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Document 62015TJ0624

Acórdão do Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) de 18 de junho de 2019.
European Food SA e o. contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado ‑ Sentença proferida por um tribunal arbitral constituído sob os auspícios do Centro Internacional para a Resolução de Diferendos relativos a Investimentos (CIRDI) ‑ Pagamento de uma indemnização atribuída a certos operadores económicos ‑ Decisão que declara o auxílio incompatível com o mercado interno e ordena a sua recuperação ‑ Competência da Comissão.
Processos T-624/15, T-694/15 e T-704/15.

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2019:423

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada)

18 de junho de 2019 ( *1 )

«Auxílios de Estado — Sentença proferida por um tribunal arbitral constituído sob os auspícios do Centro Internacional para a Resolução de Diferendos relativos a Investimentos (CIRDI) — Pagamento de uma indemnização atribuída a certos operadores económicos — Decisão que declara o auxílio incompatível com o mercado interno e ordena a sua recuperação — Competência da Comissão»

Nos processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15

European Food SA, com sede em Drăgăneşti (Roménia),

Starmill SRL, com sede em Drăgăneşti,

Multipack SRL, com sede em Drăgăneşti,

Scandic Distilleries SA, com sede em Oradea (Roménia),

representadas por K. Struckmann, G. Forwood, advogados, e A. Kadri, solicitor,

recorrentes no processo T‑624/15,

Ioan Micula, residente em Oradea (Roménia), representado por K. Struckmann, G. Forwood e A. Kadri,

recorrente no processo T‑694/15,

Viorel Micula, residente em Oradea,

European Drinks SA, com sede em Ştei (Roménia),

Rieni Drinks SA, com sede em Rieni (Roménia),

Transilvania General Import‑Export SRL, com sede em Oradea,

West Leasing International SRL, com sede em Păntășești (Roménia),

representados inicialmente por J. Derenne, D. Vallindas, advogados, A. Dashwood, barrister, e V. Korom, solicitor, e, em seguida, por J. Derenne, D. Vallindas e A. Dashwood,

recorrentes no processo T‑704/15,

contra

Comissão Europeia, representada por P.‑J. Loewenthal e T. Maxian Rusche, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por

Reino de Espanha, representado por S. Centeno Huerta e A. Rubio González, na qualidade de agentes,

e por

Hungria, representada inicialmente por M. Fehér, G. Koós e M. Bóra e, em seguida, por M. Fehér e G. Koós, na qualidade de agentes,

intervenientes,

que têm por objeto três pedidos apresentados ao abrigo do disposto no artigo 263.o TFUE e destinados à anulação da Decisão (UE) 2015/1470 da Comissão, de 30 de março de 2015, relativa ao auxílio estatal SA.38517 (2014/C) (ex 2014/NN) aplicado pela Roménia — Sentença arbitral Micula contra Roménia, de 11 de dezembro de 2013 (JO 2015, L 232, p. 43),

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada),

composto por: M. Prek (relator), presidente, E. Buttigieg, F. Schalin, B. Berke e M. J. Costeira, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 20 de março de 2018,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes dos litígios

1

Os recorrentes, a European Food SA, a Starmill SRL, a Multipack SRL e a Scandic Distilleries SA, no processo T‑624/15, Ioan Micula, no processo T‑694/15, Viorel Micula, a European Drinks SA, a Rieni Drinks SA, a Transilvania General Import‑Export SRL e a West Leasing International SRL, no processo T‑704/15, foram designados na Decisão (UE) 2015/1470 da Comissão, de 30 de março de 2015, relativa ao auxílio estatal SA.38517 (2014/C) (ex 2014/NN) aplicado pela Roménia — Sentença arbitral Micula contra Roménia, de 11 de dezembro de 2013 (JO 2015, L 232, p. 43, a seguir «decisão impugnada»), como sendo os beneficiários da indemnização atribuída por uma sentença arbitral (a seguir «sentença arbitral») proferida em 11 de dezembro de 2013 no processo ARB/05/20 Micula e o./Roménia por um tribunal arbitral (a seguir «tribunal arbitral») constituído sob a égide do Centro Internacional para a Resolução de Diferendos relativos a Investimentos (CIRDI).

2

Ioan e Viorel Micula, cidadãos suecos residentes na Roménia, são os acionistas maioritários do European Food and Drinks Group (EFDG), cuja atividade está ligada à produção de alimentos e de bebidas na região de Ştei‑Nucet, departamento de Bihor, na Roménia. A European Food, a Starmill, a Multipack, a Scandic Distilleries, a European Drinks, a Rieni Drinks, a Transilvania General Import‑Export e a West Leasing International pertencem ao EFDG.

Legislação romena e investimento dos recorrentes

3

O Acordo Europeu Que Cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a Roménia, por outro (JO 1994, L 357, p. 2, a seguir «Acordo Europeu»), entrou em vigor em 1 de fevereiro de 1995. Por força do seu artigo 64.o, n.o 1, alínea iii), qualquer auxílio de Estado que falseasse ou ameaçasse falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções, era declarado incompatível com o bom funcionamento do Acordo Europeu, na medida em que podia afetar o comércio entre as Comunidades Europeias e a Roménia. Por força do artigo 64.o, n.o 2, do Acordo Europeu, quaisquer práticas contrárias ao referido artigo eram examinadas «com base em critérios decorrentes da aplicação das regras dos artigos 85.o, 86.o e 92.o do Tratado [CEE, atuais artigos 101.o, 102.o e 107.o TFUE]». Além disso, os artigos 69.o e 71.o do Acordo Europeu obrigavam a Roménia a alinhar a sua legislação nacional pelo acervo comunitário.

4

Para cumprir a obrigação de alinhamento prevista no Acordo Europeu que recai sobre si, a Roménia aprovou em 1999 a Lei n.o 143/1999, relativa aos auxílios de Estado, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2000. Esta lei, que incluía uma definição de auxílios de Estado igual à prevista no artigo 64.o do Acordo Europeu e no direito da União Europeia, designou o Consiliul Concurenţei (Conselho da Concorrência, Roménia) e o Oficiul Concurenței (Instituto da Concorrência, Roménia), enquanto autoridades nacionais encarregadas de supervisionar os auxílios de Estado, competentes para apreciar a compatibilidade dos auxílios de Estado concedidos pela Roménia às empresas.

5

Em 2 de outubro de 1998, as autoridades romenas aprovaram o Decreto Governamental de Emergência n.o 24/1998 (a seguir «DGE 24») que concede a certos investidores de regiões desfavorecidas, os quais tinham obtido um certificado de investidor permanente, uma série de incentivos, entre os quais, nomeadamente, facilidades como a isenção de direitos aduaneiros e do imposto sobre o valor acrescentado para as máquinas e o reembolso dos direitos aduaneiros relativos às matérias‑primas, bem como a isenção do imposto sobre as sociedades enquanto a zona em causa fosse designada como região desfavorecida.

6

O Governo romeno decidiu quais as regiões que deviam ser designadas como regiões desfavorecidas e fixou a duração dessa designação por um período máximo de dez anos. Por Decisão de 25 de março de 1999, aplicável a partir de 1 de abril de 1999, o referido governo declarou a zona mineira Ştei‑Nucet, departamento de Bihor, região desfavorecida por um período de dez anos.

7

Em 15 de maio de 2000, o Conselho da Concorrência adotou a Decisão n.o 244/2000, na qual estabeleceu que vários dos incentivos concedidos ao abrigo do DGE 24 deviam ser considerados auxílios de Estado ao funcionamento que provocavam uma distorção da concorrência e, por conseguinte, deviam ser suprimidos.

8

Em 1 de julho de 2000 entrou em vigor o Despacho Governamental de Emergência n.o 75/2000 (a seguir «DGE 75»), que altera o DGE 24 (a seguir, considerados em conjunto, «DGE»).

9

O Conselho da Concorrência contestou na Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia) o facto de, não obstante a adoção do DGE 75, a sua Decisão n.o 244/2000 não ter sido cumprida. Foi negado provimento a este pedido em 26 de janeiro de 2001 pelo facto de o DGE 75 dever ser considerado uma medida legislativa, e não administrativa, não podendo, portanto, a sua legalidade ser contestada pelo Conselho da Concorrência ao abrigo da Lei n.o 143/1999. Esta decisão foi confirmada pela Înalta Curte de Casație şi Justiție (Tribunal Superior de Cassação e de Justiça, Roménia) em 19 de fevereiro de 2002.

10

Com base nos certificados de investidores permanentes, obtidos em 1 de junho de 2000 pela European Food e em 17 de maio de 2002 pela Starmill e pela Multipack, estas fizeram alguns investimentos na zona mineira Ștei‑Nucet.

11

Em fevereiro de 2000, a Roménia iniciou as negociações de adesão à União. No contexto destas negociações, a União, na Posição Comum de 21 de novembro de 2001, declarou que havia na Roménia «uma série de regimes de auxílios existentes, bem como regimes de auxílios novos incompatíveis, que não [tinham] sido alinhados com o acervo», incluindo «as facilidades concedidas por força do [DGE]».

12

Em 26 de agosto de 2004, especificando que, «[a] fim de respeitar os critérios previstos nas regras comunitárias relativas aos auxílios de Estado e finalizar as negociações relativas ao capítulo n.o 6 (Política em matéria de concorrência), [era] necessário eliminar todas as formas de auxílio de Estado previstas pela legislação nacional que [fossem] incompatíveis com o acervo comunitário na matéria», a Roménia revogou todos os incentivos concedidos ao abrigo do DGE, com exceção da facilidade relativa ao imposto sobre as sociedades. Esta revogação entrou em vigor em 22 de fevereiro de 2005.

13

Em 1 de janeiro de 2007, a Roménia aderiu à União. Nem o DGE 24 nem o DGE 75 são mencionados no n.o 1 do título 2, «Política de Concorrência», do anexo V do Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2005, L 157, p. 203, a seguir «Ato de Adesão») enquanto medidas de auxílio que seriam consideradas como auxílios existentes no momento dessa adesão.

Processo arbitral

14

O Tratado bilateral de investimento, concluído em 29 de maio de 2002 entre o Governo do Reino da Suécia e o Governo romeno para a promoção e a proteção recíproca dos investimentos (a seguir «TBI»), entrou em vigor em 1 de julho de 2003. Este tratado previa para os investidores de ambos os países (incluindo para os investimentos realizados antes da entrada em vigor do TBI) certas medidas de proteção quando os investidores de um dos países investissem no outro país. O artigo 2.o, n.o 3, TBI dispõe, nomeadamente, que «[c]ada parte contratante garante, a todo o momento, um tratamento justo e equitativo aos investimentos dos investidores da outra parte contratante e não cria obstáculos, através de medidas arbitrárias ou discriminatórias, à administração, gestão, manutenção, utilização, gozo ou cessão dos referidos investimentos pelos mencionados investidores». Além disso, o artigo 7.o TBI prevê que os diferendos entre os investidores e os países signatários são dirimidos, nomeadamente, por um tribunal arbitral colocado sob a égide do CIRDI.

15

Em 28 de julho de 2005, na sequência da revogação dos incentivos ao investimento previstos pelo DGE, cinco dos recorrentes, a saber, Ioan Micula e Viorel Micula, a European Food, a Starmill e a Multipack (a seguir «demandantes na arbitragem»), pediram a constituição de um tribunal arbitral, em conformidade com o artigo 7.o TBI.

16

Por Decisão de 24 de setembro de 2008, o tribunal arbitral considerou que os pedidos dos demandantes na arbitragem eram admissíveis. Os demandantes na arbitragem tinham inicialmente pedido que os incentivos ao investimento revogados fossem repostos. Em seguida, retiraram parcialmente esse pedido e, em troca, reclamaram uma indemnização pelos prejuízos causados com a revogação dos referidos incentivos. Estes demandantes alegaram que a Roménia, ao suprimir os incentivos, tinha violado a confiança legítima dos investidores, que pensavam que esses incentivos estariam disponíveis, essencialmente, até 1 de abril de 2009. Por conseguinte, segundo os demandantes na arbitragem, a Roménia não cumpriu a sua obrigação de aplicar um tratamento justo e equitativo aos investidores suecos, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 3, TBI.

17

No decurso do processo arbitral, a Comissão Europeia interveio na qualidade de amicus curiae. Na sua intervenção de 20 de julho de 2009, alegou que os incentivos ao abrigo do DGE 24 eram «incompatíveis com as normas comunitárias em matéria de auxílios regionais», observando, em especial, que «os incentivos não preenchiam os requisitos do direito comunitário em matéria de custos elegíveis e de intensidades do auxílio [e que] as facilidades [tinham] constituído um auxílio ao funcionamento que [era] proibido ao abrigo das normas em matéria de auxílios regionais». A Comissão alegou, assim, que «[q]ualquer decisão que reponha os privilégios anulados pela Roménia ou que conceda compensações aos demandantes na arbitragem pela perda desses privilégios constituiria um novo auxílio que não seria compatível com o Tratado [FUE]» e que «a execução [de qualquer decisão que imponha à Roménia a reposição dos regimes de investimento declarados incompatíveis com o mercado interno durante as negociações de adesão] não podia, portanto, ter lugar se fosse contrária às regras da política da União Europeia em matéria de auxílios de Estado».

18

Na sentença arbitral, o tribunal arbitral concedeu aos demandantes na arbitragem uma indemnização a pagar pela Roménia no montante de 791882452 lei romenos (RON) (cerca de 178 milhões de euros). O tribunal arbitral concluiu o seguinte:

«[A]o revogar os incentivos previstos pelo DGE 24 antes de 1 de abril de 2009, a Roménia não agiu sem razoabilidade ou de má‑fé (com exceção do facto de a [demandada] não ter agido razoavelmente ao manter as obrigações dos investidores após a eliminação dos incentivos). No entanto, o tribunal [arbitral] concluiu […] que a Roménia violou a confiança legítima dos demandantes [na arbitragem], que pensavam que esses incentivos estariam disponíveis, essencialmente sob a mesma forma, até 1 de abril de 2009. Além disso, a Roménia não atuou com transparência ao não avisar oportunamente os [ditos] demandantes na arbitragem de que o regime iria terminar antes da data declarada para o seu termo. Por conseguinte, o tribunal declara que a Roménia não conseguiu “garantir o tratamento justo e equitativo dos investimentos” dos demandantes [na arbitragem], na aceção do artigo 2.o, n.o 3, TBI.»

19

O tribunal arbitral concedeu, nomeadamente, aos demandantes na arbitragem uma indemnização repartida da seguinte forma:

85100000 RON pela revogação das facilidades para as matérias‑primas e o aumento do custo do açúcar subsequente;

17500000 RON pelo aumento do custo de outras matérias‑primas;

18133229 RON pela perda da capacidade de armazenamento do açúcar a preços inferiores;

255700000 RON pelo lucro cessante resultante das vendas de produtos acabados não realizadas;

além disso, o tribunal arbitral impôs à Roménia o pagamento de juros de mora, calculados a partir de 1 de março de 2007 pelo aumento do custo do açúcar e de outras matérias‑primas, a partir de 1 de novembro de 2009 pela perda da capacidade de armazenamento do açúcar e, a partir de 1 de maio de 2008, pelo lucro cessante.

20

Em 18 de abril de 2014, a Roménia requereu a anulação da sentença arbitral a um comité ad hoc com base no artigo 52.o da Convenção para a Resolução de Diferendos relativos a Investimentos entre os Estados e os Nacionais de outros Estados, concluída em 18 de março de 1965 (a seguir «Convenção CIRDI»). Neste contexto, em 7 de setembro de 2014, o comité ad hoc anulou a suspensão da execução da sentença arbitral, que tinha aprovado numa primeira fase, uma vez que a Roménia, após ter consultado a Comissão sobre esta questão, não estava em condições de assumir, conforme o comité lhe pedia, o compromisso incondicional de que executaria a sentença arbitral mesmo que isso conduzisse a uma violação das suas obrigações ao abrigo, nomeadamente, do direito da União e independentemente de qualquer decisão adotada pela Comissão.

21

Em 15 de outubro de 2014, a Comissão apresentou ao comité ad hoc um pedido de intervenção acessória, enquanto terceiro não litigante no diferendo em causa no processo de anulação. O pedido de intervenção foi aceite pelo comité ad hoc em 4 de dezembro de 2014 e, em 9 de janeiro de 2015, a Comissão apresentou observações no âmbito deste processo na qualidade de amicus curiae. No momento da adoção da decisão impugnada, o processo de anulação da sentença arbitral ainda estava em curso.

Recursos interpostos pelos demandantes na arbitragem nos tribunais nacionais para o reconhecimento e a execução da sentença arbitral

22

Em 18 de março de 2014, quatro dos recorrentes (a European Food, a Starmill, a Multipack e Ioan Micula) intentaram na Roménia uma ação executiva com vista à execução da sentença arbitral, em conformidade com o artigo 54.o da Convenção CIRDI, na qual pedem o pagamento de 80 % do montante em dívida e os juros correspondentes.

23

Em 24 de março de 2014, o Tribunal București (Tribunal de Bucareste, Roménia) autorizou a execução da sentença arbitral, considerando que, nos termos do artigo 54.o da Convenção CIRDI, a sentença arbitral era um ato diretamente executável e devia ser tratada como uma sentença transitada em julgado, proferida a nível nacional, excluindo, por conseguinte, o processo de reconhecimento dessa sentença nos termos do código de processo civil romeno. Em 30 de março de 2014, um agente de execução deu início à tramitação executiva da sentença arbitral, fixando um prazo de seis meses no termo do qual o Ministério das Finanças romeno deveria ter pago 80 % do montante devido aos quatro recorrentes, em conformidade com a sentença arbitral, acrescido de juros e outros custos.

24

A Roménia deduziu oposição à execução da sentença arbitral no Tribunal București (Tribunal de Bucareste) e pediu a adoção de medidas provisórias, a saber, a suspensão temporária da execução até que esse tribunal se pronunciasse quanto ao mérito nesse processo. Em 14 de maio de 2014, esse tribunal suspendeu temporariamente a execução da sentença arbitral até que fosse proferida uma decisão quanto ao mérito da oposição à execução e ao pedido de suspensão da execução. Em 26 de maio de 2014, a Comissão interveio neste processo em conformidade com o disposto no artigo 23.o‑A, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [108.o TFUE] (JO 1999, L 83, p. 1). Esta última solicitou ao Tribunal București (Tribunal de Bucareste) que suspendesse e anulasse a execução da sentença arbitral e submetesse duas questões prejudiciais à apreciação do Tribunal de Justiça da União Europeia, em conformidade com o disposto no artigo 267.o TFUE.

25

Em 23 de setembro de 2014, o Tribunal București (Tribunal de Bucareste) proferiu decisão sobre a medida provisória, revogando a suspensão e indeferindo o pedido da Roménia de suspensão da execução da sentença arbitral, pelo facto de o comité ad hoc do CIRDI ter anulado a suspensão da execução dessa sentença em 7 de setembro de 2014 (v. n.o 20, supra). Em 30 de setembro de 2014, a Roménia interpôs recurso da Sentença de 23 de setembro de 2014. Em 13 de outubro de 2014, o Tribunal București (Tribunal de Bucareste) indeferiu o pedido de submissão de questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça da União Europeia. Em 17 de outubro de 2014, na sequência da Decisão da Comissão de 1 de outubro de 2014 de dar início ao procedimento formal de investigação, previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, no âmbito do processo pendente no Tribunal de București (Tribunal de Bucareste), a Roménia pediu novamente a adoção de medidas provisórias sob a forma de suspensão da execução da sentença arbitral.

26

Em 24 de novembro de 2014, o Tribunal București (Tribunal de Bucareste) julgou improcedente a oposição à execução apresentada pela Roménia contra o Despacho de 24 de março de 2014, incluindo o pedido de medidas provisórias de 17 de outubro de 2014. Em 14 de janeiro de 2015, a Roménia recorreu desta sentença.

27

Em 24 de fevereiro de 2015, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) anulou a Sentença proferida pelo Tribunal de București (Tribunal de Bucareste) em 23 de setembro de 2014 e suspendeu a execução até que fosse proferido o acórdão no recurso interposto da sentença desse mesmo tribunal de 24 de novembro de 2014. A Comissão apresentou um pedido de intervenção no âmbito desse recurso ao abrigo do artigo 23.o‑A, n.o 2, do Regulamento n.o 659/1999.

28

Viorel Micula apresentou vários pedidos de reconhecimento da sentença arbitral no âmbito de processos de exequatur ou de partes nos tribunais da Bélgica, França, Luxemburgo, Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, e dos Estados Unidos. Ioan Micula, a European Food, a Starmill e a Multipack também apresentaram um pedido de reconhecimento da sentença arbitral no âmbito de um processo de partes nos Estados Unidos. Durante a fase dos articulados no Tribunal Geral, esses processos estavam ainda em curso.

Execução da sentença arbitral, procedimento formal de investigação e decisão impugnada

29

Em 31 de janeiro de 2014, os serviços da Comissão informaram as autoridades romenas de que qualquer cumprimento ou execução da sentença arbitral constituiria um novo auxílio e deveria ser objeto de uma notificação dirigida à Comissão.

30

Em 20 de fevereiro de 2014, as autoridades romenas informaram os serviços da Comissão sobre o pagamento de uma parte da indemnização que o tribunal arbitral tinha atribuído aos demandantes na arbitragem, através de compensação com os impostos devidos às autoridades romenas por um dos demandantes (European Food). A dívida fiscal assim compensada era de 337492864 RON (cerca de 76000000 euros). Além disso, a Roménia pediu esclarecimentos suplementares aos serviços da Comissão relativamente à possibilidade de pagar o montante restante a uma pessoa singular (a Viorel Micula e Ioan Micula ou a qualquer outra pessoa singular a quem o crédito pudesse ser cedido).

31

Em 12 de março de 2014, os serviços da Comissão solicitaram informações complementares à Roménia a respeito das medidas que tencionava tomar para o cumprimento ou a execução ulterior da sentença arbitral. A Roménia prestou essas informações na carta de 26 de março de 2014.

32

Por ofício de 1 de abril de 2014, os serviços da Comissão chamaram a atenção das autoridades romenas para a possibilidade de a Comissão adotar uma injunção de suspensão para garantir que não será pago nenhum auxílio de Estado incompatível, e pediram à Roménia que apresentasse observações a este respeito. Na carta de 7 de abril de 2014, a Roménia declarou que não pretendia apresentar observações sobre essa possibilidade.

33

Em 26 de maio de 2014, a Comissão adotou a Decisão C(2014) 3192, intimando a Roménia, ao abrigo do disposto no artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, a suspender imediatamente qualquer ação que pudesse levar ao cumprimento ou à execução da sentença arbitral, com o fundamento de que se afigurava que tal ação constituía um auxílio de Estado ilegal, até a Comissão adotar uma decisão final sobre a compatibilidade desse auxílio de Estado com o mercado interno.

34

Por ofício de 1 de outubro de 2014, a Comissão informou a Roménia da sua decisão de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE no que diz respeito à execução parcial, pela Roménia, da sentença arbitral no início de 2014 (v. n.o 30, supra), bem como a qualquer cumprimento ou execução ulterior da sentença arbitral. Nessa decisão, publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 7 de novembro de 2014, a Comissão convidou as partes interessadas a apresentarem observações.

35

Em 31 de outubro de 2014, um agente de execução designado pelo Tribunal de București (Tribunal de Bucareste) ordenou a penhora das contas do Ministério das Finanças romeno e pediu a execução de 80 % da sentença arbitral. No momento da adoção da decisão impugnada, as contas abertas pelo Ministério das Finanças romeno na Tesouraria do Estado e em instituições bancárias estavam bloqueadas.

36

Em 26 de novembro de 2014, a Roménia apresentou as observações relativas à decisão de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE. Os recorrentes apresentaram observações, na qualidade de partes interessadas, em 8 de dezembro de 2014, após a Comissão ter rejeitado a prorrogação do prazo para a apresentação de observações. As observações dos recorrentes foram comunicadas à Roménia, à qual foi dada a possibilidade de lhes responder. As observações da Roménia a respeito das observações dos recorrentes foram apresentadas em 27 de janeiro de 2015.

37

Por outro lado, os recorrentes pediram acesso a toda a correspondência trocada entre a Comissão e a Roménia, junta aos autos. Este pedido foi indeferido em 19 de dezembro de 2014, tendo o indeferimento sido confirmado em 2 de março de 2015.

38

Em 5 de janeiro de 2015, um agente de execução penhorou as contas do Ministério das Finanças romeno no montante de 36484232 RON (cerca de 8100000 euros). Em seguida, transferiu 34004232 RON (cerca de 7560000 euros), em partes iguais, para três dos cinco demandantes na arbitragem e conservou o remanescente a título de honorários. Entre 5 e 25 de fevereiro de 2015, o agente de execução penhorou novamente as contas do Ministério das Finanças romeno no montante de 9197482 RON (cerca de 2000000 euros). Em 9 de março de 2015, o referido ministério transferiu voluntariamente o saldo do montante devido por força da sentença arbitral, ou seja, 472788675 RON (cerca de 106500000 euros, incluindo as custas da execução, a saber, 6028608 RON), para uma conta bloqueada aberta em nome dos cinco demandantes na arbitragem. No entanto, os beneficiários da conta apenas poderão levantar o dinheiro se a Comissão decidir que o auxílio de Estado concedido com base na sentença é compatível com o mercado interno.

39

Por ofícios de 9 e 11 de março de 2015, as autoridades romenas informaram a Comissão das penhoras efetuadas de 5 a 25 de fevereiro de 2015 e do depósito voluntário numa conta bloqueada aberta em nome dos cinco demandantes na arbitragem, representando o saldo do montante devido por força da sentença arbitral.

40

Segundo as autoridades romenas, a sentença arbitral foi integralmente cumprida.

41

Em 30 de março de 2015, a Comissão adotou a decisão impugnada.

42

A decisão impugnada tem a seguinte redação:

«Artigo 1.o

O pagamento da indemnização atribuída pelo tribunal arbitral […] na sentença arbitral […] à unidade económica única composta por Viorel Micula, Ioan Micula, […] European Food, […] Starmill, […] Multipack, European Drinks, Rieni Drinks, Scandic Distilleries, Transilvania General Import‑Export e West Leasing constitui um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, [TFUE], o qual é incompatível com o mercado interno.

Artigo 2.o

1.   A Roménia não pagará qualquer auxílio incompatível, referido no artigo 1.o, e recuperará todos os auxílios incompatíveis referidos no artigo 1.o que já tenham sido pagos às entidades, quaisquer que elas sejam, que compõem a unidade económica única que beneficiou desse auxílio na sequência do cumprimento ou da execução parcial da sentença arbitral, […] bem como qualquer auxílio pago às entidades, quaisquer que elas sejam, que compõem a unidade económica única que beneficiou desse auxílio na sequência do cumprimento ulterior da sentença arbitral […] que não tenha sido notificado à Comissão ou qualquer auxílio pago após a data em que a presente decisão foi proferida.

2.   Viorel Micula, Ioan Micula, […] European Food, […] Starmill, […] Multipack, European Drinks, Rieni Drinks, Scandic Distilleries, Transilvania General Import‑Export e West Leasing são solidariamente responsáveis pelo reembolso do auxílio de Estado que receberam.

3.   Os montantes a recuperar são os que decorrem do cumprimento ou da execução da sentença arbitral […] (montante principal e juros).

4.   Os montantes a recuperar são acrescidos de juros a contar da data em que foram postos à disposição dos beneficiários até à sua recuperação efetiva.

5.   A Roménia deve informar as datas exatas a partir das quais os auxílios de Estado foram postos à disposição dos respetivos beneficiários.

6.   Os juros são calculados numa base composta, em conformidade com o disposto no capítulo V do Regulamento (CE) n.o 794/2004 da Comissão.

7.   A Roménia deve garantir que, a partir da data em que é proferida a presente decisão, não será efetuado qualquer outro pagamento do auxílio referido no artigo 1.o

Artigo 3.o

1.   A recuperação do auxílio referido no artigo 1.o é imediata e efetiva.

2.   A Roménia deve garantir a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da sua notificação.

Artigo 4.o

1.   No prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, a Roménia deverá prestar as seguintes informações:

a)

o montante total do auxílio recebido por cada uma das entidades referidas no artigo 1.o da presente decisão;

b)

uma descrição pormenorizada das medidas já tomadas ou previstas para dar cumprimento à presente decisão;

c)

os documentos comprovativos de que os beneficiários foram notificados para reembolsar o auxílio.

2.   A Roménia informará a Comissão sobre o avanço das medidas tomadas a nível nacional para executar a presente decisão até à recuperação total do auxílio referido no artigo 1.o A pedido da Comissão, a Roménia apresentará de imediato informações sobre as medidas já tomadas e as previstas para dar cumprimento à presente decisão. Prestará, igualmente, informações pormenorizadas sobre os montantes do auxílio e juros correspondentes já recuperados aos beneficiários.

Artigo 5.o

A Roménia é a destinatária da presente decisão.»

Tramitação processual e pedidos das partes

43

Os recorrentes interpuseram os presentes recursos por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 6 (processo T‑624/15), 30 (processo T‑694/15) e 28 de novembro de 2015 (processo T‑704/15).

44

Por decisões respetivas de 18 de março e de 21 de abril de 2016 (processo T‑624/15), de 18 de março e de 22 de abril de 2016 (processo T‑694/15) e de 25 de maio e de 21 de abril de 2016 (processo T‑704/15), o presidente da Quarta Secção do Tribunal Geral admitiu a intervenção do Reino de Espanha e da Hungria em apoio dos pedidos da Comissão.

45

Em 13 e 14 de julho de 2016 (processos T‑624/15 e T‑694/15) e em 14 de julho de 2016 (processo T‑704/15), o Reino de Espanha e a Hungria apresentaram na Secretaria do Tribunal Geral os respetivos articulados de intervenção. Os recorrentes apresentaram observações sobre os mesmos nos prazos fixados.

46

Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz‑relator foi afeto à Segunda Secção, à qual os presentes processos foram, por conseguinte, atribuídos.

47

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 27 de fevereiro de 2017, os recorrentes pediram a apensação dos processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15 para efeitos da fase oral do processo. Nas observações que apresentou sobre o pedido de apensação de 14 de março de 2017, a Comissão deu o seu acordo para a apensação dos processos T‑624/15 e T‑694/15, mas opôs‑se à apensação desses dois processos ao processo T‑704/15.

48

Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 21 de fevereiro de 2017, pelos recorrentes nos processos T‑624/15 e T‑694/15 e, 4 de maio de 2017, pela Comissão nos processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15, estes pediram tratamento prioritário. Este tratamento foi‑lhes deferido por Decisão do presidente da Segunda Secção de 22 de maio de 2017.

49

Sob proposta da Segunda Secção, o Tribunal Geral decidiu, ao abrigo do artigo 28.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

50

Por Decisão do presidente da Segunda Secção alargada do Tribunal Geral de 7 de fevereiro de 2018, os processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15 foram apensados para efeitos da fase oral do processo, em conformidade com o artigo 68.o, n.o 2, do Regulamento de Processo.

51

Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) decidiu abrir a fase oral do processo.

52

As alegações das partes foram ouvidas na audiência de 20 de março de 2018.

53

Por Despacho de 28 de maio de 2018, o Tribunal Geral (Segunda Secção alargada), considerando que havia que convidar as partes principais a apresentarem observações sobre a eventual apensação dos processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15 para efeitos da decisão que põe termo à instância, ordenou a reabertura da fase oral do processo nos termos do artigo 113.o do Regulamento de Processo. As partes principais apresentaram observações no prazo fixado.

54

Os recorrentes nos processos T‑624/15 e T‑694/15 concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão impugnada;

a título subsidiário, anular a decisão impugnada na parte em que:

diz respeito a cada um deles, nesses dois processos;

impede a Roménia de executar a sentença arbitral;

ordena à Roménia a recuperação de qualquer auxílio incompatível;

ordena que os recorrentes sejam solidariamente responsáveis pelo reembolso do auxílio de Estado recebido por qualquer das entidades referidas no seu artigo 2.o, n.o 2;

condenar a Comissão nas despesas.

55

Os recorrentes no processo T‑704/15 concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão impugnada;

a título subsidiário, anular a decisão impugnada na parte em que:

qualifica Viorel Micula como «empresa» e o considera como fazendo parte da unidade económica beneficiária do auxílio;

identifica o beneficiário do auxílio como sendo uma unidade económica constituída por Viorel Micula e Ioan Micula, pela European Food, pela Starmill, pela Multipack, pela European Drinks, pela Rieni Drinks, pela Scandic Distilleries, pela Transilvania General Import‑Export e pela West Leasing International;

dispõe, no artigo 2.o, n.o 2, que Viorel Micula e Ioan Micula, a European Food, a Starmill, a Multipack, a European Drinks, a Rieni Drinks, a Scandic Distilleries, a Transilvania General Import‑Export e a West Leasing International são solidariamente responsáveis pelo reembolso do auxílio de Estado que receberam;

condenar a Comissão nas despesas.

56

Nos processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15, a Comissão, apoiada pelas intervenientes, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento aos recursos;

condenar os recorrentes nas despesas.

Questão de direito

57

Nos termos do artigo 68.o do Regulamento de Processo, os presentes processos são apensados para efeitos da decisão que põe termo à instância.

58

Os recorrentes apresentam oito fundamentos de recurso, alguns deles articulados em várias partes, os quais importa reagrupar em sete fundamentos e apresentar pela ordem seguinte: em primeiro lugar, o fundamento relativo à incompetência da Comissão para adotar a decisão impugnada e a um desvio de poder, bem como à violação do artigo 351.o TFUE e dos princípios gerais de direito; em segundo lugar, o fundamento relativo à violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE; em terceiro lugar, o fundamento relativo à violação do princípio da proteção da confiança legítima; em quarto lugar, o fundamento relativo à apreciação incorreta da compatibilidade da medida em causa com o mercado interno; em quinto lugar, o fundamento relativo à determinação incorreta dos beneficiários do auxílio e à falta de fundamentação; em sexto lugar, o fundamento relativo a um erro de direito relativo à recuperação do auxílio; e, em sétimo lugar, o fundamento relativo à violação do direito a ser ouvido, do artigo 108.o, n.o 3, TFUE e do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999.

Quanto à incompetência da Comissão e à inaplicabilidade do direito da União a uma situação anterior à adesão da Roménia

59

No âmbito da primeira parte do primeiro fundamento apresentado no processo T‑704/15, os recorrentes invocam, em substância, a incompetência da Comissão e a inaplicabilidade do direito da União a uma situação anterior à adesão da Roménia. Além disso, no âmbito da primeira parte do segundo fundamento apresentado nos processos T‑624/15 e T‑694/15, os recorrentes alegam que uma eventual vantagem foi concedida antes da adesão da Roménia à União. O Tribunal Geral entende que, com os seus argumentos, os recorrentes nos processos T‑624/15 e T‑694/15 contestam igualmente a competência da Comissão para adotar a decisão impugnada. Em todo o caso, uma vez que a questão da competência da Comissão constitui um fundamento de inadmissibilidade de ordem pública, há que conhecer dele oficiosamente (v. Acórdão de 13 de julho de 2000, Salzgitter/Comissão, C‑210/98 P, EU:C:2000:397, n.o 56 e jurisprudência referida).

60

Segundo os recorrentes, em primeiro lugar, a Comissão não era competente para adotar a decisão impugnada, uma vez que todos os atos e omissões que constituem os factos internacionalmente ilícitos, dos quais o tribunal arbitral julgou a Roménia culpada perante os recorrentes e que causaram o prejuízo indemnizado pela sentença arbitral, ocorreram antes da adesão da Roménia à União. Em segundo lugar, durante esse período, o direito da União, incluindo as regras em matéria de auxílios de Estado, não era, enquanto tal, aplicável à Roménia, e a Comissão não podia exercer coercivamente as competências que lhe eram conferidas pelo artigo 108.o TFUE e pelo Regulamento n.o 659/1999 em relação a um auxílio de Estado concedido pelas autoridades romenas. Em terceiro lugar, é indiferente que o pagamento da indemnização atribuída por factos internacionalmente ilícitos, cometidos pela Roménia num quadro jurídico aplicável antes da sua adesão à União, tenha sido efetuado, como no caso em apreço, após essa adesão.

61

A este respeito, os recorrentes no processo T‑704/15 alegam que a sentença arbitral foi proferida pelo tribunal arbitral em virtude da atuação das autoridades romenas no âmbito da revogação do DGE em 2005, as quais violaram a confiança legítima dos demandantes na arbitragem e não agiram com transparência no que respeita à revogação das medidas de incentivo ao mesmo tempo que mantinham as obrigações correspondentes dos referidos demandantes. Ora, no momento destes factos, o DGE não estava sujeito nem às regras da União em matéria de auxílios de Estado nem à competência da Comissão. A decisão impugnada parte da premissa errada de que o DGE constituía um auxílio de Estado proibido pelo direito da União.

62

Segundo os recorrentes nos processos T‑624/15 e T‑694/15, o direito incondicional a receber uma indemnização pelas violações cometidas pela Roménia e, portanto, qualquer eventual vantagem foram‑lhes concedidos ou no momento da violação, pela Roménia, do TBI resultante da anulação dos incentivos previstos pelo DGE, ou no momento da entrada em vigor do TBI, que prevê obrigações da Roménia para com os recorrentes, mas em qualquer dos casos anteriormente à adesão. Assim, qualquer pagamento efetuado com base na sentença arbitral deve ser considerado como o pagamento de um auxílio existente, nos termos do artigo 15.o, n.o 3, do Regulamento n.o 659/1999, já não podendo ser recuperado.

63

A Comissão contesta estes argumentos e responde que era efetivamente competente para adotar a decisão impugnada. Dado que a sentença arbitral foi proferida, foi parcialmente executada e será eventualmente plenamente executada após a adesão da Roménia à União, os demandantes só teriam podido obter o direito incondicional à indemnização que lhes foi atribuída por força da regulamentação nacional aplicável após a adesão da Roménia à União. O facto de o DGE nunca ter sido diretamente sujeito a análise à luz das regras da União em matéria de auxílios de Estado e de a alegada violação do TBI ter sido cometida antes dessa adesão é igualmente irrelevante para determinar a competência da Comissão no caso em apreço. A Comissão alega que, na decisão impugnada, não condenou a Roménia a recuperar os auxílios inicialmente concedidos aos demandantes na arbitragem ao abrigo do DGE. Além disso, o DGE, que foi revogado em22 de fevereiro de 2005, não pode servir de base jurídica para o pagamento da indemnização atribuída aos recorrentes. Embora estes últimos pudessem invocar um pedido contra a Roménia ao abrigo do TBI quando os incentivos previstos pelo DGE foram suprimidos, o direito incondicional à totalidade da indemnização ulteriormente atribuída só pode ter surgido após a adesão da Roménia à União.

64

Segundo a Comissão, o auxílio em causa foi efetivamente concedido posteriormente à adesão da Roménia à União, quer pela conversão da sentença arbitral, através do seu reconhecimento, em título jurídico nacional válido, quer pelo cumprimento da sentença arbitral pela Roménia.

65

Nos considerandos 130 a 140 da decisão impugnada, a Comissão analisou se a medida em causa, definida no considerando 39 da referida decisão como sendo o «pagamento da indemnização atribuída aos demandantes pelo tribunal [arbitral] em virtude do cumprimento ou da execução da sentença [arbitral], acrescidos dos juros acumulados desde a data em que a [referida] sentença foi proferida», deveria ser qualificada como auxílio novo. A este respeito, declarou que, na sequência da revogação, em 22 de fevereiro de 2005, do regime instituído pelo DGE, nenhuma outra sociedade pôde obter o direito a um auxílio ao abrigo desse regime e que, por conseguinte, o pedido de indemnização apresentado pelos recorrentes ao Estado romeno resultava apenas da «sentença arbitral juntamente com o direito nacional romeno, o qual confere a essa sentença um efeito jurídico na ordem jurídica interna da Roménia». Considerando que a sentença arbitral foi proferida e corre o risco de ser cumprida ou executada após a adesão da Roménia à União, o direito incondicional previsto na legislação nacional romena de receber a indemnização atribuída pelo tribunal arbitral só foi concedido aos recorrentes após a adesão da Roménia à União. A Comissão considerou que não era relevante o facto de nem o Ato de Adesão nem o Tratado FUE serem aplicáveis na Roménia no momento em que, como alegaram os recorrentes no âmbito do procedimento administrativo, a Roménia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do TBI, ao revogar o regime de auxílio instituído pelo DGE, ou no momento em que intentaram a ação no tribunal arbitral, uma vez que, em nenhum desses momentos, os recorrentes obtiveram um direito incondicional ao pagamento da indemnização atribuída pelo tribunal arbitral, medida essa que foi objeto de apreciação por parte da Comissão. Além disso, a Comissão observou que a sentença arbitral tinha concedido aos recorrentes um montante que correspondia às vantagens previstas no quadro do regime revogado do DGE até à data prevista para o seu termo, bem como uma indemnização pela perda da possibilidade de armazenamento do açúcar em 2009 e pelos lucros cessantes e que, durante uma grande parte, ou mesmo durante todo o período em causa, a Roménia tinha sido membro de pleno direito da União e tinha estado diretamente sujeita às regras do Tratado FUE em matéria de auxílios de Estado. Recordou também que o regime das medidas de incentivos previsto pelo DGE não foi mencionado como auxílio existente no Ato de Adesão. A Comissão concluiu desse facto que o pagamento da indemnização que o tribunal arbitral tinha atribuído aos recorrentes, quer fosse efetuado através do cumprimento ou da execução da sentença arbitral, constituía um auxílio novo e estava, por conseguinte, integralmente sujeito ao mecanismo de fiscalização dos auxílios de Estado referido nos artigos 107.o e 108.o TFUE.

66

Por força do artigo 2.o do Ato de Adesão, as disposições dos Tratados originários e os atos adotados pelas instituições antes da adesão vinculam a Roménia a partir dessa adesão e são aplicáveis nesse Estado nos termos desses Tratados e desse Ato.

67

Assim, o direito da União só se tornou aplicável na Roménia a partir da sua adesão à União em 1 de janeiro de 2007. Por conseguinte, foi só nessa data que a Comissão adquiriu a competência que lhe permite proceder à fiscalização da atuação da Roménia ao abrigo do artigo 108.o TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 20 de março de 2013, Rousse Industry/Comissão, T‑489/11, não publicado, EU:T:2013:144, n.os 63 e 64).

68

Ora, os argumentos dos recorrentes, relativos à incompetência da Comissão para adotar a decisão impugnada, assentam na premissa de que todos os factos teriam ocorrido, e qualquer eventual vantagem teria sido concedida, antes da adesão da Roménia à União. Daqui resulta que, para apreciar a procedência destes argumentos, há que definir previamente a data em que o alegado auxílio foi concedido.

69

A este respeito, importa salientar que, segundo a jurisprudência, os auxílios de Estado devem ser considerados concedidos no momento em que é conferido ao beneficiário o direito de os receber ao abrigo da legislação nacional aplicável, tendo em conta o conjunto das condições consagradas pelo direito nacional para a obtenção das mesmas (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de março de 2013, Magdeburger Mühlenwerke, C‑129/12, EU:C:2013:200, n.os 40 e 41, e de 6 de julho de 2017, Nerea, C‑245/16, EU:C:2017:521, n.o 32).

70

No caso em apreço, em primeiro lugar, segundo a decisão impugnada, o cumprimento ou a execução da sentença arbitral destinava‑se a repor a situação em que os recorrentes se encontrariam, com toda a probabilidade, se o regime previsto pelo DGE não tivesse sido anulado (considerandos 95 e 146 e nota n.o 83 da decisão impugnada).

71

Ora, resulta dos antecedentes do litígio (v. n.os 5 a 15, supra) que todos os factos associados ao DGE, a saber, a adoção do DGE pela Roménia, a obtenção dos certificados pelas sociedades recorrentes que lhes permitiu beneficiar dos incentivos previstos no referido DGE, a entrada em vigor do TBI, a revogação dos incentivos previstos no DGE e as violações cometidas pela Roménia nessa ocasião, bem como o recurso ao tribunal arbitral pelos demandantes na arbitragem, tiveram lugar antes da adesão da Roménia à União em 1 de janeiro de 2007.

72

Em segundo lugar, há que salientar a este respeito que, na sentença arbitral, o tribunal arbitral concluiu que, ao revogar os incentivos previstos pelo DGE antes de 1 de abril de 2009, a Roménia, por um lado, tinha violado a confiança legítima dos demandantes na arbitragem e, por outro, não tinha atuado com transparência para com os mesmos. Por conseguinte, a revogação dos incentivos previstos pelo DGE constitui o facto gerador do prejuízo para cujo ressarcimento a indemnização em causa foi atribuída aos recorrentes na sentença arbitral.

73

Como resulta do considerando 146 e da nota n.o 83 da decisão impugnada, a sentença arbitral visava, assim, compensar «retroativamente» a revogação do DGE em 2005, ou seja, que os efeitos de indemnização por si estabelecida valessem para o passado.

74

Daqui resulta que, na sentença arbitral, o tribunal arbitral se limitou a determinar o prejuízo exato sofrido pelos recorrentes com a revogação do DGE e calculou o montante da indemnização correspondente a um direito ao ressarcimento dos danos constituído no momento das violações cometidas pela Roménia em 2005.

75

Daqui resulta que o direito a receber a indemnização, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 69, se constituiu no momento em que a Roménia revogou as iniciativas previstas pelo DGE em 2005. Contrariamente ao que a Comissão declarou, nomeadamente, no considerando 134 da decisão impugnada, o direito a receber a indemnização atribuída pelo tribunal arbitral não foi, portanto, concedido aos recorrentes apenas após a adesão da Roménia à União (v. n.o 65, supra).

76

Em terceiro lugar, é verdade que a sentença arbitral, que declara as violações cometidas pela Roménia aquando da revogação do DGE e que determina a indemnização a pagar aos recorrentes a este título, foi proferida em 2013 e, portanto, posteriormente à referida adesão.

77

No entanto, como foi salientado no n.o 74, supra, o tribunal arbitral limitou‑se a determinar o prejuízo exato sofrido pelos recorrentes com as violações cometidas pela Roménia em 2005. Assim, uma vez que a sentença arbitral representa apenas um elemento acessório da indemnização em causa e não é, enquanto tal, cindível das medidas de incentivos fiscais anteriores, não pode ser qualificada de novo auxílio e fundamentar a competência da Comissão e a aplicabilidade do direito da União para todos os acontecimentos passados, a saber, os factos que estão na origem dos litígios que sejam anteriores à adesão da Roménia à União (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 20 de março de 2013, Rousse Industry/Comissão, T‑489/11, não publicado, EU:T:2013:144, n.o 55 e jurisprudência referida, confirmado em sede de recurso pelo Acórdão de 20 de março de 2014, Rousse Industry/Comissão, C‑271/13 P, não publicado, EU:C:2014:175).

78

Em face do exposto, há que concluir que o direito dos recorrentes a receber a indemnização em causa se constituiu e começou a produzir efeitos no momento em que a Roménia revogou o DGE 24, ou seja, antes da adesão da Roménia à União, e, portanto, que o momento em que este direito foi conferido aos recorrentes, na aceção da jurisprudência referida no n.o 69, supra, é anterior à adesão. Com efeito, por um lado, a sentença arbitral é apenas o reconhecimento deste direito e, por outro, os pagamentos efetuados em 2014 representam apenas a execução do referido direito, constituído em 2005.

79

Ora, uma vez que o direito da União e, mais concretamente, os artigos 107.o e 108.o TFUE não eram aplicáveis na Roménia antes da sua adesão à União (v., neste sentido, Acórdão de 1 de outubro de 2015, Electrabel e Dunamenti Erőmű/Comissão, C‑357/14 P, EU:C:2015:642, n.o 64 e jurisprudência referida), a Comissão não podia exercer as competências que lhe eram conferidas pelo artigo 108.o TFUE e não podia, nomeadamente, sancionar os incentivos previstos no DGE para o período anterior à referida adesão. Com efeito, foi só a partir dessa data que a Comissão adquiriu a competência que lhe permite proceder à fiscalização da atuação da Roménia ao abrigo do artigo 108.o TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 20 de março de 2013, Rousse Industry/Comissão, T‑489/11, não publicado, EU:T:2013:144, n.o 63, confirmado em sede de recurso pelo Acórdão de 20 de março de 2014, Rousse Industry/Comissão, C‑271/13 P, não publicado, EU:C:2014:175).

80

Além disso, há que precisar, à semelhança do que fazem os recorrentes, que o facto de a indemnização ter sido paga posteriormente à referida adesão não é relevante neste âmbito, uma vez que esses pagamentos, efetuados em 2014, representam a execução de um direito constituído em 2005.

81

Em quarto lugar, a Comissão definiu o objeto da medida em causa como sendo o «pagamento da indemnização atribuída aos demandantes pelo tribunal [arbitral] em virtude do cumprimento ou da execução da sentença [arbitral], acrescidos dos juros acumulados desde a data em que a [referida] sentença foi proferida» (considerando 39 da decisão impugnada).

82

Ora, importa salientar que, embora, na decisão impugnada, a Comissão não se tenha pronunciado expressamente sobre a legalidade do DGE, resulta, nomeadamente, dos considerandos 24, 25, 95 e 146 da decisão impugnada que a mesma considerou que o pagamento da indemnização atribuída aos recorrentes pelo tribunal arbitral era incompatível com o direito da União, uma vez que tinha por objetivo repor os incentivos contrários ao direito da União que o DGE previa. Assim, resulta claramente da decisão impugnada que a Comissão estabeleceu uma associação direta entre esse pagamento e o regime de incentivos previsto pelo DGE e que a conclusão da Comissão segundo a qual o pagamento da indemnização constituía um auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, estava subjacente à ideia de que os próprios incentivos previstos no DGE eram incompatíveis com o direito da União.

83

Segundo jurisprudência constante, uma norma nova é, em princípio, imediatamente aplicável aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior (v. Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Freistaat Sachsen, C‑334/07 P, EU:C:2008:709, n.o 43 e jurisprudência referida).

84

Ora, no caso em apreço, dada a natureza específica da sentença arbitral, que resulta, designadamente, do considerando 146 da decisão impugnada, não se pode considerar que os efeitos dessa sentença constituam os efeitos futuros de uma situação nascida antes da adesão, na aceção da jurisprudência referida no n.o 83, supra, uma vez que esta produziu, retroativamente, efeitos definitivamente adquiridos, que mais não fez do que «declarar» em relação ao passado, ou seja, efeitos que, em parte, já se tinham produzido antes da adesão.

85

Com efeito, no considerando 146 da decisão impugnada, a Comissão considerou que «o cumprimento da sentença [arbitral] rep[unha] a situação em que os demandantes se encontrariam, com toda a probabilidade, se o [DGE] nunca tivesse sido anulado pela Roménia [e que isso] constitu[ía] um auxílio ao funcionamento».

86

Todavia, tendo os incentivos previstos pelo DGE sido revogados em 2005 e, portanto, antes da adesão da Roménia à União, a Comissão não era de modo nenhum competente para apreciar o seu caráter alegadamente ilegal à luz do direito da União, pelo menos no que respeita ao período anterior à adesão. Do mesmo modo, uma vez que o direito à indemnização em causa se constituiu no momento dessa revogação (v. n.o 75, supra), a Comissão também não podia pronunciar‑se sobre a sua compatibilidade nesse mesmo período.

87

A este respeito, há que sublinhar que, no caso em apreço, o tribunal arbitral não estava obrigado a aplicar o direito da União aos factos ocorridos antes da adesão, sobre os quais foi chamado a pronunciar‑se, contrariamente ao que se verificava no processo que deu lugar ao Acórdão de 6 de março de 2018, Achmea (C‑284/16, EU:C:2018:158, n.os 38 a 41).

88

Além disso, dado que todos os factos tomados em consideração pelo tribunal arbitral ocorreram antes dessa adesão, a sentença arbitral não pode ter por efeito tornar a Comissão competente e o direito da União aplicável a esses factos anteriores, na medida em que produziram os seus efeitos antes da referida adesão (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 10 de janeiro de 2006, Ynos, C‑302/04, EU:C:2006:9, n.os 25 e 36).

89

Como a Comissão salientou no considerando 135 da decisão impugnada, resulta da sentença arbitral que os montantes concedidos para ressarcimento do dano resultante das violações cometidas pela Roménia foram calculados pelo tribunal arbitral relativamente ao período compreendido entre a data da revogação do DGE, 22 de fevereiro de 2005, e a data prevista para o termo do respetivo prazo, 1 de abril de 2009. Este período abrange, é certo, 27 meses durante os quais a Roménia já era membro da União, bem como a possibilidade de armazenamento do açúcar em 2009 e o lucro cessante relativamente ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2005 e 31 de agosto de 2011.

90

Importa, contudo, declarar que os montantes concedidos para o ressarcimento do dano do período anterior à adesão da Roménia à União, a saber, o período compreendido entre 22 de fevereiro de 2005 e 31 de dezembro de 2006, não podem constituir um auxílio de Estado na aceção do direito da União. Por conseguinte, aplicando a jurisprudência recordada nos n.os 69, 79 e 88, supra, há que declarar que a Comissão exerceu retroativamente as suas competências a respeito de uma situação anterior à adesão da Roménia à União, pelo menos no que respeita a esses montantes.

91

Além disso, no que respeita aos montantes concedidos para o ressarcimento do dano do período posterior à adesão da Roménia à União, a saber, o período compreendido entre 1 de janeiro de 2007 e 1 de abril de 2009, mesmo pressupondo que o pagamento da indemnização e dos juros relativos a esse período possa ser qualificado de auxílio incompatível, dado que a Comissão não fez qualquer distinção entre os períodos de ressarcimento do prejuízo sofrido pelos demandantes antes ou depois da adesão, a mesma excedeu, em qualquer dos casos, as suas competências em matéria de fiscalização dos auxílios de Estado.

92

Em face do exposto, há que concluir que, ao adotar a decisão impugnada, a Comissão aplicou retroativamente as competências que detinha nos termos do artigo 108.o TFUE e do Regulamento n.o 659/1999 a factos anteriores à adesão da Roménia à União. Por conseguinte, a Comissão não podia qualificar a medida em causa como auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

93

Em consequência, a primeira parte do primeiro fundamento, apresentada no processo T‑704/15, e a primeira parte do segundo fundamento, apresentada nos processos T‑624/15 e T‑694/15, devem ser julgados procedentes.

Quanto ao erro na qualificação como vantagem e como auxílio, na aceção do artigo 107.o TFUE, na sentença arbitral

94

No âmbito da segunda parte do segundo fundamento, apresentada nos processos T‑624/15 e T‑694/15, e da primeira parte do segundo fundamento, apresentada no processo T‑704/15, os recorrentes alegam que a sentença arbitral não lhes confere uma vantagem económica, mas se destina apenas a indemnizar o prejuízo que sofreram. A este respeito, alegam que a referida sentença não repõe o DGE, mas lhes concede uma indemnização fundada no incumprimento, por parte da Roménia, das suas obrigações previstas pelo TBI e, nomeadamente, pelo facto de esta ter mantido as obrigações correspondentes dos investidores quando os incentivos tinham sido revogados. Os recorrentes, que inicialmente solicitaram ao tribunal arbitral a reposição do DGE, alteraram expressamente os seus pedidos nesse sentido. A Comissão concentrou‑se, erradamente, sobre a forma como o tribunal arbitral calculou a indemnização e não sobre a razão da sua atribuição. Este cálculo da indemnização não é relevante no caso em apreço. Além disso, a Comissão não tem competência para reanalisar uma indemnização por desaprovar o método de cálculo escolhido. De qualquer modo, a Comissão não demonstrou que os montantes atribuídos correspondiam ao montante exato dos reembolsos e isenções que os recorrentes obtiveram por força do DGE relativamente ao período em causa e que, portanto, a sentença arbitral efetivamente repôs esse regime. Assim, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (Acórdão de 27 de setembro de 1988, Asteris e o., 106/87 a 120/87, EU:C:1988:457), a execução da sentença arbitral não lhes confere uma vantagem, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

95

Além disso, a sentença arbitral não tem por efeito indemnizar os recorrentes pela supressão de uma medida de auxílio de Estado incompatível. A Comissão parte da premissa errada de que o DGE constituía um auxílio de Estado proibido pelo direito da União. Os recorrentes alegam que, no momento dos factos contemplados pela sentença arbitral, o DGE não estava sujeito às regras da União em matéria de auxílios de Estado e que a Comissão tenta exercer retroativamente as suas competências sobre os referidos factos. De qualquer modo, segundo os recorrentes, estaria em causa uma vantagem obtida «em condições normais de mercado», uma vez que o pagamento seria a consequência automática da condenação decidida pela sentença arbitral. Por último, a posição segundo a qual o TBI padece de nulidade está errada.

96

A Comissão, apoiada pelo Reino de Espanha, contesta estes argumentos. Em sua opinião, é manifesto que o pagamento da indemnização atribuída na sequência de uma decisão favorável aos recorrentes, que corresponde aos montantes previstos pelo auxílio ilícito e ilegal equacionado, constitui, em si mesmo, a concessão indireta de um auxílio de Estado. A este respeito, a Comissão precisa que nunca afirmou que a sentença arbitral repunha de jure o DGE, tendo antes concluído na decisão impugnada que a referida sentença repunha de facto os incentivos previstos pelo DGE, uma vez que a sentença arbitral se limitava a recolocar os demandantes na arbitragem na situação em que se encontrariam, com toda a probabilidade, se o DGE não tivesse sido revogado em 2005. O tribunal arbitral evocou o nexo de causalidade entre a violação do TBI e a indemnização atribuída referindo‑se exclusivamente à supressão dos incentivos previstos pelo DGE, mas não mencionou nenhum prejuízo que resultaria da manutenção das obrigações dos investidores ou da falta de transparência. O caso em apreço é fundamentalmente diferente do do processo que deu origem ao Acórdão de 27 de setembro de 1988, Asteris e o. (106/87 a 120/87, EU:C:1988:457).

97

O Reino de Espanha acrescenta que a indemnização em causa constitui efetivamente um auxílio de Estado, uma vez que houve recurso ao tribunal arbitral pouco depois da revogação do DGE e que o próprio cálculo da compensação foi efetuado segundo um método muito semelhante ao que estava previsto no referido DGE. É precisamente a revogação antecipada desse regime que está fundamentalmente na origem de todo o litígio. Por outro lado, nenhum particular tem um direito individual a um auxílio de Estado, independentemente da sua forma e da questão de saber se o Estado lho concedeu anteriormente.

98

No considerando 95 da decisão impugnada, a Comissão concluiu o seguinte:

«[É] evidente que, ao dar cumprimento ou ao executar a sentença, a Roménia concede aos demandantes [na arbitragem] um montante que corresponde precisamente às vantagens previstas no âmbito do regime anulado do [DGE] para o período compreendido entre o momento da revogação do Despacho correspondente (22 de fevereiro de 2005) e a data prevista para o termo do regime (1 de abril de 2009). Mais precisamente, o cumprimento ou a execução da sentença significam um reembolso de facto do montante equivalente aos direitos aduaneiros cobrados pelo açúcar e outras matérias‑primas importadas durante o período compreendido entre 22 de fevereiro de 2005 e 31 de março de 2009, bem como do montante equivalente aos direitos aduaneiros cobrados pelo açúcar importado que os demandantes [na arbitragem] teriam evitado se tivessem tido a possibilidade de armazenar o açúcar antes da data prevista para a caducidade das facilidades concedidas por força [do DGE], ou seja, 31 de março de 2009. Além disso, para garantir que os demandantes [na arbitragem] beneficiam plenamente de um montante equivalente ao do regime anulado e que «se encontram na situação em que se encontrariam “com toda a probabilidade”», o tribunal arbitral concedeu igualmente juros e uma indemnização pelos lucros cessantes presumidos devido à perda de oportunidades e de lucro. Com efeito, o cumprimento ou a execução da sentença repõe a situação em que os demandantes [na arbitragem] se encontrariam, com toda a probabilidade, caso o regime previsto pela [DGE] nunca tivesse sido anulado.»

99

A Comissão observou igualmente, no considerando 99 da decisão impugnada, que, «na justificação da sua decisão de conceder uma indemnização pelo aumento dos preços, pela perda da capacidade de armazenagem e pelo lucro cessante, o tribunal [arbitral] [fez] apenas referência aos prejuízos sofridos pelos demandantes na sequência da revogação dos incentivos previstos pelo [DGE]».

100

A este respeito, o artigo 107.o, n.o 1, TFUE dispõe que, «[s]alvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções».

101

Segundo jurisprudência constante, a qualificação de «auxílio», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, requer que todos os requisitos estabelecidos nesta disposição estejam preenchidos. Assim, em primeiro lugar, deve ser tratar‑se de uma intervenção do Estado ou proveniente de recursos estatais. Em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem ao seu beneficiário. Em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (v. Acórdão de 16 de julho de 2015, BVVG, C‑39/14, EU:C:2015:470, n.os 23 e 24 e jurisprudência referida).

102

O conceito de auxílio de Estado, tal como definido no Tratado FUE, é um conceito jurídico e deve ser interpretado com base em elementos objetivos. Por esta razão, o juiz da União deve, em princípio e tendo em conta tanto os elementos concretos do litígio que lhe foi submetido, como o caráter técnico ou complexo das apreciações feitas pela Comissão, exercer uma fiscalização integral relativamente à questão de saber se uma medida entra no âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (v. Acórdão de 21 de junho de 2012, BNP Paribas e BNL/Comissão, C‑452/10 P, EU:C:2012:366, n.o 100 e jurisprudência referida).

103

Além disso, a indemnização de um prejuízo sofrido não pode ser considerada um auxílio, salvo se conduzir à indemnização da revogação de um auxílio ilegal ou incompatível (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 1988, Asteris e o., 106/87 à 120/87, EU:C:1988:457, n.os 23 e 24), como recorda a Comissão no considerando 104 da decisão impugnada. Este considerando 104 confirma que a Comissão considera que a sentença arbitral é um auxílio incompatível, uma vez que indemniza a revogação de uma medida que considera ser um auxílio incompatível com o direito da União.

104

Todavia, resulta da análise da primeira parte do primeiro fundamento apresentado no processo T‑704/15 e da primeira parte do segundo fundamento apresentado nos processos T‑624/15 e T‑694/15 que o direito da União não se aplica à indemnização por revogação do DGE, pelo menos em relação ao período anterior à adesão, uma vez que a sentença arbitral, que declarou a existência de um direito à indemnização constituído em 2005, não teve por efeito desencadear a aplicabilidade do direito da União e da competência da Comissão para esse período anterior.

105

Por conseguinte, a indemnização por revogação do regime do DGE, pelo menos para os montantes correspondentes ao período compreendido entre 22 de fevereiro de 2005 e 1 de janeiro de 2007, não pode ser considerada uma indemnização por revogação de um auxílio ilegal ou incompatível com o direito da União.

106

Na medida em que o direito da União não se aplica à indemnização por revogação do DGE, pelo menos no que respeita ao período anterior à adesão, os recorrentes podem, pelo menos relativamente a esse período, invocar o Acórdão de 27 de setembro de 1988, Asteris e o. (106/87 a 120/87, EU:C:1988:457).

107

Todavia, resulta da análise da primeira parte do primeiro fundamento apresentado no processo T‑704/15 e da primeira parte do segundo fundamento apresentado nos processos T‑624/15 e T‑694/15 que a Comissão não é competente e que o direito da União não se aplica ao regime do DGE, à sua revogação e à indemnização dessa revogação, uma vez que a sentença arbitral, que declarou a existência de um direito à indemnização em 2013, não teve por efeito desencadear a aplicabilidade do direito da União e da competência da Comissão às medidas de incentivos fiscais anteriores do DGE e, portanto, à indemnização em causa, que deles é a consequência.

108

Assim, uma vez que a indemnização em questão abrangia, pelo menos em parte, um período anterior à adesão (compreendido entre 22 de fevereiro de 2005 e 1 de janeiro de 2007) e que a Comissão não distinguiu, dentre os montantes a recuperar, os que fazem parte do período anterior à adesão e os relativos ao período posterior à adesão, a decisão pela qual qualificou como auxílio a totalidade da indemnização está necessariamente ferida de ilegalidade.

109

Daqui resulta que a decisão impugnada está ferida de ilegalidade na medida em que qualificou como vantagem e como auxílio, na aceção do artigo 107.o TFUE, a atribuição, pelo tribunal arbitral, de uma indemnização destinada a ressarcir os danos resultantes da revogação de medidas de incentivos fiscais, pelo menos relativamente ao período anterior à data de entrada em vigor do direito da União na Roménia.

110

Por conseguinte, há igualmente que julgar procedente a segunda parte do segundo fundamento, apresentada nos processos T‑624/15 e T‑694/15, e a primeira parte do segundo fundamento, apresentada no processo T‑704/15.

111

Em face do exposto, a decisão impugnada deve ser anulada na íntegra, sem que seja necessário examinar as outras partes destes fundamentos nem os demais fundamentos.

Quanto às despesas

112

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

113

Tendo a Comissão ficado vencida, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pelos recorrentes, em conformidade com os pedidos destes.

114

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Por conseguinte, o Reino de Espanha e a Hungria suportarão as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada)

decide:

 

1)

Os processos T‑624/15, T‑694/15 e T‑704/15 são apensados para efeitos do acórdão.

 

2)

É anulada a Decisão (UE) 2015/1470 da Comissão, de 30 de março de 2015, relativa ao auxílio estatal SA.38517 (2014/C) (ex 2014/NN) aplicado pela Roménia — Sentença arbitral Micula contra Roménia, de 11 de dezembro de 2013.

 

3)

A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas suportadas por European Food SA, Starmill SRL, Multipack SRL, Scandic Distilleries SA, MM. Ioan e Viorel Micula, European Drinks SA, Rieni Drinks SA, Transilvania General Import‑Export SRL e West Leasing International SRL.

 

4)

O Reino de Espanha e a Hungria suportarão as suas próprias despesas.

 

Prek

Buttigieg

Schalin

Berke

Costeira

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 18 de junho de 2019.

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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