Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62021CJ0438

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 16 de março de 2023.
Comissão Europeia e o. contra Pharmaceutical Works Polpharma S.A.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Saúde pública — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83/CE — Regulamento (CE) n.o 726/2004 — Pedido de autorização de introdução no mercado de uma versão genérica do medicamento Tecfidera — Decisão da Agência Europeia de Medicamentos (EMA) que recusou validar o pedido de autorização de introdução no mercado — Decisão anterior da Comissão Europeia que declara que o Tecfidera não era abrangido pela mesma autorização de introdução no mercado global que o Fumaderm — Associação medicamentosa anteriormente autorizada — Autorização de introdução no mercado posterior de um componente da associação medicamentosa — Apreciação da existência de uma autorização de introdução no mercado global.
Processos apensos C-438/21 P a C-440/21 P.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:213

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

16 de março de 2023 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Saúde pública — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83/CE — Regulamento (CE) n.o 726/2004 — Pedido de autorização de introdução no mercado de uma versão genérica do medicamento Tecfidera — Decisão da Agência Europeia de Medicamentos (EMA) que recusou validar o pedido de autorização de introdução no mercado — Decisão anterior da Comissão Europeia que declara que o Tecfidera não era abrangido pela mesma autorização de introdução no mercado global que o Fumaderm — Associação medicamentosa anteriormente autorizada — Autorização de introdução no mercado posterior de um componente da associação medicamentosa — Apreciação da existência de uma autorização de introdução no mercado global»

Nos processos apensos C‑438/21 P a C‑440/21 P,

que têm por objeto três recursos de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interpostos em 14 de julho de 2021 (C‑438/21 P e C‑439/21 P) e em 15 de julho de 2021 (C‑440/21 P),

Comissão Europeia, representada inicialmente por S. Bourgois, L. Haasbeek e A. Sipos, e, em seguida, por L. Haasbeek e A. Sipos, na qualidade de agentes,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Pharmaceutical Works Polpharma S.A., com sede em Starogard Gdański (Polónia), representada por N. Carbonnelle, avocat, S. Faircliffe, solicitor, e M. Martens, advocaat,

recorrente em primeira instância,

Agência Europeia de Medicamentos (EMA), representada por S. Drosos, H. Kerr e S. Marino, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

Biogen Netherlands BV, com sede em Badhoevedorp (Países Baixos), representada por C. Schoonderbeek, advocaat,

interveniente em primeira instância (C‑438/21 P),

e

Biogen Netherlands BV, com sede em Badhoevedorp, representada por C. Schoonderbeek, advocaat,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Pharmaceutical Works Polpharma S.A., com sede em Starogard Gdański, representada por N. Carbonnelle, avocat, S. Faircliffe, solicitor, e M. Martens, advocaat,

recorrente em primeira instância,

Agência Europeia de Medicamentos (EMA), representada por S. Drosos e S. Marino, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

Comissão Europeia, representada inicialmente por S. Bourgois, L. Haasbeek e A. Sipos, e, em seguida, por L. Haasbeek e A. Sipos, na qualidade de agentes,

interveniente em primeira instância (C‑439/21 P),

e

Agência Europeia de Medicamentos (EMA), representada por S. Drosos, H. Kerr e S. Marino, na qualidade de agentes,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Pharmaceutical Works Polpharma S.A., com sede em Starogard Gdański, representada por N. Carbonnelle, avocat, S. Faircliffe, solicitor, e M. Martens, advocaat,

recorrente em primeira instância,

Comissão Europeia, representada inicialmente por S. Bourgois, L. Haasbeek e A. Sipos, e, em seguida, por L. Haasbeek e A. Sipos, na qualidade de agentes,

Biogen Netherlands BV, com sede em Badhoevedorp, representada por C. Schoonderbeek, advocaat,

intervenientes em primeira instância (C‑440/21 P),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: C. Lycourgos, presidente de secção, L. S. Rossi, J.‑C. Bonichot, S. Rodin e O. Spineanu‑Matei (relatora), juízes,

advogada‑geral: L. Medina,

secretária: R. Stefanova‑Kamisheva, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 30 de junho de 2022,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 6 de outubro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1

Com os respetivos recursos, a Comissão Europeia (C‑438/21 P), a Biogen Netherlands BV (a seguir «Biogen») (C‑439/21 P) e a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) (C‑440/21 P) pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 5 de maio de 2021, Pharmaceutical Works Polpharma/EMA (T‑611/18, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2021:241), pelo qual o Tribunal Geral anulou a Decisão da EMA de 30 de julho de 2018 que recusou validar o pedido apresentado pela Pharmaceutical Works Polpharma S.A. (a seguir «Polpharma») de autorização de introdução no mercado de uma versão genérica do medicamento Tecfidera (a seguir «decisão controvertida»).

Quadro jurídico

Diretiva 2001/83/CE

2

Os considerandos 9 e 12 da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (JO 2001, L 311, p. 67), conforme alterada pela Diretiva 2012/26/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012 (JO 2012, L 299, p. 1) (a seguir «Diretiva 2001/83»), enunciam:

«(9)

A experiência demonstrou que é conveniente precisar ainda melhor os casos em que não é necessário fornecer os resultados dos ensaios toxicológicos, farmacológicos ou clínicos para obter autorização de um medicamento essencialmente similar a um medicamento autorizado, embora zelando por que as firmas inovadoras não fiquem em desvantagem.

[…]

(12)

Exceto no que respeita aos medicamentos sujeitos ao procedimento comunitário centralizado de autorização previsto no Regulamento (CEE) n.o 2309/93 do Conselho, de 22 de julho de 1993, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e fiscalização dos medicamentos de uso humano e veterinário e institui uma Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos [(JO 1993, L 214, p. 1)], autorização de introdução no mercado emitida pela autoridade competente de um Estado‑Membro deve ser reconhecida pelas autoridades competentes dos restantes Estados‑Membros, a menos que haja fortes indícios para pressupor que a autorização do medicamento em questão pode constituir um risco para a saúde pública. Em caso de divergência entre os Estados‑Membros relativamente à eficácia, qualidade e segurança de um medicamento, deve ser realizada a nível comunitário uma análise científica que resulte numa decisão inequívoca nessa matéria e que vincule os Estados‑Membros em questão. A referida decisão deve ser adotada na sequência de um procedimento rápido que assegure a cooperação estreita entre a Comissão e os Estados‑Membros».

3

O artigo 1.o da Diretiva 2001/83 prevê:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

2)

“Medicamento”:

a)

Toda a substância ou associação de substâncias apresentada como possuindo propriedades curativas ou preventivas relativas a doenças em seres humanos; ou

b)

Toda a substância ou associação de substâncias que possa ser utilizada ou administrada em seres humanos com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou modificar funções fisiológicas ao exercer uma ação farmacológica, imunológica ou metabólica, ou a estabelecer um diagnóstico médico.

[…]

3‑A) “Substância ativa”:

Qualquer substância ou mistura de substâncias destinada a ser utilizada no fabrico de um medicamento e que, quando utilizada no seu fabrico, se torna um princípio ativo desse medicamento, destinado a exercer uma ação farmacológica, imunológica ou metabólica com vista a restaurar, corrigir ou modificar funções fisiológicas ou a estabelecer um diagnóstico médico;

[…]»

4

O artigo 6.o, n.o 1, desta diretiva dispõe:

«Não pode ser introduzido um medicamento no mercado de um Estado‑Membro sem que para tal tenha sido emitida pela autoridade competente desse Estado‑Membro uma autorização de introdução no mercado, em conformidade com a presente diretiva, ou sem que tenha sido concedida uma autorização em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 726/2004 [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, que estabelece procedimentos da União de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e que cria uma Agência Europeia de Medicamentos (JO 2004, L 136, p. 1)] […]

Sempre que um medicamento tiver obtido uma autorização inicial de introdução no mercado nos termos do primeiro parágrafo, quaisquer dosagens, formas farmacêuticas, vias de administração e apresentações adicionais, bem como quaisquer alterações e extensões, devem também receber uma autorização nos termos do primeiro parágrafo ou ser incluídas na autorização inicial de introdução no mercado. Considera‑se que todas estas autorizações de introdução no mercado fazem parte da mesma autorização de introdução no mercado global, nomeadamente para efeitos da aplicação do n.o 1 do artigo 10.o»

5

O artigo 10.o, n.os 1 e 2, da referida diretiva enuncia:

«1.   Em derrogação da alínea i) do n.o 3 do artigo 8.o e sem prejuízo das leis relativas à proteção da propriedade industrial e comercial, o requerente não é obrigado a fornecer os resultados dos ensaios pré‑clínicos e clínicos se puder demonstrar que o medicamento é um genérico de um medicamento de referência que seja ou tenha sido autorizado nos termos do artigo 6.o há, pelo menos, oito anos num Estado‑Membro ou na [União].

Os medicamentos genéricos autorizados nos presentes termos só podem ser comercializados 10 anos após a autorização inicial do medicamento de referência.

[…]

O período de dez anos referido no segundo parágrafo será alargado a um máximo de onze anos se, nos primeiros oito desses dez anos, o titular da autorização de introdução no mercado obtiver uma autorização para uma ou mais indicações terapêuticas novas que, na avaliação científica prévia à sua autorização, se considere trazerem um benefício clínico significativo em comparação com as terapias existentes.

2.   Para efeitos do presente artigo, entende‑se por:

a)

Medicamento de referência, um medicamento autorizado, nos termos do artigo 6.o, em conformidade com o disposto no artigo 8.o;

b)

Medicamento genérico, um medicamento com a mesma composição qualitativa e quantitativa em substâncias ativas, a mesma forma farmacêutica que o medicamento de referência e cuja bioequivalência com este último tenha sido demonstrada por estudos adequados de biodisponibilidade. Os diferentes sais, ésteres, éteres, isómeros, misturas de isómeros, complexos ou derivados de uma substância ativa são considerados uma mesma substância ativa, a menos que difiram significativamente em propriedades relacionadas com segurança e/ou eficácia, caso em que o requerente deve fornecer dados suplementares destinados a fornecer provas da segurança e/ou da eficácia dos vários sais, ésteres ou derivados de uma substância ativa autorizada. As diferentes formas farmacêuticas orais de libertação imediata são consideradas como uma mesma forma farmacêutica. O requerente pode ser dispensado da apresentação dos estudos de biodisponibilidade, se puder demonstrar que o medicamento genérico satisfaz os critérios pertinentes definidos nas diretrizes pormenorizadas na matéria.»

6

O artigo 30.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83 prevê:

«Caso tenham sido apresentados dois ou mais pedidos de autorização de introdução no mercado para um dado medicamento, em conformidade com os artigos 8.o, 10.o, 10.o‑A, 10.o‑B, 10.o‑C e 11.o, e os Estados‑Membros tenham tomado decisões divergentes relativamente à sua autorização, suspensão ou revogação, um Estado‑Membro, a Comissão, ou o requerente ou o titular da autorização de introdução no mercado podem submeter a questão ao Comité dos Medicamentos para Uso Humano, a seguir designado “Comité”, para que se aplique o procedimento previsto nos artigos 32.o, 33.o e 34.o»

7

Nos termos do artigo 31.o, n.o 1, desta diretiva:

«Em casos específicos em que esteja envolvido o interesse da União, os Estados‑Membros, a Comissão, o requerente ou o titular da autorização de introdução no mercado submetem a questão ao Comité para aplicação do procedimento previsto nos artigos 32.o, 33.o e 34.o antes de ser tomada qualquer decisão sobre o pedido, a suspensão ou a revogação de uma autorização de introdução no mercado, ou sobre qualquer outra alteração, eventualmente necessária, da referida autorização.

[…]»

Regulamento n.o 726/2004

8

Os considerandos 17 e 19 do Regulamento n.o 726/2004 enunciam:

«(17)

A [União] deve dispor dos meios necessários para proceder à avaliação científica dos medicamentos apresentados em conformidade com procedimentos comunitários de autorização descentralizados. Além disso, com vista a garantir a harmonização efetiva das decisões administrativas adotadas pelos Estados‑Membros no que se refere a medicamentos apresentados em conformidade com procedimentos de autorização descentralizados, torna‑se necessário dotar a [União] dos meios necessários para resolver as divergências entre Estados‑Membros quanto à qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos.

[…]

(19)

A principal atribuição da [EMA] deve ser a de emitir pareceres científicos da melhor qualidade possível destinados às instituições comunitárias e aos Estados‑Membros, para o exercício das competências que a legislação [da União] lhes confere no domínio dos medicamentos, no que respeita à autorização e fiscalização dos mesmos. Só após uma avaliação científica única, do mais elevado nível possível, da qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos de alta tecnologia, a efetuar pela [EMA], deve a [União] conceder uma autorização de introdução no mercado, através de um procedimento célere que assegure uma estreita cooperação entre a Comissão e os Estados‑Membros.»

9

Nos termos do artigo 3.o, n.o 3, deste regulamento:

«Um medicamento genérico de um medicamento de referência autorizado pela [União] pode ser autorizado pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros em conformidade com a Diretiva 2001/83/CE e com a Diretiva 2001/82/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários (JO 2001, L 311, p. 1)], nas seguintes condições:

a)

O pedido de autorização deve ser apresentado ao abrigo do artigo 10.o da Diretiva 2001/83/CE ou do artigo 13.o da Diretiva 2001/82/CE;

b)

O resumo das características do medicamento deve ser perfeitamente conforme ao do medicamento autorizado pela [União], exceto no caso de partes do resumo das características do medicamento relativas às indicações ou às dosagens estarem ainda abrangidas pelo direito das patentes no momento da comercialização do medicamento genérico ‑ e

c)

O medicamento genérico deve ser autorizado com o mesmo nome em todos os Estados‑Membros em que o pedido tenha sido apresentado. Para efeitos desta disposição, todas as versões linguísticas da DCI (denominação comum internacional) devem ser consideradas como sendo o mesmo nome.»

10

O artigo 4.o, n.o 1, do referido regulamento dispõe:

«Os pedidos de autorização de introdução no mercado referida no artigo 3.o devem ser apresentados à [EMA].»

11

O artigo 5.o, n.o 1, do mesmo regulamento enuncia:

«É instituído um Comité dos Medicamentos para Uso Humano. O Comité faz parte da [EMA].»

12

O artigo 57.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 726/2004 prevê:

«A [EMA] fornece aos Estados‑Membros e às instituições da [União] os melhores pareceres científicos possíveis sobre qualquer questão relativa à avaliação da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos para uso humano ou veterinário que lhe seja apresentada em conformidade com as disposições da legislação [da União] em matéria de medicamentos.»

13

Nos termos do artigo 60.o deste regulamento:

«A pedido da Comissão, a [EMA] recolhe, em relação aos medicamentos autorizados, todas as informações disponíveis sobre a metodologia utilizada pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros para determinar a mais‑valia terapêutica obtida com qualquer novo medicamento.»

Regulamento (CE) n.o 1234/2008

14

O artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 1234/2008 da Comissão, de 24 de novembro de 2008, relativo à análise das alterações dos termos das autorizações de introdução no mercado de medicamentos para uso humano e medicamentos veterinários (JO 2008, L 334, p. 7), conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 712/2012 da Comissão, de 3 de agosto de 2012 (JO 2012, L 209, p. 4) (a seguir «Regulamento n.o 1234/2008»), dispõe:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

4)

“Extensão da autorização de introdução no mercado” ou “extensão”, qualquer alteração constante do anexo I que observe as condições previstas no referido anexo.

[…]»

15

O anexo I deste regulamento, intitulado «Extensões das autorizações de introdução no mercado», contém a seguinte passagem:

«1. Alterações da(s) substância(s) ativa(s):

a)

substituição de uma substância ativa por um sal ou éster diferente (complexo/derivado), com a mesma parte ativa terapêutica, em que as características de eficácia/segurança não variem consideravelmente;

[…]»

16

O referido regulamento revogou o Regulamento (CE) n.o 1085/2003 da Comissão, de 3 de junho de 2003, relativo à análise da alteração dos termos das autorizações de introdução no mercado de medicamentos para uso humano e medicamentos veterinários no âmbito do Regulamento n.o 2309/93 (JO 2003, L 159, p. 24).

Antecedentes do litígio

17

Os antecedentes do litígio figuram nos n.os 1 a 51 do acórdão recorrido e podem, para efeitos do presente processo, ser resumidos do seguinte modo.

18

Em 9 de agosto de 1994, o Bundesinstitut für Arzneimittel und Medizinprodukte (Instituto Federal dos Medicamentos e dos Produtos Médicos, Alemanha) (a seguir «BfArM») concedeu à Fumapharm AG duas autorizações de introdução no mercado (a seguir «AIM») relativas a duas dosagens de um medicamento denominado Fumaderm, indicado para o tratamento da psoríase. O Fumaderm foi autorizado como associação medicamentosa fixa de fumarato de dimetilo ou dimetilo fumarato (a seguir «DMF») e de vários sais de etilo hidrogeno fumarato (sais de monoetilo fumarato, a seguir «MEF»). Em conformidade com o artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83, o período regulamentar de proteção dos dados (a seguir «PRD») do Fumaderm terminou em 2004. Essas AIM foram, por último, transferidas para a Biogen Idec Ltd.

19

Em 28 de fevereiro de 2012, a Biogen Idec apresentou à EMA, com fundamento no artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 726/2004, um pedido de AIM do medicamento para uso humano Tecfidera — fumarato de dimetilo (a seguir «Tecfidera»).

20

Em 30 de janeiro de 2014, a Comissão adotou a Decisão de Execução C(2014) 601 final que concede uma autorização de introdução no mercado do medicamento para uso humano Tecfidera ao abrigo do Regulamento n.o 726/2004 (a seguir «Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014»). Foi publicado um resumo dessa decisão de execução no Jornal Oficial da União Europeia em 28 de fevereiro de 2014 (JO 2014, C 59, p. 1).

21

Com essa decisão, o Tecfidera foi autorizado como medicamento monossubstância, composto por DMF, e indicado para o tratamento da esclerose múltipla. A Comissão considerou igualmente que o Tecfidera e o Fumaderm não faziam parte da mesma autorização de introdução no mercado global, na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83. A este respeito, o considerando 3 da referida decisão tem a seguinte redação:

«O [DMF], a substância ativa contida no “[Tecfidera]”, entra na composição do medicamento autorizado Fumaderm, que contém DMF, bem como sal de cálcio de etilo fumarato, sal de magnésio de etilo hidrogeno fumarato e sal de zinco de etilo hidrogeno fumarato ([MEF]), e que pertence ao mesmo titular de autorização de introdução no mercado. O Comité dos Medicamentos para Uso Humano concluiu que o [MEF] e o [DMF] são dois ativos e não correspondem à mesma substância ativa, porque a sua fração terapêutica não é a mesma. Por conseguinte, considera‑se que o Tecfidera que contém DMF é diferente do Fumaderm, o outro medicamento já autorizado composto por DMF e por [MEF]. Por conseguinte, o “[Tecfidera]”, cujo pedido de autorização se baseava no artigo 8.o, n.o 3, da [Diretiva 2001/83], e o medicamento já autorizado “Fumaderm” não fazem parte da mesma autorização de introdução no mercado global em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, [desta diretiva].»

22

Em 27 de novembro de 2017, a Polpharma apresentou à EMA um pedido de confirmação da sua elegibilidade para apresentar um pedido de AIM segundo o procedimento centralizado em aplicação do artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 726/2004, para um medicamento genérico denominado Dimethyl Fumarate Pharmaceutical Works Polpharma, derivado do medicamento de referência Tecfidera.

23

Através da decisão controvertida, adotada em 30 de julho de 2018, a EMA informou a Polpharma de que não estava em condições de validar o seu pedido. A EMA salientou que, segundo o considerando 3 da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, o Tecfidera e o medicamento já autorizado Fumaderm não faziam parte da mesma autorização global na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, pelo facto de o MEF e o DMF serem dois ativos e não corresponderem à mesma substância ativa, porque a sua fração terapêutica não era a mesma nos dois medicamentos. A EMA considerou que o Tecfidera beneficiava do seu próprio PRD de oito anos e que esse período de proteção ainda não tinha terminado. Tendo em conta essas constatações, a EMA indicou que a referência a dados relativos aos ensaios pré‑clínicos e clínicos, constantes do processo do Tecfidera, não estava atualmente autorizada para efeitos de apresentação de um pedido de autorização de introdução no mercado em aplicação do artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83.

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

24

Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de outubro de 2018, a Polpharma interpôs recurso de anulação da decisão controvertida.

25

Por Despachos do Tribunal Geral de 19 de março de 2019, a Biogen, a saber, a sociedade para a qual a AIM do Tecfidera tinha sido transferida, e a Comissão, foram admitidas a intervir em apoio dos pedidos da EMA.

26

Em apoio do seu recurso, a Polpharma invocou um fundamento único, relativo à ilegalidade da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014. Em substância, alegou que essa decisão, que constituía a base jurídica da decisão controvertida, devia, em conformidade com o artigo 277.o TFUE, ser declarada inaplicável, uma vez que era ilegal na parte em que a Comissão tinha considerado que o Tecfidera e o Fumaderm eram diferentes e que, consequentemente, não estavam abrangidos pela mesma autorização de introdução no mercado global. A este respeito, a Polpharma sustentou que, perante um pedido de AIM de uma substância ativa que faz parte de uma associação medicamentosa anteriormente autorizada, a apreciação da existência de uma diferença entre essa associação e a substância ativa isolada depende da questão de saber se as substâncias ativas individuais da associação têm uma contribuição terapêutica documentada e pertinente nessa associação. A Polpharma deduziu daí que a decisão controvertida, que recusou validar o pedido de AIM de um medicamento genérico do Tecfidera, estava privada de base jurídica e devia ser anulada, nomeadamente por falta de fundamentação, nos termos do artigo 296.o TFUE.

27

Em primeiro lugar, nos n.os 85 a 149 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que a exceção de ilegalidade suscitada pela Polpharma contra a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 era admissível. Com efeito, antes de mais, qualificou essa decisão de «ato de alcance geral», uma vez que constatou que o Tecfidera não fazia parte da mesma autorização global que o Fumaderm, anteriormente autorizado. Em seguida, referiu que a Comissão se tinha baseado expressamente nas apreciações do Comité dos Medicamentos para Uso Humano, instituído pelo artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento n.o 726/2004 e pertencentes à EMA (a seguir «CHMP»), para concluir que o Tecfidera e o Fumaderm não eram abrangidos pela mesma autorização global. Considerou que, para demonstrar a ilegalidade da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, a Polpharma tinha, deste modo, o direito de contestar as apreciações que figuram nos documentos do CHMP relativos ao Tecfidera, nos quais essa decisão de execução se baseava e que faziam parte integrante da sua fundamentação. Por último, após ter analisado os elementos dos autos, o Tribunal Geral concluiu que a Polpharma não tinha legitimidade para interpor um recurso direto de anulação da referida decisão de execução. Salientou, nomeadamente, que a Polpharma não dispunha de um interesse efetivo e atual para pedir a anulação desta última, sendo o mesmo futuro e incerto na data em que podia interpor recurso de anulação dessa decisão de execução.

28

Em segundo lugar, o Tribunal Geral julgou procedente a exceção de ilegalidade e declarou que a decisão controvertida, que assentava na Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, não tinha fundamento e devia ser anulada.

29

Para chegar a essa conclusão, em primeiro lugar, nos n.os 173 a 180 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral examinou o conceito de «autorização global» e os objetivos deste. A este respeito, esclareceu que este conceito, que figura no artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, dá seguimento a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, que desenvolveu o referido conceito, designadamente, para ter em conta o objetivo do procedimento dito «abreviado», que é o de permitir economias de tempo e de custos necessários para reunir os resultados dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos, bem como evitar a repetição dos ensaios em seres humanos ou animais. Mencionou igualmente, atendendo ao artigo 10.o da Diretiva 2001/83, o objetivo de «favorecer a investigação de novas indicações terapêuticas portadoras de um benefício clínico importante, bem como de uma melhoria do bem‑estar e da qualidade de vida do paciente», velando simultaneamente por «manter o necessário equilíbrio entre a promoção de tais inovações e a necessidade de favorecer a produção de medicamentos genéricos».

30

Em segundo lugar, nos n.os 181 a 218 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral examinou o direito da União aplicável e a evolução dos conhecimentos científicos de 1994 a 2014. A este respeito, constatou que, quando da adoção da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, a Comissão foi confrontada, pela primeira vez, ao nível da União, com a questão de saber se uma associação medicamentosa fixa autorizada e um componente dessa associação pertencem ou não à mesma autorização global. Considerou, por outro lado, que, ao responder à questão de saber se a AIM do Tecfidera, cuja única substância ativa era um componente do Fumaderm, fazia ou não parte da mesma autorização global, a Comissão devia ter tido em conta o facto de o estado do direito da União relativo às associações medicamentosas e os conhecimentos científicos serem significativamente diferentes daqueles que existiam em 1994, quando a autoridade nacional emitiu a AIM para o Fumaderm. O Tribunal Geral considerou que, neste contexto particular, a Comissão tinha razão ao pedir ao CHMP que avaliasse se o DMF, componente do Tecfidera, era diferente do Fumaderm, composto por DMF e MEF.

31

Em terceiro lugar, e sem se pronunciar sobre a aplicabilidade do artigo 31.o da Diretiva 2001/83 no caso em apreço, nos n.os 219 a 238 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que, no âmbito dos procedimentos de AIM levados a efeito a nível da União ou nos Estados‑Membros, a EMA e a Comissão exercem uma função específica, que não é comparável à das autoridades nacionais. Considerou que o princípio do reconhecimento mútuo não pode, portanto, obstar a que, na sequência da apresentação de um pedido de AIM no âmbito do procedimento centralizado, o CHMP examine as avaliações anteriormente efetuadas por uma autoridade nacional ou proceda ele próprio a uma avaliação independente.

32

Em quarto lugar, nos n.os 239 a 273 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que, quando da adoção da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, a EMA e a Comissão dispunham ou podiam dispor de dados suscetíveis de retirar plausibilidade à hipótese de que o MEF desempenhava um papel no Fumaderm.

33

Em quinto lugar, após expor todas estas considerações, o Tribunal Geral salientou, no n.o 281 do acórdão recorrido, que resultava claramente do considerando 3 da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 que a apreciação segundo a qual o Tecfidera é diferente do Fumaderm e não é abrangido pela mesma autorização de introdução no mercado global que o Fumaderm se baseava na constatação do CHMP de que o MEF e o DMF são dois ativos e não correspondem à mesma substância ativa, bem como na constatação de que já tinha sido concedida uma AIM ao Fumaderm enquanto associação medicamentosa composta por DMF e MEF.

34

Ora, segundo o Tribunal Geral, estas constatações não eram suficientes para concluir que o Tecfidera era abrangido por uma autorização de introdução no mercado global distinta da do Fumaderm. No n.o 282 do acórdão recorrido, declarou, a este respeito, que, atendendo aos objetivos dessa autorização global, o direito da União aplicável às associações medicamentosas apreciadas durante o ano de 1994 e a evolução dos conhecimentos científicos entre 1994 e 2014, a função específica exercida pela EMA e pela Comissão, bem como aos dados de que estas dispunham ou podiam dispor e que eram suscetíveis de retirar plausibilidade à hipótese de o MEF desempenhar um papel no Fumaderm, a Comissão não tinha direito a concluir que o Tecfidera era abrangido por uma autorização de introdução no mercado global diferente do Fumaderm anteriormente autorizado sem ter verificado ou requerido ao CHMP que verificasse se, e, se fosse caso disso, de que modo, o BfArM tinha apreciado o papel do MEF no Fumaderm e, também, sem ter pedido ao CHMP que verificasse esse papel.

35

Nos n.os 289 e 293 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral deduziu daí que, uma vez que a Comissão não analisou todos os dados pertinentes que deviam ser tomados em consideração para concluir que o Tecfidera e o Fumaderm não eram abrangidos pela mesma autorização de introdução no mercado global, a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 enfermava de um erro manifesto de apreciação. Nos n.os 295 e 296 do acórdão recorrido, julgou procedente a exceção de ilegalidade suscitada pela Polpharma e, consequentemente, declarou que a decisão controvertida, que assentava na Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, não tinha fundamento e devia ser anulada.

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

36

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 4 de maio de 2022, a Biogen pediu que o processo C‑439/21 P beneficiasse de tratamento prioritário, ao abrigo do artigo 53.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. O presidente do Tribunal de Justiça decidiu, em 6 de maio de 2022, que não havia que julgar este processo com prioridade.

37

Por Decisão de 10 de maio de 2022, os processos C‑438/21 P a C‑440/21 P foram apensados para efeitos da fase oral e do acórdão.

38

Com o seu recurso no processo C‑438/21 P, a Comissão, apoiada pela Biogen, pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido;

negar provimento ao recurso em primeira instância; e

condenar a Polpharma no pagamento das despesas.

39

Com o seu recurso no processo C‑439/21 P, a Biogen, apoiada pela Comissão, pede, em substância, que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido;

negar provimento ao recurso interposto em primeira instância ou remeter o processo ao Tribunal Geral, se necessário; e

condenar a Polpharma no pagamento das despesas.

40

Com o seu recurso no processo C‑440/21 P, a EMA, apoiada pela Comissão e pela Biogen, pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido;

negar provimento ao recurso em primeira instância; e

condenar a Polpharma no pagamento das despesas do processo em primeira instância e do presente recurso.

41

Nos processos C‑438/21 P a C‑440/21 P, a Polpharma pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento aos recursos;

confirmar o acórdão recorrido; e

condenar a Comissão, a Biogen e a EMA nas despesas efetuadas no âmbito dos respetivos recursos.

Quanto aos pedidos de reabertura da fase oral do processo

42

Na sequência da apresentação das conclusões da advogada‑geral, a Polpharma pediu, por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal de Justiça em 24 de novembro de 2022 e em 20 de janeiro de 2023, a reabertura da fase oral do processo, em aplicação do artigo 83.o do Regulamento de Processo.

43

Nos termos desta disposição, o Tribunal pode, a qualquer momento, ouvido o advogado‑geral, ordenar a reabertura da fase oral do processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido, ou quando, após o encerramento dessa fase, uma parte invocar um facto novo que possa ter influência determinante na decisão do Tribunal, ou ainda quando o processo deva ser resolvido com base num argumento que não foi debatido.

44

Em apoio dos seus pedidos, a Polpharma alega que, no que respeita ao procedimento de renovação da AIM do Fumaderm em 2013, as conclusões da advogada‑geral assentam no pressuposto errado de que o BfArM tinha confirmado a contribuição terapêutica do MEF.

45

Todavia, importa recordar que, por força do artigo 252.o, segundo parágrafo, TFUE, cabe ao advogado‑geral apresentar publicamente, com toda a imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas que, nos termos do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, requeiram a sua intervenção. Não se trata, portanto, de um parecer destinado aos juízes ou às partes que emane de uma autoridade externa ao Tribunal de Justiça, mas da opinião individual, fundamentada e expressa publicamente, de um membro da própria instituição. Nestas condições, as conclusões do advogado‑geral não podem ser debatidas pelas partes. Além disso, o Tribunal de Justiça não está vinculado pelas conclusões do advogado‑geral nem pela fundamentação em que este baseia essas conclusões. Por conseguinte, o desacordo de uma parte com as conclusões do advogado‑geral, sejam quais forem as questões nelas examinadas, não constitui, em si mesmo, um fundamento justificativo da reabertura da fase oral do processo (Acórdão de 9 de junho de 2022, Préfet du Gers e Institut national de la statistique et des études économiques, C‑673/20, EU:C:2022:449, n.o 41 e jurisprudência referida).

46

No caso em apreço, resulta dos pedidos de reabertura da fase oral do processo que, com estes pedidos, a Polpharma pretende, na realidade, responder à leitura, efetuada pela advogada‑geral, das circunstâncias factuais e jurídicas subjacentes ao primeiro fundamento de recurso no processo C‑438/21 P, ao terceiro fundamento de recurso no processo C‑439/21 P e ao primeiro fundamento de recurso no processo C‑440/21 P. Ora, como resulta do artigo 83.o do Regulamento de Processo e da jurisprudência referida no número anterior do presente acórdão, não se trata de um fundamento entre os que podem justificar a reabertura da fase oral de um processo. Por outro lado, uma vez que essas circunstâncias foram objeto de amplos debates entre as partes no recurso na fase escrita do processo e na audiência, o Tribunal de Justiça considera, ouvida a advogada‑geral, que dispõe de todos os elementos necessários para decidir do recurso e que o processo não deve ser resolvido à luz de um facto novo suscetível de exercer uma influência decisiva na sua decisão ou de um argumento que não foi debatido perante si.

47

Nestas condições, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.

Quanto aos presentes recursos

48

Em apoio dos respetivos recursos nos processos C‑438/21 P, C‑439/21 P e C‑440/21 P, a Comissão, a Biogen e a EMA (a seguir «recorrentes») invocam quatro fundamentos semelhantes.

49

Com o primeiro fundamento no processo C‑438/21 P, o terceiro fundamento no processo C‑439/21 P e o primeiro fundamento no processo C‑440/21 P, respetivamente, a Comissão, a Biogen e a EMA invocam, em substância, a não tomada em consideração da avaliação do Fumaderm quando da renovação da sua AIM, em 2013, pelo BfArM, e a desvirtuação dos factos.

50

Com o segundo fundamento no processo C‑438/21 P, o segundo fundamento no processo C‑439/21 P e o terceiro fundamento no processo C‑440/21 P, respetivamente, a Comissão, a Biogen e a EMA invocam, em substância, uma violação do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 e uma interpretação errada do conceito de «autorização global».

51

Com o terceiro fundamento no processo C‑438/21 P, o quarto fundamento no processo C‑439/21 P e o segundo fundamento no processo C‑440/21 P, respetivamente, a Comissão, a Biogen e a EMA invocam, em substância, uma violação do sistema de aplicação descentralizada da legislação da União em matéria farmacêutica, estabelecido pelo Regulamento n.o 726/2004 e pela Diretiva 2001/83, bem como uma violação dos princípios da atribuição de competências e da subsidiariedade conforme enunciados no artigo 5.o TUE, bem como do princípio da confiança mútua.

52

Com o quarto fundamento no processo C‑438/21 P, o quinto fundamento no processo C‑439/21 P e o quarto fundamento no processo C‑440/21 P, respetivamente, a Comissão, a Biogen e a EMA invocam, em substância, uma violação do alcance da fiscalização jurisdicional, uma vez que o Tribunal Geral substituiu a avaliação científica das autoridades reguladoras competentes pela sua própria avaliação.

53

Por último, além destes quatro fundamentos semelhantes, com o seu primeiro fundamento no processo C‑439/21 P, a Biogen sustenta que o Tribunal Geral aplicou erradamente o artigo 277.o TFUE, ao declarar admissível a exceção de ilegalidade suscitada pela Polpharma contra a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014.

Quanto ao primeiro fundamento no processo C‑439/21 P

Argumentos das partes

54

Com o seu primeiro fundamento no processo C‑439/21 P, a Biogen acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao declarar admissível a exceção de ilegalidade suscitada contra a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 quando esta decisão podia ter sido diretamente impugnada pela Polpharma em 2014.

55

A este respeito, mais especificamente, o Tribunal Geral considerou, erradamente, no n.o 137 do acórdão recorrido, por um lado, que a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 necessitava de medidas de execução e que a decisão controvertida constituía uma dessas medidas. Por outro lado, o Tribunal baseou‑se, erradamente, na constatação, efetuada no n.o 136 do acórdão recorrido, de que a decisão controvertida constituía uma medida de execução necessária, uma vez que a Polpharma só conseguiu demonstrar que a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 era suscetível de produzir efeitos diretos na sua situação jurídica mediante um pedido genérico.

56

A Polpharma sustenta que este fundamento deve ser julgado improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

57

Importa salientar que, com o seu primeiro fundamento no processo C‑439/21 P, a Biogen pretende contestar os n.os 136 e 137 do acórdão recorrido, na parte em que o Tribunal Geral considerou, em substância, que a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 necessitava de medidas de execução e que a decisão controvertida constituía uma dessas medidas.

58

Ora, resulta da apreciação do Tribunal Geral nos n.os 138 a 147 do acórdão recorrido que a sua conclusão, no n.o 148 do acórdão recorrido, segundo a qual a Polpharma não tinha legitimidade para interpor um recurso com fundamento no artigo 263.o TFUE, com vista à anulação da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, assentava, em todo o caso, na constatação de que esta não dispunha de um interesse em agir efetivo e atual a respeito dessa decisão.

59

Daqui resulta que o primeiro fundamento no processo C‑439/21 P deve ser julgado inoperante.

Quanto ao segundo fundamento no processo C‑438/21 P, ao segundo fundamento no processo C‑439/21 P e ao terceiro fundamento no processo C‑440/21 P

Argumentos das partes

60

Com os seus respetivos fundamentos, dirigidos contra os n.os 173 a 180, 236 a 238, 274, 275, 280 a 282, 288, 289 e 292 do acórdão recorrido, a Comissão, a Biogen e a EMA invocam, em substância, uma violação do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83. Particularmente, acusam o Tribunal Geral de ter interpretado erradamente o conceito de «autorização global» previsto nesta disposição.

61

A este respeito, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral violou a referida disposição, conforme interpretada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, ao declarar que, no contexto da avaliação destinada a determinar se o Fumaderm e o Tecfidera fazem parte da mesma autorização global, a EMA e a Comissão deviam ter reavaliado a composição qualitativa em substâncias ativas do medicamento inicial, isto é, do Fumaderm, que é uma associação medicamentosa, para determinar se o MEF e o DMF fornecem, cada um, uma contribuição terapêutica no âmbito dessa associação.

62

O critério assim utilizado pelo Tribunal Geral não é justificado nem pelo artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 nem pelos objetivos legislativos subjacentes ao conceito de «autorização global».

63

Com efeito, por um lado, segundo as recorrentes, o artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 enumera em termos claros, exaustivamente, todas as evoluções posteriores possíveis de um medicamento abrangido pelo âmbito de aplicação de uma autorização global existente. Estas evoluções englobam outras dosagens, formas farmacêuticas, vias de administração e apresentações de um medicamento inicial, bem como as alterações e extensões da AIM desse medicamento. Os conceitos de «alteração» e de «extensão» estão expressamente definidos no Regulamento n.o 1234/2008 e não há dúvidas de que a eliminação da substância ativa de um produto inicialmente autorizado ou a sua substituição por uma substância ativa diferente não podem ser consideradas um desenvolvimento abrangido pela autorização global do produto inicialmente autorizado.

64

Decorre da própria redação do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 que dois medicamentos que contenham substâncias ativas que não partilhem a mesma fração terapêutica, e que sejam, portanto, diferentes, não podem ser considerados como abrangidas pela mesma autorização global. A importância da fração terapêutica para considerar substâncias ou produtos diferentes foi igualmente reconhecida no Acórdão de 20 de janeiro de 2005, SmithKline Beecham (C‑74/03, EU:C:2005:39). Por conseguinte, há que comparar a composição qualitativa em substâncias ativas do medicamento inicial, conforme estabelecida na sua AIM, com a composição qualitativa em substâncias ativas do segundo medicamento.

65

O Tribunal Geral recorreu erradamente, ao apreciar a existência de uma autorização global, a uma avaliação da relação benefício/risco do medicamento inicial, que faz parte do procedimento de concessão da AIM relativa a esse medicamento. A este respeito, as recorrentes alegam que a determinação da composição qualitativa em substâncias ativas de um medicamento faz parte das atribuições da autoridade competente, a nível nacional ou da União, que concede a AIM do medicamento inicial e abrange, no caso de uma associação medicamentosa fixa, a avaliação destinada a determinar se as duas substâncias ativas dão uma contribuição terapêutica documentada nessa associação. Se não for esse o caso, o produto deve ser autorizado como medicamento que contém apenas uma única substância ativa. Em contrapartida, a avaliação da composição qualitativa em substâncias ativas do medicamento inicial não faz parte da avaliação da autorização global. A abordagem do Tribunal Geral incentiva uma reavaliação sistemática das decisões adotadas anteriormente.

66

Por outro lado, segundo as recorrentes, os objetivos e o contexto do conceito de «autorização global» corroboram a interpretação literal do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83. Segundo jurisprudência constante, referida aliás no n.o 275 do acórdão recorrido, este conceito e o período de PRD que lhe está associado visam garantir um justo equilíbrio entre a proteção das empresas inovadoras e os interesses da concorrência que serve a comercialização de medicamentos genéricos. O objetivo do conceito de «autorização global» é o de alcançar esse equilíbrio, fornecendo simultaneamente um critério prático para determinar se dois medicamentos fazem ou não parte da mesma autorização global, conforme previsto no considerando 9 da Diretiva 2001/83. Por conseguinte, no caso em apreço, uma vez que o Fumaderm foi autorizado enquanto associação medicamentosa fixa composta por duas substâncias ativas, este medicamento e o Tecfidera só podem fazer parte da mesma autorização global se essas duas substâncias não forem diferentes. Ora, o CHMP conclui não ser esse o caso, dado que não apresentam a mesma fração terapêutica.

67

Além disso, a EMA considera que o critério estabelecido pelo Tribunal Geral é igualmente contrário ao artigo 10.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2001/83, uma vez que pode levar a que um produto genérico utilize de facto como medicamento de referência, para efeitos do cálculo do termo do PRD, um produto cuja composição qualitativa em substâncias ativas é diferente.

68

Por último, a Biogen acrescenta que, apesar de, por força do artigo 10.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2001/83, as substâncias ativas de dois medicamentos comparados serem diferentes, não podem ser consideradas simples variantes do mesmo produto e abrangidas pela mesma autorização global. Além disso, ao questionar se o contributo terapêutico do MEF foi corretamente avaliado no âmbito da AIM do Fumaderm, o Tribunal Geral tem dúvidas, na realidade, sobre a validade da concessão desta AIM em conformidade com as exigências legais e regulamentares da União. Ora, só os medicamentos que são objeto de uma AIM em conformidade com estas exigências podem ser medicamentos de referência e constituir o ponto de partida de uma autorização global.

69

A Polpharma contesta a argumentação das recorrentes.

70

Sustenta que as provas científicas publicamente disponíveis corroboram a conclusão de que o componente MEF, retirado da associação medicamentosa fixa para obter a monoterapia, não tem nenhuma contribuição terapêutica significativa ou pertinente nessa associação. O artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 não prevê esta situação em específico, dado que a sua redação não dá uma resposta clara na determinação do âmbito de aplicação da autorização global do Fumaderm.

71

É essencial que a proteção conferida pelo PRD seja ponderada com a necessidade de instituir um sistema eficaz que permita a comercialização de versões genéricas de medicamentos inovadores menos onerosos, decorrido um período adequado de proteção do mercado concedido às empresas inovadoras.

72

A este respeito, em primeiro lugar, a Polpharma admite que as alterações referidas no artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83 não abrangem as alterações no perfil da substância ativa. Todavia, as substâncias ativas do Fumaderm e do Tecfidera têm o mesmo perfil, pelo que não está em causa uma «alteração» das substâncias ativas e a análise do Regulamento n.o 1085/2003 não é pertinente no caso em apreço.

73

Quando dois medicamentos contêm uma ou mais substâncias ativas idênticas, ou assim consideradas, no que respeita ao PRD, e pertencem ao mesmo titular da AIM, constituem simplesmente o «mesmo» medicamento para efeitos da autorização global. A presença ou a ausência de um componente «excipiente» inativo num medicamento ou num componente que não exerça uma atividade significativa ou pertinente do ponto de vista clínico não tem relevância a este respeito. Só depois de provar que o Tecfidera e o Fumaderm são o mesmo produto para efeitos da autorização global é que a redação do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 se torna pertinente para corroborar o facto de que as diferenças, por exemplo em termos de indicações, em nada alteram a conclusão de que fazem parte da mesma autorização global.

74

Por conseguinte, a verificação da contribuição terapêutica do MEF no Fumaderm constitui o método correto e proporcionado que permite confirmar a existência de uma diferença entre o Fumaderm e o Tecfidera para efeitos do PRD.

75

Em contrapartida, o critério segundo o qual basta comparar as composições qualitativas autorizadas do Tecfidera e do Fumaderm em termos de substâncias ativas para estabelecer uma diferença pertinente que justifique um direito ao PRD é demasiado simplista para garantir uma definição correta deste direito. A Polpharma sublinha que foi com razão que, no n.o 292 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral indicou que esta abordagem apresentava o risco de levar, no caso em apreço, à concessão de um PRD contrário aos objetivos prosseguidos pelo conceito de «autorização global».

76

A este respeito, subscreve igualmente a posição do Tribunal Geral segundo a qual a situação que deu origem ao Acórdão de 28 de junho de 2017, Novartis Europharm/Comissão (C‑629/15 P e C‑630/15 P, EU:C:2017:498, n.o 72), era diferente da do presente processo.

77

Do mesmo modo, o Acórdão de 20 de janeiro de 2005, SmithKline Beecham (C‑74/03, EU:C:2005:39), mencionado pela Comissão, baseou‑se em antecedentes de facto muito diferentes. No entanto, estabelece um princípio fundamental segundo o qual a «similitude» das substâncias ativas para efeitos do PRD deve ser interpretada à luz do objetivo das disposições relativas ao PRD, para assegurar a aplicação correta da letra da lei.

78

Em segundo lugar, a Polpharma alega que, no caso de uma associação medicamentosa fixa, a relação benefício/risco não fornece necessariamente uma indicação sobre a atividade ou os riscos terapêuticos específicos das substâncias em caso de administração individual. Por conseguinte, é falacioso sustentar que a abordagem do Tribunal Geral consiste em utilizar, no conceito de autorização global, uma avaliação da apreciação da relação benefício/risco do medicamento inicial, uma vez que a apreciação da contribuição terapêutica pertinente do MEF no Fumaderm, para efeitos do PRD, não era um elemento necessário da avaliação do pedido de AIM deste medicamento. A Polpharma esclarece que não foi contestado que o BfArM concedeu validamente uma AIM ao Fumaderm, tendo‑se o Tribunal Geral centrado na necessidade de verificar se, para efeitos da autorização global, os componentes do Fumaderm têm uma contribuição terapêutica pertinente e significativa.

79

Em terceiro lugar, a Polpharma considera que o critério adotado pelo Tribunal Geral não é contrário ao artigo 10.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2001/83, uma vez que pode ser necessário demonstrar mais do que uma versão do produto de referência. No caso em apreço, o Tecfidera é o medicamento de referência mencionado no pedido de AIM para um medicamento genérico, ao passo que o Fumaderm é o medicamento de referência utilizado para demonstrar que o PRD tinha terminado. Por outro lado, se estes dois medicamentos fizerem parte da mesma autorização global, então a composição qualitativa do Fumaderm em substâncias ativas para efeitos dessa autorização global e do PRD seria considerada idêntica à do Tecfidera.

Apreciação do Tribunal de Justiça

80

Com os seus fundamentos respetivos, as recorrentes acusam o Tribunal Geral, em substância, de ter cometido um erro de direito ao declarar que, no âmbito da avaliação destinada a determinar se dois medicamentos fazem parte da mesma autorização global na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, a Comissão estava obrigada a verificar a avaliação da composição qualitativa em substâncias ativas do primeiro medicamento autorizado por uma autoridade nacional competente enquanto associação medicamentosa fixa, para demonstrar que essas substâncias fornecem, cada uma, uma contribuição terapêutica nessa associação.

81

A título preliminar, importa recordar que o artigo 6.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2001/83 estabelece, como condição prévia à introdução no mercado de um Estado‑Membro, em relação a todos medicamentos, a concessão de uma AIM. A concessão desta autorização pode ser feita tanto pelas autoridades nacionais competentes, nos termos da Diretiva 2001/83, como pela Comissão, em conformidade com o Regulamento n.o 726/2004.

82

Por outro lado, o artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, lido em conjugação com o considerando 9 da Diretiva 2001/83, enuncia exaustivamente os desenvolvimentos posteriores de que pode ser objeto um medicamento que tenha obtido uma primeira AIM e cujas autorizações correspondentes são consideradas parte da mesma autorização global, e isto, como o Tribunal de Justiça esclareceu no Acórdão de 28 de junho de 2017, Novartis Europharm/Comissão (C‑629/15 P e C‑630/15 P, EU:C:2017:498, n.o 72), independentemente dos procedimentos de autorização próprios de cada um deles. Estes desenvolvimentos são quaisquer dosagens, formas farmacêuticas, vias de administração e apresentações adicionais, bem como quaisquer alterações e extensões do medicamento que obteve uma primeira AIM.

83

No caso em apreço, atendendo ao alcance da crítica dirigida ao Tribunal Geral pelas recorrentes, há que examinar se uma diferença na composição qualitativa de um medicamento autorizado, em termos de substâncias ativas, na aceção do artigo 1.o, ponto 3‑A, da Diretiva 2001/83, figura entre os desenvolvimentos posteriores previstos no artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, desta diretiva.

84

Em primeiro lugar, não é contestado que tal diferença na composição qualitativa de um medicamento autorizado não constitui uma dosagem, uma forma farmacêutica, uma via de administração nem uma apresentação adicional.

85

Em segundo lugar, no que respeita aos termos «quaisquer alterações e extensões» que figuram no artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, o Tribunal de Justiça já declarou que estes visam uma alteração dos termos de uma AIM ou uma extensão desta, na aceção do Regulamento n.o 1085/2003 (Acórdão de 28 de junho de 2017, Novartis Europharm/Comissão, C‑629/15 P e C‑630/15 P, EU:C:2017:498, n.o 66).

86

O Regulamento n.o 1085/2003 foi substituído pelo Regulamento n.o 1234/2008, que regula, por um lado, as «alterações» ou «alterações dos termos das [AIM]» e, por outro, as «extensões», que correspondem, sem prejuízo de restrições urgentes de segurança, a alterações mais significativas. Em conformidade com o artigo 2.o deste último regulamento, a extensão de uma AIM remete para qualquer modificação que figure no anexo I do referido regulamento e que observe as condições nele previstas. Particularmente, o ponto 1, alínea a), deste anexo I prevê que a extensão de uma AIM resulta da «substituição de uma substância ativa por um sal ou éster diferente (complexo/derivado), com a mesma parte ativa terapêutica, em que as características de eficácia/segurança não variem consideravelmente».

87

Daqui resulta, como salientou, em substância, a advogada‑geral nos n.os 55 e 56 das suas conclusões, que a diferença na composição qualitativa de um medicamento devido à substituição da substância ou das substâncias ativas desse medicamento por uma ou outras substâncias com uma fração terapêutica diferente não pode ser qualificada de «quaisquer alterações e extensões», na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83.

88

No caso em apreço, conforme resulta dos n.os 16 a 38 do acórdão recorrido, a adoção da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 foi precedida de uma avaliação, pelo CHMP, da questão de saber se o DMF era diferente do Fumaderm, composto por DMF e por MEF. O CHMP concluiu que o Fumaderm, composto por DMF e por MEF, por um lado, e o Tecfidera, composto por DMF como monossubstância, por outro, são diferentes, uma vez que o DMF e o MEF não têm a mesma fração terapêutica e não correspondem, por conseguinte, à mesma substância ativa.

89

Atendendo ao quadro regulamentar acima recordado, a referida avaliação do CHMP é suficiente, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou, para determinar se os medicamentos em causa são ou não abrangidos pela «mesma autorização de introdução no mercado global», na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83. Assim, o Tribunal não tomou em consideração esse quadro regulamentar ao considerar, nos n.os 280 a 289 e 293 do acórdão recorrido, que a Comissão estava igualmente obrigada a verificar se existia uma «contribuição terapêutica» da substância ativa presente no primeiro medicamento autorizado, embora ausente da composição do segundo medicamento autorizado, e que lhe incumbia verificar o «papel» desempenhado por essa substância no primeiro medicamento, avaliando se e em que medida esse papel tinha sido analisado pela autoridade nacional que concede a AIM relativa a esse medicamento ou solicitando ao CHMP que verificasse o papel desempenhado pelo MEF no Fumaderm.

90

Por outro lado, a tomada em consideração dos objetivos do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 não impõe à Comissão a obrigação de proceder à verificação mencionada no n.o 89 do presente acórdão.

91

A este respeito, deve salientar‑se que, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, se considera que a primeira AIM e as AIM relativas aos desenvolvimentos do medicamento inicial fazem parte da mesma autorização global, nomeadamente para efeitos da utilização do procedimento abreviado no termo do PRD aplicável, conforme especificado no artigo 10.o, n.o 1, desta diretiva. Assim, tendo em conta o nexo que este artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, estabelece entre o PRD e a autorização global, este último conceito é essencial para determinar as condições em que os requerentes podem remeter, no procedimento abreviado, para os dados constantes do processo do medicamento de referência.

92

A existência de uma autorização global na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 determina, em substância, que só é aplicável um único período de PRD, conforme previsto no artigo 10.o, n.o 1, desta diretiva, aos desenvolvimentos de um medicamento já autorizado previstos neste artigo 6.o a partir da data de autorização desse medicamento. Por conseguinte, ao obstar à prorrogação do PRD de um produto existente com base em meras variantes que não merecem beneficiar desse período, o artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 visa assegurar um justo equilíbrio entre a proteção das empresas inovadoras e os interesses gerais da comercialização dos medicamentos genéricos.

93

No entanto, uma vez que a redação do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83 e o contexto em que se insere esta disposição não determinam a aplicabilidade do conceito de «autorização de introdução no mercado global» a medicamentos que apresentem composições qualitativas diferentes, na aceção referida no n.o 86 do presente acórdão, os objetivos da referida disposição não podem, por si só, justificar a necessidade de proceder, além de uma comparação qualitativa desses produtos para apreciar se fazem parte da mesma autorização global, à verificação da contribuição terapêutica da ou das substâncias ativas do primeiro medicamento autorizado.

94

Atendendo a todas as considerações precedentes, há que considerar que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar que, no âmbito da avaliação destinada a determinar se dois medicamentos fazem parte da mesma autorização global na aceção do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83, conforme interpretado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, a Comissão é obrigada a verificar a existência de uma contribuição terapêutica da substância ativa presente no primeiro medicamento autorizado a nível nacional, embora ausente da composição do medicamento por si autorizado posteriormente.

95

Nestas condições, há que julgar procedente o segundo fundamento no processo C‑438/21 P, o segundo fundamento no processo C‑439/21 P e o terceiro fundamento no processo C‑440/21 P.

96

Uma vez que o erro de direito acima constatado é suscetível de conduzir à anulação do acórdão recorrido, há que dar provimento aos recursos sem que seja necessário apreciar os restantes fundamentos dos mesmos.

Quanto à tramitação do processo no Tribunal Geral

97

Em conformidade com o artigo 61.o, primeiro parágrafo, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, este pode, em caso de anulação da decisão do Tribunal Geral, decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

98

É o que sucede no presente caso, uma vez que o fundamento único do recurso de primeira instância destinado à anulação da decisão controvertida foi objeto de um debate contraditório no Tribunal Geral e o seu exame não exige adotar nenhuma medida suplementar de organização do processo ou de instrução do processo (v., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2020, Comissão e Conselho/Carreras Sequeros e o., C‑119/19 P e C‑126/19 P, EU:C:2020:676, n.o 130).

99

Em apoio do seu pedido de anulação, a Polpharma invoca um fundamento único, relativo à ilegalidade da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, visto que a Comissão considerou que o Tecfidera não era abrangido pela mesma autorização de introdução no mercado global que o Fumaderm. Em substância, a Polpharma sustenta que essa decisão, que é a única base jurídica da decisão controvertida, é ilegal e deve, em conformidade com o artigo 277.o TFUE, ser declarada inaplicável. Consequentemente, a decisão controvertida, que recusa a validação do pedido de AIM de um medicamento genérico do Tecfidera, ficaria privada de base jurídica e deveria ser anulada, nomeadamente por falta de fundamentação, em aplicação do artigo 296.o TFUE.

100

A Polpharma sustenta que, na Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, a Comissão aplicou um critério errado e cometeu um erro manifesto de apreciação ao concluir que o Tecfidera e o Fumaderm eram diferentes e que, consequentemente, o Tecfidera não era abrangido pela autorização de introdução no mercado global do Fumaderm. Com efeito, em primeiro lugar, o critério aplicado não teve em conta todos os fatores pertinentes. Em segundo lugar, a recorrente alega que, se o CHMP e a Comissão tivessem aplicado o critério adequado e tido em conta todos os fatores pertinentes, não poderiam ter decidido que o Tecfidera não estava abrangido no âmbito de aplicação da autorização de introdução no mercado global do Fumaderm.

101

Assim, ambas as acusações destinam‑se a alegar que a Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 enferma de um erro manifesto de apreciação, porquanto, ao adotar essa decisão, a Comissão baseou‑se apenas em determinados elementos, e não em todos os dados disponíveis e pertinentes que deviam ser tomados em consideração. Mais precisamente, a Polpharma alega que, perante um pedido de AIM de uma substância ativa que faz parte de uma associação medicamentosa anteriormente autorizada, a apreciação da existência de uma diferença entre essa associação e a substância ativa isolada depende da questão de saber se as substâncias ativas individuais da associação têm uma contribuição terapêutica documentada e pertinente nessa associação. Assim, segundo a Polpharma, a comparação para determinar se o Fumaderm e o Tecfidera são «diferentes» para efeitos da autorização global não consistia unicamente em comparar duas substâncias ativas entre si.

102

A EMA, apoiada pela Comissão e pela Biogen, contesta esta argumentação.

103

A este respeito, há que salientar que, com a decisão controvertida, a EMA informou a Polpharma de que não estava em condições de validar o seu pedido de concessão de uma AIM de um medicamento genérico derivado do medicamento de referência Tecfidera. Sublinhou que, segundo o considerando 3 da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, o Tecfidera e o medicamento já autorizado Fumaderm não faziam parte da mesma autorização global na aceção do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83, uma vez que o MEF e o DMF, que compunham oFumaderm, eram ativos e não correspondiam à mesma substância ativa, uma vez que a sua fração terapêutica não era a mesma. Esclareceu que daí resultava que o Tecfidera, que contém DMF, era diferente do Fumaderm, o outro medicamento já autorizado.

104

Resulta, assim, da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 que o CHMP procedeu à comparação dos dois medicamentos em causa em termos de substâncias ativas para concluir que, uma vez que a fração terapêutica das substâncias ativas que compõem o primeiro medicamento não era a mesma, este medicamento era diferente do segundo medicamento composto por uma das suas substâncias, pelo que os dois medicamentos não estavam abrangidos pela mesma autorização global, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83.

105

Dado que a Polpharma contesta o fundamento do critério de exame aplicado pela Comissão no caso em apreço, resulta dos n.os 86 a 89 do presente acórdão que, para efeitos de decidir da pertença ou não a uma mesma autorização global na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83, esta instituição podia basear‑se nessa comparação do Fumaderm e do Tecfidera e não era obrigada a verificar a contribuição terapêutica do MEF no Fumaderm nem, por maioria de razão, o caráter pertinente desta contribuição.

106

Por conseguinte, ao basear‑se, na Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014, na constatação de que o MEF e o DMF, que compõem o Fumaderm, eram duas substâncias ativas com frações terapêuticas diferentes e que as composições em termos de substâncias ativas do Tecfidera e do Fumaderm eram diferentes, a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação ao concluir que o Tecfidera não fazia parte da mesma autorização global que o Fumaderm, na aceção do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/83.

107

Atendendo às considerações precedentes, há que julgar improcedente o fundamento único relativo à exceção de ilegalidade da Decisão de Execução de 30 de janeiro de 2014 e, por conseguinte, negar provimento ao recurso.

Quanto às despesas

108

Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

109

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, desse regulamento, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do referido regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

110

Tendo a Polpharma sido vencida após ter sido dado provimento aos presentes recursos e tendo a Comissão, a Biogen e a EMA, respetivamente, pedido a sua condenação nas despesas, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão, a Biogen e a EMA tanto em primeira instância no processo T‑611/18 como nos presentes recursos nos processos C‑438/21 P a C‑440/21 P.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide:

 

1)

O Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 5 de maio de 2021, Pharmaceutical Works Polpharma/EMA (T‑611/18, EU:T:2021:241), é anulado.

 

2)

É negado provimento ao recurso interposto pela Pharmaceutical Works Polpharma S.A. no processo T‑611/18.

 

3)

A Pharmaceutical Works Polpharma S.A. é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão Europeia, a Biogen Netherlands BV e a Agência Europeia de Medicamentos (EMA).

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

Top