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Document 62022CC0547

    Conclusões do advogado-geral Collins apresentadas em 7 de dezembro de 2023.


    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:967

     CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    ANTHONY MICHAEL COLLINS

    apresentadas em 7 de dezembro de 2023 ( 1 )

    Processo C‑547/22

    INGSTEEL spol. s. r. o.

    contra

    Úrad pre verejné obstarávanie

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Okresný súd Bratislava II (Tribunal de Primeira Instância de Bratislava II, Eslováquia)]

    «Reenvio prejudicial — Contratos públicos — Recursos — Diretiva 89/665/CEE — Responsabilidade extracontratual dos Estados‑Membros — Ação de indemnização por violação do direito da União intentada por um proponente preterido — Quantificação — Lucros cessantes — Perda de oportunidade»

    I. Introdução

    1.

    O direito da União exige que os Estados‑Membros aceitem um pedido de indemnização por perda de oportunidade apresentado por um proponente excluído ilegalmente de um procedimento de adjudicação de um contrato público, quando esse procedimento tenha terminado e tenha sido celebrado um contrato com o adjudicatário? A resposta a esta questão exige que o Tribunal de Justiça determine se o direito dos Estados‑Membros regula a concessão de indemnizações a que se refere o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras de fornecimentos ( 2 ). Se assim for, o Tribunal de Justiça deve examinar as consequências da exigência de que essa legislação respeite o princípio da efetividade.

    II. Quadro jurídico

    A.   Direito da União

    2.

    O preâmbulo da Diretiva 89/665 contém o seguinte texto:

    «Considerando que, em determinados Estados‑Membros, a ausência de meios de recurso eficazes ou o número insuficiente dos meios de recurso existentes desencorajam as empresas comunitárias a tentar a sua sorte no Estado da entidade adjudicante em causa; que é conveniente, por isso, que os Estados‑Membros em questão obstem a essa situação;

    […]

    Considerando que é necessário assegurar que, em todos os Estados‑Membros, procedimentos apropriados permitam a anulação das decisões ilegais e a indemnização das pessoas lesadas por uma violação.»

    3.

    Por força do artigo 1.o, n.o 1, quarto parágrafo, da Diretiva 89/665:

    «Os Estados‑Membros adotam as medidas necessárias para assegurar que, no que se refere aos contratos abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2014/24/UE ou da Diretiva 2014/23/UE, as decisões das autoridades adjudicantes possam ser objeto de recursos eficazes […]».

    4.

    O artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665 prevê:

    «Os Estados‑Membros devem garantir o acesso ao recurso, de acordo com regras detalhadas que os Estados‑Membros podem estabelecer, a qualquer pessoa que tenha ou tenha tido interesse em obter um determinado contrato e que tenha sido, ou possa vir a ser, lesada por uma eventual violação.»

    5.

    Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 89/665:

    «Os Estados‑Membros asseguram que as medidas tomadas relativamente aos recursos a que se refere o artigo 1.o prevejam poderes para:

    […]

    c)

    Conceder indemnizações aos lesados por uma violação.»

    B.   Direito eslovaco

    6.

    O § 3, n.o 1, alínea a), da Zákon č. 514/2003 Z. z. o zodpovednosti za škodu spôsobenú pri výkone verejnej moci (Lei n.o 514/2003, relativa à Responsabilidade por Danos Causados no Exercício de Poderes Públicos, a seguir «Lei n.o 514/2003»), prevê que o Estado é responsável por um dano causado por autoridades públicas em resultado da adoção de uma decisão ilegal.

    7.

    Por força do § 5.o, n.o 1, da Lei n.o 514/2003, tem direito a uma indemnização a parte que tenha sofrido um prejuízo em resultado de uma decisão ilegal adotada nesse procedimento.

    8.

    O § 17, n.o 1, da Lei n.o 514/2003 estabelece que o dano efetivo e os lucros cessantes devem ser reparados, salvo disposições específicas em contrário.

    9.

    O § 442, n.o 1, da Zákon č. 40/1964 Zb. Občiansky zakonnik (Lei n.o 40/1964 relativa ao Código Civil; a seguir «Código Civil») prevê que, nas ações de indemnização, são tidos em conta na reparação dos danos o dano real e os lucros cessantes.

    10.

    A Zácon č. 25/2006 Z. z. o verejnom obstarávaní (Lei n.o 25/2006 relativa aos Contratos Públicos) não parece conter disposições específicas que regulem as ações de indemnização por danos decorrentes da adjudicação de contratos públicos.

    III. Litígio no processo principal, pedido de decisão prejudicial e tramitação processual no Tribunal de Justiça

    11.

    Em 2013, a Federação Eslovaca de Futebol publicou um anúncio de um concurso para a adjudicação de um contrato de construção, remodelação e modernização de estádios de futebol. A INGSTEEL spol s.r.o. (a seguir «Ingsteel»), uma empresa que exerce a sua atividade no setor da construção, participou nesse procedimento de adjudicação. A Federação Eslovaca de Futebol excluiu a Ingsteel desse procedimento por esta não ter cumprido os requisitos económicos e financeiros do concurso. A Ingsteel interpôs recurso com vista a impugnar a legalidade desta decisão, no decurso do qual o Najvyšší súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal da República Eslovaca) submeteu um pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça.

    12.

    No seu Acórdão de 13 de julho de 2017Ingsteel e Metrostav (C‑76/16, EU:C:2017:549), o Tribunal de Justiça declarou que a Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços ( 3 ), deve ser interpretada no sentido de que, quando um concurso exige a apresentação de uma declaração de uma instituição bancária, nos termos da qual esta se compromete a conceder crédito a um proponente, e as instituições bancárias a quem o proponente se dirige se recusam a apresentar essa declaração, pode ser permitido ao referido proponente provar a sua capacidade económica e financeira por outros meios adequados. Tendo em conta o acórdão do Tribunal de Justiça, o Najvyšší súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal da República Eslovaca) concluiu que a decisão de excluir a Ingsteel era ilegal e anulou‑a. Em seguida, remeteu o processo ao Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia) para que tomasse as medidas adequadas.

    13.

    Como o procedimento de adjudicação do contrato público tinha terminado e a entidade adjudicante tinha celebrado um contrato‑quadro com o adjudicatário, a Ingsteel intentou uma ação contra o Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia), na qual pedia, nomeadamente, uma indemnização pelos danos causados pela perda da oportunidade de ganhar o concurso. Alegou que a perda de oportunidade e os lucros cessantes constituem dois tipos diferentes de danos em que se pode fundamentar o pedido. Afigura‑se que, ao abrigo do direito eslovaco, o nível de prova para demonstrar que o dano é suficientemente previsível é inferior no que respeita aos pedidos por perda de oportunidade do que relativamente aos pedidos por lucros cessantes.

    14.

    O Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia) considera que o pedido de indemnização da Ingsteel é hipotético. Não havia garantia de que a Ingsteel teria sido selecionada como proponente com êxito ou que, caso tivesse sido selecionada, a entidade adjudicante teria celebrado um contrato com a mesma.

    15.

    O Okresný súd Bratislava II (Tribunal de Primeira Instância de Bratislava II, Eslováquia) questiona‑se sobre se a Diretiva 89/665 o obriga a admitir um pedido de indemnização por perda de oportunidade, apresentado por um proponente, quando um órgão jurisdicional anulou uma decisão de o excluir de um procedimento que conduziu à adjudicação de um contrato público e a entidade adjudicante celebrou um contrato com outro proponente. Este órgão jurisdicional decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    A prática de um órgão jurisdicional nacional, que aprecia um litígio que tem por objeto um pedido de reparação dos danos causados a um proponente ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público, segundo a qual é recusada a concessão de uma indemnização a título de perda de oportunidade (loss of opportunity), é compatível com o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), em conjugação com o artigo 2.o, n.os 6 e 7, da Diretiva [89/665]?

    2)

    A prática de um órgão jurisdicional nacional, que aprecia um litígio que tem por objeto um pedido de reparação dos danos causados a um proponente ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público, segundo a qual um pedido de lucros cessantes provocados pela impossibilidade de participar num contrato público não faz parte do pedido de indemnização, é compatível com o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), em conjugação com o artigo 2.o, n.os 6 e 7, da Diretiva [89/665]?»

    16.

    O Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia), os Governos Checo, Francês e Eslovaco e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas. Na audiência realizada em 20 de setembro de 2023, os Governos Checo e Austríaco e a Comissão apresentaram alegações orais e responderam às perguntas do Tribunal de Justiça.

    IV. Apreciação

    A.   Quanto à admissibilidade

    17.

    O Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia) apresenta duas razões pelas quais o Tribunal de Justiça deve declarar inadmissível o pedido de decisão prejudicial. Em primeiro lugar, uma vez que a Ingsteel participou no procedimento de adjudicação conjuntamente com a Metrostav a.s., que não é parte no processo submetido ao órgão jurisdicional de reenvio, não tem legitimidade para apresentar um pedido de indemnização. Em segundo lugar, visto que a Ingsteel pediu inicialmente uma indemnização por lucros cessantes e não por perda de oportunidade, não pode apresentar esse pedido nesta fase do processo no órgão jurisdicional de reenvio.

    18.

    O Governo Eslovaco também tem dúvidas quanto à admissibilidade das questões, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio parece perguntar ao Tribunal de Justiça se deve ser julgado procedente o pedido de indemnização da Ingsteel. Tanto o Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia) como o Governo Eslovaco assinalam que cabe exclusivamente ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se sobre o mérito do pedido da Ingsteel.

    19.

    Segundo jurisprudência constante, no âmbito da cooperação instituída no artigo 267.o TFUE, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal. Consequentemente, desde que as questões submetidas tenham por objeto a interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se ( 4 ). O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas ( 5 ).

    20.

    Com as questões do órgão jurisdicional de reenvio procura obter uma interpretação do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665. Tendo em conta os factos do processo, as questões que a decisão de reenvio suscita quanto à possibilidade de ser intentada uma ação de indemnização por perda da oportunidade de celebrar um contrato público não se afiguram hipotéticas. Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, nos termos do direito nacional, a Ingsteel tem legitimidade para intentar uma ação de indemnização por perda de oportunidade e quais as consequências, se as houver, que podem resultar da forma como apresentou o seu pedido. Por estas razões, aconselho o Tribunal de Justiça a julgar improcedentes as objeções deduzidas contra a admissibilidade das questões prejudiciais.

    B.   Quanto ao mérito

    1. Observações das partes

    21.

    O Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia) e os Governos Austríaco, Checo, Francês e Eslovaco sustentam que cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro determinar os critérios de avaliação dos danos que resultam de uma violação do direito da União no âmbito de um procedimento de adjudicação de um contrato público. As partes aceitam igualmente que essas disposições de direito nacional devem respeitar os princípios da equivalência e da efetividade. Uma vez que a Diretiva 89/665 apenas assegura uma harmonização mínima, não contém nenhuma orientação sobre os critérios que os órgãos jurisdicionais nacionais devem ter em conta para proceder a essa determinação. Daqui resulta que a Diretiva 89/665 não obriga os Estados‑Membros a preverem a reparação dos danos causados pela perda da oportunidade de obter a adjudicação de um contrato público.

    22.

    O Governo Checo sugere que o conceito de dano previsto na Diretiva 89/665 não é um conceito autónomo do direito da União. O Governo Francês concorda com esta sugestão. Sustenta que a sua abordagem é coerente com a jurisprudência relativa à responsabilidade extracontratual dos Estados‑Membros por violação do direito da União, segundo a qual a legislação de cada Estado‑Membro determina o alcance da indemnização e as normas relativas à avaliação de quaisquer prejuízos ou danos causados por essa infração.

    23.

    O Úrad pre verejné obstarávanie (Gabinete dos Contratos Públicos, Eslováquia) concorda com a Ingsteel que os lucros cessantes e a perda de oportunidade são conceitos distintos, consistindo esta última na perda da oportunidade de obter um contrato público ( 6 ). Alega que, nos termos do direito eslovaco, um proponente ilegalmente excluído que consiga demonstrar que tinha uma possibilidade real e suficientemente elevada de obter um contrato público pode ser indemnizado pela perda dessa oportunidade. Pelo contrário, o Governo Checo e o Governo Eslovaco entendem que a perda de oportunidade pode ser considerada um tipo de lucros cessantes. A principal diferença entre os dois conceitos reside no nível de prova exigido para comprovar a existência de um dano e a indemnização que pode ser concedida.

    24.

    Os Governos Austríaco, Checo e Eslovaco alegam que, embora possa dar alguma orientação, a jurisprudência relativa à responsabilidade extracontratual da União Europeia no domínio dos contratos públicos não pode ser transposta para a aplicação da Diretiva 89/665. Embora os órgãos jurisdicionais da União tenham, em alguns casos, concedido indemnizações por perda de oportunidade a proponentes que as instituições da União excluíram ilegalmente de procedimentos de adjudicação, os órgãos jurisdicionais da União rejeitaram tais pedidos na maioria dos casos, considerando que, para que seja recebida uma indemnização, qualquer perda de oportunidade deve ser real e não hipotética.

    25.

    A Comissão observa que, embora o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 imponha aos Estados‑Membros que prevejam a concessão de uma indemnização aos lesados por uma violação das regras da União em matéria de contratos públicos, não contém condições detalhadas quanto ao modo como essa exigência deve ser satisfeita. Uma vez que a Diretiva 89/665 assegura uma harmonização mínima, os Estados‑Membros continuam a ter a liberdade de conceder um grau de proteção mais elevado aos lesados por uma violação das regras em matéria de contratos públicos. Cabe a cada Estado‑Membro, em conformidade com o princípio da autonomia processual, estabelecer regras detalhadas que rejam as ações para a salvaguarda dos direitos que decorrem para os particulares do direito da União, desde que essas regras respeitem os princípios da equivalência e da efetividade. Visto que a Diretiva 89/665 procura assegurar a existência de recursos eficazes para garantir o respeito dos princípios subjacentes às regras em matéria de contratos públicos e, em última análise, do mercado interno, o princípio da efetividade é fundamental para a resolução do presente reenvio prejudicial.

    26.

    Segundo a Comissão, devido ao facto de a entidade adjudicante ter celebrado um contrato‑quadro com outro proponente, já não é possível corrigir a ilegalidade que afetou o procedimento de adjudicação no âmbito do processo submetido ao órgão jurisdicional de reenvio. Nestas circunstâncias, a concessão de uma indemnização é a única via de recurso eficaz de que dispõe o proponente que sofreu um prejuízo em resultado dessa ilegalidade. As legislações nacionais que não concedem a possibilidade de pedir uma indemnização pela perda da oportunidade de obter um contrato causada por essa ilegalidade privam a Ingsteel do acesso a uma via de recurso eficaz, o que é contrário à Diretiva 89/665.

    2. Análise

    27.

    As partes no processo no Tribunal de Justiça concordam que deve ser dada uma resposta única às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio. Uma vez que esta sugestão é válida, proponho que o Tribunal de Justiça reformule as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio no sentido de se perguntar se é contrária ao artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 a adoção de uma prática por um órgão jurisdicional nacional segundo a qual um proponente ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público regido por esta diretiva está impedido de pedir uma indemnização pela perda da oportunidade de obter esse contrato. Embora o órgão jurisdicional de reenvio peça ao Tribunal de Justiça que leia o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 em conjugação com o artigo 2.o, n.os 6 e 7, desta diretiva, a decisão de reenvio não indica que impacto, se algum impacto existir, destas últimas disposições na resolução das questões submetidas. E a decisão de reenvio também não indica se a República Eslovaca exerceu a opção prevista no artigo 2.o, n.o 6, da Diretiva 89/665, segundo a qual um órgão jurisdicional deve anular uma decisão alegadamente ilegal antes de poder ser pedida uma indemnização ( 7 ). O artigo 2.o, n.o 7, da Diretiva 89/665, que prevê que o direito interno determina os efeitos sobre o contrato celebrado na sequência de uma adjudicação do exercício dos poderes a que se refere o artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva, afigura‑se irrelevante ( 8 ). Nenhuma das partes que apresentaram observações escritas ou orais ao Tribunal de Justiça fez referência ao artigo 2.o, n.o 6 ou 7, da Diretiva 89/665 nem expôs nenhuma argumentação remetendo para o mesmo. Por conseguinte, sou de opinião que a questão reformulada em nada perde a sua pertinência com a omissão destas disposições.

    28.

    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, decorre normalmente da exigência de aplicação uniforme do direito da União que, salvo quando uma disposição deste remeta para o direito dos Estados‑Membros no que respeita à descrição de um conceito jurídico, este último deve ser objeto de interpretação autónoma e uniforme. Esta interpretação deve ser alcançada tendo em conta a redação da disposição em questão, bem como o contexto em que se insere e o objetivo prosseguido pela legislação de que faz parte ( 9 ).

    29.

    Importa salientar que esta abordagem não se aplica a todos os casos. A este respeito, vários Estados‑Membros sustentam que o conceito de dano previsto na Diretiva 89/665 não é um conceito autónomo do direito da União. Concordo com esta posição pelos motivos que passo a expor.

    30.

    O artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 esclarece que os Estados‑Membros são obrigados a assegurar que os recursos prevejam poderes para conceder indemnizações aos lesados por uma violação. Não descreve em que consistem esses danos, nem fornece orientações sobre a forma como podem ser avaliados ( 10 ). Também não prevê as condições em que uma entidade adjudicante pode ser obrigada a pagar uma indemnização, nem indica a forma de calcular essa indemnização ( 11 ).

    31.

    O contexto em que se insere o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 inclui o respetivo preâmbulo, que afirma que cabe aos Estados‑Membros corrigir as faltas ou insuficiências das vias de recurso existentes nos seus sistemas jurídicos. O artigo 1.o, n.o 1, quarto parágrafo, da mesma diretiva prevê que os Estados‑Membros adotem as medidas necessárias para assegurar que as decisões das autoridades adjudicantes sejam objeto de recursos eficazes. O artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665 declara que os Estados‑Membros devem garantir o acesso ao recurso, de acordo com regras detalhadas que esses Estados podem estabelecer. Essas disposições demonstram que a Diretiva 89/665 estabelece um sistema de harmonização mínima, segundo o qual os Estados‑Membros são responsáveis pela forma e pela natureza das vias de recurso que devem estar acessíveis no âmbito de um recurso da adjudicação de contratos públicos ( 12 ). As partes que apresentaram observações concordam que a jurisprudência sustenta esta conclusão ( 13 ). Por conseguinte, a Diretiva 89/665 impõe aos Estados‑Membros que prevejam determinadas vias de recurso, que devem ser eficazes, mas não pretende definir quais são essas vias de recurso ( 14 ).

    32.

    No que diz respeito aos objetivos da Diretiva 89/665, o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 89/665, em conjugação com o respetivo preâmbulo, indica que esta diretiva procura assegurar a existência de procedimentos eficazes para o recurso das decisões relativas a contratos públicos. As pessoas afetadas por violações das disposições de direito nacional que transpõem as diretivas da União em matéria de contratos públicos devem ter acesso a vias de recurso eficazes ao abrigo do direito nacional, para que resultem efeitos concretos da abertura à concorrência, à escala da União, dos procedimentos de adjudicação de contratos públicos.

    33.

    Daqui decorre que a concessão de indemnizações para efeitos da Diretiva 89/665 não pretende ser um conceito independente e uniforme do direito da União, mas sim um conceito definido pelo direito dos Estados‑Membros. A Diretiva 89/665 salienta o resultado que o processo deve atingir e não o conteúdo das normas a adotar para esse efeito, que serão inevitavelmente diferentes entre os Estados‑Membros. Neste contexto, constato que o legislador da União se absteve de alterar o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 89/665 ( 15 ). A jurisprudência também não procurou definir critérios detalhados para determinar a existência de um dano e a sua avaliação no âmbito da violação das regras que regem a adjudicação de contratos públicos.

    34.

    Na falta de disposições do direito da União para o efeito, cabe, portanto, à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro fixar os critérios de acordo com os quais o prejuízo causado por uma violação do direito da União nos procedimentos conducentes à adjudicação de contratos públicos deve ser avaliado ( 16 ). Como várias das partes no presente pedido de decisão prejudicial assinalaram, a meu ver corretamente, estas questões inserem‑se no âmbito da autonomia processual dos Estados‑Membros ( 17 ). É ponto assente que as modalidades processuais das ações destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos conferidos pelo direito da União não devem ser menos favoráveis do que as que respeitam a ações similares de direito interno (princípio da equivalência) e não devem tornar impossível ou excessivamente difícil, na prática, o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) ( 18 ).

    35.

    Duas outras considerações sustentam a conclusão segundo a qual a avaliação dos danos ao abrigo do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 89/665 deve ser tratada no âmbito da autonomia processual dos Estados‑Membros. Em primeiro lugar, esta autonomia é uma expressão prática do princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.o TUE, segundo o qual, nos domínios que não sejam da sua competência exclusiva, a União Europeia intervém apenas se e uma vez que os objetivos da ação considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados‑Membros. O segundo parágrafo do artigo 19.o, n.o 1, TUE, que determina que os Estados‑Membros devem estabelecer as vias de recurso que assegurem uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União, reconhece tacitamente a relevância deste princípio. Em segundo lugar, as tradições jurídicas, os procedimentos e as vias de recurso podem variar consideravelmente entre os Estados‑Membros. Na fase atual do desenvolvimento do direito da União, é difícil imaginar um regime homogéneo de vias de recurso que funcione de forma igualmente eficaz em todos os Estados‑Membros no domínio do direito dos contratos públicos ( 19 ). Não me surpreende, portanto, que, como se observa no n.o 33 das presentes conclusões, o legislador da União não tenha, até à data, procurado conceber tal sistema.

    36.

    Nas suas observações escritas e orais, a Comissão remeteu para os Acórdãos do Tribunal da EFTA proferidos nos processos Fosen‑Linjen I ( 20 ) e Fosen‑Linjen II ( 21 ), que examinaram a natureza da concessão de uma indemnização ao abrigo da Diretiva 89/665 no âmbito de um pedido de lucros cessantes. O Tribunal da EFTA considerou que, embora os processos de recurso exigidos pela Diretiva 89/665 devam ser tão uniformes quanto possível para todas as empresas do mercado interno, não devem ser homogéneos, nem idênticos, uma vez que a Diretiva 89/665 assegura uma harmonização mínima ( 22 ). Observou que a concessão de uma indemnização tem um triplo objetivo: i) reparar os prejuízos sofridos; ii) restabelecer a confiança na eficácia do quadro jurídico aplicável; e iii) dissuadir as entidades adjudicantes de atuarem ilegalmente, melhorando assim a sua conformidade ( 23 ). Uma vez que a Diretiva 89/665 não estabelece condições para a concessão de uma indemnização, cabe à ordem jurídica de cada Estado do EEE, em princípio, fixar os critérios de acordo com os quais podem ser avaliados os danos causados por uma violação do direito dos contratos públicos ( 24 ). Neste contexto, a ordem jurídica de cada Estado do EEE deve estabelecer normas, nomeadamente as relativas ao nexo de causalidade e ao ónus da prova ( 25 ). Estas disposições de direito nacional devem sempre respeitar os princípios da equivalência e da efetividade ( 26 ). Embora seja preferível que as infrações ao direito dos contratos públicos sejam corrigidas antes da celebração de um contrato público, em certos casos, a concessão de uma indemnização é a única via de recurso para essas infrações ( 27 ). Por estas razões, embora a Diretiva 89/665 não mencione qualquer tipo específico de danos, o Tribunal da EFTA interpretou‑a no sentido de que exige que os Estados do EEE permitam que as pessoas lesadas por uma violação do direito dos contratos públicos no decurso de um procedimento de adjudicação obtenham uma indemnização por lucros cessantes ( 28 ). Estes acórdãos indicam que o princípio da efetividade pode funcionar a fim de impedir que a legislação de um Estado‑Membro exclua liminarmente os pedidos respeitantes a determinados tipos de danos.

    37.

    Uma vez que o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 expressa o princípio da responsabilidade pelos danos causados aos particulares por violações do direito da União que sejam imputáveis ao Estado, que é inerente à ordem jurídica da União Europeia ( 29 ), é igualmente necessário, como sugere o Governo Francês nas suas observações escritas, examinar a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às condições gerais em que os Estados‑Membros incorrem em responsabilidade extracontratual por violações do direito da União.

    38.

    Desde o Acórdão de referência proferido no processo Francovich, constitui ponto assente que os particulares lesados por uma infração ao direito da União por um Estado‑Membro ou por uma das suas emanações têm direito a reparação desde que preencham três condições: i) a regra do direito da União infringida tem por objeto conferir direitos a essas pessoas; ii) a infração a essa regra é suficientemente caracterizada; e iii) existe um nexo de causalidade direto entre a infração e o alegado prejuízo ou dano ( 30 ). Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que, embora o direito dos particulares à reparação se funde diretamente no direito da União Europeia, é por referência ao regime jurídico nacional da responsabilidade que um Estado‑Membro repara as consequências do prejuízo causado pela sua violação ( 31 ). Cabe ao direito dos Estados‑Membros fixar as condições de fundo e de forma para a reparação do dano, sempre no respeito do princípio da efetividade ( 32 ).

    39.

    No Acórdão Brasserie du pêcheur, o Tribunal de Justiça aprofundou o exame dos critérios que regem a reparação ( 33 ). Concluiu que o direito da União não estabelece critérios específicos relativamente aos diferentes tipos de danos identificados pelos órgãos jurisdicionais de reenvio ( 34 ), que constituem uma matéria da competência do direito interno, sem prejuízo do respeito dos princípios da equivalência e da efetividade ( 35 ). Acrescentou que o direito da União não aceita a exclusão total, a título do prejuízo reparável, do lucro cessante, uma vez que tal exclusão seria contrária ao princípio da efetividade ( 36 ). Noutro processo em que estava em causa a responsabilidade extracontratual dos Estados‑Membros por violação do direito da União, o advogado‑geral P. Léger sugeriu que o prejuízo indemnizável pode consistir não só em lucros cessantes, mas também numa perda de oportunidades, desde que esta última seja uma consequência suficientemente certa da alegada violação ( 37 ). No domínio do direito do trabalho, o Tribunal de Justiça declarou que o direito de pedir uma indemnização por perda de oportunidades pode ser adequado para apagar as consequências de uma violação do direito da União e está em conformidade com o princípio da efetividade ( 38 ). Essas considerações demonstram que o âmbito da autonomia processual dos Estados‑Membros não é ilimitado, uma vez que o Tribunal de Justiça pode estabelecer obrigações específicas para garantir que os particulares lesados por uma violação do direito da União obtenham um nível mínimo de proteção.

    40.

    Os Governos Austríaco, Checo e Eslovaco alegam que a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais da União relativa à perda de oportunidade em consequência de ilegalidades na adjudicação de contratos públicos pelas instituições da União não é automaticamente aplicável às circunstâncias em que surgiu o presente reenvio prejudicial. Concordo com esta posição. Por alguma razão, as disposições que regem o recurso das adjudicações de contratos públicos pelas instituições da União e as que regem a adjudicação de contratos públicos pelas entidades adjudicantes são diferentes ( 39 ). Embora o Tribunal Geral tenha considerado que um proponente que tenha sido ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público por uma instituição da União pode pedir uma indemnização por perda de oportunidade ( 40 ), essa jurisprudência diz respeito à responsabilidade extracontratual da União Europeia e não à dos seus Estados‑Membros ( 41 ). Há que ter presente que o papel que os órgãos jurisdicionais da União desempenham nestas circunstâncias é semelhante ao que os órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros desempenham quando aplicam as respetivas regras processuais nacionais. É neste contexto específico que o direito da União é chamado a regular todos os aspetos do direito que rege a adjudicação de contratos públicos pelas instituições da União, incluindo a questão da referida responsabilidade extracontratual que possa surgir. A jurisprudência relativa à indemnização por violação, pelas instituições da União, do direito que rege a adjudicação de contratos públicos tende a demonstrar que os lucros cessantes e a perda de oportunidade são conceitos diferentes. Ao passo que os lucros cessantes são avaliados por referência à indemnização pela perda de um contrato, a perda de oportunidade consiste na compensação da perda de uma oportunidade de celebrar um contrato ( 42 ). O conceito de perda de oportunidade também parece ser reconhecido em ações de indemnização no âmbito do Estatuto dos Funcionários da União Europeia e da responsabilidade extracontratual da União ( 43 ).

    41.

    Tendo por base tanto os termos do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665 como os objetivos que esta diretiva prossegue, considerada no contexto dos princípios gerais que regem a responsabilidade extracontratual dos Estados‑Membros por violação do direito da União, pode concluir‑se que cabe ao direito dos Estados‑Membros definir os tipos de danos a título dos quais um proponente ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público pode pedir uma indemnização, desde que essas disposições de direito nacional respeitem os princípios da equivalência e da efetividade.

    42.

    Não resulta dos autos que no presente processo esteja em causa uma violação do princípio da equivalência. Resta saber se uma interpretação judicial da legislação nacional que não prevê a concessão de uma indemnização por perda de oportunidade está em conformidade com o princípio da efetividade, conforme definido no n.o 34 das presentes conclusões. Neste contexto, nem a eficácia da Diretiva 89/665, nem os direitos que ela confere aos particulares podem ser postos em causa ( 44 ). O Tribunal de Justiça declarou que as regras nacionais que subordinam a concessão de uma indemnização à prova da existência de culpa ou dolo imputável às entidades adjudicantes violam a Diretiva 89/665, uma vez que obstam à plena eficácia da política da União Europeia em matéria de contratos públicos ( 45 ).

    43.

    Quando um proponente obtém uma decisão judicial no sentido de que foi ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público, e a entidade adjudicante celebrou esse contrato com outro proponente, excluir qualquer possibilidade de pedir uma indemnização pela perda de uma oportunidade de obter esse contrato parece violar o princípio da efetividade. Esta situação é incompatível com o objetivo da Diretiva 89/665, que é o de garantir vias de recurso eficazes contra as decisões tomadas pelas entidades adjudicantes em violação do direito da União, uma vez que o lesado ficaria privado da via de recurso complementar prevista no artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 89/665, a saber, a concessão de uma indemnização. Cabe ao direito dos Estados‑Membros estabelecer as condições em que esse pedido pode ser formulado, incluindo o ónus e o nível de prova, o nexo de causalidade e o cálculo do montante da indemnização ( 46 ).

    44.

    O § 442.o, n.o 1, do Código Civil prevê que, nas ações de indemnização, na reparação dos danos são tidos em conta o dano real e os lucros cessantes. A decisão de reenvio parece dar a entender que a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais nacionais não prevê a concessão de uma indemnização por perda da oportunidade de obter um contrato público. O Governo Eslovaco alegou na audiência que, por força da legislação desse Estado‑Membro, a perda de oportunidade faz parte do conceito de lucros cessantes suscetível de fundamentar a concessão de uma indemnização, desde que o lesado possa demonstrar que havia uma elevada possibilidade de lhe ser adjudicado o contrato público.

    45.

    Sendo o órgão jurisdicional de reenvio o único competente para interpretar e aplicar a regulamentação nacional, cabe a este órgão jurisdicional interpretar, na medida do possível, as normas que regem os pedidos de indemnização para garantir o respeito do princípio da efetividade. Cabe ao órgão jurisdicional nacional dar à lei interna que deve aplicar, em toda a medida do possível, uma interpretação em conformidade com o direito da União. Esta interpretação está sujeita ao respeito de limites reconhecidos, nomeadamente a proibição de uma interpretação contra legem do direito nacional. Se um órgão jurisdicional nacional não puder alcançar uma tal interpretação, tem o dever de aplicar integralmente o direito da União a fim de proteger os direitos que este confere aos particulares, deixando, se necessário, de aplicar uma disposição nacional que conduza a um resultado contrário ao direito da União, desde que a disposição pertinente do direito da União tenha efeito direto ( 47 ). Neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou que a exigência de interpretação conforme pode obrigar os órgãos jurisdicionais nacionais a alterar uma jurisprudência assente, caso esta se baseie numa interpretação incompatível com o direito da União ( 48 ).

    V. Conclusão

    46.

    Proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais submetidas pelo Okresný súd Bratislava II (Tribunal Distrital de Bratislava II, Eslováquia) do seguinte modo:

    O artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras de fornecimentos

    deve ser interpretado no sentido de que:

    cabe ao direito dos Estados‑Membros determinar as condições em que um órgão jurisdicional nacional se pode pronunciar sobre um pedido de indemnização apresentado por um proponente ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público regido por esta diretiva. Estas condições incluem o ónus e o nível de prova, o nexo de causalidade e o cálculo do montante da indemnização. O direito dos Estados‑Membros para este efeito deve respeitar os princípios da equivalência e da efetividade. O princípio da efetividade exige que um órgão jurisdicional nacional não se possa basear numa prática segundo a qual um proponente ilegalmente excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público fica impedido de pedir uma indemnização pela perda de uma oportunidade de obter esse contrato.


    ( 1 ) Língua original: inglês.

    ( 2 ) JO 1989, L 395, p. 33, com a redação que lhe foi dada pela Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2007 (JO 2007, L 335, p. 31) e pela Diretiva 2014/23/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014 (JO 2014, L 94, p. 1).

    ( 3 ) JO 2004, L 134, p. 114.

    ( 4 ) V. Acórdão de 13 de janeiro de 2022, Regione Puglia (C‑110/20, EU:C:2022:5, n.o 23 e jurisprudência referida).

    ( 5 ) Ibidem, n.o 24 e jurisprudência referida.

    ( 6 ) V., neste sentido, Acórdãos de 21 de maio de 2008, Belfass/Conselho (T‑495/04, EU:T:2008:160, n.o 124), de 20 de setembro de 2011, Evropaïki Dynamiki/BEI (T‑461/08, EU:T:2011:494, n.o 210), e de 28 de fevereiro de 2018, Vakakis kai Synergates/Comissão (T‑292/15, EU:T:2018:103, n.o 187).

    ( 7 ) Resulta da decisão de reenvio que o the Najvyšší súd Slovenskej republiky (Supremo Tribunal da República Eslovaca) anulou a decisão de excluir a Ingsteel do procedimento de adjudicação do contrato público em causa.

    ( 8 ) Exceto nas situações previstas nos artigos 2.o‑D, 2.o‑E e 2.o‑F da Diretiva 89/665, que não têm relevância para o presente processo: Acórdão de 11 de setembro de 2014, Fastweb (C‑19/13, EU:C:2014:2194, n.o 52). V. também Conclusões do advogado‑geral M. Campos Sánchez‑Bordona no processo Ingsteel e Metrostav (C‑76/16, EU:C:2017:226, n.o 69).

    ( 9 ) Acórdão de 25 de outubro de 2018, Anodiki Services EPE (C‑260/17, EU:C:2018:864, n.o 25 e jurisprudência referida).

    ( 10 ) Conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo Combinatie Spijker Infrabouw/De Jonge Konstruktie e o. (C‑568/08, EU:C:2010:515, n.o 106).

    ( 11 ) V., neste sentido, Acórdão de 9 de dezembro de 2010, Combinatie Spijker Infrabouw‑De Jonge Konstruktie e o. (C‑568/08, EU:C:2010:751, n.o 86).

    ( 12 ) V., neste sentido, Acórdãos de 21 de outubro de 2010, Symvoulio Apochetefseon Lefkosias (C‑570/08, EU:C:2010:621, n.o 37), de 26 de março de 2020, Hungeod e o. (C‑496/18 e C‑497/18, EU:C:2020:240, n.o 73), e Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Marina del Mediterráneo e o. (C‑391/15, EU:C:2016:651, n.o 38).

    ( 13 ) V., a este respeito, Acórdãos de 30 de setembro de 2010, Strabag e o. (C‑314/09, EU:C:2010:567, n.o 33), e de 7 de agosto de 2018, Hochtief (C‑300/17, EU:C:2018:635, n.o 35).

    ( 14 ) Acórdão de 18 de junho de 2002, HI (C‑92/00, EU:C:2002:379, n.o 58). V. também, por analogia, Acórdão de 11 de julho de 1985, Foreningen af Arbejdsledere i Danmark (105/84, EU:C:1985:331, n.o 26), no qual o Tribunal de Justiça considerou que um conceito incluído numa diretiva que procede a uma harmonização parcial não pode constituir um conceito autónomo do direito da União, visto que essa diretiva não pretendeu estabelecer um nível de proteção uniforme com base em critérios comuns.

    ( 15 ) V. Diretiva 2007/66 e Diretiva 2014/23.

    ( 16 ) Acórdão de 9 de dezembro de 2010, Combinatie Spijker Infrabouw‑De Jonge Konstruktie e o. (C‑568/08, EU:C:2010:751, n.o 90).

    ( 17 ) Acórdão de 30 de setembro de 2010, Strabag e o. (C‑314/09, EU:C:2010:567, n.o 34).

    ( 18 ) Acórdãos de 9 de dezembro de 2010, Combinatie Spijker Infrabouw‑De Jonge Konstruktie e o. (C‑568/08, EU:C:2010:751, n.o 91 e jurisprudência referida), e de 26 de novembro de 2015, MedEval (C‑166/14, EU:C:2015:779, n.o 37).

    ( 19 ) Esta circunstância pode explicar, em parte, por que razão as regras relativas à adjudicação de contratos públicos constantes do Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.o 1296/2013, (UE) n.o 1301/2013, (UE) n.o 1303/2013, UE n.o 1304/2013, (UE) n.o 1309/2013, (UE) n.o 1316/2013, (UE) n.o 223/2014 e (UE) n.o 283/2014, e a Decisão n.o 541/2014/UE, e revoga o Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 não são idênticas às da Diretiva 89/665. V., neste sentido, Acórdão de 23 de maio de 2014, European Dynamics Luxembourg/BCE (T‑553/11, EU:T:2014:275, n.o 110), em que o Tribunal Geral considerou que o regime estabelecido pela Diretiva 89/665 não podia ser transposto por analogia para a adjudicação de contratos públicos pelas instituições da União.

    ( 20 ) Acórdão do Tribunal da EFTA de 31 de outubro de 2017, Fosen‑Linjen/AtB (E‑16/16, Coletânea da Jurisprudência do Tribunal da EFTA de 2017, n.o 90; a seguir «Acórdão Fosen‑Linjen I»).

    ( 21 ) Acórdão do Tribunal da EFTA de 1 de agosto de 2019, Fosen‑Linjen/AtB (E‑7/18, Coletânea da Jurisprudência do Tribunal da EFTA de 2019; a seguir «Acórdão Fosen‑Linjen II»).

    ( 22 ) V., neste sentido, Acórdãos do Tribunal da EFTA de 31 de outubro de 2017, Fosen‑Linjen c. AtB (E‑16/16, Tribunal da EFTA Relatório, 2017, n.o 67) e de 1 de agosto de 2019, Fosen-Linjen c. AtB (E‑7/18, n.o 109).

    ( 23 ) Acórdão do Tribunal da EFTA de 31 de outubro de 2017, Fosen-Linjen c. AtB (E‑16/16, Tribunal da EFTA, Relatório 2017, n.o 76).

    ( 24 ) Ibidem (n.os 69 e 70).

    ( 25 ) V., neste sentido, ibidem (n.os 89 e 108).

    ( 26 ) Acórdãos do Tribunal da EFTA de 31 de outubro de 2017, Fosen-Linjen c. AtB (E‑16/16, Tribunal da EFTA, Relatório 2017, n.o 70) e de 1 agosto de 2019, Fosen-Linjen c. AtB (E‑7/18, Tribunal da EFTA, Relatório 2019, n.o 114).

    ( 27 ) Acórdão do Tribunal da EFTA de 31 de outubro de 2017, Fosen-Linjen c. AtB (E‑16/16, Tribunal da EFTA, Relatório 2017, n.o 73).

    ( 28 ) Acórdãos do Tribunal da EFTA de 31 de outubro de 2017, Fosen-Linjen c. AtB (E-16/16, Tribunal da EFTA, Relatório 2017, n.o 90) e de 1 de agosto de 2019, Fosen-Linjen c. AtB (E-7/18, Tribunal da EFTA, Relatório 2019, n.os 115 e 116).

    ( 29 ) Acórdão de 9 de dezembro de 2010, Combinatie Spijker Infrabouw‑De Jonge Konstruktie e o. (C‑568/08, EU:C:2010:751, n.o 87).

    ( 30 ) Acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich e o. (C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.o 40; a seguir «Acórdão Francovich»), e de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 51, a seguir «Acórdão Brasserie du pêcheur»).

    ( 31 ) Acórdão de 19 de novembro de 1991, Francovich e o. (C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.o 42). V. também Acórdãos de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 67), de 30 de setembro de 2003, Köbler (C‑224/01, EU:C:2003:513, n.o 58), e de 13 de março de 2007, Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation (C‑524/04, EU:C:2007:161, n.o 123).

    ( 32 ) Acórdão de 19 de novembro de 1991, Francovich e o. (C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.o 43). V. também, neste sentido, Acórdão de 17 de abril de 2007, AGM‑COS.MET (C‑470/03, EU:C:2007:213, n.o 89), e Conclusões do advogado‑geral L. Geelhoed no processo GAT (C‑315/01, EU:C:2002:573, n.o 64).

    ( 33 ) Acórdão de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 81).

    ( 34 ) O órgão jurisdicional nacional referiu-se expressamente a despesas, lucros cessantes, perda de rendimentos e a danos resultantes das vendas abaixo do seu valor, neste contexto (ibidem, n.o 14).

    ( 35 ) Ibidem, n.os 83, 84 e 88.

    A doutrina sobre a responsabilidade extracontratual dos Estados‑Membros por violação do direito da União parece ser unânime em considerar que, embora o direito da União estabeleça um direito à reparação, cabe aos sistemas jurídicos dos Estados‑Membros precisar o conteúdo de qualquer via de recurso, sob reserva do respeito dos princípios da equivalência e da efetividade. Foi igualmente observado que, ao não procurar definir o conceito de dano, o Tribunal de Justiça deixou esta matéria ao critério das legislações nacionais. V. Van Gerven, W., «Of rights, remedies and procedures», Common Market Law Review, Vol. 37, Issue 3, 2000, pp. 511 e 512. V. também Christ, H., «Compensation for damage: The Non‑Contractual Liability of Member States and EU institutions for breaches of EU law», in Colcelli V., e Arnold R., (eds), Europeanization Through Private Law Instruments, Universitätsverlag Regensburg, 2016, p. 213; Biondi A., e Farley, M., The Right to Damages in European Law, Kluwer Law International; 2009, p. 76 a 83; Gutman, K., «Liability for breach of EU law by the Union, Member States and individuals: damages, enforcement and effective judicial protection», in Lazowski A. and Blockmans S. (eds), Research Handbook on EU Institutional Law, Edward Elgar Law, 2016, p. 460.

    Vários autores que se debruçam sobre o tema da indemnização no domínio da contratação pública consideram, do mesmo modo, que a definição de dano deve ser deixada ao critério do direito dos Estados‑Membros, com base no princípio da autonomia processual nacional, sob reserva do respeito dos princípios da efetividade e da equivalência. Treumer, V. S., «Basis and Conditions for a damages claim for breach of the EU public procurement rules», in Fairgrieve D., e Lichère, F., Public Procurement Law: Damages as an Effective Remedy, Hart, 2011, p. 150. V. também R. Caranta, «Damages for breaches of EU Public Procurement Law: Issues of causation and recoverable losses», in Fairgrieve D., e Lichère, F.,.Public Procurement Law: Damages as an Effective Remedy, Hart, 2011, pp. 167 a 184; Schebesta, H.,.Damages in EU Public Procurement Law, Springer International Publishing Switzerland, 2016, pp. 52 a 60.

    ( 36 ) Acórdão de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 87). V. também Acórdão de 17 de abril de 2007, AGM‑COS.MET (C‑470/03, EU:C:2007:213, n.o 89). O Tribunal de Justiça chegou à mesma conclusão no que respeita à responsabilidade extracontratual dos particulares por violação do direito da União (Acórdão de 13 de julho de 2006, Manfredi e o., C‑295/04 a C‑298/04, EU:C:2006:461, n.os 95 e 96).

    Segundo alguns autores, a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à responsabilidade extracontratual dos Estados‑Membros reflete o delicado equilíbrio (e tensão) entre unidade e diversidade, através da interação entre a autonomia processual nacional e os princípios da equivalência e da efetividade. Gutman, V. K., «Liability for breach of EU law by the Union, Member States and individuals: damages, enforcement and effective judicial protection», in Lazowski A., and Blockmans S., (eds), Research handbook on EU institutional law, Edward Elgar Law, 2016, p. 465.

    ( 37 ) Conclusões do advogado‑geral P. Léger no processo Hedley Lomas (C‑5/94, EU:C:1995:193, n.o 183).

    ( 38 ) Acórdão de 7 de março de 2018, Santoro (C‑494/16, EU:C:2018:166, n.o 50).

    ( 39 ) V., neste sentido, Acórdãos de 21 de maio de 2008, Belfass/Conselho (T‑495/04, EU:T:2008:160, n.o 43), de 3 de março de 2011, Evropaïki Dynamiki/Comissão (T‑589/08, EU:T:2011:73, n.os 22 e 23), e de 12 de julho de 2012, Evropaïki Dynamiki/Frontex (T‑476/07, EU:T:2012:366, n.os 39 a 41).

    ( 40 ) V., por exemplo, Acórdãos de 20 de setembro de 2011, Evropaïki Dynamiki/BEI (T‑461/08, EU:T:2011:494, n.o 66), de 28 de fevereiro de 2018, Vakakis kai Synergates/Comissão (T‑292/15, EU:T:2018:103, n.os 186 a 193), de 14 de dezembro de 2018, East West Consulting/Comissão (T‑298/16, EU:T:2018:967, n.o 176), e de 12 de fevereiro de 2019, Vakakis kai Synergates/Comissão (T‑292/15, EU:T:2019:84, n.o 53).

    ( 41 ) O Regulamento Financeiro rege a adjudicação de contratos públicos pelas instituições da União. Não se aplica à adjudicação de contratos públicos pelas entidades adjudicantes dos Estados‑Membros, que são, em substância, regulados pela Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114).

    ( 42 ) Acórdão de 28 de fevereiro de 2018, Vakakis kai Synergates/Comissão (T‑292/15, EU:T:2018:103, n.o 188).

    ( 43 ) No âmbito dos processos relativos ao pessoal, v. Acórdãos de 21 de fevereiro de 2008, Comissão/Girardot (C‑348/06 P, EU:C:2008:107, n.o 55), e de 27 de outubro de 1994, C/Comissão (T‑47/93, EU:T:1994:262, n.os 54 e 55). V. também Conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo Giordano/Comissão (C‑611/12 P, EU:C:2014:195), que explica que o conceito de perda de oportunidade no direito que rege a indemnização está ligado ao aparecimento da «teoria do risco», que permite quantificar o grau de probabilidade de eventos futuros. Quanto à responsabilidade extracontratual geral da União Europeia por violação do direito da União, v. Acórdão de 8 de maio de 2007, Citymo/Comissão (T‑271/04, EU:T:2007:128, n.os 180 a 182).

    ( 44 ) V., neste sentido, Acórdão de 7 de agosto de 2018, Hochtief (C‑300/17, EU:C:2018:635, n.o 38).

    ( 45 ) Acórdão de 10 de janeiro de 2008, Comissão/Portugal (C‑70/06, EU:C:2008:3, n.o 42).

    ( 46 ) Segundo Schebestra, H., a teoria da perda de oportunidade poderia proporcionar uma solução para o problema recorrente da natureza hipotética dos prejuízos sofridos pelo proponente preterido. Schebesta, H., Damages in EU Public Procurement Law, Springer International Publishing Switzerland, 2016, p. 205.

    ( 47 ) V., neste sentido, Acórdãos de 27 de fevereiro de 2003, Santex (C‑327/00, EU:C:2003:109, n.os 62 a 64) e de 11 de outubro de 2007, Lämmerzahl (C‑241/06, EU:C:2007:597, n.os 62 e 63). V. também Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530, n.os 55, 61 e 62).

    ( 48 ) Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 78).

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