no âmbito desse projeto, era satisfeito pela difusão dos resultados nas condições determinadas pelo Regulamento n.o 1290/2013 e pela convenção de subvenção. |
109 |
Ora, o recorrente não invoca uma desvirtuação dos seus próprios argumentos em primeira instância. |
110 |
Por outro lado, pelas razões expostas nos n.os 84 a 95 do presente acórdão, não se pode acusar o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao considerar que, na medida em que o projeto iBorderCtrl era apenas um projeto de investigação em fase de desenvolvimento, que tinha por único objetivo experimentar tecnologias, o interesse público invocado pelo recorrente podia ser satisfeito pela difusão dos resultados do projeto nas condições determinadas pelo Regulamento n.o 1290/2013 e pela convenção de subvenção. |
111 |
Decorre de todas as considerações precedentes que o fundamento deve ser julgado parcialmente inoperante e parcialmente improcedente. |
112 |
Por conseguinte, há que negar provimento ao recurso. |
Quanto às despesas
113 |
Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. |
114 |
Tendo a REA pedido a condenação do recorrente nas despesas e tendo este último sido vencido, há que condená‑lo a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela REA. |
115 |
Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste, a Comissão, que interveio no litígio, suportará as suas próprias despesas. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) decide: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.