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Document 62017CO0036

    Despacho do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 5 de abril de 2017.
    Daher Muse Ahmed contra Bundesrepublik Deutschland.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Minden.
    Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro — Pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro beneficiário do estatuto conferido pela proteção subsidiária — Aplicabilidade do procedimento de retomada a cargo.
    Processo C-36/17.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:273

    DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

    5 de abril de 2017 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro — Pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro beneficiário do estatuto conferido pela proteção subsidiária — Aplicabilidade do procedimento de retomada a cargo»

    No processo C‑36/17,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Verwaltungsgericht Minden (Tribunal Administrativo de Minden, Alemanha), por decisão de 19 de janeiro de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 25 de janeiro de 2017, no processo

    Daher Muse Ahmed

    contra

    Bundesrepublik Deutschland,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

    composto por: L. Bay Larsen (relator), presidente de secção, M. Vilaras, J. Malenovský, M. Safjan e D. Šváby, juízes,

    advogado‑geral: E. Sharpston,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de decidir por despacho fundamentado, nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

    profere o presente

    Despacho

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 17.o, n.o 1, e dos artigos 20.o a 33.o do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre Daher Muse Ahmed e a Bundesrepublik Deutschland (República Federal da Alemanha), representada pelo Bundesamt für Migration und Flüchtlinge (Serviço Federal das Migrações e Refugiados, Alemanha, a seguir «Serviço Federal»), a respeito da decisão deste último que indeferiu o seu pedido de asilo, constatou a inexistência de impedimentos do seu afastamento para Itália, o advertiu de que pode ser afastado para esse Estado‑Membro se não abandonar a Alemanha e lhe aplicou uma proibição de entrada e permanência com uma duração de 30 meses a contar do dia de afastamento.

    Quadro jurídico

    Regulamento n.o 604/2013

    3

    Os considerandos 4 e 5 do Regulamento n.o 604/2013 enunciam:

    «(4)

    As conclusões do Conselho de Tampere precisaram […] que [o sistema europeu comum de asilo] deverá incluir, a curto prazo, um método claro e operacional para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise dos pedidos de asilo.

    (5)

    Este método deverá basear‑se em critérios objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa. Deverá, permitir, nomeadamente, uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e a não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional.»

    4

    O artigo 1.o deste regulamento prevê:

    «O presente regulamento estabelece os critérios e mecanismos para a determinação do Estado‑Membro responsável pela análise dos pedidos de proteção internacional apresentados num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida […]»

    5

    O artigo 2.o, alíneas b) e c), do referido regulamento tem a seguinte redação:

    «Para os efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

    […]

    b)

    ‘Pedido de proteção internacional’, um pedido de proteção internacional tal como definido no artigo 2.o, alínea h), da Diretiva 2011/95/UE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que estabelece normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional, a um estatuto uniforme para refugiados ou pessoas elegíveis para proteção subsidiária e ao conteúdo da proteção concedida (JO 2011, L 337, p. 9)];

    c)

    ‘Requerente’: um nacional de um país terceiro ou um apátrida que apresentou um pedido de proteção internacional pendente de decisão definitiva».

    6

    O artigo 18.o, n.o 1, do mesmo regulamento dispõe:

    «O Estado‑Membro responsável por força do presente regulamento é obrigado a:

    […]

    b)

    Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência;

    c)

    Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o nacional de um país terceiro ou o apátrida que tenha retirado o seu pedido durante o processo de análise e que tenha formulado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência;

    d)

    Retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o, o nacional de um país terceiro ou o apátrida cujo pedido tenha sido indeferido e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência.»

    7

    O artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 604/2013 prevê:

    «O processo de determinação do Estado‑Membro responsável tem início a partir do momento em que um pedido de proteção internacional é apresentado pela primeira vez a um Estado‑Membro.»

    8

    O artigo 23.o, n.os 1 a 3, desse regulamento enuncia:

    «1.   Se o Estado‑Membro ao qual foi apresentado um novo pedido de proteção internacional pela pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), considerar que o responsável é outro Estado‑Membro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

    2.   O pedido de retomada a cargo é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac […]

    Se o pedido de retomada a cargo se basear em elementos de prova diferentes dos dados obtidos através do sistema Eurodac, deve ser enviado ao Estado‑Membro requerido no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido de proteção internacional, na aceção do artigo 20.o, n.o 2.

    3.   Se o pedido de retomada a cargo não for apresentado nos prazos previstos no n.o 2, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional cabe ao Estado‑Membro em que o pedido tiver sido apresentado.»

    9

    O artigo 24.o, n.os 1, 2 e 4, do referido regulamento prevê:

    «1.   Se o Estado‑Membro em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), e em que não foi apresentado nenhum novo pedido de proteção internacional, considerar que o Estado‑Membro responsável é outro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c), ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

    2.   Em derrogação do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular [(JO 2008, L 348, p. 98)], se o Estado‑Membro, em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa, decidir pesquisar o sistema Eurodac […], o pedido de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b) ou c) do presente regulamento, ou de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), cujo pedido de proteção internacional não tenha sido indeferido por decisão definitiva, é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac […]

    […]

    4.   Se a pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do presente regulamento, cujo pedido de proteção internacional foi indeferido por decisão definitiva num Estado‑Membro, se encontrar no território de outro Estado‑Membro sem título de residência, o segundo Estado‑Membro pode solicitar ao primeiro que retome a seu cargo a pessoa em causa ou conduza um procedimento de retorno nos termos da Diretiva 2008/115/CE.

    […]»

    10

    O artigo 26.o, n.o 1, do mesmo regulamento tem a seguinte redação:

    «Caso o Estado‑Membro requerido aceite a […] retomada a cargo […] de outra pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas c) ou d), o Estado‑Membro requerente deve notificar a pessoa em causa da decisão da sua transferência para o Estado‑Membro responsável e, se for caso disso, da decisão de não analisar o seu pedido de proteção internacional. […]»

    Diretiva 2013/32/UE

    11

    O artigo 10.o, n.o 2, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60), dispõe:

    «Ao apreciar os pedidos de proteção internacional, o órgão de decisão deve determinar em primeiro lugar se os requerentes preenchem as condições necessárias para beneficiar do estatuto de refugiados e, caso contrário, determinar se os requerentes são elegíveis para proteção subsidiária.»

    12

    O artigo 33.o desta diretiva, sob a epígrafe «Inadmissibilidade dos pedidos», tem a seguinte redação:

    «1.   Além dos casos em que um pedido não é apreciado em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 604/2013, os Estados‑Membros não são obrigados a analisar se o requerente preenche as condições para beneficiar de proteção internacional, em conformidade com a Diretiva 2011/95/UE, quando o pedido for considerado não admissível nos termos do presente artigo.

    2.   Os Estados‑Membros podem considerar não admissível um pedido de proteção internacional apenas quando:

    a)

    Outro Estado‑Membro tiver concedido proteção internacional;

    […]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    13

    Em 7 de dezembro de 2015, D. M. Ahmed pediu asilo na Alemanha. Apresentou, em seguida, um pedido oficial de asilo ao Serviço Federal em 30 de junho de 2016.

    14

    Uma vez que uma pesquisa no sistema «Eurodac» demonstrou, nomeadamente, que o interessado tinha já solicitado proteção internacional em Itália, em 17 de outubro de 2013, o Serviço Federal pediu, em 25 de agosto de 2016, às autoridades italianas para retomar a cargo D. M. Ahmed, com base no Regulamento n.o 604/2013.

    15

    Por carta de 9 de setembro de 2016, as autoridades italianas indeferiram este pedido de retomada a cargo, alegando que D. M. Ahmed beneficia de proteção subsidiária em Itália e que a sua eventual transferência deve, por conseguinte, ter lugar no âmbito dos acordos de readmissão em vigor.

    16

    Por decisão de 25 de novembro de 2016, o Serviço Federal declarou inadmissível o pedido de asilo que D. M. Ahmed tinha apresentado, constatou a inexistência de impedimentos do seu afastamento para Itália, advertiu‑o de que pode ser afastado para esse Estado‑Membro se não abandonar a Alemanha e aplicou‑lhe uma proibição de entrada e permanência com uma duração de 30 meses a contar do dia de afastamento.

    17

    D. M. Ahmed impugnou esta decisão no órgão jurisdicional de reenvio.

    18

    Esse órgão jurisdicional duvida da aplicação das disposições do Regulamento n.o 604/2013 relativas ao procedimento de retomada a cargo de um nacional de um país terceiro beneficiário da proteção subsidiária noutro Estado‑Membro.

    19

    Contudo, na hipótese destas disposições serem efetivamente aplicáveis numa situação como a do processo principal, o referido órgão jurisdicional pergunta‑se sobre se, em tal situação, um requerente de asilo pode invocar o termo dos prazos de apresentação do pedido para efeitos de retomada a cargo previstos no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013. Interroga‑se igualmente sobre as modalidades de contagem destes prazos e sobre os eventuais efeitos do atraso na apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo na determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de asilo.

    20

    Nestas condições, o Verwaltungsgericht Minden (Tribunal Administrativo de Minden, Alemanha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Os artigos 20.o a 33.o do Regulamento n.o 604/2013 devem ser aplicados aos requerentes de asilo que já beneficiam da proteção subsidiária num Estado‑Membro?

    Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

    2)

    Pode um requerente de asilo invocar a transferência da responsabilidade para o Estado‑Membro requerente em virtude do termo do prazo de apresentação do pedido para efeitos de retomada a cargo (artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 604/2013)?

    3)

    Em caso de resposta afirmativa à segunda questão, pode igualmente um requerente de asilo invocar a transferência da responsabilidade se o Estado‑Membro requerido continuar disponível para a tomada a cargo?

    4)

    Em caso de resposta negativa à terceira questão: pode deduzir‑se do consentimento expresso ou tácito (artigo 25.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013) do Estado‑Membro requerido que o mesmo está disposto a tomar a cargo o requerente de asilo?

    5)

    Pode o prazo de dois meses previsto no artigo 23.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 604/2013[…] terminar após o termo do prazo de três meses previsto no artigo 23.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 604/2013, quando o Estado‑Membro requerente deixa passar mais de um mês após o início do prazo de três meses antes de enviar um pedido de consulta à base de dados Eurodac?

    6)

    Considera‑se que um pedido de proteção internacional foi apresentado, na aceção do artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013, a partir da primeira emissão de um certificado de registo enquanto requerente de asilo ou apenas quando a autoridade recebe o referido certificado ou as informações essenciais nele contidas, ou apenas quando for lavrado um auto relativo a um pedido formal de asilo? Mais especificamente:

    a)

    O certificado de registo enquanto requerente de asilo é considerado um formulário ou um auto lavrado pela autoridade na aceção do artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013?

    b)

    A autoridade competente, na aceção do artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013, é a autoridade com competência para receber o formulário ou lavrar o auto, ou a autoridade com competência para se pronunciar quanto ao pedido de asilo?

    c)

    Um formulário ou um auto lavrado pela autoridade consideram‑se recebidos pela autoridade competente quando lhe foram comunicados os respetivos elementos essenciais ou é necessário, para este efeito, que o original ou uma cópia do auto lhe tenha sido transmitida?

    7)

    O atraso verificado entre o primeiro pedido de asilo ou a primeira emissão de um certificado de registo enquanto requerente de asilo e a apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo podem levar a uma transferência da responsabilidade para o Estado‑Membro requerente por aplicação analógica do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 604/2013 ou a uma obrigação de o Estado‑Membro requerente exercer o seu direito de reapreciação, nos termos do artigo 17.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 604/2013?

    8)

    Em caso de resposta afirmativa a uma das alternativas da sétima questão, a partir de que prazo é possível considerar que um pedido para efeitos de retomada a cargo foi apresentado de forma excessivamente tardia?

    9)

    Um pedido para efeitos de retomada a cargo no qual o Estado‑Membro requerente indica apenas a data da entrada no seu território e a data de apresentação do pedido formal de asilo, não indicando a data do primeiro pedido de asilo ou a data da primeira emissão do certificado de registo enquanto requerente de asilo, considera‑se apresentado dentro do prazo previsto no artigo 23.o, n.o 2, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.o 604/2013, ou tal pedido é ‘ineficaz’?»

    Quanto às questões prejudiciais

    21

    Ao abrigo do artigo 99.o do seu Regulamento de Processo, quando a resposta a uma questão submetida a título prejudicial não suscite nenhuma dúvida razoável, o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidir pronunciar‑se por meio de despacho fundamentado.

    22

    Há que aplicar esta disposição no âmbito do presente processo.

    23

    Tendo em conta o tratamento do processo pelo presente despacho adotado nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo, não há que conhecer do pedido de tramitação acelerada.

    Quanto à primeira questão

    24

    Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se as disposições e os princípios do Regulamento n.o 604/2013, que regem, de forma direta ou indireta, os prazos de apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo, são aplicáveis numa situação, como a do processo principal, em que um nacional de um país terceiro tenha apresentado um pedido de proteção internacional num Estado‑Membro depois de lhe ter sido concedida a proteção subsidiária por um outro Estado‑Membro.

    25

    A este respeito, importa sublinhar que estas regras, que têm por objeto enquadrar o desenvolvimento do procedimento de retomada a cargo previsto por esse regulamento assegurando que um pedido para efeitos de retomada a cargo é formulado num prazo razoável, apenas são, por natureza, aplicáveis às situações nas quais tal procedimento pode, em princípio, ser validamente instaurado em aplicação do referido regulamento.

    26

    O âmbito de aplicação do procedimento de retomada a cargo é definido nos artigos 23.o e 24.o do Regulamento n.o 604/2013. Enquanto o artigo 24.o deste regulamento abrange os casos em que não foi apresentado nenhum novo pedido de proteção internacional no Estado‑Membro requerente, o artigo 23.o do mesmo rege as situações, como as que estão em causa no processo principal, em que tal pedido foi apresentado nesse Estado‑Membro.

    27

    Resulta do artigo 23.o, n.o 1, do referido regulamento que, em tais situações, o procedimento de retomada a cargo apenas pode visar a transferência de uma pessoa abrangida pelo artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), do mesmo regulamento.

    28

    Estas três últimas disposições abrangem, respetivamente, um requerente cujo pedido esteja em análise, um nacional de um país terceiro ou um apátrida que tenha retirado o seu pedido durante a análise e um nacional de um país terceiro ou um apátrida cujo pedido tenha sido indeferido.

    29

    Uma vez que a circunstância de um nacional de um país terceiro beneficiar do estatuto conferido pela proteção subsidiária concedida por um Estado‑Membro que não seja aquele que procede à determinação do Estado‑Membro responsável não pode ser analisada no sentido de que implica que um pedido apresentado por esse nacional de um país terceiro esteja em análise ou que tenha sido retirado num outro Estado‑Membro, há que determinar se tal pessoa pode ser considerada nacional de um país terceiro cujo pedido foi indeferido num outro Estado‑Membro.

    30

    A este propósito, importa, na verdade, salientar que o artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento n.o 604/2013 não especifica se o «pedido» indeferido ao qual faz referência é um pedido de proteção internacional ou um pedido de asilo stricto sensu.

    31

    Ora, caso esta disposição devesse ser interpretada no sentido de remeter para o indeferimento de um pedido de asilo, poderia eventualmente ser aplicada a um nacional de um país terceiro que beneficia do estatuto conferido pela proteção subsidiária, na medida em que, em virtude do artigo 10.o, n.o 2, da Diretiva 2013/32, esse estatuto apenas deve ser conferido depois de se ter determinado que o requerente não preenche as condições de concessão do estatuto de refugiado.

    32

    Contudo, esta interpretação do artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento n.o 604/2013 não pode ser acolhida.

    33

    Com efeito, a dita interpretação implica admitir que o legislador da União empregou, nesta disposição, o termo «pedido» em vários sentidos diferentes, uma vez que a referência, que consta da referida disposição, ao facto de que a pessoa em causa «tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro» faz alusão necessariamente, à luz, nomeadamente, do artigo 1.o e do artigo 20.o, n.o 1, deste regulamento, à apresentação de um pedido de proteção internacional.

    34

    Além disso, decorre de jurisprudência constante do Tribunal da Justiça que, para a interpretação de uma disposição de direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (acórdão de 19 de dezembro de 2013, Koushkaki, C‑84/12, EU:C:2013:862, n.o 34).

    35

    A este respeito, importa salientar que o artigo 2.o, alínea c), do Regulamento n.o 604/2013 define o termo «requerente» como um nacional de um país terceiro ou apátrida «que tenha apresentado um pedido de proteção internacional sobre o qual não tenha sido ainda proferida decisão definitiva».

    36

    Do mesmo modo, embora este regulamento não inclua expressamente a definição do termo «pedido», o seu artigo 2.o, alínea b), define o conceito de «pedido de proteção internacional». As disposições do referido regulamento empregam, de resto, de uma forma geral, os termos «pedido» e «pedido de proteção internacional» de forma indissociável, sem nunca se referir, ao invés do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela avaliação de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 50, p. 1), a um «pedido de asilo».

    37

    Além disso, para definir o regime aplicável a uma pessoa abrangida pelo artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento n.o 604/2013 quando esta não tenha apresentado um novo pedido de proteção internacional, o artigo 24.o, n.os 2 e 4, deste regulamento refere‑se expressamente ao caráter definitivo ou não da decisão que indefere o «pedido de proteção internacional» apresentado por aquela pessoa.

    38

    Por outro lado, o artigo 33.o da Diretiva 2013/32 distingue claramente os casos nos quais um pedido de proteção internacional não foi apreciado em aplicação do Regulamento n.o 604/2013 daqueles em que um tal pedido pode ser declarado inadmissível quando «outro Estado‑Membro tiver concedido proteção internacional».

    39

    O legislador da União considerou, portanto, que o indeferimento do pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro como o que está em causa no processo principal deve ser assegurado por uma decisão de inadmissibilidade, em aplicação do artigo 33.o daquela diretiva, e não por uma decisão de transferência e de não análise, nos termos do artigo 26.o deste regulamento, o que dá origem a uma série de consequências, em particular, quanto às vias de recurso disponíveis contra a decisão de indeferimento.

    40

    Esta conclusão não é suscetível de impedir a realização dos objetivos, mencionados no considerando 5 do referido regulamento, destinados, por um lado, a garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e, por outro, a não comprometer a celeridade do tratamento dos pedidos de proteção internacional, uma vez que um nacional de um país terceiro como o que está em causa no processo principal já beneficia de uma proteção internacional.

    41

    Por consequência, decorre do artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento n.o 604/2013, lido em conjugação com o artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do mesmo, que um Estado‑Membro não pode validamente requerer a outro Estado‑Membro a retomada a cargo, no âmbito de procedimentos definidos por este regulamento, de um nacional de um país terceiro, como o que está em causa no processo principal, que apresentou um pedido de proteção internacional naquele primeiro Estado‑Membro depois de lhe ter sido concedida proteção subsidiária por esse segundo Estado‑Membro.

    42

    Assim, há que responder à primeira questão que as disposições e os princípios do Regulamento n.o 604/2013, que regem, de forma direta ou indireta, os prazos de apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo, não são aplicáveis numa situação, como a que está em causa no processo principal, em que um nacional de um país terceiro apresentou um pedido de proteção internacional num Estado‑Membro depois de lhe ter sido concedida proteção subsidiária por outro Estado‑Membro.

    Quanto à segunda a nona questões

    43

    Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda a nona questões.

    Quanto às despesas

    44

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

     

    As disposições e os princípios do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou apátrida, que regem, de forma direta ou indireta, os prazos de apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo, não são aplicáveis a uma situação, como a que está em causa no processo principal, em que um nacional de um país terceiro apresentou um pedido de proteção internacional num Estado‑Membro depois de lhe ter sido concedida proteção subsidiária por outro Estado‑Membro.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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