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Document 62022CC0201

Conclusões do advogado-geral M. Szpunar apresentadas em 11 de maio de 2023.


Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:400

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 11 de maio de 2023 ( 1 )

Processo C‑201/22

Kopiosto r.y.

contra

Telia Finland Oyj

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Korkein oikeus (Supremo Tribunal, Finlândia)]

«Pedido de decisão prejudicial — Direitos de propriedade intelectual — Diretiva 2014/26/UE — Gestão coletiva dos direitos de autor e dos direitos conexos — Organismo de gestão coletiva — Diretiva 2004/48/CE — Medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual — Artigo 4.o — Pessoas com legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos pela diretiva — Organismos de gestão coletiva com legitimidade para conceder licenças coletivas com efeitos alargados — Titulares de direitos que não autorizaram que o organismo os representasse»

Introdução

1.

Apesar de uma harmonização pontual ( 2 ), os aspetos processuais da proteção dos direitos de propriedade intelectual continuam, em grande medida, sujeitos a normas nacionais heterogéneas. As disposições da Diretiva 2004/48/CE ( 3 ) visam mitigar as desvantagens que daí resultam para o desenvolvimento do mercado interno, definindo, para o efeito, um catálogo de medidas que devem estar previstas no direito nacional a fim de garantir o respeito dos direitos de autor e dos direitos conexos no quadro dos processos judiciais.

2.

Todavia, as dificuldades que se suscitam no presente processo não estão relacionadas com o catálogo de medidas em causa, mas antes com as pessoas que devem ter legitimidade para lançar mão destas medidas junto dos tribunais nacionais. A questão principal consiste em saber se o artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 obriga os Estados‑Membros a reconhecerem aos organismos de gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual (a seguir «OGC») legitimidade para agirem em nome próprio nos litígios que tenham por objeto a aplicação das medidas previstas nesta diretiva.

3.

Esta questão surge no presente caso a propósito da atividade de um organismo com legitimidade para conceder licenças coletivas com «efeitos alargados». Introduzidas nos países escandinavos a partir da década de 1960 ( 4 ), as licenças com efeitos alargados constituem um mecanismo original de gestão dos direitos de propriedade intelectual, permitindo a determinados OGC conceder direitos de exploração não só em nome dos seus membros mas também em nome de outros titulares que não tenham optado pela gestão individual dos seus direitos. Este mecanismo tem‑se revelado útil nos domínios em que a multiplicidade de obras suscetíveis de ser exploradas pelos licenciados e a fragmentação excessiva do mercado dificultam a gestão através de contratos individuais, gerando uma insegurança jurídica significativa ( 5 ).

4.

As competências alargadas atribuídas aos OGC em matéria de gestão dos direitos suscitam a questão de saber que papel devem assumir estes organismos na proteção judicial da propriedade intelectual. A resposta a esta questão deverá ter em conta as diferenças estruturais entre os Estados‑Membros em matéria processual. Em meu entender, estas diferenças explicam a prudência do legislador da União, que optou por não proceder a uma harmonização plena das legislações nacionais no contexto das disposições do direito da União em vigor.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 93/83/CEE

5.

Nos termos do artigo 9.o, da Diretiva 93/83/CEE ( 6 ), com a epígrafe «Exercício do direito de retransmissão por cabo»:

«1.   Os Estados‑Membros garantirão que o direito dos titulares de direitos de autor e de direitos conexos de autorizar ou proibir a um operador por cabo uma retransmissão por cabo apenas possa ser exercido através de entidades de gestão.

2.   Sempre que o titular de direitos não tiver transferido a gestão dos seus direitos para uma entidade de gestão, considera‑se que a entidade que gere direitos da mesma categoria se encontra mandatada para gerir os seus direitos. Sempre que os direitos dessa categoria forem geridos por mais do que uma entidade de gestão, o titular dos direitos de autor poderá decidir qual dessas entidades deve gerir os seus direitos. O titular dos direitos referido no presente número terá os mesmos direitos e obrigações, resultantes do contrato entre o operador por cabo e a entidade de gestão que se considera mandatada para gerir os seus direitos, que os titulares dos direitos que mandataram essa entidade de gestão e pode reivindicá‑los dentro de um prazo, a fixar pelo Estado‑Membro interessado, que não deve ser inferior a três anos a contar da data da retransmissão por cabo que inclui a sua obra ou outra prestação protegida.

3.   Um Estado‑Membro pode estabelecer que, quando um titular de direitos autorizar no seu território a emissão primária de uma obra ou de outra prestação protegida, se considera que esse titular de direitos aceita não exercer os seus direitos de retransmissão por cabo numa base individual mas nos termos do disposto na presente diretiva.»

Diretiva 2004/48/CE

6.

Os considerandos 3, 10, 18 da Diretiva 2004/48 dispõem o seguinte:

«(3)

[…] sem meios eficazes para fazer respeitar os direitos da propriedade intelectual, a inovação e a criação são desencorajadas e os investimentos reduzidos. Assim, é necessário assegurar que o direito material da propriedade intelectual, hoje em grande parte decorrente do acervo comunitário, seja efetivamente aplicado na Comunidade. Neste contexto, os meios para fazer respeitar os direitos de propriedade intelectual assumem uma importância capital para o êxito do mercado interno.

[…]

(10)

O objetivo da presente diretiva é aproximar essas legislações a fim de assegurar um nível elevado de proteção da propriedade intelectual equivalente e homogéneo no mercado interno.

[…]

(18)

As pessoas com legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos mencionados devem ser não apenas os titulares de direitos, mas também pessoas com um interesse e uma legitimidade diretos, na medida do permitido e nos termos da legislação aplicável, o que pode incluir as organizações profissionais encarregadas da gestão dos direitos ou da defesa dos interesses coletivos e individuais da sua responsabilidade.»

7.

Nos termos do artigo 1.o, da Diretiva 2004/48, com a epígrafe «Objeto»:

«A presente diretiva estabelece as medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual. Para efeitos da presente diretiva, a expressão “direitos de propriedade intelectual” engloba os direitos da propriedade industrial.»

8.

O artigo 2.o desta diretiva, com a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe no seu n.o 1:

«Sem prejuízo dos meios já previstos ou que possam vir a ser previstos na legislação [da União] ou nacional e desde que esses meios sejam mais favoráveis aos titulares de direitos, as medidas, procedimentos e recursos previstos na presente diretiva são aplicáveis, nos termos do artigo 3.o, a qualquer violação dos direitos de propriedade intelectual previstos na legislação [da União] e/ou na legislação nacional do Estado‑Membro em causa.»

9.

O artigo 3.o, da referida diretiva, com a epígrafe, «Obrigação geral», dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros devem estabelecer as medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual abrangidos pela presente diretiva. […]

2.   As medidas, procedimentos e recursos […] devem ser eficazes, proporcionados e dissuasivos e aplicados de forma a evitar que se criem obstáculos ao comércio lícito e a prever salvaguardas contra os abusos.»

10.

O artigo 4.o, da Diretiva 2004/48, com a epígrafe «Legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos», tem a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros reconhecem legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos referidos no presente Capítulo, às seguintes pessoas:

a)

Titulares de direitos de propriedade intelectual, nos termos da legislação aplicável,

b)

Todas as outras pessoas autorizadas a utilizar esses direitos, em particular os titulares de licenças, na medida do permitido pela legislação aplicável e nos termos da mesma,

c)

As organizações de gestão dos direitos coletivos de propriedade intelectual regularmente reconhecidos como tendo o direito de representar os titulares de direitos de propriedade intelectual, na medida do permitido pela legislação aplicável e nos termos da mesma,

d)

As organizações de defesa da profissão regularmente reconhecidos como tendo o direito de representar os titulares de direitos de propriedade intelectual, na medida do permitido pela legislação aplicável nos termos da mesma.»

Diretiva 2014/26/UE

11.

O considerando 12 da Diretiva 2014/26/UE ( 7 ) enuncia:

«A presente diretiva, embora aplicável a todas as organizações de gestão coletiva, com exceção do título III, que se aplica apenas às organizações de gestão coletiva que gerem os direitos de autor sobre obras musicais para utilização em linha numa base multiterritorial, não afeta as disposições relativas à gestão dos direitos nos Estados‑Membros, como a gestão individual, os efeitos alargados de um acordo entre uma organização de gestão coletiva representativa e um usuário, ou seja, as licenças coletivas alargadas, a gestão coletiva obrigatória, as presunções legais de representação e a transferência de direitos para organizações de gestão coletiva.»

12.

O artigo 3.o desta diretiva, com a epígrafe «Definições», dispõe na sua alínea a):

«Para efeitos do disposto na presente diretiva, entende‑se por:

a)

“Organização de gestão coletiva”, qualquer organização que é autorizada por lei ou por transmissão, licença ou qualquer outra disposição contratual a gerir direitos de autor ou direitos conexos em nome de mais do que um titular de direitos, para benefício coletivo desses titulares de direitos, como finalidade única ou principal e que preencha um dos seguintes critérios ou ambos:

i)

ser detida ou controlada pelos seus membros,

ii)

não ter fins lucrativos»

13.

Em conformidade com o artigo 35.o da referida diretiva, com a epígrafe «Resolução de litígios»:

«1.   Os Estados‑Membros asseguram que os litígios entre as organizações de gestão coletiva e os usuários relativos, nomeadamente, às condições de concessão de licenças vigentes e propostas ou a um incumprimento do contrato possam ser submetidos a um tribunal ou, se adequado, a outra entidade de resolução de litígios independente e imparcial se esta for tecnicamente competente em direito da propriedade intelectual.

2.   Os artigos 33.o e 34.o e o n.o 1 do presente artigo aplicam‑se sem prejuízo do direito das partes de reclamarem e defenderem os seus direitos intentando uma ação em tribunal.»

Direito finlandês

14.

O § 26, n.o 1, da tekijänoikeuslaki (404/1961) (Lei dos Direitos de Autor), com a redação introduzida pela Lei 607/2015 (a seguir, «Lei dos Direitos de Autor»), sob a epígrafe «Licença contratual», prevê que as disposições desta lei relativas às licenças contratuais são aplicáveis aos contratos celebrados entre os utilizadores e os organismos, autorizados pelo Ministério da Educação e da Cultura, que representam, num domínio específico, vários autores de obras utilizadas na Finlândia, para a utilização de obras de autores desse domínio. Em relação a estes contratos, considera‑se que os organismos autorizados também têm legitimidade para representar os autores de outras obras no mesmo domínio. Os licenciados que tenham obtido uma licença coletiva com efeitos alargados ao abrigo destes contratos podem, em conformidade com as condições estabelecidas nestes últimos, utilizar todas as obras dos autores do mesmo domínio.

15.

Em conformidade com o § 26, n.o 4, da Lei dos Direitos de Autor, as modalidades fixadas pelos organismos referidos no n.o 1 deste parágrafo, relativas à repartição das remunerações a título da reprodução, comunicação ou transmissão das obras entre os autores representados diretamente por estes organismos, ou à utilização das remunerações para fins de interesse comum aos autores, aplicam‑se igualmente aos autores do mesmo domínio que não sejam representados diretamente por estes organismos.

Matéria de facto, processo principal e questões prejudiciais

Antecedentes do litígio e tramitação do processo principal

16.

A Kopiosto r.y. é uma organização de gestão coletiva que representa os titulares de direitos de autor na aceção do artigo 3.o, alínea a), da Diretiva 2014/26, certificada pelo Ministério da Educação e da Cultura como organismo com legitimidade para conceder licenças com efeitos alargados. Estas licenças dizem respeito, nomeadamente, aos direitos de retransmissão das obras contempladas numa emissão de rádio ou de televisão. Em simultâneo, a Kopiosto gere e concede licenças por conta de um elevado número de autores com base em mandatos que estes últimos lhe conferem.

17.

A sociedade Telia Finland Oyj (a seguir «Telia») explora uma rede de televisão por cabo que transmite sinais de difusão de canais de televisão nacionais descodificados para serem distribuídos ao público.

18.

Em 24 de janeiro de 2018, a Kopiosto intentou no markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos, Finlândia) uma ação por violação de direitos de autor, pedindo que fosse declarado que a Telia procedera a uma retransmissão de emissões televisivas sem a sua autorização. A este respeito, a Kopiosto pediu uma compensação e uma indemnização, invocando, a título principal, a sua qualidade de organismo com legitimidade para conceder licenças com efeitos alargados e, a título subsidiário, a sua qualidade de mandatária dos autores que lhe confiaram a gestão dos seus direitos.

19.

Por Acórdão de 18 de junho de 2019, o markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos) julgou improcedentes os pedidos da Kopiosto com fundamento na falta de legitimidade deste organismo para intentar uma ação por violação de direitos de autor em nome próprio.

20.

A Kopiosto interpôs recurso deste acórdão para o Korkein oikeus (Supremo Tribunal, Finlândia), invocando o seu interesse direto em agir nos litígios relativos aos direitos abrangidos pelas licenças que concede.

21.

Em resposta aos argumentos da Kopiosto, a Telia alega que a legitimidade deste organismo para conceder licenças coletivas não lhe permite intentar ações por violação de direitos de autor em nome próprio, uma vez que estas ações estão reservadas aos titulares destes direitos, isto é, tanto aos criadores como aos seus cessionários.

Questões prejudiciais

22.

Na ausência de disposições nacionais que regulem a matéria em causa no processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a procedência da ação por violação de direitos de autor intentada pela Kopiosto depende da interpretação das disposições pertinentes da Diretiva 2004/48, lidas à luz dos artigos 17.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

23.

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio começa por se interrogar se a legitimidade dos OGC para requerer a aplicação das medidas previstas na Diretiva 2004/48 depende unicamente da sua capacidade judiciária ou ainda da existência de disposições na legislação aplicável especialmente adotadas para o efeito.

24.

Em seguida, o Korkein oikeus (Supremo Tribunal) pergunta se o conceito de «interesse direto» utilizado no considerando 18 da Diretiva 2004/48 é um conceito autónomo do direito da União, de modo que a sua interpretação uniforme implica o reconhecimento do interesse direto dos OGC em requerer, em nome próprio, a aplicação das medidas previstas nesta diretiva.

25.

Por último, na eventualidade de os OGC terem legitimidade para requerer a aplicação das medidas previstas na Diretiva 2004/48, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber quais são as consequências, tendo em conta os direitos fundamentais dos titulares que não são membros, consagrados nos artigos 17.o e 47.o, da Carta, nos casos em que estes organismos têm legitimidade para conceder licenças coletivas com efeitos alargados.

26.

Foi neste contexto que o Korkein oikeus (Supremo Tribunal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

No que respeita aos organismos de [gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual responsáveis pela concessão de licenças contratuais], deve considerar‑se que a [capacidade judiciária] para [efeitos de] defesa destes direitos, [que é] pressupost[o] [da] legitimidade [processual] fundada no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, se refere apenas à capacidade judiciária para efeitos de intervenção em processos judiciais ou requer a existência de um direito, expressamente reconhecido pelas disposições legais nacionais, de propor uma ação em nome próprio para defesa dos direitos controvertidos?

2)

Para efeitos de interpretação do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, deve a expressão “interesse direto na defesa dos direitos de autor dos titulares de direitos [que representa]” ser interpretada em sentido uniforme em todos os Estados‑Membros, se estiver em causa o direito de uma organização de [gestão] coletiva, na aceção do artigo 3.o, alínea a), da Diretiva 2014/26/UE, propor, em nome próprio, uma ação por violação de direitos de autor, no caso de

i)

estarem em causa utilizações de obras relativamente às quais um organismo de [gestão coletiva responsável pela concessão] de licenças contratuais, na aceção da Tekijänoikeuslake (Lei dos Direitos de Autor) tem legitimidade para conceder licenças coletivas [com efeitos] alargad[os] que permitem aos titulares de licenças utilizar igualmente obras dos autores deste setor que não tenham conferido ao organismo poderes de gestão dos seus direitos;

ii)

estarem em causa utilizações de obras relativamente às quais os autores tenham conferido ao organismo, mediante contrato ou [mandato], poderes de gestão dos seus direitos, sem que os direitos de autor tenham sido transferidos para o organismo;

3)

Caso se considere que o organismo, na qualidade de organismo de [gestão coletiva responsável pela concessão] de licenças contratuais, tem interesse direto e legitimidade [processual] para, em nome próprio, propor ações: qual a relevância para a apreciação da legitimidade [processual], eventualmente à luz dos artigos 17.o e 47.o da Carta, do facto de o organismo, na qualidade de organismo de [gestão coletiva responsável pela concessão] de licenças contratuais, também representar autores que não lhe conferiram poderes de gestão dos seus direitos e de o direito de o organismo propor ações para defesa dos direitos destes autores não estar regulado por lei?»

27.

O pedido de decisão prejudicial deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de março de 2022. Foram apresentadas observações escritas pelas partes no processo principal, pelos Governos finlandês e polaco e pela Comissão. Encerrada a fase escrita do processo, o Tribunal de Justiça considerou que dispunha de informações suficientes para se pronunciar sem audiência de alegações.

Análise

Quanto à primeira questão prejudicial

28.

Através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, no que respeita aos organismos de gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual responsáveis pela concessão de licenças contratuais, deve considerar‑se que a capacidade judiciária para efeitos de defesa destes direitos, que é pressuposto da legitimidade processual fundada artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, se refere apenas à capacidade judiciária para efeitos de intervenção em processos judiciais ou ainda a um direito de instaurar processos em nome próprio para defesa destes direitos, o qual deve ser expressamente reconhecido pelo direito nacional.

29.

Para facilitar a leitura e distinguir claramente a capacidade judiciária (que resulta, em termos gerais, da personalidade jurídica) da legitimidade processual (que é apreciada tendo em conta a natureza e o objeto do litígio), proponho ao Tribunal de Justiça que esta questão seja reformulada no sentido de que, através da mesma, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se a legitimidade dos organismos de gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos no capítulo II, da Diretiva 2004/48, na aceção do artigo 4.o, alínea c), desta diretiva, depende apenas da sua capacidade judiciária ou ainda da consagração expressa no direito nacional da sua legitimidade processual para efeitos de defesa dos direitos individuais que gerem.

30.

Para responder a esta questão, há que começar por determinar se a «legitimidade para requerer», na aceção do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, depende apenas da capacidade judiciária dos OGC ou ainda da sua legitimidade processual. No segundo caso, importa determinar igualmente se esta legitimidade processual deve estar expressamente consagrada na legislação aplicável.

Quanto à interpretação da «legitimidade para requerer», na aceção do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48

31.

Esta primeira questão não me parece particularmente complexa. Em meu entender, não há dúvidas de que a legitimidade dos OGC para requerer a aplicação das medidas previstas no capítulo II da Diretiva 2004/48 depende da sua legitimidade processual, pelo que a capacidade judiciária não é em si suficiente para o efeito.

32.

O conceito de «legitimidade para requerer», utilizado no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, afigura‑se pouco preciso neste contexto. Contudo, esta disposição deve ser lida à luz do considerando 18 desta diretiva. Este artigo foi objeto de interpretação no Acórdão SNB‑REACT ( 8 ), no qual o Tribunal de Justiça declarou que «os Estados‑Membros devem reconhecer a um organismo de representação coletiva de titulares de marcas […] legitimidade para requerer, em nome próprio, a aplicação dos recursos previstos nesta diretiva, com vista a proteger os direitos destes titulares, bem como legitimidade para intentar ações ou interpor recursos, em nome próprio, com vista a defender esses direitos, desde que a legislação nacional considere que esse organismo tem um interesse direto na defesa de tais direitos e lhe atribua legitimidade processual para o efeito» ( 9 ).

33.

Daqui resulta claro, em meu entender, que a «legitimidade para requerer», na aceção do artigo 4.o, alínea c), desta diretiva, não depende apenas da capacidade judiciária, mas também da legitimidade processual dos OGC ao abrigo da legislação aplicável.

34.

Acresce que uma interpretação contrária, que sujeitasse a «legitimidade para requerer» na aceção do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 apenas à capacidade judiciária, faria com que este requisito deixasse de ter aplicabilidade prática.

35.

Com efeito, conforme o Governo finlandês salientou ( 10 ), a capacidade judiciária constitui um elemento típico da personalidade jurídica de que dispõem, em regra, os OGC, independentemente das várias formas que estes organismos revistam ao abrigo do direito nacional ( 11 ). Na prática, só suscitam dúvidas a legitimidade processual ou o interesse em agir dos OGC ( 12 ).

36.

À luz das considerações que precedem, considero que a legitimidade para requerer na aceção do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 está sujeita à consagração da legitimidade processual dos OGC. Por conseguinte, há que determinar se esta legitimidade deve estar consagrada de forma explícita.

Quanto à necessidade de consagração expressa da legitimidade processual

37.

Uma vez que a primeira questão se refere à necessidade de uma consagração expressa da legitimidade processual dos OGC no direito nacional, o órgão jurisdicional de reenvio pretende esclarecer se a consagração desta qualidade deve ter por base uma disposição escrita.

38.

A este respeito, tendo em conta as dificuldades que surgem em relação ao eventual reconhecimento da legitimidade dos OGC para agir em nome próprio em lugar dos titulares dos direitos ( 13 ), considero que a adoção de um texto legislativo é o meio mais adequado para responder às necessidades de segurança jurídica.

39.

Contudo, na prática, a maioria dos Estados‑Membros não dispõe de um texto que regule especificamente a legitimidade processual dos OGC ( 14 ). Por conseguinte, não se pode excluir que esta matéria seja regulada por disposições processuais de caráter geral ou ainda que seja determinada por via jurisprudencial ( 15 ), sobretudo nos Estados‑Membros cujos tribunais inferiores são formalmente obrigados a seguir a jurisprudência dos tribunais superiores ( 16 ).

40.

Nestas condições, parece‑me que a interpretação literal do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, no sentido de sujeitar a legitimidade processual dos OGC à «legislação aplicável», poderia comprometer o efeito útil desta diretiva em determinadas circunstâncias.

41.

Consequentemente, considero que o Tribunal de Justiça poderia inspirar‑se in casu na sua jurisprudência relativa às modalidades de transposição das diretivas ( 17 ). De acordo com esta jurisprudência, «a transposição de uma diretiva não exige necessariamente uma repetição formal e textual do seu conteúdo numa disposição legal ou regulamentar expressa e específica, podendo, em função deste conteúdo, ser para tanto suficiente um contexto jurídico geral, desde que este assegure efetivamente a plena aplicação da diretiva de um modo suficientemente claro e preciso» ( 18 ).

42.

Este contexto jurídico pode resultar, nomeadamente, de uma prática jurisprudencial assente ( 19 ).

43.

Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à primeira questão prejudicial que a legitimidade dos organismos de gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos no capítulo II da Diretiva 2004/48, na aceção do artigo 4.o, alínea c), desta diretiva, depende da consagração da sua legitimidade processual para efeitos de defesa dos direitos individuais que gerem. Na ausência de disposições adotadas para o efeito na legislação aplicável, esta legitimidade pode resultar do contexto jurídico geral, desde que o seu alcance e as suas consequências no que respeita à situação das partes sejam determinados de modo suficientemente claro e preciso.

Quanto à segunda questão prejudicial

44.

De acordo com a sua formulação, a segunda questão prejudicial visa analisar o caráter autónomo da expressão «interesse direto na defesa dos direitos de autor dos titulares de direitos que representa».

45.

Esta expressão não consta de nenhuma disposição da Diretiva 2004/48. Em contrapartida, foi utilizada pelo Tribunal de Justiça, com uma formulação ligeiramente diferente, no Acórdão SNB‑REACT ( 20 ), no contexto da interpretação do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 à luz do seu considerando 18 ( 21 ), que faz referência ao conceito de «interesse direto».

46.

Com base neste considerando, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, deve ser entendido no sentido de que quando a legislação nacional prevê que um organismo de gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual tem um interesse direto na defesa destes direitos, os Estados‑Membros devem reconhecer a este organismo a legitimidade para requerer a aplicação das medidas previstas na referida diretiva ( 22 ).

47.

Neste contexto, parece‑me que aquilo que o órgão jurisdicional de reenvio pretende apurar, ao questionar o Tribunal de Justiça sobre o caráter autónomo do conceito de «interesse direto» referido no Acórdão SNB‑REACT, é a existência e o alcance eventual da obrigação dos Estados‑Membros ao abrigo das disposições da Diretiva 2004/48 de reconhecerem o interesse dos OGC em agir em nome próprio nos litígios relativos à aplicação das medidas referidas no artigo 4.o, alínea c), desta diretiva, caso este interesse não resulte das normas nacionais.

48.

Por conseguinte, proponho que a segunda questão prejudicial seja reformulada no sentido de que, através da mesma, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o disposto no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros são obrigados a reconhecer o interesse direto dos organismos com legitimidade para conceder licenças coletivas, a que se refere esta disposição, em requerer em nome próprio a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos no capítulo II, desta diretiva, como a ação por violação de direitos de autor, caso este interesse não resulte das normas nacionais.

49.

Esta questão obteve, em substância, uma resposta negativa no Acórdão SNB‑REACT ( 23 ), e não vislumbro motivos que possam levar o Tribunal de Justiça a dar‑lhe uma resposta diferente neste processo.

50.

Há que recordar que, ao abrigo do disposto no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, a legitimidade para requerer continua dependente da «legislação aplicável». Neste contexto, o Tribunal de Justiça salientou que «enquanto o artigo 4.o, alínea a), da Diretiva 2004/48 prevê que os Estados‑Membros devem reconhecer, em qualquer hipótese, aos titulares de direitos de propriedade intelectual a legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos referidos no capítulo II dessa diretiva, as alíneas b) a d) do artigo 4.o desta última especificam que só na medida do permitido pela legislação aplicável e nos termos da mesma é que os Estados‑Membros reconhecem tal legitimidade a outras pessoas e a determinados organismos» ( 24 ).

51.

No que respeita à expressão «legislação aplicável» que consta desta disposição, o Tribunal de Justiça declarou que a mesma se refere não só à legislação nacional mas também à legislação da União ( 25 ).

52.

Por conseguinte, para responder à segunda questão prejudicial, há que determinar se as disposições de direito da União atualmente em vigor reconhecem o interesse direto dos OGC, como a Kopiosto, em requerer em nome próprio a aplicação das medidas previstas na Diretiva 2004/48.

53.

Em meu entender, isto não se verifica.

54.

Em primeiro lugar, este interesse não pode ser deduzido das disposições da Diretiva 2004/48.

55.

Pelo contrário, e independentemente do teor do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, que me parece claro, os trabalhos preparatórios desta disposição indiciam que esta diretiva não obriga os Estados‑Membros a reconhecerem aos OGC a possibilidade de intervirem em litígios relativos aos direitos individuais dos titulares. Com efeito, foi abandonada uma disposição da proposta inicial da Comissão que previa uma obrigação semelhante ( 26 ).

56.

Em segundo lugar, o interesse em agir dos OGC também não me parece resultar das disposições da Diretiva 2014/26. No entanto, há que fazer um reparo quanto a este ponto.

57.

Com efeito, o artigo 35.o, n.o 1, da Diretiva 2014/26 prevê que os Estados‑Membros devem assegurar «que os litígios entre as organizações de gestão coletiva e os usuários relativos, nomeadamente, às condições de concessão de licenças vigentes e propostas ou a um incumprimento do contrato possam ser submetidos a um tribunal» (o sublinhado é meu). Tendo em conta o teor desta disposição, é possível deduzir do mesmo um reconhecimento implícito do interesse em agir dos OGC no âmbito dos litígios que os opõem aos utilizadores.

58.

No entanto, uma leitura isolada desta disposição seria contrária aos objetivos e à economia geral da Diretiva 2014/26, que não tem por objeto regular a capacidade dos OGC para intervirem em juízo ( 27 ). Além disso, esta leitura seria difícil de conciliar com o disposto no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48, que regula esta matéria e que não é objeto de derrogação pela Diretiva 2014/16. Por conseguinte, considero que o artigo 35.o, n.o 1, da Diretiva 2014/16 não consagra o interesse em agir dos OGC.

59.

Por último, este interesse também não resulta do artigo 12.o, da Diretiva (UE) 2019/790 ( 28 ), que permite que os Estados‑Membros instituam o regime de licenças coletivas com efeitos alargados ( 29 ) em determinadas situações previstas nesta disposição.

60.

Quanto a este ponto, não subscrevo a análise da Comissão ( 30 ), que parece ter interpretado as expressões «entidade […] [que] se presum[e] que representa titulares de direitos» e «presunções legais de representação», que constam, respetivamente, do artigo 12.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2019/790 e do considerando 12 da Diretiva 2014/26, como designando a capacidade dos OGC para intervirem em juízo. Ora, no contexto em que foram utilizadas, estas expressões designam uma das modalidades de concessão de licenças com efeitos alargados, que se distingue do modelo «clássico» pela liberdade acrescida que confere aos titulares de direitos ( 31 ).

61.

Acresce que a consagração da legitimidade para gerir os direitos não pressupõe o reconhecimento da qualidade e do interesse em agir relativos a estes direitos. Nem todos os mecanismos de gestão coletiva conduzem necessariamente a uma cessão dos direitos aos OGC, como é exemplo o regime de presunção legal de representação, de modo que a legitimidade para conceder uma licença com efeitos alargados não implica a consagração implícita da legitimidade para agir em lugar do titular dos direitos ( 32 ). Esta pode resultar, consoante o caso, de disposições especialmente adotadas para o efeito ( 33 ).

62.

Tendo em conta as considerações que precedem, considero que as disposições de direito da União em vigor não impõem aos Estados‑Membros a obrigação de reconhecer o interesse dos OGC em agir em nome próprio nos litígios relativos à aplicação das medidas previstas na Diretiva 2004/48.

63.

Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à segunda questão prejudicial que o disposto no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros não são obrigados a reconhecer o interesse direto dos organismos com legitimidade para conceder licenças coletivas, a que se refere esta disposição, em requererem em nome próprio a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos no capítulo II desta diretiva, como a ação por violação de direitos de autor, caso este interesse não resulte das normas nacionais aplicáveis.

Quanto à terceira questão prejudicial

64.

A terceira questão prejudicial é submetida no caso de, na ausência de legislação pertinente no direito nacional, se considerar que as disposições da Diretiva 2004/48 obrigam os Estados‑Membros a reconhecer aos OGC legitimidade para agir em nome próprio nos litígios relativos aos direitos abrangidos por licenças com efeitos alargados. O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas relativamente à conformidade desta obrigação com os direitos consagrados nos artigos 17.o e 47.o da Carta.

65.

Tendo em conta a proposta de resposta à segunda questão prejudicial, considero que não é necessário responder à terceira questão. O problema suscitado pelo órgão jurisdicional de reenvio só pode ser suscitado e analisado no contexto de uma legislação nacional que consagre a legitimidade ou o interesse em agir dos OGC, o que não se verifica neste caso ( 34 ).

66.

Acresce que a legitimidade processual só pode ser utilmente reconhecida aos OGC se os interesses e os direitos fundamentais dos criadores forem devidamente assegurados, o que depende de um conjunto de normas materiais e processuais de direito nacional, que foram parcialmente harmonizadas pelas disposições da Diretiva 2014/26.

67.

Estas normas dizem respeito a questões como a existência de um mecanismo opt‑out em matéria de gestão dos direitos, o direito de intervenção ou de oposição do titular, as consequências de uma eventual desistência por parte de um OGC, o alcance e os efeitos dos procedimentos de resolução alternativa de litígios ou ainda a possibilidade de acionar a responsabilidade do organismo de gestão para efeitos de indemnização no quadro de uma relação «quase‑contratual», como a negotiorum gestio. Todavia, atentas as circunstâncias do presente processo, estas questões são hipotéticas.

Conclusão

68.

À luz de todas as considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pelo Korkein oikeus (Supremo Tribunal, Finlândia) do seguinte modo:

1)

A legitimidade dos organismos de gestão coletiva de direitos de propriedade intelectual para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos no capítulo II da Diretiva 2004/48, na aceção do artigo 4.o, alínea c), desta diretiva, depende da consagração da sua legitimidade processual para efeitos de defesa dos direitos individuais que gerem. Na ausência de disposições adotadas para o efeito na legislação aplicável, esta legitimidade pode resultar do contexto jurídico geral, desde que o seu alcance e as suas consequências no que respeita à situação das partes sejam determinados de modo suficientemente claro e preciso.

2)

O disposto no artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 2004/48 deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros não são obrigados a reconhecer o interesse direto dos organismos com legitimidade para conceder licenças coletivas, a que se refere esta disposição, em requererem em nome próprio a aplicação das medidas, procedimentos e recursos previstos no capítulo II desta diretiva, como a ação por violação de direitos de autor, caso este interesse não resulte das normas nacionais aplicáveis.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) V. artigo 8.o, da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10).

( 3 ) Diretiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual (JO 2004, L 157, p. 45, e retificações JO 2004, L 195, p. 16 e JO 2007, L 204, p. 27).

( 4 ) Quanto à incorporação das licenças coletivas com efeitos alargados no direito da União, v. Quaedvlieg, A., «Les licences collectives étendues. Un oiseau exotique des lacs du Nord fait un atterrissage réussi à Bruxelles», Revue internationale du droit d’auteur, n.o 4, 2020, p. 189.

( 5 ) Para uma descrição geral do mecanismo e um panorama detalhado das soluções adotadas pelos Estados‑Membros em matéria de licenças com efeitos alargados no âmbito dos mercados digitais, v. Estudo realizado para a Comissão Europeia, Study on emerging issues on collective licensing practices in the digital environment, Serviço das Publicações da União Europeia, Luxemburgo, 2021, pp. 131 a 242.

( 6 ) Diretiva 93/83/CEE do Conselho, de 27 de setembro de 1993, relativa à coordenação de determinadas disposições em matéria de direito de autor e direitos conexos aplicáveis à radiodifusão por satélite e à retransmissão por cabo (JO 1993, L 248, p. 15).

( 7 ) Diretiva 2014/26/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à gestão coletiva dos direitos de autor e direitos conexos e à concessão de licenças multiterritoriais de direitos sobre obras musicais para utilização em linha no mercado interno (JO 2014, L 84, p. 72).

( 8 ) Acórdão de 7 de agosto de 2018 (C‑521/17, EU:C:2018:639, a seguir «Acórdão SNB‑REACT»).

( 9 ) Acórdão SNB‑REACT (n.o 39). O sublinhado é meu.

( 10 ) V. Observações escritas do Governo finlandês, n.os 12 e 14.

( 11 ) Resulta do considerando 14 da Diretiva 2014/26 que a mesma não obriga os organismos de gestão coletiva a adotarem uma forma jurídica específica. Estes organismos revestem, na prática, a forma de sociedades, associações, sindicatos ou fundações.

( 12 ) Quanto às controvérsias em torno deste aspeto no direito francês, v. Vivant, M., Bruguière, J.‑M., Droit d’auteur et droits voisins, 4.a ed., Dalloz, Paris, 2019, n.o 1348, pp. 1288 e 1289.

( 13 ) Estas dificuldades foram abordadas pelo órgão jurisdicional de reenvio no âmbito da terceira questão prejudicial.

( 14 ) Em particular, a Finlândia não adotou nenhuma disposição desta natureza (v. n.os 16 e segs. do pedido de decisão prejudicial).

( 15 ) Como parece ter acontecido em França, onde a Cour de cassation (Tribunal de Cassação) pôs termo às divergências jurisprudenciais (anteriormente) existentes ao recusar reconhecer a legitimidade processual dos OGC nos litígios relativos à defesa dos direitos dos criadores não‑membros (Acórdão de 11 de setembro de 2013, n.o 12‑17.795, FR:CCASS:2013:C100905).

( 16 ) A título exemplificativo, pode ser o caso, na Polónia, das secções alargadas do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que podem adotar «resoluções com força de princípio jurídico», em conformidade com o artigo 87.o, n.o 1, da ustawa o Sądzie Najwyższym (Lei do Supremo Tribunal).

( 17 ) Esta jurisprudência pode ser aplicada à situação em causa no processo principal apenas por via de analogia e não diretamente, dado que o reconhecimento da legitimidade processual dos OGC pelo direito nacional não resulta, a meu ver, dos requisitos estabelecidos pela Diretiva 2004/48. Irei expor os motivos que me levam a esta conclusão no âmbito da análise da segunda questão prejudicial.

( 18 ) V. Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑530/11, EU:C:2014:67, n.o 33 e jurisprudência referida).

( 19 ) V. Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑530/11, EU:C:2014:67, n.os 34 a 36 e jurisprudência referida).

( 20 ) Acórdão SNB‑REACT (n.o 38).

( 21 ) Acórdão SNB‑REACT (n.o 33).

( 22 ) Acórdão SNB‑REACT (n.o 34).

( 23 ) V., particularmente, Acórdão SNB‑REACT (n.o 38).

( 24 ) Acórdão SNB‑REACT (n.o 28).

( 25 ) Acórdão SNB‑REACT (n.o 31).

( 26 ) O artigo 5.o da proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às medidas e aos procedimentos destinados a assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual [COM (2003)46 final], com a epígrafe «Pessoas habilitadas para requerer a aplicação das medidas e dos procedimentos», previa, no seu n.o 2, que «os Estados‑Membros reconhecem que os organismos de gestão dos direitos ou de defesa profissional, na medida em que representem titulares de direitos de propriedade intelectual, bem como outras pessoas autorizadas a utilizar esses direitos ao abrigo da legislação aplicável, têm legitimidade para requerer a aplicação das medidas e dos procedimentos referidos no presente capítulo, incluindo o recurso à justiça para a defesa dos direitos ou dos interesses coletivos ou individuais da sua responsabilidade» (o sublinhado é meu).

( 27 ) À luz dos considerandos 8 e 9 da Diretiva 2014/26, esta tem por objetivo dispor em matéria de coordenação das normas nacionais relativas ao acesso à atividade de gestão de direitos de autor e de direitos conexos por organismos de gestão coletiva, às suas modalidades de funcionamento e ao seu enquadramento de supervisão, bem como garantir um padrão elevado de governação, gestão financeira, transparência e apresentação de relatórios por estes organismos.

( 28 ) Diretiva (UE) 2019/970 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de abril de 2019, relativa aos direitos de autor e direitos conexos no mercado único digital e que altera as Diretivas 96/9/CE e 2001/29/CE (JO 2019, L 130, p. 92). Como a Comissão referiu, esta diretiva não influencia a resposta que, in casu, deve ser dada à segunda questão prejudicial, uma vez que não se aplica ratione temporis ao litígio no processo principal. No entanto, parece‑me oportuno reiterar a interpretação do artigo 12.o, n.o 1, alínea b), desta diretiva, feita pela Comissão nas suas observações escritas.

( 29 ) Nos termos do artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2019/790, com a epígrafe «Concessão de licenças coletivas com efeitos alargados»:

«Os Estados‑Membros podem prever, no que se refere à utilização no seu território e sem prejuízo das salvaguardas previstas no presente artigo, que, caso uma entidade de gestão coletiva sujeita às regras nacionais de aplicação da Diretiva 2014/26/UE, nos termos do respetivo mandato que recebeu dos titulares de direitos, celebre um acordo de concessão de licenças para a exploração de obras ou outro material protegido:

a) Tal acordo possa ser alargado a fim de se aplicar aos direitos dos titulares de direitos que não tenham autorizado essa entidade de gestão coletiva a representá‑los por transmissão, licença ou qualquer outra disposição contratual; ou

b) No que diz respeito a tal acordo, a entidade disponha de um mandato legal ou se presuma que representa titulares de direitos que não lhe tenham dado autorização nesse sentido.»

( 30 ) Observações escritas da Comissão, n.os 24 e 26.

( 31 ) Quanto aos tipos de mecanismos de licenças com efeitos alargados e às suas características, v. Estudo realizado para a Comissão Europeia, Study on emerging issues on collective licensing practices in the digital environment, Serviço das Publicações da União Europeia, Luxemburgo, 2021, p. 132.

( 32 ) Pelos mesmos motivos, considero que a legitimidade processual da Kopiosto no processo principal não pode ser inferida das disposições da Diretiva 93/83, uma vez que o artigo 9.o desta diretiva prevê um mecanismo de gestão coletiva obrigatório em matéria de retransmissão por cabo.

( 33 ) A título de exemplo, é o caso da Polónia, onde a legitimidade processual dos OGC que beneficiam da presunção legal de representação foi consagrada no artigo 5.o, n.o 1, da ustawa o zbiorowym zarządzaniu prawami autorskimi i prawami pokrewnymi (Lei sobre a Gestão Coletiva dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos), de 15 de junho de 2018.

( 34 ) V. Pedido de decisão prejudicial, n.os 16 a 19.

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