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Document 62016TJ0763

    Acórdão do Tribunal Geral (Quinta Secção) de 12 de abril de 2018.
    PY contra EUCAP Sahel Niger.
    Cláusula compromissória — Pessoal das missões internacionais da União Europeia — Litígios relativos aos contratos de trabalho — Processos de inquérito interno — Proteção das vítimas em caso de denúncia de uma situação de assédio — Responsabilidade contratual.
    Processo T-763/16.

    ECLI identifier: ECLI:EU:T:2018:181

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

    12 de abril de 2018 ( *1 )

    «Cláusula compromissória — Pessoal das missões internacionais da União Europeia — Litígios relativos aos contratos de trabalho — Processos de inquérito interno — Proteção das vítimas em caso de denúncia de uma situação de assédio — Responsabilidade contratual»

    No processo T‑763/16,

    PY, representado por S. Rodrigues e A. Tymen, advogados,

    demandante,

    contra

    EUCAP Sahel Niger, representada por E. Raoult e M. Vicente Hernandez, advogados,

    recorrida,

    que tem por objeto um pedido baseado no artigo 272.o TFUE e destinado a obter a condenação da EUCAP Sael Níger a indemnizar o demandante pelos danos que este sofreu devido a um incumprimento contratual cometido pela EUCAP Sael Níger,

    O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

    composto por D. Gratsias, presidente, A. Dittrich e P. G. Xuereb (relator), juízes,

    secretário: G. Predonzani, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 26 de outubro de 2017,

    profere o presente

    Acórdão

    Antecedentes do litígio

    1

    A EUCAP Sael Níger (a seguir «Missão») é uma missão de política comum de segurança e defesa (PCSD) criada pela Decisão 2012/392/PESC do Conselho, de 16 de julho de 2012, relativa à Missão PCSD da União Europeia no Níger (EUCAP Sael Níger) (JO 2012, L 187, p. 48), alterada pela última vez pela Decisão (PESC) 2017/1253 do Conselho, de 11 de julho de 2017 (JO 2017, L 179, p. 15).

    2

    Nos termos do artigo 2.o da Decisão 2012/392, conforme alterada pela Decisão (PESC) 2016/1172 do Conselho, de 18 de julho de 2016 (JO 2016, L 193, p. 106), no contexto da execução da Estratégia da União Europeia para a Segurança e o Desenvolvimento no Sael, a Missão tem por objetivo permitir às autoridades nigerinas definir e aplicar a sua própria Estratégia Nacional de Segurança. A Missão tem igualmente por objetivo contribuir para o desenvolvimento, entre os diversos intervenientes nigerinos do setor da segurança ativos na luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada, de uma abordagem integrada, pluridisciplinar, coerente, sustentável e assente nos direitos humanos. A Missão presta assistência às autoridades centrais e locais e forças de segurança nigerinas no desenvolvimento de políticas, técnicas e procedimentos para melhor controlar e lutar contra a migração irregular.

    3

    Nos termos do artigo 7.o, n.o 3, da Decisão 2012/392, a Missão recruta, numa base contratual, pessoal internacional e local, caso as funções requeridas não possam ser asseguradas pelo pessoal destacado pelos Estados‑Membros. O artigo 7.o, n.o 4, da referida decisão prevê que as condições de trabalho e os direitos e obrigações do pessoal internacional e local são estipulados nos contratos entre a Missão e os membros do pessoal em causa.

    4

    O artigo 12.o‑A da Decisão 2012/392, que foi introduzido pelo artigo 1.o, ponto 6, da Decisão 2014/482/PESC do Conselho, de 22 de julho de 2014, que altera a Decisão 2012/392 (JO 2014, L 217, p. 31), prevê que, na medida do que for necessário para dar execução a esta última decisão, a Missão tem a capacidade de adquirir serviços e fornecimentos, celebrar contratos e convénios administrativos, contratar pessoal, ser titular de contas bancárias, adquirir e alienar bens, liquidar obrigações e estar em juízo.

    5

    O demandante, PY, é um antigo membro do pessoal da Missão. Em 31 de janeiro de 2014, o demandante assinou um contrato de trabalho com a Missão relativo a um posto de agente responsável pelo aprovisionamento para o período compreendido entre 30 de janeiro de 2014 e 15 de julho de 2014. Em seguida, o demandante assinou um segundo contrato de trabalho que abrangia o período compreendido entre 16 de julho de 2014 e 15 de julho de 2015 e, posteriormente, um terceiro contrato de trabalho para o período compreendido entre 16 de julho de 2015 e 15 de julho de 2016.

    6

    Segundo os termos dos contratos de trabalho do demandante, o código de conduta e de disciplina da Missão (a seguir «código de conduta») faz parte integrante dos referidos contratos.

    7

    O código de conduta estabelece, em primeiro lugar, um determinado número de regras de comportamento que devem ser respeitadas por todos os membros do pessoal da Missão (n.os 1 a 6), incluído o dever de não sujeitar outros colegas a assédio (n.o 2.5) e a intimidações (n.o 2.6), e, em segundo lugar, o procedimento a seguir em caso de violação destas regras (n.os 7 a 8).

    8

    O n.o 2.5 do código de conduta tem a seguinte redação:

    «O assédio difere do assédio sexual na medida em que não se baseia necessariamente no género. Ao contrário das intimidações, um simples incidente pode ser considerado constitutivo de assédio e vários tipos de comportamento ilustram‑no. É considerado assédio, no âmbito deste documento: qualquer ato ou conduta, incluindo palavras, gestos ou a produção, exibição ou difusão de escritos, fotografias ou qualquer outro material se este ato ou conduta não for desejado pelo funcionário e se puder razoavelmente ser considerado ofensivo, humilhante ou intimidante.»

    9

    O n.o 7.1, sob a epígrafe «Comunicação de infrações», prevê o seguinte:

    «Os casos de má conduta podem conduzir a medidas e ações disciplinares, devendo ser instaurados os procedimentos adequados […] Cada membro da Missão tem o direito e a obrigação de apresentar uma queixa por escrito ao chefe de Missão […] relativamente a qualquer alegado caso de má conduta, práticas ilícitas ou incompetência.»

    10

    Nos termos do n.o 8.4.1 do código de conduta, no caso de uma alegada violação das regras em causa «comunicada ou detetada», o chefe‑adjunto de Missão supervisiona a condução de um inquérito preliminar e nomeia um agente responsável pela apreciação do processo. Em conformidade com o n.o 8.4.2 do código de conduta, este realiza uma apreciação do alegado incidente, reunindo as versões deste incidente apresentadas, respetivamente, pelo queixoso, pelas testemunhas e pelas vítimas. Segundo o n.o 8.4.4 do código de conduta, deve ser enviado um relatório preliminar de inquérito ao chefe‑adjunto de Missão no prazo de dez dias. Caso este relatório confirme a existência de uma violação das regras em causa, é aberto um inquérito aprofundado, em conformidade com o n.o 8.5 do código de conduta, que dá origem a um relatório final de inquérito. Se este relatório confirmar que ocorreu uma violação das regras em causa, é constituído um conselho disciplinar para apreciar as consequências de natureza disciplinar que devem ser aplicáveis.

    11

    Nos termos do artigo 21.o do segundo e terceiro contratos de trabalho do demandante, os litígios decorrentes destes contratos, ou relativos aos mesmos, são da competência do Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo do artigo 272.o TFUE.

    12

    Em 15 e 16 de dezembro de 2014, realizaram‑se reuniões de um comité de avaliação criado na Missão que tinham por objeto um procedimento por negociação relativo a um contrato‑quadro para serviços aéreos para a Missão. O demandante assegurava a sua presidência.

    13

    Em 16 de dezembro de 2014, tendo tomado conhecimento de um incidente ocorrido nas referidas reuniões, o chefe do departamento «Apoio à Missão», G., enviou um correio eletrónico ao demandante no qual lhe pediu informações a este respeito.

    14

    O demandante respondeu a este pedido por correio eletrónico de 16 de dezembro de 2014, através do qual explicou que tinha tido um diferendo importante com outro membro do comité de avaliação, X., sobre a questão de saber se uma das três propostas a avaliar cumpria as condições impostas pela Missão. Segundo o demandante, X. tinha sugerido que as sérias dúvidas manifestadas pelo demandante a este respeito se deviam a um preconceito deste contra a empresa que tinha apresentado a referida proposta. O demandante acrescentou que o comité de avaliação tinha acabado por decidir pedir esclarecimentos à empresa em causa. No seu correio eletrónico de 16 de dezembro de 2014, o demandante não revelou a identidade de X.

    15

    Em 19 de dezembro de 2014, o comité de avaliação decidiu, tendo em conta os esclarecimentos recebidos da empresa em causa, que a proposta desta não cumpria as condições que deviam ser respeitadas no caso em apreço e recomendou que o contrato fosse adjudicado a outra empresa. O relatório de 22 de dezembro de 2014, através do qual o comité de avaliação informou a Comissão Europeia do resultado dos seus trabalhos, foi igualmente assinado por X.

    16

    Em 7 de fevereiro de 2015, o demandante enviou um correio eletrónico ao chefe da administração interino da Missão, M., para informá‑lo de determinados comportamentos de X. que o demandante considerava «inadequados entre colegas, uma vez que eram […] desrespeitosos em relação à U[nião] […], a outras [u]nidades da [a]dministração [e] a alguns missionários (entre os quais [ele] mesmo)». Em primeiro lugar, X. perguntou‑lhe, perante pessoas externas à Missão, e utilizando o termo «elas», onde se encontravam duas mulheres que trabalhavam para a Missão que estavam ausentes nesse dia. Segundo o demandante, esta observação poderia ser facilmente considerada sexista pelas testemunhas da cena. Em segundo lugar, X. entrou no seu gabinete sem bater à porta e perguntou, fazendo referência a um formulário da Missão, e num tom acusatório e desdenhoso, «quem [tinha escrito] aquilo». Em terceiro lugar, X. entrou no seu gabinete com um documento, sem bater à porta, e, de forma provocatória e desrespeitosa, perguntou «é aqui que deixo isto?» Em quarto lugar, X. deu a entender ao demandante que considerava que as regras de avaliação da Missão eram «imbecis» (ou «estúpidas»). No seu correio eletrónico, o demandante evocou a possibilidade de poder sentir‑se obrigado a apresentar oficialmente uma queixa ao chefe de Missão.

    17

    Na sua resposta de 9 de fevereiro de 2015, M., atendendo ao caráter sério dos termos do seu correio eletrónico, propôs ao demandante três opções entre as quais era convidado a escolher. A primeira era, antes de mais, organizar uma reunião com o demandante, em seguida com X. e, por último, com o demandante e X., com o objetivo de esclarecer a situação e de encontrar uma solução para o futuro. A segunda era, antes de mais, organizar uma reunião com o demandante, em seguida com X. e, por último, com o demandante, X. e um representante do setor dos recursos humanos da Missão, com o objetivo de esclarecer a situação e de encontrar uma solução para o futuro. Um relatório ou uma nota seriam elaborados e anexados aos processos pessoais do demandante e de X. A terceira era que o demandante apresentasse uma queixa oficial ao chefe de Missão.

    18

    O demandante respondeu a este correio eletrónico através de outro correio eletrónico enviado no mesmo dia. Neste correio eletrónico, o demandante informou M. de um novo incidente com X. Segundo o demandante, este tinha entrado no seu gabinete sem bater à porta. Quando o demandante lhe explicou que esperava que X. batesse à porta antes de entrar no seu gabinete, este «utilizou o seu dedo para fazer círculos junto ao lado direito da sua cabeça (um sinal autoexplicativo)». O demandante acrescentou que, quando indicou a X. que era a última vez que abria a sua porta sem bater, este interrompeu‑o para, com um grande sorriso, proferir a frase «estás a ameaçar‑me».

    19

    Além disto, neste correio eletrónico, o demandante informou M. do facto de que, após este incidente, sentiu‑se mal e dirigiu‑se à enfermeira, que lhe deu um medicamento. Acrescentou que tinha sofrido algumas vertigens por causa do medicamento ou por causa do que considerava uma forma de «assédio moral» e que, por isso, não poderia de forma alguma responder à proposta que M. lhe tinha feito. Não obstante, o demandante informou este último que confiava no seu julgamento e que, caso M. chegasse à conclusão de que existia um problema sério que devia ser submetido ao chefe de Missão, agradecia que o informasse «também [em] [s]eu nome, até que [ele se] sen[tisse] melhor para apresentar uma queixa oficial». O demandante acrescentou que, caso M. considerasse que podia ser encontrada uma solução a nível da administração, preferiria naturalmente tal solução. Todavia, insistiu para que, neste caso, M. refletisse nas medidas provisórias que poderiam ser tomadas para garantir a sua proteção, ou seja, proibir X. de entrar no seu gabinete e de lhe dirigir a palavra até que uma solução fosse encontrada.

    20

    Na sua resposta de 10 de fevereiro de 2015, M. informou o demandante que, «tendo o dever de solicitude, e atendendo ao caráter sério dos factos relatados [por ele], pens[ava] que não [tinha] outra alternativa senão transmitir o [s]eu correio eletrónico ao [chefe de Missão] e [ao seu adjunto], as únicas autoridades competentes na Missão responsáveis pelo código de conduta e para tratar deste tipo de questão disciplinar». O chefe de Missão e o chefe‑adjunto de Missão foram destinatários deste correio eletrónico.

    21

    Mais tarde no dia 10 de fevereiro de 2015, o chefe‑adjunto de Missão, S., enviou um correio eletrónico ao chefe de Missão para informá‑lo que o demandante «se queixa[va] do comportamento de [X.]» e que os acontecimentos dos últimos dias levaram a que o demandante «sofresse uma degradação do seu estado de saúde». S. explicou que, embora neste tipo de situação fosse difícil determinar o que se tinha efetivamente passado, afigurava‑se difícil não ter em consideração os factos denunciados pelo demandante. Por conseguinte, S. indicou ao chefe de Missão que, «[p]ara esclarecer totalmente [estes factos], suger[ia] que estas diferentes mensagens fossem consideradas uma queixa que implica a abertura de um procedimento disciplinar» e que «[o] inquérito preliminar permitir[ia] determinar se a denúncia [tinha] fundamento ou não». S. acrescentou que, caso o chefe de Missão ordenasse esta medida, tomaria providências para desencadear o inquérito preliminar relativamente aos alegados factos de assédio ou de intimidações.

    22

    Num correio eletrónico enviado mais tarde em 10 de fevereiro de 2015, o chefe de Missão concordou com a proposta de S. O chefe de Missão informou igualmente S. que considerava que também era necessário, paralelamente ao inquérito preliminar, organizar uma reunião entre M., o demandante e X.

    23

    No entanto, não foi aberto nenhum inquérito preliminar na sequência desta troca de correios eletrónicos e não foi realizada qualquer reunião entre M., o demandante e X.

    24

    Entre 19 de junho e 6 de julho de 2015 e entre 1 e 24 de agosto de 2015, o demandante estava de licença.

    25

    Num correio eletrónico de 25 de agosto de 2015, enviado ao chefe de Missão, o demandante referiu que M. tinha informado o chefe de Missão de factos graves que constituíam um assédio moral por parte de X., mas que não tinha sido ouvido nem pelo chefe de Missão nem por uma comissão disciplinar. Alegando que o comportamento de X. a seu respeito continuava a contribuir para a formação de um ambiente de trabalho degradado, prejudicial à sua saúde, o demandante pediu ao chefe de Missão para informá‑lo das medidas que pretendia adotar para pôr termo a essa situação.

    26

    No mesmo dia, o chefe de Missão respondeu que tinha comunicado os factos relatados pelo demandante, em fevereiro de 2015, ao chefe‑adjunto de Missão, na sua qualidade de responsável pela disciplina, em conformidade com o n.o 8.4.1 do código de conduta, e que, dado que não tinha tido qualquer resposta das partes interessadas, tinha ficado com a perceção de que o chefe‑adjunto de Missão tinha sido capaz de resolver o litígio de forma amigável. O chefe de Missão acrescentou que, como tinha constatado nesse momento que tal não tinha sido o caso, tinha considerado como queixa oficial o correio eletrónico do demandante de 25 de agosto de 2015.

    27

    Num correio eletrónico de 28 de agosto de 2015, enviado ao chefe de Missão, o demandante alegou que, após as reuniões do comité de avaliação realizadas em dezembro de 2014, X. tinha dado provas de um «ódio permanente, sendo qualquer atividade propícia para o denegrir, repreender, rebaixar, humilhar mesmo em público e perante o [s]eu pessoal». Além disso, o demandante informou a Missão de que, numa data não especificada, em fevereiro ou em março de 2015, X. entrou no seu gabinete e agrediu‑o fisicamente derramando chá a ferver sobre as suas pernas.

    28

    Por carta de 28 de agosto de 2015, o chefe de Missão informou o demandante que, na sequência da queixa que este tinha apresentado em 25 de agosto de 2015 contra X., tinha decidido enviar esta queixa «para competência disciplinar» ao chefe‑adjunto interino de Missão. Além disso, o chefe de Missão informou o demandante na referida carta que tinha tomado a decisão de proibir X. de se aproximar do demandante.

    29

    Num correio eletrónico de 30 de agosto de 2015, enviado ao chefe de Missão, o demandante referiu que «confirm[ava] as acusações de agressão física e [de] assédio por parte de [X.]» e pediu ao destinatário para considerar este correio eletrónico uma queixa oficial.

    30

    Num atestado emitido em 25 de agosto de 2015, um médico que o demandante tinha consultado no Níger concluiu que o estado de saúde deste exigia uma baixa por doença de sete dias. Num segundo atestado emitido em 27 de agosto de 2015, este médico explicou que o estado de saúde psíquico do demandante exigia um afastamento deste do seu local de trabalho. Na sequência da visita de controlo efetuada nesse mesmo dia, o médico concluiu que não havia melhorias, que o demandante evidenciava sofrimento psicológico e que era fortemente recomendado que regressasse à Europa para consultar um psiquiatra o mais rapidamente possível.

    31

    Em 29 de agosto de 2015, o demandante partiu da Missão para ser consultado num hospital em França.

    32

    Em 1 de setembro de 2015, o médico competente do hospital a que o demandante se dirigiu prescreveu uma baixa por doença até 14 de setembro de 2015. Em 9 de setembro de 2015, um psiquiatra consultado pelo demandante emitiu um atestado segundo o qual o demandante não estava em condições de retomar o seu trabalho antes de 25 de setembro de 2015. Esta baixa por doença foi prorrogada pelo mesmo médico várias vezes, a última vez até 16 de julho de 2016. Dois destes atestados, datados respetivamente de 14 de outubro e de 26 de novembro de 2015, faziam referência a um «estado depressivo grave».

    33

    Por correio eletrónico de 6 de outubro de 2015, a Missão informou o demandante de que, em aplicação do artigo 15.3 do seu contrato de trabalho, este deixaria de beneficiar de qualquer remuneração a partir de 30 de setembro de 2015, ou seja, 30 dias após o início da sua baixa por doença.

    34

    Por correio eletrónico de 8 de outubro de 2015, um membro do pessoal da Missão informou o demandante que tinha sido nomeado responsável pelo inquérito preliminar aberto na sequência da sua queixa contra X. e perguntou‑lhe se era possível regressar à Missão para uma audição e, em caso de resposta negativa, se tinha elementos adicionais a comunicar‑lhe e se podia indicar‑lhe os nomes das testemunhas que pretendia que fossem ouvidas.

    35

    Através dos seus advogados, o demandante forneceu informações adicionais à Missão.

    36

    Por carta de 26 de novembro de 2015, o chefe de Missão informou o demandante que o inquérito disciplinar contra X. se encontrava então encerrado, que o conselho de disciplina da Missão tinha considerado que existia uma infração ao código de conduta e proposto uma medida contra X. e, por último, que tinha confirmado a decisão do conselho de disciplina e aplicado a referida medida.

    37

    Em 25 de janeiro de 2016, o demandante apresentou, por intermédio dos seus advogados, um pedido de indemnização, com fundamento no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, dirigido à Missão.

    38

    Por carta de 8 de junho de 2016, a Missão informou o demandante de que o seu contrato não podia ser renovado para além de 15 de julho de 2016.

    39

    Em 11 de julho de 2016, por carta registada enviada para o endereço em França que o demandante tinha fornecido à Missão, um consultório médico francês, a pedido da Missão, convocou o demandante para um exame médico a realizar em 13 de julho de 2016. O envelope com essa convocatória foi devolvido ao referido consultório médico pelos correios, uma vez que não tinha sido levantada pelo demandante.

    40

    Num correio eletrónico de 15 de julho de 2016, a Missão informou o demandante da devolução da carta que continha uma convocatória para um exame médico. Indicou igualmente que os atestados médicos que lhe tinha apresentado após 1 de setembro de 2015 não respeitavam as regras enunciadas no seu contrato de trabalho e que, por conseguinte, a Missão questionava a sua validade.

    Tramitação do processo e pedidos das partes

    41

    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 31 de outubro de 2016, o demandante interpôs a presente ação.

    42

    No âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o, n.o 3, do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral pediu à Missão que apresentasse um documento. A Missão deu cumprimento a este pedido no prazo fixado.

    43

    Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Quinta Secção) decidiu dar início à fase oral do processo e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, pediu às partes que respondessem a determinadas questões. As partes deram cumprimento a este pedido no prazo fixado.

    44

    As partes foram ouvidas em alegações e nas suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 26 de outubro de 2017.

    45

    O demandante conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

    julgar a ação admissível e procedente;

    reconhecer a responsabilidade da Missão na aceção do artigo 340.o TFUE;

    determinar a reparação dos danos patrimoniais sofridos;

    determinar a reparação dos danos morais sofridos, avaliados em 70000 euros;

    condenar a Missão na totalidade das despesas.

    46

    A Missão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

    julgar a ação improcedente;

    condenar o demandante nas despesas.

    Questão de direito

    Quanto ao objeto do litígio

    47

    Tendo em conta os termos da petição, o demandante pede ao Tribunal Geral, em substância, que condene a Missão a reparar os danos patrimoniais e morais que lhe causou ao não investigar, em tempo útil, as queixas por assédio que lhe apresentou em dezembro de 2014 e em fevereiro de 2015.

    48

    No seu correio eletrónico de 28 de agosto de 2015, dirigido ao chefe de Missão, o demandante informou este último de que X. cometeu igualmente uma agressão física contra si em fevereiro ou março de 2015. Porém, esta alegada agressão física não era referida em nenhum dos correios eletrónicos de dezembro de 2014 e de fevereiro de 2015 que, segundo o demandante, constituíam queixas por assédio. É verdade que, no seu correio eletrónico de 30 de agosto de 2015, igualmente enviado ao chefe de Missão, o demandante pediu a este último que considerasse o seu correio eletrónico de 28 de agosto de 2015 uma queixa oficial relativa, nomeadamente, à referida agressão física. Todavia, a presente ação não tem por objeto o seguimento que a Missão deu aos correios eletrónicos de 28 e 30 de agosto de 2015. Assim, a apreciação do Tribunal Geral, no caso em apreço, deve limitar‑se à questão de saber se a Missão cumpriu as suas obrigações no que respeita às queixas por assédio que o demandante considera ter apresentado em dezembro de 2014 e em fevereiro de 2015.

    49

    Resulta da petição que a presente ação diz respeito à responsabilidade contratual da Missão, na aceção do artigo 340.o, primeiro parágrafo, TFUE, o que, aliás, o demandante confirmou na sua resposta de 10 de outubro de 2017 às questões escritas do Tribunal Geral. Os argumentos que a Missão apresentou para demonstrar que, no caso em apreço, os requisitos necessários à declaração da sua responsabilidade extracontratual na aceção do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE não estão preenchidos não são, por conseguinte, pertinentes.

    Quanto à competência do Tribunal Geral

    50

    O artigo 12.o‑A da Decisão 2012/392, aplicável a partir de 16 de julho de 2014 por força do artigo 2.o da Decisão 2014/482 (v. n.o 3, supra), introduziu a capacidade de a Missão celebrar contratos e estar em juízo, conferindo‑lhe assim capacidade jurídica. Além disso, resulta do artigo 7.o, n.os 3 e 4, da Decisão 2012/392 que a Missão pode recrutar pessoal numa base contratual e que as condições de trabalho e os direitos e obrigações deste pessoal são estipulados nos contratos entre a Missão e os membros do pessoal em causa.

    51

    Nos termos do artigo 272.o TFUE, o Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir com fundamento em cláusula compromissória constante de um contrato de direito público ou de direito privado, celebrado pela União ou por sua conta. No caso em apreço, o primeiro contrato de trabalho do demandante com a Missão incluía uma cláusula atributiva de jurisdição a favor dos tribunais de Bruxelas (Bélgica). Em contrapartida, tanto o contrato de trabalho celebrado entre a Missão e o demandante para o período compreendido entre 16 de julho de 2014 e 15 de julho de 2015 como o celebrado entre estas duas partes para o período compreendido entre 16 de julho de 2015 e 15 de julho de 2016 continham uma cláusula atributiva de jurisdição a favor do Tribunal de Justiça da União Europeia. Uma vez que os factos que deram origem à presente ação ocorreram durante os períodos abrangidos por estes dois últimos contratos de trabalho, a presente ação pode basear‑se no artigo 272.o TFUE. Por outro lado, nos termos do artigo 256.o, n.o 1, TFUE, o Tribunal Geral é competente para conhecer em primeira instância dos recursos referidos no artigo 272.o TFUE.

    52

    Em conformidade com o artigo 20.o dos dois últimos contratos de trabalho celebrados entre o demandante e a Missão, os litígios relativos à interpretação destes contratos devem ser sujeitos a arbitragem. Todavia, este artigo prevê expressamente que esta atribuição é feita sem prejuízo da possibilidade de submeter o litígio ao Tribunal de Justiça da União Europeia. As disposições deste artigo não se opunham, assim, a que o demandante submetesse o presente litígio ao Tribunal Geral.

    53

    Por outro lado, importa assinalar que, segundo a jurisprudência, o juiz da União é competente para conhecer de ações ou recursos relativos à gestão pelas missões PSDC do seu pessoal, mesmo quando esta gestão respeita a operações «no terreno» (v., neste sentido, Acórdão de 19 de julho de 2016, H/Conselho e Comissão, C‑455/14 P, EU:C:2016:569, n.os 54 a 60).

    54

    Por conseguinte, o Tribunal Geral é competente para conhecer da presente ação, o que, de resto, a Missão não contesta.

    Quanto à admissibilidade

    55

    A Missão contesta a admissibilidade da ação.

    56

    Em primeiro lugar, no que respeita ao argumento que a Missão invocou na audiência e segundo o qual a ação é inadmissível devido ao facto de o demandante não ter respeitado o procedimento pré‑contencioso, basta assinalar que, na medida em que este argumento significa que o demandante estava obrigado a dirigir‑se à Missão antes de intentar a presente ação, tal obrigação foi, em todo caso, cumprida no caso em apreço. Com efeito, o pedido de indemnização que o demandante enviou à Missão em 25 de janeiro de 2016, embora formalmente se baseasse no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, tinha um objeto idêntico ao da presente ação.

    57

    Em segundo lugar, a Missão alega que a presente ação é inadmissível no que respeita aos pedidos relativos à indemnização dos danos alegados, causados pela sua decisão de deixar de pagar o salário do demandante a partir de 30 de setembro de 2015 (v. n.o 33, supra). Uma vez que o demandante não apresentou reclamação desta decisão da Missão, já não pode pô‑la em causa através de pedidos de indemnização. A este propósito, basta assinalar que o demandante não fundamenta, enquanto tal, a sua ação de indemnização no dano ligado à decisão da Missão de deixar de pagar‑lhe o salário a partir de 30 de setembro de 2015. Com efeito, a presente ação tem por objeto os danos resultantes do facto de a Missão não ter aberto um inquérito relativo às queixas por assédio que o demandante considera ter apresentado em dezembro de 2014 e em fevereiro de 2015, dos quais um é constituído pela supressão do seu salário. Por conseguinte, este argumento deve ser rejeitado, não sendo necessário apreciar a questão de saber se o demandante devia ter apresentado uma reclamação da decisão de deixar de pagar o seu salário a partir de 30 de setembro de 2015.

    58

    Em terceiro lugar, na sua resposta de 11 de outubro de 2017 às questões escritas do Tribunal Geral, e no âmbito das suas observações relativas ao direito francês, a Missão alegou que, na falta de factos precisos, objetivos e concordantes que permitam presumir a existência de assédio, o Tribunal Geral deveria declarar a ação inadmissível. Na audiência, e em resposta a uma questão do Tribunal Geral, a Missão alegou que esta conclusão se impõe independentemente do direito aplicável no caso em apreço. Este argumento deve, em todo caso, ser rejeitado, uma vez que a presente ação não se baseia no dano ligado a um alegado assédio mas no dano resultante do facto de a Missão não ter aberto um inquérito relativo às queixas por assédio que o demandante considera ter apresentado em dezembro de 2014 e em fevereiro de 2015.

    59

    Em quarto e último lugar, o argumento que a Missão tenta extrair do conteúdo do correio eletrónico enviado ao chefe de Missão em 30 de agosto de 2015 deve igualmente ser rejeitado. É verdade que, neste correio eletrónico, o demandante refere que «confirma formalmente não apresentar queixa» relativamente ao «facto de o inquérito preliminar que [o chefe de Missão] [tinha ordenado] não ter tido lugar ou ter tido lugar sem o [s]eu testemunho». Ora, como o demandante sublinhou na audiência, a referida observação não pode ser considerada uma renúncia à possibilidade de intentar uma ação no Tribunal Geral. Com efeito, tal renúncia deve ser clara e inequívoca para ser suscetível de pôr em causa a admissibilidade de uma ação. Ora, não é isso que sucede no caso em apreço. A este respeito, basta assinalar que a observação referida pela Missão não faz qualquer menção à possibilidade de intentar uma ação no Tribunal Geral.

    60

    Tendo em consideração o exposto, a presente ação deve ser considerada admissível.

    Quanto ao mérito

    No que respeita ao direito aplicável

    61

    Nos termos do artigo 340.o, primeiro parágrafo, TFUE, a responsabilidade contratual da União é regulada pela lei aplicável ao contrato em causa.

    62

    No caso em apreço, os contratos de trabalho do demandante não especificam a lei que lhes é aplicável.

    63

    Em resposta a uma questão do Tribunal Geral sobre este ponto, o demandante alegou que, a título principal, são as estipulações dos referidos contratos, incluindo as do código de conduta, e os atos da União ao abrigo dos quais estes contratos foram adotados que constituem o fundamento jurídico da responsabilidade da Missão. A título subsidiário, importa remeter para o código civil do Níger, nomeadamente, para o artigo 1134.o, primeiro parágrafo, deste.

    64

    A Missão, por seu turno, alegou que a sua responsabilidade contratual resulta dos contratos de trabalho que celebrou com o demandante. Se, por extraordinário, o Tribunal Geral devesse apreciar o direito nacional a este respeito, seriam as disposições do direito francês e, mais especificamente, as do código do trabalho francês que seriam pertinentes.

    65

    Na audiência, e em resposta às questões do Tribunal Geral sobre este ponto, as partes confirmaram que concordavam que, para apreciar a eventual responsabilidade contratual da Missão, bastava apreciar os contratos de trabalho em causa, incluindo as disposições do código de conduta, e que não era necessário remeter para um direito nacional.

    66

    O Tribunal Geral considera que a presente ação pode efetivamente ser apreciada apenas com fundamento nos contratos de trabalho em causa, incluindo as disposições do código de conduta que deles fazem parte integrante, à luz dos princípios gerais do direito da União em matéria de responsabilidade contratual. Segundo estes princípios, para uma ação por responsabilidade contratual poder proceder devem estar preenchidos três requisitos, nomeadamente, antes de mais, que a instituição em causa não tenha cumprido as suas obrigações contratuais, em seguida, que a parte requerente tenha sofrido um dano e, por último, que exista um nexo de causalidade entre o comportamento da referida instituição e esse dano.

    67

    Por conseguinte, não é necessário apreciar a questão de saber se, como o demandante alegou na audiência, as provas que a Missão apresentou para demonstrar a eventual aplicação do direito francês eram inadmissíveis.

    Quanto à violação das obrigações contratuais por parte da Missão

    68

    O demandante alega que, apesar de ter apresentado à Missão, com os seus correios eletrónicos de 17 de dezembro de 2014 e 7 e 9 de fevereiro de 2015, queixas relativas a um assédio cometido por um colega de que foi vítima, a Missão não deu seguimento às referidas queixas, violando várias disposições do n.o 8.4 do código de conduta.

    69

    Segundo o demandante, esta violação caracteriza‑se pelo facto de que, por um lado, o próprio chefe‑adjunto de Missão, S., no seu correio eletrónico de 10 de fevereiro de 2015, tinha considerado que os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 deviam ser entendidos como uma queixa oficial por assédio e sugerido, por conseguinte, a abertura de um inquérito preliminar e que, por outro, esta proposta tinha sido explicitamente aprovada pelo chefe de Missão no mesmo dia. Ora, não foi dado qualquer seguimento a esta decisão de abrir um inquérito preliminar.

    70

    A este respeito, o demandante alega que o n.o 8.4.1 do código de conduta estabelece que, em caso de denúncia de uma violação das disposições do referido código, deve obrigatoriamente ser aberto um inquérito preliminar. Assim, a Missão não tinha margem de apreciação, uma vez que tomou conhecimento das denúncias feitas pelo demandante e as considerou uma queixa oficial.

    71

    Por conseguinte, a Missão violou, de forma particularmente grave, as regras contratuais, a saber, as que a própria se auto impôs em matéria de boa conduta e de inquéritos internos. Estas regras tinham por objetivo proteger os membros do pessoal da Missão, nomeadamente, em caso de situações de assédio ou de intimidação por parte de colegas.

    72

    O demandante acrescenta que, no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, já tinha sublinhado que a situação em que se encontrava à época degradava o seu estado de saúde, informação que o chefe‑adjunto de Missão tinha comunicado ao chefe de Missão.

    73

    A Missão contesta estes argumentos.

    74

    Resulta do n.o 8.4.1 do código de conduta que, no caso de uma alegada violação, nomeadamente, das disposições do referido código, que é comunicada ou detetada, é aberto um inquérito preliminar. Daqui resulta que, como o demandante alegou, a abertura de um inquérito preliminar é obrigatória em tal caso e que, a este respeito, a Missão não dispõe de margem de apreciação.

    75

    Além disso, há que assinalar que as disposições do n.o 8.4.1 do código de conduta devem ser lidas em conjugação com as do n.o 7.1 do mesmo código, segundo as quais os membros do pessoal da Missão têm o direito e a obrigação de apresentar por escrito ao chefe de Missão uma queixa em qualquer alegado caso de má conduta, de práticas ilícitas ou de incompetência (v. n.o 9, supra). Resulta destas disposições que um membro do pessoal da Missão, que se considere vítima de atos de assédio e que pretenda que esta abra um inquérito preliminar, deve formular uma queixa escrita e apresentá‑la ao chefe de Missão. Uma vez que o n.o 8.4.3 do código de conduta faz referência ao «membro do pessoal incriminado» neste contexto, é evidente que a queixa deve incidir sobre uma pessoa identificada.

    76

    No que respeita, em primeiro lugar, ao correio eletrónico do demandante de 17 de dezembro de 2014, estes requisitos não estão, evidentemente, preenchidos.

    77

    Em primeiro lugar, é pacífico que, neste correio eletrónico, o demandante não revelou a identidade de X. O facto que resultava do referido correio eletrónico de que se tratava de um avaliador que era membro de um comité de seleção, identificado pelo demandante, e que só havia três avaliadores neste comité, dos quais dois eram homens, não afeta esta conclusão.

    78

    Em segundo lugar, embora o demandante tenha criticado fortemente, no seu correio eletrónico de 17 de dezembro de 2014, a atitude que X. tinha adotado nas discussões no comité de avaliação, não formulou qualquer crítica específica que desse a entender que tinha considerado que o comportamento de X. constituía um caso de assédio. É verdade que, na petição, o demandante alegou que, no seu correio eletrónico de 17 de dezembro de 2014, tinha denunciado um conflito de interesses que visava X. relativamente ao procedimento por negociação que era objeto das discussões no comité de avaliação. Ora, além de não figurar qualquer indicação neste sentido no correio eletrónico do demandante de 17 de dezembro de 2014, este não explicou de forma alguma de que modo tal conflito de interesses poderia dar origem a um assédio. Em todo caso, o demandante não explicou como é que o facto de a Missão eventualmente não abrir um inquérito preliminar relativo a tal conflito de interesses poderia dar origem à sua responsabilidade contratual para com ele.

    79

    Em terceiro lugar, há que observar que, no seu correio eletrónico de 17 de dezembro de 2014, o demandante referiu que estava disposto a redigir «um relatório circunstanciado detalhado» para o chefe de Missão, se o destinatário deste correio eletrónico o pretendesse. Ora, o demandante não alegou que posteriormente transmitiu tal relatório ou apresentou uma queixa contra o comportamento de X. no comité de avaliação em causa ao chefe de Missão.

    80

    Em quarto e último lugar, há que observar que, na petição, o próprio demandante alegou que tinha, pela primeira vez, em fevereiro de 2015, denunciado uma situação de assédio moral.

    81

    No que respeita, em segundo lugar, ao correio eletrónico que o demandante enviou a M., chefe da administração interino da Missão, em 7 de fevereiro de 2015, há que salientar que, neste correio eletrónico, o demandante indicou o nome de X., referiu alguns comportamentos deste que considerava inadequados e manifestou a esperança de que pudesse ser encontrada uma solução. Todavia, importa igualmente observar que, neste correio eletrónico, o demandante se limitou a pedir assistência a M. na sequência do comportamento de X., explicando que tinha chegado à conclusão de que, nesse momento, não se sentia obrigado a apresentar uma queixa oficial ao chefe de Missão. O correio eletrónico de 7 de fevereiro de 2015, enquanto tal, não pode, assim, ser considerado uma queixa no sentido do n.o 7.1 do código de conduta.

    82

    No que respeita, em terceiro lugar, ao correio eletrónico que o demandante enviou a M. em 9 de fevereiro de 2015, há que assinalar que constituía a resposta do demandante ao correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015 através do qual M. tinha respondido ao seu correio eletrónico de 7 de fevereiro de 2015. Na referida resposta, M. tinha apresentado três opções ao demandante, incluindo a que consistia em apresentar uma queixa oficial ao chefe de Missão. Todavia, como a Missão observou corretamente no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, o demandante não escolheu nenhuma destas opções, manifestando preferência por uma solução administrativa. Além disso, o facto de o demandante, no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, ter evocado a possibilidade de o chefe da administração interino da Missão informar o chefe de Missão dos problemas com X. «até que [ele se] sen[tisse] melhor para apresentar uma queixa oficial» sugere que considerava que ainda não tinha apresentado tal queixa. Por último, há que observar que o correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015 não foi enviado ao chefe de Missão, embora, segundo o n.o 7.1 do código de conduta, devesse ser‑lhe apresentada uma queixa por assédio.

    83

    Não obstante estes elementos, o Tribunal Geral considera que era simultaneamente legítimo e adequado a Missão encarar os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015, lidos em conjunto, como uma queixa oficial.

    84

    Em primeiro lugar, há que observar que, no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, o demandante, contrariamente ao que a Missão alega, precisou que se considerava vítima de um «assédio moral» por parte de X.

    85

    Em segundo lugar, embora o demandante não tenha explicitamente escolhido uma das três opções que lhe tinham sido apresentadas, informou M., no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, que, após o incidente que referia neste correio eletrónico, se tinha sentido mal e que, consequentemente, se tinha dirigido à enfermeira, que lhe deu um medicamento. O demandante acrescentou que tinha sofrido algumas vertigens por causa do medicamento ou por causa do que considerava uma forma de «assédio moral» e que, por isso, dificilmente podia responder à proposta que M. lhe tinha feito. Além disso, evocou a possibilidade de o chefe de Missão ser informado dos seus problemas com X. até que ele se sentisse melhor para apresentar uma queixa oficial. Resulta destas observações que o demandante considerava ser vítima de assédio, que enfrentava problemas de saúde ligados a este assédio e que o seu estado de saúde não lhe permitia apresentar uma queixa oficial por assédio nesse momento. É evidente que a Missão devia ter em conta estes elementos adicionais para decidir qual o seguimento a dar ao correio eletrónico do demandante de 9 de fevereiro de 2015. Em particular, incumbia à Missão, em razão do seu dever de solicitude, ter em conta que, embora os factos possivelmente constitutivos de assédio tivessem sido identificados por um membro do seu pessoal, este não estava em condições de apresentar devidamente uma queixa nesse momento, devido a problemas de saúde que, segundo esta pessoa, estavam ligados a tais factos de assédio.

    86

    Em terceiro lugar, no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, o demandante sublinhou que tinha confiança no julgamento de M. e que, caso M. chegasse à conclusão de que tinha um problema sério a apresentar ao chefe de Missão, agradecia que informasse este último. Daqui resulta que o demandante remetia para a apreciação de M. quanto ao seguimento a dar aos seus correios eletrónicos. A apreciação concreta efetuada no caso em apreço por M. deve, assim, ser igualmente tida em conta a este respeito.

    87

    Em quarto lugar, há que assinalar que, na sua resposta de 10 de fevereiro de 2015, M. informou o demandante que, «tendo o dever de solicitude, e atendendo ao caráter sério dos factos relatados [por ele], pens[ava] que não [tinha] outra alternativa senão transmitir o [s]eu correio eletrónico ao [chefe de Missão] e [ao seu adjunto], as únicas autoridades competentes na Missão responsáveis pelo código de conduta e para tratar deste tipo de questão disciplinar».

    88

    No que respeita ao correio eletrónico de 10 de fevereiro de 2015 de M. e ao seguimento que lhe foi dado, há que assinalar o seguinte.

    89

    Em primeiro lugar, tanto o chefe como o chefe‑adjunto de Missão eram destinatários do correio eletrónico de M. de 10 de fevereiro de 2015. Além disso, resulta dos autos que os dois correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 foram efetivamente transmitidos ao chefe de Missão em 10 de fevereiro de 2015. Ora, embora o n.o 7.1 do código de conduta exija que sejam apresentadas ao chefe de Missão as queixas a que esta disposição faz referência, não precisa que o queixoso tem a obrigação de transmitir a sua queixa diretamente ao chefe de Missão e que está excluído que um terceiro transmita tal queixa, recebida do queixoso, e com o consentimento deste último, ao chefe de Missão.

    90

    Em segundo lugar, resulta do correio eletrónico de 10 de fevereiro de 2015 de M. que, contrariamente ao que a Missão alegou, não se limitou a informar o chefe de Missão dos problemas que o demandante tinha com X., enquanto se aguardava uma queixa oficial que o demandante poderia, eventualmente, apresentar ao chefe de Missão. Pelo contrário, resulta claramente da redação deste correio eletrónico que M. considerava que, no caso em apreço, se tratava de uma questão disciplinar que devia ser apreciada pelas instâncias competentes da Missão. Com efeito, se M. tivesse simplesmente pretendido informar o chefe de Missão dos problemas do demandante, não teria tido necessidade de colocar o chefe‑adjunto de Missão em cópia e de sublinhar que estes dois destinatários eram as «únicas instâncias competentes na Missão, responsáveis pelo código de conduta e para tratar este tipo de questão disciplinar».

    91

    Em terceiro lugar, há que observar que, num correio eletrónico enviado ao chefe de Missão posteriormente em 10 de fevereiro de 2015, S., o chefe‑adjunto de Missão, concluiu que o demandante se queixava do comportamento de X. e propôs considerar os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 uma queixa que conduzia à abertura de um procedimento disciplinar. S. acrescentou que, se o chefe de Missão ordenasse esta medida, tomaria providências para desencadear o inquérito preliminar relativamente aos alegados factos de assédio ou de intimidações. Além disso, há que assinalar que o chefe de Missão, na sua resposta enviada em 10 de fevereiro de 2015 ao chefe‑adjunto de Missão, concordou com a proposta que este lhe tinha feito. Resulta desta troca de correspondência que tanto o chefe de Missão como o seu adjunto concordavam que os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 podiam e deviam ser considerados uma queixa na aceção do código de conduta e que devia ser aberto um inquérito preliminar.

    92

    O facto de se tratar de uma troca de correspondência interna que apenas tinha sido dada a conhecer ao demandante perto do fim do mês de agosto de 2015 não tem qualquer pertinência a este respeito, uma vez que o que importa no caso em apreço é a forma como a Missão interpretou os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015. A mesma conclusão impõe‑se quanto ao argumento da Missão segundo o qual o chefe de Missão não tinha o poder de ordenar a abertura de um inquérito preliminar. Mesmo que tivesse sido esse o caso, contrariamente à premissa em que o próprio chefe‑adjunto de Missão se baseou no seu correio eletrónico de 10 de fevereiro de 2015, isso não afetaria a conclusão de que tanto o chefe de Missão como o seu adjunto tinham considerado que devia ser aberto um inquérito preliminar no caso em apreço. Por conseguinte, não é necessário apreciar se o referido argumento da Missão deve, em todo caso, ser rejeitado por ser extemporâneo e, consequentemente, inadmissível, como o demandante alegou na audiência.

    93

    Em quarto lugar, uma vez que resultava do seu correio eletrónico de 10 de fevereiro de 2015 que M. ia transmitir os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 ao chefe de Missão e ao seu adjunto para que estes pudessem desencadear a ação exigida pelo código de conduta, o demandante não tinha qualquer necessidade de iniciar diligências suplementares a este respeito. Em particular, já não era necessário o próprio demandante dirigir‑se ao chefe de Missão a este propósito, apresentando‑lhe uma queixa oficial que reproduzisse os factos relatados nos seus correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015. Aliás, o correio eletrónico de M. não faz qualquer referência ao facto de que tal queixa adicional fosse necessária. A mesma conclusão aplica‑se à troca de correios eletrónicos de 10 de fevereiro de 2015 entre o chefe de Missão e o seu adjunto.

    94

    Em quinto e último lugar, há que assinalar que, no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, o demandante tinha insistido, caso M. considerasse que podia ser encontrada uma solução a nível da administração, para que M. refletisse nas medidas provisórias que podiam ser adotadas para garantir a sua proteção, ou seja, proibir X. de entrar no seu gabinete e de lhe dirigir a palavra até que fosse encontrada uma solução. Todavia, é pacífico que não foi dado qualquer seguimento a este pedido nesse momento. Ora, se a Missão considerava que o demandante devia ainda apresentar uma queixa oficial ao chefe de Missão para permitir a abertura de um inquérito preliminar, devia ter‑se pronunciado, na pendência de tal queixa, sobre o referido pedido.

    95

    Estas considerações não são postas em causa pela circunstância de que, no seu correio eletrónico de 30 de agosto de 2015, o demandante pediu ao chefe de Missão para considerar o referido correio eletrónico uma queixa oficial. Com efeito, como referido nos n.os 91 a 93, supra, tanto o chefe de Missão como o seu adjunto consideraram que os correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 constituíam uma queixa oficial e que devia ser aberto um inquérito preliminar, pelo que, nesta fase, o demandante já não tinha necessidade de iniciar diligências suplementares.

    96

    Tendo em consideração o exposto, o Tribunal Geral considera que o facto de não ter sido aberto nenhum inquérito preliminar na sequência dos correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 constitui uma violação do n.o 8.4 do código de conduta e, por conseguinte, um incumprimento contratual imputável à Missão.

    97

    Nenhum dos outros argumentos invocados pela Missão contra esta conclusão é convincente.

    98

    Em primeiro lugar, a Missão refere a explicação apresentada pelo seu chefe no seu correio eletrónico ao demandante de 25 de agosto de 2015, nomeadamente que, uma vez que não tinha recebido resposta das partes interessadas, continuou a ter a perceção de que o chefe‑adjunto de Missão tinha conseguido resolver amigavelmente o litígio entre o demandante e X. Ora, a Missão não nega que tal resolução não ocorreu. Em todo caso, e como o demandante alega corretamente, incumbia ao chefe de Missão informar‑se dos desenvolvimentos do inquérito preliminar cuja abertura tinha acordado com o seu adjunto.

    99

    Em segundo lugar, a Missão sugere que não era necessário um inquérito preliminar, uma vez os factos alegados pelo demandante não constituíam atos de assédio e não estavam suportados por provas suficientes. Este argumento deve ser rejeitado. Por um lado, a Missão não demonstrou que nenhum dos factos relatados nos correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015 era suscetível de constituir um caso de assédio, na aceção do n.o 2.5 do código de conduta. Por outro, não resulta de forma alguma do código de conduta que um inquérito preliminar apenas se justifica quando o queixoso já apresentou provas suficientes para demonstrar que tinha efetivamente ocorrido assédio.

    100

    Em terceiro lugar, a Missão alega que, entre fevereiro e agosto de 2015, o demandante não pediu informações relativamente ao inquérito que, em seu entender, devia ter sido aberto em fevereiro de 2015. Ora, a Missão não explicou de que modo é que este facto podia ser relevante para responder à questão de saber se tinha incumprido o contrato ao não abrir tal inquérito preliminar relativamente aos correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015. A mesma conclusão impõe‑se quanto ao argumento da Missão segundo o qual, no período compreendido entre fevereiro e agosto de 2015, o demandante não reportou qualquer problema e não informou a Missão de uma eventual necessidade de apoio psicológico.

    101

    Em quarto e último lugar, o facto invocado pela Missão segundo o qual esta tinha mantido o último contrato de trabalho do demandante, embora o pudesse ter rescindido em função do que considera comportamentos do demandante que implicam a qualificação de falta grave — ou seja, os insultos e a linguagem difamatória que utilizou nos correios eletrónicos que enviou à Missão em 28 e 30 de agosto de 2015 —, não tem qualquer relevância para a resposta à questão de saber se, ao não abrir um inquérito preliminar em fevereiro de 2015, a Missão incumpriu o contrato.

    Quanto aos danos invocados pelo demandante

    102

    O primeiro dano invocado pelo demandante é de ordem moral. Devido à inércia da Missão, continuou a sofrer uma situação de assédio entre os meses de fevereiro e de agosto de 2015, o que podia e devia ter sido evitado. Segundo o demandante, esta «descida aos infernos» ilustra‑se, nomeadamente, pela gravidade do seu estado de saúde no momento em que partiu da Missão, mas igualmente pelos medicamentos que os médicos foram obrigados a prescrever‑lhe. O dano moral é também constituído pelas consequências médicas associadas a essa situação de assédio, designadamente, o estado depressivo grave de que continua a sofrer, a medicação de que necessita em consequência disso e a inatividade profissional a que foi obrigado em razão das suas baixas por doença.

    103

    Este dano moral foi agravado pela atitude da Missão durante as baixas por doença do demandante. Por um lado, não tomou qualquer iniciativa para que ele regressasse ao trabalho. Pelo contrário, a Missão esperou até 11 de julho de 2016 para lhe enviar, para o seu endereço oficial, uma convocatória para um pretenso exame médico, de resto com uma base legal duvidosa, que era suposto realizar‑se apenas dois dias mais tarde, sabendo perfeitamente que, na verdade, ele residia noutro lugar. Por outro lado, a Missão pôs em causa a validade de todos os seus atestados médicos em razão da sua transmissão por correio eletrónico, apesar de ter confirmado, após ter recebido o primeiro destes atestados, que não era necessário o envio por correio eletrónico. Tal atitude é desprovida de qualquer solicitude, revela má‑fé e é desleal. A Missão contribuiu assim para agravar o dano moral do demandante.

    104

    Segundo o demandante, o seu dano moral pode ser avaliado, ex æquo et bono, no montante de 70000 euros.

    105

    O segundo dano invocado pelo demandante é de natureza patrimonial. A Missão devia pagar‑lhe uma indemnização equivalente à remuneração devida em relação ao período compreendido entre 29 de setembro de 2015 — data em que o pagamento tinha sido interrompido em razão das suas baixas por doença — e 15 de julho de 2016 — data em que o seu terceiro contrato de trabalho com a Missão tinha cessado —, assim como juros e a reconstituição do seu direito a férias. Com efeito, as suas baixas por doença deveram‑se à degradação do seu estado de saúde, associada à situação de assédio no local de trabalho a que tinha sido exposto. O montante a reembolsar a título da perda de remuneração do demandante entre 1 de setembro de 2015 e 15 de julho de 2016 ascendia a 73774 euros no total.

    106

    Segundo o demandante, o seu terceiro dano, igualmente de natureza patrimonial, é constituído pela perda de oportunidade de obter a renovação do seu contrato. Com efeito, foi apenas em razão da impossibilidade de proceder a uma avaliação do seu desempenho que o seu contrato não foi renovado. Atendendo ao seu excelente desempenho no passado e ao facto de a Missão continuar a necessitar dos serviços de um agente responsável pelo aprovisionamento, as suas oportunidades de obter a renovação do seu contrato por um ano deviam ser avaliadas em pelo menos 80%. Por conseguinte, devia ser concedida ao demandante uma indemnização num montante equivalente a 80% da remuneração que teria recebido em caso de renovação do seu contrato.

    107

    A Missão contesta estes argumentos do demandante.

    108

    A este respeito, há que assinalar, relativamente ao estado de saúde do demandante, que este, com efeito, como observa a Missão, não apresentou qualquer relatório médico que permita suportar o seu pedido de indemnização.

    109

    No entanto, resulta dos documentos dos autos que o médico consultado pelo demandante no Níger no final do mês de agosto de 2015 concluiu que o demandante tinha sofrimento psicológico. Além disso, resulta destes documentos que o demandante esteve de baixa por doença de 25 de agosto de 2015 até ao fim do seu contrato de trabalho com a Missão em julho de 2016. Por último, daqui decorre que, nos seus atestados que autorizam as baixas por doença, o psiquiatra consultado pelo demandante em França fez referência, por duas vezes, a um «estado depressivo grave».

    110

    É verdade que resulta dos documentos dos autos que o estado de saúde do demandante não exigia hospitalização no Níger ou em França. É igualmente verdade que a alegação do demandante segundo a qual a gravidade do seu estado de saúde no final do mês de agosto de 2015 era confirmada pela medicação que os médicos foram obrigados a prescrever‑lhe não foi demonstrada, uma vez que os atestados médicos que o demandante apresentou ao Tribunal Geral não referem qualquer tratamento medicamentoso. Não deixa de ser verdade que resulta dos documentos disponibilizados no Tribunal Geral que houve uma degradação grave do estado de saúde do demandante e que esta degradação ocorreu após este, nos seus correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015, ter chamado a atenção da Missão para o que considerava ser um caso de assédio contra si por parte de X.

    111

    Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral considera que não pode ser negada a existência de um dano moral, ligado a essa degradação do estado de saúde do demandante.

    112

    No que respeita ao dano patrimonial alegado pelo demandante, é pacífico que o pagamento do salário deste foi interrompido em 29 de setembro de 2015 e que, por conseguinte, o demandante perdeu o restante salário que lhe seria devido em conformidade com o seu último contrato de trabalho, até ao seu termo, se estivesse em condições de continuar a trabalhar, bem como o direito a férias relativo a este período. É verdade que o artigo 15.7 do último contrato de trabalho do demandante prevê que as ausências por doença apenas são consideradas equivalentes aos períodos de serviço ativo até 30 dias de calendário no máximo e que nenhum direito abrange um período de ausência por doença além deste limite. Ora, o facto de a referida disposição ter permitido ou mesmo obrigado a Missão a interromper o pagamento do salário do demandante em nada afeta a conclusão de que, por conseguinte, este perdeu o salário que teria recebido e, consequentemente, sofreu um dano patrimonial.

    113

    Quanto à possibilidade de obter um contrato de trabalho adicional, é verdade que o demandante não beneficiava de um direito adquirido à renovação do seu contrato de trabalho com a Missão. No entanto, esta não pôs em causa o argumento do demandante segundo o qual, atendendo ao seu excelente desempenho no passado e ao facto de a Missão continuar a necessitar do tipo de serviços que prestava, as suas oportunidades de obter a renovação do seu contrato por um ano deviam ser avaliadas em pelo menos 80%. Com efeito, a este respeito, a Missão limitou‑se a alegar que o pouco tempo que o demandante tinha trabalhado durante o período abrangido pelo seu terceiro contrato de trabalho não lhe tinha permitido proceder à avaliação do seu desempenho com vista a uma eventual renovação do seu contrato. Ora, o demandante alega que foi precisamente o incumprimento contratual por parte da Missão que afetou o seu estado de saúde de tal forma que não lhe tinha sido possível regressar ao trabalho. Nestas circunstâncias, também não pode ser negada a realidade de um dano patrimonial no que respeita à perda de oportunidade de obter um novo contrato.

    114

    Os outros argumentos que a Missão invocou neste contexto não são suscetíveis de pôr em causa estas conclusões.

    115

    Em primeiro lugar, o argumento da Missão segundo o qual, desde o início do ano de 2015, o demandante não escondeu aos seus colegas que procurava uma forma de sair da Missão, além de não estar suportado por nenhum elemento concreto, não é suscetível de pôr em causa a conclusão de que ocorreu uma degradação grave do estado de saúde do demandante entre os meses de fevereiro e agosto de 2015.

    116

    Em segundo lugar, o facto de o demandante nunca ter contactado a Missão relativamente a um eventual mal‑estar psicológico entre os meses de fevereiro e de agosto de 2015 e de não ter perguntado à Missão qual tinha sido o seguimento dado aos seus correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015 antes do mês de agosto de 2015 também não é suscetível de pôr em causa a referida conclusão.

    117

    Em terceiro lugar, a mesma conclusão impõe‑se, evidentemente, no que respeita ao argumento da Missão segundo o qual o demandante organizou a sua partida da Missão para o final do mês de agosto de 2015 de uma forma que sugeria que não pretendia regressar.

    118

    Além disso, a Missão invocou alguns argumentos que respeitam ao período que se iniciou após a partida do demandante do seu posto de trabalho no fim do mês de agosto de 2015. Por um lado, a Missão alega que o demandante não aceitou os pedidos da Missão para que se sujeitasse a um exame médico para avaliar o seu estado de saúde e a sua eventual incapacidade para o trabalho. Por outro, a ausência do demandante do seu local de trabalho foi injustificada e, por conseguinte, não podia dar lugar a uma compensação indemnizatória, uma vez que o demandante não apresentou atestados médicos válidos e verificáveis, residia num lugar desconhecido da Missão e que foi impossível proceder a um exame ou a um controlo médico por razões imputáveis ao demandante. Todavia, o Tribunal Geral considera que apenas é necessário apreciar estes argumentos se o demandante puder demonstrar um nexo de causalidade entre o incumprimento contratual da Missão e os danos morais e patrimoniais sofridos durante o período posterior à sua partida da Missão, o que, por conseguinte, importa apreciar em seguida.

    Quanto ao nexo de causalidade

    119

    O demandante alega que, em razão da inércia da Missão, a situação de assédio denunciada desde o mês de fevereiro de 2015 perdurou, agravou‑se e conduziu à sua baixa por doença, a partir de 25 de agosto de 2015. Está demonstrado que esta baixa por doença se deveu, nomeadamente, a um estado depressivo, qualificado de grave, ligado à situação de assédio vivida no local de trabalho. Este último aspeto, que foi sublinhado pelo médico do demandante, prova de forma suficiente o nexo de causalidade entre as violações, por parte da Missão, das suas obrigações contratuais e os danos sofridos pelo demandante. O demandante acrescenta que foi no mês de fevereiro de 2015 que lhe foram prescritos, pela primeira vez, antidepressivos, apesar de anos de serviço em missão em ambientes frequentemente hostis. Além disso, esteve pela primeira vez de baixa por doença entre 9 e 13 de fevereiro de 2015, ou seja, imediatamente após a primeira denúncia da situação de assédio moral.

    120

    A Missão contesta os argumentos do demandante. Segundo a Missão, não existe nexo de causalidade entre o seu comportamento e o alegado dano.

    121

    Resulta da jurisprudência que, no que respeita à responsabilidade extracontratual da União, esta só pode ser responsabilizada pelo dano que resulta de modo suficientemente direto do comportamento irregular da instituição em causa (v., Acórdão de 24 de outubro de 2000, Fresh Marine/Comissão, T‑178/98, EU:T:2000:240, n.o 118 e jurisprudência referida; Despacho de 9 de novembro de 2016, Jenkinson/Conselho e o., T‑602/15, EU:T:2016:660, n.o 49). O Tribunal Geral considera que o mesmo sucede no que respeita à responsabilidade contratual da União.

    122

    Em primeiro lugar, há que apreciar a existência de um nexo direto entre o comportamento da Missão e os danos morais sofridos pelo demandante.

    123

    A este respeito, o Tribunal Geral constata que o demandante não apresentou qualquer documento que demonstre de forma indiscutível que os seus danos morais foram causados pelo incumprimento contratual da Missão no caso em apreço. Em particular, não resulta das provas apresentadas pelo demandante, contrariamente ao que este alega, que o seu médico concluiu que a degradação do seu estado de saúde estava ligada a uma situação de assédio vivida no local de trabalho. O facto de, no seu atestado de 14 de outubro de 2015, o psiquiatra que o examinou ter referido que o demandante se queixava de assédio no trabalho não constitui tal conclusão, uma vez que se trata de uma observação do demandante sobre a qual o seu médico não se pronunciou.

    124

    No entanto, há que tomar em conta os elementos seguintes neste contexto.

    125

    Em primeiro lugar, no seu correio eletrónico de 9 de fevereiro de 2015, o demandante informou a Missão dos problemas de saúde que tinha tido na sequência do incidente relativo a X., que era relatado neste mesmo correio eletrónico. Além disso, resulta das provas apresentadas pelo demandante que, em seguida, este esteve pela primeira vez de baixa por doença de 9 a 13 de fevereiro de 2015. Nestas circunstâncias, a Missão não podia ignorar que não dar um seguimento adequado aos correios eletrónicos do demandante de 7 e 9 de fevereiro de 2015 podia criar o risco de agravar ainda mais o estado de saúde do demandante. Neste contexto, há que assinalar que, quando foi aberto um inquérito preliminar no final do mês de agosto de 2015, o chefe de Missão tomou simultaneamente a decisão de proibir X. de se aproximar do demandante com efeitos imediatos.

    126

    Em segundo lugar, e como já foi salientado (v. n.o 110, supra), é pacífico que ocorreu uma degradação grave do estado de saúde do demandante no final do mês de agosto de 2015 e que o demandante alega que esta degradação era o resultado do facto de não ter sido aberto qualquer inquérito preliminar em fevereiro de 2015. É verdade que a Missão sugere que esta degradação poderia dever‑se a uma causa distinta de um assédio ou do facto de não ter sido aberto um inquérito preliminar em fevereiro de 2015. A este respeito, a Missão afirma que os atestados do médico consultado pelo demandante no Níger no final do mês de agosto de 2015 faziam referência às condições de vida na Missão como causa da degradação do seu estado de saúde. Ora, este argumento não é suportado pelos referidos atestados, nos quais o médico em causa se limitou a constatar que o demandante tinha sofrimento psicológico e que o seu estado de saúde exigia um afastamento do seu ambiente de trabalho.

    127

    Em terceiro lugar, a Missão reconhece que o inquérito que abriu no final do mês de agosto de 2015 a levou a concluir pela existência de uma violação do código de conduta por parte de X.

    128

    Atendendo a estas circunstâncias, o Tribunal Geral entende que existe um conjunto de indícios suficientemente conclusivos para considerar que há um nexo direto entre, por um lado, o facto de a Missão não ter aberto um inquérito preliminar na sequência da troca de correios eletrónicos de 10 de fevereiro de 2015 entre o chefe de Missão e o seu adjunto, a fim de apreciar os factos relatados pelo demandante como constitutivos de um assédio por parte de X., e, por outro, a degradação do estado de saúde do demandante ocorrida no período posterior a esta data.

    129

    No entanto, o Tribunal Geral considera que este nexo de causalidade apenas pode constatado relativamente a parte deste período.

    130

    Em primeiro lugar, há que assinalar, a este respeito, que resulta do código de conduta que deve ser efetuado um inquérito preliminar rapidamente. Em particular, o n.o 8.4.4 do código de conduta prevê que o relatório sobre o inquérito preliminar deve ser enviado ao chefe‑adjunto de Missão num prazo bastante curto, ou seja, dez dias. Nestas circunstâncias, o demandante tinha razoavelmente o dever de se questionar, após o decurso de um determinado período de tempo sem ter obtido informações sobre o seguimento dado à sua queixa, se efetivamente tinha sido aberto um inquérito preliminar e se ainda estava em curso. Por outro lado, resulta dos documentos dos autos, nomeadamente dos seus diferentes correios eletrónicos, que o demandante estava corretamente informado dos procedimentos em vigor em tal situação.

    131

    Por conseguinte, há que considerar que cabia ao demandante solicitar informações sobre o seguimento dado aos seus correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015 num prazo relativamente curto, tanto mais que a situação de assédio de que se queixava nos referidos correio eletrónicos parece, segundo os seus correios eletrónicos de 25 e 28 de agosto de 2015, ter‑se agravado consideravelmente. Em particular, há que observar que, neste último correio eletrónico, o demandante queixa‑se de que, em fevereiro ou em março de 2015, X. o agrediu fisicamente derramando chá a ferver sobre as suas pernas. Na audiência, e em resposta a uma questão do Tribunal Geral sobre este ponto, o demandante não conseguiu explicar a razão pela qual apenas tinha informado a Missão deste incidente após alguns meses, que, considerado provado, devia ser tratado como bastante sério.

    132

    Ora, o demandante não contesta o facto de que, durante o período compreendido entre o mês de fevereiro e o mês de agosto de 2015, e como a Missão alegou, se manteve em silêncio sobre um pretenso assédio e nunca perguntou à Missão qual tinha sido o seguimento dado aos seus correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015, nem se manifestou para informar a Missão de uma degradação da sua situação. A este respeito, na sua resposta a uma questão do Tribunal Geral, na audiência, o demandante limitou‑se a alegar que não tinha considerado útil iniciar tais diligências, que tinha tido confiança na Missão e que tinha acreditado que estava efetivamente em curso um inquérito.

    133

    É verdade que, no âmbito das informações adicionais que forneceu à Missão em 26 de outubro de 2015, o demandante observou que «quanto a [X.], est[eve] melhor durante um curto período (no decurso do mês de maio de 2015)», que «[devia] precisar qu[e,] estando ainda, [na] sequência [da su]a queixa de fevereiro, à espera da conclusão do procedimento disciplinar e de uma sanção que de facto teria [tido] um efeito “pedagógico” e “incentivador” sobre [X.] e vendo que este alterava a sua atitude, espera[va] que as coisas pudessem entrar na ordem» e que, «[p]ara encorajar esta alteração positiva durante esse curto período, até o [tinha] convidado para almoçar, convite que t[inha] aceitado e honrado com a sua presença». Por conseguinte, resulta das próprias declarações do demandante que, no mês de maio de 2015, este considerava que a atitude de X. a seu respeito tinha melhorado e que podia esperar, com o resultado da sua queixa e os sinais de encorajamento da sua parte, que as suas relações retomassem um curso normal. Todavia, como o próprio refere, esta melhoria apenas se verificou por um curto período e, por conseguinte, há que deduzir daí que, em seguida, a situação de assédio de que se queixava continuou. Consequentemente, mesmo admitindo que, no mês de maio de 2015, a melhoria da situação não incentivava o demandante a solicitar informações sobre o seguimento que tinha sido dado à sua queixa, o mesmo não sucede em relação ao período posterior.

    134

    Atendendo ao exposto, o Tribunal Geral considera que apenas pode ser considerado suficientemente demonstrado um nexo de causalidade direto entre a não abertura de um inquérito preliminar e a degradação do estado de saúde do demandante em relação ao período compreendido entre 10 de fevereiro de 2015 e o mês de maio de 2015 no máximo. Além deste período, deve considerar‑se que a degradação do estado de saúde do demandante já não decorre diretamente da não abertura de um inquérito preliminar, mas decorre igualmente da sua falta de diligências para se informar do seguimento dado aos seus correios eletrónicos de 7 e 9 de fevereiro de 2015 ou informar a sua hierarquia da degradação das suas relações com X. A este respeito, o correio eletrónico do demandante de 25 de agosto de 2015 deve ser considerado extemporâneo, tanto mais que, nessa data, o seu estado de saúde se tinha degradado a ponto de exigir, segundo os atestados médicos apresentados neste período, que entrasse em situação de baixa por doença e o seu regresso à Europa. Por conseguinte, e sem que seja necessário apreciar os outros argumentos que a Missão alegou a este respeito, esta não pode ser considerada responsável pelos danos morais sofridos pelo demandante depois do mês de maio de 2015 e, em particular, pelos que ocorreram após a partida do demandante da Missão, no final do mês de agosto de 2015.

    135

    Em segundo lugar, resulta dos n.os 112 e 113, supra, que os danos patrimoniais sofridos pelo demandante ocorreram posteriormente à sua partida da Missão no mês de agosto de 2015. Por conseguinte, pelas mesmas razões invocadas nos n.os 130 a 134, supra, deve considerar‑se que a Missão não pode ser considerada responsável por estes danos patrimoniais.

    136

    Tendo em consideração o exposto, o Tribunal Geral considera que o montante do dano moral sofrido pelo demandante deve ser fixado ex æquo et bono no montante de 10000 euros.

    137

    Resulta de todas as considerações anteriores que há que condenar a Missão a pagar ao demandante o montante de 10000 euros a título do dano moral sofrido e julgar improcedentes os restantes pedidos.

    Quanto às despesas

    138

    Nos termos do artigo 134.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas. No entanto, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal Geral pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

    139

    No caso em apreço, o demandante e a Missão foram vencidos parcialmente. Todavia, atendendo às circunstâncias do caso em apreço, há que decidir que a Missão suportará, além das suas próprias despesas, três quartos das despesas do demandante.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

    decide:

     

    1)

    A EUCAP Sahel Niger é condenada a pagar a PY a quantia de 10000 euros.

     

    2)

    A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

     

    3)

    A EUCAP Sahel Niger é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, três quartos das despesas efetuadas por PY.

     

    Gratsias

    Dittrich

    Xuereb

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de abril de 2018.

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

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