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Document 62016TJ0068

    Acórdão do Tribunal Geral (Quarta Secção) de 17 de janeiro de 2018.
    Deichmann SE contra Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia.
    Marca da União Europeia — Processo de extinção — Marca figurativa da União Europeia que representa uma cruz na lateral de um sapato desportivo — Marca de posição — Utilização séria da marca — Artigo 15.o, n.o 1, e artigo 51.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.o 207/2009 [atuais artigo 18.o, n.o 1, e artigo 58.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (UE) 2017/1001].
    Processo T-68/16.

    ECLI identifier: ECLI:EU:T:2018:7

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

    17 de janeiro de 2018 ( *1 )

    «Marca da União Europeia — Processo de extinção — Marca figurativa da União Europeia que representa uma cruz na lateral de um sapato desportivo — Marca de posição — Utilização séria da marca — Artigo 15.o, n.o 1, e artigo 51.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.o 207/2009 [atuais artigo 18.o, n.o 1, e artigo 58.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (UE) 2017/1001]»

    No processo T‑68/16,

    Deichmann SE, com sede em Essen (Alemanha), representada por C. Onken, advogado,

    recorrente,

    contra

    Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por D. Gája, na qualidade de agente,

    recorrido,

    sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do EUIPO, interveniente no Tribunal Geral,

    Munich, SL, estabelecida em Capellades (Espanha), representada por J. Güell Serra e M. del Mar Guix Vilanova, advogados,

    que tem por objeto um recurso interposto da decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO, de 4 de dezembro de 2015 (processo R 2345/2014‑4), relativa a um processo de extinção entre a Deichmann e a Munich,

    O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

    composto por: H. Kanninen, presidente, J. Schwarcz (relator) e C. Iliopoulos, juízes,

    secretário: X. Lopez Bancalari, administradora,

    vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de fevereiro de 2016,

    vista a resposta do EUIPO apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de abril de 2016,

    vistas as observações da interveniente apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de julho de 2016,

    após a audiência de 27 de junho de 2017,

    profere o presente

    Acórdão

    Antecedentes do litígio

    1

    Em 6 de novembro de 2002, a interveniente, Munich, SL, apresentou um pedido de registo de marca da União Europeia ao Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), nos termos do Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), conforme alterado, ele próprio substituído pelo Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1)].

    2

    A marca figurativa cujo registo foi pedido estava representada da seguinte forma:

    Image

    3

    Os produtos para os quais o registo foi pedido pertencem à classe 25 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «Calçado para desporto».

    4

    A marca foi registada em 24 de março de 2004 sob o número 2923852.

    5

    No âmbito da ação de contrafação intentada pela interveniente no Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Düsseldorf, Alemanha), contra a recorrente, Deichmann SE, esta última apresentou, em 29 de junho de 2010, um pedido reconvencional a título do artigo 100.o, n.o 1, do artigo 51.o, n.o 1, alínea a), e do artigo 52.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009 [atuais artigo 128.o, n.o 1, artigo 58.o, n.o 1, alínea a), e artigo 59.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento 2017/1001]. O Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Düsseldorf) notificou devidamente o EUIPO do pedido reconvencional e este facto foi inscrito no registo de marcas da União Europeia, em conformidade com o artigo 100.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 128.o, n.o 4, do Regulamento 2017/1001). Em 26 de outubro de 2010, o Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Düsseldorf) decidiu suspender a ação de contrafação a título do artigo 100.o, n.o 7, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 128.o, n.o 7, do Regulamento 2017/1001) e convidou a recorrente a apresentar um pedido de extinção e um pedido de declaração de nulidade ao EUIPO no prazo de três meses.

    6

    Em 26 de janeiro de 2011, a recorrente apresentou, junto do EUIPO, um pedido de extinção da marca em causa com base no artigo 51.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009, com o fundamento de que a mesma não tinha sido objeto de uma utilização séria na União Europeia, nomeadamente no decurso dos cinco anos anteriores à data do pedido reconvencional, para os produtos para os quais tinha sido registada (processo 5141 C, abrangido pelo presente recurso). Por outro lado, no mesmo dia, a recorrente apresentou, junto do EUIPO, um pedido de declaração de nulidade da marca em causa por motivos absolutos, com base no artigo 52.o, n.o 1, alínea a), deste mesmo regulamento (processo 5143 C).

    7

    Em 31 de janeiro de 2011, o EUIPO convidou a interveniente a apresentar provas relativas à utilização da marca em causa. Em 28 de abril de 2011, a interveniente apresentou um conjunto de provas da utilização. Num primeiro anexo, tratavam‑se de faturas datadas entre 26 de janeiro de 2006 e 26 de janeiro de 2011, emitidas pela Berneda SA, a saber, uma empresa associada à interveniente e autorizada por esta última a utilizar a marca em causa. Essas faturas eram dirigidas aos clientes em diversos Estados‑Membros e faziam referência a números de modelos de sapatos específicos. Foram incluídos, pela interveniente, quadros por cada Estado‑Membro, associando os números de modelos de sapatos vendidos com as entradas de catálogo correspondentes, que figuravam num segundo anexo. Este anexo referia‑se a catálogos gerais e de época de 2006 a 2011, apresentando fotografias de sapatos cujos números de modelos correspondiam às faturas apresentadas no primeiro anexo. A interveniente indicou ter compreendido que o período adequado correspondia aos cinco anos anteriores à data do pedido de extinção no EUIPO. Contudo, no caso de o EUIPO considerar que o período adequado correspondia aos cinco anos anteriores à data de apresentação do pedido reconvencional no Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Düsseldorf), a interveniente alegou que podia apresentar documentos suplementares comprovativos de uma utilização da marca em causa relativamente ao período compreendido entre 29 de junho de 2005 e 26 de janeiro de 2006. Em 29 de abril de 2011, apresentou ainda um quadro de seis páginas que estabelecia referências cruzadas entre cada fatura e modelo de sapatos vendido em relação ao número de modelo contido nos catálogos que figuram no referido segundo anexo, para certas faturas suplementares emitidas pela empresa Berneda e relativas ao período compreendido entre 25 de agosto de 2009 e 26 de janeiro de 2011.

    8

    Em 25 de junho de 2014, a interveniente indicou, «por precaução», que se baseava também em documentos que tinha apresentado no EUIPO no âmbito de um outro processo, para o qual remetia.

    9

    Por decisão de 7 de agosto de 2014, a Divisão de Anulação julgou procedente o pedido de extinção, declarou a extinção da marca em causa a partir de 26 de janeiro de 2011 e condenou a interveniente no pagamento das despesas. Em substância, considerou que os elementos de prova apresentados não permitiam provar a utilização séria da referida marca durante o período adequado, que considerou, sem explicar a razão, como sendo o período de cinco anos imediatamente anterior à data de apresentação do pedido de extinção no EUIPO. Em particular, a Divisão de Anulação considerou que os elementos de prova apresentados diziam respeito a situações de utilização de formas que diferiam da marca em causa em elementos que alteravam o seu caráter distintivo, na aceção do artigo 15.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001).

    10

    Em 10 de setembro de 2014, a interveniente interpôs recurso da decisão da Divisão de Anulação.

    11

    Por decisão de 4 de dezembro de 2015 (a seguir «decisão impugnada»), a Quarta Câmara de Recurso do EUIPO anulou a decisão da Divisão de Anulação e indeferiu o pedido de extinção. Em substância, indicou que os elementos de prova de utilização demonstravam a utilização da marca em causa para «calçado desportivo», abrangido pela classe 25, durante o período pertinente que definiu como correspondendo aos cinco anos anteriores à data de apresentação do pedido reconvencional, a saber, o período compreendido entre 29 de junho de 2005 e 28 de junho de 2010 (a seguir «período pertinente»).

    12

    Mais especificamente, no que diz respeito ao caráter da marca em causa, a Câmara de Recurso, depois de ter observado que a mesma consistia na representação gráfica conforme figura no n.o 2 supra e depois de a ter descrito de forma detalhada, considerou que, «na medida em que [era] a representação gráfica que [definia] a marca, a questão de saber [se se tratava] de uma marca de posição ou de uma marca figurativa [não era] pertinente». Na verdade, segundo a Câmara de Recurso, as marcas de posição aproximam‑se das categorias de marcas figurativas e tridimensionais uma vez que visam a aplicação de elementos figurativos e tridimensionais na superfície de um produto. O fator determinante, tendo em conta o âmbito da proteção da marca, não é o da qualificação do sinal em causa como sinal figurativo, tridimensional ou de posição, mas a forma como a marca é percecionada pelo público relevante em relação aos produtos em causa. Esta forma de percecionar a marca é suscetível de ser influenciada apenas pela natureza do sinal conforme foi registado. Segundo a Câmara de Recurso, a marca em causa «visa a proteção de um padrão em forma de cruz especificamente colocado numa determinada parte da superfície do produto designado, a saber, um sapato desportivo». A Câmara de Recurso considerou que a marca em causa não podia ser dissociada da forma de uma parte desse produto, a saber, da parte superior de um sapato desportivo.

    13

    Em seguida, a Câmara de Recurso realizou uma análise dos elementos de prova apresentados pela interveniente, que consistiam nomeadamente num número importante de faturas e de catálogos de produtos, tendo concluído, em substância, que os mesmos comprovavam, no seu conjunto, uma utilização séria da marca em causa, ou seja, da sua exploração comercial real, no que dizia respeito à importância da utilização, à sua duração, ao seu alcance geográfico e à sua natureza. Quanto a este último aspeto, a Câmara de Recurso considerou que a decisão da Divisão de Anulação, segundo a qual as imagens que figuravam nos vários catálogos submetidos pela interveniente representavam diferentes tipos de sapatos desportivos nos quais foram apostas diversas linhas cruzadas que alteravam o caráter distintivo da marca em causa, não podia ser aprovada. Pelo contrário, segundo a Câmara de Recurso, as diferenças entre a marca utilizada e a marca em causa seriam «negligenciáveis, dificilmente visíveis, ou mesmo inexistentes». A Câmara de Recurso considerou que, nas circunstâncias do caso em apreço, podia também tomar em consideração, para determinar a utilização séria da marca em causa, elementos em cores, independentemente do facto de a marca ter sido registada em preto e branco.

    14

    Por último, a Câmara de Recurso referiu‑se a certos elementos adicionais que confirmavam as suas conclusões, como um acórdão do Juzgado de marca comunitaria d’Alicante (Juiz da Marca Comunitária de Alicante, Espanha), de 31 de julho de 2007, «que declarou que a marca [em causa] era considerada forte e de renome no domínio dos sapatos desportivos em Espanha», ou outros elementos de prova relativos a um período posterior a 28 de junho de 2010, que demonstravam a existência de uma «tendência geral de uma utilização constante e ininterrupta», conforme estabelecido para o período pertinente.

    Pedidos das partes

    15

    A recorrente conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

    anular a decisão impugnada;

    condenar o EUIPO e a interveniente nas despesas.

    16

    O EUIPO conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

    negar provimento ao recurso;

    condenar a recorrente nas despesas.

    17

    A interveniente conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

    negar provimento ao recurso;

    confirmar a decisão impugnada;

    condenar a recorrente nas despesas.

    Questão de direito

    18

    A recorrente invoca três fundamentos de recurso. O primeiro é relativo a uma violação do artigo 51.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009, na medida em que a Câmara de Recurso terá avaliado de forma incorreta o objeto da marca em causa, ao considerar que a questão de saber se se trata de uma marca figurativa ou de uma marca de posição era desprovida de pertinência. O segundo fundamento é relativo à violação do artigo 51.o, n.o 1, e do artigo 15.o, n.o 1, deste regulamento, na medida em que, para determinar se a marca em causa era utilizada sob a sua forma registada ou sob uma forma que não alterava o seu caráter distintivo, a Câmara de Recurso limitou‑se a comparar uma parte desta, a saber, duas linhas entrecruzadas, com as linhas apostas nos sapatos desportivos alegadamente comercializadas pela interveniente. O terceiro fundamento é relativo a uma violação do artigo 51.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009, na medida em que a decisão impugnada seria baseada em modelos de sapatos cuja comercialização pela interveniente não teria sido demonstrada.

    19

    Importa constatar que, com os seus fundamentos, a recorrente alega, em substância, que a Câmara de Recurso cometeu um erro quanto ao próprio objeto da marca em causa e defende que esta não foi utilizada sob a forma pela qual foi registada, a saber, segundo a recorrente, como representação de contornos de um sapato desportivo sem solas, com duas linhas entrecruzadas na lateral.

    20

    Tendo em conta as alegações da recorrente no âmbito do segundo e terceiro fundamentos, proceder‑se‑á a uma análise conjunta destes últimos depois de analisado o primeiro fundamento.

    21

    Por outro lado, na medida em que a interveniente pede nomeadamente a confirmação da decisão impugnada, importa salientar que, dado que «confirmar a decisão impugnada» equivale a negar provimento ao recurso, o segundo pedido da interveniente visa, em substância, que seja negado provimento ao recurso, confundindo‑se assim com o seu primeiro pedido [v., neste sentido, acórdão de 5 de fevereiro de 2016, Kicktipp/IHMI — Italiana Calzature (kicktipp), T‑135/14, EU:T:2016:69, n.o 19 (não publicado) e jurisprudência referida].

    Quanto ao primeiro fundamento

    22

    Segundo a recorrente, a marca em causa não foi registada sob a categoria «outras» marcas e não pode ser considerada uma marca «de posição», mas apenas uma marca figurativa. É definida pela sua representação gráfica, conforme decorre do certificado de registo, sem que a «perceção do público» tenha um papel determinante a este respeito. De acordo com a recorrente, não se pode considerar que se trata de «qualquer tipo de sapato desportivo normal», nem de um sapato «com solas». Não decorre nenhuma consequência particular do facto de os contornos da imagem de um sapato, que compõem a marca em causa, estarem representados por linhas tracejadas. Da mesma forma, segundo a recorrente, a referência feita pela interveniente ao facto de a antiguidade da marca espanhola «de posição», registada sob o número 1658216, ter sido aceite pelo EUIPO, para a marca em causa, não tem qualquer consequência para a solução do presente litígio. No âmbito do seu pedido de audiência, de 5 de setembro de 2016, a recorrente fez referência a uma decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO, de 6 de julho de 2016 (processo R 408/2015‑4). Alegou que este processo era análogo ao presente processo e que a marca que representa duas linhas paralelas mudando, por diversas vezes, de direção, colocadas na lateral de um sapato desportivo, tinha sido considerada uma marca figurativa e não uma marca «de posição». Na audiência, a recorrente alegou que a sua remissão para a decisão suspensa era admissível, uma vez que esta estava publicada na língua do processo, a saber, em inglês, no sítio Internet do EUIPO.

    23

    O EUIPO e a interveniente contestam as alegações da recorrente. Além disso, na audiência, a interveniente alegou que a referência feita pela recorrente à decisão da Câmara de Recurso de 6 de julho de 2016 era inadmissível, por um lado, devido ao facto de não ter sido apresentada na íntegra na língua do processo e, por outro, pelo facto de a recorrente não ter precisado suficientemente as razões a favor da tomada em consideração da referida decisão no caso em apreço.

    24

    Nos termos do artigo 51.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009, é declarada a perda dos direitos do titular da marca da União Europeia, na sequência de pedido apresentado ao EUIPO ou de pedido reconvencional em ação de contrafação, se, durante um período ininterrupto de cinco anos, a marca não for objeto de uma utilização séria na União em relação aos produtos ou serviços para que foi registada e se não existirem motivos justos para a sua não utilização.

    25

    Por força da regra 22, n.os 3 e 4, do Regulamento (CE) n.o 2868/95 da Comissão, de 13 de dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento n.o 40/94 do Conselho, sobre a marca comunitária (JO 1995, L 303, p. 1) [atual artigo 10.o, n.os 3 e 4, do Regulamento Delegado (UE) 2017/1430 da Comissão, de 18 de maio de 2017, que complementa o Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho sobre a marca da União Europeia e que revoga os Regulamentos (CE) n.o 2868/95 e (CE) n.o 216/96 (JO 2017, L 205, p. 1)], aplicável aos processos de extinção nos termos da regra 40, n.o 5, deste regulamento (atual artigo 19.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1430), a prova de utilização deve ter por objeto o lugar, a duração, a importância e a natureza da utilização que foi feita da marca e limita‑se, em princípio, à produção de documentos comprovativos, como embalagens, etiquetas, regimes de preços, catálogos, faturas, fotografias, anúncios nos jornais, bem como às declarações escritas referidas no artigo 78.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento n.o 207/2009 [atual artigo 97.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento n.o 2017/1001].

    26

    Na interpretação do conceito de utilização séria, importa ter em conta o facto de a ratio legis da exigência segundo a qual a marca deve ser objeto de uma utilização séria não visar avaliar o sucesso comercial nem controlar a estratégia económica de uma empresa ou ainda reservar a proteção das marcas apenas às suas explorações comerciais quantitativamente importantes [v. acórdão de 27 de setembro de 2007, La Mer Technology/IHMI — Laboratoires Goëmar (LA MER), T‑418/03, não publicado, EU:T:2007:299, n.o 53 e jurisprudência referida].

    27

    Conforme decorre da jurisprudência, uma marca é objeto de uma utilização séria quando é utilizada, em conformidade com a sua função essencial, que consiste em garantir a identidade de origem dos produtos e dos serviços para os quais foi registada, a fim de criar ou conservar um mercado para estes produtos ou serviços, com exclusão de usos de caráter simbólico que tenham como único objetivo a manutenção dos direitos conferidos pela marca. Além disso, a condição relativa à utilização séria da marca exige que esta, tal como é protegida no território pertinente, seja utilizada publicamente e com relevância exterior [v. acórdão de 6 de outubro de 2004, Vitakraft‑Werke Wührmann/IHMI — Krafft (VITAKRAFT), T‑356/02, EU:T:2004:292, n.o 26 e jurisprudência referida].

    28

    A apreciação do caráter sério da utilização da marca deve assentar na totalidade dos factos e das circunstâncias adequados a demonstrar que a exploração comercial da mesma é real, em especial, nas utilizações consideradas justificadas no setor económico em questão para manter ou criar quotas de mercado em benefício dos produtos ou dos serviços protegidos pela marca, na natureza desses produtos ou serviços, nas características do mercado, na extensão e na frequência da utilização da marca [v. acórdão de 10 de setembro de 2008, Boston Scientific/IHMI — Terumo (CAPIO), T‑325/06, não publicado, EU:T:2008:338, n.o 30 e jurisprudência referida].

    29

    Por outro lado, a utilização séria de uma marca não pode ser demonstrada por meio de probabilidades ou presunções, antes deve basear‑se em elementos concretos e objetivos que provem uma utilização efetiva e suficiente da marca no mercado em causa [v. acórdão de 23 de setembro de 2009, Cohausz/IHMI — Izquierdo Faces (acopat), T‑409/07, não publicado, EU:T:2009:354, n.o 36 e jurisprudência referida]. Há que proceder a uma apreciação global que tenha em conta todos os fatores pertinentes do caso em apreço e que implica uma certa interdependência dos fatores tidos em conta [v. acórdão de 18 de janeiro de 2011, Advance Magazine Publishers/IHMI — Capela & Irmãos (VOGUE), T‑382/08, não publicado, EU:T:2011:9, n.o 30 e jurisprudência referida].

    30

    Importa recordar que não é possível determinar a priori, de forma abstrata, qual o limite quantitativo que deve ser considerado para determinar se a utilização tinha ou não caráter sério, pelo que não pode ser fixada uma regra de minimis, que não permitiria ao EUIPO ou, em sede de recurso, ao Tribunal Geral apreciar a totalidade das circunstâncias do litígio que lhes é submetido. Assim, quando corresponde a uma justificação comercial efetiva, uma utilização, mesmo mínima, pode ser suficiente para comprovar a existência de um caráter sério (acórdão de 11 de maio de 2006, Sunrider/IHMI, C‑416/04 P, EU:C:2006:310, n.o 72).

    31

    Por último, há que precisar que, ao abrigo das disposições do artigo 15.o, n.o 1, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009 [atual artigo 18.o, n.o 1, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 2017/1001], a prova de utilização séria de uma marca anterior, nacional ou da União Europeia inclui também a prova de utilização da marca anterior sob uma forma que difira em elementos que não alterem o caráter distintivo desta marca na forma sob a qual foi registada.

    32

    No que diz respeito à qualificação de uma marca como marca «de posição», importa observar que nem o Regulamento n.o 207/2009 nem o Regulamento n.o 2868/95 mencionam essas marcas como categoria particular de marcas. Contudo, na medida em que o artigo 4.o do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 4.o do Regulamento 2017/1001) não comporta uma lista tipificada dos sinais suscetíveis de constituir marcas da União Europeia, esta circunstância é irrelevante no que toca à suscetibilidade de registo das «marcas de posição» [v., neste sentido, acórdão de 15 de junho de 2010, X Technology Swiss/IHMI (Peúga com a extremidade cor de laranja), T‑547/08, EU:T:2010:235, n.o 19].

    33

    Além disso, afigura‑se que as «marcas de posição» se aproximam das categorias de marcas figurativas e tridimensionais, uma vez que visam a aplicação de elementos figurativos ou tridimensionais à superfície de um produto (v., neste sentido, acórdão de 15 de junho de 2010, Peúga com a extremidade cor de laranja, T‑547/08, EU:T:2010:235, n.o 20) Decorre desta mesma jurisprudência que, no âmbito da apreciação do caráter distintivo de uma marca, a qualificação de uma «marca de posição» como marca figurativa ou tridimensional ou como categoria específica de marcas é irrelevante (acórdão de 15 de junho de 2010, Peúga com a extremidade cor de laranja, T‑547/08, EU:T:2010:235, n.o 21).

    34

    Por outro lado, há que salientar que a jurisprudência reconhece a possibilidade de que as marcas figurativas sejam na verdade marcas «de posição» [v., neste sentido, acórdãos de 18 de abril de 2013, Colloseum Holding, C‑12/12, EU:C:2013:253, n.o 13, e de 28 de setembro de 2010, Rosenruist/IHMI (Representação de duas curvas num bolso), T‑388/09, não publicado, EU:T:2010:410, n.os 2 e 17].

    35

    No caso em apreço, importa constatar, em primeiro lugar, que, no formulário do pedido de registo apresentado pela interveniente, esta última indicou expressamente que pedia o registo de uma marca figurativa assinalando a casa para este efeito, e não as previstas para as marcas «nominativas», «tridimensionais» ou «outras». Há que também salientar que não foi dito e que também não decorre dos autos que os formulários de pedidos de registo de marcas da União Europeia previam, na data do pedido da marca em causa, um caso à parte para as denominadas marcas «de posição». É aliás pacífico que a marca em causa foi apenas pedida para os produtos de «calçado desportivo». É possível estabelecer uma certa ligação entre a marca em causa e a aparência dos produtos abrangidos por esta, na medida em que a referida marca é representada por um grafismo específico, sob a forma de uma cruz na lateral de um sapato desportivo, sendo especificado que os contornos exatos desta não são reivindicados a título da marca uma vez que aparecem tracejados. Importa ainda salientar que a cruz em causa apresenta um contraste de cor com o próprio sapato desportivo e é colocada abaixo dos atacadores.

    36

    Contrariamente ao que alega a recorrente, não se pode deduzir do simples facto de que a casa «marca figurativa» foi assinalada no registo da marca em causa que esta não pode ser considerada, concomitantemente, uma marca «de posição». Quanto a este último aspeto, importa, em particular, ter em conta o facto de a sua representação gráfica designar claramente, por traços grossos, o elemento cuja proteção é pedida e, em tracejado, os contornos dos produtos em causa, nos quais o mesmo é aposto. Além disso, há que salientar que não existia, na data pertinente no presente caso, uma exigência formal de anexar uma descrição nominativa ao formulário de pedido de registo de uma marca para que esta pudesse ser considerada como sendo uma marca «de posição». Contudo, é necessário recordar que a marca em causa, sendo simultaneamente considerada abrangida por esse tipo de marca, continua a ser também uma marca figurativa.

    37

    Na audiência, a recorrente referiu‑se ainda às diretivas do EUIPO sobre práticas de avaliação das marcas da União Europeia, para alegar, em substância, que, relativamente às marcas «de posição», é necessário por um lado, incluir uma descrição da marca que precise a posição desta no produto em causa e, por outro, indicar expressamente que se trata de uma marca «de posição». Ora, a este respeito, há que indicar, sem que seja necessário avaliar se foi feita a referência acima referida à versão das diretivas EUIPO aplicável à data do pedido de registo da marca em causa, que, em conformidade com a jurisprudência, essas diretivas não constituem atos jurídicos vinculativos para interpretar as disposições do direito da União (v., neste sentido, acórdão de 19 de dezembro de 2012, Leno Merken, C‑149/11, EU:C:2012:816, n.o 48).

    38

    A título exaustivo, como indício suplementar que levou a considerar a marca em causa como uma marca «de posição», importa acrescentar que, como alegam, corretamente, o EUIPO e a interveniente perante o Tribunal Geral, esta última tinha reivindicado uma anterioridade, baseada na marca espanhola número 1658216, solicitada em 27 de setembro de 1991 e registada em 5 de junho de 1992, cuja representação gráfica era idêntica à marca em causa e que continha, além disso, uma descrição que precisava que a marca consistia na representação de uma cruz na lateral de um sapato desportivo.

    39

    Importa ainda analisar a alegação da recorrente segundo a qual a Câmara de Recurso terá interpretado a marca em causa como incluindo elementos que não fazem parte desta e que foram acrescentados «ao critério de qualquer um», como solas, o que infringe os requisitos resultantes nomeadamente dos n.os 48 a 55 do acórdão de 12 de dezembro de 2002, Sieckmann (C‑273/00, EU:C:2002:748), e relativos à representação gráfica de uma marca.

    40

    A este respeito, basta constatar que, no caso em apreço, pode deduzir‑se diretamente da representação gráfica da marca em causa, e com precisão suficiente, que a proteção solicitada visava apenas uma cruz, constituída por duas linhas pretas interpostas, representadas em traços contínuos. Por outro lado, os «tracejados» que formam os contornos do sapato desportivo e os seus atacadores devem ser entendidos no sentido de que permitem precisar a localização da referida cruz. Tal é o caso independentemente do tipo de solas afixadas nos referidos sapatos, normais ou onduladas, como foi constatado, corretamente, pela Câmara de Recurso no n.o 20 da decisão impugnada.

    41

    Com efeito, importa salientar que é nesse sentido que os tracejados são utilizados de forma habitual em situações comparáveis, a saber, relativamente a diversos produtos nos quais uma marca é aposta, sem indicar necessariamente em pormenor o conjunto de contornos ou de outras características dos referidos produtos [acórdãos de 7 de fevereiro de 2007, Kustom Musical Amplification/IHMI (Forma de uma guitarra), T‑317/05, EU:T:2007:39; por analogia, de 14 de junho de 2011, Sphere Time/IHMI — Punch (Relógio fixado a uma correia), T‑68/10, EU:T:2011:269, n.os 62 a 64; de 26 de fevereiro de 2014, Sartorius Lab Instruments/IHMI (Arco de círculo amarelo na parte inferior de um ecrã), T‑331/12, EU:T:2014:87, e de 14 de março de 2014, Lardini/IHMI (Aposição de uma flor numa lapela), T‑131/13, não publicado, EU:T:2014:129; v., também, neste sentido, acórdão de 4 de dezembro de 2015, K‑Swiss/IHMI (Representação de listas paralelas aplicadas num sapato), T‑3/15, não publicado, EU:T:2015:937, e, por analogia, acórdão de 21 de maio de 2015, adidas/IHMI — Shoe Branding Europe (Duas linhas paralelas sobre um sapato), T‑145/14, não publicado, EU:T:2015:303].

    42

    No caso em apreço, a utilização de tracejados tinha claramente como objetivo facilitar a compreensão do facto de que só era visada pela marca em causa a proteção da cruz, representada por traços grossos, e tal numa posição exata nos sapatos desportivos. Aliás, resulta do acórdão de 12 de novembro de 2013, Gamesa Eólica/IHMI — Enercon (Tons de verde) (T‑245/12, não publicado, EU:T:2013:588, n.o 38), que nenhuma norma obriga a representar os contornos do sinal em tracejado, para indicar, se for caso disso, que os referidos contornos não são objeto da proteção. O facto de tais tracejados terem sido utilizados no caso em apreço pode ser interpretado no sentido de que permite uma melhor delimitação do que constitui a marca em causa.

    43

    É possível concluir que, embora a marca em causa vise a proteção de uma representação de cruz, constituída por duas linhas pretas interpostas, em traços contínuos, esta proteção não é reivindicada em abstrato, mas sim para efeitos da aplicação do grafismo em causa na lateral de um sapato desportivo, na forma que resulta do formulário de pedido de registo, com um contraste de cor em relação ao próprio sapato. A forma do referido sapato, enquanto tal, não é visada pela marca, nem tão‑pouco o tipo de solas utilizadas.

    44

    Nestas circunstâncias, contrariamente ao que a recorrente alega, importa sublinhar que a Câmara de Recurso pôde, com razão, considerar que, «na medida em que [era] a representação gráfica que [definia] a marca, a questão de saber [se se tratava] de uma marca de posição ou de uma marca figurativa [não era] pertinente» (v. n.o 12 supra). A Câmara de Recurso também partiu corretamente da premissa de que a marca em causa não podia ser dissociada da forma de uma parte do produto para o qual estava protegida, a saber, da parte superior de um sapato desportivo, e que o fator determinante, tendo em conta o âmbito da sua proteção, era a forma como seria percecionada, baseando‑se apenas no sinal conforme registado.

    45

    Por outro lado, há que constatar que esta conclusão não é invalidada pela remissão feita pela recorrente para a decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO de 6 de julho de 2016 (processo R 408/2015‑4), cujas circunstâncias de facto e de direito são diferentes das do presente processo.

    46

    A este respeito, importa julgar improcedente o argumento da interveniente relativo à falta de tradução na língua do processo, da referida decisão, bem como a sua alegação relativa à inadmissibilidade da remissão efetuada pela recorrente para a referida decisão. Com efeito, por um lado, no seu pedido de audiência de 5 de setembro de 2016, a recorrente traduziu diretamente a parte relevante para inglês. Por outro, esta decisão é publicada na íntegra em inglês no sítio Internet do EUIPO. Aliás, em resposta a uma questão do Tribunal colocada na audiência, a interveniente confirmou ter tomado conhecimento do texto da referida decisão.

    47

    Além disso, há que constatar que, ao contrário do presente processo, no processo que deu origem à decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO de 6 de julho de 2016, os produtos referidos no pedido de marca não estavam limitados ao «calçado desportivo», mas incluíam também outros produtos abrangidos pela classe 25, tais como «roupas, […] chapelaria, cintos ou luvas». Por conseguinte, a questão de saber se a marca que incluía um tipo de grafismo que consistia em duas linhas paralelas que mudam várias vezes de direção e estão colocadas na lateral de um sapato desportivo apresentava uma ligação com a forma dos produtos visados era submetida de uma forma diferente da do caso em apreço, em que foi constatado que a marca em causa não podia ser dissociada da forma de uma parte do produto, a saber, da parte superior de um sapato desportivo (v. n.os 12 e 44 supra).

    48

    Nessas circunstâncias, a referência feita pela recorrente ao n.o 17 da decisão adotada no processo R 408/2015‑4, na qual foi concluído que a marca era uma marca figurativa e não uma marca «de posição», não permite traçar uma analogia com o presente caso. Por outro lado, importa acrescentar que, de qualquer modo, no n.o 18 da referida decisão, a Câmara de Recurso do EUIPO indicou que a questão de saber se a marca pedida devia ser considerada uma marca «de posição» não era relevante para a sua análise.

    49

    À luz das considerações que precedem, importa concluir que, no caso em apreço, a Câmara de Recurso não cometeu um erro ao proceder à análise da questão de saber se os sapatos desportivos, cujas vendas eram comprovadas por diversos elementos de prova sobre a utilização séria da marca em causa, continham um elemento gráfico que consistia num padrão em forma de cruz especificamente colocado numa determinada parte da superfície do produto designado, que podia ser considerado quer idêntico quer correspondente ao elemento gráfico resultante da representação da marca em causa, em conformidade com o artigo 15.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009.

    50

    Há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

    Quanto ao segundo e terceiro fundamentos

    51

    No âmbito do seu segundo fundamento, a recorrente alega que a Câmara de Recurso devia examinar se a marca em causa, que consiste na imagem de conjunto de um sapato desportivo com linhas entrecruzadas, era utilizada nos sapatos ou em relação com os sapatos. Segundo a recorrente, esta marca não aparece nos sapatos que figuram nos elementos de prova apresentados. A mesma afirma que, na medida em que a marca em causa é uma marca figurativa, a comercialização de sapatos semelhantes a esses não pode provar a utilização desta marca, uma vez que os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando‑se na sua forma. Além disso, e em qualquer caso, os sapatos efetivamente vendidos pela interveniente diferem consideravelmente do sapato representado pela marca em causa. A recorrente também invoca a falta de caráter distintivo da marca em causa, ou, pelo menos, o seu caráter distintivo extremamente reduzido, de tal forma que qualquer diferença na utilização da marca alteraria esse caráter.

    52

    No âmbito do seu terceiro fundamento, a recorrente alega, em substância, que não está demonstrado que os modelos de sapatos REAGEE, TECNO e AVANT, aos quais a Câmara de Recurso fez referência na decisão impugnada, teriam sido comercializados, e mesmo que os modelos em causa figuraram num ou em vários catálogos apresentados pela interveniente. Nenhuma venda foi demonstrada. A simples representação num catálogo, cuja distribuição não foi demonstrada, não é suficiente para provar uma utilização séria de uma marca. Mais especificamente, o modelo MARCELO surge apenas num único catálogo, datado de 2006, o que demonstra quando muito que as últimas vendas deste modelo remontam a janeiro de 2007. Segundo a recorrente, isso devia levar a considerar que as conclusões da Câmara de Recurso, segundo as quais os elementos de prova mencionados constituem indicações suficientes que permitem determinar a utilização séria da marca, padecem de erros.

    53

    O EUIPO e a interveniente contestam as alegações da recorrente.

    54

    Neste contexto, há que analisar se as provas apresentadas pela interveniente perante o EUIPO permitem, no seu conjunto, confirmar uma utilização séria da marca em causa, em conformidade com a jurisprudência recordada nos n.os 24 a 30 supra.

    55

    Em primeiro lugar, importa salientar que, nos n.os 17 e 18 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso fixou corretamente o período pertinente como correspondendo aos cinco anos anteriores à data de apresentação do pedido reconvencional, a saber, o período compreendido entre 29 de junho de 2005 e 28 de junho de 2010, tendo em conta a redação dos pedidos apresentados pela recorrente, em primeiro lugar, no âmbito do processo reconvencional e depois perante o EUIPO.

    56

    A este respeito, é com razão que a Câmara de Recurso constatou, sem que tal seja aliás contestado no presente caso, que o pedido de extinção perante o EUIPO era uma consequência direta do pedido reconvencional apresentado pela recorrente no âmbito da ação de contrafação intentada contra esta pela interveniente no Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Düsseldorf) e que qualquer utilização da marca em causa depois da interveniente ter sido notificada desta contestação reconvencional devia ser abordada «com a maior prudência». A Câmara também concluiu corretamente, no n.o 18 da decisão impugnada, que os elementos submetidos a título de prova de utilização séria da marca em causa depois do período pertinente podiam, em certas condições, ter valor probatório, nomeadamente na medida em que permitiam apoiar os elementos de prova anteriores e demonstrar uma tendência e um modo de utilização constantes ao longo do tempo.

    57

    Em segundo lugar, contrariamente às alegações da recorrente, é com razão que a Câmara de Recurso considerou, nos n.os 19 a 30 da decisão impugnada, que os elementos de prova apresentados perante a Divisão de Anulação eram suficientes para provar a utilização séria da marca em causa.

    58

    Com efeito, em primeiro lugar, importa constatar que os elementos de prova, mencionados nos três primeiros travessões do n.o 27 da decisão impugnada pela interveniente ou por empresas associadas à interveniente e autorizadas por esta a utilizar a marca em causa, relativos às vendas dos sapatos desportivos abrangidos pelos modelos MARCELO, MUNDIAL REVOLUTION e GALES, cujas imagens são apresentadas no n.o 24 da referida decisão e relativamente às quais a Câmara de Recurso precisou as referências concretas no processo administrativo do EUIPO, conforme foi comunicado ao Tribunal, já permitem apoiar a conclusão de que a utilização da marca em causa incidia sobre um território suficientemente amplo e diversificado que cobria vários Estados‑Membros da União, nomeadamente o território da Espanha (incluindo várias cidades como Madrid, Barcelona, Córdova, Granada, Tarragona, Cádis, Valência, Corunha e Girona), da Itália, de Portugal, da Dinamarca, da Eslováquia, da França e da Hungria (resulta das faturas que, também para estes países, as vendas tiveram lugar em várias cidades diferentes).

    59

    Em segundo lugar, o Tribunal salienta que as faturas apresentadas relativamente a esses modelos de sapatos desportivos dizem respeito a vários anos do período pertinente, e mesmo além do mesmo, conforme constatou a Câmara de Recurso no n.o 30 da decisão impugnada. Assim, enquanto para os sapatos do modelo MARCELO os elementos de prova dizem respeito aos anos de 2006/2007, para o modelo MUNDIAL REVOLUTION os elementos de prova apresentados dizem respeito a utilizações da marca em causa durante os anos de 2007 a 2011. Da mesma forma, os catálogos dos modelos GALES dizem respeito aos anos de 2006 a 2011.

    60

    Daqui resulta uma utilização suficientemente constante ao longo do tempo. Com efeito, contrariamente às alegações da recorrente, as referidas faturas demonstram uma utilização efetiva, constante e ininterrupta. Além disso, como sublinha corretamente a Câmara de Recurso, se a recorrente considerou a data de 26 de janeiro de 2006 e não a de 29 de junho de 2005 (v. n.o 7 supra) como o início do período a ter em consideração, de forma que nenhum elemento de prova incida sobre o início do período pertinente, a saber, de 29 de junho de 2005 a 26 de janeiro de 2006, esta circunstância é desprovida de pertinência. Com efeito, é jurisprudência constante que basta que uma marca tenha sido objeto de uma utilização séria durante pelo menos uma parte do período pertinente [v., neste sentido, acórdão de 16 de dezembro de 2008, Deichmann‑Schuhe/IHMI — Design for Woman (DEITECH), T‑86/07, não publicado, EU:T:2008:577, n.o 52 e jurisprudência referida].

    61

    Em terceiro lugar, no que diz respeito à importância da utilização, é com razão que a Câmara de Recurso constatou, no n.o 27 da decisão impugnada, que os elementos de prova considerados no seu conjunto comprovavam uma exploração comercial real da marca em causa, que não era apenas simbólica, mas sim de uma dimensão e de uma estabilidade suficiente para permitir manter ou criar partes de mercado para os produtos protegidos pela marca.

    62

    A este respeito, os números indicados no n.o 27 da decisão impugnada e cuja veracidade não foi contestada pela recorrente no Tribunal, são baseados em faturas conjugadas com os catálogos. Ora, daqui resulta que, entre 2006 e 2011, a interveniente comercializou de forma constante um número importante de sapatos desportivos com cruzes laterais que não diferiam, ou que apenas diferiam de forma negligenciável, da marca em causa, a saber, os modelos MARCELO, MUNDIAL REVOLUTION e GALES. Mais concretamente, no que respeita ao primeiro modelo, que surge num catálogo, as vendas incidem sobre várias dezenas de sapatos, por um montante total que ascende aos milhares de euros. O segundo modelo surge em vários catálogos e era vendido em várias centenas de pares, por um montante total de vários milhares de euros. Por último, o terceiro modelo surge também em vários catálogos. Estes sapatos desportivos, cuja imagem é retomada no n.o 24 da decisão impugnada, apresentam uma cruz formada na lateral do sapato, em contraste evidente com a cor da restante parte deste sapato. Em razão da posição da cruz, bem como dessas outras características, há que concluir que todos estes três modelos comprovam uma utilização da marca em causa.

    63

    Na verdade, os números relativos às referidas vendas podem não parecer particularmente elevados. No entanto, considerados em conjunto com os catálogos, comprovam uma utilização real, conforme foi indicado no n.o 28 da decisão impugnada, e conforme com a jurisprudência recordada nos n.os 26 a 30 supra. Em especial, importa recordar que não compete ao EUIPO e, em sede de recurso, ao Tribunal avaliar o sucesso comercial nem controlar a estratégia económica de uma empresa, nem reservar a proteção das marcas apenas às explorações comerciais quantitativamente importantes.

    64

    Em terceiro lugar, há que avaliar se a Câmara de Recurso considerou corretamente que os elementos de prova apresentados pela interveniente permitiam, no seu conjunto, demonstrar a utilização de uma marca idêntica ou suficientemente semelhante à registada, sem que o seu caráter distintivo fosse alterado. Há que precisar que não se trata de determinar se foi colocada nos produtos em causa uma etiqueta na qual figura a marca em causa, nem de comparar os sapatos vendidos a esta mesma marca incluindo os elementos indicados em tracejado.

    65

    A este respeito, impõe‑se constatar que as diferenças entre a marca em causa e as variantes utilizadas nos sapatos desportivos pela interveniente são negligenciáveis. Com efeito, contrariamente às alegações da recorrente, a cruz representada por duas linhas sobrepostas está no mesmo lugar e na mesma posição que é prevista pela representação gráfica da marca em causa, a saber, na lateral exterior do sapato, por conseguinte, partindo da sola ou da parte inferior em direção aos atacadores. Várias fotografias apresentadas como elementos de prova demonstram uma utilização correspondente à marca em causa, com uma das linhas da cruz mais longa do que a segunda. Além disso, a espessura das linhas, bem como a sua inclinação, correspondem, em substância, para um número significante de sapatos apresentados como elementos de prova perante o EUIPO, ao que decorre da representação gráfica da marca em causa.

    66

    Nalguns outros sapatos apresentados como elementos de prova, os grafismos utilizados são quase idênticos, embora as proporções e a cor da cruz utilizada possam variar. Contudo, conforme afirmou corretamente a Câmara de Recurso, estes elementos não alteram as características distintivas da marca em causa, registada em preto e branco, na medida em que a cor não pode ser considerada como sendo um dos principais fatores que conferem a esta marca o seu caráter distintivo. Em especial, a utilização de cores diferentes pode ser tomada em consideração no presente caso, desde que o contraste entre as cores de fundo e as linhas que constituem a cruz seja respeitado. Neste sentido, o facto de certos sapatos em causa se apresentarem sob uma forma de «imagem em negativo», com a cruz em branco, em amarelo ou numa outra cor pálida, não invalida a constatação de que essa utilização, na medida em que a cruz corresponde à posição e às dimensões da marca em causa, continua pertinente para a análise do presente caso.

    67

    O facto de certos sapatos incluírem também outros elementos gráficos que podem ser memorizados pelos consumidores e apresentar um caráter distintivo autónomo, como uma sola ou uma parte traseira de sapato colorida e distinta do resto do mesmo, pitões, um salto que se diferencia pela sua cor do resto do sapato, um «padrão de couro de crocodilo», uma «tampa vermelha acima dos atacadores» ou ainda, para certos sapatos, elementos nominativos adicionais, não permite colocar em causa a constatação da utilização séria da marca em causa.

    68

    Com efeito, importa salientar que resulta da jurisprudência que o requisito de «utilização séria», na aceção do artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009, pode ser preenchido mesmo quando uma marca figurativa da União Europeia só é utilizada em combinação com outros elementos que lhe são justapostos, ou até sobrepostos, desde que a marca continue a ser apercebida como uma indicação da origem do produto em causa (v., neste sentido, acórdão de 18 de julho de 2013, Specsavers International Healthcare e o., C‑252/12, EU:C:2013:497, n.os 19 a 27 e jurisprudência referida).

    69

    Por outro lado, há que acrescentar que, no caso em apreço, decorre dos elementos de prova que a cruz, utilizada em diferentes sapatos e que consiste em duas linhas sobrepostas, é claramente percetível, de forma independente da eventual presença de outros elementos mencionados pela recorrente. A Câmara de Recurso concluiu, corretamente, no n.o 25 da decisão impugnada, que, com exceção de diferenças negligenciáveis, pouco visíveis, até invisíveis, como o comprimento preciso das linhas da cruz, a espessura das linhas ou o ângulo exato da sua inclinação, a representação deste padrão era praticamente idêntica ao da marca em causa. Da mesma forma, o EUIPO alega com razão, perante o Tribunal, que, para além da enumeração de certos elementos suplementares que figuram nos sapatos representados nas fotografias, a recorrente não aduziu nenhum argumento que explique de que formas os mesmos alteravam o caráter distintivo da marca em causa. Tal como alega o EUIPO, os referidos elementos adicionais não interagem com a cruz enquanto elemento distintivo protegido pela marca em causa.

    70

    Em quarto lugar, no que diz respeito às críticas efetuadas pela recorrente no âmbito do terceiro fundamento e relativamente à alegada insuficiência de provas em relação a certos modelos de sapatos, a saber, os modelos REAGEE, TECNO e AVANT, importa constatar que a recorrente não contesta o facto de que estes modelos de sapatos, aos quais a Câmara de Recurso também faz referência no n.o 27 da decisão impugnada, estiveram representados num ou em vários catálogos fornecidos pela interveniente. A alegação da recorrente diz apenas respeito ao facto de que nada indicava que tivessem realmente ocorrido vendas.

    71

    Ora, a este respeito, é forçoso constatar que a apresentação de produtos nos catálogos pode ser tomada em consideração como indício adicional relativo à utilização séria de uma marca, na medida em que se trata de uma utilização pública e para o exterior ou, pelo menos, de uma preparação dessa utilização, da marca em causa [v., neste sentido, acórdãos de 6 de outubro de 2004, VITAKRAFT, T‑356/02, EU:T:2004:292, n.o 26 e jurisprudência referida, e de 4 de julho de 2014, Construcción, Promociones e Instalaciones/IHMI — Copisa Proyectos y Mantenimientos Industriales (CPI COPISA INDUSTRIAL), T‑345/13, não publicado, EU:T:2014:614, n.o 21]. Por conseguinte, os elementos de provas relativos aos modelos REAGEE, TECNO e AVANT, sem poderem ser considerados decisivos por si só, podem, no entanto, ser tomados em consideração a título de confirmação de factos já analisados nos n.os 57 a 63 supra.

    72

    Além disso, no que respeita ao modelo de sapatos desportivos MARCELO, já foi constatado que o facto de os elementos de prova incidirem sobre o período de 2006/2007, ou seja, sobre um período relativamente curto, não implica que se tratava de elementos não pertinentes. Pelo contrário, os mesmos inserem‑se, como constatou corretamente a Câmara de Recurso, na avaliação de conjunto que permite constatar uma utilização séria da marca em causa, em conformidade com o n.o 30 do acórdão de 10 de setembro de 2008, Boston Scientific/IHMI — Terumo (CAPIO) (T‑325/06, não publicado, EU:T:2008:338), citado no n.o 28 supra.

    73

    Em quinto lugar, no que respeita à alegação da recorrente sobre o alegado fraco caráter distintivo da marca em causa, basta constatar que, contrariamente ao processo que deu origem ao despacho de 26 de abril de 2012, Deichmann/IHMI (C‑307/11 P, não publicado, EU:C:2012:254, n.o 52), citado pela recorrente na audiência e relativamente a um outro elemento gráfico, a saber, representação de um «galão bordado com pontilhados», não há, no presente caso, elementos que demonstrem que a marca em causa apresenta um caráter distintivo reduzido. Em especial, contrariamente ao processo acima referido, não foi demonstrado que a marca em causa tem uma forma simples e banal que não diverge significativamente das formas normalmente utilizadas no setor do calçado nem que é exclusivamente percecionada como um elemento decorativo ou de reforço dos produtos designados.

    74

    Por outro lado, importa acrescentar que já foi constatado que a marca em causa foi utilizada repetidamente sob uma forma idêntica ou muito semelhante à registada, o que permite demonstrar uma utilização efetiva desta marca mesmo considerando que o seu caráter distintivo seja bastante fraco. Além disso, embora se deva compreender a alegação da recorrente como destinada a contestar qualquer caráter distintivo na marca em causa, basta constatar que se trata de uma alegação que não é eficaz no âmbito de um processo de extinção, no qual não pode ser colocada em causa a própria validade de uma marca.

    75

    Além disso, há que acrescentar que o caráter distintivo da marca em causa também foi constatado pelo Juzgado de marca comunitaria d’Alicante (Juiz da Marca Comunitária de Alicante), num acórdão de 31 de julho de 2007, Munich SL, Berneda SL e Bernher SL/Umbro SL e Umbro Int. Ltd., para o qual remete tanto a Câmara de Recurso no n.o 29 da decisão impugnada como a interveniente no n.o 13 do seu pedido de intervenção, e no qual se conclui no sentido de que a marca em causa podia ser considerada, em Espanha, forte ou com caráter distintivo elevado no domínio do calçado de desporto.

    76

    Assim, há que julgar improcedentes o segundo e terceiro fundamentos e, por conseguinte, negar provimento ao recurso na sua totalidade.

    Quanto às despesas

    77

    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

    78

    Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, nos termos dos pedidos do EUIPO e da interveniente.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

    decide:

     

    1)

    É negado provimento ao recurso.

     

    2)

    A Deichmann SE é condenada nas despesas do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) e da Munich, SL.

     

    Kanninen

    Schwarcz

    Iliopoulos

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de janeiro de 2018.

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: inglês.

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