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Document 62017CC0213

Conclusões do advogado-geral Y. Bot apresentadas em 13 de junho de 2018.
X contra Staatssecretaris van Veiligheid en Justitie.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam.
Reenvio prejudicial — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro — Artigos 17.o, 18.o, 23.o e 24.o — Procedimento prévio de proteção internacional em curso num Estado‑Membro — Novo pedido noutro Estado‑Membro — Inexistência de pedido de retomada a cargo nos prazos previstos — Entrega da pessoa em causa para efeitos de procedimento criminal.
Processo C-213/17.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2018:434

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

YVES BOT

apresentadas em 13 de junho de 2018 ( 1 )

Processo C‑213/17

X

contra

Staatssecretaris van Veiligheid en Justitie

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos)]

«Reenvio prejudicial — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Fronteiras, asilo e imigração — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro — Estado‑Membro responsável em aplicação do critério referido no artigo 3.o, n.o 2 — Decisão jurisdicional revestida da autoridade do caso julgado que indefere o primeiro pedido de proteção internacional — Procedimento de recurso pendente respeitante à decisão que indefere o segundo pedido de proteção internacional — Emissão de um mandado de detenção europeu para efeitos da instauração de um processo penal contra o requerente — Apresentação de um novo pedido de proteção internacional num outro Estado‑Membro — Entrega do interessado ao abrigo da execução do mandado de detenção europeu — Procedimento de retomada a cargo — Artigo 23.o, n.o 3 — Efeitos ligados à expiração dos prazos previstos para a apresentação de um pedido — Transferência da responsabilidade para o Estado‑Membro em que foi apresentado o novo pedido de proteção internacional — Artigo 24.o, n.o 1 — Modalidades de aplicação — Artigo 24.o, n.o 5 — Alcance da obrigação de informação — Artigo 17.o, n.o 1 — Alcance da cláusula discricionária — Diretiva 2013/32/UE — Artigos 31.o e 46.o — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 41.o — Direito a uma boa administração — Artigo 47.o — Direito a um recurso jurisdicional efetivo»

I. Introdução

1.

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 17.o, n.o 1, do artigo 18.o, n.o 2, do artigo 23.o, n.o 3, e do artigo 24.o do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida ( 2 ), uma vez que o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos), órgão jurisdicional de reenvio, pretende, em substância, determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado por X, um nacional paquistanês, em Itália.

2.

Este processo caracteriza‑se por um quadro jurídico e factual complexo ( 3 ) não só pelo facto de o interessado ter apresentado múltiplos pedidos de proteção internacional junto de dois Estados‑Membros diferentes, mas também porque interfere, de forma concomitante com o processo de análise desses pedidos, um processo de natureza penal que conduziu à emissão de um mandado de detenção europeu contra o requerente de asilo.

3.

Os Países Baixos são o Estado‑Membro junto do qual apresentou os seus primeiro, segundo e quarto pedidos de proteção internacional. Em aplicação de um critério material previsto pelo Regulamento Dublim III, este Estado‑Membro foi responsável pela análise dos dois primeiros pedidos. O primeiro pedido de proteção internacional ( 4 ) foi indeferido por uma decisão judicial revestida da autoridade do caso julgado. O segundo pedido de proteção internacional ( 5 ) foi indeferido por uma decisão da autoridade nacional competente, que foi objeto de um processo de recurso para a Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos). Dado que, entretanto, o interessado fugiu do território neerlandês para se deslocar para Itália, onde apresentou o seu terceiro pedido de proteção internacional ( 6 ), o Reino dos Países Baixos emitiu contra ele um mandado de detenção europeu para efeitos da instauração de um processo penal, exigindo à República Italiana que procedesse à sua entrega. O Reino dos Países Baixos, em seguida, pediu às autoridades italianas que retomassem a cargo o interessado para efeitos da análise deste terceiro pedido.

4.

A Itália é, portanto, o Estado‑Membro para cujo território o interessado se deslocou na sequência da emissão, pelo Reino dos Países Baixos, do mandado de detenção europeu, onde apresentou o terceiro pedido. A República Italiana tem, por conseguinte, uma dupla função. É, por um lado, o Estado‑Membro de execução do mandado de detenção europeu, tendo sido obrigada a proceder à entrega do requerente às autoridades neerlandesas para efeitos da instauração de um processo penal. É, por outro lado, o Estado‑Membro requerido por estas últimas autoridades para retomar a cargo o requerente para efeitos de análise do seu pedido de asilo. Embora, em aplicação do artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, a República Italiana tivesse o direito de exigir ao Reino dos Países Baixos a retomada a cargo de X, perdeu, no entanto, tal direito ao não apresentar o seu pedido no prazo fixado no n.o 2 deste artigo. Com base no artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III — cujos termos devemos aqui interpretar —, as autoridades neerlandesas consideraram, portanto, a República Italiana como o novo Estado‑Membro responsável, implicitamente, pela análise do terceiro pedido. Por conseguinte, estas autoridades decidiram transferir o interessado para as autoridades italianas e, além disso, declararam‑se incompetentes para efeitos da análise do quarto pedido de proteção internacional nelas apresentado.

5.

É atendendo às particularidades deste quadro jurídico e factual que o Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) se questiona se é possível, como afirmam as autoridades neerlandesas, proceder a essa transferência de responsabilidade. Para este efeito, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre o alcance e as modalidades de aplicação não apenas das duas disposições processuais do Regulamento Dublim III em que o Reino dos Países Baixos se baseia para proceder a essa transferência, a saber, os artigos 23.o e 24.o deste regulamento, mas igualmente a cláusula discricionária prevista no artigo 17.o, n.o 1, do referido regulamento.

6.

O presente caso ilustra as debilidades e as lacunas estruturais do sistema de Dublim que a Comissão Europeia tenciona precisamente resolver através de uma reforma do quadro existente ( 7 ).

7.

Este processo demonstra que o sistema de Dublim é efetivamente um sistema de sistemas de asilo nacionais e não um regime europeu comum de asilo e que o mecanismo de repartição das responsabilidades instituído pelo Regulamento Dublim III se baseia em regras técnicas e administrativas, que foram implementadas independentemente das consequências humanas e dos custos materiais e financeiros por elas causados, o que mina a eficácia do regime de Dublim e a finalidade do sistema europeu comum de asilo.

8.

Esta apreciação é severa mas está, em nossa opinião, à altura das consequências quase absurdas que podem resultar de uma aplicação cega do mecanismo de transferência de responsabilidade instituído no artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III.

9.

Por conseguinte, o presente processo conduzir‑nos‑á principalmente, nos desenvolvimentos que se seguem, a expor as razões pelas quais consideramos que é necessário derrogar, apesar da clareza da sua redação, o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III, cuja aplicação implica uma transferência de responsabilidade devido à expiração dos prazos fixados para a apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo.

10.

Na medida em que essa transferência é efetuada de maneira automática, independentemente das consequências humanas e materiais que a mesma implica, consideramos que, numa situação como a que está em causa, retira ao procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável a racionalidade, a objetividade, a equidade e a celeridade procuradas pelo legislador da União no âmbito do Regulamento Dublim III e impede que sejam ativados os deveres de cooperação e solidariedade nos quais deve assentar o regime europeu comum de asilo.

II. Quadro jurídico

A.   Regulamento Dublim III

11.

Os considerandos 4, 5 e 22 do Regulamento Dublim III enunciam:

«(4)

As conclusões do Conselho de Tampere precisaram […] que o SECA [regime europeu comum de asilo] deverá incluir, a curto prazo, um método claro e operacional para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise dos pedidos de asilo.

(5)

Este método deverá basear‑se em critérios objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa. Deverá, permitir, nomeadamente, uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a garantir um acesso efetivo aos procedimentos de concessão de proteção internacional e a não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional.

[…]

(22)

[…] A solidariedade, elemento central do SECA, é indissociável da confiança mútua. […]»

12.

Em conformidade com o seu artigo 1.o, o Regulamento Dublim III tem por objetivo estabelecer os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida ( 8 ). Estes critérios estão fixados no capítulo III do referido regulamento, nos artigos 8.o a 15.o.

13.

Em conformidade com o artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, se nenhum Estado‑Membro puder ser designado como responsável com base nos critérios enumerados neste regulamento, o primeiro Estado‑Membro em que o pedido de proteção internacional foi apresentado será o responsável pela sua análise.

14.

O capítulo IV do Regulamento Dublim III identifica, antes de mais, as circunstâncias em que um Estado‑Membro pode ser considerado responsável pela análise de um pedido de asilo, prevendo exceções a estes critérios. O artigo 17.o deste regulamento, sob a epígrafe «Cláusulas discricionárias», dispõe assim, no seu n.o 1:

«Em derrogação do artigo 3.o, n.o 1, cada Estado‑Membro pode decidir analisar um pedido de proteção internacional que lhe seja apresentado por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida, mesmo que essa análise não seja da sua competência por força dos critérios definidos no presente regulamento.

[…]»

15.

O capítulo V do Regulamento Dublim III estabelece, em seguida, as obrigações do Estado‑Membro responsável.

16.

Neste capítulo, o artigo 18.o, n.o 1, alínea b), prevê que esse Estado‑Membro é obrigado a «retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o [deste regulamento], o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência».

17.

O artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento Dublim III prevê, além disso, que o Estado‑Membro responsável é obrigado a «retomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.o, 24.o, 25.o e 29.o [deste regulamento], o nacional de um país terceiro ou o apátrida cujo pedido tenha sido indeferido e que tenha apresentado um pedido noutro Estado‑Membro, ou que se encontre no território de outro Estado‑Membro sem possuir um título de residência».

18.

O Estado‑Membro responsável é igualmente obrigado, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do referido regulamento, a analisar o pedido de proteção internacional apresentado pelo requerente ou a levar a análise a seu termo.

19.

O capítulo VI do Regulamento Dublim III prevê, por último, as modalidades aplicáveis aos procedimentos de tomada a cargo e de retomada a cargo. O âmbito de aplicação do procedimento de retomada a cargo está definido nos artigos 23.o e 24.o desse regulamento.

20.

O artigo 23.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Apresentação de um pedido de retomada a cargo em caso de apresentação de um novo pedido no Estado‑Membro requerente», enuncia, nos seus n.os 1 a 3:

«1.   Se o Estado‑Membro ao qual foi apresentado um novo pedido de proteção internacional pela pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), considerar que o responsável é outro Estado‑Membro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

2.   O pedido de retomada a cargo é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac […].

Se o pedido de retomada a cargo se basear em elementos de prova diferentes dos dados obtidos através do sistema Eurodac, deve ser enviado ao Estado‑Membro requerido no prazo de três meses a contar da data de apresentação do pedido de proteção internacional, na aceção do artigo 20.o, n.o 2.

3.   Se o pedido de retomada a cargo não for apresentado nos prazos previstos no n.o 2, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional cabe ao Estado‑Membro em que o pedido tiver sido apresentado.»

21.

O artigo 24.o do Regulamento Dublim III, sob a epígrafe «Apresentação de um pedido de retomada a cargo sem que tenha sido apresentado um novo pedido no Estado‑Membro requerente», dispõe:

«1.   Se o Estado‑Membro em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), e em que não foi apresentado nenhum novo pedido de proteção internacional, considerar que o Estado‑Membro responsável é outro, nos termos do artigo 20.o, n.o 5, e do artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c), ou d), pode solicitar a esse outro Estado‑Membro que retome essa pessoa a seu cargo.

[…]

4.   Se a pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do presente regulamento, cujo pedido de proteção internacional foi indeferido por decisão definitiva num Estado‑Membro, se encontrar no território de outro Estado‑Membro sem título de residência, o segundo Estado‑Membro pode solicitar ao primeiro que retome a seu cargo a pessoa em causa ou conduza um procedimento de retorno […]

[…]

5.   Os pedidos de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alíneas b), c) ou d), são feitos num formulário‑tipo e devem conter as provas ou indícios descritos nas duas listas a que se refere o artigo 22.o, n.o 3, e/ou os elementos relevantes das declarações da pessoa em causa, que permitam às autoridades do Estado‑Membro requerido verificar se é responsável, com base nos critérios definidos no presente regulamento.

[…]»

B.   Regulamento (CE) n.o 1560/2003

22.

O Regulamento n.o 1560/2003 ( 9 ) estabelece as modalidades de aplicação do Regulamento Dublim III. O seu artigo 2.o precisa as modalidades de elaboração de um pedido para efeitos de retomada a cargo.

III. Factos do litígio no processo principal

23.

X é um cidadão paquistanês, de confissão cristã, que solicita a concessão de proteção internacional.

24.

X apresentou cinco pedidos de proteção internacional entre o ano de 2011 e o ano de 2015. Quatro de entre eles foram apresentados nos Países Baixos e um foi apresentado em Itália.

25.

O primeiro pedido foi apresentado nos Países Baixos em 23 de março de 2011. O Staatssecretaris van Veiligheid en Justitie (Secretário de Estado da Segurança e da Justiça, Países Baixos) indeferiu o pedido quanto ao mérito por decisão de 5 de setembro de 2011. Como indicou o representante de X na audiência, os riscos a que o interessado ficaria exposto em caso de regresso ao seu país de origem não foram considerados suficientemente graves para justificar a concessão de proteção internacional. O recurso interposto desta decisão foi julgado improcedente por sentença de 31 de maio de 2012, proferida pelo rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos), tendo a Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos) confirmado essa decisão em 27 de junho de 2013.

26.

Em 18 de dezembro de 2013, X interpôs então nos Países Baixos um novo pedido de proteção internacional, que foi por ele retirado alguns dias mais tarde, em 10 de janeiro de 2014 ( 10 ).

27.

X apresentou de novo um pedido de proteção internacional nos Países Baixos em 4 de junho de 2014, o segundo pedido. Sete dias mais tarde, em 11 de junho de 2014, o Secretário de Estado da Segurança e da Justiça indeferiu este pedido. O recurso interposto desta decisão para o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) foi julgado improcedente por decisão de 7 de julho de 2014. A Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos) confirmou essa decisão, um ano mais tarde, em 7 de agosto de 2015.

28.

Durante o ano em que o processo de recurso apresentado nesse órgão jurisdicional estava, assim, pendente, diferentes acontecimentos se produziram quanto à situação pessoal e judiciária do interessado.

29.

Com efeito, em 28 de setembro de 2014, X, então suspeito de ter cometido uma infração de natureza sexual no território neerlandês, fugiu para Itália.

30.

Em 2 de outubro de 2014, as autoridades neerlandesas emitiram um mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal contra X, solicitando às autoridades italianas a sua entrega. Foi neste quadro que X foi detido em Itália durante um período de dois meses, antes da sua entrega ( 11 ).

31.

Em 23 de outubro de 2014, X apresentou um novo pedido de proteção internacional, o terceiro, desta vez, em território italiano. A República Italiana não enviou ao Reino dos Países Baixos, nos termos do artigo 18.o, n.o 1, alínea d), e do artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, um pedido para efeitos de retomada a cargo no prazo previsto no artigo 23.o, n.o 2, deste regulamento.

32.

Em 30 de janeiro de 2015, a República Italiana executou o mandado de detenção europeu e entregou o interessado às autoridades neerlandesas.

33.

Este último foi imediatamente privado da sua liberdade e colocado em detenção provisória. Nos termos da decisão de reenvio, esse período estende‑se de 2 a 24 de fevereiro de 2015. Em contrapartida, nos termos das observações apresentadas pelo Governo neerlandês, o referido período estende‑se de 30 de janeiro a 18 de março de 2015.

34.

Em 5 de março de 2015, o Reino dos Países Baixos dirigiu à República Italiana um pedido para efeitos de retomada a cargo de X, baseado no artigo 18.o, n.o 1, alínea b), e no artigo 24.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublim III, uma vez que X se encontrava sem título de residência no território neerlandês e que ainda não tinha apresentado um novo pedido de proteção internacional. As autoridades neerlandesas consideraram que a República Italiana se tinha tornado o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por X às autoridades italianas, na medida em que este Estado não lhes enviou, no prazo de dois meses fixado no artigo 23.o, n.o 2, do referido regulamento, um pedido para efeitos de retomada a cargo. Como resulta da decisão de reenvio, o Reino dos Países Baixos indicou nesse pedido que, segundo as declarações de X, este tinha saído de Itália no mês de janeiro de 2015 e se tinha dirigido diretamente para os Países Baixos. Em contrapartida, esse pedido não contém nenhum elemento quanto ao procedimento penal instaurado contra X nos Países Baixos.

35.

A República Italiana não respondeu a este pedido no prazo de duas semanas fixado no artigo 25.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III. Em 20 de março de 2015, o Reino dos Países Baixos considerou, por conseguinte, que a República Italiana aceitava implicitamente o pedido para efeitos de retomada a cargo de X.

36.

Em 25 de março de 2015, o Secretário de Estado da Segurança e da Justiça decidiu transferir X para as autoridades italianas (a seguir «decisão de transferência»), na sequência da aceitação implícita das referidas autoridades.

37.

Em 30 de março de 2015, a República Italiana aceitou o pedido de retomada a cargo.

38.

Em 1 de abril de 2015, X interpôs recurso para o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) contra esta decisão juntando ao recurso um pedido de medidas provisórias.

39.

Resulta dos documentos anexados ao processo nacional de que dispõe o Tribunal de Justiça que, por carta de 13 de abril de 2015, o Ministerie van Veiligheid en Justitie (Ministério da Segurança e da Justiça, Países Baixos) informou o Ministero dell’Interno (Ministério do Interior, Itália), por um lado, que, não tendo respondido antes de 20 de março de 2015 ao pedido para efeitos de retomada a cargo considerava que a República Italiana tinha aceitado o pedido para efeitos de retomada a cargo do interessado. Por outro lado, o Ministério da Segurança e da Justiça, por outro lado, assinalou que a transferência de X para as autoridades italianas não podia ser executada no prazo fixado em razão do desaparecimento deste último.

40.

Por decisão de 21 de abril de 2015, o voorzieningenrechter (Juiz das Medidas Provisórias, Países Baixos) da Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos) deferiu o pedido de medidas provisórias e decretou a suspensão da transferência.

41.

Em 19 de maio de 2015, X apresentou um novo pedido de proteção internacional, o quarto, nos Países Baixos, sendo este acompanhado de um pedido de autorização de residência temporária.

42.

Em 21 de maio de 2015, ou seja, dois dias mais tarde, o Secretário de Estado da Segurança e da Justiça indicou que não analisaria esse pedido pelo facto de estar determinado, com fundamento no Regulamento Dublim III, que a República Italiana era o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional de X. Este último, no próprio dia, interpôs recurso para o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) contra esta decisão.

43.

Como referimos, em 7 de agosto de 2015, a Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos) confirmou a decisão de 7 de julho de 2014 relativa ao indeferimento do segundo pedido de proteção internacional.

44.

Em 30 de novembro de 2015, X foi informado do arquivamento do procedimento penal contra ele instaurado.

45.

Os recursos interpostos por X contra a decisão de transferência e contra a decisão pela qual o Secretário de Estado da Segurança e da Justiça se declarou incompetente para fins da análise do quarto pedido de proteção internacional foram apreciados no âmbito de uma audiência que teve lugar em 10 de dezembro de 2015. O rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) decidiu pelo encerramento do processo no final dessa audiência.

46.

Em 24 de março de 2016, o órgão jurisdicional de reenvio reabriu o exame desse processo enquanto se aguardava a prolação do Acórdão de 7 de junho de 2016, Ghezelbash ( 12 ), e, em 20 de abril de 2017, apresentou o reenvio prejudicial ora submetido ao Tribunal de Justiça.

IV. Questões prejudiciais

47.

Nestas condições, o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)

Deve o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento [Dublim III], ser interpretado no sentido de que a República Italiana passou a ser responsável pela análise do pedido de proteção internacional apresentado pelo recorrente naquele país em 23 de outubro de 2014, independentemente do facto de os Países Baixos serem o Estado‑Membro primariamente responsável com base nos pedidos de proteção internacional, na aceção do artigo 2.o, alínea d), do Regulamento Dublim, apresentados anteriormente neste país, o último dos quais ainda estava a ser analisado nos Países Baixos, uma vez que [o Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State] a Secção [do Contencioso Administrativo do Raad van State] ainda não se tinha pronunciado sobre o recurso interposto pelo recorrente da sentença do rechtbank de 7 de julho de 2014 […]?

2)

[Se a primeira questão merecer uma resposta afirmativa,] [d]ecorre do artigo 18.o, n.o 2, do [Regulamento Dublim III] que o pedido de proteção internacional, que ainda se encontrava em análise nos Países Baixos quando da apresentação do pedido de retomada a cargo em 5 de março de 2015, deveria ter sido suspenso pelas autoridades holandesas, imediatamente após a apresentação do pedido de retomada a cargo e após o termo do prazo referido no artigo 24.o [deste regulamento], mediante a anulação ou alteração da decisão anterior de 11 de junho de 2014, relativa ao indeferimento do pedido de asilo de 4 de junho de 2014?

3)

Em caso de resposta afirmativa à segunda questão, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional do recorrente não se transferiu para a Itália, mas continuou a recair sobre as autoridades holandesas, pelo facto de o recorrido não ter anulado ou alterado a decisão de 11 de junho de 2014?

4)

As autoridades holandesas, ao não terem feito referência ao recurso no segundo procedimento de asilo que estava pendente na Secção [do Contencioso Administrativo do Conselho de Estado] nos Países Baixos, faltaram ao cumprimento da obrigação que lhes incumbia por força do artigo 24.o, n.o 5, do [Regulamento Dublim III] de fornecer às autoridades italianas elementos que as permitiriam verificar se este Estado‑Membro era responsável nos termos daquele regulamento?

5)

Em caso de resposta afirmativa à quarta questão, esse incumprimento leva a concluir que, por esse motivo, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional do recorrente não se transferiu para a Itália, mas continuou a recair sobre as autoridades holandesas?

6)

Caso essa responsabilidade não tenha continuado a recair sobre os Países Baixos, as autoridades holandesas deveriam ter procedido à análise do pedido de proteção internacional apresentado pelo recorrente em Itália, em razão da transferência do recorrente para os Países Baixos pela Itália no âmbito do seu processo penal, nos termos do artigo 17.o, n.o 1, e em derrogação do artigo 3.o, n.o 1, do [Regulamento Dublim III], sendo que, razoavelmente, não deveriam ter feito uso da competência referida no artigo 24.o, n.o 1, do [Regulamento Dublim III] para pedir a retomada a cargo do recorrente às autoridades italianas?»

48.

Os Governos alemão, húngaro e neerlandês, bem como a Comissão, apresentaram observações ( 13 ). Não podemos senão lamentar a ausência do Governo italiano, que não apresentou nenhuma observação escrita e também não se fez representar na audiência.

V. Observações preliminares

49.

Antes de proceder à análise destas questões, é necessário formular algumas observações preliminares relativas ao objeto e ao alcance do presente reenvio prejudicial ( 14 ).

50.

O pedido de decisão prejudicial formulado pelo rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) destina‑se, em substância, a determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado por X em Itália.

51.

Tendo em conta as particularidades do quadro jurídico e factual em que se inscreve o processo principal, o juiz de reenvio pergunta se é possível considerar que a República Italiana é efetivamente o Estado‑Membro responsável pela análise desse pedido.

52.

Num primeiro momento, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, assim, sobre o alcance e as modalidades de aplicação das duas disposições processuais do Regulamento Dublim III em que o Reino dos Países Baixos se baseia para proceder a uma transferência de responsabilidade:

o artigo 23.o, n.o 3, deste regulamento, cuja aplicação implica uma transferência de pleno direito da responsabilidade devido à expiração dos prazos fixados para a apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo (primeira questão prejudicial), e

o artigo 24.o, n.o 1, do referido regulamento, cuja aplicação implica igualmente uma transferência de responsabilidade na sequência da aceitação, expressa ou tácita, pelo Estado‑Membro requerido de um pedido para efeitos de retomada a cargo (primeira a sexta questões prejudiciais).

53.

Se o Tribunal de Justiça considerar que houve uma transferência de pleno direito da responsabilidade com fundamento no artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III, as questões sobre a interpretação do artigo 24.o deste regulamento só se colocariam a título subsidiário.

54.

Num segundo momento, o juiz de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que precise o alcance da cláusula discricionária prevista no artigo 17.o, n.o 1, do referido regulamento no caso de a República Italiana ser o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional em causa (sexta questão prejudicial).

55.

O órgão jurisdicional de reenvio questiona se as autoridades neerlandesas não eram obrigadas a aplicar esta cláusula e a analisar este pedido, na medida em que a República Italiana executou o mandado de detenção europeu e apresentou o interessado às referidas autoridades para efeitos do exercício do procedimento penal instaurado contra este último.

VI. Análise

A.   Sobre a transferência da responsabilidade decorrente do artigo 23.o do Regulamento Dublim III (primeira questão prejudicial)

56.

Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que interprete o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III.

57.

Pergunta, em especial, se esta disposição, lida à luz dos objetivos prosseguidos pelo legislador da União no âmbito do Regulamento Dublim III ( 15 ), não se opõe a uma transferência da responsabilidade resultante da expiração dos prazos previstos no artigo 23.o, n.o 2, desse regulamento quando o Estado‑Membro responsável, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do referido regulamento, procedeu à análise dos pedidos anteriormente apresentados pelo interessado e quando a decisão pela qual foi indeferido o segundo pedido é objeto de um recurso que ainda está pendente nas autoridades jurisdicionais desse Estado‑Membro.

58.

Em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, um pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro no território de um dos Estados‑Membros, seja qual for, é, em princípio, analisado unicamente pelo Estado‑Membro que os critérios enunciados no capítulo III deste regulamento designarem como responsável ( 16 ). No entanto, para além dos critérios enunciados no capítulo III do Regulamento Dublim III, o capítulo VI do mesmo regulamento institui procedimentos de tomada e de retomada a cargo por outro Estado‑Membro que «contribuem igualmente, da mesma maneira que os critérios enunciados no capítulo III do referido regulamento, para determinar o Estado‑Membro responsável» ( 17 ).

59.

O artigo 23.o do Regulamento Dublim III estabelece as regras aplicáveis à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo numa situação em que um novo pedido de proteção internacional é apresentado num outro Estado‑Membro, nomeadamente no Estado‑Membro requerente.

60.

Nos termos do artigo 23.o, n.o 1, deste regulamento, se uma pessoa visada pelo artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do referido regulamento, cujo pedido de proteção internacional foi indeferido num Estado‑Membro, apresentar um novo pedido de proteção internacional num outro Estado‑Membro, esse Estado‑Membro pode solicitar ao primeiro Estado‑Membro que retome a seu cargo a pessoa em causa.

61.

Uma pessoa como X, após ter apresentado dois pedidos de proteção internacional num Estado‑Membro, concretamente nos Países Baixos, em 23 de março de 2011 e em 4 de junho de 2014, que não foram deferidos, se deslocar em seguida para outro Estado‑Membro no qual apresentou um novo pedido, concretamente em Itália, em 23 de outubro de 2014, está efetivamente abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 23.o do Regulamento de Dublim III.

62.

Na sequência das questões e dos esclarecimentos solicitados pelo Tribunal de Justiça na audiência, todas as partes acordaram que a situação de X está efetivamente abrangida pela situação referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), deste regulamento.

63.

No artigo 23.o, n.o 2, do referido regulamento, o legislador da União fixa prazos imperativos para a apresentação do pedido para efeitos de retomada a cargo. Este deve ser apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses a contar da receção do acerto do Eurodac ou de três meses se as autoridades competentes basearem o seu pedido noutros elementos de prova que não sejam os dados obtidos através do sistema Eurodac. Esses prazos devem garantir que o procedimento de retomada a cargo será implementado sem atraso injustificado e, de qualquer modo, num «prazo razoável» a partir do momento em que dispõe das informações para o efeito, e a fim de garantir a celeridade do tratamento dos pedidos de proteção internacional ( 18 ).

64.

No artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III — cujos termos devemos aqui interpretar — o legislador da União define os efeitos ligados à expiração dos prazos fixados. Em conformidade com esta disposição, se o pedido não é formulado dentro dos prazos, a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional cabe ao Estado‑Membro em que este último foi apresentado. O referido legislador não prevê nenhuma exceção e não concede nenhuma margem de manobra.

65.

A redação dessa disposição é muito clara, em todas as versões linguísticas, e traduz sem ambiguidade a vontade do legislador da União de proceder a uma transferência de responsabilidade quando os prazos fixados para a apresentação de um pedido não são respeitados.

66.

No processo principal, é pacífico que a República Italiana, onde foi apresentado o terceiro pedido, não solicitou ao Reino dos Países Baixos a retomada a cargo de X dentro dos prazos obrigatórios fixados no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III. Em aplicação do artigo 23.o, n.o 3, deste regulamento, deveria ter sido transferida para a República Italiana, «de pleno direito», a responsabilidade pela análise desse novo pedido ( 19 ).

67.

Todas as partes que apresentaram observações, com exceção de X, estão de acordo em dizer que, tendo em conta os termos do artigo 23.o, n.o 3, do referido regulamento, a República Italiana tornou‑se, de facto, o Estado‑Membro responsável pela análise desse pedido, independentemente da existência, no Reino dos Países Baixos, de um processo de recurso pendente contra a decisão de indeferimento do segundo pedido.

68.

Poderíamos partilhar desta conclusão se a situação em causa se caracterizasse efetivamente pela existência apenas no Reino dos Países Baixos desse processo de recurso pendente. Ora, como veremos, não é esse o caso. Há aqui algumas outras circunstâncias que, em conjunto, tornam, a nosso ver, as autoridades neerlandesas as únicas responsáveis pela análise deste terceiro pedido.

69.

Aplicada a uma situação tão específica como a que está em causa, a interpretação literal levanta mais dificuldades do que as que resolve, o que transparece de forma bastante evidente das seis questões prejudiciais que o órgão jurisdicional de reenvio submete ao Tribunal de Justiça. Tendo em conta as especificidades do caso em apreço, esta interpretação literal faz produzir ao texto do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III efeitos perfeitamente contrários aos princípios em que assenta o regime de asilo europeu comum e aos objetivos visados pelo legislador da União no quadro deste regulamento.

70.

A fim de preservar o efeito útil do Regulamento Dublim III, e pelas razões que passamos a expor, vamos, por conseguinte, propor ao Tribunal de Justiça que admita uma exceção ao caráter automático do mecanismo previsto no artigo 23.o, n.o 3, deste regulamento.

71.

Em conformidade com o artigo 67.o, n.o 2, e com o artigo 80.o TFUE, o regime de asilo europeu comum, no qual se integra o Regulamento Dublim III, assenta na solidariedade entre os Estados‑Membros e na partilha equitativa de responsabilidades entre estes ( 20 ). Como resulta do considerando 22 deste regulamento, essa solidariedade constitui um «elemento central» desse regime. Além disso, deve ser «real e concreta» e deve vincular os Estados‑Membros mais afetados pelos fluxos de requerentes de asilo que constituem um encargo desmedido para os seus sistemas ( 21 ).

72.

Este regime assenta igualmente na confiança mútua entre os Estados‑Membros, a qual constitui mesmo um dos seus pilares fundadores.

73.

Foi precisamente em razão do princípio de confiança mútua que o legislador da União adotou o Regulamento Dublim III, a fim de acelerar o tratamento dos pedidos de proteção internacional, garantindo aos requerentes a análise do seu pedido quanto ao mérito por um único Estado‑Membro claramente determinado. Para esse efeito, o legislador pretende racionalizar o tratamento destes pedidos, evitando o congestionamento do sistema pela obrigação que teriam os Estados‑Membros de tratar pedidos múltiplos apresentados por um mesmo requerente, aumentando a segurança jurídica na determinação do Estado‑Membro responsável pelo tratamento do pedido de asilo e, por último, evitando o «forum shopping» ( 22 ).

74.

Como resulta dos considerandos 4 e 5 do Regulamento Dublim III, o legislador da União tende, assim, a estabelecer um método que se pretende «claro e operacional» para determinar o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional, método que deve basear‑se em critérios «objetivos e equitativos, tanto para os Estados‑Membros como para as pessoas em causa». Este método deve, acima de tudo, permitir «uma determinação rápida do Estado‑Membro responsável, por forma a […] não comprometer o objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional».

75.

Embora o legislador da União vise, acima de tudo, os critérios de determinação do Estado‑Membro responsável enunciados no capítulo III do Regulamento Dublim III, não é menos certo que os procedimentos de tomada e de retomada a cargo por outro Estado‑Membro visados no capítulo VI deste regulamento devem basear‑se em critérios que apresentem as mesmas qualidades não só pelo facto de estes procedimentos contribuírem, da mesma forma que os referidos critérios, para determinar o Estado‑Membro responsável ( 23 ), mas também porque participam da mesma forma na realização dos objetivos do referido Regulamento.

76.

Assim, no Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab ( 24 ), o Tribunal de Justiça considerou que, no que respeita à transferência de responsabilidade resultante da expiração dos prazos fixados para a apresentação de um pedido para efeitos de tomada a cargo (artigo 21.o, n.o 1, terceiro parágrafo, do Regulamento Dublim III), este mecanismo contribui de modo determinante para a realização do objetivo de celeridade no tratamento dos pedidos de proteção internacional, garantindo, em caso de atraso na condução do processo de tomada a cargo, que a análise do pedido será efetuada no Estado‑Membro em que o pedido foi apresentado, a fim de não adiar mais essa análise através da adoção e da execução de uma decisão de transferência ( 25 ).

77.

Esta análise é, em princípio, transponível, devido à identidade do mecanismo instituído no artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III. No entanto, como iremos demonstrar, em primeiro lugar, as circunstâncias do presente processo são tais que a transferência de responsabilidade em causa, longe de contribuir para a celeridade do procedimento, também o privaria da racionalidade, da objetividade e da equidade visadas pelo legislador da União no quadro deste regulamento.

78.

Em primeiro lugar, a transferência de responsabilidade exigida ao abrigo do artigo 23.o, n.o 3, do referido regulamento equivale a determinar o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido através de uma sanção. A partir do momento em que o Estado‑Membro não cumpre os prazos fixados nessa disposição, a transferência de responsabilidade é automática e opera independentemente das circunstâncias do caso concreto e das consequências humanas e materiais que ele implica. Como já referimos, o legislador da União não previu nenhuma exceção e não deixa qualquer margem de manobra às autoridades competentes.

79.

Assim, no caso em apreço, resulta claramente dos elementos do processo que a transferência de responsabilidade exigida ao abrigo do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III equivale mais a punir o incumprimento da República Italiana por uma regra formal, a saber, a regra processual prevista no artigo 23.o, n.o 2, deste regulamento ( 26 ), do que a responder a uma verdadeira «necessidade jurídica», uma vez que o pedido de proteção internacional apresentado em Itália, por mais criticável que possa ser, não passa de um artifício ( 27 ).

80.

Em segundo lugar, o caráter automático do mecanismo não permite ter em conta que a transferência de responsabilidade aqui equacionada diz respeito à análise de um pedido de proteção internacional que é um pedido, senão idêntico, pelo menos conexo com os dois pedidos anteriores apresentados por X nos Países Baixos. Estes têm o mesmo objeto, a saber, a concessão de uma proteção internacional, a mesma causa, isto é, a eventual existência de um risco de perseguição por motivos religiosos, e são apresentados pela mesma parte, a saber, X ( 28 ).

81.

Em terceiro lugar, o caráter automático deste mecanismo não permite igualmente ter em conta o facto de que o Reino dos Países Baixos se consideraram plenamente competentes para efeito da análise dos dois pedidos anteriores apresentados pelo interessado, em aplicação de um critério material, o do primeiro Estado‑Membro em que o pedido de proteção internacional foi apresentado, referido no artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III.

82.

Como demonstram a duração do processo de análise do primeiro pedido e as numerosas peças anexadas ao dossiê nacional de que o Tribunal de Justiça dispõe, os dois primeiros pedidos de proteção internacional foram, de resto, objeto de uma análise atenta por parte das autoridades administrativas e judiciais desse Estado‑Membro e levaram à adoção de duas decisões de indeferimento definitivas.

83.

Assim, na data em que X apresentou o seu terceiro pedido em Itália, a decisão de indeferimento do primeiro pedido, datada 5 de setembro de 2011, era definitiva e a sentença proferida pela Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos) estava revestida da autoridade do caso julgado. A decisão de indeferimento no que respeita ao segundo pedido, datada 11 de junho de 2014, era igualmente definitiva, uma vez que o recurso que estava pendente, interposto nesse órgão jurisdicional, não tinha efeito suspensivo ( 29 ).

84.

Nestas circunstâncias, se o objetivo procurado pelo legislador da União é efetivamente racionalizar e acelerar o tratamento dos pedidos de asilo através de uma determinação objetiva do Estado‑Membro responsável, então parece‑nos bastante evidente, tendo em conta o papel desempenhado pelas autoridades neerlandesas na apreciação dos pedidos de asilo do interessado, que estas autoridades são as melhor colocadas para analisar o terceiro pedido. Contrariamente à situação existente no processo que deu lugar ao Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab ( 30 ), a transferência de responsabilidade em causa, além do custo humano e financeiro que implica, não contribuirá para a celeridade do processo nem para a boa administração em geral. Porque ainda estamos num sistema de asilos nacionais, as autoridades italianas serão, com efeito, obrigadas a efetuar uma análise tão escrupulosa como a efetuada concomitantemente pelas autoridades neerlandesas a fim, por um lado, de apurar os factos e de avaliar o valor probatório dos documentos apresentados pelo interessado, com toda a complexidade que isso implica no âmbito dos pedidos de asilo e, por outro, de apreciar o pedido de proteção internacional apresentado por uma pessoa que nunca viram e com a qual nunca mantiveram contacto. Na hipótese em que o requerente estivesse vulnerável e se encontrasse numa situação de indigência, essa transferência de responsabilidade, na medida em que implica um novo processo de análise, é verdadeiramente respeitadora dos seus direitos?

85.

Além disso, ao transferir a responsabilidade da análise deste terceiro pedido para as autoridades italianas, expomo‑nos ao risco de estas adotarem uma decisão diferente das proferidas pelas suas homólogas neerlandesas no âmbito da análise dos dois primeiros pedidos, mesmo que estes pedidos, no seu conjunto, sejam conexos, ou até idênticos. Se isto multiplica as possibilidades para o requerente de asilo de obter uma decisão positiva, tal situação compromete a coerência e a unidade procuradas no âmbito do regime de asilo europeu, que se pretende comum, e acarreta um risco acrescido de «asylum shopping» que o sistema de Dublim visa evitar. Do mesmo modo, isso abre caminho para que cada novo Estado‑Membro competente no quadro da análise de um novo pedido de proteção internacional desempenhe o papel de «jurisdição de recurso» do Estado‑Membro anteriormente responsável.

86.

Em quarto lugar, o caráter automático do mecanismo não permite ter em conta os processos judiciais em curso nos Países Baixos, a saber, o procedimento de natureza administrativa pendente perante a Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos), bem como o procedimento de natureza penal instaurado na sequência da prática presumível de uma infração.

87.

Se a transferência de responsabilidade se opera em prazos imperativos e estritos, o mesmo não se passa com os processos judiciais em curso.

88.

É certo que o processo administrativo relativo à análise do segundo pedido está encerrado. No entanto, a investigação judicial iniciada no âmbito do recurso pode conduzir a uma reforma da decisão administrativa adotada, uma vez que o juiz de primeira instância está em condições de proceder a uma análise exaustiva e ex nunc tanto dos factos como das questões de ordem jurídica ( 31 ) e o tribunal de última instância estará em condições de acolher um fundamento de cassação. Por conseguinte, existe um risco de que o juiz a que se recorreu em primeiro lugar no Estado‑Membro requerente reforme a decisão pela qual o pedido de proteção internacional foi inicialmente indeferido, o que priva de sentido e de qualquer interesse uma transferência de responsabilidade.

89.

De qualquer modo, esta situação de facto assemelha‑se a uma situação de litispendência europeia e, tendo em conta a conexão, ou mesmo a identidade, dos pedidos de proteção internacional apresentados por X nos Países Baixos e na Itália, parece‑nos, nesse caso, que nenhum órgão jurisdicional de outro Estado‑Membro poderia ser validamente competente de um modo concorrente.

90.

No que respeita agora aos processos penais instaurados contra o requerente de asilo, é extremamente difícil prever, exceto nos casos mais simples e mais evidentes, qual o tratamento que será reservado ao processo e ao interessado, de forma que o automatismo da transferência de responsabilidade, que também é acompanhado, a prazo, por uma transferência do interessado, parece‑nos, também neste caso, inoportuno. Ainda que, no presente processo, os processos penais tenham conduzido a um arquivamento, noutras circunstâncias podem levar ao recurso a um juiz de instrução ou a uma formação de julgamento e, se for caso disso, à condenação do requerente.

91.

O jogo prioritário do procedimento penal não pode, portanto, ter como efeito paralisar a análise de um pedido de proteção internacional apresentado de novo.

92.

Então, de que modo, no âmbito de uma apreciação que se pretende racional e objetiva, não ter em conta esses processos e, igualmente, no âmbito do processo principal, o mandado de detenção europeu requerendo às autoridades italianas a entrega do interessado?

93.

Se, como veremos, a emissão, por um Estado‑Membro, de um mandado de detenção europeu contra um requerente de asilo não constitui, em si, um obstáculo a um processo de retomada a cargo, esta circunstância, porque se acumula com tantas outras, interfere de forma evidente com o desenrolar normal dos procedimentos previstos no Regulamento Dublim III.

94.

X apresentou o seu pedido de proteção internacional em Itália, em 23 de outubro de 2014, ou seja, apenas alguns dias após a emissão do mandado de detenção europeu emitido contra ele. A apresentação desse pedido não obstou à execução do mandado de detenção europeu ( 32 ). Como precisou o representante de X na audiência, as autoridades italianas procederam à detenção do interessado no início do mês de dezembro de 2014, ou seja, algumas semanas após a apresentação do seu pedido de asilo, antes de o colocar em detenção, por um período de dois meses, para efeitos da sua entrega às autoridades neerlandesas, uma vez que esta teve lugar em 30 de janeiro de 2015. Se é então censurado às autoridades italianas o facto de não terem requerido ao Reino dos Países Baixos a retomada a cargo de X, importa, contudo, referir que, nesse mesmo período, executaram o mandado de detenção europeu procedendo à entrega do interessado.

95.

Em circunstâncias como as do presente caso, transferir a responsabilidade da análise do pedido de proteção internacional para a Itália, quando, de forma quase simultânea, o Estado‑Membro entregou o interessado às autoridades neerlandesas, para efeitos de processos penais ( 33 ), faz algum sentido?

96.

Nenhuma disposição do Regulamento Dublim III permite resolver esta questão. Apenas o respeito pela dignidade humana e a prossecução dos objetivos visados pelo legislador da União no âmbito do estabelecimento de um regime de asilo europeu comum o permitem.

97.

Evocamos a dignidade humana, pois se este processo não dissesse respeito a um requerente de asilo, poderia assemelhar‑se a um jogo de pingue‑pongue.

98.

À luz destes elementos, e tendo em conta a multiplicidade e o caráter intrincado dos processos de natureza administrativa e judicial contra o interessado nos Países Baixos, consideramos que a objetividade que deve caracterizar o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional e a celeridade que deve ser observada no quadro desta análise exigem que sejam as autoridades melhor posicionadas que analisem o novo pedido apresentado por X, ou seja, as autoridades neerlandesas — cujas mais elevadas instâncias administrativas já se reconheceram plenamente competentes em aplicação de um critério material previsto no Regulamento Dublim III —, e não as que não cumpriram as suas obrigações ao não formularem um pedido para efeitos de retomada a cargo dentro dos prazos ( 34 ).

99.

Em segundo lugar, o caráter automático desta transferência de responsabilidade é dificilmente compatível com os princípios de cooperação leal e de solidariedade entre os Estados‑Membros que suportam o Sistema Europeu Comum de Asilo e o Regulamento Dublim III.

100.

Com efeito, em 2014, as autoridades competentes dos Estados‑Membros não podiam ignorar que o afluxo maciço de migrantes nas costas italianas submetia a uma pressão acrescida as administrações responsáveis pelo asilo desse Estado‑Membro, o que se traduzia por atrasos estruturais e tinha, nomeadamente, o efeito de atrasar o tempo de reação e alongar o tempo de resposta aos pedidos para efeitos de (re)tomada a cargo deste último. Ao transferir automaticamente esta responsabilidade em razão de incumprimento dos prazos fixados, estamos longe, confessemos, da procurada solidariedade «real e concreta» ( 35 ).

101.

Tendo em conta todas estas considerações, estimamos que é, por conseguinte, necessário prever uma derrogação à aplicação estrita da letra do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III e à transferência de responsabilidade daí decorrente quanto à análise do terceiro pedido, a fim de preservar o efeito útil deste regulamento.

102.

Num caso como o que está em causa, a fim de preservar o efeito útil do referido regulamento e, em particular, a fim de racionalizar o tratamento dos pedidos de proteção internacional, propomos a aplicação do princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais.

103.

Este princípio, como sabemos, constitui a pedra angular do espaço de liberdade, de segurança e de justiça ( 36 ), do qual a política de asilo faz parte ( 37 ).

104.

O referido princípio é aplicável no quadro dos processos previstos nos artigos 23.o e 24.o do Regulamento Dublim III, sempre que um Estado‑Membro decide solicitar a retomada a cargo de um requerente de proteção internacional ao qual já foi recusado o asilo noutro Estado‑Membro, por decisão definitiva.

105.

Nos termos do artigo 23.o, n.o 1, deste regulamento, se uma pessoa visada no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), do referido regulamento, cujo pedido de proteção internacional foi indeferido por decisão definitiva num Estado‑Membro, apresentar um novo pedido de proteção internacional num outro Estado‑Membro, esse Estado‑Membro pode, assim, solicitar ao primeiro Estado‑Membro que retome a seu cargo a pessoa em causa.

106.

Em conformidade com o artigo 24.o, n.o 4, do Regulamento de Dublim III, quando uma pessoa visada no artigo 18.o, n.o 1, alínea d), deste regulamento, cujo pedido de proteção internacional foi indeferido por decisão definitiva num Estado‑Membro, se encontrar no território de outro Estado‑Membro sem título de residência, o segundo Estado‑Membro pode solicitar ao primeiro Estado‑Membro que retome a seu cargo a pessoa em causa ou que instaure um processo de regresso nos termos da Diretiva 2008/115.

107.

Atualmente, os Estados‑Membros acordam em reconhecer as decisões relativas ao asilo emitidas por outros Estados‑Membros quando estas são negativas.

108.

No caso em apreço, quando X apresentou às autoridades italianas o terceiro pedido, em 23 de outubro de 2014, as autoridades neerlandesas já tinham proferido uma decisão revestida da autoridade do caso julgado, desde 27 de junho de 2013, através da qual indeferiram o primeiro pedido. O Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) também negou provimento, por decisão de 7 de julho de 2014, ao recurso que o interessado tinha interposto da decisão de indeferimento relativa ao segundo pedido.

109.

A partir do momento em que as autoridades neerlandesas se reconheceram competentes para decidir sobre os pedidos de proteção internacional apresentados pelo interessado, e isso em aplicação de um critério material, que, além disso, adotaram em relação ao primeiro pedido uma decisão definitiva, a qual adquiriu força de caso julgado na sequência de um acórdão proferido pela jurisdição administrativa suprema, isso deve interromper a análise de qualquer novo pedido de proteção internacional apresentado pelo interessado noutro Estado‑Membro que não assente em elementos ou factos novos. Em razão da aplicação do princípio de reconhecimento mútuo, esse Estado‑Membro deve tomar em consideração a autoridade do caso julgado associada às decisões proferidas e deve, por conseguinte, tornar, ipso facto, inadmissível qualquer novo pedido, na aceção do artigo 33.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva 2013/32.

110.

Recordamos que, por força desta disposição, um Estado‑Membro pode considerar um pedido de proteção internacional como inadmissível quando o pedido em questão for um pedido posterior no qual não surge nem é apresentado pelo requerente nenhum elemento nem nenhum facto novos. Como já salientámos, pensamos que é esse o caso no processo principal. Cabe, no entanto, às autoridades competentes assegurarem‑se disso.

111.

As trocas de informações estabelecidas no âmbito do Regulamento Dublim III tornam este mecanismo perfeitamente viável, uma vez que o Estado requerido ao abrigo da retomada a cargo de um requerente dispõe, em conformidade com as obrigações referidas no artigo 24.o, n.o 5, deste regulamento — ou está em condições de dispor, mediante pedido, nos termos do artigo 34.o do referido regulamento —, de todas as informações úteis no que respeita à existência de um procedimento relativo a um pedido de proteção internacional anterior (data e local de apresentação de um pedido de proteção internacional anterior, estado de avanço do processo, teor e data da decisão) ( 38 ).

112.

A aplicação do princípio do reconhecimento mútuo permitiria aqui um funcionamento mais racional, mais eficaz e mais coerente do Regime Europeu Comum de Asilo, na medida em que, uma vez estabelecida a responsabilidade de um Estado‑Membro para a análise de um pedido de proteção internacional, esta seria mantida de modo estável, o que permitiria assegurar a celeridade do processo, evitar que sejam proferidas decisões contraditórias e limitar os movimentos secundários do requerente em razão de uma transferência de responsabilidade.

113.

Esta solução mais não faria de facto do que antecipar as propostas da Comissão sobre a reforma do sistema de Dublim ( 39 ). No âmbito da sua proposta de regulamento que altera o Regulamento Dublim III, a Comissão propõe, com efeito, introduzir a regra segundo a qual, quando um Estado‑Membro tiver analisado um pedido de proteção internacional enquanto Estado‑Membro responsável, deverá igualmente continuar a ser responsável pela análise dos pedidos posteriores apresentados pelo interessado, quer este tenha ou não deixado o território dos Estados‑Membros ou dele tenha sido afastado ( 40 ). Um único Estado‑Membro é e permaneceria então responsável pela análise de um pedido e os critérios de responsabilidade só se aplicariam uma única vez. Além disso, a Comissão propõe a introdução da regra segundo a qual a expiração de um prazo deixará de implicar uma transferência de responsabilidades.

114.

Se essas propostas fossem adotadas, o pedido de decisão prejudicial apresentado pelo rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) perderia o seu interesse.

115.

Atendendo a todas estas considerações, e tendo em conta as circunstâncias particulares do processo principal, considero que a aplicação do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III e a transferência de responsabilidade daí decorrente quanto à análise do pedido de proteção internacional apresentado pelo interessado em Itália, na medida em que privam o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável da racionalidade, da objetividade, da equidade bem como da celeridade procuradas no âmbito deste regulamento e não são compatíveis com os princípios da cooperação leal e da solidariedade entre os Estados‑Membros em que assenta o regime de asilo europeu comum, devem ser rejeitadas.

B.   Sobre a legalidade do pedido para efeitos de retomada a cargo dirigido a Itália pelas autoridades neerlandesas com fundamento no artigo 24.o do Regulamento Dublim III (primeira e sexta questões prejudiciais)

116.

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se em seguida sobre a legalidade do pedido para efeitos de retomada a cargo apresentado pelas autoridades neerlandesas às suas homólogas italianas com fundamento no artigo 24.o do Regulamento Dublim III (apresentação de um pedido quando qualquer novo pedido só foi apresentado no Estado‑Membro requerente).

117.

A situação de X é, desta vez, abrangida pelo artigo 18.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento Dublim III. Esta disposição refere‑se a uma pessoa que, por um lado, apresentou um pedido de proteção internacional, que está em curso de análise e que, por outro lado, apresentou um pedido noutro Estado‑Membro ou então se encontra, sem título de residência, no território de outro Estado‑Membro.

118.

Uma pessoa como X que, após ter apresentado um pedido de proteção internacional noutro Estado‑Membro, a saber, no caso em apreço a Itália, regressa ilegalmente ao território de outro Estado‑Membro, a saber, os Países Baixos, sem aí apresentar um novo pedido de proteção internacional, é efetivamente abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 24.o do Regulamento Dublim III.

119.

Um procedimento de retomada a cargo é desencadeado com fundamento no artigo 24.o, n.o 1, desse regulamento por opção dos Estados‑Membros, como resulta da expressão «pode solicitar», usada nesta disposição pelo legislador da União, e tem por objeto organizar uma transferência de responsabilidade quanto à análise de um pedido de proteção internacional.

120.

A questão que nos dirige o órgão jurisdicional de reenvio, coloca, portanto, a hipótese de o Tribunal de Justiça dever afastar a transferência de responsabilidade resultante da aplicação do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III.

121.

Em especial, esse órgão jurisdicional pede ao Tribunal de Justiça que precisa as modalidades de aplicação do artigo 24.o, n.o 1, desse regulamento.

122.

O órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se, portanto, se essa disposição se opõe à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo quando o Estado‑Membro requerente tenha sido responsável pela análise dos pedidos de proteção internacional anteriormente apresentados pelo interessado, quando, além disso, é chamado a conhecer de um processo de recurso pendente relativo à decisão pela qual um desses pedidos foi rejeitado e quando, por último, emitiu um mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal contra o interessado, exigindo ao Estado‑Membro requerido que proceda à entrega deste último.

123.

Cada uma dessas circunstâncias considerada individualmente não obsta, em si, à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo. Estas circunstâncias serão examinadas sucessivamente.

1. O Estado‑Membro requerente foi responsável pela análise de um pedido de proteção internacional anteriormente apresentado pelo interessado

124.

Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III não se opõe à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo quando o Estado‑Membro requerente tenha sido responsável pela análise de um pedido de proteção internacional anteriormente apresentado pelo interessado.

125.

Com efeito, num acórdão recente, proferido após o termo da fase escrita do processo que é objeto das presentes conclusões, o Tribunal de Justiça declarou que se pode aplicar o procedimento previsto no artigo 24.o do Regulamento Dublim III, a uma pessoa que, «quando de uma primeira residência no território [do Estado‑Membro requerente, apresentou] um pedido de proteção internacional que foi indeferido ao abrigo do disposto no artigo 26.o, n.o 1,[do Regulamento Dublim III]» ( 41 ). Segundo o Tribunal de Justiça, uma vez que este pedido já não está a ser analisado neste Estado‑Membro, essa pessoa não pode ser considerada como alguém que tenha apresentado um novo pedido de proteção internacional ( 42 ). Impõe‑se observar que esta interpretação do artigo 24.o, n.o 1, deste regulamento abrange uma situação como a que está em causa, em que tinha sido apresentado e analisado no Estado‑Membro requerente um pedido de proteção internacional anteriormente apresentado pelo interessado, pedido esse que foi indeferido.

2. O Estado‑Membro requerente é chamado a conhecer de um processo de recurso ainda pendente

126.

O Tribunal de Justiça declarou igualmente que o facto de a decisão através da qual foi indeferido um pedido de proteção internacional apresentado quando de uma primeira residência no território do Estado‑Membro requerente ser objeto de um recurso ainda pendente num dos seus órgãos jurisdicionais, não exclui a aplicação do artigo 24.o do Regulamento Dublim III, «uma vez que, na falta de efeito suspensivo da interposição deste recurso, se deve considerar que esta decisão produz os efeitos que decorrem deste regulamento e, por conseguinte, que implica o encerramento do procedimento administrativo iniciado na sequência do pedido de proteção internacional» ( 43 ).

127.

Esta interpretação do artigo 24.o do referido regulamento aplica‑se, por conseguinte, a fortiori, numa situação como a que está em causa, em que o recurso interposto contra a decisão de indeferimento de 11 de junho de 2014 é desprovido de efeito suspensivo.

3. O Estado‑Membro requerente emitiu um mandado de detenção europeu

128.

Importa agora analisar a questão de saber se o artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III se opõe à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo quando o Estado‑Membro requerente tiver emitido um mandado de detenção europeu contra o requerente de asilo, exigindo ao Estado‑Membro requerido que proceda à entrega deste último.

129.

O Tribunal de Justiça não se pronunciou sobre essa questão e nenhuma disposição do Regulamento Dublim III prevê tal hipótese.

130.

A priori, a emissão, por um Estado‑Membro, de um mandado de detenção europeu contra um requerente de asilo não parece constituir um obstáculo à apresentação por esse Estado‑Membro de um pedido para efeitos de retomada a cargo desse requerente.

131.

O procedimento administrativo destinado à análise de um pedido de proteção internacional e o processo penal instaurado contra um requerente de asilo constituem dois processos distintos e nada se opõe, à primeira vista, a que, após ter exercido o seu direito soberano de perseguir aquele que cometeu uma infração no seu território, o Estado‑Membro de emissão do mandado de detenção europeu se vire para quem considera responsável para efeitos de análise do pedido de proteção internacional do interessado.

132.

No entanto, será em vão pensar‑se que a emissão de um mandado de detenção europeu não interferirá com o procedimento de retomada a cargo do requerente de asilo por outro Estado‑Membro.

133.

Com efeito, o procedimento de retomada a cargo, tal como referido no artigo 24.o do Regulamento Dublim III, deve ser efetuado dentro de prazos estritos, que, em nossa opinião, dificilmente se combinam com a natureza de exercício da ação penal (no caso de um mandado de detenção europeu emitido para efeitos de procedimento penal) ou com a duração da pena privativa de liberdade (no caso de um mandado de detenção europeu emitido para efeitos da execução de uma pena).

134.

Em primeiro lugar, em conformidade com o artigo 24.o, n.o 2, deste regulamento, o pedido de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea b), do referido regulamento deve ser apresentado o mais rapidamente possível e, de qualquer modo, no prazo de dois meses a contar da receção do acerto do Eurodac ou três meses se o pedido foi baseado noutros elementos de prova. Estes prazos são imperativos.

135.

Em segundo lugar, por força do artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublim III, se este pedido for deferido, a transferência da pessoa em causa deve ser efetuada logo que possível e, de qualquer modo, no prazo de seis meses a contar dessa aceitação ( 44 ), podendo o prazo ser alargado até um ano, no máximo, em razão da detenção da pessoa em causa. Se a transferência não for efetuada no prazo de um ano, o Estado‑Membro responsável é liberado da sua obrigação de retomada a cargo do interessado.

136.

Por conseguinte, quando um Estado‑Membro emite um mandado de detenção europeu contra um requerente de proteção internacional, este pode, na sequência da entrega do interessado, requerer a sua retomada a cargo ao Estado‑Membro que considera responsável pela análise do seu pedido, desde que o pedido seja formulado dentro dos prazos previstos no artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III e que, em caso de aceitação do Estado‑Membro requerido, a transferência seja efetuada em conformidade com os prazos referidos no artigo 29.o, n.os 1 e 2, deste regulamento.

137.

No caso de o mandado de detenção europeu ser emitido para efeitos do exercício de processos penais, é bastante difícil de compreender em que medida será possível respeitar essas condições, com exceção do caso em que, como no presente, os processos penais são rapidamente arquivados.

138.

No caso de o mandado de detenção europeu ser emitido para efeitos de execução de uma pena privativa de liberdade, em contrapartida, é bastante evidente que a apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo só fará sentido se a pena prevista for de curta duração.

139.

À luz destes elementos, somos, portanto, de opinião que a emissão de um mandado de detenção europeu não constitui em si um obstáculo à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo se os prazos previstos no artigo 24.o, n.o 2, e no artigo 29.o, n.os 1 e 2, do Regulamento Dublim III forem respeitados.

140.

Em nossa opinião, esta apreciação é igualmente válida numa situação como a que está em causa, em que o Estado‑Membro de execução do mandado de detenção europeu, que procede à entrega do interessado às autoridades do Estado‑Membro de emissão, é igualmente o Estado‑Membro requerido por este último para efeitos de retomada a cargo do interessado.

141.

No termo desta análise, parece‑nos, por conseguinte, que cada uma das circunstâncias invocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, considerada individualmente, não se opõe, em si, à apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo.

142.

Em contrapartida, conjuntamente consideradas, constituem, em nossa opinião, um obstáculo fundamental a tal procedimento de retomada a cargo.

143.

Com efeito, por razões idênticas às que referimos nos n.os 71 a 98 das presentes conclusões, quando as autoridades competentes do Estado‑Membro requerente, em primeiro lugar, foram responsáveis pela análise dos pedidos de proteção internacional apresentados pelo requerente quando de uma primeira residência no território desse Estado, em segundo lugar, foram chamadas a conhecer de um recurso interposto ainda pendente contra a decisão através da qual um desses pedidos foi indeferido e, em terceiro lugar, emitiram um mandado de detenção europeu contra o requerente, exigindo do Estado‑Membro requerido, para efeitos de retomada a cargo, e em cujo território este se encontra, que proceda à sua entrega, pensamos que um procedimento de retomada a cargo com base no artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III priva o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável da racionalidade, da objetividade, da equidade e da celeridade procuradas no âmbito desse regulamento e não é compatível com os princípios da cooperação leal e da solidariedade entre os Estados‑Membros em que assenta o regime de asilo europeu comum.

C.   Quanto ao alcance das obrigações que incumbem ao Estado‑Membro responsável por força do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III (segunda e terceira questões prejudiciais)

144.

Com a sua segunda e terceira questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a precisar as obrigações que recaem sobre o Estado‑Membro requerente quanto à análise de um pedido de proteção internacional cuja responsabilidade lhe incumbe, quando esse Estado‑Membro apresenta, na aceção do artigo 24.o do Regulamento Dublim III, um pedido para efeitos de retomada a cargo do requerente.

145.

Em especial, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre a questão de saber se, uma vez apresentado o pedido para efeitos de retomada a cargo, o Estado‑Membro requerente deve, por força do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, suspender a análise em curso do pedido e de lhe pôr termo, retirando ou modificando a decisão pela qual a autoridade nacional competente indeferiu este pedido no termo do prazo previsto no artigo 24.o deste regulamento.

146.

Se for caso disso, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se esse incumprimento é suscetível de se opor à retomada a cargo pelo Estado‑Membro requerido.

147.

Sabemos que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à interpretação do artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, um Estado‑Membro pode efetivamente dar início a um procedimento de retomada a cargo do requerente de asilo, mesmo na hipótese em que as suas autoridades jurisdicionais são chamadas a conhecer de um processo de recurso no âmbito da análise de um pedido de proteção internacional de que ainda tem a responsabilidade ( 45 ).

148.

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, por conseguinte, sobre a natureza das obrigações que incumbem ao Estado‑Membro requerente quanto ao tratamento em curso desse pedido.

149.

A análise desta questão suscita uma primeira dificuldade relativa ao prazo referido pelo órgão jurisdicional de reenvio. Na falta de esclarecimentos na decisão de reenvio, supomos que se trata do prazo de dois meses previsto no artigo 24.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublim III ( 46 ), tendo o Reino dos Países Baixos, neste caso, formulado o seu pedido para efeitos de retomada a cargo com base num acerto resultante da consulta ao sistema Eurodac.

150.

Ora, pensamos que este prazo não é aqui pertinente. Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑nos sobre as obrigações que incumbem ao Estado‑Membro requerente «imediatamente após a apresentação do pedido para efeitos de retomada a cargo» ( 47 ). Ora, o prazo previsto no artigo 24.o, n.o 2, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublim III é o prazo limite no qual esse pedido deve ser apresentado.

151.

A análise desta questão suscita uma segunda dificuldade. Com efeito, as obrigações que impendem sobre o Estado‑Membro requerente quanto à análise de um pedido de proteção internacional cuja responsabilidade lhe incumbe não devem ser examinadas com base nas disposições específicas previstas no artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, mas com base nas disposições gerais, estabelecidas no âmbito da Diretiva 2013/32.

152.

Com efeito, o Regulamento Dublim III não prevê disposições especiais sempre que o Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentar, em simultâneo, um pedido para efeitos de retomada a cargo do requerente de asilo com fundamento no seu artigo 24.o, n.o 1.

153.

Quanto ao artigo 18.o do Regulamento Dublim III, não é aplicável devido ao seu alcance limitado. Se essa disposição tem por objeto, como o seu título indica, fixar as «[o] brigações do Estado‑Membro responsável», as obrigações que institui inscrevem‑se no âmbito específico de um procedimento de tomada a cargo e de retomada a cargo, como resulta expressamente dos termos do n.o 1 desta disposição. Ora, as obrigações das autoridades neerlandesas quanto à análise do segundo pedido não se inscrevem no âmbito de um procedimento de tomada a cargo ou de retomada a cargo.

154.

A fim de fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil, proponho, portanto, ao Tribunal de Justiça que analise a questão que nos dirigiu à luz dos princípios e garantias fundamentais previstas pela Diretiva 2013/32.

155.

As obrigações que recaem sobre o Estado‑Membro requerente quanto à apreciação do pedido de proteção internacional cuja responsabilidade lhe incumbe impõem‑se, em nosso entender, de forma evidente ( 48 ).

156.

Deve, em primeiro lugar, realizar uma análise completa e adequada do pedido e o mais rapidamente possível, em conformidade com o direito a uma boa administração consagrado no artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ( 49 ) e em conformidade com o artigo 31.o da Diretiva 2013/32 ( 50 ).

157.

No âmbito do processo de recurso, o Estado‑Membro requerente deve, em segundo lugar, garantir o respeito do direito a um recurso jurisdicional efetivo, consagrado no artigo 47.o da Carta e no artigo 46.o da Diretiva 2013/32, o que implica que o juiz, pelo menos nos processos de recurso num tribunal de primeira instância, proceda a uma análise exaustiva e ex nunc tanto da matéria de facto como dos aspetos de ordem jurídica, incluindo, se for caso disso, a uma apreciação das necessidades de proteção internacional ( 51 ).

158.

O processo de análise do pedido de asilo deve, pois, seguir o seu curso.

159.

A apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo não figura entre os motivos suscetíveis de justificar a suspensão do processo de análise ( 52 ). O que tem o seu sentido, na medida em que se trata de dois processos distintos, baseando‑se, um, num pedido de proteção internacional apresentado anteriormente no Estado‑Membro requerente e, o outro, num pedido de proteção internacional apresentado sucessivamente junto das autoridades do Estado‑Membro requerido.

160.

A apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo também não constitui um motivo suscetível de justificar a alteração ou a retirada da decisão, individual, objeto do processo de recurso em causa. Embora essa decisão de indeferimento do pedido de proteção internacional não seja, certamente, criadora do direito para o interessado, uma vez que se trata de uma decisão de indeferimento de um pedido de asilo, não é menos verdade que a mesma produz efeitos — como reconheceu o Tribunal de Justiça no Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan ( 53 ) — e que só o juiz pode, oficiosamente e por motivos referentes à legalidade intrínseca do ato recorrido, anular ou reformar essa decisão.

161.

A apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo concomitantemente com um processo de recurso pendente no Estado‑Membro requerente suscita dificuldades, de resto, já por nós evocadas.

162.

O curso do procedimento de retomada a cargo não é o mesmo que o do processo judicial. Se o primeiro está inserido dentro de prazos estritos e extremamente curtos, o segundo não tem outros prazos a observar que não os de um prazo razoável.

163.

O processo judicial pode, assim, durar — o contencioso do Tribunal de Justiça assim o demonstra — e, quando chegar a um termo, pode implicar a anulação ou a reforma da decisão impugnada.

164.

Isso comporta o risco de que o juiz a que se recorreu em primeiro lugar no Estado‑Membro requerente reforme a decisão pela qual o pedido de proteção internacional foi inicialmente indeferido, o que priva de sentido e de qualquer interesse a retomada a cargo do requerente de asilo por outro Estado‑Membro.

165.

Isso implica, igualmente, o risco de se verificar uma situação de litispendência europeia se os pedidos de proteção internacional apresentados no Estado‑Membro requerente e no Estado‑Membro requerido forem idênticos. Neste caso, pensamos que nenhuma jurisdição do Estado‑Membro requerido pode ser, de um modo concorrente, validamente competente.

166.

Todavia, trata‑se de dificuldades que nenhum texto do regime de asilo europeu comum aborda. Tendo em conta o alcance da questão submetida e dos limites relativos ao respeito do princípio do contraditório, não desenvolveremos aqui as soluções possíveis.

167.

Gostaríamos, contudo, de precisar que, na medida em que não é possível diferir a apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo a partir do momento em que o Estado‑Membro requerente teve conhecimento de que outro Estado‑Membro pode ser responsável — uma vez que os prazos fixados no artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III, são imperativos —, cabe então ao Estado‑Membro requerente assegurar‑se de que a jurisdição a que se recorreu se pronunciará o mais rapidamente possível, a contar do momento em que um pedido para efeitos de retomada a cargo do requerente de asilo é apresentado, e isso em aplicação do artigo 46.o, n.o 10, da Diretiva 2013/32.

168.

Quanto à atitude correta a adotar pelo Estado‑Membro requerido, é ainda necessário que ele seja informado da existência, no Estado‑Membro requerente, de um processo de recurso pendente. Ora, como veremos, este último não é obrigado, por força do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III, a mencionar, no âmbito do seu pedido para efeitos de retomada a cargo, o estado de avanço de um processo de análise de um pedido de proteção internacional.

169.

Nesta fase da nossa análise, propomos, assim, ao Tribunal de Justiça que declare que as disposições conjugadas dos artigos 31.o e 46.o da Diretiva 2013/32, bem como as dos artigos 41.o e 47.o da Carta, devem ser interpretadas no sentido de que, uma vez que o pedido para efeitos de retomada a cargo seja apresentado ao Estado‑Membro requerido, em conformidade com o artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, o Estado‑Membro requerente é obrigado a levar a seu termo, no prazo o mais curto possível, o processo de análise de um pedido de proteção internacional cuja responsabilidade lhe incumbe.

D.   Quanto ao alcance da obrigação de informação que incumbe ao Estado‑Membro requerente por força do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III (quarta e quinta questões prejudiciais)

170.

Com a quarta e quinta questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio debruça‑se sobre o alcance da obrigação de informação que incumbe ao Estado‑Membro requerente quando este formule um pedido para efeitos de retomada a cargo com base no artigo 24.o do Regulamento Dublin III.

171.

Em especial, o juiz de reenvio pergunta se, nos termos do artigo 24.o, n.o 5, deste regulamento, o Estado‑Membro requerente deve informar o Estado‑Membro requerido da existência de um processo de recurso pendente, no quadro da análise de um pedido de proteção internacional cuja responsabilidade lhe incumbia. O órgão jurisdicional de reenvio pretende, com efeito, saber se as autoridades neerlandesas não cumpriram as suas obrigações ao não indicar às autoridades italianas de que a decisão que indeferiu o segundo pedido era ainda objeto de um recurso pendente na Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos).

172.

Se for caso disso, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se esse incumprimento é suscetível de se opor à retomada a cargo pelo Estado‑Membro requerido.

173.

Encontramos no Regulamento Dublim III duas disposições relativas às informações a partilhar entre os Estados‑Membros no âmbito de um processo de (re)tomada a cargo, ou seja, o artigo 24.o, n.o 5, bem como o artigo 34.o do referido regulamento.

174.

Importa, desde já, excluir a aplicação do artigo 34.o do regulamento, na falta de um pedido de informações formulado pela República Italiana.

175.

Este artigo, que se insere no capítulo VII do Regulamento Dublim III, relativo à «[c]ooperação administrativa», tem por epígrafe «Partilha de informações» e só é acionado, como resulta claramente dos seus n.os 1 e 6, a pedido de um Estado‑Membro. Assim, ainda que o artigo 34.o, n.o 2, alínea g), deste regulamento abranja uma informação como a que está em causa relativa à existência de um processo pendente no âmbito da análise de um pedido de proteção internacional anterior ( 54 ), não é menos verdade que, no processo principal, a República Italiana não solicitou às autoridades neerlandesas essa informação.

176.

É necessário, então, considerar as obrigações que incumbem ao Estado‑Membro requerente ao abrigo do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III, cujas normas de execução estão previstas no artigo 2.o do regulamento de aplicação.

177.

Nos termos destas disposições, o pedido para efeitos de retomada a cargo da pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea b), deve ser apresentado utilizando o formulário previsto no Anexo III do regulamento de execução. Este formulário deve expor a natureza, os fundamentos e a base jurídica do pedido.

178.

Este deve, além disso, incluir, consoante o caso, uma cópia de todos os elementos de prova e indícios que permitem presumir a responsabilidade do Estado‑Membro requerido para a análise do pedido de proteção internacional, a que podem ser juntas as declarações do interessado e/ou o acerto do Eurodac. As provas e indícios são descritos no artigo 22.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III e uma lista está estabelecida no Anexo II do regulamento de aplicação.

179.

Em conformidade com o texto do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III, todos esses dados devem permitir «às autoridades do Estado‑Membro requerido verificar se é responsável, com base nos critérios definidos no [presente regulamento]».

180.

Ora, a existência, no Estado‑Membro requerente, de um recurso pendente contra uma decisão de indeferimento de um pedido de proteção internacional não está abrangido pelo âmbito dos critérios com base nos quais o Estado‑Membro requerido se pode basear para apreciar a sua responsabilidade. Com efeito, como o Tribunal de Justiça declarou, tal circunstância não constitui um obstáculo a um processo de retomada a cargo ( 55 ).

181.

Examinemos, agora, o conteúdo do formulário com base no qual o Estado requerente apresenta o seu pedido para efeitos de retomada a cargo que figura no Anexo III do regulamento de aplicação.

182.

Verificamos que, além das informações relativas à base jurídica do pedido e à identidade do requerente de asilo, o Estado‑Membro requerente é, nos termos do n.o 12 desse formulário, obrigado a informar o Estado‑Membro requerido dos «[p]rocessos de asilo anteriores». O n.o 12 é apresentado da seguinte forma:

«O requerente de asilo já alguma vez solicitou asilo […] no país de residência ou noutro país?

sim/não

Quando e onde?

Este pedido foi objeto de uma decisão?

não/não sabe/sim, indeferido

Data da decisão»

183.

Se interpretarmos de forma estrita o n.o 12 do referido formulário, o Estado‑Membro requerente só é obrigado a especificar se o requerente já tiver apresentado um pedido de proteção internacional junto das suas autoridades ou das de outro Estado‑Membro e se este foi objeto de uma decisão, assinalando com uma cruz a menção «não», a menção «não sabe» ( 56 ) ou ainda a menção «sim, indeferido», se for caso disso, indicando a data da mesma.

184.

O Estado‑Membro requerente não é obrigado, em si, a explicar a situação de um processo, em especial as fases judiciais do mesmo. Parece, portanto, que as autoridades neerlandesas não tinham a obrigação de especificar a existência de um procedimento de recurso pendente relativo à decisão de indeferimento de 11 de junho de 2014.

185.

Esta menção não tem, aliás, o seu lugar entre as provas e os outros indícios que o Estado‑Membro requerente é obrigado a fornecer. Com efeito, também neste caso, essas provas e indícios devem demonstrar que o Estado‑Membro requerido é efetivamente responsável à luz dos critérios enunciados no Regulamento Dublim III. Ora, como vimos, uma circunstância como a que está em causa não faz parte desses critérios.

186.

Para ser completo, precisamos que as provas, que são enumeradas de forma exaustiva ( 57 ) na lista A do Anexo II do regulamento de aplicação, são provas formais que devem poder demonstrar, por exemplo, que um membro da família do requerente, menor não acompanhado, reside legalmente no território do Estado‑Membro requerido (cópia do título de residência no contexto do artigo 8.o do Regulamento Dublim III), ou ainda que o requerente entrou efetivamente em situação irregular no território do Estado‑Membro requerido por uma fronteira externa (cópia do carimbo de entrada num passaporte falsificado no contexto do artigo 13.o, n.o 1, deste regulamento).

187.

Quanto aos indícios, que são objeto de uma enumeração não exaustiva na lista B do Anexo II do regulamento de aplicação, deve tratar‑se de elementos indicativos que permitam apreciar a responsabilidade de um Estado‑Membro, com base nos critérios estabelecidos no Regulamento Dublim III, tais como declarações pormenorizadas do requerente, relatórios elaborados por uma organização internacional ou ainda bilhetes de transporte ou faturas de hotel.

188.

Por conseguinte, não pensamos que, nos termos do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III, as autoridades neerlandesas não tenham cumprido as suas obrigações ao não indicar, no seu pedido, que a decisão de 11 de junho de 2014, pela qual o segundo pedido tinha sido indeferido, era objeto de um recurso ainda pendente na Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos).

189.

Esta omissão é, em contrapartida, mais criticável, em nosso entender, tendo em conta o princípio da cooperação leal subjacente ao Regulamento Dublim III, nada se opondo a que as autoridades neerlandesas o refiram a título de «[o]bservações», referidas em pé de página do formulário constante do Anexo III do regulamento de aplicação.

190.

Tendo em conta estas considerações, o artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento Dublim III deve ser interpretado no sentido de que o Estado‑Membro que requer a retomada a cargo de um requerente de proteção internacional não viola as obrigações que lhe incumbem quando omite precisar ao Estado‑Membro requerido que a decisão pela qual indeferiu o pedido apresentado pelo interessado quando de uma primeira residência no território de um Estado‑Membro é objeto de um recurso perante os tribunais.

E.   Quanto ao alcance da cláusula discricionária prevista no artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III (sexta questão prejudicial)

191.

Com a sua sexta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III deve ser interpretado no sentido de que exige a um Estado‑Membro, não designado como responsável através dos critérios enunciados no capítulo III deste regulamento, que analise um pedido de proteção internacional se o requerente lhe tiver sido entregue em execução de um mandado de detenção europeu.

192.

Noutros termos, na hipótese de a República Italiana se ter tornado o Estado‑Membro responsável, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se as autoridades neerlandesas não eram obrigadas a analisar elas próprias o pedido de proteção internacional em causa fazendo uso desta cláusula discricionária, na medida em que, em execução do mandado de detenção europeu que emitiram contra X, este lhes foi entregue pelas autoridades italianas.

193.

Todos os interessados que apresentaram observações no Tribunal de Justiça consideram que o artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III deve ser interpretado no sentido de que exclui essa obrigação.

194.

Também somos dessa opinião, em razão do âmbito de aplicação desta disposição e dos termos absolutamente claros desta.

195.

Há que recordar que, nos termos do artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III, um pedido de asilo é analisado por um único Estado‑Membro, que é aquele que os critérios enunciados no capítulo III deste regulamento designarem como responsável.

196.

O capítulo IV do Regulamento Dublim III identifica as situações em que um Estado‑Membro pode ser considerado responsável pela análise de um pedido de asilo, prevendo exceções a estes critérios. O artigo 17.o deste regulamento, sob a epígrafe «Cláusulas discricionárias», dispõe no seu n.o 1, primeiro parágrafo, que «cada Estado‑Membro pode decidir analisar um pedido de proteção internacional que lhe seja apresentado por um nacional de um país terceiro […], mesmo que essa análise não seja da sua competência por força dos critérios definidos no [presente regulamento] ( 58 )».

197.

Há que referir, desde já, que a cláusula enunciada nesta disposição se dirige aos Estados‑Membros nos quais um pedido de proteção internacional «seja apresentado por um nacional de um país terceiro».

198.

Uma situação como a que está em causa, em que o pedido de proteção internacional foi apresentado num Estado‑Membro diferente daquele a que esta disposição se destina, no caso vertente, a República Italiana, não está, portanto, abrangida pelo campo de aplicação da referida disposição.

199.

De qualquer modo, e na hipótese de a situação em causa dever ser abrangida pelo campo de aplicação do artigo 17.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublim III, há que recordar que a cláusula nesta disposição constitui, como indica claramente o título desta disposição, uma cláusula discricionária.

200.

Ao enunciar que «cada Estado‑Membro pode decidir analisar um pedido de proteção internacional» ( 59 ), esta disposição traduz sem ambiguidade a intenção do legislador da União de deixar à discrição dos Estados‑Membros a possibilidade de proceder à análise de um pedido, que não seja da sua competência por força dos critérios de determinação estabelecidos no âmbito do Regulamento Dublim III, e não de uma obrigação. Resulta claramente da própria redação da referida disposição que o exercício dessa faculdade não está dependente de nenhuma condição particular ( 60 ).

201.

Com base nos trabalhos preparatórios do Regulamento Dublim III, o Tribunal de Justiça considerou, assim, que esta regra foi introduzida a fim de permitir a cada Estado‑Membro decidir soberanamente, em função de considerações políticas, humanitárias ou práticas, aceitando analisar um pedido de asilo mesmo que não seja responsável em aplicação dos critérios definidos nesse regulamento ( 61 ).

202.

Assim, no Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o. ( 62 ), relativo à transferência de um requerente de asilo gravemente doente para o Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido, o Tribunal de Justiça declarou que o Estado‑Membro requerente, se se aperceber de que o estado de saúde do requerente não poderia melhorar a curto prazo, ou que a suspensão do procedimento durante um longo período exporia ao risco de agravar o seu estado, «pode optar por analisar ele próprio o pedido do interessado utilizando a "cláusula discricionária" prevista no artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento Dublim III», mas que, em caso algum, esta disposição implica uma obrigação de a ele recorrer ( 63 ).

203.

Esta interpretação assenta na preocupação de preservar a função desta cláusula discricionária e a margem de apreciação deixada ao Estado‑Membro requerente. Deve, pois, ser transposta para a situação em que o Estado‑Membro, no qual é apresentado um pedido de proteção internacional, emite um mandado de detenção europeu contra o requerente ( 64 ).

204.

Tendo em conta estes elementos, há que concluir que o artigo 17.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento Dublim III não é aplicável a uma situação como a que está em causa no processo principal em que o pedido de proteção internacional foi apresentado num Estado‑Membro diferente daquele a que esta disposição se dirige.

VII. Conclusão

205.

Tendo em conta as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pelo Rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) do seguinte modo:

1)

Tendo em conta as circunstâncias particulares do processo principal, a aplicação do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou um apátrida, e a transferência de responsabilidade daí decorrente quanto à análise do pedido de proteção internacional apresentado pelo interessado em Itália, na medida em que privam o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável da racionalidade, da objetividade, da equidade e da celeridade visadas no âmbito do Regulamento n.o 604/2013 e não são compatíveis com os princípios da cooperação leal e da solidariedade entre os Estados‑Membros em que assenta o regime de asilo europeu comum, devem ser rejeitadas.

2)

Tendo em conta as circunstâncias particulares do processo principal, a apresentação de um pedido para efeitos de retomada a cargo, com fundamento no artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento n.o 604/2013 priva o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável da racionalidade, da objetividade, da equidade e da celeridade visadas no âmbito do Regulamento n.o 604/2013 e não é compatível com os princípios da cooperação leal e da solidariedade entre os Estados‑Membros em que assenta o regime de asilo europeu comum, quando as autoridades competentes do Estado‑Membro requerente, em primeiro lugar, foram responsáveis pela análise dos pedidos de proteção internacional apresentados pelo requerente quando de uma primeira residência no território desse Estado, em segundo lugar, são chamadas a conhecer de um recurso ainda pendente interposto contra a decisão através da qual um dos pedidos foi indeferido e, em terceiro lugar, emitiram um mandado de detenção europeu contra o requerente, exigindo do Estado‑Membro requerido para efeitos de retomada a cargo, e em cujo território este se encontra, que proceda à sua entrega.

3)

As disposições conjugadas dos artigos 31.o e 46.o da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional, bem como dos artigos 41.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, devem ser interpretadas no sentido de que, uma vez que seja apresentado o pedido para efeitos de retomada a cargo no Estado‑Membro requerido, em conformidade com o artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento n.o 604/2013, o Estado‑Membro requerente é obrigado a levar a seu termo, no prazo o mais curto possível, o processo de análise de um pedido de proteção internacional cuja responsabilidade lhe incumba.

4)

O artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento n.o 604/2013 deve ser interpretado no sentido de que o Estado‑Membro que requeira a retomada a cargo de um requerente de proteção internacional não viola as obrigações que lhe incumbem quando omite precisar ao Estado‑Membro requerido que a decisão pela qual indeferiu o pedido apresentado pelo interessado quando de uma primeira residência no seu território é objeto de recurso ainda pendente perante os seus tribunais.

5)

O artigo 17.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 604/2013 não é aplicável a uma situação como a que está em causa no processo principal, em que o pedido de proteção internacional foi apresentado num Estado‑Membro diferente daquele ao qual esta disposição se dirige.

VIII. Anexo

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( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) JO 2013, L 180, p. 31, a seguir «Regulamento Dublim III».

( 3 ) V. quadro jurídico e factual apresentado em anexo às presentes conclusões.

( 4 ) A seguir «primeiro pedido».

( 5 ) A seguir «segundo pedido».

( 6 ) A seguir «terceiro pedido».

( 7 ) V. proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida [COM(2016) 270 final, a seguir «proposta de regulamento»].

( 8 ) A seguir «Estado‑Membro responsável».

( 9 ) Regulamento da Comissão, de 2 de setembro de 2003, relativo às modalidades de aplicação do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 222, p. 3), com a redação que lhe foi dada pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 118/2014 da Comissão, de 30 de janeiro de 2014 (JO 2014, L 39, p. 1, a seguir «regulamento de aplicação»).

( 10 ) No âmbito da nossa análise, não teremos este em conta.

( 11 ) Informações fornecidas pelas partes na audiência.

( 12 ) C‑63/15, EU:C:2016:409.

( 13 ) Tomamos nota do facto de que, na audiência, a Comissão declarou retirar as suas observações relativas à invocabilidade, por um requerente de proteção internacional, no âmbito de um processo judicial, das disposições que preveem, por um lado, os prazos previstos no Regulamento Dublim III e, por outro lado, a cooperação entre os serviços dos Estados‑Membros.

( 14 ) Tendo em conta os desenvolvimentos que figuram, nomeadamente, nos n.os 3.2 e 3.3 da decisão de reenvio, bem como o teor da sexta questão prejudicial, optámos por reorientar a primeira questão sobre a interpretação do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III, e depois tratar separadamente a questão relativa à interpretação do artigo 24.o deste regulamento.

( 15 ) Embora este aspeto não resulte expressamente da formulação da primeira questão, resulta dos desenvolvimentos que figuram no n.o 3.2 da decisão de reenvio.

( 16 ) V. Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o. (C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127, n.o 56).

( 17 ) V., neste sentido, Acórdão de 25 de outubro de 2017, Shiri (C‑201/16, EU:C:2017:805, n.o 39, sublinhado nosso). No Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab (C‑670/16, EU:C:2017:587), o Tribunal de Justiça declarou que, «embora as disposições do artigo 21.o, n.o 1, deste regulamento [(apresentação de um pedido para efeitos de tomada a cargo)] visem regular o procedimento de tomada a cargo, contribuem também, à semelhança dos critérios enunciados no capítulo III do referido regulamento, para determinar o Estado‑Membro responsável, na aceção do mesmo regulamento» (n.o 53).

( 18 ) V. Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35, n.os 62 e 63 e jurisprudência referida).

( 19 ) V. Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab (C‑670/16, EU:C:2017:587). No n.o 61 desse acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que «o artigo 21.o, n.o 1, [terceiro parágrafo,] do [Regulamento Dublim III] […] prevê, em caso de expiração dos prazos previstos nos dois parágrafos que o precedem, a transferência de pleno direito da responsabilidade para o Estado‑Membro ao qual o pedido de proteção internacional tiver sido apresentado, sem subordinar essa transferência a qualquer reação do Estado‑Membro requerido».

( 20 ) Nos termos do artigo 67.o, n.o 2, TFUE, a União desenvolve uma política comum em matéria de asilo, baseada na solidariedade entre os Estados‑Membros. O artigo 80.o TFUE estabelece que a política de asilo da União é regida pelo princípio da solidariedade e da partilha equitativa de responsabilidades entre os Estados‑Membros.

( 21 ) V. Conclusões do Conselho da União Europeia «Justiça e Assuntos Internos», de 8 de março de 2012, sobre um quadro comum de solidariedade genuína e prática para com os Estados‑Membros confrontados com pressões especiais nos seus sistemas de asilo, nomeadamente através de fluxos migratórios mistos, adotadas pelo Conselho na sua 3151.a reunião.

( 22 ) V., neste sentido, Acórdão de 10 de dezembro de 2013, Abdullahi (C‑394/12, EU:C:2013:813, n.o 53 e jurisprudência referida).

( 23 ) V. n.o 58 das presentes conclusões.

( 24 ) C‑670/16, EU:C:2017:587.

( 25 ) Ibidem (n.o 54). V. igualmente, por analogia, Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35), no qual o Tribunal de Justiça retoma esta jurisprudência no âmbito da interpretação do artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento Dublim III.

( 26 ) Com efeito, é pacífico que a República Italiana não apresentou um pedido para efeitos de retomada a cargo dirigido ao Reino dos Países Baixos nos prazos fixados no artigo 23.o, n.o 2, do referido regulamento, pelo que estes consideraram‑na como sendo o Estado‑Membro responsável. Além disso, é igualmente admitido que a República Italiana não respondeu no prazo de duas semanas, quer dizer, no prazo fixado no artigo 25.o, n.o 2, deste regulamento, ao pedido de retomada a cargo que lhe foi enviado pelo Reino dos Países Baixos, de modo que este pedido foi considerado tacitamente aceite.

( 27 ) X opõe‑se atualmente à sua transferência para o referido Estado‑Membro. Como confirmou o seu representante na audiência, X apresentou um pedido de proteção internacional em Itália a fim de obter meios de subsistência. Não é de excluir, em nossa opinião, que a apresentação deste pedido tenha tido por finalidade obstar à execução do mandado de detenção europeu.

( 28 ) Apesar de um escalonamento no tempo destes pedidos, não pensamos que o pedido de proteção internacional apresentado na Itália se baseie em factos ou elementos novos relativamente aos dois primeiros pedidos analisados nos Países Baixos. Em primeiro lugar, a brevidade da análise efetuada pelas autoridades neerlandesas no que respeita ao segundo pedido demonstra que não há nenhum elemento novo suscetível de inverter a decisão de indeferimento em relação ao primeiro pedido. Na audiência, o representante de X confirmou, aliás, que este segundo pedido tinha sido fundamentado apenas em resultado de uma mudança de política nos Países Baixos. Em segundo lugar, é difícil imaginar que os factos e os elementos em que assenta o terceiro pedido, apresentado em 23 de outubro de 2014, tenham sofrido uma alteração substancial desde 7 de julho de 2014, data em que o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Haia, sede de Amesterdão, Países Baixos) se pronunciou sobre o indeferimento do segundo pedido.

( 29 ) Como o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35), «na falta de efeito suspensivo da interposição [de um] recurso [no órgão jurisdicional competente, deve considerar‑se que a decisão de indeferimento de um pedido de proteção internacional apresentado durante uma primeira estadia no território do Estado‑Membro em causa produz os seus efeitos], como decorrem [do Regulamento Dublim III], e, por conseguinte, que implica o encerramento do procedimento administrativo iniciado na sequência da apresentação do pedido de proteção internacional.» (n.o 50).

( 30 ) C‑670/16, EU:C:2017:587.

( 31 ) V. artigo 46.o, n.o 3, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180 p. 60).

( 32 ) Entre os motivos de não execução do mandado de detenção europeu indicados nos artigos 3.o e 4.o da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros (JO 2002, L 190, p. 1), não figura a existência de um pedido de asilo nem de um pedido de concessão do estatuto de refugiado ou de proteção subsidiária [v. Acórdão de 21 de outubro de 2010, B. (C‑306/09, EU:C:2010:626, n.o 43)].

( 33 ) À data em que o Reino dos Países Baixos enviou à República Italiana um pedido para efeitos de retomada a cargo, esses processos não tinham ainda sido objeto de arquivamento.

( 34 ) Além disso, é também duvidoso que tal incumprimento não devesse ser entendido de outra forma, em particular, pela Comissão, que teria evidentemente em conta a pressão migratória exercida sobre as autoridades italianas e os dispositivos específicos, como o da recolocação, entretanto criado. Em resposta à situação de crise na Itália, o Conselho adotou duas decisões de recolocação, que foram aplicadas até ao mês de setembro de 2017, a saber, a Decisão (UE) 2015/1523 do Conselho, de 14 de setembro de 2015, que estabelece medidas provisórias a favor da Itália e da Grécia no domínio da proteção internacional (JO 2015, L 239, p. 146), e a Decisão (UE) 2015/1601 do Conselho, de 22 de setembro de 2015, que estabelece medidas provisórias no domínio da proteção internacional a favor da Itália e da Grécia (JO 2015, L 248, p. 80).

( 35 ) Não conviria, além disso, que os Estados‑Membros pudessem tirar partido do atraso dos Estados‑Membros sujeitos a forte pressão migratória para concluir pela existência de uma transferência de responsabilidade.

( 36 ) V. ponto 3.1. da Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, Como conseguir uma Europa aberta e segura [COM(2014) 154 final], intitulado «Consolidação do Sistema Europeu Comum de Asilo (SECA)», que enuncia: «[p]odem ser desenvolvidas novas regras sobre o reconhecimento mútuo das decisões em matéria de asilo entre os Estados‑Membros, bem como um enquadramento para a transferência de proteção em consonância com o objetivo do Tratado de criação de um estatuto uniforme válido em toda a UE. Tal permitiria reduzir os obstáculos à circulação na UE e facilitar a transferência através das fronteiras internas dos benefícios relacionados com a proteção» (p. 8). V., igualmente, relatório do Parlamento Europeu, de 9 de janeiro de 2015, intitulado «New Approaches, Alternative Avenues and Means of Access to Asylum Procedures for Persons Seeking International Protection», que retoma esta citação (p. 58).

( 37 ) O princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais é igualmente aplicável em matéria de afastamento. V., a este respeito, Diretiva 2001/40/CE do Conselho, de 28 de maio de 2001, relativa ao reconhecimento mútuo de decisões de afastamento de nacionais de países terceiros (JO 2001, L 149, p. 34), e Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2008, L 348, p. 98).

( 38 ) Os casos em que um Estado‑Membro pode recusar esta comunicação são limitados e enumerados taxativamente no artigo 34.o, n.o 3, do Regulamento Dublim III (proteção dos seus interesses essenciais ou proteção das liberdades e dos direitos fundamentais da pessoa em causa ou de outrem).

( 39 ) V. nota de pé de página 7 das presentes conclusões.

( 40 ) V. considerando 25, bem como o artigo 3.o, n.o 5, e o artigo 20.o da proposta de regulamento.

( 41 ) V. Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 48, sublinhado nosso).

( 42 ) V. Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 49).

( 43 ) V. Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 50).

( 44 ) Ou a contar da decisão final sobre o recurso ou revisão, nos casos em que o efeito suspensivo é concedido nos termos do artigo 27.o, n.o 3, desse regulamento.

( 45 ) V. Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 50).

( 46 ) Nos termos dessa disposição, o pedido de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.o, n.o 1, alínea b), deste regulamento, cujo pedido de proteção internacional não tenha sido indeferido por decisão definitiva, é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac.

( 47 ) V. segunda questão prejudicial (sublinhado nosso).

( 48 ) No caso em apreço, o Reino dos Países Baixos é e continuará a ser, apesar do processo de retomada a cargo, o Estado‑Membro responsável pela análise do pedido, segundo o qual um recurso para a Afdeling bestuursrechtspraak van de Raad van State (Secção de Contencioso Administrativo do Conselho de Estado, Países Baixos) estava ainda pendente no momento da apresentação do terceiro pedido em Itália.

( 49 ) A seguir «Carta».

( 50 ) Por força desta disposição, os Estados‑Membros devem tratar os pedidos de proteção internacional no âmbito de uma análise adequada e exaustiva e garantir que esse procedimento seja concluído o mais rapidamente possível. Em princípio, o prazo é de seis meses a contar da apresentação do pedido. Quando o pedido está sujeito ao procedimento definido no âmbito do Regulamento Dublim III, o prazo começa a correr a partir do momento em que o Estado‑Membro responsável foi determinado e em que o requerente se encontrar no território desse Estado‑Membro e tiver sido tomado a cargo pela autoridade competente. De qualquer modo, os Estados‑Membros devem concluir o processo de análise no prazo máximo de 21 meses a contar da apresentação do pedido.

( 51 ) V. artigo 46.o, n.o 3, desta diretiva.

( 52 ) V., a este respeito, os casos visados no artigo 31.o da referida diretiva.

( 53 ) C‑360/16, EU:C:2018:35 (n.o 50).

( 54 ) Nos termos do artigo 34.o, n.o 1, e n.o 2, alínea g), do Regulamento Dublim III, um Estado‑Membro é obrigado a comunicar os dados pessoais do requerente, bem como qualquer informação relativa à «data de apresentação de um eventual pedido de proteção internacional anterior, a data de apresentação do pedido atual, a situação do processo e, eventualmente, o teor da decisão tomada» a quaisquer Estados‑Membros «que o solicitem». Haveria que garantir que a menção relativa à «situação do processo» se refere ao pedido de proteção internacional anterior.

( 55 ) V. Acórdão de 25 de janeiro de 2018, Hasan (C‑360/16, EU:C:2018:35, n.o 50).

( 56 ) Pensamos que esta menção se refere à situação em que o pedido de proteção internacional tenha sido apresentado num Estado‑Membro diferente daquele que requer a retomada a cargo, não dispondo necessariamente este último Estado‑Membro das informações relativas à situação do processo no primeiro Estado‑Membro.

( 57 ) Nos termos do artigo 22.o, n.o 3, alínea a), ii), do Regulamento Dublim III, os Estados‑Membros devem apresentar ao Comité referido no artigo 44.o deste regulamento modelos dos diferentes tipos de documentos administrativos, de acordo com a tipologia estabelecida na lista de provas formais.

( 58 ) Sublinhado nosso.

( 59 ) Sublinhado nosso.

( 60 ) Os termos coincidem essencialmente com os da cláusula de soberania que figurava no artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 50, p. 1).

( 61 ) Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o. (C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127, n.o 53), bem como proposta de regulamento do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro [COM(2001) 447 final].

( 62 ) C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127.

( 63 ) Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o. (C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127, n.o 88, sublinhado nosso).

( 64 ) Assim, na hipótese em que o Estado‑Membro requerente devesse emitir um mandado de detenção europeu contra o requerente, exigindo do Estado‑Membro designado responsável através dos critérios enunciados no capítulo III do Regulamento Dublim III, e em cujo território o requerente se encontra, de o entregar para efeitos de processos penais, o Estado‑Membro requerente pode optar por analisar ele próprio o pedido de proteção internacional, fazendo uso da cláusula discricionária prevista no artigo 17.o, n.o 1, primeiro parágrafo, deste regulamento. Tal permitiria, nomeadamente, integrar os processos de natureza penal e administrativa, num único local e evitar uma nova transferência do interessado, obstando a atrasos. Não é menos verdade que, independentemente das vantagens de uma tal integração, que o Estado‑Membro requerente não é obrigado a aplicar esta cláusula discricionária.

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