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Document 62018CJ0262
Judgment of the Court (Grand Chamber) of 11 June 2020.#European Commission and Slovak Republic v Dôvera zdravotná poistʼovňa, a.s.#Appeal — State aid — Article 107(1) TFEU — Social security system — Health insurance bodies — Concepts of ‘undertaking’ and ‘economic activity’ — Social objective — Principle of solidarity — State supervision — Overall assessment — Possibility of seeking profits — Residual competition on quality and on health insurance services offered.#Joined Cases C-262/18 P and C-271/18 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 11 de junho de 2020.
Comissão Europeia e República Eslovaca contra Dôvera zdravotná poistʼovňa a.s.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Artigo 107.o, n.o 1, TFUE — Regime de Segurança Social — Organismos de seguros de doença — Conceitos de “empresa” e de “atividade económica” — Finalidade social — Princípio da solidariedade — Controlo do Estado — Apreciação global — Possibilidade de procurar a obtenção de lucros — Concorrência residual quanto à qualidade e à oferta das prestações de seguro de doença.
Processos apensos C-262/18 P e C-271/18 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 11 de junho de 2020.
Comissão Europeia e República Eslovaca contra Dôvera zdravotná poistʼovňa a.s.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Artigo 107.o, n.o 1, TFUE — Regime de Segurança Social — Organismos de seguros de doença — Conceitos de “empresa” e de “atividade económica” — Finalidade social — Princípio da solidariedade — Controlo do Estado — Apreciação global — Possibilidade de procurar a obtenção de lucros — Concorrência residual quanto à qualidade e à oferta das prestações de seguro de doença.
Processos apensos C-262/18 P e C-271/18 P.
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:450
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)
11 de junho de 2020 ( *1 )
«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Artigo 107.o, n.o 1, TFUE — Regime de Segurança Social — Organismos de seguros de doença — Conceitos de “empresa” e de “atividade económica” — Finalidade social — Princípio da solidariedade — Controlo do Estado — Apreciação global — Possibilidade de procurar a obtenção de lucros — Concorrência residual quanto à qualidade e à oferta das prestações de seguro de doença»
Nos processos apensos C‑262/18 P e C‑271/18 P,
que têm por objeto dois recursos de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interpostos em 16 e 19 de abril de 2018,
Comissão Europeia, representada por F. Tomat e P.‑J. Loewenthal, na qualidade de agentes,
recorrente,
apoiada por:
República da Finlândia, representada por S. Hartikainen, na qualidade de agente,
interveniente no presente recurso,
sendo as outras partes no processo:
Dôvera zdravotná poist'ovňa a.s., com sede em Bratislava (Eslováquia), representada por F. Roscam Abbing, A. Pliego Selie e O. W. Brouwer, advocaten,
recorrente em primeira instância,
República Eslovaca, representada por M. Kianička, D. Kaiserová e B. Ricziová, na qualidade de agentes,
Union zdravotná poist'ovňa a.s., com sede em Bratislava, representada por A. M. ter Haar, A. Kleinhout e J. K. de Pree, advocaten,
intervenientes em primeira instância (C‑262/18 P),
e
República Eslovaca, representada por M. Kianička, D. Kaiserová e B. Ricziová, na qualidade de agentes,
recorrente,
apoiada por:
República da Finlândia, representada por S. Hartikainen, na qualidade de agente,
interveniente no presente recurso,
sendo as outras partes no processo:
Dôvera zdravotná poist'ovňa a.s., representada por F. Roscam Abbing, A. Pliego Selie e O. W. Brouwer, advocaten,
recorrente em primeira instância,
Comissão Europeia, representada por F. Tomat e P.‑J. Loewenthal, na qualidade de agentes,
recorrida em primeira instância,
Union zdravotná poist'ovňa a.s., representada por A. M. ter Haar, A. Kleinhout e J. K. de Pree, advocaten,
interveniente em primeira instância (C‑271/18 P),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),
composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, J.‑C. Bonichot, M. Vilaras, E. Regan, S. Rodin, L. S. Rossi e I. Jarukaitis, presidentes de secção, E. Juhász, M. Ilešič, J. Malenovský, T. von Danwitz (relator), D. Šváby, F. Biltgen e A. Kumin, juízes,
advogado‑geral: P. Pikamäe,
secretário: M. Longar, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 1 de outubro de 2019,
ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 19 de dezembro de 2019,
profere o presente
Acórdão
1 |
Com os seus recursos, a Comissão Europeia e a República Eslovaca pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 5 de fevereiro de 2018, Dôvera zdravotná poist'ovňa/Comissão (T‑216/15, não publicado, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2018:64), pelo qual este anulou a Decisão (UE) 2015/248 da Comissão, de 15 de outubro de 2014, relativa às medidas SA.23008 (2013/C) (ex 2013/NN) aplicadas pela República Eslovaca a favor da Spoločná zdravotná poisťovňa, a.s (SZP) e da Všeobecná zdravotná poisťovňa, a.s (VšZP) (JO 2015, L 41, p. 25; seguir «decisão controvertida»). |
Antecedentes do litígio e decisão controvertida
2 |
Em 1994, o regime eslovaco de seguro de doença passou de um sistema unitário, com um único organismo público de seguro de doença, para um modelo misto, no qual podem coexistir organismos públicos e privados. Em conformidade com uma legislação eslovaca entrada em vigor em 1 de janeiro de 2005, esses organismos, quer sejam públicos ou privados, devem revestir a forma jurídica de sociedade anónima de direito privado com fins lucrativos. |
3 |
No período compreendido entre 1 de janeiro de 2005 e a adoção da decisão controvertida, os residentes eslovacos podiam escolher entre os seguintes organismos de seguro de doença:
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4 |
Na sequência de uma denúncia apresentada pela Dôvera em 2 de abril de 2007 a respeito de auxílios de Estado alegadamente concedidos pela República Eslovaca à SZP e à VšZP, em 2 de julho de 2013 a Comissão iniciou o procedimento formal de investigação. |
5 |
Na decisão controvertida, a Comissão constatou que a SZP e a VšZP não eram empresas na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, uma vez que a atividade que exerciam não tinha natureza económica, de modo que as medidas denunciadas não constituíam auxílios de Estado. |
Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido
6 |
Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de abril de 2015, a Dôvera interpôs um recurso de anulação da decisão controvertida, no âmbito do qual invocou dois fundamentos. O primeiro fundamento era relativo à interpretação errada dos conceitos de «empresa», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, e de «atividade económica», e o segundo era relativo à aplicação errada destes conceitos à SZP e à VšZP e à violação do dever de fundamentação. |
7 |
O Tribunal Geral julgou procedente o segundo fundamento de recurso e anulou a decisão controvertida sem examinar o primeiro fundamento. |
8 |
Depois de recordar, nos n.os 46 a 53 do acórdão recorrido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa aos conceitos de «empresa» e de «atividade económica», nomeadamente a resultante de acórdãos proferidos no domínio da segurança social, o Tribunal Geral examinou, nos n.os 55 a 58 do referido acórdão, a procedência da apreciação da Comissão segundo a qual o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco se caracteriza por elementos sociais, de solidariedade e regulamentares importantes. |
9 |
No que diz respeito aos elementos sociais e de solidariedade desse regime, nos n.os 55 e 56 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral salientou, antes de mais, que na Eslováquia o seguro de doença é obrigatório e que os organismos de seguros estão obrigados a inscrever qualquer residente eslovaco que o solicite, sem poderem recusar segurar uma pessoa em razão da idade, do estado de saúde ou do risco de doença. Em seguida, constatou que o regime assenta num sistema de contribuições obrigatórias cujos montantes são fixados por lei e são proporcionais aos rendimentos dos segurados, independentemente das prestações recebidas ou do risco resultante, nomeadamente, da idade ou do estado de saúde do segurado. Salientou também que todos os segurados têm direito ao mesmo nível mínimo de prestações. Por último, o Tribunal Geral observou que existe um dispositivo de perequação dos riscos, através do qual os organismos que seguram pessoas com um risco elevado recebem fundos dos organismos cuja carteira é composta por pessoas com riscos menores. |
10 |
No que respeita ao controlo estatal do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco, no n.o 57 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que os organismos de seguros estão sujeitos a uma regulamentação especial, nos termos da qual cada um deles é constituído com o objetivo de prestar serviços de seguro de doença público e não pode exercer atividades diferentes das previstas na lei. Salientou igualmente que as atividades desses organismos são objeto de fiscalização por parte de uma autoridade reguladora que assegura o cumprimento do quadro legislativo pertinente e que intervém em caso de infração. |
11 |
No n.o 58 do acórdão recorrido, a título de conclusão provisória, o Tribunal Geral julgou procedente a apreciação da Comissão segundo a qual, em substância, o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco apresenta elementos sociais, de solidariedade e regulamentares importantes. |
12 |
No entanto, no n.o 59 do referido acórdão, o Tribunal Geral salientou que a regulamentação relativa a esse regime permite aos organismos de seguros de doença, por um lado, realizar, utilizar e distribuir lucros e, por outro, fazer uma certa concorrência entre si quanto à qualidade e à oferta de serviços. |
13 |
Seguidamente, nos n.o os 63 a 69 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral examinou as consequências daí resultantes no que respeita à qualificação da natureza económica ou não da atividade desses organismos de seguros de doença. Estes últimos números têm a seguinte redação:
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14 |
No termo desta análise, o Tribunal Geral concluiu que, contrariamente ao afirmado pela Comissão, a atividade da SZP e da VšZP apresentava caráter económico, pelo que esses organismos de seguros deviam ser qualificados de empresas, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. |
Processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes nos recursos
15 |
Por Decisões do presidente do Tribunal de Justiça de 10 de setembro de 2018, foi admitida a intervenção da República da Finlândia em apoio dos pedidos da Comissão no processo C‑262/18 P e da República Eslovaca no processo C‑271/18 P. |
16 |
Nos recursos principais, a Comissão e a República Eslovaca, apoiadas pela República da Finlândia, pedem ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido e, caso decida definitivamente o litígio, negue provimento ao recurso inicial. Nesse caso, a Comissão e a República Eslovaca pedem ao Tribunal de Justiça que condene Dôvera e a Union nas despesas. |
17 |
Por seu turno, a Dôvera e a Union pedem ao Tribunal de Justiça que negue provimento ao recurso e condene a Comissão nas despesas relativas ao processo C‑262/18 P e a República Eslovaca nas despesas relativas ao processo C‑271/18 P. A Dôvera pede igualmente ao Tribunal de Justiça que condene nas despesas as intervenientes que apoiam a Comissão no processo C‑262/18 P. |
18 |
No âmbito dos recursos subordinados nos processos C‑262/18 P e C‑271/18 P, a Dôvera pede ao Tribunal de Justiça que anule o n.o 58 do acórdão recorrido na medida em que declara que a Dôvera não contestou a afirmação da Comissão segundo a qual o regime de seguro de doença eslovaco apresentava «aspetos sociais, de solidariedade e regulamentares importantes». |
19 |
Por seu turno, a Comissão e a República Eslovaca pedem que os recursos subordinados sejam julgados inadmissíveis e a condenação da Dôvera nas despesas. A título subsidiário, a Comissão pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido e remeta o processo ao Tribunal Geral ou que decida definitivamente o litígio, e condene a Dôvera e a Union nas despesas. |
20 |
Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 19 de novembro de 2018, os processos C‑262/18 P e C‑271/18 P foram apensados para efeitos da fase oral e do acórdão. |
21 |
No processo C‑271/18 P, o Governo eslovaco, nos termos do artigo 16.o, terceiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, pediu ao Tribunal de Justiça que reunisse em Grande Secção. |
Quanto aos recursos principais
Argumentos das partes
22 |
A Comissão e a República Eslovaca invocam, respetivamente, três fundamentos de recurso comuns, relativos, em substância, o primeiro, à violação do dever de fundamentação; o segundo, à interpretação errada dos conceitos de «empresa», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, e de «atividade económica»; e, o terceiro, à desvirtuação de elementos de prova. A República Eslovaca invoca igualmente um quarto fundamento relativo à inobservância, pelo Tribunal Geral, dos limites da sua fiscalização jurisdicional. |
23 |
Com o segundo fundamento invocado pela Comissão no processo C‑262/18 P e o terceiro fundamento invocado pela República Eslovaca no processo C‑271/18 P, estas partes, apoiadas pela República da Finlândia, visam pôr em causa a conclusão do Tribunal Geral segundo a qual a atividade da SZP e da VšZP era de natureza económica, pelo que esses organismos de seguros deviam ser qualificados de empresas, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. |
24 |
Em substância, sustentam que o Tribunal Geral se baseou numa interpretação errada dos conceitos de «empresa», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, e de «atividade económica». A qualificação de um regime de seguro de doença que contém não só elementos sociais, de solidariedade e regulamentares mas também elementos económicos depende de uma apreciação global que tenha em conta, nomeadamente, os objetivos prosseguidos por esse regime e a importância respetiva dos seus diferentes elementos. No caso em apreço, verifica‑se que o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco prossegue uma finalidade social, aplica o princípio da solidariedade e está sujeito a controlo estatal. Tendo em conta estes elementos, o Tribunal Geral concluiu erradamente que a atividade dos organismos de seguros no âmbito desse regime era de natureza económica baseando‑se apenas nas considerações relativas, por um lado, à possibilidade de esses organismos entrarem, em certa medida, em concorrência no que se refere à relação qualidade‑preço das suas prestações e, por outro, ao facto de prosseguirem fins lucrativos. Além disso, a existência de regulamentação estrita das possibilidades de procurar, utilizar e distribuir lucros é um elemento pertinente que o Tribunal Geral deveria ter tido em conta no âmbito dessa apreciação. |
25 |
A Dôvera e a Union contestam estes argumentos. A mera circunstância de o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco prosseguir um objetivo social não justifica a conclusão de que a atividade dos organismos de seguros nesse regime não é de natureza económica. O caráter económico da sua atividade resulta do facto de concorrerem entre si no que respeita à relação qualidade‑preço das suas prestações e de exercerem essa atividade com fins lucrativos. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
26 |
Em conformidade com o artigo 107.o, n.o 1, TFUE, são auxílios de Estado, na aceção da referida disposição, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções. |
27 |
Daqui resulta, nomeadamente, que a proibição enunciada no artigo 107.o, n.o 1, TFUE visa unicamente as atividades das empresas (v., neste sentido, Acórdão de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 39 e jurisprudência referida). |
28 |
Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que, no contexto do direito da concorrência da União, o conceito de «empresa» abrange qualquer entidade que exerça uma atividade económica, independentemente do estatuto jurídico dessa entidade e do seu modo de financiamento (Acórdãos de 23 de abril de 1991, Höfner e Elser, C‑41/90, EU:C:1991:161, n.o 21, e de 3 de março de 2011, AG2R Prévoyance, C‑437/09, EU:C:2011:112, n.o 41 e jurisprudência referida). |
29 |
Por conseguinte, a qualificação de empresa ou não de uma entidade depende da natureza da sua atividade. Em conformidade com jurisprudência igualmente constante do Tribunal de Justiça, constitui uma atividade económica qualquer atividade que consiste em oferecer bens ou serviços num dado mercado (Acórdãos de 16 de junho de 1987, Comissão/Itália, 118/85, EU:C:1987:283, n.o 7, e de 3 de março de 2011, AG2R Prévoyance, C‑437/09, EU:C:2011:112, n.o 42 e jurisprudência referida). |
30 |
No que respeita, especialmente, ao domínio da segurança social, o Tribunal de Justiça declarou que o direito da União não prejudica, em princípio, a competência dos Estados‑Membros para organizarem os seus sistemas de segurança social. Para avaliar se uma atividade exercida no âmbito de um regime de segurança social é desprovida de caráter económico, procede a uma apreciação global do regime em causa e toma, para esse efeito, em consideração os elementos seguintes, a saber, a prossecução, pelo regime, de um objetivo social, a aplicação, por este, do princípio da solidariedade, a ausência de quaisquer fins lucrativos da atividade exercida e o respetivo controlo pelo Estado (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de fevereiro de 1993, Poucet e Pistre, C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63, n.os 8 a 10, 14, 15 e 18; de 22 de janeiro de 2002, Cisal, C‑218/00, EU:C:2002:36, n.os 34, 38 e 43; de 16 de março de 2004, AOK Bundesverband e o., C‑264/01, C‑306/01, C‑354/01 e C‑355/01, EU:C:2004:150, n.os 47 a 50; de 5 de março de 2009, Kattner Stahlbau, C‑350/07, EU:C:2009:127, n.os 35, 38 e 43; e de 3 de março de 2011, AG2R Prévoyance, C‑437/09, EU:C:2011:112, n.os 43 a 46). |
31 |
No âmbito desta apreciação global, há que examinar, especialmente, se e em que medida se pode considerar que o regime em causa aplica o princípio da solidariedade e se a atividade dos organismos de seguros que gerem esse regime está sujeita ao controlo do Estado (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de fevereiro de 1993, Poucet e Pistre, C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63, n.os 8 e 14; de 22 de janeiro de 2002, Cisal, C‑218/00, EU:C:2002:36, n.os 38 e 43; e de 5 de março de 2009, Kattner Stahlbau, C‑350/07, EU:C:2009:127, n.o 43). |
32 |
Os regimes de segurança social que aplicam o princípio da solidariedade caracterizam‑se, nomeadamente, pelo caráter obrigatório da inscrição tanto para os segurados como para os organismos de seguros, por contribuições fixadas por lei proporcionais aos rendimentos dos segurados e não ao risco que representam individualmente devido à sua idade ou estado de saúde, pela regra em virtude da qual as prestações obrigatórias fixadas por lei são idênticas para todos os segurados, independentemente do montante das contribuições pagas por cada um deles, e por um mecanismo de perequação dos custos e dos riscos segundo o qual os regimes excedentários participam no financiamento dos regimes com dificuldades financeiras estruturais (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de fevereiro de 1993, Poucet e Pistre, C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63, n.os 7 a 12, 15 e 18; de 22 de janeiro de 2002, Cisal, C‑218/00, EU:C:2002:36, n.os 39, 40 e 42; e de 16 de março de 2004, AOK Bundesverband e o., C‑264/01, C‑306/01, C‑354/01 e C‑355/01, EU:C:2004:150, n.os 47, 48, 52 e 53). |
33 |
Neste contexto, o Tribunal de Justiça precisou que o facto de um Estado‑Membro não confiar a gestão de um regime de segurança social a um único organismo de seguros, mas a vários organismos, não pode pôr em causa o princípio da solidariedade subjacente a esse regime por maioria de razão, quando, no referido regime, os organismos em causa efetuam entre si uma perequação dos custos e dos riscos (v., neste sentido, Acórdão de 5 de março de 2009, Kattner Stahlbau, C‑350/07, EU:C:2009:127, n.os 49, 50 e 53). |
34 |
O Tribunal de Justiça declarou igualmente que a introdução, num regime que apresente as características recordadas no n.o 32 do presente acórdão, de um elemento de concorrência, uma vez que visa incentivar os operadores a exercer a respetiva atividade segundo os princípios da boa gestão, ou seja, da forma mais eficaz e menos onerosa possível, no interesse do bom funcionamento do sistema de segurança social, não altera a natureza desse regime (v., neste sentido, Acórdão de 16 de março de 2004, AOK Bundesverband e o., C‑264/01, C‑306/01, C‑354/01 e C‑355/01, EU:C:2004:150, n.o 56). |
35 |
Pelo contrário, numa jurisprudência igualmente constante, o Tribunal de Justiça declarou que os organismos que gerem um regime de seguro que assenta num sistema de inscrição facultativa, que funciona segundo um princípio de capitalização em virtude do qual existe um nexo direto entre as contribuições pagas pelo segurado e o seu rendimento financeiro, por um lado, e os serviços prestados a esse segurado, por outro, e que incluem elementos de solidariedade extremamente limitados, não aplicam o princípio da solidariedade e, consequentemente, exercem uma atividade económica (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de novembro de 1995, Fédération française des sociétés d’assurance e o., C‑244/94, EU:C:1995:392, n.os 17, 19 e 22, e de 21 de setembro de 1999, Albany, C‑67/96, EU:C:1999:430, n.os 79, 81, 82 e 85). |
36 |
É à luz da jurisprudência recordada nos n.os 28 a 35 do presente acórdão que há que analisar se as considerações desenvolvidas pelo Tribunal Geral nos n.os 63 a 69 do acórdão recorrido enfermam de erros de direito. |
37 |
A este respeito, resulta dos n.os 8 a 13 do presente acórdão que, no âmbito da sua apreciação global do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco, o Tribunal Geral, depois de ter aprovado a conclusão da Comissão segundo a qual esse regime apresenta elementos sociais, de solidariedade e regulamentares importantes que correspondem às características de um regime que prossegue um objetivo social e aplica o princípio da solidariedade sob o controlo do Estado, considerou, no entanto, que essa conclusão era infirmada pelo facto de, nesse mesmo regime, os organismos de seguros, por um lado, terem a possibilidade de procurar obter lucros e, por outro, se envolverem numa certa concorrência entre si, tanto no que diz respeito à qualidade e ao âmbito da sua oferta como ao seu fornecimento. |
38 |
Ora, ao fazê‑lo, o Tribunal Geral atribuiu a estes últimos elementos uma importância indevida à luz da jurisprudência recordada nos n.os 28 a 35 do presente acórdão e não teve suficientemente em conta a sua relação com os elementos sociais, de solidariedade e regulamentares do regime em causa. |
39 |
Com efeito, no que respeita, em primeiro lugar, à possibilidade de os organismos de seguros que gerem o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco procurarem obter lucros, há que salientar que o facto de esses organismos terem sido obrigados, por força de uma legislação eslovaca que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2005, a recorrer ao estatuto de sociedade anónima de direito privado com fins lucrativos não permite qualificá‑los de «empresas», à luz do direito da concorrência da União. Com efeito, segundo a jurisprudência recordada no n.o 28 do presente acórdão, tal qualificação não depende do estatuto jurídico da entidade em causa, mas do conjunto dos fatores que caracterizam a respetiva atividade. |
40 |
Além disso, e como resulta do n.o 64 do acórdão recorrido, embora os lucros eventualmente obtidos por esses organismos possam ser utilizados e distribuídos, devem sê‑lo no cumprimento das exigências destinadas a assegurar a perenidade do regime e a realização dos objetivos sociais e de solidariedade que lhe estão subjacentes. Parece assim que a possibilidade de realizar lucros é estritamente delimitada pela lei e não pode ser considerada, contrariamente às considerações do Tribunal Geral desenvolvidas nos n.os 63 e 64 do acórdão recorrido, um elemento suscetível de infirmar o caráter social e solidário que decorre da própria natureza das atividades em causa. |
41 |
Em segundo lugar, foi também erradamente que, nos n.os 65 a 67 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que os diferentes elementos que introduzem uma certa concorrência no regime de seguro de doença obrigatório eslovaco eram suscetíveis de pôr em causa o caráter social e solidário de tal regime. |
42 |
Com efeito, além do facto de, como o próprio Tribunal Geral afirmou no n.o 66 do acórdão recorrido, essa concorrência não poder ter por objeto as prestações legais obrigatórias nem o montante das contribuições, há que salientar, primeiro, que, embora os organismos de seguro de doença eslovacos possam completar essas prestações legais obrigatórias mediante prestações complementares, estas últimas correspondem a prestações conexas gratuitas, tais como uma melhor cobertura de certos tipos de tratamentos complementares e preventivos no âmbito das prestações obrigatórias ou um serviço de assistência reforçado para os segurados, que lhes permitem distinguir‑se, de forma residual e acessória, quanto à extensão da oferta e à sua qualidade. |
43 |
Ora, segundo a jurisprudência recordada no n.o 34 do presente acórdão, a introdução, num regime com as características mencionadas no n.o 32 deste acórdão, de um elemento de concorrência que visa incentivar os operadores a exercer a respetiva atividade segundo os princípios da boa gestão, ou seja, da forma mais eficaz e menos onerosa possível, no interesse do bom funcionamento do sistema de segurança social, não altera a natureza desse regime. |
44 |
De resto, é pacífico que essas prestações complementares são fornecidas a título gratuito, pelo que a possibilidade de as oferecer no âmbito do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco não pode, de modo nenhum, pôr em causa a natureza social e solidária desse regime. |
45 |
Em seguida, no que respeita à liberdade de os segurados escolherem o seu organismo de seguro de doença e de mudarem de prestador uma vez por ano, embora essa liberdade afete a concorrência entre esses organismos de seguros, é, todavia, no interesse de um bom funcionamento do regime de seguro de doença eslovaco e deve ser apreciada à luz da obrigação que impende sobre qualquer residente eslovaco de se inscrever num dos organismos que participam na gestão desse regime, bem como da obrigação de esses organismos aceitarem a inscrição de qualquer pessoa que o solicite, independentemente da sua idade e do seu estado de saúde. Ora, tais obrigações figuram entre as características fundamentais do princípio da solidariedade, como resulta da jurisprudência recordada no n.o 32 do presente acórdão. |
46 |
Cabe acrescentar que a concorrência introduzida no regime de seguro de doença obrigatório eslovaco mediante os elementos referidos nos n.os 42 a 45 do presente acórdão está estreitamente ligada ao facto de a gestão desse regime não ter sido confiada a um único organismo de seguros, mas a vários organismos. Ora, na medida em que o referido regime inclui um mecanismo de perequação dos custos e dos riscos, a apreciação feita pelo Tribunal Geral nos n.os 65 a 67 do acórdão recorrido, segundo a qual essa concorrência era suscetível de pôr em causa o princípio da solidariedade subjacente a esse mesmo regime, é igualmente contrária à jurisprudência recordada no n.o 33 do presente acórdão. |
47 |
Por conseguinte, contrariamente ao afirmado pelo Tribunal Geral nos n.os 65 a 67 do acórdão recorrido, a existência de uma certa concorrência quanto à qualidade e à extensão da oferta no regime de seguro de doença obrigatório eslovaco, como resulta dos elementos referidos nos n.os 42 a 46 do presente acórdão, não pode pôr em causa a própria natureza da atividade exercida por esses organismos de seguros no âmbito do referido regime. |
48 |
Por último, no que respeita à circunstância, igualmente salientada no n.o 66 do acórdão recorrido, de os organismos que gerem o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco concorrerem entre si ao nível do seu fornecimento, esta circunstância não pode, como salientou o advogado‑geral no n.o 119 das suas conclusões, ser considerada um elemento pertinente para apreciar a natureza da sua atividade que consiste em prestar serviços de seguro de doença obrigatório na Eslováquia. Com efeito, para apreciar a natureza da atividade de uma entidade, não se deve dissociar a atividade de aquisição de bens ou serviços da sua posterior utilização, uma vez que é o caráter económico ou não da posterior utilização que determina a natureza da atividade da entidade em causa (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2006, FENIN/Comissão, C‑205/03 P, EU:C:2006:453, n.o 26). |
49 |
Em terceiro lugar, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou no n.o 69 do acórdão recorrido, o seu raciocínio não encontra fundamento na jurisprudência decorrente dos Acórdãos de 10 de janeiro de 2006, Cassa di Risparmio di Firenze e o. (C‑222/04, EU:C:2006:8, n.os 122 e 123), e de 1 de julho de 2008, MOTOE (C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 27). Com efeito, destes dois acórdãos resulta que, quando a atividade de um operador consiste na oferta de serviços de caráter económico — a saber, no processo que deu origem ao primeiro desses acórdãos, dos serviços ligados a operações financeiras, comerciais, imobiliárias e mobiliárias, e, no processo que deu origem ao segundo desses acórdãos, dos serviços ligados à organização de competições desportivas baseadas em contratos de patrocínio, de publicidade e de seguro destinados à exploração comercial dessas competições — num ambiente de mercado em concorrência com outros operadores que prosseguem fins lucrativos, o facto de essa oferta de serviços ser feita pelo operador sem fins lucrativos não põe em causa a qualificação económica da atividade em questão. |
50 |
Assim, não se pode inferir da referida jurisprudência que um organismo que participa na gestão de um regime que prossegue um objetivo social e aplica o princípio da solidariedade sob o controlo do Estado pode ser qualificado de empresa pelo facto, sublinhado pelo Tribunal Geral no n.o 69 do acórdão recorrido, de outros organismos ativos no âmbito do mesmo regime prosseguirem efetivamente fins lucrativos. |
51 |
Em face do exposto, há que concluir que as considerações do Tribunal Geral desenvolvidas nos n.os 63 a 69 do acórdão recorrido enfermam de erros de direito, que o levaram erradamente a declarar que, embora o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco prossiga um objetivo social e aplique o princípio da solidariedade sob o controlo do Estado, a atividade dos organismos que o gerem tem natureza económica. |
52 |
Por conseguinte, há que julgar procedente o segundo fundamento no processo C‑262/18 P e o terceiro fundamento no processo C‑271/18 P e, portanto, anular o acórdão recorrido, sem que seja necessário examinar os outros fundamentos invocados nos recursos principais. |
Quanto aos recursos subordinados
53 |
Com os seus recursos subordinados, a Dôvera pede ao Tribunal de Justiça que «anule» o n.o 58 do acórdão recorrido no caso de se pretender basear nas considerações do Tribunal Geral que figuram no referido número, tal como consta da versão do acórdão recorrido na língua do processo, a saber, a versão em língua inglesa. |
54 |
A este respeito, basta recordar que, em conformidade com o artigo 169.o, n.o 1, e o artigo 178.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, os pedidos do recurso principal ou subordinado só podem ter por objeto a anulação, total ou parcial, da decisão do Tribunal Geral. Ora, com os seus recursos subordinados, a Dôvera apenas pede uma substituição de fundamentos, sem que essa substituição possa conduzir à anulação, ainda que parcial, do dispositivo do acórdão recorrido. Consequentemente, os referidos recursos devem ser julgados inadmissíveis. |
Quanto ao recurso no Tribunal Geral
55 |
Em conformidade com o artigo 61.o, primeiro parágrafo, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando este anula a decisão do Tribunal Geral, pode decidir definitivamente o litígio se este estiver em condições de ser julgado. |
56 |
No caso em apreço, o Tribunal de Justiça considera que o recurso de anulação da Dôvera no processo T‑216/15 está em condições de ser julgado e que há que decidir definitivamente o mesmo. |
57 |
Com o seu recurso, a Dôvera pretende pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual a SZP e a VšZP não exerciam uma atividade económica e, portanto, não podiam ser consideradas empresas na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. |
58 |
Para avaliar se a atividade exercida no âmbito do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco não tem caráter económico, há que proceder a uma apreciação global desse regime, tomando em consideração os elementos referidos no n.o 30 do presente acórdão. A este respeito, como recordado no n.o 31, cabe verificar, especialmente, se e em que medida se pode considerar que o referido regime aplica o princípio da solidariedade sob o controlo do Estado. |
59 |
A este respeito, resulta dos n.os 9 a 11 do presente acórdão que o regime de seguro obrigatório eslovaco, que prossegue uma finalidade social que consiste em assegurar a cobertura do risco de doença de todos os residentes eslovacos, apresenta todas as características do princípio da solidariedade referidas na jurisprudência constante do Tribunal de Justiça recordada no n.o 32 do presente acórdão. Com efeito, a inscrição no referido regime é obrigatória para todos os residentes eslovacos, o montante das contribuições é fixado por lei e proporcional aos rendimentos dos segurados e não do risco que representam devido à sua idade ou ao seu estado de saúde, e todos os segurados têm direito ao mesmo nível de prestações fixadas por lei, de modo que não existe nenhuma relação direta entre o montante das contribuições pagas pelo segurado e as prestações que lhes são fornecidas. Além disso, uma vez que os organismos de seguros estão obrigados a assegurar a cobertura do risco de doença de qualquer residente eslovaco que o solicite, independentemente das contingências decorrentes da sua idade ou do seu estado de saúde, o referido regime prevê igualmente um mecanismo de perequação dos custos e dos riscos. |
60 |
O mesmo regime está igualmente sujeito ao controlo do Estado. Com efeito, a atividade dos organismos de seguros no âmbito de tal regime está sujeita ao controlo de uma autoridade reguladora que assegura que os referidos organismos cumprem o quadro legislativo pertinente e que intervém em caso de infração. |
61 |
A presença de elementos de concorrência no âmbito do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco reveste, em relação aos elementos sociais, de solidariedade e regulamentares do mesmo, um papel secundário que, como exposto nos n.os 41 a 50 do presente acórdão, não é suscetível de alterar a natureza do referido regime. Com efeito, a possibilidade de os organismos de seguros concorrerem entre si não pode ter por objeto o montante das contribuições nem as prestações legais obrigatórias, pelo que esses organismos apenas se podem diferenciar, de modo residual e acessório relativamente a estas últimas prestações, quanto à extensão e à qualidade da oferta. |
62 |
Além disso, e sobretudo, resulta do considerando 94 da decisão controvertida que a possibilidade de os organismos de seguros procurarem, utilizarem e distribuírem lucros é estritamente delimitada pela lei, uma vez que o objetivo destas obrigações legais é preservar a viabilidade e a continuidade do seguro de doença obrigatório. Pela mesma ordem de ideias, a exigência de que os organismos de seguros ativos no regime de seguro de doença obrigatório eslovaco devem assumir a forma jurídica de sociedade anónima de direito privado com fins lucrativos e a abertura desse regime a organismos de seguros controlados por entidades privadas visam, segundo as conclusões que figuram no considerando 13 dessa decisão, contribuir para aumentar a eficiência na utilização dos recursos disponíveis e melhorar a qualidade dos cuidados de saúde. Afigura‑se, assim, que estes elementos, tal como a liberdade de os residentes eslovacos escolherem o seu organismo de seguro de doença e mudarem de prestador uma vez por ano, foram introduzidos no interesse do bom funcionamento do referido regime e, por conseguinte, não podem pôr em causa a natureza não económica do mesmo. |
63 |
Por conseguinte, a Comissão podia legitimamente concluir, na decisão controvertida, que o regime de seguro de doença obrigatório eslovaco prossegue um objetivo social e aplica o princípio da solidariedade sob o controlo do Estado, sem que os elementos identificados nos dois números anteriores sejam suscetíveis de infirmar esta conclusão. |
64 |
Assim, foi com razão que a Comissão considerou que a atividade da SZP e da VšZP no âmbito desse regime não tinha natureza económica e que, consequentemente, os referidos organismos não podiam ser qualificados de empresas na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. |
65 |
Em face do exposto, há que julgar improcedentes o primeiro e o segundo fundamentos do recurso em primeira instância, uma vez que, com estes, a Dôvera sustenta que a Comissão cometeu erros na interpretação e aplicação dos conceitos de «empresa» e de «atividade económica». |
66 |
Quanto ao restante, no âmbito do segundo fundamento, a Dôvera alega que a Comissão não fundamentou suficientemente a sua conclusão segundo a qual o mecanismo de perequação dos custos e dos riscos constituía um elemento significativo a favor do caráter não económico do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco. |
67 |
A este respeito, cabe recordar que, segundo jurisprudência constante, a questão de saber se a fundamentação de uma decisão cumpre os requisitos estabelecidos no artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não apenas da sua redação mas também do seu contexto. Em especial, um ato lesivo está suficientemente fundamentado quando tenha ocorrido num contexto conhecido dos interessados (Acórdão de 14 de abril de 2015, Conselho/Comissão, C‑409/13, EU:C:2015:217, n.o 79). |
68 |
No caso em apreço, há que salientar que, nos considerandos 25 e 87 da decisão controvertida, a Comissão considerou, em substância, que o mecanismo de perequação em causa garantia a partilha dos riscos de seguro, o que reforçava o caráter solidário do regime de seguro de doença obrigatório eslovaco. Nessas circunstâncias, e uma vez que a Dôvera, na sua qualidade de organismo de seguro sujeito a esse mecanismo, tinha necessariamente conhecimento do seu funcionamento, a fundamentação que figura nessa decisão forneceu‑lhe indicações suficientes para poder contestar a justeza da referida conclusão da Comissão. |
69 |
Por conseguinte, a alegação relativa à violação do dever de fundamentação deve ser julgada improcedente. |
70 |
Uma vez que nenhum dos fundamentos de recurso no processo T‑216/15 foi julgado procedente, há que negar‑lhe provimento. |
Quanto às despesas
71 |
Nos termos do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado improcedente, ou for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. |
72 |
Segundo o artigo 138.o, n.o 1, do referido Regulamento de Processo, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, desse mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. |
73 |
No caso em apreço, tendo a Dôvera sido vencida e tendo a Comissão pedido a sua condenação nas despesas, há que condená‑la nas despesas da Comissão relativas aos presentes recursos e ao processo no Tribunal Geral. Por outro lado, tendo a República Eslovaca pedido a condenação da Dôvera nas despesas, há que condená‑la nas despesas da República Eslovaca relativas aos presentes recursos. |
74 |
Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. A República da Finlândia, interveniente nos presentes recursos, deve suportar as suas próprias despesas relativas a esses processos. Por outro lado, enquanto interveniente no âmbito do recurso no Tribunal Geral, a República Eslovaca deve suportar as suas despesas relativas a esse processo. |
75 |
Por último, nos termos do artigo 184.o, n.o 4, do Regulamento de Processo, um interveniente em primeira instância, quando não tenha ele próprio interposto o recurso da decisão do Tribunal Geral, só pode ser condenado nas despesas do processo de recurso se tiver participado na fase escrita ou oral do processo no Tribunal de Justiça. Quando participe no processo, o Tribunal de Justiça pode decidir que essa parte suporte as suas próprias despesas. Nos termos do artigo 140.o, n.o 3, do referido Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça pode decidir que um interveniente diferente dos mencionados nos números anteriores suporte as suas próprias despesas. Tendo em conta estas disposições, há que decidir que a Union suporta as suas próprias despesas efetuadas no âmbito dos presentes recursos e do processo no Tribunal Geral. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: inglês.