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Document 62015TJ0712

Acórdão do Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) de 13 de dezembro de 2017.
Crédit mutuel Arkéa contra Banco Central Europeu (BCE).
Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 — Supervisão prudencial numa base consolidada — Grupo submetido a supervisão prudencial — Instituições associadas de maneira permanente a um organismo central — Artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento (UE) n.o 468/2014 — Artigo 10.o do Regulamento (UE) n.o 575/2013 — Exigências de fundos próprios — Artigo 16.o, n.o 1, alínea c), e n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 1024/2013.
Processo T-712/15.

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2017:900

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada)

13 de dezembro de 2017 ( *1 )

«Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 — Supervisão prudencial numa base consolidada — Grupo submetido a supervisão prudencial — Instituições associadas de maneira permanente a um organismo central — Artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento (UE) n.o 468/2014 — Artigo 10.o do Regulamento (UE) n.o 575/2013 — Exigências de fundos próprios — Artigo 16.o, n.o 1, alínea c), e n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 1024/2013»

No processo T‑712/15,

Crédit mutuel Arkéa, com sede em Relecq Kerhuon (França), representado por H. Savoie e P. Mele, advogados,

recorrente,

contra

Banco Central Europeu (BCE), representado por K. Lackhoff, R. Bax e C. Olivier, na qualidade de agentes, assistidos por D. Martin, M. Pittie e M. Françon, advogados,

recorrido,

apoiado pela

Comissão Europeia, representada por V. Di Bucci e K.—P. Wojcik, na qualidade de agentes,

interveniente,

que tem por objeto um pedido nos termos do artigo 263.o TFUE e destinado a obter a anulação da Decisão ECB/SSM/2015 — 9695000CG 7B84NLR5984/28 do BCE, de 5 de outubro de 2015, que estabelece os requisitos prudenciais aplicáveis ao grupo Crédit mutuel,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada),

composto por: M. Prek (relator), presidente, E. Buttigieg, F. Schalin, B. Berke e M. J. Costeira, juízes,

secretário: S. Spyropoulos, administradora,

vista a fase escrita do processo e após a audiência de 6 de junho de 2017,

profere o presente

Acórdão

I. Antecedentes do litígio

1

O Crédit mutuel é um grupo bancário não centralizado, constituído por uma rede de caixas locais que tem o estatuto de sociedades cooperativas. Cada caixa local do Crédit mutuel deve aderir a uma federação regional e cada federação deve aderir à Confédération nationale du Crédit mutuel (CNCM), órgão central da rede na aceção dos artigos L.511—30 e L.511—31 do code monétaire et financier (Código Monetário e Financeiro francês, a seguir «CMF»). À escala nacional, o Crédit mutuel inclui, além disso, a Caisse centrale du Crédit mutuel (CCCM), que é uma sociedade anónima cooperativa de crédito de capital variável, autorizada enquanto instituição de crédito, detida pelos membros da rede.

2

O recorrente, o Crédit mutuel Arkéa, é uma sociedade anónima cooperativa de crédito de capital variável, autorizada enquanto instituição de crédito. Foi criado em 2002 através da aproximação de várias federações regionais de créditos mútuos. Outras federações agruparam‑se para criar o CM11—CIC e outras ainda permanecem autónomas.

3

Por carta de 19 de setembro de 2014, o recorrente transmitiu ao Banco Central Europeu (BCE) a sua análise da impossibilidade de ser submetido à supervisão prudencial do BCE por intermédio da CNCM. Por ofício de 10 de novembro de 2014, o BCE referiu que iria colocar esta questão às autoridades competentes francesas.

4

Em 19 de dezembro de 2014, o BCE comunicou à CNCM um projeto de decisão que estabelece os requisitos prudenciais aplicáveis ao grupo Crédit mutuel, pedindo‑lhe para assegurar a comunicação deste projeto às diferentes entidades que o compõem e fixou‑lhe um prazo para que estas apresentem as suas observações. Em 16 de janeiro de 2015, o recorrente comunicou as suas observações ao BCE. Em 30 de janeiro de 2015, a CNCM manifestou‑se sobre as observações apresentadas pelo recorrente.

5

Em 19 de fevereiro de 2015, o BCE comunicou à CNCM um projeto de decisão revisto que estabelece os requisitos prudenciais aplicáveis ao grupo Crédit mutuel, assim como às entidades que o compõem, pedindo‑lhe para assegurar a comunicação deste projeto revisto a tais entidades e fixou‑lhe um prazo para que estas apresentem as suas observações. Em 27 de março de 2015, o recorrente apresentou as suas observações.

6

Em 17 de junho de 2015, o BCE adotou uma decisão que estabelece os requisitos prudenciais aplicáveis ao grupo Crédit mutuel, na qual sublinhava ser a autoridade de supervisão prudencial numa base consolidada da CNCM e a autoridade competente responsável pela supervisão das entidades enumeradas nesta decisão, entre as quais figurava o recorrente (considerando 1). No artigo 2.o, n.o 1, da mesma decisão, era especificado que a CNCM assegurava que o grupo Crédit mutuel cumpria de maneira permanente os requisitos previstos no anexo I. Decorria do artigo 2.o, n.o 3, da referida decisão que o recorrente devia cumprir de maneira permanente os requisitos previstos no anexo II—2, segundo os quais era imposto um rácio de fundos próprios de categoria 1 (a seguir «fundos próprios “CET 1”») de 11%.

7

Em 17 de julho de 2015, o recorrente pediu a revisão desta decisão nos termos do artigo 24.o do Regulamento (UE) n.o 1024/2013, do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63, a seguir «regulamento de base»), lido em conjugação com o artigo 7.o da Decisão 2014/360/UE do BCE, de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento (JO 2014, L 175, p. 47). Em 31 de agosto de 2015, realizou‑se uma audição na Comissão de Reexame (a seguir «Comissão de Reexame»).

8

Em 14 de setembro de 2015, a Comissão de Reexame emitiu um parecer que concluía pela legalidade da decisão do BCE. No essencial, sublinhou que as críticas do recorrente à decisão de 17 de junho de 2015 podiam ser agrupadas em três categorias, consoante o recorrente contestava o recurso a uma supervisão prudencial consolidada do Grupo Crédit mutuel por intermédio da CNCM, com o fundamento de que esta não é uma instituição de crédito (primeira acusação), alegava a inexistência de um «Grupo Crédit mutuel» (segunda acusação) ou contestava a decisão do BCE de aumentar os seus requisitos de rácio de fundos próprios «CET 1» de 8% para 11% (terceira acusação).

9

Quanto à primeira acusação, em primeiro lugar, a Comissão de Reexame recordou que o BCE, por decisão de 1 de setembro de 2014, tinha considerado que o grupo Crédit mutuel constituía um grupo significativo submetido à supervisão prudencial e, nessa ocasião, afirmou que o recorrente era uma entidade membro deste grupo e que a CNCM constituía o nível de consolidação mais elevado. Em segundo lugar, constatou que o conceito de organismo central que figura no artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do BCE, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o BCE e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas («Regulamento‑Quadro do MUS») (JO 2014, L 141, p. 1, a seguir «Regulamento‑Quadro do MUS»), e no artigo 10.o do Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1; retificações no JO 2013, L 208, p. 68 e no JO 2013, L 321, p. 6), não era definido pelo direito da União Europeia e que não se exigia que o organismo central fosse uma instituição de crédito, invocando, em apoio desta interpretação, as orientações do Comité das Autoridades Europeias de Supervisão Bancária (CAESB) de 18 de novembro de 2010 (a seguir «orientações do CAESB»), assim como o artigo 4.o, n.o 1, alínea g), do regulamento de base. Em terceiro lugar, a Comissão de Reexame salientou que não era necessário que o BCE dispusesse do conjunto dos poderes de supervisão ou dos poderes sancionatórios em relação à entidade‑mãe de um grupo para exercer uma supervisão prudencial numa base consolidada. Em quarto lugar, recordou que, antes da transferência desta competência para o BCE, o grupo Crédit mutuel era objeto de supervisão prudencial numa base consolidada por parte da autoridade competente francesa, concretamente, a autorité de contrôle prudentiel et de résolution [Autoridade de Fiscalização Prudencial e de Resolução] (ACPR), por intermédio da CNCM.

10

Quanto à segunda acusação, a Comissão de Reexame concluiu que o grupo Crédit mutuel cumpria as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, para o qual remete o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS. Em primeiro lugar, a Comissão de Reexame considerou que a qualidade de associação da CNCM não impedia a existência de solidariedade com as instituições filiadas. Em segundo lugar, entendeu que as contas do grupo Crédit mutuel no seu conjunto estavam estabelecidas numa base consolidada. Em terceiro lugar, considerou que o BCE decidiu acertadamente que a CNCM tinha o poder de dar instruções à direção das instituições filiadas.

11

No que respeita à terceira acusação, a Comissão de Reexame entendeu que as apreciações do BCE quanto ao nível dos requisitos de fundos próprios «CET 1» do recorrente não enfermavam de erro manifesto de apreciação e não eram desproporcionadas. A este respeito, sublinhou as discordâncias constantes que opõem o recorrente à CNCM, uma vez que são reveladoras de problemas de governança suscetíveis de originar riscos adicionais.

12

Em 5 de outubro de 2015, o BCE adotou a Decisão ECB/SSM/2015 — 9695000CG 7B84NLR5984/28, que estabelece os requisitos prudenciais aplicáveis ao grupo Crédit mutuel (a seguir «decisão impugnada»), que, nos termos do artigo 24.o, n.o 7, do regulamento de base, revoga e substitui a decisão de 17 de junho de 2015, embora mantendo um conteúdo idêntico. A própria decisão impugnada foi revogada pela Decisão ECB/SSM/2015 — 9695000CG 7B84NLR5984/40 do BCE, de 4 de dezembro de 2015, na medida em que esta estabelece novos requisitos prudenciais aplicáveis ao grupo Crédit mutuel, assim como às entidades que o compõem.

13

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral, em 3 de fevereiro de 2016, o recorrente interpôs um recurso de anulação da decisão de 4 de dezembro de 2015.

II. Tramitação processual e pedidos das partes

14

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de dezembro de 2015, o recorrente interpôs o presente recurso.

15

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 21 de março de 2016, a Comissão Europeia pediu para intervir em apoio dos pedidos do BCE.

16

Por decisão de 20 de abril de 2016, o presidente da Quarta Secção do Tribunal Geral admitiu a intervenção da Comissão em apoio dos pedidos do BCE.

17

Em 1 de junho de 2016, a Comissão apresentou o seu articulado de intervenção.

18

Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz‑relator foi afetado à Segunda Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, atribuído.

19

Em 3 de abril de 2017, a título das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, foi pedido ao BCE que apresentasse vários documentos. O BCE deu cumprimento a esse pedido no prazo fixado.

20

Sob proposta da Segunda Secção do Tribunal Geral, este decidiu, nos termos do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo para uma formação de julgamento alargada.

21

Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) decidiu abrir a fase oral do processo.

22

As alegações e as respostas das partes às questões colocadas pelo Tribunal Geral foram ouvidas na audiência de 6 de junho de 2017. No termo desta audiência, o Tribunal Geral decidiu não encerrar a fase oral do processo e pediu ao BCE para apresentar uma resposta escrita a uma questão, o que foi registado na ata da audiência. O BCE deu cumprimento a este pedido nos prazos fixados.

23

A fase oral do processo foi encerrada em 10 de julho de 2017.

24

O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne a anular a decisão impugnada.

25

O BCE e a Comissão concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar o recorrente nas despesas.

III. Questão de direito

A. Quanto à admissibilidade do recurso

26

Sem suscitar formalmente uma exceção de inadmissibilidade nos termos do artigo 130.o do Regulamento de Processo, o BCE contesta a admissibilidade do recurso. A este respeito, em primeiro lugar, o BCE observa que a procuração para interposição do presente recurso foi passada pelo presidente do conselho de administração do recorrente, o qual não dispõe de poder de representação, nos termos do direito francês; em segundo lugar, alega que o recorrente não possui legitimidade para agir contra a decisão impugnada, com exceção do artigo 2.o, n.o 3, e do anexo II—2; e, em terceiro lugar, contesta a existência de interesse em agir do recorrente.

27

O recorrente pede que os fundamentos de inadmissibilidade suscitados pelo BCE sejam julgados improcedentes.

1.   Quanto à regularidade da procuração conferida aos representantes do recorrente

28

O BCE observa que a procuração inicialmente conferida aos representantes do recorrente foi passada pelo presidente do conselho de administração deste, apesar de resultar das decisões dos tribunais franceses que interpretam os artigos L.225—51—1 e L.225—56 do Código Comercial francês que o presidente do conselho de administração de uma sociedade anónima não tem poder para a representar legalmente, estando tal poder atribuído exclusivamente ao diretor‑geral, salvo se justificar uma acumulação destas funções.

29

Nos termos do artigo 51.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, quando representem uma pessoa coletiva de direito privado, os advogados devem apresentar na Secretaria uma procuração por ela passada. Por outro lado, segundo o artigo 51.o, n.o 4, deste mesmo regulamento, se a procuração não for apresentada, o secretário fixa à parte interessada um prazo razoável para a apresentar.

30

O artigo 51.o, n.o 4, do Regulamento de Processo deve ser interpretado no sentido de que é possível sanar a falta de procuração no momento da interposição do recurso através da apresentação posterior de qualquer documento que confirme a existência dessa procuração [v., por analogia, acórdão de 4 de fevereiro de 2015, KSR/IHMI — Lampenwelt (Moon), T‑374/13, EU:T:2015:69, n.os 12 e 13; v., igualmente, no que respeita ao Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, acórdão de 19 de junho de 2014, Commune de Millau e SEMEA/Comissão, C‑531/12 P, EU:C:2014:2008, n.os 33 e 34].

31

No caso em apreço, na sequência de um pedido neste sentido, os advogados do recorrente transmitiram ao Tribunal Geral um documento passado pelo seu representante qualificado, concretamente, o seu diretor‑geral, que confirma a sua intenção de prosseguir o recurso.

32

Por conseguinte, o recurso não pode ser considerado inadmissível por irregularidade da procuração.

2.   Quanto à legitimidade do recorrente para agir contra o artigo 2.o, n.o 1, e o anexo I da decisão impugnada

33

O BCE alega, em substância, que o recorrente apenas tem legitimidade para agir contra a parte da decisão impugnada que lhe diz respeito, isto é, o artigo 2.o, n.o 3, e o anexo II—2.

34

Importa assinalar que a decisão impugnada, apesar de redigida sob a forma de uma decisão única, deve ser analisada como um conjunto de decisões individuais (v., neste sentido e por analogia, acórdão de 15 de outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, EU:C:2002:582, n.o 100), que impõem requisitos prudenciais a cada uma das entidades enumeradas no seu artigo 2.o A este respeito, há que observar que, embora o artigo 6.o da decisão impugnada tenha como destinatária da mesma decisão a CNCM, cabe a esta, nos termos do artigo 3.o, n.o 1, da referida decisão, notificar ao órgão de direção de cada uma das entidades enumeradas no artigo 2.o o teor da decisão impugnada e o anexo relevante, assim como, nos termos do artigo 3.o, n.o 2, da decisão impugnada, informar o BCE das datas em que efetuou essas notificações.

35

No que respeita ao artigo 2.o, n.o 1, da decisão impugnada, na medida em que precisa que «a [CNCM] deve assegurar que o grupo Crédit mutuel cumpre de maneira permanente os requisitos previstos no anexo I», deve deduzir‑se que o seu único destinatário, na aceção do artigo 263.o TFUE, é a CNCM.

36

Por conseguinte, o recorrente apenas pode contestar o artigo 2.o, n.o 1, da decisão impugnada e o anexo I para o qual remete se for direta e individualmente afetado por este ponto da decisão impugnada ou se for diretamente afetado por este ponto da decisão impugnada e se a decisão impugnada constituir um ato regulamentar que não necessita de medidas de execução (v., neste sentido, acórdão de 26 de setembro de 2014, Royal Scandinavian Casino Århus/Comissão, T‑615/11, não publicado, EU:T:2014:838, n.o 25 e jurisprudência aí referida).

37

Na medida em que decorre tanto do considerando 1 da decisão impugnada como dos seus artigos 2.o e 3.o que o BCE considera o recorrente uma entidade que pertence ao grupo Crédit mutuel, em relação ao qual o BCE decidiu exercer uma supervisão prudencial numa base consolidada por intermédio da CNCM, deve considerar‑se que é direta e individualmente afetado pelo artigo 2.o, n.o 1, da decisão impugnada e pelo anexo I para o qual remete, uma vez que fazem da CNCM a entidade responsável pela sua supervisão prudencial no que respeita ao BCE.

38

Daqui resulta necessariamente que o recorrente dispõe de legitimidade para agir não apenas contra o artigo 2.o, n.o 3, e o anexo II—2 da decisão impugnada, mas igualmente contra o artigo 2.o, n.o 1, e o anexo I desta.

3.   Quanto ao interesse em agir do recorrente contra a decisão impugnada

39

O BCE, para contestar a existência de interesse em agir do recorrente, observa, antes de mais, que a decisão impugnada deixou de produzir os seus efeitos jurídicos em 4 de dezembro de 2015, data em que uma nova decisão foi adotada, em seguida, que o recorrente dispunha de um rácio de fundos próprios «CET 1» superior ao que lhe era imposto pela decisão impugnada e, por último, que o recorrente nunca se opôs à supervisão prudencial numa base consolidada do grupo Crédit mutuel pela ACPR.

40

Cabe recordar que, segundo jurisprudência constante, só há interesse na anulação de um ato se esta anulação for suscetível, por si própria, de ter consequências jurídicas (v., neste sentido, acórdãos de 24 de junho de 1986, AKZO Chemie/Comissão, 53/85, EU:C:1986:256, n.o 21, e de 25 de março de 1999, Gencor/Comissão, T‑102/96, EU:T:1999:65, n.o 40).

41

Há que observar que a revogação da decisão impugnada pela decisão de 4 de dezembro de 2015 não priva o recorrente do interesse em agir contra a decisão impugnada.

42

Com efeito, a revogação de um ato de uma instituição não constitui o reconhecimento da sua ilegalidade e produz efeitos ex nunc, diversamente de um acórdão de anulação por força do qual o ato anulado é eliminado retroativamente da ordem jurídica, considerando‑se que o mesmo nunca existiu (acórdãos de 12 de dezembro de 2006, Organisation des Modjahedines du peuple d’Iran/Conselho, T‑228/02, EU:T:2006:384, n.o 35; de 23 de outubro de 2008, People’s Mojahedin Organization of Iran/Conselho, T‑256/07, EU:T:2008:461, n.o 48; e de 30 de setembro de 2009, Sison/Conselho, T‑341/07, EU:T:2009:372, n.os 47 e 48).

43

Além disso, o recorrente mantém um interesse em agir contra a decisão impugnada, a fim de evitar que uma eventual anulação da decisão que a revogou não faça com que esta produza novamente efeitos. De facto, se a decisão de 4 de dezembro de 2015 fosse anulada, as partes seriam recolocadas na situação anterior à sua entrada em vigor (v., neste sentido, acórdão de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, EU:C:1971:32, n.o 60), que seria então de novo regulada pela decisão impugnada. Daqui decorre igualmente que o recorrente tem interesse em pedir a anulação da decisão impugnada através da qual o BCE estabelece os seus requisitos mínimos de fundos próprios «CET 1», independentemente do nível dos seus fundos próprios quando a decisão impugnada estava em vigor.

44

Por último, na medida em que o artigo 2.o, n.o 1, e o anexo I da decisão impugnada implicam a pertença do recorrente ao grupo Crédit mutuel e a sua supervisão por intermédio da CNCM, apesar de considerar que deve estar diretamente submetido à supervisão prudencial do BCE, dispõe de interesse em agir contra este ponto da decisão impugnada, independentemente da sua atitude no momento em que a supervisão prudencial era realizada pela ACPR.

45

Tendo em consideração o exposto, os fundamentos de inadmissibilidade suscitados pelo BCE devem ser julgados improcedentes.

B. Quanto ao mérito

46

Em apoio do seu recurso, o recorrente apresenta uma argumentação que pode ser dividida em três fundamentos.

47

Embora o objetivo geral seja a decisão impugnada, a argumentação que figura nos dois primeiros fundamentos, na realidade, diz unicamente respeito à legalidade do artigo 2.o, n.o 1, e do anexo I desta decisão, através dos quais o BCE organiza a supervisão prudencial consolidada do grupo Crédit mutuel por intermédio da CNCM. Com o seu primeiro fundamento, o recorrente alega, em substância, que este ponto da decisão impugnada é ilegal, uma vez que a CNCM não é uma instituição de crédito e, por conseguinte, não pode estar submetida à supervisão prudencial do BCE. Com o seu segundo fundamento, alega que o BCE errou ao concluir que existia um «grupo» para efeitos de supervisão prudencial.

48

Com o seu terceiro fundamento, o recorrente contesta, em substância, a fixação dos seus fundos próprios «CET 1» em 11%, devido à imposição de fundos próprios superiores aos requisitos legais mínimos, nos termos do artigo 16.o, n.o 1, alínea c), e n.o 2, alínea a), do regulamento de base. Apesar de ter por objeto a decisão impugnada no seu conjunto, há que constatar que, na realidade, este fundamento diz unicamente respeito à legalidade do artigo 2.o, n.o 3, e do anexo II—2 da decisão impugnada, relativos aos requisitos prudenciais impostos ao recorrente.

1.   Quanto ao primeiro e segundo fundamentos, relativos à legalidade do artigo 2.o, n.o 1, e do anexo I da decisão impugnada

49

Decorre do considerando 1 e do artigo 2.o, n.o 1, da decisão impugnada que o BCE organiza uma supervisão prudencial consolidada do grupo Crédit mutuel por intermédio da CNCM, encarregando‑a de assegurar que este grupo cumpre de maneira permanente os requisitos previstos no anexo I da referida decisão.

50

Importa desde já rejeitar a contestação, por parte do BCE, do caráter operante destes dois fundamentos, com o fundamento de que o recorrente admite constituir uma entidade significativa na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do regulamento de base, submetida à supervisão prudencial direta do BCE. Com efeito, com os seus dois primeiros fundamentos, o recorrente contesta as modalidades de exercício desta supervisão prudencial, nomeadamente, que seja efetuada por intermédio da CNCM contra si, na medida em que é uma componente do grupo Crédit mutuel.

51

Além disso, há que realçar que, embora os motivos pelos quais o BCE decidiu organizar uma supervisão prudencial consolidada do grupo Crédit mutuel por intermédio da CNCM não figurem expressamente na decisão impugnada, a Comissão de Reexame apresentou uma exposição de motivos sobre este ponto, a qual foi novamente transcrita nos n.os 8 a 10, supra. Ora, na medida em que, na decisão impugnada, o BCE decidiu em conformidade com o parecer da Comissão de Reexame, o qual faz parte do contexto da decisão impugnada, deve considerar‑se que o BCE fez seus os fundamentos que figuram em tal parecer e que o mérito da decisão impugnada pode ser apreciado à luz dos referidos fundamentos (v., neste sentido, acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, em sede de recurso, EU:T:2017:337, n.os 125 a 127).

52

No âmbito dos seus dois primeiros fundamentos, o recorrente contesta a interpretação feita pelo BCE do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, assim como as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, para o qual esta primeira disposição remete.

53

Nos termos do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, um «grupo supervisionado» designa, nomeadamente, «as entidades supervisionadas com sede no mesmo Estado‑Membro participante, desde que associadas de modo permanente a um organismo central que as supervisione nas condições previstas no artigo 10.o do Regulamento […] n.o 575/2013 e que esteja estabelecido no mesmo Estado‑Membro participante».

54

O artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013, sob a epígrafe «Dispensa aplicável a instituições de crédito associadas de modo permanente a um organismo central», prevê que:

«1.   As autoridades competentes podem, nos termos do direito nacional, dispensar total ou parcialmente da aplicação dos requisitos estabelecidos nas [p]artes II a VIII uma ou mais instituições de crédito situadas no mesmo Estado‑Membro e associadas de modo permanente a um organismo central que as supervisiona e que está estabelecido no mesmo Estado‑Membro se estiverem reunidas as seguintes condições:

a)

Os compromissos do organismo central e das instituições a ele associadas constituem responsabilidades solidárias ou os compromissos das instituições a ele associadas são totalmente garantidos pelo organismo central;

b)

A solvabilidade e a liquidez do organismo central e de todas as instituições a ele associadas são monitorizadas no seu conjunto com base nas contas consolidadas dessas instituições;

c)

A direção do organismo central está habilitada a dar instruções à direção das instituições a ele associadas.»

55

Segundo jurisprudência constante, para interpretar uma disposição de direito da União, há que ter em conta não apenas os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (v., neste sentido, acórdão de 7 de junho de 2005, VEMW e o., C‑17/03, EU:C:2005:362, n.o 41 e jurisprudência aí referida).

56

Nas circunstâncias do caso em apreço, afigura‑se útil efetuar uma interpretação teleológica e contextual do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, antes de apreciar os dois primeiros fundamentos invocados pelo recorrente.

a) Quanto à interpretação teleológica e contextual do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS

57

Em primeiro lugar, quanto à interpretação teleológica do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, cabe assinalar que, nos termos do seu considerando 9, este regulamento tem por objetivo desenvolver e precisar os procedimentos de cooperação estabelecidos no regulamento de base entre o BCE e as autoridades competentes nacionais no Mecanismo Único de Supervisão (a seguir «MUS»), e com as autoridades nacionais designadas. Por conseguinte, importa também ter em conta as finalidades do regulamento de base na interpretação teleológica do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS.

58

A este respeito, há que observar que a supervisão prudencial dos grupos de instituições de crédito numa base consolidada tem, no essencial, duas finalidades.

59

A primeira finalidade consiste em permitir ao BCE avaliar os riscos suscetíveis de afetar uma instituição de crédito que nela não tenham origem, mas no grupo a que pertence.

60

Assim, o considerando 26 do regulamento de base dispõe o seguinte:

«Os riscos para a segurança e a solidez de uma instituição de crédito podem surgir quer ao nível de uma instituição de crédito individual, quer ao nível de um grupo bancário ou conglomerado financeiro. É importante adotar mecanismos de supervisão específicos para atenuar estes riscos e para garantir a segurança e a solidez das instituições de crédito. Para além da supervisão das instituições de crédito individuais, as atribuições do BCE deverão incluir a supervisão a nível consolidado […]».

61

A segunda finalidade prosseguida pela supervisão prudencial dos grupos de instituições de crédito numa base consolidada consiste em evitar o fracionamento da supervisão prudencial das entidades que compõem os referidos grupos em diferentes autoridades de supervisão.

62

Em particular, isto manifesta‑se, em primeiro lugar, pela circunstância de que, segundo o considerando 38 e o artigo 6.o, n.o 4, do regulamento de base, a apreciação da importância de uma instituição de crédito, que determina se o exercício de certas atribuições de supervisão prudencial será efetuado exclusivamente pelo BCE ou de forma descentralizada no âmbito do MUS (v., neste sentido, acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, em sede de recurso, EU:T:2017:337, n.o 63), é realizada ao mais elevado nível de consolidação nos Estados‑Membros participantes. Esta finalidade é retomada no artigo 40.o, n.o 1 e n.o 2, alínea a), do Regulamento‑Quadro do MUS, no que respeita aos grupos submetidos à supervisão prudencial.

63

Esta finalidade manifesta‑se igualmente, em segundo lugar, no artigo 40.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, do qual resulta que, caso uma entidade que faça parte de um grupo esteja submetida à supervisão prudencial do BCE, seja por cumprir o critério da assistência financeira pública direta, seja por constituir uma das três instituições de crédito mais significativas de um Estado‑Membro participante, esta supervisão estende‑se a todo o grupo.

64

Decorre do exposto que, para respeitar as finalidades do regulamento de base, o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS e as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 para os quais remete, devem ser interpretados tendo em conta que o legislador pretendia que o BCE pudesse dispor de uma visão global de todos os riscos suscetíveis de afetar uma instituição de crédito, assim como evitar um fracionamento da supervisão prudencial entre o BCE e as autoridades nacionais.

65

Quanto à finalidade específica do artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, importa observar que este regulamento diz respeito aos requisitos prudenciais aplicáveis às instituições de crédito. Neste âmbito, o objetivo prosseguido pelo artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 resulta claramente da sua redação. Consiste na possibilidade de a autoridade competente dispensar total ou parcialmente da aplicação dos requisitos estabelecidos no regulamento uma ou mais instituições de crédito situadas no mesmo Estado‑Membro e associadas de modo permanente a um organismo central que as supervisiona e que está estabelecido no mesmo Estado‑Membro. De igual modo, o artigo 10.o, n.o 2, do referido regulamento permite dispensar da aplicação dos mesmos requisitos prudenciais o organismo central numa base individual.

66

Todavia, no presente processo, as condições que figuram no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 não são aplicáveis nos termos deste regulamento para efeitos da apreciação da possibilidade de dispensa do cumprimento dos requisitos numa base individual, mas aplicam‑se devido à remissão efetuada pelo artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS para verificar a existência de um grupo supervisionado.

67

Além disso, o eventual reconhecimento da existência de um grupo supervisionado na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS não implica a concessão do benefício da dispensa previsto no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 às instituições de crédito que o constituem, uma vez que a autoridade competente pode sempre recusar o benefício de uma dispensa individual mesmo que os requisitos previstos no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 estejam preenchidos.

68

Com efeito, o facto de as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 poderem estar preenchidas não tem as mesmas consequências consoante esteja em causa o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS ou apenas o artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013. Na primeira hipótese, implica a supervisão do grupo pelo BCE, desde que as condições previstas no artigo 40.o do Regulamento‑Quadro do MUS também estejam preenchidas. Na segunda hipótese, a dispensa numa base individual dos requisitos prudenciais no grupo não é automática, permanecendo uma faculdade da autoridade competente.

69

Assim, o BCE pode deduzir do cumprimento das condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 que o artigo 2.o, n.o 21, do Regulamento‑Quadro do MUS é aplicável e exercer uma supervisão prudencial sobre todo o grupo, recusando dispensar, enquanto autoridade competente nos termos do Regulamento n.o 575/2013, as entidades do grupo do cumprimento dos requisitos prudenciais numa base individual.

70

Decorre do exposto que apenas as finalidades do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS são relevantes quanto à sua interpretação, não obstante a remissão que este faz para o artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS.

71

No que respeita, em segundo lugar, à interpretação contextual do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, cabe observar que, no seu parecer, a Comissão de Reexame referiu várias vezes o conteúdo das orientações do CAESB para concluir que as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 estavam preenchidas. Por conseguinte, há que apreciar se as referidas orientações são um elemento do contexto jurídico em que se insere o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, que pode ser relevante para efeitos da interpretação das condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, para as quais remete.

72

Importa recordar que o CAESB é o precursor da Autoridade Bancária Europeia (ABE) e que as orientações do CAESB têm por objeto a interpretação do artigo 3.o da Diretiva 2006/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício (reformulação) (JO 2006, L 177, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2009/111/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009, que altera as Diretivas 2006/48/CE, 2006/49/CE e 2007/64/CE, no que diz respeito aos bancos em relação de grupo com instituições centrais, a determinados elementos relativos aos fundos próprios, a grandes riscos, a disposições relativas à supervisão e à gestão de crises (JO 2009, L 302, p. 97). O artigo 3.o da Diretiva 2006/48 estabelecia que «[a]s instituições de crédito situadas no mesmo Estado‑Membro e que [estavam] filiadas de modo permanente num organismo central encarregado da respetiva fiscalização e estabelecido no mesmo Estado‑Membro [podiam] ser dispensadas das condições constantes […] se o direito nacional [dispusesse] que […]». Em seguida, referia três condições, que são as que figuram atualmente no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013.

73

Além disso, há que observar que as orientações do CAESB foram adotadas na sequência de um pedido do legislador nesse sentido, exposto no considerando 2 da Diretiva 2009/111. Com efeito, foi pedido ao CAESB para «formular orientações tendentes a melhorar a convergência das práticas de supervisão [no que respeita ao artigo 3.o da Diretiva 2006/48]».

74

Por conseguinte, atendendo à identidade da redação das condições que figuram no artigo 3.o da Diretiva 2006/48 e no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 e às circunstâncias em torno da adoção das orientações do CAESB, isto é, a sua adoção pelo organismo então competente e a pedido do legislador, as orientações do CAESB podem ser tidas em conta a título do contexto jurídico em que se insere o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS.

75

Todavia, a interpretação da legislação relevante por uma autoridade administrativa não pode vincular o juiz da União, que continua a ter competência exclusiva para interpretar o direito da União, nos termos do artigo 19.o TUE.

76

Além disso, cabe assinalar que esta interpretação foi fornecida pelo CAESB tendo apenas em conta as finalidades do artigo 3.o da Diretiva 2006/48, que eram análogas às do artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013, ou seja, autorizar a dispensa do cumprimento dos requisitos prudenciais numa base individual, uma vez que são cumpridos dentro do grupo.

77

Ora, pelos motivos expostos nos n.os 66 a 70, supra, não são estas finalidades que importam, mas as do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, as quais não puderam ser tidas em consideração na adoção das orientações do CAESB.

78

Por conseguinte, embora as orientações do CAESB constituam um elemento que pode eventualmente ser tido em conta pelo juiz da União, não lhe pode ser atribuída nenhuma forma de autoridade.

b) Quanto ao primeiro fundamento, relativo à inexistência de qualidade de instituição de crédito da CNCM

79

O recorrente alega que resulta tanto do regulamento de base e do Regulamento‑Quadro do MUS como do Regulamento n.o 575/2013 que a supervisão prudencial numa base consolidada de instituições associadas a um organismo central apenas é possível se este dispuser da qualidade de instituição de crédito, o que não é o caso da CNCM.

80

O BCE, apoiado pela Comissão, pede que o presente fundamento seja julgado improcedente.

81

A título preliminar, importa realçar que, embora o recorrente observe nos seus articulados que o artigo 127.o, n.o 6, TFUE e o regulamento de base são relativos à supervisão prudencial das instituições de crédito, não suscita nenhuma exceção de ilegalidade a respeito do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, segundo a qual este, na eventualidade de dever ser interpretado no sentido de que não implica que o organismo central deva dispor da qualidade de instituição de crédito, viola o artigo 127.o, n.o 6, TFUE ou o regulamento de base, facto que confirmou na audiência.

82

Por conseguinte, no âmbito do presente fundamento, basta verificar se o conceito de «organismo central» na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS deve ser entendido no sentido de que implica a qualidade de instituição de crédito.

83

Na medida em que o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS remete para as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, há que apreciar se a qualidade de instituição de crédito resulta diretamente do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, ou indiretamente das referidas condições.

1) Quanto à questão de saber se a qualidade de instituição de crédito do organismo central resulta do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS

84

No essencial, o recorrente alega que, na medida em que o artigo 127.o, n.o 6, TFUE e o regulamento de base são relativos à supervisão prudencial das instituições de crédito, o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS deve ser interpretado no sentido de que implica que os organismos centrais disponham da qualidade de instituição de crédito. Acrescenta que esta impossibilidade de exercer uma supervisão prudencial consolidada por intermédio de um organismo central que não dispõe da referida qualidade é confirmada pela falta de poder de supervisão e de poder sancionatório do BCE em tal configuração.

85

Em aplicação da jurisprudência referida no n.o 55, supra, há que proceder a uma interpretação literal, teleológica e contextual do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS.

86

No que respeita, em primeiro lugar, à interpretação literal do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, importa assinalar que a sua redação não refere que o organismo central deve dispor da qualidade de instituição de crédito, ao contrário da hipótese prevista no artigo 2.o, n.o 21, alínea a), desse mesmo regulamento, que se refere explicitamente à supervisão prudencial de um grupo cuja empresa‑mãe dispõe da qualidade de instituição de crédito.

87

Relativamente, em segundo lugar, à interpretação teleológica do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, devem ser tidas em conta as finalidades referidas no n.o 64, supra.

88

Ora, não sendo necessário pormenorizar a apreciação dos requisitos previstos no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, que está abrangida pelo segundo fundamento, basta sublinhar, nesta fase, que, na eventualidade de os referidos requisitos estarem preenchidos, daí se deduz logicamente uma proximidade suficiente entre as instituições filiadas e um organismo central que demonstra a existência de um grupo. Mais particularmente, o requisito de solidariedade que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 pode implicar, na eventualidade de resolução de uma instituição de crédito, um risco para as outras entidades filiadas ao mesmo organismo central. Por conseguinte, é conforme com as finalidades do regulamento de base e do Regulamento‑Quadro do MUS concluir pela qualificação de «grupo supervisionado» na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, independentemente de o organismo central deste grupo dispor, ou não, da qualidade de instituição de crédito.

89

Além disso, seguir a análise do recorrente implicaria que diferentes instituições filiadas a um organismo central que não dispõem da qualidade de instituição de crédito, mas cumprem as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, estariam submetidas, segundo a sua importância individual, quer apenas à supervisão do BCE, quer à supervisão direta das autoridades nacionais competentes, no âmbito do MUS, o que conduziria a um fracionamento da supervisão prudencial contrário às finalidades tanto do regulamento de base como do Regulamento‑Quadro do MUS.

90

No que respeita, em terceiro lugar, à interpretação contextual do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, é certo que o recorrente observa com razão, em substância, por um lado, que o regulamento de base confere ao BCE um determinado número de prerrogativas que vão além da possibilidade de aplicar sanções administrativas, as quais constituem o corolário da função de supervisão que lhe é atribuída, e, por outro, que as disposições relevantes do regulamento de base não preveem o exercício de tais prerrogativas a respeito dos organismos centrais referidos no artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS.

91

Com efeito, tanto o artigo 10.o do regulamento de base, relativo aos pedidos de informação, como o seu artigo 11.o, relativo às investigações de caráter geral, e o seu artigo 16.o, relativo aos poderes de supervisão, se referem ao exercício de prerrogativas do BCE a respeito das instituições de crédito, companhias financeiras, companhias mistas e companhias financeiras mistas. Além disso, o artigo 18.o deste mesmo regulamento prevê a possibilidade de serem aplicadas sanções às instituições de crédito, companhias financeiras e companhias financeiras mistas.

92

Todavia, há que ter em conta que a supervisão prudencial numa base consolidada de um grupo acresce à supervisão prudencial numa base individual das instituições de crédito que o compõem, mas não a substitui, como recorda o considerando 38, segundo período, do regulamento de base.

93

Por conseguinte, a impossibilidade de o BCE exercer tais prerrogativas a respeito de um organismo central que não dispõe da qualidade de instituição de crédito não constitui um obstáculo dirimente à realização de uma supervisão prudencial adequada, uma vez que o BCE está em condições de utilizar as suas prerrogativas em relação às entidades filiadas ao referido organismo central.

94

Resulta do exposto que o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS não pode ser interpretado no sentido de implicar, por si só, que um organismo central disponha da qualidade de instituição de crédito.

2) Quanto à questão de saber se a qualidade de instituição de crédito do organismo central resulta do artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013

95

O recorrente considera que o respeito do Regulamento n.o 575/2013 implica que um organismo central deve dispor da qualidade de instituição de crédito. A este propósito, remete, por um lado, para o artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 e, por outro, para o artigo 10.o, n.o 1, alínea b), deste mesmo regulamento.

96

No que respeita, em primeiro lugar, ao artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013, este precisa que, «[s]empre que seja aplicado o artigo 10.o, o organismo central a que se refere esse artigo cumpre os requisitos das [p]artes II a VIII com base na situação consolidada do conjunto constituído pelo organismo central e pelas instituições a ele associadas». As partes II a VIII são relativas, respetivamente, aos fundos próprios, aos requisitos de fundos próprios, aos grandes riscos, às posições em risco sobre o risco de crédito transferido, à liquidez, à alavancagem e à divulgação de informações por parte das instituições. No essencial, o recorrente alega que tais requisitos apenas podem ser respeitados por uma instituição de crédito.

97

Há que observar que tal argumentação não pode ser seguida, uma vez que faz da observância do artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 um requisito de aplicação do artigo 10.o deste mesmo regulamento, o que é contrário tanto à interpretação literal do referido artigo 10.o como à articulação destas duas disposições.

98

Por um lado, não figura nenhuma referência ao artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 no artigo 10.o deste mesmo regulamento.

99

Por outro, a lógica da relação entre estas duas disposições pretende que a execução do disposto no artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 seja uma consequência, e não uma condição, da aplicação do artigo 10.o deste mesmo regulamento. Com efeito, quando a autoridade competente aceita, com fundamento no artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013, dispensar as entidades associadas a um organismo central do cumprimento dos requisitos prudenciais numa base individual, o artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 é aplicável, impondo que o referido organismo central cumpra os requisitos prudenciais com base na situação consolidada do conjunto que constitui com as instituições filiadas.

100

A este respeito, cabe recordar que não está em causa o mérito de uma decisão de dispensa do cumprimento dos requisitos prudenciais numa base individual das instituições associadas a um organismo central, mas a existência de um grupo na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS. Ora, esta última disposição remete apenas para o artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013, e não para o artigo 11.o, n.o 4, do mesmo regulamento.

101

Por conseguinte, embora a eventual dificuldade de um organismo central respeitar o disposto no artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 possa ser uma consideração relevante quando se trata da concessão, pela autoridade competente, do benefício de uma dispensa individual — a qual continua a ser uma faculdade mesmo que as condições previstas no artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013 estejam preenchidas —, não tem impacto no exercício, pelo BCE, da sua supervisão sobre todo o grupo.

102

Em segundo lugar, a condição que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013, estabelece que «[a] solvabilidade e a liquidez do organismo central e de todas as instituições a ele associadas são monitorizadas no seu conjunto com base nas contas consolidadas dessas instituições».

103

A questão de saber se a CNCM cumpre esta condição é discutida no âmbito da segunda parte do segundo fundamento. Nesta fase, importa apenas verificar se o respeito do artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013 implica necessariamente que o organismo central disponha da qualidade de instituição de crédito.

104

Para ser preenchida, esta condição exige o respeito de dois critérios. O primeiro é relativo à existência de contas consolidadas do grupo. O segundo implica a supervisão da solvabilidade e da liquidez de todas as entidades que formam o grupo com base nas referidas contas consolidadas.

105

A este respeito, há que aprovar a posição que figura no ponto 24 das orientações do CAESB, segundo a qual este requisito de supervisão da solvabilidade e da liquidez de todas as entidades que formam o grupo com base nestas contas consolidadas deve ser encarado de um ponto de vista prudencial, uma vez que o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS respeita precisamente à definição dos grupos submetidos à supervisão prudencial.

106

De igual modo, o CAESB também observou acertadamente, nas suas orientações, que não era necessário o organismo central dispor da qualidade de instituição de crédito, visto que o respeito dos dois critérios explicitamente referidos no artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013 bastava para que pudesse ser exercida uma supervisão do cumprimento dos requisitos prudenciais pelo grupo.

107

Com efeito, a existência de contas consolidadas permite uma visão global da situação financeira do conjunto constituído pelo organismo central e pelas instituições a ele associadas, com base nas quais a autoridade competente pode assegurar que a liquidez e a solvabilidade deste conjunto cumprem os requisitos prudenciais, independentemente de o organismo central dispor, ou não, da qualidade de instituição de crédito.

108

Por conseguinte, importa concluir que nem o artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013, nem o artigo 11.o, n.o 4, deste mesmo regulamento implicam que um organismo central deve dispor da qualidade de instituição de crédito para que o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS seja aplicável.

109

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

c) Quanto ao segundo fundamento, relativo à inexistência de grupo supervisionado na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS e do artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013

110

Com o seu segundo fundamento, o recorrente alega que as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013, para o qual o artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS remete, não estão preenchidas pelo Crédit mutuel que, assim, não pode ser qualificado de «grupo» na aceção desta disposição. O presente fundamento pode ser dividido em três partes, relativas à violação das condições previstas, respetivamente, no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, no artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do referido regulamento e no artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do mesmo regulamento.

1) Quanto à primeira parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013

111

A título preliminar, o recorrente alega que decorre do artigo 6.o do Regulamento n.o 575/2013 que, em princípio, as instituições de crédito estão submetidas aos requisitos prudenciais numa base individual e que a possibilidade aberta pelo artigo 10.o deste mesmo regulamento tem caráter de exceção, apenas aplicável quando o grupo pode ser considerado uma entidade única e a aplicação dos requisitos prudenciais numa base individual não apresenta nenhum valor acrescentado.

112

O recorrente alega que a CNCM não dispõe nem tem o direito de dispor de fundos próprios que lhe permitam garantir ou ser solidário com os compromissos das suas associadas e que, assim, o BCE errou ao considerar que a condição prevista no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 estava preenchida.

113

Em primeiro lugar, o recorrente alega, em substância, que os conceitos de solidariedade e de garantia apenas podem ser interpretados à luz das regras do direito francês que regulam as relações entre a CNCM e as suas associadas. Ora, em primeiro lugar, não existe solidariedade, na aceção do artigo 1200.o do Código Civil francês, entre a CNCM e as suas entidades associadas em relação aos seus credores. Em segundo lugar, a CNCM não assume os compromissos das suas associadas na aceção do artigo 2288.o do Código Civil francês nem presta garantias autónomas na aceção do artigo 2321.o deste mesmo código. Em terceiro lugar, o artigo L.511—31 do CMF não pode ser interpretado no sentido de que implica a existência de solidariedade ou de garantia da CNCM em benefício das suas associadas. Em quarto lugar, o mesmo sucede com as disposições específicas aplicáveis à CNCM que figuram nos artigos L.512—55 e seguintes do CMF. O recorrente acrescenta que não há nenhum mecanismo de apoio financeiro intragrupo semelhante aos que podem ser adotados nos termos dos artigos L.613‑46 e seguintes do CMF.

114

Em segundo lugar, o recorrente alega que a CNCM não dispõe de nenhum poder de transferência de fundos próprios entre associadas. Por um lado, o artigo L.511‑31 do CMF não prevê que os órgãos centrais podem efetuar tais transferências e, por outro, a jurisprudência recente do Conseil constitutionnel (França) impossibilita transferências autoritárias sem o consentimento das associadas em causa.

115

Em terceiro lugar, o recorrente alega que a décision à caractère général n.o 1—1992 de la CNCM (Decisão com Caráter Geral n.o 1—1992 da CNCM), de 10 de março de 1992, relativa ao exercício da solidariedade entre as caixas de crédito mútuo e as caixas de crédito mútuo agrícola, não prevê que os compromissos do organismo central e dos associados são solidários ou garantidos por uns ou outros. Recorda que a própria decisão impugnada sublinha a falta de definição do mecanismo de solidariedade previsto no Crédit mutuel. Considera igualmente que a existência de um fundo de 2% dos depósitos na CCCM não permite concluir que a condição prevista no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 está preenchida.

116

O BCE, apoiado pela Comissão, pede que a primeira parte do segundo fundamento seja julgada improcedente.

117

A título desta primeira condição, há que verificar se os compromissos da CNCM e das instituições a ela associadas constituem compromissos solidários ou se os compromissos das instituições a ela associadas são integralmente garantidos pela CNCM.

118

Em primeiro lugar, no que respeita ao sentido do artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, deve ser imediatamente afastado o argumento do recorrente, segundo o qual os termos «responsabilidade solidária» e «compromissos […] garantidos» devem ser interpretados à luz dos artigos relevantes do Código Civil francês.

119

Com efeito, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, decorre das exigências tanto de aplicação uniforme do direito da União como do princípio da igualdade que os termos de uma disposição de direito da União que não contenha nenhuma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros para determinar o seu sentido e alcance devem normalmente ser interpretados de modo autónomo e uniforme em toda a União, interpretação essa que deve ser procurada tendo em conta o contexto da disposição e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa (v. acórdão de 5 de dezembro de 2013, Vapenik, C‑508/12, EU:C:2013:790, n.o 23 e jurisprudência aí referida).

120

Uma vez que o Regulamento n.o 575/2013 não define os conceitos de «solidariedade» e de «garantia» através de uma remissão para os direitos dos Estados‑Membros, deve considerar‑se que se trata de conceitos autónomos do direito da União.

121

No seu parecer, a Comissão de Reexame referiu‑se à interpretação que figura nas orientações do CAESB.

122

A este respeito, o n.o 19 das orientações do CAESB menciona acertadamente que a condição que figura no artigo 3.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/48, cuja redação é análoga à do artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, prevê diferentes hipóteses, concretamente, quer uma garantia do organismo central em relação às suas associadas, quer uma garantia recíproca do organismo central e das suas associadas, quer um sistema de intergarantias no grupo no sentido de que as suas associadas são igualmente garantes umas das outras.

123

No ponto 20 das orientações do CAESB, este considera, em substância, que, para que haja garantia ou solidariedade, «os mecanismos existentes […] devem assegurar que não existe, de direito ou de facto, qualquer impedimento à transferência rápida de fundos próprios e de liquidez no grupo para assegurar que as obrigações em relações aos credores do organismo central e às suas associadas podem ser cumpridas» e «[o] grupo, no seu conjunto, deve ser capaz de fornecer o apoio necessário segundo os mecanismos existentes a partir de fundos disponíveis».

124

Há que observar que este segundo ponto da interpretação do CAESB não pode ser inteiramente aprovado, pelo menos quando o artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 é aplicável por força da remissão efetuada pelo artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS.

125

De facto, adotar a posição do CAESB equivaleria a interpretar a condição que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 à luz da condição relativa às transferências de fundos entre uma empresa‑mãe e as suas filiais para que estas possam beneficiar de uma dispensa do cumprimento dos requisitos prudenciais numa base individual. Esta constava do artigo 69.o da Diretiva 2006/48 e figura atualmente no artigo 7.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, que refere a inexistência de «impedimentos significativos, de direito ou de facto, atuais ou previstos, a uma transferência rápida de fundos próprios ou ao pronto reembolso de passivos pela empresa‑mãe».

126

Ora, por um lado, há que assinalar que estas duas disposições, concretamente, o artigo 7.o, n.o 1, alínea a), e o artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, estão redigidas de forma distinta, o que milita contra uma interpretação que alargue os termos utilizados pelo legislador para um tipo de situações, concretamente, as relações entre uma empresa‑mãe e as suas filiais, a outro tipo de situações, concretamente, o das relações entre as instituições associadas e um organismo central.

127

Por outro lado, tal interpretação é contrária às finalidades do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS.

128

Com efeito, conforme foi sublinhado nos n.os 59 a 64, supra, o conceito de grupo no contexto do regulamento de base e do Regulamento‑Quadro do MUS visa, nomeadamente, permitir ao BCE avaliar os riscos suscetíveis de afetar uma instituição de crédito que não têm origem nesta, mas no grupo a que pertence. Ora, uma vez que existe uma obrigação de transferência de fundos próprios e de liquidez no grupo a fim de assegurar que as obrigações perante os credores são cumpridas — independentemente de esta transferência ser efetuada, ou não, segundo as modalidades aplicadas pelo CAESB —, o risco da instituição de crédito associada pode estender‑se ao conjunto do grupo a que pertence, o que faz com que o BCE possa exercer a sua supervisão sobre o conjunto constituído pelo organismo central e as suas associadas.

129

Por esta mesma razão, o argumento do recorrente segundo o qual, na lógica do Regulamento n.o 575/2013, o benefício do artigo 10.o deste regulamento só deve ser concedido quando a aplicação dos requisitos prudenciais numa base individual não tem nenhum valor acrescentado é irrelevante, uma vez que, no caso em apreço, está unicamente em causa a existência de um grupo submetido à supervisão prudencial na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro MUS e que, pelos fundamentos referidos nos n.os 67 a 69, supra, a constatação da existência de tal grupo não implica automaticamente a concessão da dispensa prevista no artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013 às entidades que o compõem.

130

Por conseguinte, é conforme à finalidade do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS, mas igualmente à redação do artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, concluir que a condição que figura nesta disposição está preenchida, uma vez que há uma obrigação de transferência de fundos próprios e de liquidez no grupo a fim de assegurar que as obrigações perante os credores são cumpridas.

131

Em segundo lugar, quanto à aplicação desta primeira condição ao caso em apreço, há que recordar que a Comissão de Reexame invocou vários fundamentos para justificar o seu respeito. Trata‑se, em primeiro lugar, dos termos do artigo L.511‑31 do CMF; em segundo lugar, da obrigação incondicional de intervenção da CNCM a favor das caixas em dificuldades que decorre da Decisão n.o 1‑1992 da CNCM, de 10 de março de 1992 (v. n.o 115, supra); em terceiro lugar, da existência de recursos da CNCM e da CCCM que podem ser mobilizados; em quarto lugar, dos estatutos da CCCM; e, em quinto lugar, da circunstância de no passado ter sido prestado um auxílio excecional às entidades em dificuldades.

132

No que respeita ao primeiro fundamento invocado pela Comissão de Reexame, isto é, a redação do artigo L.511—31 do CMF, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o alcance das disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais deve ser apreciado tendo em conta a interpretação que delas fazem os órgãos jurisdicionais nacionais (v. acórdão de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia, C‑433/13, EU:C:2015:602, n.o 81 e jurisprudência aí referida). Todavia, na falta de decisão dos órgãos jurisdicionais nacionais competentes, cabe necessariamente ao Tribunal Geral pronunciar‑se sobre o alcance das referidas disposições.

133

Da redação do artigo L.511—31 do CMF resulta apenas a existência da obrigação de tais organismos centrais adotarem «todas as medidas necessárias para garantir a liquidez e a solvência de cada uma destas instituições e também do conjunto da rede».

134

Há que observar que a redação do artigo L.511—31 do CMF não permite, por si só, concluir que a condição prevista no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 está preenchida, uma vez que a referência à adoção das «medidas necessárias» para «garantir a liquidez e a solvência de cada uma destas instituições e também do conjunto da rede» tem um caráter demasiado geral para que daí se possa deduzir a existência de uma obrigação de transferência de fundos próprios e de liquidez no grupo a fim de assegurar que as obrigações perante os credores são cumpridas.

135

Em contrapartida, da leitura da decisão de 10 de março de 1992 resulta a existência de um mecanismo de solidariedade a favor das caixas em dificuldade, ou seja, as caixas que estão impossibilitadas de respeitar a regulamentação bancária, as caixas que não podem fazer face a um sinistro excecional, as caixas que apresentam uma situação negativa e as caixas que têm fundo de maneio negativo (artigo 2.o). É especificado que esta intervenção pode assumir a forma de adiantamentos remunerados eventualmente acompanhados por subvenções do montante dos juros dos adiantamentos, subvenções, empréstimos ordinários ou empréstimos participativos e garantias a título gratuito de toda ou de uma parte dos seus compromissos (artigo 3.o). Por último, daqui resulta igualmente que, embora esta solidariedade seja exercida, em princípio, à escala regional, uma caixa pode recorrer à solidariedade nacional (artigo 4.o) e que, nesse caso, a CNCM deve obrigatoriamente intervir a favor de uma caixa em dificuldade (artigo 5.o).

136

Estes elementos confirmam a existência de uma obrigação de transferência de fundos próprios e de liquidez no Crédit mutuel destinada a assegurar que as obrigações perante os credores são cumpridas.

137

Por conseguinte, apesar de o BCE ter podido, no anexo I da decisão impugnada, salientar algumas lacunas na aplicação deste mecanismo de solidariedade, atendendo à sua própria existência, tinha fundamento para concluir que a condição prevista no artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013 estava preenchida.

138

Segundo jurisprudência constante, quando determinados fundamentos de uma decisão são, por si só, suscetíveis de a justificar juridicamente, os vícios de que pudessem estar feridos outros fundamentos do ato não têm, de qualquer forma, influência na sua parte decisória (v., neste sentido e por analogia, acórdãos de 12 de julho de 2001, Comissão e França/TF1, C‑302/99 P e C‑308/99 P, EU:C:2001:408, n.o 27, e de 12 de dezembro de 2006, SELEX Sistemi Integrati/Comissão, T‑155/04, EU:T:2006:387, n.o 47). Em aplicação desta jurisprudência, o Tribunal Geral considera que não é necessário apreciar o mérito dos outros fundamentos invocados no parecer da Comissão de Reexame.

139

Esta conclusão não é infirmada pela argumentação contrária do recorrente. É o que sucede, nomeadamente, com a referência à Decisão n.o 2014‑449 QPC, de 6 de fevereiro de 2015, do Conseil constitutionnel, uma vez que dizia exclusivamente respeito à conformidade de uma disposição do CMF com a Constituição francesa, que autorizava a ACPR a ordenar uma transferência oficiosa de carteiras em detrimento de uma companhia de seguros, o que a torna, assim, irrelevante em relação a um mecanismo de solidariedade previsto entre instituições associadas que pertencem ao mesmo grupo bancário.

140

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente a primeira parte do segundo fundamento.

2) Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013

141

O recorrente alega que o BCE errou ao considerar que a condição que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013 estava preenchida.

142

Em primeiro lugar, os conceitos de solvabilidade e de liquidez apenas fazem sentido em relação às instituições de crédito, enquanto que a CNCM é uma associação.

143

Em segundo lugar, é a nível dos grupos associados à CNCM que a solvabilidade e a liquidez são apreciadas pelos credores, pelas agências de notação e pelos reguladores. As contas publicadas pela CNCM constituem a simples agregação de diferentes grupos e têm um caráter artificial, uma vez que entre estes não existe unidade económica.

144

Em terceiro lugar, a Comissão de Reexame errou ao considerar que esta condição estava preenchida com base no artigo L.511—20 do CMF, segundo o qual «as instituições e as sociedades de financiamentos associadas a uma rede e o órgão central na aceção do artigo L.511—31 são consideradas parte de um mesmo grupo para efeitos da aplicação do presente código». O recorrente alega que esta qualificação de «grupo» apenas é válida para a aplicação do CMF, sendo irrelevante no que respeita à questão de saber se as condições previstas no artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013 estão preenchidas. De igual modo, nem o artigo L.511—31 do CMF, nem o artigo 25.o dos estatutos da CNCM permitem demonstrar que esta segunda condição está preenchida. O mesmo sucede com o artigo 2.o de tais estatutos e as outras disposições do CMF que o BCE refere.

145

O BCE e a Comissão pedem que a segunda parte do segundo fundamento seja julgada improcedente.

146

Nos termos do artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013, «[a] solvabilidade e a liquidez do organismo central e de todas as instituições a ele associadas [devem ser] monitorizadas no seu conjunto com base nas contas consolidadas dessas instituições».

147

Pelos motivos referidos nos n.os 104 e 105, supra, esta condição deve ser entendida no sentido de que implica o respeito de dois critérios. O primeiro é relativo à existência de contas consolidadas do grupo. O segundo pressupõe uma supervisão da solvabilidade e da liquidez de um ponto de vista prudencial de todas as entidades que compõem o grupo com base nas suas contas consolidadas.

148

No seu parecer, a Comissão de Reexame considerou que esta condição estava preenchida tanto em relação às responsabilidades da CNCM a título do artigo L.511—31 da CMF no que respeita à liquidez e à solvabilidade das instituições associadas e do conjunto da rede como em relação aos termos do artigo 25.o do estatuto da CNCM.

149

O Tribunal Geral considera que esta conclusão deve ser acolhida.

150

No que respeita ao primeiro critério, deve considerar‑se que está preenchido, uma vez que, segundo o artigo 25.o dos estatutos da CNCM, o seu conselho de administração «aprova as contas anuais da [CNCM], as contas consolidadas nacionais e elabora os relatórios de gestão destas contas».

151

Quanto ao segundo critério, importa observar que, nos termos do artigo L.511—31 do CMF, os órgãos centrais «devem adotar todas as medidas necessárias para garantir a liquidez e a solvência de cada uma destas instituições e também do conjunto da rede» e «representam as instituições de crédito e as sociedades de financiamento a eles associadas junto […] da [ACPR]». Daqui decorre logicamente que a CNCM está habilitada pelo CMF a representar o Crédit mutuel junto das autoridades responsáveis pela supervisão prudencial do cumprimento dos requisitos de solvabilidade e de liquidez. Assim, é igualmente possível considerar que o segundo critério está satisfeito.

152

Relativamente à argumentação do recorrente segundo a qual esta condição apenas pode ser preenchida se a CNCM não constituir uma instituição de crédito, deve ser rejeitada pelas razões referidas no n.o 106, supra.

153

Tendo em consideração o exposto, a segunda parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

3) Quanto à terceira parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 575/2013

154

O recorrente alega que o BCE errou ao considerar que a condição que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 575/2013 estava preenchida.

155

O recorrente entende que a CNCM não está habilitada a dar instruções às suas associadas na aceção desta disposição nos domínios fundamentais da vida de uma instituição de crédito, atendendo aos termos gerais utilizados pelo artigo L.511‑31 do CMF. Para que tal poder existisse, teria sido necessário que o legislador o previsse expressamente, a exemplo do órgão central do grupo BPCE com o artigo L.512‑107 do CMF. Uma comparação com o artigo L.512‑56 do CMF aplicável ao Crédit mutuel demonstra a inexistência de tal poder a seu respeito, uma vez que a referência à adoção de «medidas necessárias» pela CNCM não implica a possibilidade de dar instruções. Além disso, este poder também não foi atribuído à CNCM por via contratual. No que respeita ao poder sancionatório que, segundo a CNCM, resulta do artigo R.512—24 do CMF, o recorrente alega que não é possível deduzir daí a existência de um poder de dar instruções à direção das instituições associadas. Quanto aos poderes sancionatórios previstos nos estatutos da CNCM, apresentam um caráter ilegal.

156

O BCE, apoiado pela Comissão, pede que a terceira parte do segundo fundamento seja julgada improcedente.

157

Para verificar se o BCE teve razão ao concluir que a condição que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 575/2013 estava preenchida, importa verificar se a direção da CNCM pode dar instruções à direção das instituições associadas.

158

No seu parecer, a Comissão de Reexame refere o direito, que a CNCM extrai do artigo L.511—31 do CMF, de adotar «todas as medidas necessárias para garantir a liquidez e a solvência de cada uma destas instituições e também do conjunto da rede», assim como o dever que lhe é imposto pela mesma disposição de garantir «a aplicação das disposições legislativas e regulamentares relativas a estas instituições e sociedades e [exercer] uma fiscalização administrativa, técnica e financeira sobre a sua organização e a sua gestão». Sublinhou igualmente a obrigação das caixas de Crédit mutuel «respeitarem os estatutos, regulamentos internos, instruções e decisões da [CNCM] e da federação regional a que devem aderir» nos termos do artigo R.512—20, segundo parágrafo, do CMF. Por último, sublinhou a existência de poder sancionatório por parte da CNCM. Por um lado, refere o artigo R.512‑24 do CMF, que lhe permite impor a uma caixa que viole a regulamentação em vigor, uma das sanções entre «[a] advertência [, a] repreensão [ou] a supressão da lista das caixas de crédito mútuo», e, por outro, os artigos 10.o e 25.o dos estatutos da CNCM, que lhe permitem excluir uma federação, retirar a sua confiança a um presidente de federação de caixa de crédito mútuo ou retirar a autorização de um diretor executivo.

159

Decorre destas disposições uma conjugação de três elementos: em primeiro lugar, o dever de a CNCM garantir, nomeadamente, a liquidez e a solvabilidade do grupo e das entidades que o compõem, bem como o cumprimento dos requisitos legislativos e regulamentares; em segundo lugar, uma obrigação de as instituições associadas respeitarem as instruções da CNCM e, em terceiro lugar, um poder sancionatório da CNCM em relação a tais entidades. Por conseguinte, deve considerar‑se preenchida a condição que figura no artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 575/2013.

160

Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento do recorrente segundo o qual o poder de instrução que decorre dos estatutos da CNCM é ilegal, uma vez que apenas o CMF pode conferir tal prerrogativa. A este respeito, basta sublinhar que, como salienta o Conseil d’État (França) no n.o 5 do seu acórdão de 13 de dezembro de 2016, invocado pelo BCE na audiência e em relação ao qual o recorrente pôde apresentar as suas observações, o segundo parágrafo do artigo R.512—20 do CMF prevê que as caixas de crédito mútuo «devem comprometer‑se a respeitar os estatutos, regulamentos internos, instruções e decisões da [CNCM]». É igualmente possível observar que, no n.o 13 deste mesmo acórdão, o Conseil d’État recordou que «[o recorrente] [estava] obrigad[o] a respeitar os pedidos da [CNCM], atuando no âmbito das suas prerrogativas de órgão central».

161

Tendo em consideração o exposto, a terceira parte e, por conseguinte, o segundo fundamento na íntegra devem ser julgados improcedentes.

2.   Quanto ao terceiro fundamento, relativo à legalidade do artigo 2.o, n.o 3, e do anexo II—2 da decisão impugnada

162

No âmbito do seu terceiro fundamento, o recorrente alega que a decisão impugnada, na medida em que lhe impõe fundos próprios adicionais, enferma de um erro de direito e de erros de apreciação, e é desproporcionada.

163

O BCE pede que o presente fundamento seja julgado improcedente.

164

A título preliminar, cabe observar que decorre do artigo 4.o, n.o 3, do regulamento de base que, na execução das suas atribuições de supervisão prudencial, o BCE constitui a autoridade competente na aceção da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), e do Regulamento n.o 575/2013.

165

Nos termos do artigo 97.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2013/36, «[t]endo em conta os critérios técnicos definidos no artigo 98.o, as autoridades competentes revêm as disposições, as estratégias, os processos e os mecanismos aplicados pelas instituições para dar cumprimento à presente diretiva e ao Regulamento […] n.o 575/2013 e avaliam […] [o]s riscos a que as instituições estão ou podem vir a estar expostas».

166

Os requisitos mínimos de fundos próprios «CET 1» de que deve dispor uma instituição de crédito são precisados no artigo 92.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013, nos termos do qual, «[s]ob reserva dos artigos 93.o e 94.o, as instituições respeitam permanentemente os seguintes requisitos de fundos próprios: […] Rácio de fundos próprios [“CET 1”] de 4,5%».

167

Para tal, há que acrescentar a obrigação que figura no artigo 129.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36, sob a epígrafe «Requisito de manutenção de uma reserva de conservação de fundos próprios», que estabelece que:

«Os Estados‑Membros exigem que as instituições mantenham, para além dos fundos próprios [“CET 1”] mantidos para cumprir o requisito de fundos próprios imposto pelo artigo 92.o do Regulamento […] n.o 575/2013 uma reserva de conservação de fundos [“CET 1”] de 2,5% do montante total das suas posições em risco calculado nos termos do artigo 92.o, n.o 3, do referido regulamento, em base individual e consolidada, consoante o caso, nos termos da [p]arte I, [t]ítulo II, do mesmo regulamento».

168

Além disso, resulta da leitura conjugada do artigo 16.o, n.o 1, alínea c), e n.o 2, alínea a), do regulamento de base que, caso decorra do exame prudencial realizado pelo BCE que os fundos próprios e liquidez que uma instituição de crédito detém não garantem uma boa gestão e uma cobertura dos riscos, o BCE tem o direito de exigir a uma instituição de crédito fundos próprios superiores a esses requisitos mínimos.

169

No anexo II—2 da decisão impugnada, o BCE fixou em 11% os requisitos de fundos próprios «CET 1» do recorrente. Para justificar este nível de fundos próprios, o BCE referiu, nomeadamente, os riscos adicionais resultantes de uma potencial saída do grupo Crédit mutuel e considerou que implicavam a imposição de fundos próprios adicionais nos termos do artigo 16.o, n.o 1, alínea c), e n.o 2, alínea a), do regulamento de base.

170

A este respeito, o BCE salientou a discussão entre o recorrente e o grupo CM11‑CIC no grupo Crédit mutuel e observou que esta tornava possível a saída do recorrente do grupo Crédit mutuel.

171

No essencial, o BCE considerou que uma eventual separação poderia ter três tipos de consequências para o recorrente. Em primeiro lugar, influenciaria o seu modelo de negócio. A este respeito, é feita referência a um aumento da pressão concorrencial que o recorrente deveria enfrentar, pelas entidades do grupo Crédit mutuel, e às dúvidas quanto à possibilidade de utilizar a marca Crédit mutuel em caso de separação. Em segundo lugar, uma separação poderia ter impacto no cálculo dos requisitos mínimos de fundos próprios «CET 1» do recorrente, uma vez que este deixaria de poder utilizar o método avançado e deveria utilizar o método padrão, o que implicaria um aumento dos seus requisitos de fundos próprios. Em terceiro lugar, esta separação teria igualmente impacto no perfil de risco de liquidez do recorrente, dado que este deixaria de beneficiar do mecanismo de solidariedade que existe no grupo Crédit mutuel. Isto poderia afetar as suas notações externas e, consequentemente, os seus custos de refinanciamento.

172

O presente fundamento pode ser dividido em três partes, relativas, a primeira, a um erro de direito decorrente da tomada em consideração, pelo BCE, de um acontecimento que o recorrente considera improvável, concretamente, a sua separação do grupo Crédit mutuel; a segunda, ao caráter incorreto e desproporcionado da imposição de fundos próprios adicionais devido a este acontecimento improvável; e, a terceira, ao facto de a imposição de fundos próprios adicionais constituir uma «sanção dissimulada».

a) Quanto à primeira parte do terceiro fundamento, relativa ao caráter erróneo da tomada em consideração, pelo BCE, de uma possível separação do recorrente e do grupo Crédit mutuel

173

O recorrente acusa o BCE de se ter baseado na eventualidade de uma saída do grupo Crédit mutuel e alega, em substância, que tal eventualidade é tão pouco credível que a sua tomada em consideração enferma a decisão impugnada de um erro de direito.

174

A este respeito, observa que a sua separação do grupo Crédit mutuel implicaria uma alteração das disposições legislativas do CMF, alteração que não foi prevista pelos poderes públicos franceses nem pelo próprio BCE. Em contrapartida, o BCE, tanto no seu ofício de 10 de novembro de 2014 como na decisão impugnada, defende a reforma e o reforço do papel da CNCM. Por conseguinte, apenas a vontade do recorrente de alterar a estrutura do grupo Crédit mutuel a favor de uma estrutura bipolar em que cada um dos dois polos possuiria um órgão central pode, na falta de apoio das autoridades públicas a favor de uma tal reforma, justificar uma alteração do seu perfil de risco.

175

O BCE pede que a primeira parte do terceiro fundamento seja julgada improcedente.

176

Na medida em que o recorrente alega que o BCE cometeu um erro de direito ao tomar em consideração uma possível separação do grupo Crédit mutuel, há que salientar que resulta da própria redação do artigo 97.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2013/36 que a fiscalização que o BCE deve realizar tem por objeto os riscos a que as instituições «estão ou podem vir a estar expostas», o que implica necessariamente a possível tomada em consideração de acontecimentos futuros suscetíveis de alterar o seu perfil de risco. Por conseguinte, ao basear‑se na possível ocorrência de um acontecimento futuro, o BCE não cometeu um erro de direito.

177

Com a argumentação em que acusa o BCE de ter tido em conta a eventualidade de tal separação quando esta não tem um grau de probabilidade suficiente, o recorrente alega, na realidade, a existência de um erro de apreciação por parte do BCE.

178

A este respeito, é jurisprudência constante que, em caso de apreciações complexas, as autoridades da União dispõem, em determinados domínios do direito da União, de uma ampla margem de apreciação, de tal modo que a fiscalização do juiz da União em relação a estas apreciações deve necessariamente limitar‑se à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, bem como da exatidão material dos factos, da inexistência de erro manifesto de apreciação dos factos e de desvio de poder (v. acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Deutsche Post, C‑399/08 P, EU:C:2010:481, n.o 97 e jurisprudência aí referida).

179

O exercício desta ampla margem de apreciação não está, todavia, subtraído à fiscalização jurisdicional. O juiz da União deve não só verificar a exatidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são de molde a escorar as conclusões que deles se tiram (v., neste sentido, acórdãos de 22 de novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C‑525/04 P, EU:C:2007:698, n.o 57, e de 6 de novembro de 2008, Países Baixos/Comissão, C‑405/07 P, EU:C:2008:613, n.o 55).

180

De igual modo, quando uma autoridade da União dispõe de uma ampla margem de apreciação, o respeito das garantias atribuídas pela ordem jurídica da União nos processos administrativos assume uma importância ainda mais fundamental. Entre essas garantias constam, nomeadamente, a obrigação de a instituição competente fundamentar de forma suficiente as suas decisões. Só assim é que o juiz da União pode verificar se os elementos de facto e de direito de que depende o exercício da margem de apreciação foram reunidos (v., neste sentido, acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14, e de 9 de setembro de 2010, Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑387/08, não publicado, EU:T:2010:377, n.o 31).

181

Há que constatar que, no caso em apreço, o BCE dispõe dessa ampla margem de apreciação, atendendo ao caráter complexo da avaliação dos requisitos de fundos próprios «CET 1» de uma instituição de crédito em relação ao seu perfil de risco e aos acontecimentos suscetíveis de o influenciar.

182

Por conseguinte, importa verificar se o BCE cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar a possibilidade de uma separação do recorrente do grupo Crédit mutuel.

183

O argumento essencial invocado pelo recorrente para contestar a probabilidade de tal separação consiste no facto de ser necessária a intervenção dos poderes públicos franceses, por meio de uma alteração do CMF, à qual estes não são favoráveis.

184

É certo que o recorrente teve razão ao observar que resulta da leitura conjugada dos artigos L.511—30 e L.511—31 do CMF que deve ser associado a um dos órgãos centrais taxativamente enumerados no artigo L.511—30 do CMF. Daqui decorre necessariamente que uma saída organizada do recorrente do grupo Crédit mutuel implicaria uma alteração do artigo L.511—30 do CMF, de modo a incluir um órgão central, ao qual as instituições de crédito que constituem o recorrente estão associadas.

185

Todavia, é verdade que o CMF reconhece à CNCM o poder de excluir as entidades associadas ao grupo Crédit mutuel. Por um lado, o artigo L.511—31 do CMF, no seu quinto parágrafo, prevê a possibilidade de os organismos centrais «imporem as sanções previstas pelos seus próprios diplomas legislativos e regulamentares» e, mais explicitamente, no seu sexto parágrafo, a eventualidade da perda de qualidade de instituição ou de sociedade associada, a qual «deve ser notificada pelo órgão central à [ACPR], que decide da aprovação da instituição ou da sociedade em causa». Por outro, resulta do artigo R.512—24 do CMF que «[o] conselho de administração da [CNCM] pode impor a uma caixa que viole a regulamentação em vigor uma das seguintes sanções: […] a supressão da lista das caixas de crédito mútuo», sendo as modalidades do exercício deste poder sancionatório precisadas no artigo R.512—25 do CMF. Esta prerrogativa é retomada no artigo 25.o dos estatutos da CNCM.

186

Ora, por um lado, na medida em que o recorrente constitui um conjunto de caixas de crédito mútuo, não é possível excluir que esta prerrogativa seja exercida a seu respeito.

187

Por outro lado, o recorrente não contesta a existência da longa discussão que o opõe ao grupo CM11—CIC e à CNCM, salientada pelo BCE na decisão impugnada. A este respeito, o próprio recorrente referiu, desde a sua carta de 17 de julho de 2015 dirigida ao BCE, a queixa com constituição de parte civil por consideração ilegal de interesses apresentada ao Ministério Público do Tribunal de grande instance de Paris [Tribunal de Primeira Instância de Paris, França] devido a um alegado conflito de interesses entre o grupo CM11—CIC e a CNCM. Do mesmo modo, em anexo à referida carta, o recorrente salientava os processos que intentou no tribunal de grande instance de Paris [Tribunal de Primeira Instância de Paris, França] e no EUIPO para obter, respetivamente, a anulação da marca nacional e a declaração de nulidade da marca da União Europeia Crédit mutuel de que a CNCM é titular.

188

Atendendo a esta situação particularmente conflituosa entre o recorrente, a CNCM e o grupo CM11—CIC, a eventualidade de uma saída do recorrente do grupo Crédit mutuel, mesmo sem alteração do artigo L.511—30 do CMF, não se afigura uma improbabilidade tal que a sua tomada em consideração constituiria um erro manifesto de apreciação por parte do BCE.

189

Por conseguinte, a primeira parte do terceiro fundamento deve ser julgada improcedente.

b) Quanto à segunda parte do terceiro fundamento, relativa ao caráter erróneo e desproporcionado da apreciação, pelo BCE, da necessidade de o recorrente dispor de fundos próprios adicionais

190

O recorrente considera que o BCE considerou incorreta e desproporcionadamente que a eventualidade da sua separação do grupo Crédit mutuel implicava que dispusesse de fundos próprios adicionais.

191

O BCE pede que a presente parte do terceiro fundamento seja julgada improcedente.

192

Assim como resulta do n.o 171, supra, para concluir que a separação do recorrente do grupo Crédit mutuel teria um impacto negativo no seu perfil de risco, que implicaria que o recorrente possuísse fundos próprios adicionais, o BCE teve em conta, no essencial, três categorias de fundamentos.

193

O Tribunal Geral considera suficiente apreciar o mérito dos fundamentos relativos, por um lado, à alteração do perfil de risco de liquidez do recorrente e, por outro, ao impacto de uma alteração do método de cálculo dos seus fundos próprios.

1) Quanto ao mérito do fundamento relativo à alteração do perfil de risco de liquidez do recorrente em caso de separação do grupo Crédit mutuel

194

O recorrente alega que o BCE errou ao referir as consequências no seu perfil de risco da perda do mecanismo de solidariedade no grupo Crédit mutuel, uma vez que este mecanismo não existe. Considera, além disso, que as consequências de uma degradação das suas notações externas sobre os seus custos de refinanciamento seriam limitadas devido à sua boa situação económica intrínseca. Sublinha, no essencial, que o seu rácio de compromisso foi substancialmente reduzido e, consequentemente, a sua dependência face aos mercados financeiros para efeitos de refinanciamento. Assim, considera que uma degradação da sua nota em três graus apenas teria consequências pouco significativas nos seus custos de refinanciamento ou no seu resultado líquido.

195

A este respeito, basta observar que, contrariamente ao que alega o recorrente nos seus articulados, e conforme é constatado nos n.os 135 e 137, supra, existe um mecanismo de solidariedade no grupo Crédit mutuel.

196

Além disso, resulta de um relatório de uma agência de notação sobre o recorrente, apresentado pelo BCE no anexo B.16 da contestação, que a nota que lhe foi atribuída estava ligada à do grupo Crédit mutuel. Além disso, nesse mesmo relatório, a agência de notação atribuiu importância, para efeitos da determinação da nota atribuída ao recorrente, à existência de um mecanismo de solidariedade no grupo Crédit mutuel.

197

Deste modo, atendendo ao caráter complexo da determinação do perfil de risco do recorrente, o BCE não cometeu um erro manifesto de apreciação ao concluir que a perda deste mecanismo de solidariedade na sequência de uma saída do grupo Crédit mutuel poderia ter um impacto negativo nas notações externas do recorrente e, por conseguinte, nos seus custos de refinanciamento. A este respeito, a opinião do recorrente sobre a dimensão do custo adicional do refinanciamento que resultaria de uma queda da sua notação não consegue demonstrar o caráter manifestamente errado desta apreciação.

2) Quanto ao mérito do fundamento relativo ao impacto de uma alteração do método de cálculo dos fundos próprios do recorrente em caso de separação do grupo Crédit mutuel

198

O recorrente alega que a passagem de um método avançado para um método padrão para o cálculo dos fundos próprios apenas constitui uma alteração de instrumentos de medição que não corresponde a uma alteração da realidade dos riscos operacionais ou de crédito a que faz face. Embora reconheça que a passagem para o método padrão conduziria de facto a um aumento automático dos requisitos de fundos próprios «CET 1», o recorrente alega que está em condições de fazer face a tal aumento. A decisão impugnada, na medida em que lhe impõe, desde já, fundos próprios adicionais, priva‑o da livre utilização de uma parte da sua capacidade financeira, o que lhe causa um prejuízo grave e é desproporcionado.

199

A este respeito, importa recordar que o Regulamento n.o 575/2013 prevê dois métodos de cálculo dos requisitos mínimos de fundos próprios das instituições de crédito: o «método padrão», referido nos artigos 111.o a 141.o do Regulamento n.o 575/2013, que consiste em medir o risco de acordo com a forma padrão, ou o «método avançado» ou «método das notações internas», previsto nos artigos 142.o a 191.o do Regulamento n.o 575/2013, que consiste em utilizar os seus próprios modelos, sendo que este segundo método exige, nos termos do artigo 143.o do Regulamento n.o 575/2013, a autorização da autoridade competente.

200

Além disso, na medida em que o recorrente refere o caráter desproporcionado da imposição a título preventivo de fundos próprios adicionais, há que recordar que, segundo o artigo 5.o, n.o 4, TUE, em virtude do princípio da proporcionalidade, o conteúdo e a forma da ação da União não devem exceder o necessário para alcançar os objetivos dos Tratados. As instituições aplicam o princípio da proporcionalidade em conformidade com o Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, anexado ao Tratado FUE.

201

Segundo jurisprudência constante, o princípio da proporcionalidade, que faz parte dos princípios gerais do direito da União, exige que os atos das instituições da União sejam adequados a realizar os objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa e não vão além do necessário à realização desses objetivos, sendo que, quando existe uma escolha entre várias medidas adequadas, há que recorrer à menos restritiva e que os inconvenientes causados não devem ser desmedidos face aos objetivos prosseguidos (v. acórdão de 4 de maio de 2016, Philip Morris Brands e o., C‑547/14, EU:C:2016:325, n.o 165 e jurisprudência aí referida).

202

Importa igualmente recordar que a apreciação da proporcionalidade de uma medida deve ser conciliada com o respeito da margem de apreciação eventualmente reconhecida às instituições da União quando da sua adoção (v., neste sentido, acórdão de 12 de dezembro de 2006, Alemanha/Parlamento e Conselho, C‑380/03, EU:C:2006:772, n.o 145 e jurisprudência aí referida).

203

Na decisão impugnada, o BCE, no essencial, seguiu um raciocínio fundado na conjugação de três elementos. Em primeiro lugar, em caso de saída do grupo Crédit mutuel, o recorrente deixará provavelmente de ter condições para beneficiar do método avançado e deverá utilizar o método padrão. Em segundo lugar, a aplicação deste método implica uma redução da avaliação dos seus fundos próprios. Em terceiro lugar, concluiu que o recorrente deveria preparar‑se para essa situação através da constituição de reservas adequadas de fundos próprios.

204

O Tribunal Geral observa que o recorrente não contesta o mérito dos dois primeiros elementos realçados pelo BCE. Além disso, resulta de uma carta que o recorrente enviou ao BCE, em 27 de março de 2015, que o próprio avaliou em 2,8% a queda do seu nível de fundos próprios «CET 1» que conduziria a uma passagem do método avançado de cálculo destes fundos para o método padrão.

205

Na medida em que, por um lado, pelos motivos referidos nos n.os 184 a 188, supra, o BCE podia tomar em consideração a eventual saída do recorrente do grupo Crédit mutuel e, por outro, é pacífico entre as partes que tal saída pode implicar uma queda da avaliação do nível dos fundos próprios «CET 1» do recorrente, a imposição de fundos próprios adicionais que permitam fazer face a tal eventualidade não resulta de um erro manifesto de apreciação nem tem um caráter manifestamente desproporcionado.

206

Decorre do exposto que tanto os fundamentos relativos à alteração do perfil de risco de liquidez do recorrente como os fundamentos respeitantes ao impacto de uma alteração do método de cálculo dos seus fundos próprios, em caso de separação do grupo Crédit mutuel, bastam para justificar suficientemente a imposição de fundos próprios adicionais pelo BCE. Por conseguinte, não é necessário apreciar o mérito dos fundamentos da decisão impugnada referentes ao impacto no modelo de negócios do recorrente de uma separação do grupo Crédit mutuel.

207

Por conseguinte, a segunda parte do terceiro fundamento deve ser julgada improcedente.

c) Quanto à terceira parte do terceiro fundamento, relativa ao facto de a imposição de fundos próprios adicionais constituir uma sanção dissimulada

208

O recorrente alega que o nível dos fundos próprios «CET 1» que lhe foi imposto na decisão impugnada tem o caráter de sanção dissimulada, uma vez que aparentemente teve como objetivo «penalizá‑lo» por ter chamado a atenção do BCE para a situação no grupo Crédit mutuel.

209

O BCE contesta o caráter de sanção dissimulada da sua apreciação do nível de fundos próprios «CET 1» do recorrente.

210

Há que observar que, através de tal argumentação, o recorrente alega, no essencial, que a decisão impugnada enferma de desvio de poder.

211

Importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o conceito de desvio de poder se refere ao facto de uma autoridade administrativa ter usado os seus poderes com um objetivo diferente daquele para que lhe foram conferidos. Uma decisão só padece de desvio de poder se, com base em indícios objetivos, pertinentes e concordantes, se verificar que foi adotada para um fim dessa natureza (acórdãos de 13 de novembro de 1990, Fedesa e o., C‑331/88, EU:C:1990:391, n.o 24, e de 9 de outubro de 2001, Itália/Comissão, C‑400/99, EU:C:2001:528, n.o 38). Além disso, em caso de pluralidade de objetivos prosseguidos, mesmo quando um motivo injustificado se junta aos motivos válidos, a decisão não enferma por esse facto de desvio de poder, quando não sacrifique o objetivo essencial (acórdãos de 21 de dezembro de 1954, Itália/Alta Autoridade, 2/54, EU:C:1954:8, p. 103, e de 21 de setembro de 2005, EDP/Comissão, T‑87/05, EU:T:2005:333, n.o 87).

212

No que respeita à finalidade para a qual os poderes referidos no artigo 16.o, n.o 2, do regulamento de base foram conferidos ao BCE, conforme foi exposto no n.o 168, supra, aquela reside, nomeadamente, na necessidade de fazer face a uma situação em que os fundos próprios e a liquidez de uma instituição de crédito não garantem uma boa gestão e uma cobertura dos seus riscos.

213

Ora, por um lado, resulta da apreciação das duas primeiras partes do presente fundamento que o BCE utilizou os seus poderes em conformidade com esta finalidade. Por outro, o recorrente não apresenta indícios objetivos, pertinentes e concordantes, na aceção da jurisprudência referida no n.o 211, supra, suscetíveis de demonstrar que o seu nível de fundos próprios foi determinado de modo a puni‑lo.

214

Assim, há que julgar improcedente a terceira parte e, por conseguinte, o fundamento no seu todo, assim como negar provimento ao presente recurso.

IV. Quanto às despesas

215

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No caso em apreço, tendo o recorrente sido vencido, há que condená‑lo nas suas próprias despesas, bem como nas despesas efetuadas pelo BCE, em conformidade com os pedidos deste.

216

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Por conseguinte, a Comissão suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

O Crédit mutuel Arkéa suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pelo Banco Central Europeu (BCE).

 

3)

A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

 

Prek

Buttigieg

Schalin

Berke

Costeira

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 13 de dezembro de 2017.

Assinaturas

Índice

 

I. Antecedentes do litígio

 

II. Tramitação processual e pedidos das partes

 

III. Questão de direito

 

A. Quanto à admissibilidade do recurso

 

1. Quanto à regularidade da procuração conferida aos representantes do recorrente

 

2. Quanto à legitimidade do recorrente para agir contra o artigo 2.o, n.o 1, e o anexo I da decisão impugnada

 

3. Quanto ao interesse em agir do recorrente contra a decisão impugnada

 

B. Quanto ao mérito

 

1. Quanto ao primeiro e segundo fundamentos, relativos à legalidade do artigo 2.o, n.o 1, e do anexo I da decisão impugnada

 

a) Quanto à interpretação teleológica e contextual do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS

 

b) Quanto ao primeiro fundamento, relativo à inexistência de qualidade de instituição de crédito da CNCM

 

1) Quanto à questão de saber se a qualidade de instituição de crédito do organismo central resulta do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS

 

2) Quanto à questão de saber se a qualidade de instituição de crédito do organismo central resulta do artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013

 

c) Quanto ao segundo fundamento, relativo à inexistência de grupo supervisionado na aceção do artigo 2.o, n.o 21, alínea c), do Regulamento‑Quadro do MUS e do artigo 10.o do Regulamento n.o 575/2013

 

1) Quanto à primeira parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do artigo 10.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 575/2013

 

2) Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 575/2013

 

3) Quanto à terceira parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 575/2013

 

2. Quanto ao terceiro fundamento, relativo à legalidade do artigo 2.o, n.o 3, e do anexo II—2 da decisão impugnada

 

a) Quanto à primeira parte do terceiro fundamento, relativa ao caráter erróneo da tomada em consideração, pelo BCE, de uma possível separação do recorrente e do grupo Crédit mutuel

 

b) Quanto à segunda parte do terceiro fundamento, relativa ao caráter erróneo e desproporcionado da apreciação, pelo BCE, da necessidade de o recorrente dispor de fundos próprios adicionais

 

1) Quanto ao mérito do fundamento relativo à alteração do perfil de risco de liquidez do recorrente em caso de separação do grupo Crédit mutuel

 

2) Quanto ao mérito do fundamento relativo ao impacto de uma alteração do método de cálculo dos fundos próprios do recorrente em caso de separação do grupo Crédit mutuel

 

c) Quanto à terceira parte do terceiro fundamento, relativa ao facto de a imposição de fundos próprios adicionais constituir uma sanção dissimulada

 

IV. Quanto às despesas


( *1 ) Língua do processo: francês.

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