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Document 62015CJ0535

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 27 de abril de 2017.
Freie und Hansestadt Hamburg contra Jost Pinckernelle.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht.
Reenvio prejudicial — Registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas — Regulamento (CE) n.o 1907/2006 (Regulamento REACH) — Obrigação geral de registo e requisitos de informação — Substâncias químicas não registadas — Exportação para fora do território da União Europeia de substâncias químicas não registadas.
Processo C-535/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:315

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

27 de abril de 2017 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas — Regulamento (CE) n.o 1907/2006 (Regulamento REACH) — Obrigação geral de registo e requisitos de informação — Substâncias químicas não registadas — Exportação para fora do território da União Europeia de substâncias químicas não registadas»

No processo C‑535/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal, Alemanha), por decisão de 10 de setembro de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 14 de outubro de 2015, no processo

Freie und Hansestadt Hamburg

contra

Jost Pinckernelle,

sendo interveniente:

Vertreter des Bundesinteresses beim Bundesverwaltungsgericht,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: L. Bay Larsen (relator), presidente de secção, M. Vilaras, J. Malenovský, M. Safjan e D. Šváby, juízes,

advogado‑geral: E. Tanchev,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 28 de setembro de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Freie und Hansestadt Hamburg, por M. Vogelsang, Rechtsanwalt,

em representação de J. Pinckernelle, por A. Anisic, Rechtsanwältin,

em representação do Governo alemão, por T. Henze, J. Möller e K. Petersen, na qualidade de agentes,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por M. Russo, avvocato dello Stato,

em representação da Comissão Europeia, por T. Maxian Rusche e D. Kukovec, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 21 de dezembro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas (REACH), que cria a Agência Europeia dos Produtos Químicos, que altera a Diretiva 1999/45/CE e revoga o Regulamento (CEE) n.o 793/93 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 1488/94 da Comissão, bem como a Diretiva 76/769/CEE do Conselho e as Diretivas 91/155/CEE, 93/67/CEE, 93/105/CE e 2000/21/CE da Comissão (JO 2006, L 396, p. 1; retificação no JO 2007, L 136, p. 3, a seguir «Regulamento REACH»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Freie und Hansestadt Hamburg (Cidade Livre e Hanseática de Hamburgo, Alemanha, a seguir «cidade de Hamburgo») a Jost Pinckernelle, a respeito da exportação para fora do território da União Europeia de substâncias químicas que tinham sido importadas para esse território sem terem sido registadas em conformidade, nomeadamente, com o artigo 5.o do Regulamento REACH.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos 1 a 3 e 7 do Regulamento REACH têm a seguinte redação:

«(1)

O presente regulamento tem por objetivo assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana e do ambiente e garantir a livre circulação das substâncias — estremes ou contidas em preparações ou em artigos —, reforçando simultaneamente a competitividade e a inovação. […]

(2)

O funcionamento eficaz do mercado interno das substâncias só poderá ser concretizado se os requisitos aplicáveis às substâncias não diferirem significativamente entre Estados‑Membros.

(3)

Deve ser assegurado um elevado nível de proteção da saúde humana e do ambiente na aproximação das disposições legislativas relativas a substâncias, com o intuito de atingir o desenvolvimento sustentável. Essas disposições deverão ser aplicadas de forma não discriminatória, quer as substâncias sejam comercializadas no mercado interno, quer a nível internacional, de acordo com os compromissos internacionais da Comunidade.

[…]

(7)

Para preservar a integridade do mercado interno e assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana, especialmente da saúde dos trabalhadores e do ambiente, é necessário garantir que o fabrico de substâncias na Comunidade esteja em conformidade com a legislação comunitária, mesmo se forem exportadas.»

4

O artigo 1.o deste regulamento, sob a epígrafe «Objetivo e âmbito de aplicação», dispõe, no seu n.o 1:

«O presente regulamento tem por objetivo assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana e do ambiente, incluindo a promoção do desenvolvimento de métodos alternativos de avaliação dos perigos das substâncias, e garantir a livre circulação das substâncias no mercado interno, reforçando simultaneamente a competitividade e a inovação.»

5

O artigo 2.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Aplicação», prevê, no seu n.o 7, alínea c), i):

«Estão isentas do disposto nos títulos II, V e VI:

[…]

c)

As substâncias — estremes ou contidas em preparações — registadas em conformidade com o título II, exportadas da Comunidade por um agente da cadeia de abastecimento e reimportadas para a Comunidade por esse ou outro agente da mesma cadeia de abastecimento, que demonstre que:

i)

a substância reimportada é a mesma que foi exportada,

[…]»

6

O artigo 3.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Definições», tem a seguinte redação:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

9)

Fabricante: qualquer pessoa singular ou coletiva estabelecida na Comunidade que fabrique uma substância dentro da Comunidade;

10)

Importação: a introdução física no território aduaneiro da Comunidade;

11)

Importador: qualquer pessoa singular ou coletiva estabelecida na Comunidade que seja responsável pela importação;

12)

Colocação no mercado: o fornecimento ou a disponibilização a terceiros, mediante pagamento ou gratuitamente. A importação é considerada uma colocação no mercado;

[…]

21)

Substância notificada: uma substância em relação à qual foi apresentada uma notificação e que pode ser colocada no mercado de acordo com a Diretiva 67/548/CEE [do Conselho, de 27 de junho de 1967, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes à classificação, embalagem e rotulagem das substâncias perigosas (JO 1967, L 196, p. 1; EE 13 F1 p. 50)].»

7

Nos termos do artigo 5.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Ausência de dados, ausência de mercado»:

«Sem prejuízo do disposto nos artigos 6.°, 7.°, 21.° e 23.°, as substâncias estremes ou contidas em preparações ou em artigos não são fabricadas na Comunidade nem colocadas no mercado a não ser que tenham sido registadas de acordo com as disposições aplicáveis do presente título sempre que exigido.»

8

O artigo 6.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Obrigação geral de registo das substâncias estremes ou contidas em preparações», dispõe, no seu n.o 1:

«Salvo disposição em contrário prevista no presente regulamento, o produtor ou o importador de uma substância, estreme ou contida numa ou várias preparações em quantidades iguais ou superiores a uma tonelada por ano, apresenta um registo à Agência [Europeia dos Produtos Químicos (a seguir “Agência”)].»

9

O artigo 7.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Obrigação geral de registo das substâncias estremes ou contidas em artigos», prevê, no seu n.o 1:

«O produtor ou importador de artigos apresenta à Agência um registo para cada substância contida nesses artigos caso se verifiquem ambas as condições seguintes:

a)

A substância está presente nos artigos em quantidades que perfazem mais de uma tonelada por produtor ou importador por ano;

b)

A substância destina‑se a ser libertada em condições de utilização normais ou razoavelmente previsíveis.

A apresentação do registo faz‑se acompanhar da taxa estabelecida em conformidade com o título IX.»

10

O artigo 21.o deste regulamento, sob a epígrafe «Fabrico e importação de substâncias», dispõe, no seu n.o 1:

«Sem prejuízo do disposto no n.o 8 do artigo 27.o, o registante pode iniciar ou prosseguir o fabrico ou a importação de uma substância ou a produção ou importação de um artigo se, nas três semanas seguintes à data de apresentação, a Agência não tiver dado indicação em contrário nos termos do n.o 2 do artigo 20.o

No caso do registo de substâncias de integração progressiva, e sem prejuízo do disposto no n.o 8 do artigo 27.o, esse registante pode prosseguir o fabrico ou a importação de uma substância ou a produção ou importação de um artigo se, nas três semanas seguintes à data de registo, a Agência não tiver dado indicação em contrário nos termos do n.o 2 do artigo 20.o ou, quando a apresentação tenha sido efetuada nos dois meses que antecedem imediatamente o fim do prazo aplicável previsto no artigo 23.o, se, nos três meses seguintes ao fim desse prazo, a Agência não tiver dado indicação em contrário nos termos do n.o 2 do artigo 20.o

No caso de uma atualização do registo de acordo com o artigo 22.o, e sem prejuízo do disposto no n.o 8 do artigo 27.o, o registante pode prosseguir o fabrico ou a importação da substância ou a produção ou importação do artigo se, nas três semanas seguintes à data de atualização, a Agência não tiver dado indicação em contrário nos termos do n.o 2 do artigo 20.o»

11

O artigo 23.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Disposições específicas para as substâncias de integração progressiva», tem a seguinte redação:

«1.   Os artigos 5.° e 6.°, o n.o 1 do artigo 7.o e os artigos 17.°, 18.° e 21.° não se aplicam às seguintes substâncias até 1 de dezembro de 2010:

a)

Substâncias de integração progressiva classificadas como cancerígenas, mutagénicas ou tóxicas para a reprodução das categorias 1 ou 2, de acordo com a Diretiva 67/548/CEE, e fabricadas na Comunidade ou importadas, em quantidades iguais ou superiores a 1 tonelada por ano por fabricante ou por importador, pelo menos uma vez após 1 de junho de 2007;

b)

Substâncias de integração progressiva classificadas como “muito tóxicas para os organismos aquáticos, podendo causar efeitos adversos a longo prazo no ambiente aquático” […], e fabricadas na Comunidade ou importadas, em quantidades iguais ou superiores a 100 toneladas por ano por fabricante ou por importador, pelo menos uma vez após 1 de junho de 2007;

c)

Substâncias de integração progressiva fabricadas na Comunidade ou importadas em quantidades iguais ou superiores a 1000 toneladas por ano por fabricante ou por importador, pelo menos uma vez após 1 de junho de 2007.

2.   Os artigos 5.° e 6.°, o n.o 1 do artigo 7.o e os artigos 17.°, 18.° e 21.° não se aplicam, até 1 de junho de 2013, às substâncias de integração progressiva fabricadas na Comunidade ou importadas, em quantidades iguais ou superiores a 100 toneladas por ano por fabricante ou por importador, pelo menos uma vez após 1 de junho de 2007.

3.   […] até 1 de junho de 2018, […]

4.   Sem prejuízo dos n.os 1 a 3, os registos podem ser apresentados em qualquer altura antes do respetivo prazo.

5.   O presente artigo aplica‑se igualmente às substâncias registadas nos termos do artigo 7.o, com as devidas adaptações.»

12

Nos termos do artigo 28.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Obrigação de pré‑registo das substâncias de integração progressiva»:

«1.   Para beneficiar do regime transitório previsto no artigo 23.o, cada potencial registante de uma substância de integração progressiva em quantidades iguais ou superiores a uma tonelada por ano, incluindo, sem restrições, as substâncias intermédias, apresenta à Agência todas as informações seguintes:

[…]

2.   As informações a que se refere o n.o 1 devem ser apresentadas durante um período compreendido entre 1 de junho de 2008 e 1 de dezembro de 2008.

3.   Aos registantes que não apresentarem as informações exigidas no n.o 1 não pode aplicar‑se o artigo 23.o

[…]»

13

O artigo 31.o deste regulamento, sob a epígrafe «Requisitos aplicáveis às fichas de dados de segurança», dispõe, no seu n.o 5:

«A ficha de dados de segurança deve ser fornecida nas línguas oficiais do(s) Estado(s)‑Membro(s) interessado(s) onde a substância ou preparação é colocada no mercado, salvo disposição em contrário desse(s) Estado(s)‑Membro(s).»

14

O artigo 112.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», que figura no seu título XI, designado «Inventários de classificação e rotulagem», prevê:

«O disposto no presente título aplica‑se:

[…]

b)

Às substâncias abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 1.o da Diretiva 67/548/CEE, que satisfaçam os critérios de classificação como perigosas de acordo com essa diretiva e que sejam colocadas no mercado, estremes ou contidas numa preparação, acima dos limites de concentração especificados na Diretiva 1999/45/CE se for caso disso, resultando na classificação da preparação como perigosa.»

15

Nos termos do artigo 126.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Sanções por não cumprimento»:

«Os Estados‑Membros estabelecem disposições relativas às sanções aplicáveis em caso de infração ao disposto no presente regulamento e tomam todas as medidas necessárias para garantir a sua aplicação. […]»

16

O artigo 129.o deste regulamento, sob a epígrafe «Cláusula de salvaguarda», enuncia, nos seus n.os 2 e 3:

«2.   A Comissão toma uma decisão nos termos do n.o 3 do artigo 133.o, no prazo de sessenta dias a contar da receção da informação do Estado‑Membro. Essa decisão:

a)

Autoriza a medida provisória por um período definido na decisão; ou

b)

Exige que o Estado‑Membro revogue a medida provisória.

3.   Se, no caso de uma decisão como a referida na alínea a) do n.o 2, a medida provisória tomada pelo Estado‑Membro consistir numa restrição à colocação no mercado ou à utilização da substância, o Estado‑Membro em causa dá início a um procedimento comunitário de restrição apresentando um dossiê à Agência, em conformidade com o Anexo XV, no prazo de três meses a contar da data da decisão da Comissão.»

17

O Anexo XV do Regulamento REACH define, nos seus próprios termos, os princípios gerais para a preparação de dossiês destinados a propor e justificar, nomeadamente, as restrições de fabrico, colocação no mercado ou utilização de uma substância na Comunidade.

Direito alemão

18

A Gesetz zum Schutz vor gefährlichen Stoffen (Chemikaliengesetz) (Lei sobre a proteção contra as substâncias perigosas, designada por lei sobre os produtos químicos), na versão da comunicação de 28 de agosto de 2013 (BGBl. I, pp. 3498, 3991), prevê, no seu § 27b, sob a epígrafe «Violações do Regulamento [REACH]», que «[q]uem viole o disposto no Regulamento [REACH] é punido com pena de prisão até dois anos ou pena de multa».

Litígio no processo principal e questão prejudicial

19

J. Pinckernelle comercializa produtos químicos.

20

Depois de 1 de dezembro de 2008, importou da China pelo menos 19,4 toneladas de sulfato de nicotina, sem ter procedido ao registo prévio exigido em aplicação do artigo 28.o do Regulamento REACH.

21

Não tendo também procedido ao registo deste produto em aplicação do artigo 6.o deste regulamento, a cidade de Hamburgo decidiu que J. Pinckernelle apenas tinha o direito de utilizar o referido produto ou de o colocar no mercado após ter obtido uma autorização para a utilização pretendida.

22

J. Pinckernelle requereu autorização para exportar este produto para a Rússia, o que a cidade de Hamburgo recusou atendendo ao facto de tal produto se encontrar ilegalmente em Hamburgo. A cidade de Hamburgo indeferiu também a reclamação apresentada por J. Pinckernelle da decisão de indeferimento.

23

Consequentemente, J. Pinckernelle interpôs recurso do indeferimento da reclamação para o Verwaltungsgericht Hamburg (Tribunal Administrativo de Hamburgo, Alemanha), que lhe negou provimento.

24

No âmbito do recurso interposto por J. Pinckernelle, o Oberverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Superior, Alemanha) anulou, em 25 de fevereiro de 2014, a decisão do Verwaltungsgericht Hamburg (Tribunal Administrativo de Hamburgo) e intimou a cidade de Hamburgo a autorizar J. Pinckernelle a proceder à exportação requerida do sulfato de nicotina.

25

O Oberverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Superior) fundamentou o seu acórdão considerando que, em qualquer caso, a exportação pretendida de uma substância importada em violação do artigo 5.o do Regulamento REACH não podia constituir uma nova violação do artigo 3.o, n.o 12, em conjugação com o artigo 5.o deste regulamento, se a substância em causa — como no caso em apreço — não estivesse disponível no mercado europeu devido a uma proibição de utilização.

26

A cidade de Hamburgo interpôs recurso desta decisão para o Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal, Alemanha). Alega que o artigo 5.o do Regulamento REACH proíbe que substâncias que se encontrem no território da União sejam exportadas para países terceiros, enquanto e na medida em que estas substâncias não tenham sido registadas em conformidade com o referido regulamento.

27

Independentemente deste contencioso administrativo, J. Pinckernelle foi condenado, no âmbito de um processo penal na Alemanha, a uma pena de prisão de 18 meses, suspensa na sua execução por três anos, e a uma pena de multa de 340000 euros, por, nomeadamente, ter procedido à importação de substâncias químicas em violação do artigo 5.o do Regulamento REACH.

28

Nestas condições, o Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 5.o do Regulamento REACH ser interpretado no sentido de que, sob reserva dos artigos 6.°, 7.°, 21.° e 23.° [deste] [r]egulamento […], as substâncias só podem ser exportadas do território da União se tiverem sido registadas nos termos das disposições relevantes do título II do [mesmo regulamento]?»

Quanto à questão prejudicial

29

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o do Regulamento REACH deve ser interpretado no sentido de que substâncias que não tenham sido registadas quando da sua importação para o território da União, em conformidade com este regulamento, podem ser exportadas para fora desse território.

30

Assim, a resposta a esta questão depende do âmbito da obrigação de registo prevista por esta disposição.

31

A este propósito, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para interpretar uma disposição do direito da União, devem ser tidos em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação em que se integra (acórdão de 17 de março de 2016, Liffers, C‑99/15, EU:C:2016:173, n.o 14 e jurisprudência referida).

32

Quanto à redação do artigo 5.o do Regulamento REACH, importa salientar que, nas versões búlgara, estónia, grega, inglesa, francesa, italiana, neerlandesa, polaca, portuguesa e finlandesa desta disposição, a expressão «na Comunidade» está expressamente associada ao fabrico das substâncias. Em contrapartida, nas versões checa, dinamarquesa, letã, húngara, romena, eslovaca, eslovena e sueca deste artigo 5.o, a expressão «na Comunidade» reporta‑se quer ao fabrico quer à colocação das substâncias no mercado. Por último, as versões espanhola, alemã e lituana do referido artigo são ambíguas.

33

Deste modo, enquanto a interpretação do artigo 5.o do Regulamento REACH segundo a qual a expressão «na Comunidade» se reporta tanto ao fabrico como à colocação das substâncias no mercado não está excluída atendendo ao conjunto das versões linguísticas desta disposição, a interpretação segundo a qual a referida expressão se refere exclusivamente ao fabrico destas substâncias é contrária à redação da referida disposição nas línguas checa, dinamarquesa, letã, húngara, romena, eslovaca, eslovena e sueca.

34

Quanto ao contexto em que se insere a disposição em questão, há que recordar que o artigo 3.o, ponto 12, do Regulamento REACH define a «colocação no mercado» como o fornecimento ou a disponibilização a terceiros, mediante pagamento ou gratuitamente, e equipara a importação a uma colocação no mercado. Em contrapartida, esta disposição não prevê que a exportação de um produto possa ser equiparada a uma colocação no mercado.

35

Ora, na medida em que o artigo 3.o, ponto 12, do Regulamento REACH define, para efeitos deste mesmo regulamento, o conceito de «colocação no mercado», este deve ser entendido de modo uniforme no âmbito do referido regulamento.

36

A este respeito, há que mencionar o artigo 3.o, ponto 21, do Regulamento REACH, nos termos do qual uma «substância notificada» é uma substância em relação à qual foi apresentada uma notificação e que pode ser colocada no mercado de acordo com a Diretiva 67/548. Ora, esta diretiva prevê, no seu artigo 1.o, n.os 1 e 3, por um lado, que a mesma tem por objetivo a aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros respeitantes à classificação, à embalagem e à rotulagem das substâncias perigosas, quando estas forem colocadas no mercado dos Estados‑Membros da Comunidade, e, por outro, que não é aplicável às substâncias perigosas exportadas para países terceiros. Daqui decorre que a «colocação no mercado», a que se refere o artigo 3.o, n.o 21, do Regulamento REACH, respeita apenas ao mercado interno e exclui as exportações para fora desse território.

37

Segundo o artigo 31.o, n.o 5, do Regulamento REACH, «[a] ficha de dados de segurança deve ser fornecida nas línguas oficiais do(s) Estado(s)‑Membro(s) interessado(s) onde a substância ou preparação é colocada no mercado, salvo disposição em contrário desse(s) Estado(s)‑Membro(s)». Assim, esta disposição também relaciona a «colocação no mercado» apenas com o mercado interno.

38

O mesmo se diga do artigo 112.o, alínea b), do Regulamento REACH, nos termos do qual o título XI deste regulamento é, em certas condições, aplicável «às substâncias abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 1.o da Diretiva 67/548/CEE», a saber, as substâncias perigosas que sejam «colocadas no mercado dos Estados‑Membros da Comunidade», com exclusão das que são «exportadas para países terceiros».

39

Por força do artigo 129.o, n.o 3, do Regulamento REACH, se, no caso de uma decisão da Comissão que autoriza as medidas provisórias por um período definido, a medida provisória tomada pelo Estado‑Membro consistir numa restrição à colocação no mercado ou à utilização da substância, o Estado‑Membro em causa dá início a um procedimento comunitário de restrição apresentando um dossiê à Agência, em conformidade com o Anexo XV deste regulamento, no prazo de três meses a contar da data da decisão da Comissão. Ora, este Anexo XV define os princípios gerais para a preparação dos dossiês destinados a propor e justificar, nomeadamente, restrições de fabrico, colocação no mercado ou utilização de uma substância na Comunidade. Afigura‑se, assim, que a «colocação no mercado» referida no artigo 129.o, n.o 3, do Regulamento REACH apenas se relaciona com o mercado interno e não cobre as exportações para países terceiros.

40

Quanto a este último aspeto, há que sublinhar que, no âmbito do Regulamento REACH, as substâncias que saem do território da Comunidade são apresentadas não como «colocadas no mercado» mas como «exportadas». Assim, o artigo 2.o, n.o 7, alínea c), i), deste regulamento dispõe que «[e]stão isentas do disposto nos títulos II, V e VI as substâncias — estremes ou contidas em preparações — registadas em conformidade com o título II, exportadas da Comunidade por um agente da cadeia de abastecimento e reimportadas para a Comunidade por esse ou outro agente da mesma cadeia de abastecimento, que demonstre que a substância reimportada é a mesma que foi exportada».

41

Decorre do que precede que a exportação de uma substância para um país terceiro não pode ser qualificada de «colocação no mercado» dessa substância, na aceção do artigo 3.o, ponto 12, e do artigo 5.o do Regulamento REACH.

42

A este respeito, deve salientar‑se que os objetivos do Regulamento REACH não se opõem a essa interpretação das referidas disposições. Com efeito, este regulamento baseia‑se expressamente no artigo 95.o CE, atual artigo 114.o TFUE, cujas disposições se aplicam à concretização dos objetivos enunciados no artigo 14.o CE, atual artigo 26.o TFUE, a saber, estabelecer ou assegurar o funcionamento do mercado interno, que compreende um espaço sem fronteiras internas, no qual é assegurada, designadamente, a livre circulação de mercadorias.

43

Neste âmbito, o considerando 1 do Regulamento REACH afirma que este último deveria assegurar, em especial, a livre circulação das mercadorias. A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que esta diz respeito ao mercado interno (v., neste sentido, acórdão de 17 de março de 2016, Canadian Oil Company Sweden e Rantén, C‑472/14, EU:C:2016:171, n.o 32). Nos termos do considerando 2 deste regulamento, o funcionamento eficaz do mercado interno das substâncias só poderá ser concretizado se os requisitos aplicáveis às substâncias não diferirem significativamente entre Estados‑Membros. Segundo o considerando 7 do referido regulamento, para preservar a integridade do mercado interno e assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana, especialmente da saúde dos trabalhadores e do ambiente, é necessário garantir que o fabrico de substâncias na Comunidade esteja em conformidade com a legislação comunitária, mesmo se essas substâncias forem exportadas.

44

Resulta do conjunto destes elementos que o mercado ao qual é feita referência no Regulamento REACH é o mercado interno e que, por conseguinte, a «colocação no mercado» se reporta ao mercado interno. Tal interpretação não é contrariada por nenhum elemento deste regulamento, tanto mais que, quando está em causa a colocação de substâncias fora do mercado interno, o mesmo regulamento se refere ao conceito de exportação.

45

A cidade de Hamburgo e o Governo alemão defenderam que a interpretação dos termos «colocação no mercado», constantes do artigo 5.o do Regulamento REACH, no sentido de que respeitam apenas ao mercado interno e não à exportação para países terceiros de substâncias químicas não registadas quando da sua importação para a União, poderia criar o risco de que importadores pouco escrupulosos violassem intencionalmente as obrigações de registo das substâncias químicas, impostas pela União, ao saber que podem simplesmente exportar.

46

A este respeito, há que recordar que, em conformidade com o disposto no artigo 126.o do Regulamento REACH, os Estados‑Membros determinam o regime das sanções aplicáveis às violações das disposições do presente regulamento, entre as quais o artigo 5.o, que impõe o registo das substâncias, em especial quando são importadas, e tomam todas as medidas necessárias para assegurar a sua implementação. Por outro lado, as sanções assim previstas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas.

47

No caso vertente, há que observar que, como é precisado no n.o 18 do presente acórdão, a regulamentação alemã prevê que quem violar o Regulamento REACH é punido com uma pena de prisão até dois anos ou com uma pena de multa.

48

Por último, como resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça e, em especial, da decisão de reenvio, as autoridades competentes podem recorrer às disposições de direito administrativo nacional para impor o respeito, se necessário coercivamente, da obrigação de registo de uma substância que seja objeto de uma importação, conforme decorre, designadamente, do artigo 5.o do Regulamento REACH.

49

Tendo em conta o conjunto das considerações precedentes, há que responder à questão prejudicial que o artigo 5.o do Regulamento REACH, conjugado com o artigo 3.o, ponto 12, deste regulamento, deve ser interpretado no sentido de que substâncias que não tenham sido registadas quando da sua importação para o território da União, em conformidade com o referido regulamento, podem ser exportadas para fora desse território.

Quanto às despesas

50

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

O artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas (REACH), que cria a Agência Europeia dos Produtos Químicos, que altera a Diretiva 1999/45/CE e revoga o Regulamento (CEE) n.o 793/93 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 1488/94 da Comissão, bem como a Diretiva 76/769/CEE do Conselho e as Diretivas 91/155/CEE, 93/67/CEE, 93/105/CE e 2000/21/CE da Comissão, conjugado com o artigo 3.o, ponto 12, deste regulamento, deve ser interpretado no sentido de que substâncias que não tenham sido registadas quando da sua importação para o território da União Europeia, em conformidade com o referido regulamento, podem ser exportadas para fora desse território.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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