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Document 62022CJ0133
Judgment of the Court (Third Chamber) of 28 September 2023.#LACD GmbH v BB Sport GmbH & Co. KG.#Request for a preliminary ruling from the Bundesgerichtshof.#Reference for a preliminary ruling – Consumer protection – Directive 2011/83/EU – Point 14 of Article 2 – Directive (EU) 2019/771 – Point 12 of Article 2 – Commercial guarantee – Specifications or any other requirements not related to the conformity of the goods sold, set out in the guarantee statement or in the relevant advertising – Undertaking by a guarantor in respect of the consumer’s satisfaction with the goods purchased – Verification that the consumer is not satisfied.#Case C-133/22.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 28 de setembro de 2023.
LACD GmbH contra BB Sport GmbH & Co. KG.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof.
Reenvio prejudicial — Proteção dos consumidores — Diretiva 2011/83/UE — Artigo 2.o, ponto 14 — Diretiva (UE) 2019/771 — Artigo 2.o, ponto 12 — Garantia comercial — Especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade do bem adquirido, estabelecido na declaração de garantia ou na respetiva publicidade — Compromisso de um garante relativo à satisfação do consumidor em causa com o produto adquirido — Verificação da insatisfação deste consumidor.
Processo C-133/22.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 28 de setembro de 2023.
LACD GmbH contra BB Sport GmbH & Co. KG.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof.
Reenvio prejudicial — Proteção dos consumidores — Diretiva 2011/83/UE — Artigo 2.o, ponto 14 — Diretiva (UE) 2019/771 — Artigo 2.o, ponto 12 — Garantia comercial — Especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade do bem adquirido, estabelecido na declaração de garantia ou na respetiva publicidade — Compromisso de um garante relativo à satisfação do consumidor em causa com o produto adquirido — Verificação da insatisfação deste consumidor.
Processo C-133/22.
Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:710
*A9* Bundesgerichtshof, beschluss vom 10/02/2022 (I ZR 38/21)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)
28 de setembro de 2023 ( *1 )
«Reenvio prejudicial — Proteção dos consumidores — Diretiva 2011/83/UE — Artigo 2.o, ponto 14 — Diretiva (UE) 2019/771 — Artigo 2.o, ponto 12 — Garantia comercial — Especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade do bem adquirido, estabelecido na declaração de garantia ou na respetiva publicidade — Compromisso de um garante relativo à satisfação do consumidor em causa com o produto adquirido — Verificação da insatisfação deste consumidor»
No processo C‑133/22,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal, Alemanha), por Decisão de 10 de fevereiro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de fevereiro de 2022, no processo
LACD GmbH
contra
BB Sport GmbH & Co. KG,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),
composto por: K. Jürimäe, presidente de secção, M. Safjan, N. Piçarra (relator), N. Jääskinen e M. Gavalec, juízes,
advogado‑geral: P. Pikamäe,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
— |
em representação de LACD GmbH, por S. Kuhn, Rechtsanwalt, |
— |
em representação de BB Sport GmbH & Co. KG, por C. Rohnke, Rechtsanwalt, |
— |
em representação da Comissão Europeia, por M. Noll‑Ehlers, I. Rubene e N. Ruiz García, na qualidade de agentes, |
ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de março de 2023,
profere o presente
Acórdão
1 |
O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores, que altera a Diretiva 93/13/CEE do Conselho e a Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga a Diretiva 85/577/CEE do Conselho e a Diretiva 97/7/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2011, L 304, p. 64), bem como do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva (UE) 2019/771 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019, relativa a certos aspetos dos contratos de compra e venda de bens que altera o Regulamento (UE) 2017/2394 e a Diretiva 2009/22/CE e que revoga a Diretiva 1999/44/CE (JO 2019, L 136, p. 28). |
2 |
Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a LACD GmbH à BB Sport GmbH & Co. KG a respeito da legalidade de uma declaração aposta em produtos comercializados pela LACD. |
Quadro jurídico
Direito da União
Diretiva 2011/83
3 |
Os considerandos 4, 5 e 7 da Diretiva 2011/83 dispõem:
[…]
|
4 |
Nos termos do artigo 1.o dessa diretiva, a mesma tem por objeto «contribuir, graças à consecução de um elevado nível de defesa dos consumidores, para o bom funcionamento do mercado interno através da aproximação de certos aspetos das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros relativas aos contratos celebrados entre consumidores e profissionais». |
5 |
O artigo 2.o, ponto 14, da referida diretiva define o conceito de «garantia comercial» como «qualquer compromisso assumido pelo profissional ou pelo produtor (o “garante”) perante o consumidor, para além das suas obrigações legais no tocante à garantia de conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar‑se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade [estabelecido] na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato». |
6 |
O artigo 6.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Requisitos de informação dos contratos celebrados à distância e dos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial», prevê, no seu n.o 1: «Antes de o consumidor ficar vinculado por um contrato à distância ou celebrado fora do estabelecimento comercial ou por uma proposta correspondente, o profissional faculta ao consumidor, de forma clara e compreensível, as seguintes informações: […]
[…]» |
Diretiva 2019/771
7 |
Em conformidade com o artigo 1.o da Diretiva 2019/771, esta «tem por objetivo contribuir para o bom funcionamento do mercado interno, garantindo simultaneamente um nível elevado de proteção dos consumidores […]» |
8 |
O artigo 2.o, ponto 12, desta diretiva define o conceito de «garantia comercial» como «um compromisso assumido pelo vendedor ou pelo produtor (“garante”) perante o consumidor, para além das obrigações legais do vendedor relativas à garantia de conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar‑se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecidos na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada na celebração do contrato ou antes desta». |
9 |
O artigo 24.o da referida diretiva prevê, no seu n.o 2, que as suas disposições não se aplicam aos contratos celebrados antes de 1 de janeiro de 2022. |
Direito alemão
10 |
Nos termos do § 443, n.o 1, do Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Código Civil»), o compromisso específico assumido pelo vendedor, produtor ou outro terceiro numa declaração ou publicidade, divulgada no momento ou anteriormente à celebração do contrato de compra e venda, constitui uma garantia para além das suas obrigações legais no tocante à garantia de conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar‑se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecidos na declaração de garantia ou na respetiva publicidade. |
11 |
O § 479, n.o 1, deste código prevê, por um lado, que uma declaração de garantia, na aceção do artigo 443.o do referido código, deve ser redigida em termos claros e inteligíveis e, por outro, enumera os elementos que essa declaração deve conter. |
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
12 |
A LACD vende, através de retalhistas e de comerciantes em linha, artigos de desporto e de fitness sob a marca LACD. Apôs nas suas t‑shirts, pelo menos até 2013, etiquetas («Hang‑Tags») com o seguinte texto (a seguir «declaração LACD»): «Garantia LACD Cada produto LACD tem a nossa garantia vitalícia própria. Se não estiver inteiramente satisfeito com algum dos nossos produtos, queira devolvê‑lo ao revendedor a quem o comprou. Pode igualmente devolvê‑lo diretamente à LACD, mas não se esqueça de nos indicar onde e quando o adquiriu.» |
13 |
Em agosto de 2018, a BB Sport, que também vende artigos de desporto e de fitness, comprou em linha, por intermédio de uma cliente «mistério» («Testkäuferin»), duas t‑shirts da marca LACD nas quais estavam apostas etiquetas com a declaração LACD. |
14 |
Por considerar que as informações constantes dessas etiquetas não cumpriam os requisitos legais aplicáveis a uma declaração de garantia, na aceção dos §§ 443 e 479 do Código Civil, a BB Sport intentou uma ação no Landgericht München I (Tribunal Regional de Munique I, Alemanha), pedindo que a LACD fosse condenada a cessar de apor essas etiquetas nos seus produtos de vestuário. Uma vez que o referido órgão jurisdicional julgou a ação improcedente, a BB Sport interpôs recurso no Oberlandesgericht München (Tribunal Regional Superior de Munique, Alemanha), que lhe deu provimento. |
15 |
A LACD interpôs então recurso de «Revision» no Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal, Alemanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio, que considera que a decisão do litígio no processo principal depende da interpretação tanto do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 como do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771, na medida em que a ação inibitória de uma prática comercial desleal baseada no risco de reincidência, como a proposta no processo principal, só pode ser julgada procedente se o comportamento censurado à demandada no processo principal for contrário ao direito da concorrência em vigor não apenas à data dos factos mas também à data da decisão que se pronunciou sobre o recurso de «Revision». |
16 |
Este órgão jurisdicional começa por salientar que a constatação da violação, pela LACD, das obrigações de informação previstas no § 479, n.o 1, do Código Civil pressupõe que o compromisso de retoma do produto de vestuário em caso de insatisfação do consumidor, contido na declaração LACD, constitui uma «garantia», na aceção do § 443, n.o 1, deste código, disposição que transpôs para o direito alemão o conceito de «garantia» previsto na Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas (JO 1999, L 171, p. 12), e que, desde 1 de janeiro de 2022, tem fundamento no artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771. |
17 |
O órgão jurisdicional de reenvio considera que, mesmo que a «satisfação do consumidor com o bem adquirido» não se enquadre nas «especificações do bem adquirido», pode, no entanto, constituir «qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade», na aceção do § 443, n.o 1, do Código Civil. Aquele órgão jurisdicional precisa que este segundo critério foi aditado a esta disposição com efeitos a partir de 13 de junho de 2014, a fim de transpor para o direito alemão o conceito de «garantia comercial» que figura no artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83. |
18 |
Segundo aquele órgão jurisdicional, nem a redação nem o contexto deste artigo 2.o, ponto 14, ou do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771 permitem deduzir, sem ambiguidade, que a «insatisfação do consumidor com o bem adquirido» constitui um «qualquer elemento não relacionado com a conformidade enunciado na declaração de garantia», na aceção destas disposições, cuja prova é suscetível de implicar o reembolso do preço pago, substituir, reparar ou ocupar‑se de qualquer modo do referido bem, sem que essa insatisfação deva decorrer do seu estado ou das suas características. |
19 |
No entanto, uma vez que o objetivo de garantir um nível elevado de proteção dos consumidores, conforme previsto nas Diretivas 2011/83 e 2019/771, favorece tal interpretação, o referido órgão jurisdicional interroga‑se sobre a questão de saber se esta «insatisfação do consumidor com o produto adquirido» deve ser comprovada para a implementação da «garantia comercial», na aceção do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 e do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771. |
20 |
Foi nestas circunstâncias que o Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
|
Quanto ao pedido de reabertura da fase oral do processo
21 |
Na sequência da leitura das Conclusões do advogado‑geral, em 9 de março de 2023, a LACD, por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 6 de abril de 2023, pediu a reabertura da fase oral, nos termos do artigo 83.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. Em apoio deste pedido, a LACD alega, por um lado, que o advogado‑geral ignorou que esta não explora uma loja virtual. Por outro lado, a LACD insiste na pertinência da interpretação do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771, pedida pelo órgão jurisdicional de reenvio. |
22 |
Importa recordar que, ao abrigo do artigo 252.o, segundo parágrafo, TFUE, cabe ao advogado‑geral apresentar publicamente, com toda a imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas que, nos termos do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, requeiram a sua intervenção. O Tribunal de Justiça não está vinculado nem por essas conclusões nem pela fundamentação em que o advogado‑geral baseia essas conclusões. Além disso, nem o Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia nem o Regulamento de Processo preveem a possibilidade de as partes apresentarem observações em resposta às conclusões apresentadas pelo advogado‑geral. Por conseguinte, o desacordo de uma parte com as conclusões do advogado‑geral, não constitui, em si, um fundamento que justifique a reabertura da fase oral do processo (Acórdão de 21 de outubro de 2021, Beeren‑, Wild‑, Feinfrucht, C‑825/19, EU:C:2021:869, n.os 24 a 26 e jurisprudência referida). |
23 |
No caso em apreço, uma vez que, como salientado no n.o 21 do presente acórdão, a LACD se limita a contestar certas passagens das conclusões do advogado‑geral e a apresentar observações sobre o conteúdo destas, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo. |
Quanto às questões prejudiciais
24 |
A título preliminar, na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio pede a interpretação do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771, importa observar que esta diretiva, em conformidade com o seu artigo 24.o, n.o 2, não se aplica aos contratos celebrados antes de 1 de janeiro de 2022. Ora, resulta da decisão de reenvio que o contrato relativo à venda das t‑shirts em causa no processo principal foi celebrado em agosto de 2018. |
25 |
Nestas condições, há que examinar em conjunto as duas questões através das quais o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «garantia comercial» inclui, como «qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecido na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato», um compromisso assumido por um garante perante o consumidor em causa, relativamente a circunstâncias específicas à pessoa deste último, como a sua satisfação com o bem adquirido, deixada à sua própria discrição, e, em caso afirmativo, de que forma essas circunstâncias devem ser comprovadas para executar essa garantia comercial. |
26 |
O artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 define o conceito de «garantia comercial» como «qualquer compromisso assumido pelo profissional ou pelo produtor (o “garante”) perante o consumidor, para além das suas obrigações legais no tocante à garantia de conformidade, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar‑se de qualquer modo de um bem, no caso de este não ser conforme com as especificações ou qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecidos na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato». |
27 |
A este respeito, importa salientar, antes de mais, que a redação do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 não contém nenhum elemento que permita excluir do seu âmbito de aplicação um compromisso de um garante relativo à «satisfação do consumidor com o bem adquirido», deixado à apreciação subjetiva desse consumidor. |
28 |
Com efeito, por um lado, esta disposição faz referência a «qualquer compromisso» de um garante perante o consumidor em causa, «para além das suas obrigações legais no tocante à garantia de conformidade». Por outro lado, como salientou o advogado‑geral no n.o 30 das suas conclusões, a expressão neutra e genérica «qualquer outro elemento» é suscetível de incluir os casos de insatisfação das expectativas subjetivas desse consumidor em relação ao bem adquirido, independentemente de qualquer consideração objetiva relacionada com as características ou qualidades deste bem. |
29 |
Em seguida, a comunicação das informações relativas à «garantia comercial» faz parte, como resulta, nomeadamente, do artigo 6.o, n.o 1, alínea m), da Diretiva 2011/83, das obrigações desta diretiva que visam assegurar a informação pré‑contratual do consumidor em causa. Assim, este artigo 6.o impõe a qualquer profissional que faculte a esse consumidor, de forma clara e compreensível, antes que este último fique vinculado por um contrato à distância, por um contrato celebrado fora do estabelecimento comercial, ou por uma proposta correspondente, as informações relativas à existência, se for caso disso, de garantias comerciais, bem como as respetivas condições. |
30 |
Ora, uma interpretação do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 segundo a qual o conceito de «garantia comercial» inclui o compromisso de um profissional relativo à «satisfação do consumidor em causa com o produto adquirido» é conforme com o objetivo, prosseguido por esta diretiva, de assegurar um nível elevado de proteção dos consumidores garantindo a informação e a segurança destes últimos nas transações com os profissionais, conforme consagrado no artigo 1.o da referida diretiva, lido à luz dos seus considerandos 4, 5 e 7. Com efeito, esta interpretação permite a esse consumidor, por um lado, tomar conhecimento do compromisso desse profissional e conhecer melhor, previamente, as condições do contrato que pretende celebrar para tomar, de forma esclarecida, a decisão de celebrar ou não esse contrato e, por outro, obter do referido profissional o reembolso do preço de compra mediante uma simples declaração de não satisfação, o que reforça o seu nível de proteção em relação ao mesmo profissional. |
31 |
Por outro lado, o compromisso de um profissional de retomar o bem adquirido em caso de insatisfação do consumidor em causa constitui uma expressão da liberdade de empresa desse profissional, consagrada no artigo 16.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que também deve ser respeitada quando da interpretação da Diretiva 2011/83 à luz do objetivo enunciado no seu considerando 4 de assegurar um justo equilíbrio entre um elevado nível de defesa dos consumidores e a competitividade das empresas (v., neste sentido, Acórdão de 5 de maio de 2022, Victorinox,C‑179/21, EU:C:2022:353, n.o 39 e jurisprudência referida). |
32 |
Por último, a questão de saber se uma eventual insatisfação do consumidor em causa com o bem adquirido deve ser determinada de forma objetiva só pode receber uma resposta negativa, como salientou o advogado‑geral no n.o 48 das suas conclusões. Efetivamente, a não satisfação das expectativas subjetivas desse consumidor em relação a esse bem não pode, por definição, ser objeto de uma verificação objetiva. A simples afirmação nesse sentido do referido consumidor deve, por conseguinte, ser considerada suficiente. |
33 |
À luz dos fundamentos anteriores, há que responder às questões submetidas que o artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «garantia comercial» inclui, como «qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecido na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato», um compromisso assumido por um garante perante o consumidor em causa, relativamente a circunstâncias específicas à pessoa deste último, como a sua satisfação com o bem adquirido, deixada à sua própria discrição, sem que a existência dessas circunstâncias deva ser verificada de forma objetiva a fim de executar essa garantia comercial. |
34 |
Tendo em conta, como se concluiu no n.o 15 do presente acórdão, que o órgão jurisdicional de reenvio indica que será levado a tomar igualmente em consideração o artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771 para examinar a legalidade da declaração LACD, há que acrescentar que a interpretação, efetuada no número anterior do presente acórdão, do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83 é válida para a interpretação do artigo 2.o, ponto 12, da Diretiva 2019/771, uma vez que o conceito de «garantia comercial» está definido de forma quase idêntica em ambas as disposições e que, à semelhança da Diretiva 2011/83, a Diretiva 2019/771, como resulta do seu artigo 1.o, visa assegurar um elevado nível de defesa dos consumidores. |
Quanto às despesas
35 |
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara: |
O artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores, que altera a Diretiva 93/13/CEE do Conselho e a Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga a Diretiva 85/577/CEE do Conselho e a Diretiva 97/7/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, |
deve ser interpretado no sentido de que: |
o conceito de «garantia comercial» inclui, como «qualquer outro elemento não relacionado com a conformidade estabelecido na declaração de garantia ou na respetiva publicidade divulgada aquando ou antes da celebração do contrato», um compromisso assumido por um garante perante o consumidor em causa, relativamente a circunstâncias específicas à pessoa deste último, como a sua satisfação com o bem adquirido, deixada à sua própria discrição, sem que a existência dessas circunstâncias deva ser verificada de forma objetiva a fim de executar essa garantia comercial. |
Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.