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Document 62021CJ0553

Acórdão do Tribunal de Justiça (Oitava Secção) de 22 de dezembro de 2022.
Hauptzollamt Hamburg contra Shell Deutschland Oil GmbH.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof.
Reenvio prejudicial — Diretiva 2003/96/CE — Tributação dos produtos energéticos e da eletricidade — Artigo 5.°, quarto travessão — Taxas diferenciadas do imposto especial de consumo em função da utilização profissional, ou não, desses produtos — Isenções e reduções fiscais facultativas — Apresentação de um pedido de redução fiscal facultativa após o termo do prazo previsto para o efeito mas antes do termo do prazo de liquidação do imposto em causa — Princípio da efetividade — Princípio da proporcionalidade.
Processo C-553/21.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:1030

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

22 de dezembro de 2022 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Diretiva 2003/96/CE — Tributação dos produtos energéticos e da eletricidade — Artigo 5.o, quarto travessão — Taxas diferenciadas do imposto especial de consumo em função da utilização profissional, ou não, desses produtos — Isenções e reduções fiscais facultativas — Apresentação de um pedido de redução fiscal facultativa após o termo do prazo previsto para o efeito mas antes do termo do prazo de liquidação do imposto em causa — Princípio da efetividade — Princípio da proporcionalidade»

No processo C‑553/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha), por Decisão de 8 de junho de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 8 de setembro de 2021, no processo

Hauptzollamt Hamburg

contra

Shell Deutschland Oil GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: N. Piçarra (relator), exercendo funções de presidente de secção, N. Jääskinen e M. Gavalec, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Hauptzollamt Hamburg, por C. Schaade, na qualidade de agente,

em representação da Shell Deutschland Oil GmbH, por J. Dengler, L. Freiherr von Rummel e R. Stein, Rechtsanwälte,

em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e R. Pethke, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do princípio da proporcionalidade, como princípio geral do direito da União, conjugado com o artigo 5.o, quarto travessão, da Diretiva 2003/96/CE do Conselho, de 27 de outubro de 2003, que reestrutura o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade (JO 2003, L 283, p. 51).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Hauptzollamt Hamburg (Serviço Aduaneiro Principal de Hamburgo, Alemanha) (a seguir «Serviço Aduaneiro») à Shell Deutschland Oil GmbH (a seguir «Shell») a propósito da recusa do Serviço Aduaneiro em isentar esta sociedade do imposto sobre a energia que incide sobre os produtos energéticos por ela utilizados como combustível para fins profissionais.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos 3, 17 e 21 da Diretiva 2003/96 enunciam:

«(3)

O bom funcionamento do mercado interno e a realização dos objetivos das outras políticas comunitárias exigem a fixação de níveis mínimos de tributação a nível comunitário para a maioria dos produtos energéticos, incluindo a eletricidade, o gás natural e o carvão.

[...]

(17)

Importa fixar níveis mínimos comunitários de tributação diferenciados em função da utilização dos produtos energéticos e da eletricidade.

[...]

(21)

A utilização profissional e não profissional de produtos energéticos e de eletricidade poderá ser objeto de tratamento diferenciado para efeitos fiscais.»

4

O artigo 5.o desta diretiva tem a seguinte redação:

«Desde que respeitem os níveis mínimos de tributação previstos na presente diretiva e sejam compatíveis com o direito comunitário, podem ser aplicadas pelos Estados‑Membros, sob controlo fiscal, taxas de imposto diferenciadas, nos seguintes casos:

[...]

para distinguir entre utilização profissional e utilização não profissional, no caso dos produtos energéticos e da eletricidade referidos nos artigos 9.° [combustíveis] e 10.° [eletricidade].»

5

Nos termos do artigo 6.o da referida diretiva:

«Os Estados‑Membros têm a faculdade de aplicar as isenções ou reduções do nível de tributação previstas na presente diretiva:

[...]

c)

Através do reembolso da totalidade ou parte do montante do imposto.»

Direito alemão

6

O § 54, n.o 1, da Energiesteuergesetz (Lei do Imposto sobre a Energia), de 15 de julho de 2006 (BGBl. 2006 I, p. 1534), na versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «EnergieStG»), prevê:

«Mediante pedido, é concedido uma isenção fiscal para produtos energéticos que tenham sido comprovadamente tributados de acordo com o § 2, n.o 3, primeiro período, pontos 1 e 3 a 5 e que tenham sido utilizados como combustível para fins profissionais ou utilizados em instalações que beneficiem de um regime preferencial, na aceção do § 3, por uma empresa do setor produtivo, na aceção do § 2, ponto 3, da Stromsteuergesetz [(Lei do Imposto sobre a Eletricidade), de 24 de março de 1999 (BGBl. 1999 I, p. 378)] [...]. Todavia, só é concedida isenção fiscal para produtos energéticos que tenham sido utilizados para produzir calor na medida em que seja comprovado que o calor produzido foi utilizado por uma empresa do setor produtivo [...]»

7

O § 100 da Verordnung zur Durchführung des Energiesteuergesetzes (Regulamento de Execução da Lei do Imposto sobre a Energia), de 31 de julho de 2006 (BGBl. 2006 I, p. 1753; a seguir «EnergieStV»), sob a epígrafe «Isenção fiscal para as empresas», dispõe, no n.o 1:

«A isenção fiscal prevista no § 54 da EnergieStG deve ser pedida ao [Serviço Aduaneiro] de que depende o requerente, com o formulário oficial exigido, para todos os produtos energéticos utilizados no período em causa. O requerente deve fornecer no seu pedido todas as indicações necessárias para efeitos da isenção e calcular ele próprio o montante da isenção. A isenção só é concedida se o pedido for apresentado ao [Serviço Aduaneiro] o mais tardar até 31 de dezembro do ano seguinte ao ano civil em que os produtos energéticos foram utilizados.»

8

O § 169 da Abgabenordnung (Código Tributário), sob a epígrafe «Prazo de liquidação», tem a seguinte redação:

«(1)   A liquidação do imposto, bem como a sua anulação ou alteração, deixam de ser possíveis após o termo do prazo de liquidação. [...]

(2)   O prazo para a liquidação é de:

1.

um ano para os impostos especiais de consumo e os reembolsos de impostos especiais sobre o consumo,

[...]»

9

Nos termos do § 170 deste código, o prazo de liquidação começa a correr a partir do termo do ano civil em que surgiu o imposto.

10

O § 171 do referido código, sob a epígrafe «Prorrogação do prazo», dispõe, no n.o 4, que, se tiver sido iniciada uma inspeção fiscal antes do termo do prazo para a liquidação dos impostos sobre os quais incide essa inspeção fiscal, esse prazo não termina antes de os atos de liquidação emitidos na sequência da referida inspeção fiscal se terem tornado definitivos, sem prejuízo da prorrogação do mesmo prazo nos termos de outras disposições.

Litígio no processo principal e questão prejudicial

11

A Shell apresentou ao Serviço Aduaneiro, mediante o formulário oficial previsto para o efeito, um pedido de isenção fiscal ao abrigo do § 54, n.o 1, da EnergieStG, para os produtos energéticos que utilizou para fins profissionais no período compreendido entre agosto e novembro de 2010, sob a forma de um reembolso parcial do montante do imposto, como prevê o artigo 6.o, alínea c), da Diretiva 2003/96.

12

É pacífico que, relativamente a esse período, estavam preenchidos todos os requisitos para que a Shell pudesse beneficiar dessa redução fiscal, nos termos do § 54, n.o 1, da EnergieStG, com exceção da apresentação, no prazo fixado no § 100 da EnergieStV, de um pedido para esse efeito, que foi recebido no Serviço Aduaneiro em maio de 2012. É igualmente pacífico que, no ano de 2011, esta sociedade foi alvo de uma inspeção fiscal relativa ao ano de 2010.

13

O Serviço Aduaneiro indeferiu o pedido apresentado pela Shell e a reclamação deduzida contra essa decisão de indeferimento, em 13 de agosto de 2012 e 27 de fevereiro de 2015, respetivamente, com o fundamento de que esta sociedade não tinha apresentado o pedido de redução fiscal no prazo fixado no § 100, n.o 1, da EnergieStV.

14

Por Acórdão de 1 de fevereiro de 2019, o Finanzgericht Hamburg (Tribunal Tributário de Hamburgo, Alemanha) deu provimento à ação intentada pela Shell, considerando que, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, esta última disposição tinha sido respeitada e que, em todo o caso, atendendo ao direito da União, em especial ao princípio da proporcionalidade, o Serviço Aduaneiro devia ter deferido o pedido da Shell.

15

Posteriormente, o Serviço Aduaneiro interpôs recurso de «Revision» dessa decisão para o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha), o órgão jurisdicional de reenvio.

16

Esse órgão jurisdicional refere que a resolução do litígio no processo principal depende da questão de saber se, quando um pedido de redução fiscal apresentado ao abrigo do § 54, n.o 1, da EnergieStG — disposição baseada no artigo 5.o, quarto travessão, da Diretiva 2003/96 — chega ao Serviço Aduaneiro após o termo do prazo para a apresentação desse pedido, mas no cumprimento do prazo de liquidação do imposto, prorrogado em virtude de uma inspeção fiscal iniciada contra o requerente, em conformidade com o § 171, n.o 4, do Código Tributário, o direito do requerente a essa redução fiscal fica excluído, nos termos do § 100, n.o 1, da EnergieStV, ou se o princípio da proporcionalidade, como princípio geral do direito da União, se opõe a que as autoridades nacionais competentes recusem esse direito apenas com base no incumprimento do primeiro prazo.

17

O referido órgão jurisdicional salienta que, no momento em que o pedido de redução fiscal deu entrada no Serviço Aduaneiro, em maio de 2012, o prazo de liquidação ainda não tinha terminado em consequência da inspeção fiscal de que a Shell tinha sido alvo em 2011. Recorda que se trata de um prazo de caducidade ao serviço da segurança jurídica e da paz jurídica, como o Tribunal de Justiça já declarou.

18

Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio observa, por um lado, que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça decorrente dos Acórdãos de 2 de junho de 2016, Polihim‑SS (C‑355/14, EU:C:2016:403), e de 7 de novembro de 2019, Petrotel‑Lukoil (C‑68/18, EU:C:2019:933), é contrário ao direito da União e, nomeadamente, ao princípio da proporcionalidade sancionar a violação de exigências formais previstas no direito nacional através da recusa de concessão de uma vantagem fiscal prevista na Diretiva 2003/96 e, por outro, que, segundo a sua própria jurisprudência, o pedido de isenção do imposto sobre a energia «não é um requisito jurídico material, mas apenas um requisito formal do direito [à isenção fiscal]». Segundo esse órgão jurisdicional, isto poderia sugerir que a apresentação tardia de um pedido não impede a tributação de um produto energético de acordo com a sua utilização efetiva, no caso em apreço, como combustível para fins profissionais. Nesse caso, esse órgão jurisdicional tende a considerar que, enquanto o prazo de liquidação previsto no § 169 do Código Tributário não tiver terminado, o direito à isenção ou à redução do imposto sobre a energia não pode ser recusado pela autoridade competente, se os requisitos materiais previstos para o efeito estiverem preenchidos.

19

Contudo, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a jurisprudência referida, que tem por objeto isenções fiscais obrigatórias previstas na Diretiva 2003/96, é igualmente aplicável às isenções fiscais facultativas previstas nesta diretiva, que são objeto do processo principal.

20

Nestas condições, o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O princípio da proporcionalidade[, como princípio geral] do direito da União também se aplica à redução facultativa do imposto prevista no artigo 5.o[, quarto travessão], da Diretiva 2003/96, de modo que o Estado‑Membro não pode recusar a redução do imposto após o termo do prazo de apresentação do pedido previsto na sua ordem jurídica se, no momento da receção do pedido pela autoridade competente, o prazo de prescrição para a liquidação do imposto ainda não tiver expirado?»

Quanto à questão prejudicial

21

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o princípio da efetividade e o princípio da proporcionalidade, como princípio geral do direito da União, devem ser interpretados no sentido de que, no âmbito da aplicação de uma disposição como a do artigo 5.o, quarto travessão, da Diretiva 2003/96, que permite aos Estados‑Membros aplicarem, em determinadas condições, taxas de imposto diferenciadas para distinguir entre utilização profissional e utilização não profissional, no caso dos produtos energéticos e da eletricidade referidos nesta diretiva, se opõem a uma regulamentação nacional nos termos da qual as autoridades competentes de um Estado‑Membro são obrigadas a indeferir, automaticamente e sem exceção, um pedido de isenção fiscal apresentado no prazo de liquidação do imposto em causa, previsto no direito nacional, com o único fundamento de que o requerente não cumpriu o prazo fixado nesse direito para a apresentação de tal pedido.

22

No que respeita, em primeiro lugar, aos requisitos materiais de isenção dos impostos especiais de consumo para os produtos energéticos e da eletricidade referidos na Diretiva 2003/96, importa recordar que esta diretiva, como resulta do seu considerando 3, tem por objeto a fixação de níveis mínimos de tributação a nível da União Europeia para a maioria dos produtos energéticos, incluindo a eletricidade. Por força das disposições conjugadas dos artigos 5.° e 6.° da referida diretiva, lidas à luz dos seus considerandos 17 e 21, os Estados‑Membros podem introduzir taxas de imposto diferenciadas, isenções de tributação ou reduções dos impostos especiais sobre o consumo, as quais são parte integrante do regime de tributação harmonizado estabelecido pela mesma diretiva [v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2021, Hauptzollamt B (Redução facultativa do imposto), C‑100/20, EU:C:2021:716, n.o 30].

23

O artigo 5.o da Diretiva 2003/96 confere, assim, aos Estados‑Membros a faculdade de aplicarem, no respeito pelos níveis mínimos de tributação previstos nesta diretiva e no respeito pelo direito da União, taxas de tributação diferenciadas em certos casos enumerados neste artigo, entre os quais o previsto no quarto travessão, relativo à utilização profissional, ou não, dos produtos energéticos e da eletricidade referidos nos artigos 9.° e 10.° desta diretiva. Esta faculdade é parte integrante do regime de tributação harmonizado estabelecido pela mesma diretiva [v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2021, Hauptzollamt B (Redução facultativa do imposto), C‑100/20, EU:C:2021:716, n.o 30].

24

Daqui resulta que os operadores económicos sujeitos a uma taxa reduzida do imposto em causa em aplicação de uma disposição do direito nacional que aplica a referida faculdade, quando se encontram numa situação comparável à dos operadores económicos sujeitos à taxa normal desse imposto em aplicação de uma disposição obrigatória da Diretiva 2003/96, não devem, em conformidade com o princípio da igualdade de tratamento, ser tratados de maneira diferente destes últimos, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado [v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2021, Hauptzollamt B (Redução facultativa do imposto), C‑100/20, EU:C:2021:716, n.os 31 e 32].

25

Em segundo lugar, uma vez que os requisitos formais e processuais para a apresentação de um pedido de isenção do imposto que incide sobre os produtos energéticos ou a eletricidade, baseado numa regulamentação nacional que aplica a faculdade prevista no artigo 5.o, quarto travessão, da Diretiva 2003/96, não são especificados nem por esta diretiva nem por outro ato do direito da União, cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro regular esse requisitos, por força do princípio da autonomia processual, desde que, todavia, não sejam menos favoráveis do que os que regulam situações comparáveis de natureza interna (princípio da equivalência) e não tornem impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (v., por analogia, Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 59).

26

O mesmo se aplica, em particular, à fixação de prazos para o exercício desses direitos, nomeadamente dos prazos de prescrição e de caducidade. Com efeito, é jurisprudência constante que a fixação de prazos razoáveis sob pena de caducidade constitui uma aplicação do princípio fundamental da segurança jurídica, que visa garantir a previsibilidade das situações e relações jurídicas e exige, nomeadamente, que a situação do sujeito passivo, atentos os seus direitos e obrigações para com a Administração Fiscal, não possa ser indefinidamente posta em causa [v., neste sentido, Acórdãos de 21 de junho de 2012, Elsacom, C‑294/11, EU:C:2012:382, n.o 29, e de 14 de outubro de 2021, Finanzamt N e Finanzamt G (Comunicação da afetação), C‑45/20 e C‑46/20, EU:C:2021:852, n.o 59 e jurisprudência referida].

27

Contudo, tais prazos devem ser aplicados do mesmo modo aos direitos em matéria fiscal baseados no direito interno e aos direitos, análogos, baseados no direito da União, além de não deverem tornar impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício do direito em causa (v., neste sentido, Acórdão de 30 de abril de 2020, CTT — Correios de Portugal, C‑661/18, EU:C:2020:335, n.o 59 e jurisprudência referida).

28

A observância das exigências decorrentes dos princípios da equivalência e da efetividade quanto, especificamente, aos prazos de prescrição e de caducidade deve ser analisada tendo em conta o lugar que as regras nacionais que fixam esses prazos ocupam em todo o processo, a tramitação desse processo e as particularidades dessas regras nas diversas instâncias nacionais (v., neste sentido, Acórdão de 14 de outubro de 2020, Valoris, C‑677/19, EU:C:2020:825, n.o 22 e jurisprudência referida).

29

Nestas condições, tais prazos não suscetíveis de tornar impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União, mesmo que, por definição, o decurso desses prazos conduza ao não provimento, total ou parcial, da ação intentada (Acórdão de 21 de outubro de 2021, Wilo Salmson France, C‑80/20, EU:C:2021:870, n.o 95 e jurisprudência referida).

30

No caso em apreço, a regulamentação em causa no processo principal prevê, por um lado, o prazo de um ano para a liquidação do imposto sobre a energia, calculado a partir do termo do ano civil em que surgiu o imposto. Em caso de inspeção fiscal, este prazo não termina até à data em que os atos de liquidação emitidos na sequência dessa fiscalização se tornam definitivos. Por outro lado, esta regulamentação prevê um prazo para a apresentação de um pedido de isenção fiscal às autoridades nacionais competentes, com a mesma duração e, à primeira vista, com o mesmo início que o prazo de liquidação. O termo do prazo para a apresentação desse pedido acarreta automaticamente e sem exceção o indeferimento do pedido, embora o prazo de liquidação do imposto ainda não tenha terminado, devido à suspensão, interrupção ou prorrogação de que pode ser objeto.

31

Ora, o princípio da efetividade opõe‑se à regulamentação nacional em causa no processo principal, se esta dever ser interpretada no sentido de que o incumprimento do prazo para a apresentação de um pedido de isenção fiscal acarreta automaticamente e sem exceção o indeferimento desse pedido, incluindo quando o prazo de liquidação do imposto em causa — que tem a mesma duração e o mesmo início que o prazo para a apresentação do pedido e que pode ser interrompido, suspenso ou prorrogado — ainda não terminou devido, nomeadamente, a uma fiscalização fiscal movida contra o requerente. Com efeito, nesse caso, tal regulamentação pode, independentemente das circunstâncias do processo em causa, privar um sujeito passivo do direito à isenção, embora o Estado‑Membro em causa tenha optado por garantir esse direito aos operadores económicos no seu território.

32

Estas considerações são corroboradas pelo princípio da proporcionalidade, como princípio geral do direito da União, cuja interpretação o órgão jurisdicional de reenvio pretende e que as disposições nacionais de aplicação do direito da União devem igualmente respeitar [v., neste sentido, Acórdãos de 13 de julho de 2017, Vakarų Baltijos laivų statykla, C‑151/16, EU:C:2017:537, n.o 45; de 9 de setembro de 2021, Hauptzollamt B (Redução facultativa do imposto), C‑100/20, EU:C:2021:716, n.o 31; e de 30 de junho de 2022, ARVI ir ko, C‑56/21, EU:C:2022:509, n.o 34]. Este princípio obriga os Estados‑Membros a recorrerem a meios que, embora permitam alcançar eficazmente o objetivo prosseguido pela regulamentação nacional, afetem menos os princípios consagrados na legislação da União [v., neste sentido, Acórdão de 14 de outubro de 2021, Finanzamt N e Finanzamt G (Comunicação da afetação), C‑45/20 e C‑46/20, EU:C:2021:852, n.o 62 e jurisprudência referida].

33

O Tribunal de Justiça já declarou que uma regulamentação nacional que, no prazo geral de prescrição de cinco anos, impede um sujeito passivo que não tenha reclamado a dedução do IVA a montante de retificar as suas declarações de IVA relativamente aos períodos que já foram objeto de inspeção fiscal, fazendo‑lhe perder o direito a dedução, afigura‑se, tendo em conta o lugar preponderante que ocupa o direito a dedução no sistema do IVA, desproporcionada a esse objetivo prosseguido pela regulamentação nacional, no caso de não estarem demonstradas fraudes nem prejuízo para o orçamento do Estado (Acórdão de 26 de abril de 2018, Zabrus Siret, C‑81/17, EU:C:2018:283, n.o 51). Esta apreciação vale, mutatis mutandis, para uma regulamentação como a que está em causa no processo principal.

34

Uma vez que não se afigura que, em circunstâncias como as referidas no n.o 30 do presente acórdão, a admissão de um pedido de isenção ou de redução fiscal, apresentado após o termo do prazo para a apresentação desse pedido, mas no cumprimento do prazo de liquidação do imposto em causa, seja incompatível com o princípio da segurança jurídica, e tendo em conta a sistemática geral e a finalidade da Diretiva 2003/96 que assentam no princípio segundo o qual os produtos energéticos são tributados em função da sua utilização efetiva (Acórdão de 2 de junho de 2016, ROZ‑ŚWIT, C‑418/14, EU:C:2016:400, n.o 33), deve considerar‑se que o princípio da proporcionalidade também se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, quando não há dúvida sobre a utilização efetiva dos produtos energéticos.

35

Atendendo ao exposto, há que responder à questão submetida que o princípio da efetividade e o princípio da proporcionalidade, como princípio geral do direito da União, devem ser interpretados no sentido de que, no âmbito da aplicação de uma disposição como a do artigo 5.o, quarto travessão, da Diretiva 2003/96, que permite aos Estados‑Membros aplicarem, em determinadas condições, taxas de imposto diferenciadas para distinguir entre utilização profissional e utilização não profissional, no caso dos produtos energéticos e da eletricidade referidos nesta diretiva, se opõem a uma regulamentação nacional nos termos da qual as autoridades competentes de um Estado‑Membro são obrigadas a indeferir, automaticamente e sem exceção, um pedido de isenção fiscal apresentado no prazo de liquidação do imposto em causa, previsto no direito nacional, com o único fundamento de que o requerente não cumpriu o prazo fixado nesse direito para a apresentação de tal pedido.

Quanto às despesas

36

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

 

O princípio da efetividade e o princípio da proporcionalidade, como princípio geral do direito da União, devem ser interpretados no sentido de que, no âmbito da aplicação de uma disposição como a do artigo 5.o, quarto travessão, da Diretiva 2003/96/CE do Conselho, de 27 de outubro de 2003, que reestrutura o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade, que permite aos Estados‑Membros aplicarem, em determinadas condições, taxas de imposto diferenciadas para distinguir entre utilização profissional e utilização não profissional, no caso dos produtos energéticos e da eletricidade referidos nesta diretiva, se opõem a uma regulamentação nacional nos termos da qual as autoridades competentes de um Estado‑Membro são obrigadas a indeferir, automaticamente e sem exceção, um pedido de isenção fiscal apresentado no prazo de liquidação do imposto em causa, previsto no direito nacional, com o único fundamento de que o requerente não cumpriu o prazo fixado nesse direito para a apresentação de tal pedido.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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