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Document 62020CC0267

    Conclusões do advogado-geral A. Rantos apresentadas em 28 de outubro de 2021.
    AB Volvo e DAF TRUCKS NV contra RM.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Audiencia Provincial de León.
    Reenvio prejudicial — Acordos, decisões e práticas concertadas — Artigo 101.o TFUE — Diretiva 2014/104/UE — Artigos 10.o, 17.o e 22.o — Ações de indemnização por infração às disposições do direito da concorrência da União Europeia — Prazo de prescrição — Presunção ilidível de danos — Quantificação dos danos sofridos — Transposição tardia da Diretiva — Aplicação no tempo — Disposições substantivas e processuais.
    Processo C-267/20.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:884

     CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    ATHANASIOS RANTOS

    apresentadas em 28 de outubro de 2021 ( 1 )

    Processo C‑267/20

    AB Volvo,

    DAF TRUCKS NV

    contra

    RM

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pela Audiencia Provincial de León (Audiência Provincial de Leão, Espanha)]

    «Reenvio prejudicial — Artigo 101.o TFUE — Diretiva 2014/104/UE — Ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados‑Membros e da União Europeia — Regra nacional que fixa o ponto de referência da retroatividade na data da sanção e não na da propositura da ação — Prazo de prescrição em matéria de responsabilidade extracontratual — Quantificação dos danos sofridos — Princípios da equivalência e da efetividade»

    I. Introdução

    1.

    Este processo inscreve‑se na linha dos reenvios prejudiciais dirigidos ao Tribunal de Justiça por órgãos jurisdicionais nacionais sobre a interpretação da Diretiva 2014/104/UE ( 2 ), relativa às ações de indemnização por infração às disposições do direito da concorrência.

    2.

    O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 101.o TFUE e dos artigos 10.o, 17.o e 22.o da Diretiva 2014/104.

    3.

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a AB Volvo e a DAF Trucks NV (a seguir «demandadas») a RM (a seguir «demandante») a propósito de uma ação de indemnização intentada por este último que tem por objeto a reparação do dano resultante de uma infração ao artigo 101.o TFUE, declarada pela Comissão Europeia, cometida por algumas empresas, entre as quais figuram as demandadas.

    4.

    Este processo levará o Tribunal de Justiça a clarificar o âmbito de aplicação ratione temporis da Diretiva 2014/104, tarefa empreendida pela primeira vez nos Acórdãos Cogeco Communications ( 3 ) e Skanska Industrial Solutions e o. ( 4 ). Deste modo, as respostas que o Tribunal de Justiça vier dar ao órgão jurisdicional de reenvio neste processo podem ter incidência nos litígios, atualmente pendentes em órgãos jurisdicionais nacionais através da União, que levanta a problemática da aplicação ratione temporis das disposições desta diretiva, nomeadamente no âmbito de ações de indemnização que incidem sobre factos ocorridos antes da sua entrada em vigor.

    II. Quadro jurídico

    A. Direito da União

    1.   Regulamento (CE) n.o 1/2003

    5.

    O artigo 25.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 ( 5 ) prevê:

    «O prazo de prescrição começa a ser contado a partir do dia em que foi cometida a infração. Todavia, no que se refere às infrações continuadas ou repetidas, o prazo de prescrição apenas começa a ser contado a partir do dia em que tiverem cessado essas infrações.»

    6.

    Nos termos do artigo 30.o deste regulamento, sob a epígrafe «Publicação das decisões»:

    «1.   A Comissão publica as decisões que tomar nos termos dos artigos 7.o a 10.o, 23.o e 24.o

    2.   A publicação menciona as partes interessadas e o conteúdo essencial da decisão, incluindo as sanções impostas. Deve acautelar o interesse legítimo das empresas na proteção dos seus segredos comerciais.»

    2.   Diretiva 2014/104

    7.

    O artigo 10.o da Diretiva 2014/104, sob a epígrafe «Prazos de prescrição», enuncia:

    «1.   Os Estados‑Membros estabelecem, nos termos do presente artigo, as regras aplicáveis aos prazos de prescrição para intentar ações de indemnização. Essas regras determinam quando começa a correr o prazo de prescrição, a duração do mesmo e as circunstâncias em que este é interrompido ou suspenso.

    2.   O prazo de prescrição não começa a correr antes de cessar a infração ao direito da concorrência e de o demandante ter conhecimento, ou se poder razoavelmente presumir que teve conhecimento:

    a)

    Do comportamento em causa e de que este constitui uma infração ao direito da concorrência;

    b)

    Do facto de a infração ao direito da concorrência lhe ter causado dano; e

    c)

    Da identidade do infrator.

    3.   Os Estados‑Membros asseguram que o prazo de prescrição para intentar a ação de indemnização seja pelo menos de cinco anos.

    4.   Os Estados‑Membros asseguram que o prazo de prescrição seja suspenso ou, consoante o direito nacional, interrompido, se a autoridade da concorrência tomar medidas no âmbito de uma investigação ou de um processo relativo a uma infração ao direito da concorrência com a qual a ação de indemnização esteja relacionada. A suspensão termina, no mínimo, um ano depois de a decisão em matéria de infração se ter tornado definitiva ou depois de o processo ter sido de outro modo concluído.»

    8.

    O artigo 17.o desta diretiva, sob a epígrafe «Quantificação dos danos», prevê:

    «1.   Os Estados‑Membros asseguram que nem o ónus da prova nem o grau de convicção do julgador exigidos para a quantificação dos danos tornem o exercício do direito à indemnização praticamente impossível ou excessivamente difícil. Os Estados‑Membros asseguram que os tribunais nacionais sejam competentes, de acordo com os processos nacionais, para calcular o montante dos danos, se for estabelecido que o demandante sofreu danos, mas seja praticamente impossível ou excessivamente difícil quantificar com precisão os danos sofridos, com base nos elementos de prova disponíveis.

    2.   Presume‑se que as infrações de cartel causam danos. O infrator tem o direito de ilidir essa presunção.

    3.   Os Estados‑Membros asseguram que, nas ações de indemnização, a autoridade nacional da concorrência possa, a pedido do tribunal nacional, prestar‑lhe assistência na quantificação dos danos, caso a autoridade nacional da concorrência considerar adequada a prestação dessa assistência.»

    9.

    O artigo 21.o, n.o 1, da referida diretiva, com a epígrafe «Transposição», prevê:

    «Os Estados‑Membros põem em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até 27 de dezembro de 2016. Os Estados‑Membros comunicam imediatamente à Comissão o texto dessas disposições.

    Quando os Estados‑Membros adotarem essas medidas, estas incluem uma referência à presente diretiva ou são acompanhadas dessa referência aquando da sua publicação oficial. As modalidades dessa referência são estabelecidas pelos Estados‑Membros.»

    10.

    O artigo 22.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Aplicação no tempo», enuncia:

    «1.   Os Estados‑Membros asseguram que as disposições nacionais adotadas por força do artigo 21.o a fim de dar cumprimento às disposições substantivas da presente diretiva não se aplicam retroativamente.

    2.   Os Estados‑Membros asseguram que quaisquer disposições nacionais adotadas por força do artigo 21.o, que não as referidas no n.o 1, não se aplicam às ações de indemnização intentadas nos tribunais nacionais antes de 26 de dezembro de 2014.»

    B. Direito espanhol

    11.

    Nos termos do artigo 74.o, n.o 1, da Ley 15/2007 de Defensa de la Competencia (Lei 15/2007, de Defesa da Concorrência), de 3 de julho de 2007») ( 6 ) (a seguir «Lei 15/2007):

    «O prazo de prescrição da ação de indemnização pelos danos resultantes de uma infração ao direito da concorrência é de cinco anos.»

    12.

    O artigo 76.o, n.o 2, da Ley 15/2007 prevê:

    «Se for demonstrado que o demandante sofreu danos, mas que é praticamente impossível ou excessivamente difícil quantificar com precisão os danos sofridos, com base nos elementos de prova disponíveis, os tribunais têm competência para calcular o correspondente montante da indemnização.»

    13.

    A primeira disposição transitória do Real Decreto‑ley 9/2017 (Real Decreto‑Lei 9/2017), sob a epígrafe «Regime Transitório Aplicável a Ações de Indemnização Resultantes de Infrações ao Direito da Concorrência dos Estados‑Membros e da União Europeia», enuncia:

    «1. O disposto no artigo 3.o do presente real decreto‑lei não é aplicável com efeitos retroativos.

    2. O disposto no artigo 4.o do presente real decreto‑lei só é aplicável aos processos iniciados após a sua entrada em vigor.»

    14.

    O artigo 1902.o do Código Civil dispõe:

    «Quem, por ação ou omissão, causar um dano a outrem, culposa ou negligentemente, é obrigado a reparar o dano causado.»

    III. Litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

    15.

    Durante 2006 e 2007, o demandante comprou três camiões fabricados pelas demandadas.

    16.

    Em 19 de julho de 2016, a Comissão adotou a Decisão C(2016) 4673 final relativa a um processo nos termos do artigo 101.o [TFUE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (Processo AT.39824 — Camiões) (a seguir «decisão da Comissão») ( 7 ) e publicou um comunicado de imprensa a este respeito (a seguir «comunicado de imprensa»)

    17.

    Nessa decisão, a Comissão declarou que diversos fabricantes internacionais de camiões, entre os quais constam as demandadas, infringiram o artigo 101.o TFUE e o artigo 53.o do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) ao acordarem, por um lado, os preços e o aumento de preços brutos para camiões com peso entre 6 e 16 toneladas («camiões médios») ou com mais de 16 toneladas («camiões pesados») no EEE e, por outro, o calendário e a repercussão dos custos para a introdução de tecnologias de emissões exigidos pelas normas Euro 3 a 6. No que respeita às demandadas, a infração verificou‑se entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011.

    18.

    Em 1 de abril de 2018, o demandante intentou no Juzgado de lo Mercantil de León (Tribunal de Comércio de Leão, Espanha) uma ação contra as demandadas. Esta ação destina‑se a obter a reparação dos danos que o demandante sofreu devido às práticas anticoncorrenciais destas duas sociedades. A referida ação baseia‑se, a título principal, nas disposições pertinentes da Lei 15/2007, conforme alterada após a transposição da Diretiva 2014/104, e, a título subsidiário, no artigo 1902.o do Código Civil, que estabelece o regime geral da responsabilidade civil extracontratual. A ação constitui, relativamente às demandadas, uma ação de indemnização intentada na sequência de uma decisão definitiva da Comissão que declara uma infração ao artigo 101.o TFUE (uma ação de responsabilidade de tipo «follow‑on»).

    19.

    Por Sentença de 15 de outubro de 2019, o tribunal de primeira instância, Juzgado de lo Mercantil de León (Tribunal de Comércio de Leão) julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização e condenou as demandadas a pagar ao demandante uma indemnização correspondente a 15 % do preço de aquisição dos camiões, acrescido de juros legais, sem, no entanto, condenar essas sociedades nas despesas. Mais especificamente, esse tribunal julgou improcedente o fundamento relativo à prescrição da ação arguido pelas demandadas, pelo facto de, nomeadamente, ser aplicável o prazo de prescrição de cinco anos previsto no artigo 74.o, n.o 1, da Lei 15/2007, que transpõe o artigo 10.o, n.o 3, da Diretiva 2014/104. Além disso, esse tribunal aplicou a presunção de danos causados pelas infrações de cartel prevista no artigo 17.o, n.o 2, dessa diretiva, transposta para o artigo 76.o, n.o 3, da Lei 15/2007 e utilizou o poder de avaliação judicial dos danos previsto no artigo 17.o, n.o 1, da diretiva, transposto para o artigo 76.o, n.o 2, da Lei 15/2007, com o fundamento de que estas duas disposições são de natureza processual no âmbito da regulamentação do ónus da prova.

    20.

    As demandadas interpuseram recurso da sentença para a Audiencia Provincial de León (Audiência Provincial de Leão, Espanha), alegando que a ação está sujeita ao regime geral da responsabilidade extracontratual do artigo 1902.o do Código Civil espanhol, que sujeita as ações intentadas nos termos deste artigo a um prazo de prescrição de um ano previsto no artigo 1968.o, n.o 2, do referido código. Segundo as demandadas, este prazo começou a correr a partir da publicação, em 19 de julho de 2016, do comunicado de imprensa da Comissão e, portanto, prescreveu, uma vez que o pedido de indemnização foi apresentado em 1 de abril de 2018. As demandadas também consideram que não existe nenhuma prova do nexo de causalidade entre o comportamento descrito na decisão da Comissão e o aumento do preço dos camiões comprados pelo demandante e que, uma vez que o artigo 1902.o desse Código Civil espanhol é aplicável à ação, se o demandante não conseguir provar os danos sofridos, o pedido deve ser julgado improcedente.

    21.

    Nestas condições, a Audiencia Provincial de León (Audiência Provincial de Leão) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Devem o artigo 101.o TFUE e o princípio da efetividade ser interpretados no sentido de que se opõem a uma interpretação da norma nacional que considera não aplicável retroativamente o prazo para intentar a ação de [cinco] anos previsto no artigo 10.o da [D]iretiva [2014/104], bem como [no] artigo 17.o relativo à quantificação judicial dos danos, fixando a referência da retroatividade na data da sanção e não na data da propositura da ação?

    2)

    Devem o artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva [2014/104] e o termo «retroativamente» ser interpretados no sentido de que o artigo 10.o dessa diretiva é aplicável a uma ação como a que está em causa no processo principal, que, embora tenha sido intentada após a entrada em vigor da diretiva e da norma de transposição, se refere, no entanto, a factos ou a sanções anteriores?

    3)

    No âmbito da aplicação de uma disposição como o artigo 76.o da Lei [15/2007], deve o artigo 17.o da Diretiva [2014/104], relativo à quantificação judicial dos danos, ser interpretado no sentido de que se trata de uma norma de natureza processual aplicável ao processo principal cuja ação é intentada após a entrada em vigor da norma nacional de transposição?»

    22.

    No decurso da tramitação do processo prejudicial no Tribunal de Justiça, o demandante e as demandadas, os Governos espanhol e estónio e a Comissão apresentaram observações escritas. Todas estas partes, com exceção do Governo estónio, também responderam por escrito no prazo fixado a questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 61.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

    IV. Análise

    A. Observações preliminares

    23.

    O presente processo (dito «Camiões») suscita questões de direito complexas e sensíveis relativas à aplicação no tempo de determinadas disposições da Diretiva 2014/104 a uma ação de indemnização que, embora intentada após a entrada em vigor desta diretiva e das disposições nacionais de transposição, diz respeito a uma infração que cessou antes da entrada em vigor tanto dessa diretiva como dessas disposições nacionais.

    24.

    Importa recordar que a infração ao artigo 101.o TFUE, na origem da ação de indemnização, foi cometida entre 1997 e 2011. Foi objeto de uma Decisão da Comissão adotada em 19 de julho de 2016. A versão não confidencial e o resumo dessa decisão foram publicados em 6 de abril de 2017.

    25.

    Relativamente à Diretiva 2014/104, recordo que esta entrou em vigor em 26 de dezembro de 2014 e que o seu prazo de transposição expirou em 31 de dezembro de 2016. Por sua vez, esta diretiva foi transposta para o direito espanhol em 26 de maio de 2017.

    26.

    Por seu turno, a ação de indemnização foi intentada após a entrada em vigor das disposições nacionais resultantes da Diretiva 2014/104, ou seja, em 1 de abril de 2018.

    27.

    Importa também salientar que o Reino de Espanha assegurou a transposição da Diretiva 2014/104 ao adotar o Real Decreto‑Lei 9/2017. Com os seus artigos 3.o e 4.o, este manteve a distinção entre as disposições substantivas e processuais. O artigo 3.o do real decreto‑lei transpõe as disposições substantivas da Diretiva 2014/104 (incluindo as relativas à prescrição e à quantificação dos danos, reproduzidas respetivamente nos artigos 10.o e 17.o, n.o 1, desta diretiva), alterando a Lei 15/2007 (novos artigos 74.o e 76.o desta lei). O artigo 4.o do Real Decreto‑Lei 9/2017 executa as disposições processuais desta diretiva, alterando a Ley de Enjuiciamiento Civil (Código de Processo Civil).

    28.

    Assim, as questões controvertidas no presente processo têm por objeto o regime jurídico aplicável, por um lado, à prescrição da ação intentada pelo demandante (e, mais especificamente, à duração e à data de início do prazo de prescrição) e, por outro, à avaliação e à quantificação dos danos sofridos.

    29.

    Proponho que se responda em primeiro lugar às segunda e terceira questões, dado que têm por objeto as obrigações dos Estados‑Membros decorrentes da Diretiva 2014/104, que, no presente contexto, podem ser consideradas lex specialis, ao passo que a primeira questão diz respeito às obrigações que lhes incumbem por força de princípios de direito primário cuja clarificação só se torna pertinente se a obrigação em questão não puder ser deduzida de disposições mais específicas da diretiva.

    B. Quanto à segunda e terceira questões prejudiciais

    30.

    Com a segunda e terceira questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, respetivamente, sobre a aplicação no tempo dos artigos 10.o e 17.o da Diretiva 2014/104, na aceção do seu artigo 22.o, à ação de indemnização intentada pelo demandante contra as demandadas e sobre a natureza, substantiva ou processual, das regras que decorrem dessa diretiva.

    31.

    Tendo em conta o facto de estas duas questões estarem estreitamente ligadas, considero que devem ser examinadas em conjunto. Com efeito, só após a análise destas duas questões em conjunto é que poderá ser dada uma resposta útil a cada uma delas.

    1.   Quanto à interpretação do efeito retroativo previsto no artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 e à aplicação temporal das disposições «substantivas» dessa diretiva

    32.

    Nos termos do artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104, os Estados‑Membros asseguram que as disposições nacionais adotadas por força do artigo 21.o para a fim de dar cumprimento às disposições substantivas da presente diretiva não se aplicam retroativamente.

    33.

    O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à interpretação do advérbio «retroativamente» utilizado por esta disposição. Mais especificamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o efeito retroativo faz referência, primeiro, à data da violação do direito da concorrência pelo cartel, segundo, à data da sanção aplicada pela Comissão ou ainda, sendo caso disso, terceiro, à data da propositura da ação de indemnização.

    34.

    Recordo que, de acordo com jurisprudência constante, uma norma jurídica nova é aplicável a partir da entrada em vigor do ato que a instaura e, embora esta não seja aplicável às situações jurídicas constituídas e definitivamente adquiridas na vigência da lei anterior, é aplicável aos efeitos futuros dessas situações, bem como às situações jurídicas novas (princípio da não retroatividade dos atos jurídicos) ( 8 ). Só assim não será se a norma nova for acompanhada de disposições particulares que determinem especialmente as suas condições de aplicação no tempo ( 9 ).

    35.

    Também resulta de jurisprudência assente que, para garantir o respeito dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, as regras substantivas do direito da União devem ser interpretadas no sentido de que apenas têm em vista as situações constituídas antes da sua entrada em vigor se resultar claramente dos seus termos, da sua finalidade ou da sua sistemática que lhes deve ser atribuído esse efeito ( 10 ).

    36.

    Ora, a Diretiva 2014/104 contém regras específicas relativas às suas condições de aplicação no tempo. Assim, o âmbito de aplicação dessa diretiva no tempo está limitado pelo seu artigo 22.o, que estabelece uma distinção entre as «disposições substantivas», que não se aplicam retroativamente ( 11 ), e as (disposições) «que não as referidas no n.o 1» [desse artigo 22.o)]» (a seguir «disposições processuais»), que se aplicam no âmbito de ações que, por seu turno, foram intentadas após a entrada em vigor dessa diretiva (ou seja, 26 de dezembro de 2014) ( 12 ).

    37.

    Deste modo, a redação do artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 reflete o princípio geral estabelecido pelo Tribunal de Justiça segundo o qual, contrariamente às regras processuais, que geralmente se devem aplicar a todos os litígios pendentes no momento em que entram em vigor, as regras substantivas são normalmente interpretadas no sentido de que apenas têm em vista as «situações constituídas» antes da sua entrada em vigor ( 13 ).

    38.

    Por conseguinte, há que examinar agora o momento em que a situação jurídica foi adquirida no processo dito «Camiões» e, mais precisamente, se ocorreu antes ou depois da entrada em vigor da Diretiva 2014/104 e do seu prazo de transposição.

    39.

    Observo, a este respeito, que, nos Acórdãos Cogeco e Skanska Industrial Solutions e o. ( 14 ), o Tribunal de Justiça considerou que a Diretiva 2014/104 não era aplicável ratione temporis a «factos» ocorridos antes da sua adoção e da sua entrada em vigor, sem, no entanto, esclarecer se essa referência dizia apenas respeito à infração ou se também tinha em conta a decisão adotada pelas autoridades da concorrência, bem como a ação de indemnização. Recordo, no entanto, que, ao contrário dos processos referidos, nos quais as ações de indemnização ocorreram antes da entrada em vigor da Diretiva 2014/104, no presente processo, a ação de indemnização foi intentada após a entrada em vigor da dessa diretiva e com base na Lei 15/2007, que a transpôs ( 15 ).

    40.

    As demandadas alegam que, para efeitos da determinação das regras substantivas aplicáveis ao alegado dano causado pela infração ao direito da concorrência, o momento em que a situação foi adquirida é o momento em que o referido dano foi causado, isto é, o momento em que, durante o período da infração constatada, o demandante procedeu à aquisição dos camiões em questão.

    41.

    Por seu turno, o demandante alega que a sua situação jurídica foi adquirida no momento em que a ação de indemnização foi intentada. Assim, a Diretiva 2014/104 é aplicável na sua totalidade, sem que a questão da retroatividade se coloque.

    42.

    O órgão jurisdicional de reenvio, por seu turno, também se interroga sobre a possibilidade de tomar em consideração uma terceira referência cronológica para determinar o momento em que a situação jurídica foi adquirida, a saber, a data da sanção da infração ao direito da concorrência.

    43.

    Observo, desde logo, que a redação do artigo 22.o da Diretiva 2014/104 levanta dúvidas, no respeitante ao âmbito de aplicação temporal de certas disposições dessa diretiva. Mais precisamente, esse artigo não identifica quais — entre as disposições dessa diretiva são de natureza «substantiva» ou «processual». Por outro lado, o alcance da proibição da aplicação retroativa das disposições substantivas não é determinado de forma suficientemente clara. Isto levou a critérios diferentes entre os Estados‑Membros na transposição da mesma diretiva, um elemento que pode prejudicar tanto o objetivo de assegurar uma aplicação uniforme do direito da concorrência da União ( 16 ) como o imperativo de segurança jurídica ( 17 ).

    44.

    Considero ainda que acolher a interpretação do demandante equivaleria a aplicar retroativamente disposições substantivas para as quais o legislador da União não previu efeitos retroativos. Verificar‑se‑ia, assim, uma situação que violaria os objetivos de previsibilidade e de uniformidade prosseguidos pelo artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104. Ora, tal interpretação correria o risco de «ressuscitar» pretensões potencialmente já prescritas antes da entrada em vigor da norma nacional de transposição ( 18 ).

    45.

    No que respeita ao critério da data da sanção aplicada pela Comissão, reconheço que, atendendo ao facto de o presente processo se inscrever no âmbito da aplicação privada do direito da concorrência («private enforcement») e, mais precisamente, de ter por objeto uma ação de indemnização na sequência de uma violação do direito da concorrência declarada por uma autoridade da concorrência (uma ação de responsabilidade de tipo «follow‑on»), se podia colocar a questão de saber se o critério a adotar para estabelecer o momento em que a situação jurídica foi adquirida não deveria antes estar associado à adoção da decisão da Comissão que declarou a infração. Com efeito, no âmbito das ações de responsabilidade de tipo «follow‑on», a situação jurídica do lesado não só está vinculada como depende intrinsecamente da declaração da infração por uma autoridade da concorrência, que constitui uma fase prévia primordial para que esta possa exercer o seu direito a obter reparação.

    46.

    A este respeito, observo que considerar ponto de referência apenas a data do dano sofrido ou a data da infração cometida para determinar o momento em que a situação jurídica é adquirida constitui certamente uma abordagem pertinente no âmbito da aplicação do artigo 101.o TFUE pelas autoridades públicas («public enforcement»), como demonstra o artigo 25.o do Regulamento n.o 1/2003, ou no âmbito de ações de indemnização intentadas nos órgãos jurisdicionais nacionais, independentemente da existência de uma decisão de uma autoridade da concorrência que declara uma infração («stand‑alone actions»), mas pode eventualmente situar‑se fora do âmbito conceptual e contextual das ações de responsabilidade do tipo «follow‑on», que pressupõem a existência de uma decisão de uma autoridade da concorrência e utilizam‑na como fundamento da sua ação.

    47.

    No entanto, embora este argumento pareça sensível, não pode ser acolhido.

    48.

    Em primeiro lugar, importa observar que o princípio geral da não retroatividade constitui um corolário do princípio da segurança jurídica. A exigência do princípio da segurança jurídica procura especificamente garantir que as pessoas sujeitas ao direito da União Europeia não sejam afetadas por uma legislação que não é «clara e previsível» ( 19 ). Assim, à semelhança das sanções do direito da concorrência da União aplicadas no âmbito da aplicação do artigo 101.o TFUE pelas autoridades públicas, a não retroatividade das novas regras substantivas relativas às ações de indemnização tem por objetivo assegurar que o infrator possa prever as consequências da prática do ato ilícito e, em especial, o possível alcance da sua responsabilidade ao abrigo das regras substantivas em vigor no momento da infração. Daqui resulta que o artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 reflete a jurisprudência do Tribunal de Justiça, que garante aos particulares a previsibilidade das regras substantivas que determinam a responsabilidade pela indemnização decorrente de infrações ao direito da concorrência, proibindo assim a aplicação retroativa das suas disposições substantivas ( 20 ).

    49.

    Assim, no domínio das ações de indemnização por infração ao direito da concorrência, a situação de facto pertinente para determinar a aplicação ratione temporis das disposições nacionais adotadas para dar cumprimento às disposições substantivas da Diretiva 2014/104 que determinam a constituição da responsabilidade extracontratual é a ocorrência dos factos geradores das condições da responsabilidade que no presente processo ocorreram antes da entrada em vigor da legislação nacional de transposição. Mais precisamente, no âmbito das ações de responsabilidade de tipo «follow‑on», embora efetivamente as empresas que participam num cartel como o que está em causa no processo principal pudessem prenunciar que o seu próprio comportamento constituía uma violação do direito da concorrência suscetível de ser punida por uma autoridade da concorrência e podia potencialmente levar a que os lesados pudessem reclamar a reparação do dano sofrido, não é menos verdade que essas ações devem ser reguladas pelas disposições substantivas em vigor no momento da comissão da infração. Esta posição é, aliás, confirmada tanto pela Diretiva 2014/104 ( 21 ) como pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual, na falta de disposições no direito da União, as ações de indemnização são reguladas pelas normas e processos nacionais dos Estados‑Membros ( 22 ). Devo sublinhar, no entanto, que tal não põe em causa o direito de os lesados obterem a reparação do dano sofrido. Com efeito, como explicado nos n.os 93 e 94 das presentes conclusões, este último é garantido pelo direito primário da União, nomeadamente pelo princípio da efetividade do artigo 101.o TFUE.

    50.

    Em segundo lugar, considerar a data da infração, que constitui um critério claro, objetivo e verificável, também permite assegurar a aplicação coerente das disposições substantivas da Diretiva 2014/104 e constitui um dos seus objetivos fundamentais ( 23 ).

    51.

    Em terceiro lugar, também importa notar que um número significativo de Estados‑Membros no âmbito da transposição da Diretiva 2014/104 parece ter considerado de forma mais ou menos explícita que as disposições substantivas dessa diretiva não se aplicam a situações como as que estão em causa no processo principal em que o dano sofrido por causa da infração foi quantificado antes do prazo de transposição da diretiva ou da entrada em vigor da disposição nacional que transpõe essa diretiva. Ora, parece que o legislador espanhol optou por esse modelo ao prever que, se as disposições processuais são unicamente aplicáveis aos processos movidos depois da entrada em vigor do real decreto‑lei que transpõe a Diretiva 2014/104 (a saber, a partir de 27 de maio de 2017), as disposições substantivas não são aplicáveis «retroativamente», a saber, a factos ocorridos antes da data de transposição da Diretiva 2014/104. Esta abordagem não foi, aliás, posta em causa pela Comissão no âmbito do seu relatório sobre a aplicação da Diretiva 2014/104 ( 24 ).

    52.

    Tendo em conta o exposto, considero que, embora as disposições «processuais» da Diretiva 2014/104 sejam aplicáveis ao processo principal, as disposições qualificadas de «substantivas» não têm efeito retroativo e não são aplicáveis.

    2.   Quanto à determinação das disposições «substantivas» e «processuais» que constam do artigo 22.o da Diretiva 2014/104

    53.

    Lembro que a segunda e terceira questões são relativas às obrigações impostas aos Estados‑Membros pelo artigo 22.o da Diretiva 2014/104 respeitante à aplicação temporal das disposições dessa diretiva relativas ao prazo de prescrição (artigo 10.o), à competência dos tribunais nacionais para estimarem o montante do dano (artigo 17.o, n.o 1) e à presunção ilidível de danos causados por cartéis (artigo 17.o, n.o 2).

    54.

    Assim, o tribunal de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se as disposições acima referidas são substantivas ou não, na aceção do artigo 22.o dessa diretiva e se são aplicáveis a uma ação de indemnização como a que está em causa no processo principal.

    a)   Quanto à margem de manobra dos Estados‑Membros na determinação das disposições substantivas e processuais da Diretiva 2014/104

    55.

    Importa, antes de mais, determinar se os Estados‑Membros dispõem da liberdade de qualificar as regras adotadas com vista a assegurar a transposição da Diretiva 2014/104 como regras de natureza substantiva ou processual.

    56.

    Os Governos espanhol e estónio consideram que há que responder afirmativamente a esta questão. Assim, estes governos alegam que, enquanto a questão da prescrição das ações de indemnização não estiver exaustivamente harmonizada a nível do direito da União, a ordem jurídica nacional em causa continuava a ser livre de qualificar as regras que regulam essa prescrição como regras substantivas ou como regras processuais.

    57.

    O Governo estónio também alega que os Estados‑Membros gozam de uma autonomia processual que lhes confere margem de manobra na aplicação da Diretiva 2014/104 que o Tribunal de Justiça é obrigado a respeitar desde que o Estado‑Membro respeite, por seu turno, os princípios da equivalência e da efetividade. Segundo este governo, a qualificação de uma regra como sendo de natureza «substantiva» ou «processual» após a entrada em vigor dessa diretiva constitui uma intervenção inaceitável na autonomia processual dos Estados‑Membros.

    58.

    Em contrapartida, a Comissão e uma das demandadas consideram que a questão de saber quais são, entre as disposições da Diretiva 2014/104, as que são substantivas e as que não o são deve ser apreciada à luz do direito da União e não à luz dos requisitos do direito nacional aplicável.

    59.

    Partilho desta última posição.

    60.

    Em primeiro lugar, há que constatar que, embora o artigo 22.o da Diretiva 2014/104 não defina quais são as disposições substantivas e as de natureza processual, este artigo refere‑se expressamente «às disposições substantivas da presente diretiva», o que parece indicar que a natureza das suas disposições é uma questão específica do direito da União.

    61.

    Em segundo lugar, recordo que, entre os principais objetivos da Diretiva 2014/104, consta a vontade de assegurar a aplicação coerente do direito da concorrência da União, de aumentar a efetividade das ações de indemnização neste domínio e assegurar a aplicação efetiva e coerente dos artigos 101.o e 102.o TFUE ( 25 ). Ora, deixar aos Estados‑Membros tal discrição implicava o risco de gerar uma aplicação incoerente e não uniforme das disposições dessa diretiva nas diferentes ordens jurídicas, o que seria contrário aos objetivos acima referidos. Em contrapartida, considerar que o direito da União deve determinar, de entre as disposições desta diretiva, quais as que são substantivas e quais as que não o são permite aumentar a segurança jurídica e prevenir e desencorajar os lesados por uma infração às regras do direito da concorrência de intentar uma ação de indemnização num órgão jurisdicional específico que foi selecionado com o fundamento de que essa diligência levará à aplicação de regras substantivas e processuais mais favoráveis aos seus interesses do que as que poderiam ser aplicadas por outro órgão jurisdicional nacional. Por outras palavras, esta abordagem permite evitar o «forum shopping».

    62.

    Em terceiro lugar, observo que, mesmo que se admitisse que o legislador da União tinha deixado aos Estados‑Membros a opção de determinarem quais as disposições que eram de ordem substantiva ou de ordem processual, não é menos verdade que essa opção deveria ser feita em conformidade com os princípios gerais do direito da União e com o princípio da efetividade do direito da concorrência a fim de assegurar à iniciativa privada um sistema eficaz de punição das infrações ao direito da concorrência.

    63.

    Assim, considero que há que examinar a segunda e terceira questões partindo da premissa de que a determinação da natureza das disposições da Diretiva 2014/104 é uma questão regulada pelo direito da União.

    b)   Regras que estabelecem os prazos de prescrição em conformidade com o artigo 10.o da Diretiva 2014/104

    64.

    Há que observar que, a este respeito, à semelhança do artigo 17.o da Diretiva 2014/104, o legislador espanhol transpôs o artigo 10.o desta diretiva para o direito espanhol como disposição substantiva sem efeito retroativo.

    65.

    Recordo que a advogada‑geral J. Kokott se pronunciou sobre a qualificação do artigo 10.o da Diretiva 2014/104 nas suas Conclusões no processo Cogeco, considerando que não se trata de uma disposição puramente processual. Remeto para esta análise, que subscrevo ( 26 ).

    66.

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça também declarou que, ao contrário dos prazos processuais, o prazo de prescrição faz parte do direito substantivo, uma vez que tem por função proteger tanto o lesado — este deve dispor de tempo suficiente para reunir as informações adequadas com vista a uma eventual ação — como o responsável pelo dano — evitando que o lesado possa retardar indefinidamente o exercício do seu direito a indemnização ( 27 ).

    67.

    Observo também que a questão do prazo de prescrição se enquadra no direito substantivo na maioria dos direitos nacionais e que, por isso, o artigo 10.o da Diretiva 2014/104 foi transposto como disposição substantiva na maior parte dos Estados‑Membros ( 28 ).

    68.

    A este respeito, há que precisar que, ao contrário de outros Estados‑Membros ( 29 ), o legislador espanhol não parece ter previsto normas transitórias no que respeita ao âmbito de aplicação ratione temporis das novas regras de prescrição.

    69.

    Em face do exposto, proponho responder à segunda questão prejudicial que o artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 deve ser interpretado no sentido de que o seu artigo 10.o não é aplicável a uma ação de indemnização que, embora intentada após a entrada em vigor dessa diretiva e das disposições nacionais de transposição, tem por objeto factos e sanções anteriores à entrada em vigor dessas disposições.

    c)   Poder de avaliação judicial e de quantificação dos danos previsto no artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104

    70.

    Quanto ao artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104, conforme resulta da redação dessa disposição, esta diz principalmente respeito ao nível de prova exigido para efeitos de quantificação dos danos sofridos pelo lesado e à avaliação pelo respetivo julgador nacional das provas em que se pode basear a parte demandante para demonstrar a extensão dos danos sofridos.

    71.

    O primeiro período do artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 impõe aos Estados‑Membros que garantam que nem o ónus nem o nível da prova exigidos para a quantificação dos danos impossibilitem ou dificultem excessivamente na prática o exercício do direito à indemnização.

    72.

    Observo, desde logo, que essa disposição é uma expressão do princípio da efetividade do direito da concorrência consagrado pelo Tribunal de Justiça ( 30 ).

    73.

    O mesmo acontece, em meu entender, no que respeita ao segundo período do artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 que não institui uma nova obrigação de fundo a cargo das partes no processo.

    74.

    Assim, ao aligeirar o nível de prova exigido para efeitos de determinação do montante dos danos sofridos, essa disposição visa sanar a assimetria de informação existente em detrimento da parte demandante e o facto de a quantificação dos danos sofridos, nomeadamente nos casos de cartel, exigir que se avalie de que forma teria evoluído o mercado em causa se não tivesse existido a infração, uma tarefa quase impossível de cumprir por um lesado.

    75.

    Observo ainda que, ao contrário do artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104, o artigo 17.o, n.o 1 dessa diretiva não retira o ónus da prova e a obrigação principal de a parte demandante quantificar e provar o montante dos danos sofridos. Essa disposição limita‑se a fornecer unicamente aos tribunais nacionais um método de quantificação do montante dos danos ao conferir‑lhes uma margem de apreciação que lhes permite ajustar o nível da prova exigido à demonstração do montante dos danos e aceitar, assim, um nível de prova inferior ao que é geralmente exigido quando os demandantes têm dificuldades em quantificar com precisão os danos causados.

    76.

    Entendo que, desse modo, esse instrumento mais não faz do que reforçar o que é também a missão natural do julgador no âmbito de uma ação de indemnização, isto é, a determinação do montante dos danos sofridos.

    77.

    Em face do exposto, sou de opinião de que o artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 poderá ser considerado uma disposição «processual», na aceção do artigo 22.o dessa diretiva e, enquanto tal, aplica‑se a uma ação de indemnização como a que está em causa no processo principal que, apesar de movido depois da entrada em vigor dessa Diretiva e das disposições nacionais de transposição, tem por objeto uma infração que terminou antes da entrada em vigor tanto da mesma diretiva como dessas disposições nacionais.

    d)   Presunção do dano resultante de uma infração ao direito da concorrência prevista no artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104

    78.

    No que respeita à questão de saber se o artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 é ou não uma disposição substantiva na aceção do artigo 22.o desta diretiva, há que recordar que, nos termos desta disposição, se presume que as infrações de cartel causam danos. Todavia, o infrator tem o direito de ilidir essa presunção.

    79.

    Observo, desde já, que essa disposição não se limita à repartição do ónus da prova relativa à existência do dano (que é uma questão de ordem processual), mas estabelece uma presunção ilidível relativa à existência do dano resultante do cartel em causa, o que diz diretamente respeito à responsabilidade extracontratual dos infratores às regras do direito da concorrência.

    80.

    A este respeito, recordo que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça qualquer pessoa tem o direito de pedir a reparação do dano sofrido quando haja um nexo de causalidade entre o referido dano e um cartel ou uma prática proibida pelo artigo 101.o TFUE ( 31 ). A existência de um dano e o nexo de causalidade entre o referido dano e a infração ao direito da concorrência fazem sem dúvida parte dos elementos constitutivos da responsabilidade civil extracontratual.

    81.

    Neste contexto, considero que a presunção estabelecida no artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 não tem uma finalidade meramente probatória. Em contrapartida, ao atribuir o ónus da prova ao infrator e ao dispensar o lesado da obrigação de provar a existência de um dano sofrido devido ao cartel ou de um nexo de causalidade entre o referido dano e esse cartel, essa presunção está diretamente ligada à atribuição da responsabilidade civil extracontratual ao infrator em causa e, consequentemente, afeta diretamente a sua situação jurídica. Assim, afigura‑se que o artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104, nomeadamente o seu primeiro período, corresponde a uma regra estreitamente ligada à constituição, à atribuição e ao alcance da responsabilidade extracontratual das empresas que infringiram o artigo 101.o TFUE pela sua participação num cartel. Ora, pode deduzir‑se da jurisprudência que tais normas podem ser qualificadas de «normas substantivas» ( 32 ).

    82.

    A este respeito, há que acrescentar que o Tribunal de Justiça não reconheceu efeito retroativo a outras disposições da Diretiva 2014/104 que também estão estreitamente ligadas ao estabelecimento da responsabilidade dos infratores. A título de exemplo, no Acórdão Skanska Industrial Solutions e o., o Tribunal de Justiça considerou que o artigo 11.o, n.o 1, desta diretiva, que diz respeito ao estabelecimento da responsabilidade solidária das empresas que infringem o direito da concorrência por meio de um comportamento conjunto, não é aplicável ratione temporis aos factos em causa, que diziam respeito a uma ação de indemnização intentada posteriormente ao cartel que a tinha desencadeado ( 33 ).

    83.

    Além disso, como salientou a Comissão, no domínio do direito internacional privado, há indicações que vão no sentido de fortificar a posição segundo a qual as disposições que instituem presunções como a estabelecida no artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 podem ser qualificadas de disposições substantivas ( 34 ).

    84.

    Em face do exposto, entendo que, ao contrário do artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104, o artigo 17, n.o 2, dessa diretiva pode ser qualificado de disposição «substantiva», na aceção do artigo 22.o, n.o 1, dessa diretiva e, por conseguinte, a legislação nacional adotada para dar cumprimento a essa disposição não deve ser aplicada a factos constitutivos de responsabilidade cumpridos antes da entrada em vigor dessas normas nacionais de transposição.

    85.

    No entanto, como explicado nos n.os 139 a 141 das presentes conclusões, esta interpretação de modo nenhum impede os tribunais nacionais de aplicarem presunções relativas ao ónus da prova da presença de um dano que existia anteriormente às respetivas normas nacionais de transposição, cuja conformidade com as exigências do direito da União deve ser avaliada tendo em conta nomeadamente os princípios gerais da equivalência e da efetividade.

    86.

    Nestas condições, proponho que se responda à terceira questão prejudicial que o artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à aplicação das disposições nacionais de transposição, adotadas para dar cumprimento ao artigo 17.o, n.o 1, desta diretiva, relativo à competência dos órgãos jurisdicionais nacionais para calcularem o montante do dano, a danos sofridos por causa de uma infração ao direito da concorrência antes da entrada em vigor da legislação nacional de transposição no âmbito de uma ação de indemnização intentada após a entrada em vigor da disposição nacional de transposição. O artigo 22.o, n.o 1, da referida diretiva deve ser interpretado no sentido de que se opõe à aplicação de legislações nacionais, adotadas para dar execução ao artigo 17.o, n.o 2, da mesma diretiva, que prevê uma presunção ilidível de dano causado pelos cartéis, às infrações cometidas antes da entrada em vigor da legislação nacional de transposição no âmbito de uma ação de indemnização intentada após a entrada em vigor da disposição nacional de transposição.

    C. Quanto à primeira questão prejudicial

    87.

    Tendo em conta as respostas que proponho dar à segunda e terceira questões, considero que há que responder à primeira questão prejudicial.

    88.

    A primeira questão prejudicial inclui duas partes.

    89.

    Por um lado, com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre as obrigações que incumbem aos Estados‑Membros por força do direito primário, ou seja, sobre o efeito do artigo 101.o TFUE e do princípio da efetividade para determinarem se o artigo 10.o, n.o 3, o artigo 17.o, n.o 1, segundo período, e o artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 se aplicam a uma situação como a que está em causa no processo principal. Assim, coloca‑se a questão de saber se o artigo 101.o TFUE e o princípio da efetividade exigem que a primeira disposição transitória do Real Decreto‑Lei 9/2017 seja interpretada no sentido de que as alterações introduzidas à lei de proteção da concorrência no que respeita aos prazos de prescrição, à presunção ilidível de dano no âmbito de um cartel e à quantificação do dano se aplicam às ações intentadas após a entrada em vigor desse real decreto‑lei, como no caso da ação objeto do litígio no processo principal, incluindo os casos em que o pedido se refere a factos e a sanções anteriores à entrada em vigor desse real decreto‑lei.

    90.

    Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio também pede ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a compatibilidade das disposições do direito espanhol — mais especificamente sobre a disposição relativa à responsabilidade extracontratual, que constitui a base jurídica alternativa da ação de indemnização em causa no processo principal — com o artigo 101.o TFUE e com o princípio da efetividade, no caso de os artigos 10.o e 17.o da Diretiva 2014/104 não serem aplicáveis ratione temporis.

    91.

    No que respeita à primeira parte da primeira questão prejudicial acima identificada, observo que o princípio da efetividade não pode impor a aplicação retroativa das disposições substantivas da Diretiva 2014/104. Isto seria contrário a princípios gerais do direito, como o princípio da segurança jurídica. Considero, assim, que o facto de o legislador espanhol ter decidido que as disposições que transpõem os artigos 10.o e 17.o, n.o 2, dessa diretiva são disposições substantivas que não se aplicam retroativamente — uma qualificação que é, aliás, conforme com o direito da União, como explicado na análise da segunda e terceira questões prejudiciais — está em conformidade com o princípio da efetividade. No entanto, o mesmo raciocínio não se aplica ao artigo 17.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104, que é uma disposição processual e que se pode aplicar à ação de indemnização que é objeto do presente processo.

    92.

    No que respeita à segunda parte desta questão, observo, antes de mais, que a proibição de retroatividade das legislações nacionais de transposição das disposições substantivas da Diretiva 2014/104 nos termos do seu artigo 22.o, n.o 1, no que respeita aos factos constitutivos da responsabilidade praticados antes da entrada em vigor da legislação nacional de transposição, não exclui que os Estados‑Membros apliquem a sua legislação nacional em conformidade com as suas obrigações preexistentes ao abrigo do direito primário, por força do princípio da efetividade ( 35 ).

    93.

    Assim, é pacífico que, na ausência de regulamentação da União na matéria, aplicável ratione temporis, compete à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro estabelecer as modalidades de exercício do direito de pedir a reparação do dano resultante de uma violação dos artigos 101.o e 102.o TFUE, destinadas a garantir os direitos que para os cidadãos resultam do efeito direto dessa regulamentação, desde que essas regras nacionais não sejam menos favoráveis do que as das ações análogas de natureza interna (princípio da equivalência) e não tornem praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) ( 36 ).

    94.

    A este respeito, importa recordar que o artigo 101.o TFUE produz efeitos diretos nas relações entre os particulares e cria direitos na esfera jurídica dos sujeitos de direito que os órgãos jurisdicionais nacionais devem salvaguardar. Assim, a plena eficácia do artigo 101.o TFUE exige que as pessoas que tenham sofrido um dano possam pedir reparação não só do dano real (damnum emergens) mas também dos lucros cessantes (lucrum cessans), bem como o pagamento de juros ( 37 ).

    95.

    O Tribunal de Justiça esclareceu o conteúdo e o alcance desta jurisprudência no que respeita aos aspetos específicos das ações de indemnização. Assim, o Tribunal de Justiça declarou que o princípio da efetividade se opõe a uma regulamentação nacional que torna o exercício do direito de indemnização integral «impossível, na prática, ou excessivamente difícil» ( 38 ).

    96.

    Importa também observar que a aplicação do direito da concorrência pelas entidades públicas e por iniciativa privada devem ser considerados instrumentos que servem um objetivo comum, nomeadamente o do cumprimento do direito da concorrência. Observo, a este respeito, que a jurisprudência do Tribunal de Justiça reconheceu que o direito de pedir a reparação do dano causado por uma violação do direito da concorrência reforça o caráter operacional das regras de concorrência da União e é suscetível de desencorajar os acordos ou as práticas concertadas, frequentemente dissimulados, suscetíveis de restringir ou falsear o jogo da concorrência. Nesta perspetiva, as ações de indemnização nos órgãos jurisdicionais nacionais podem contribuir substantivamente para a manutenção de uma concorrência efetiva na União Europeia ( 39 ). Assim, embora, no âmbito da aplicação do direito da concorrência pelas entidades públicas, o efeito dissuasivo se manifeste através das sanções aplicadas pelas autoridades da concorrência, esse efeito dissuasivo no âmbito da aplicação do direito da concorrência por iniciativa da esfera privada é assegurado pelo risco que representa para as empresas que participaram num cartel de serem confrontadas com um número significativo de ações de indemnização por partes potencialmente lesadas em diferentes órgãos jurisdicionais (nomeadamente quando a violação do direito da concorrência reveste um caráter transfronteiriço e se alarga a diversos Estados‑Membros, como no caso em apreço).

    1.   Apreciação do regime da prescrição previsto no Código Civil espanhol à luz do princípio da efetividade

    97.

    O Tribunal de Justiça definiu os elementos a ter em conta para determinar se um regime de prescrição específico é conforme com o princípio da efetividade. Mais especificamente, o Tribunal de Justiça declarou que havia que tomar em consideração todos os elementos da prescrição e mais precisamente: primeiro, a duração do prazo de prescrição ( 40 ), segundo, a questão de saber se o prazo começa a correr antes de o lesado ter tomado conhecimento do dano sofrido ( 41 ) e terceiro, a questão de saber se o prazo pode ser suspenso ou interrompido ( 42 ).

    98.

    Por conseguinte, há que examinar a compatibilidade do regime de responsabilidade extracontratual previsto pelo Código Civil espanhol à luz destes critérios.

    a)   Duração do prazo de prescrição

    99.

    O Tribunal de Justiça declarou que a duração do prazo de prescrição não pode ser «curta a ponto de, quando conjugada com as outras regras de prescrição, tornar o exercício do direito de pedir a reparação impossível, na prática, ou excessivamente difícil» ( 43 ).

    100.

    Observo que o prazo de um ano previsto pelo regime de responsabilidade extracontratual do Código Civil espanhol é consideravelmente mais curto relativamente à duração de cinco anos prevista no artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104.

    101.

    No entanto, observo que tendo em atenção os critérios desenvolvidos pela jurisprudência Cogeco, há que considerar todos os elementos do regime de prescrição em causa ( 44 ). Assim, não basta considerar isoladamente elementos individuais do regime nacional da prescrição ( 45 ).

    102.

    Antes de analisar o ponto de partida e o facto que desencadeia o prazo de prescrição, saliento que a questão da suspensão ou da interrupção do prazo de prescrição (apesar da sua importância para determinar se o prazo de um ano é compatível com os critérios desenvolvidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça no Acórdão Cogeco) não se colocou no presente processo. No que respeita aos elementos a ter em conta para garantir o respeito do princípio da efetividade a este nível remeto para a análise do Tribunal de Justiça nesse Acórdão Cogeco ( 46 ).

    b)   Dies a quo para o cálculo do prazo de prescrição

    103.

    Se o Tribunal de Justiça vier a concluir que o artigo 10.o da Diretiva 2014/104 não é aplicável a uma ação de indemnização como a que está em causa no processo principal, o julgador nacional é, em princípio, obrigado a aplicar o prazo de prescrição de um ano constante do regime geral da responsabilidade extracontratual previsto no artigo 1902.o do Código Civil e a determinar o dies a quo para o cálculo do prazo de prescrição.

    104.

    A este respeito, as demandadas consideram que o prazo de prescrição previsto no artigo 1902.o do Código Civil espanhol começou a correr no dia da publicação do comunicado de imprensa, a saber, em 19 de julho de 2016. Assim, tendo a ação do demandante sido intentada em 1 de abril de 2018, estava prescrita.

    105.

    Por seu turno, o demandante, o Governo espanhol e a Comissão alegam que é necessário considerar como dies a quo o dia da publicação do resumo da decisão da Comissão no Jornal Oficial da União Europeia, a saber, em 6 de abril de 2017, o que implica que, no caso em apreço, a ação de indemnização não prescreveu.

    106.

    Antes de mais, recordo que o Tribunal de Justiça declarou que o princípio da efetividade exige que uma legislação nacional que fixa a data em que começa a correr o prazo de prescrição deve ser adaptada às especificidades do direito da concorrência e aos objetivos da execução das regras desse direito pelas pessoas envolvidas ( 47 ). O Tribunal de Justiça também se pronunciou sobre o facto que faz começar a correr o prazo de prescrição, esclarecendo que era indispensável, para que o lesado possa intentar uma ação de indemnização, que saiba quem é a pessoa do responsável pela infração ao direito da concorrência ( 48 ).

    107.

    Também encontramos estes critérios no artigo 10.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104, que prevê que o ponto de partida do cálculo do prazo de prescrição está sujeito à reunião de duas condições cumulativas, a saber, por um lado, a cessação da infração ao direito da concorrência e, por outro, o conhecimento de determinadas informações indispensáveis ao exercício da ação de indemnização.

    108.

    No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta que documento, entre a publicação do comunicado de imprensa ou a publicação do resumo da decisão no Jornal Oficial da União Europeia e da versão não confidencial dessa decisão no sítio Internet da Direção‑Geral da Concorrência da Comissão, pode ser qualificado de facto relevante a partir do qual se pode razoavelmente considerar que o demandante tomou conhecimento das informações indispensáveis ao exercício da ação de indemnização ( 49 ).

    109.

    Para responder a esta questão, há que analisar o objeto, a natureza e especialmente o conteúdo do comunicado de imprensa comparando‑o com o resumo da decisão publicada no Jornal Oficial da União Europeia no processo dito «Camiões». Importa também colocar a questão da existência de uma eventual obrigação de diligência de que os lesados deverão dar provas no âmbito da aplicação do artigo 101.o TFUE quanto à iniciativa privada.

    1) Quanto à publicação dos comunicados de imprensa e das decisões da Comissão

    110.

    Em conformidade com o artigo 30.o do Regulamento n.o 1/2003, a Comissão publica as decisões que tomar nos termos dos artigos 7.o a 10.o, 23.o e 24.o do referido regulamento.

    111.

    A Comissão cumpre esta obrigação ao publicar no Jornal Oficial da União Europeia um resumo das decisões adotadas nos termos dos artigos 101.o e/ou 102.o TFUE em todas as línguas oficiais «pouco tempo após» a sua adoção ( 50 ).

    112.

    A Direção‑Geral da Concorrência da Comissão também tem o costume de publicar «logo que possível» versões não confidenciais das decisões adotadas nos termos dos artigos 101.o ou 102.o TFUE no seu sítio Internet, ainda que, contrariamente aos resumos, as decisões só sejam publicadas na língua do processo. Devido à obrigação de proteger os segredos comerciais e as informações confidenciais das partes, estas versões públicas são geralmente publicadas algum tempo após a adoção dessas decisões ( 51 ).

    113.

    Recordo que, no presente processo, a Comissão adotou a Decisão em 19 de julho de 2016. No mesmo dia anunciou a adoção dessa decisão num comunicado de imprensa disponível no seu sítio Internet ( 52 ). Posteriormente, a Comissão publicou, em 6 de abril de 2017, um resumo dessa decisão no Jornal Oficial da União Europeia. Nessa mesma data, a Comissão publicou uma versão não confidencial provisória da decisão no sítio Internet da Direção‑Geral da Concorrência.

    2) Quanto à existência de um dever de informação que impende sobre o lesado por uma infração ao direito da concorrência

    114.

    Em face do exposto, coloca‑se a questão de saber se existe uma obrigação de as partes potencialmente lesadas se conformarem com um certo dever de diligência no tratamento dos seus processos a fim de obterem as informações necessárias que lhes permitam intentar uma ação de indemnização, e, em caso afirmativo, em que medida esse dever de diligência exige ter conhecimento das publicações dos comunicados de imprensa da Comissão relativos às decisões adotadas em aplicação do artigo 101.o TFUE.

    115.

    As demandadas parecem sustentar que, dado que os queixosos eram empresas ou profissionais experientes, deve ser exigido esse dever de diligência. Segundo estas partes, alguns indícios — como, por exemplo, a cobertura mediática da adoção da decisão no dia da publicação do comunicado de imprensa ou o facto de os escritórios de advogados, os fundos de investimento e outros peritos envolvidos em reclamações de indemnização semelhantes parecer terem anunciado a possibilidade de procederem judicialmente contra os fabricantes de camiões — indicam que os compradores de camiões não podiam alegar desconhecimento da decisão adotada pela Comissão.

    116.

    Assim, segundo as demandadas, deve‑se considerar que o demandante tomou conhecimento da violação, a partir da publicação do comunicado de imprensa e estava em condições de intentar uma ação de indemnização, ou, pelo menos, interromper o prazo de prescrição por carta a partir dessa data, o que se afigura ter sido o caso de outros compradores de camiões que atualmente procedem judicialmente contra os fabricantes de camiões nos órgãos jurisdicionais espanhóis.

    117.

    Não contesto o facto de, à data da publicação do comunicado de imprensa, alguns operadores ativos no mercado afetado pela prática colusória terem tomado conhecimento de que a Comissão adotou tal decisão. É também claro que, tendo em conta a duração da investigação e dos comunicados de imprensa emitidos pela Comissão durante o inquérito (que foram provavelmente reproduzidos pela imprensa em diversos Estados‑Membros) ( 53 ) bem como os desafios em causa para os compradores dos seus produtos, é razoável esperar que uma parte do mercado estivesse ao corrente da investigação em curso da Comissão e a fortiori da decisão que esta proferiu.

    118.

    Não considero, no entanto, que exista um dever geral de diligência por parte das vítimas de infrações da concorrência que lhes imponha ter conhecimento da publicação desses comunicados de imprensa.

    119.

    É certo que não se pode excluir que, em determinados órgãos jurisdicionais, sejam intentadas ações de indemnização na sequência da publicação do comunicado de imprensa ou mesmo antes ( 54 ). No entanto, esta prática (que, aliás, não é unânime, nomeadamente face aos diferentes critérios seguidos pelos Estados‑Membros no que respeita ao momento a partir do qual começa a correr o prazo de prescrição ( 55 )) não cria, na minha opinião, «um dever de diligência» que imponha a todas as vítimas de infrações do direito da concorrência a propositura de ações de indemnização com base nos referidos comunicados de imprensa.

    120.

    Assim, tendo em conta o que precede, não se pode presumir que, na sequência de uma simples publicação de um comunicado de imprensa da Comissão no seu sítio Internet, o lesado em causa tenha tomado conhecimento de todas as informações indispensáveis ao exercício do seu direito a uma ação de indemnização. À semelhança da Comissão, considero que exigir a uma parte potencialmente lesada que dê provas de um nível de diligência excessivamente elevado, isto é, que vá além do que essa parte poderia razoavelmente ter tido conhecimento, viola o seu direito de pedir a reparação do dano causado por uma prática anticoncorrencial. Assim, o princípio da plena eficácia dos artigos 101.o e 102.o TFUE e o princípio da segurança jurídica inerente ao estabelecimento da prescrição exigem que esse dever de diligência não seja demasiado restritivo para a pessoa que pede uma indemnização ( 56 ).

    121.

    Por último, observo que a prática jurisdicional de alguns Estados‑Membros parece estabelecer uma distinção entre os consumidores «profissionais» ou as empresas de grande dimensão e os consumidores «ordinários» no que respeita a esse pretenso «dever de diligência». Presume‑se que os primeiros têm uma obrigação de diligência superior aos segundos, impondo‑lhes acompanhar a publicação do comunicado de imprensa da Comissão.

    122.

    Embora, em última análise, caiba ao órgão jurisdicional nacional examinar casuisticamente se o dever de diligência do lesado lhe impõe que acompanhe o desenvolvimento de um processo de concorrência para exercer os seus direitos, considero que estabelecer tal distinção entre os lesados teria o risco de aumentar a incerteza (já existente) no domínio da aplicação do artigo 101.o TFUE sobre a iniciativa da esfera privada. Dado que o espaço em que as partes potencialmente lesadas evoluem não é homogénea, o nível de diligência exigido em cada caso depende necessariamente de uma gradação de critérios que remetem para circunstâncias específicas da parte potencialmente lesada, tais como, por exemplo, a dimensão do comprador em causa, a quantidade ou o volume do produto comprado, a estrutura do mercado, as condições dessa compra e outros critérios que demonstram a dificuldade prática de estabelecer essa distinção. Considero, assim, que, pelo menos, no que respeita aos comunicados de imprensa e às decisões adotadas pela Comissão em matéria de infrações ao direito da concorrência, devem ser estabelecidos critérios claros e previsíveis relativos à «tomada de conhecimento», como a conexão (por presunção, por exemplo) com a publicação do resumo de uma decisão da Comissão no Jornal Oficial da União Europeia.

    123.

    Em face do exposto, considero que, no âmbito das ações de responsabilidade de tipo «follow‑on», a conexão com um elemento objetivo como a publicação de uma decisão da Comissão que declara essa infração no Jornal Oficial da União Europeia — que constitui a última fase da aplicação do artigo 101.o TFUE pela autoridade pública — permite estabelecer de forma clara, precisa e transparente o momento em que o prazo de prescrição começa a correr, tanto para as empresas que participaram num cartel como para os lesados. Assim, o direito de um lesado intentar uma ação de indemnização subsequente a um comportamento anticoncorrencial surge no momento da adoção da decisão da Comissão que declara esse comportamento, mais precisamente no momento da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia.

    124.

    Observo, por outro lado, que, tendo em conta o conteúdo do resumo da decisão, é‑me difícil compreender a razão pela qual este não poderia ser publicado no mesmo dia que a adoção da decisão pela Comissão e a publicação do comunicado de imprensa. Com efeito, contrariamente à versão não confidencial da decisão, para a qual se justifica um desfasamento no tempo entre a data da adoção da decisão e a publicação da sua versão não confidencial pela necessidade de proteger os segredos comerciais e as informações confidenciais das partes, essa necessidade não parece ser necessária no que respeita à publicação do resumo da decisão no Jornal Oficial da União Europeia ( 57 ).

    3) Conteúdo do comunicado de imprensa e da decisão da Comissão no processo dito «Camiões»

    125.

    Antes de mais, há que observar que, em relação aos resumos das decisões publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, os comunicados de imprensa contêm geralmente informações menos detalhadas sobre os comportamentos restritivos da concorrência e as razões pelas quais constituem uma infração.

    126.

    Por outro lado, os comunicados de imprensa não se dirigem diretamente às partes para as quais as informações publicadas podem apresentar um interesse particular e não se destinam, portanto, a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros. Neste sentido, está disponível um parecer jurídico no sítio Internet da Comissão ( 58 ).

    127.

    No caso em apreço, contrariamente ao resumo da decisão no processo dito «Camiões» que foi publicado em todas as línguas oficiais da União, o comunicado de imprensa foi publicado apenas em seis línguas oficiais ( 59 ). Por outro lado, sublinho, que não foi publicado em língua espanhola, língua do país de origem do demandante no processo principal. Observo também que o comunicado de imprensa refere a possibilidade de que dispõem as pessoas ou as empresas lesadas por práticas anticoncorrenciais, como as descritas, de intentarem uma ação nos órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros e reclamar uma indemnização ( 60 ).

    128.

    Importa agora examinar as disposições‑chave de um comunicado de imprensa que permite a um lesado intentar uma ação de indemnização.

    129.

    Em primeiro lugar, o comunicado de imprensa não identifica os destinatários específicos da decisão (a sociedade‑mãe e as eventuais filiais a que a decisão diz respeito não são todas referidas) e não indica a denominação social das entidades jurídicas destinatárias da decisão ( 61 ), mas apenas as denominações comerciais das empresas envolvidas. Pelo contrário, o resumo da decisão nomeia os infratores.

    130.

    Em segundo lugar, o comunicado de imprensa não contém uma descrição suficientemente detalhada da infração, nomeadamente dos tipos específicos de camiões que são abrangidos pela infração. Refere simplesmente que a infração diz respeito aos camiões «de peso médio» (peso compreendido entre 6 e 16 toneladas) e de «peso pesado» (mais de 16 toneladas), enquanto o resumo da decisão esclarece que os veículos de transporte como os tratores são incluídos nos camiões de peso médio e pesado, e que a decisão não diz respeito ao serviço pós‑venda ou outros serviços ou garantias relativas aos camiões, nem à venda de camiões usados ou a qualquer outro bem ou serviço.

    131.

    Em terceiro lugar, o comunicado de imprensa não indica a duração exata da infração nem a duração desta imputada a cada entidade jurídica destinatária da decisão. Assim, o comunicado de imprensa refere simplesmente que a infração «durou 14 anos, de 1997 a 2011», ao passo que o resumo da decisão indica a duração exata (de 17 de janeiro de 1997 a 18 de janeiro de 2011), e esclarece a duração imputada a cada uma das empresas em causa relativamente à sua participação no cartel identificado.

    132.

    Ora, na minha opinião, estes elementos constituem indícios cruciais para permitir a um lesado verificar se a infração teve lugar num mercado geográfico que lhe diz respeito e durante um período em que, com efeito, comprou o tipo e o modelo de camiões objeto do cartel.

    133.

    Em face do exposto e tendo em conta o objeto e a natureza dos comunicados de imprensa e sobretudo o seu conteúdo, é evidente, na minha opinião, que o lesado só podia dispor de elementos que lhe permitissem intentar uma ação de indemnização a partir da data da publicação do resumo da decisão no Jornal Oficial da União Europeia.

    134.

    Observo, a esse respeito, que, segundo as observações do Governo espanhol e sem prejuízo de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, parece que os tribunais espanhóis interpretam o regime da prescrição no âmbito de ações de indemnização intentadas com base no artigo 1902.o do Código Civil, de forma que o prazo de prescrição de um ano só começa a correr a partir da publicação do resumo das decisões da Comissão no Jornal Oficial da União Europeia.

    135.

    Considero, portanto, que, num processo como o que está em causa no processo principal, a ação não prescreveu.

    2.   Presunção do dano à luz do princípio da efetividade do direito da concorrência

    136.

    No que respeita à prova da existência do dano pelo demandante, esta deverá ser efetuada em conformidade com o regime de direito comum, tendo em conta a inaplicabilidade do artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 apurada aquando da análise da terceira questão prejudicial.

    137.

    Em primeiro lugar, observo que o artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003, que codifica a jurisprudência do Tribunal de Justiça, nomeadamente o Acórdão Masterfoods e HB ( 62 ), prevê que, quando se pronunciarem sobre acordos, decisões ou práticas ao abrigo dos artigos 101.o ou 102.o TFUE que já tenham sido objeto de decisão da Comissão, os tribunais nacionais não podem tomar decisões que sejam contrárias à decisão aprovada pela Comissão.

    138.

    Na minha opinião, isso permitiria facilitar o estabelecimento do nexo de causalidade entre a infração (já declarada pela decisão da Comissão) e o dano sofrido sem recorrer a uma aplicação retroativa do artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104.

    139.

    Em segundo lugar, como mencionado no n.o 85 das presentes conclusões, nada impede os tribunais nacionais de aplicarem presunções relativas ao ónus da prova sobre a presença de um dano que existissem anteriormente às respetivas normas nacionais de transposição, cuja conformidade com as exigências do direito da União deve ser avaliada tendo em conta nomeadamente os princípios gerais da equivalência e da efetividade ( 63 ).

    140.

    A este respeito, observo que, segundo o considerando 11 da Diretiva 2014/104, na falta de norma de direito da União (e, portanto, fora do âmbito de aplicação desta diretiva), as regras nacionais que regem o exercício do direito à reparação dos danos causados por infração ao artigo 101.o TFUE, inclusive as relativas a aspetos não abrangidos por essa diretiva, como o conceito de «nexo de causalidade» entre a infração e o dano, devem observar os princípios da efetividade e da equivalência.

    141.

    Isso significa que as regras nacionais «não deverão ser formuladas ou aplicadas de forma que torne excessivamente difícil ou praticamente impossível o exercício do direito à reparação garantido pelo Tratado FUE, de forma a deixar ao juiz nacional uma margem de apreciação e de interpretação no seu cálculo dos dano sofridos» ( 64 ).

    142.

    Em face do exposto, proponho responder à primeira questão prejudicial que o artigo 101.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à interpretação de uma regra nacional que exclui a aplicação retroativa do prazo de propositura da ação de cinco anos e da presunção ilidível dos danos causados pelos cartéis, previstos, respetivamente, no artigo 10.o, n.o 3, e no artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104. No entanto, o artigo 101.o TFUE e o princípio da efetividade impõem à regulamentação nacional que rege a ação de indemnização que o prazo de prescrição só comece a correr a partir do dia da publicação do resumo da decisão da Comissão no Jornal Oficial da União Europeia.

    V. Conclusão

    143.

    Tendo em conta estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pela Audiencia Provincial de Léon (Audiência Provincial de Leão, Espanha) do seguinte modo:

    1)

    O artigo 101.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à interpretação de uma regra nacional que exclui a aplicação retroativa do prazo de propositura da ação de cinco anos e da presunção ilidível de danos causados pelos cartéis respetivamente previstos no artigo 10.o, n.o 3, e no artigo 17.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, relativa a certas regras que regem as ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados‑Membros e da União Europeia. No entanto, o artigo 101.o TFUE e o princípio da efetividade impõem à regulamentação nacional que rege a ação de indemnização que o prazo de prescrição só comece a correr a partir do dia da publicação do resumo da decisão da Comissão Europeia no Jornal Oficial da União Europeia.

    2)

    O artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104 deve ser interpretado no sentido de que o seu artigo 10.o não é aplicável a uma ação de indemnização como a que está em causa no processo principal que, embora intentada após a entrada em vigor desta diretiva e das disposições nacionais de transposição, tem por objeto factos e sanções anteriores à entrada em vigor dessas disposições.

    3)

    O artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à aplicação de disposições nacionais de transposição, adotadas para dar cumprimento ao artigo 17.o, n.o 1, desta diretiva, relativo à competência dos órgãos jurisdicionais nacionais para calcularem o montante do dano, a danos sofridos por causa de uma infração ao direito da concorrência que terminou antes da entrada em vigor da legislação nacional de transposição no âmbito de uma ação de indemnização intentada após a entrada em vigor da disposição nacional de transposição. O artigo 22.o, n.o 1, dessa diretiva deve ser interpretado no sentido de que se opõe à aplicação de legislações nacionais, adotadas para dar execução ao artigo 17.o, n.o 2, da mesma diretiva, que prevê uma presunção ilidível de dano causado pelos cartéis, às infrações cometidas antes da entrada em vigor da legislação nacional de transposição no âmbito de uma ação de indemnização intentada após a entrada em vigor da disposição nacional de transposição.


    ( 1 ) Língua original: francês.

    ( 2 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, relativa a certas regras que regem as ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados‑Membros e da União Europeia (JO 2014, L 349, p. 1).

    ( 3 ) Acórdão de 28 de março de 2019 (C‑637/17, a seguir «Acórdão Cogeco, EU:C:2019:263).

    ( 4 ) Acórdão de 14 de março de 2019, Skanska Industrial Solutions e o. (C‑724/17, EU:C:2019:204).

    ( 5 ) Regulamento do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [101.o e 102.o TFUE] (JO 2003, L 1, p. 1).

    ( 6 ) BOE n.o 159, de 4 de julho de 2007, p. 28848.

    ( 7 ) Além disso, a sanção da Comissão não é definitiva para uma das empresas, que a contesta no âmbito de um recurso pendente no Tribunal Geral [Scania e o./Comissão (T‑799/17)] interposto em 11 de dezembro de 2017.

    ( 8 ) V. Acórdãos de 14 de abril de 1970, Brock (68/69, EU:C:1970:24, n.o 7), e de 10 de julho de 1986, Licata/CES (270/84, EU:C:1986:304, n.o 31).

    ( 9 ) Acórdãos de 16 de dezembro de 2010, Stichting Natuur en Milieu e o. (C‑266/09, EU:C:2010:779, n.o 32); de 26 de março de 2015, Comissão/Moravia Gas Storage (C‑596/13 P, EU:C:2015:203, n.o 32); e de 15 de janeiro de 2019, E.B. (C‑258/17, EU:C:2019:17, n.o 50).

    ( 10 ) V. Acórdãos de 24 de março de 2011, ISD Polska e o./Comissão (C‑369/09 P, EU:C:2011:175, n.o 98 e jurisprudência aí referida), e de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Freistaat Sachsen (C‑334/07 P, EU:C:2008:709, n.o 44 e jurisprudência aí referida).

    ( 11 ) V. artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2014/104.

    ( 12 ) V. artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2014/104.

    ( 13 ) V. Acórdãos de 24 de março de 2011, ISD Polska e o./Comissão (C‑369/09 P, EU:C:2011:175, n.o 98 e jurisprudência aí referida), e de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Freistaat Sachsen (C‑334/07 P, EU:C:2008:709, n.o 44 e jurisprudência aí referida).

    ( 14 ) Acórdão de 14 de março de 2019 (C‑724/17, EU:C:2019:204).

    ( 15 ) Por outro lado, como referido no n.o 23 das presentes conclusões, a decisão da Comissão no processo dito «Camiões» foi adotada após a entrada em vigor da Diretiva 2014/104 mas antes do prazo da sua transposição, ao passo que a publicação do resumo da decisão da Comissão no Jornal Oficial da União Europeia e da versão não confidencial da decisão da Comissão no sítio Internet da Direção‑Geral da Concorrência da Comissão tiveram lugar após o prazo de transposição da Diretiva 2014/104 mas antes da sua transposição para o direito espanhol pela Lei 15/2007.

    ( 16 ) V. considerando 34 da Diretiva 2014/104.

    ( 17 ) Observo a este respeito que a questão da aplicação ratione temporis do novo regime de prescrição previsto no artigo 10.o da diretiva 2014/104 ilustra perfeitamente essa problemática à luz dos diferentes critérios de transposição seguidos pelos Estados‑Membros.

    ( 18 ) V. Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Cogeco Communications (C‑637/17, EU:C:2019:32, n.o 63).

    ( 19 ) Acórdão de 12 de novembro de 1981, Meridionale Industria Salumi e o. (processos apensos212/80 a 217/80, EU:C:1981:270, n.o 10).

    ( 20 ) V. Acórdão de 14 de fevereiro de 2012, Toshiba Corporation e o. (C‑17/10, EU:C:2012:72, n.os 50, 51 e jurisprudência aí referida).

    ( 21 ) V. considerando 11 da Diretiva 2014/104.

    ( 22 ) V. Acórdão de 20 de setembro de 2001, Courage e Crehan (C‑453/99, EU:C:2001:465, n.o 31).

    ( 23 ) V. considerando 34 da Diretiva 2014/104.

    ( 24 ) V. «Relatório sobre a aplicação da diretiva relativa às ações de indemnização», de 14 de dezembro de 2020.

    ( 25 ) V. considerando 34 da Diretiva 2014/104.

    ( 26 ) V. Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Cogeco Communications (C‑637/17, EU:C:2019:32, n.o 61).

    ( 27 ) Acórdão de 8 de novembro de 2012, Evropaïki Dynamiki/Comissão (C‑469/11 P, EU:C:2012:705, n.os 52 e 53).

    ( 28 ) Thomas, B., e Aubin, F., in Amaro, R. (ed.), Private Enforcement of Competition Law in Europe, 1e edição, Bruxelles, Bruylant, 2021, «Chapter 7 — Limitation period», p. 165.

    ( 29 ) V., por exemplo, critério seguido por França no artigo 12.o, n.o 2, da ordonnance n.o 2017‑303 du 9 mars 2017 relative aux actions en dommages et intérêts du fait des pratiques anticoncurrentielles [Despacho n.o 2017‑303, de 9 de março de 2017, relativo às Ações de Indemnização por Práticas Anticoncorrenciais] (JORF n.o 59, de 10 de março de 2017).

    ( 30 ) V. Acórdãos Cogeco e de 12 de dezembro de 2019, Otis Gesellschaft e o. (C‑435/18, EU:C:2019:1069).

    ( 31 ) V. Acórdão de 5 de junho de 2014, Kone e o. (C‑557/12, EU:C:2014:1317, n.o 22 e jurisprudência aí referida).

    ( 32 ) V. Acórdão de 1 de julho de 2004, Tsapalos e Diamantakis (C‑361/02 e C‑362/02, EU:C:2004:401, n.o 20).

    ( 33 ) V. Acórdão de 14 de março de 2019 (C‑724/17, EU:C:2019:204, n.o 34).

    ( 34 ) V. artigo 15.o, alínea c), do Regulamento (CE) n.o 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de julho de 2007, relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais (Roma II) (JO 2007, L 199, p. 40)], e artigo 12.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.o 593/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I) (JO 2008, L 177, p. 6).

    ( 35 ) V. considerando 11 da Diretiva 2014/104.

    ( 36 ) V. Acórdãos de 20 de setembro de 2001, Courage e Crehan (C‑453/99, EU:C:2001:465, n.o 29); de 5 de junho de 2014, Kone e o. (C‑557/12, EU:C:2014:1317, n.o 24); e Acórdão Cogeco (n.o 42).

    ( 37 ) V., neste sentido, Acórdão de 13 de julho de 2006, Manfredi e o. (C‑295/04 a C‑298/04, EU:C:2006:461, n.o 95).

    ( 38 ) V. Acórdãos Cogeco (n.os 38 a 55), e de 12 de dezembro de 2019, Otis Gesellschaft e o. (C‑435/18, EU:C:2019:1069, n.o 25 e jurisprudência aí referida).

    ( 39 ) V. Acórdão de 14 de junho de 2011, Pfleiderer (C‑360/09, EU:C:2011:389, n.o 29).

    ( 40 ) V. Acórdão Cogeco (n.o 48).

    ( 41 ) V. Acórdão Cogeco (n.o 49).

    ( 42 ) V. Acórdão Cogeco (n.o 51).

    ( 43 ) V. Acórdão Cogeco (n.o 48).

    ( 44 ) V. Acórdão Cogeco (n.o 45).

    ( 45 ) V. Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Cogeco Communications (C‑637/17, EU:C:2019:32, n.o 81).

    ( 46 ) V. Acórdão Cogeco (n.os 44 a 55).

    ( 47 ) V. Acórdão Cogeco (n.o 47).

    ( 48 ) V. Acórdão Cogeco (n.os 48, 49 e 50).

    ( 49 ) Considero, assim, que a análise que se segue é igualmente pertinente para determinar o dies a quo num caso em que o artigo 10.o dessa diretiva seja aplicável.

    ( 50 ) V. considerando 148 da Comunicação da Comissão sobre boas práticas para a instrução de processos de aplicação dos artigos 101.o e 102.o TFUE (JO 2011, C 308, p. 6).

    ( 51 ) V. considerando 149 da Comunicação sobre boas práticas para a instrução de processos de aplicação dos artigos 101.o e 102.o TFUE.

    ( 52 ) V. https://ec.europa.eu/comissão/presscorner/detail/pt/IP_16_2582.

    ( 53 ) A este respeito, há que observar que, em 2011, a Comissão confirmou ter efetuado inspeções de surpresa no âmbito do seu inquérito no setor da construção de camiões (v. Ficha de informação de 18 de janeiro de 2011«Antritrust: Comissão confirms unannounced inspections in the truck sector», disponível unicamente em língua inglesa no sítio Internet https://ec.europa.eu/comissão/presscorner/detail/en/MEMO_11_29). Posteriormente, em 2014, a Comissão confirmou também através de um comunicado de imprensa que tinha enviado uma nota de ilicitude a construtores de camiões suspeitos de terem participado num cartel (v. Comunicado de imprensa de 20 de novembro de 2014«Cartéis: a Comissão envia uma comunicação de acusações a construtores de camiões suspeitos de terem participado num cartel», disponível em inglês, francês e alemão no sítio Internet https://ec.europa.eu/Comissão/presscorner/detail/fr/IP_14_2002). No entanto, estes dois documentos não identificam as empresas objeto do inquérito nem os mercados geográficos, os produtos em causa ou a duração da infração sob inquérito nesse período.

    ( 54 ) Thomas, B., e Aubin, F., in Amaro, R. (ed.), Private Enforcement of Competition Law in Europe, 1a edição, Bruxelas, Bruylant, 2021, «Chapter 7 — Limitation period», pp. 170 a 172.

    ( 55 ) Van Bael & Bellis, Competition Law of the European Union, 6a edição, Kluwer Law International, 2021, «Chapter 11: Private Enforcement», p. 1322.

    ( 56 ) V. Acórdão de 20 de setembro de 2001, Courage e Crehan (C‑453/99, EU:C:2001:465, n.o 26).

    ( 57 ) Observo, a este respeito, que o intervalo de tempo de vários meses que resulta entre a publicação do resumo de uma decisão, após a sua adoção, no Jornal Oficial da União Europeia e a publicação do comunicado de imprensa no dia da adoção dessa decisão é suscetível de criar uma incerteza jurídica que põe em perigo a aplicação efetiva e coerente do direito da concorrência na União, face aos diferentes critérios seguidos pelos Estados‑Membros no que respeita ao dies a quo.

    ( 58 ) V., neste sentido: https://ec.europa.eu/info/legal‑notice_fr.

    ( 59 ) O comunicado de imprensa foi publicado nas línguas alemã, inglesa, francesa, italiana, neerlandesa e sueca.

    ( 60 ) Estão disponíveis ao público uma conexão com a Diretiva 2014/104 e com o sítio Internet da Direção‑Geral da Concorrência da Comissão que contém mais informações sobre as ações de indemnização em processos de cartéis e de abuso de posição dominante, bem como um guia prático sobre a forma de quantificar o dano causado pelas infrações às regras de concorrência.

    ( 61 ) Todavia, há que salientar que, após o carregamento do comunicado de imprensa (25 de julho de 2016) na secção relativa ao processo dito «Camiões» vários dias após a sua publicação (em 25 de julho de 2016), no sítio Internet da Direção‑Geral da Concorrência da Comissão, as denominações sociais das empresas destinatárias da decisão da Comissão já constavam na parte superior da página consagrada ao processo (v. https://ec.europa.eu/competition/elojade/isef/case_details.cfm?proc_code=1_3982). Por conseguinte, não se pode excluir que as pessoas que consultaram o comunicado de imprensa puderam tomar conhecimento da identidade dos destinatários da decisão.

    ( 62 ) V. Acórdão de 14 de dezembro de 2000 (C‑344/98, EU:C:2000:689).

    ( 63 ) V. considerando 11 da Diretiva 2014/104.

    ( 64 ) V. considerando 11 da Diretiva 2014/104.

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