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Document 62015CJ0292

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 27 de outubro de 2016.
Hörmann Reisen GmbH contra Stadt Augsburg e Landkreis Augsburg.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Vergabekammer Südbayern.
Reenvio prejudicial — Contratos públicos — Serviços públicos de transporte de passageiros por autocarro — Regulamento (CE) n.° 1370/2007 — Artigo 4.°, n.° 7 — Subcontratação — Obrigação imposta ao operador de prestar ele próprio uma parte substancial dos serviços públicos de transporte de passageiros — Alcance — Artigo 5.°, n.° 1 — Procedimento de adjudicação do contrato — Adjudicação do contrato em conformidade com a Diretiva 2004/18/CE.
Processo C-292/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:817

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

27 de outubro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Contratos públicos — Serviços públicos de transporte de passageiros por autocarro — Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Artigo 4.o, n.o 7 — Subcontratação — Obrigação imposta ao operador de prestar ele próprio uma parte substancial dos serviços públicos de transporte de passageiros — Alcance — Artigo 5.o, n.o 1 — Procedimento de adjudicação do contrato — Adjudicação do contrato em conformidade com a Diretiva 2004/18/CE»

No processo C‑292/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Vergabekammer Südbayern (Câmara dos Contratos Públicos da Baviera do Sul, Alemanha), por decisão de 5 de junho de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 10 de junho de 2015, no processo

Hörmann Reisen GmbH

contra

Stadt Augsburg,

Landkreis Augsburg,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente de secção, E. Juhász (relator), C. Vajda, K. Jürimäe e C. Lycourgos, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: A. Calot Escobar,

considerando as observações apresentadas:

em representação da Hörmann Reisen GmbH, por S. Roling e T. Martin, Rechtsanwälte,

em representação da Stadt Augsburg e do Landkreis Augsburg, por R. Wiemann, Rechtsanwalt,

em representação da Comissão Europeia, por G. Braun, A. Tokár e J. Hottiaux, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 28 de junho de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o, n.o 7, e do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho (JO 2007, L 315, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Hörmann Reisen GmbH à Stadt Augsburg (cidade de Augsburgo, Alemanha) e ao Landkreis Augsburg (distrito de Augsburgo) (a seguir, em conjunto, «entidades adjudicantes»), a propósito da legalidade de um concurso para serviços públicos de transporte de passageiros por autocarro.

Quadro jurídico

3

O considerando 4 do Regulamento n.o 1370/2007 enuncia:

«Os principais objetivos do Livro Branco da Comissão [Europeia] intitulado ‘A política europeia de transportes no horizonte 2010: a hora das opções’, de 12 de setembro de 2001, são garantir serviços de transporte de passageiros seguros, eficazes e de elevada qualidade, graças a uma concorrência regulada […]»

4

Nos termos do considerando 7 deste regulamento:

«Os estudos realizados e a experiência dos Estados‑Membros onde a concorrência no setor dos transportes públicos vigora há já vários anos demonstram que, com cláusulas de salvaguarda adequadas, a introdução de uma concorrência regulada entre operadores permite a prestação de serviços mais atrativos, mais inovadores, com custos mais baixos, e não é suscetível de comprometer a execução das missões específicas confiadas aos operadores de serviços públicos. […]»

5

O considerando 9 do referido regulamento dispõe:

«A fim de poderem organizar os seus serviços públicos de transporte de passageiros da forma mais adequada às necessidades dos cidadãos, as autoridades competentes devem poder escolher livremente os seus operadores de serviço público, tendo em conta os interesses das pequenas e médias empresas, nas condições previstas pelo presente regulamento. A fim de garantir a aplicação dos princípios da transparência, da igualdade de tratamento dos operadores concorrentes e da proporcionalidade, é indispensável, aquando da atribuição de compensações ou de direitos exclusivos, definir num contrato de serviço público celebrado entre a autoridade competente e o operador de serviço público selecionado a natureza das obrigações de serviço público e as contrapartidas concedidas. […]»

6

O considerando 19 deste regulamento prevê:

«A subcontratação pode contribuir para aumentar a eficácia do transporte público de passageiros e permite a participação de empresas distintas do operador de serviço público ao qual tenha sido adjudicado o contrato de serviço público. Todavia, a fim de assegurar uma melhor utilização dos fundos públicos, as autoridades competentes deverão poder determinar as modalidades de subcontratação dos seus serviços públicos de transporte de passageiros, nomeadamente no caso de serviços efetuados por um operador interno. Além disso, os subcontratantes não devem ser impedidos de participar em concursos no território de qualquer autoridade competente. A seleção de um subcontratante pela autoridade competente ou pelo seu operador interno deverá ser feita em conformidade com o direito [da União].»

7

O artigo 1.o do Regulamento n.o 1370/2007, com a epígrafe «Objetivo e âmbito de aplicação», dispõe:

«1.   O presente regulamento tem por objetivo definir o modo como, no respeito das regras do direito [da União], as autoridades competentes podem intervir no domínio do transporte público de passageiros para assegurar a prestação de serviços de interesse geral que sejam, designadamente, mais numerosos, mais seguros, de melhor qualidade e mais baratos do que aqueles que seria possível prestar apenas com base nas leis do mercado.

Para este fim, o presente regulamento define as condições em que as autoridades competentes, ao imporem obrigações de serviço público ou ao celebrarem contratos relativos a obrigações de serviço público, compensam os operadores de serviços públicos pelos custos incorridos e/ou concedem direitos exclusivos em contrapartida da execução de obrigações de serviço público.

2.   O presente regulamento é aplicável à exploração nacional e internacional de serviços públicos de transporte de passageiros por caminho de ferro propriamente dito e outros sistemas guiados e por estrada, com exceção dos serviços explorados essencialmente por razões históricas ou de interesse turístico. […]

[…]»

8

O artigo 2.o deste regulamento tem a seguinte redação:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)

‘Transporte público de passageiros’, os serviços de transporte de passageiros de interesse económico geral prestados ao público numa base não discriminatória e regular;

b)

‘Autoridade competente’, qualquer autoridade pública, ou agrupamento de autoridades públicas, de um ou mais Estados‑Membros com poder para intervir no transporte público de passageiros numa determinada zona geográfica, ou qualquer organismo investido dessas competências;

[…]

i)

‘Contrato de serviço público’, um ou vários atos juridicamente vinculativos que estabeleçam o acordo entre uma autoridade competente e um operador de serviço público para confiar a este último a gestão e a exploração dos serviços públicos de transporte de passageiros sujeitos às obrigações de serviço público. […]

[…]»

9

O artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1370/2007 dispõe:

«Quando uma autoridade competente decida conceder ao operador da sua escolha um direito exclusivo e/ou uma compensação, qualquer que seja a sua natureza, em contrapartida da execução de obrigações de serviço público, deve fazê‑lo no âmbito de um contrato de serviço público.»

10

O artigo 4.o deste regulamento, com a epígrafe «Conteúdo obrigatório dos contratos de serviço público e das regras gerais», prevê:

«1.   Os contratos de serviço público devem:

[…]

b)

Estabelecer, antecipadamente e de modo objetivo e transparente:

i)

os parâmetros com base nos quais deve ser calculada a compensação, se for caso disso, e

ii)

a natureza e a extensão dos direitos exclusivos eventualmente concedidos,

por forma a evitar sobrecompensações. […]

[…]

7.   Os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem ser transparentes quanto à possibilidade ou impossibilidade de subcontratação e, caso esta seja possível, quanto à sua extensão. Em caso de subcontratação, o operador encarregado da gestão e da prestação de serviços públicos de transporte de passageiros, de acordo com o presente regulamento, é obrigado a prestar ele próprio uma parte substancial dos serviços públicos de transporte. Um contrato de serviço público que abranja simultaneamente a conceção, o estabelecimento e a exploração de serviços públicos de transporte de passageiros pode autorizar a subcontratação total para efeitos da exploração daqueles serviços. Os contratos de serviço público devem determinar, de acordo com o direito nacional e [da União], as condições aplicáveis à subcontratação.»

11

O artigo 5.o do referido regulamento, com a epígrafe «Adjudicação de contratos de serviço público», tem a seguinte redação:

«1.   Os contratos de serviço público devem ser adjudicados de acordo com as regras estabelecidas no presente regulamento. No entanto, os contratos de serviços ou os contratos públicos de serviços, tal como definidos nas Diretivas 2004/17/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (JO 2004, L 134, p. 1),] ou 2004/18/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114)], para o transporte público de passageiros por autocarro ou elétrico, devem ser adjudicados nos termos dessas diretivas na medida em que tais contratos não assumam a forma de contratos de concessão de serviços, tal como definidos nessas diretivas. Sempre que os contratos devam ser adjudicados nos termos das Diretivas [2004/17] ou [2004/18], não se aplica o disposto nos n.os 2 a 6 do presente artigo.

[…]»

12

O artigo 5.o, n.os 2 a 6, do Regulamento n.o 1370/2007 contém regras sobre a adjudicação de contratos de serviço público que derrogam o direito da União em matéria de contratos públicos. Em especial, o artigo 5.o, n.o 4, primeiro parágrafo, deste regulamento prevê que «[s]alvo proibição da legislação nacional, as autoridades competentes podem decidir adjudicar por ajuste direto contratos de serviço público cujo valor anual médio seja estimado em menos de 1000000 [euros] ou que tenham por objeto a prestação anual de menos de 300000 quilómetros de serviços públicos de transporte de passageiros».

13

O artigo 1.o, n.o 3, alínea b), da Diretiva 2004/17 define, para efeitos da mesma, a «concessão de serviços» como um «contrato com as mesmas características que um contrato de serviços, com exceção de que a contrapartida dos serviços a prestar consiste quer unicamente no direito de exploração do serviço, quer nesse direito acompanhado de um pagamento».

14

Nos termos do artigo 1.o da Diretiva 2004/18, conforme alterada pelo Regulamento (UE) n.o 1336/2013 da Comissão, de 13 de dezembro de 2013 (JO 2013, L 335, p. 17) (a seguir «Diretiva 2004/18 alterada»):

«1.   Para efeitos do disposto na presente diretiva, aplicam‑se as definições dos n.os 2 a 15.

a)

‘Contratos públicos’ são contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais entidades adjudicantes, que têm por objeto a execução de obras, o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços na aceção da presente diretiva.

[…]

d)

‘Contratos públicos de serviços’ são contratos públicos que não sejam contratos de empreitada de obras públicas ou contratos públicos de fornecimento, relativos à prestação de serviços mencionados no anexo II.

Um contrato público que tenha por objeto, simultaneamente, produtos e serviços na aceção do anexo II é considerado um ‘contrato público de serviços’ sempre que o valor dos serviços em questão exceda o dos produtos abrangidos pelo contrato.

Um contrato público que tenha por objeto serviços, na aceção do anexo II, e que, só a título acessório em relação ao objeto principal do contrato, inclua atividades na aceção do anexo I, é considerado um ‘contrato público de serviços’.

[…]

4.   ‘Concessão de serviços’ é um contrato com as mesmas características que um contrato público de serviços, com exceção de que a contrapartida dos serviços a prestar consiste quer unicamente no direito de exploração do serviço, quer nesse direito acompanhado de um pagamento.

[…]»

15

O artigo 7.o da Diretiva 2004/18 alterada, com a epígrafe «Montantes dos limiares para contratos públicos», fixa os limiares dos valores estimados, sem imposto sobre o valor acrescentado (IVA), a partir dos quais a adjudicação de um contrato deve ser efetuada em conformidade com as regras da referida diretiva.

16

Esses limiares são alterados a intervalos regulares por regulamentos da Comissão Europeia e adaptados às circunstâncias económicas. À data da publicação do aviso de concurso em causa no processo principal, o limiar relativo aos contratos de serviços celebrados por entidades adjudicantes que não sejam autoridades governamentais centrais era de 207000 euros, sem IVA, nos termos do artigo 7.o, alínea b), da Diretiva 2004/18 alterada.

17

O artigo 20.o desta diretiva enuncia:

«Os contratos que tenham por objeto os serviços referidos no anexo II A são adjudicados de acordo com os artigos 23.° a 55.°»

18

O artigo 25.o da referida diretiva, com a epígrafe «Subcontratação», prevê:

«No caderno de encargos, a entidade adjudicante pode solicitar, ou ser obrigada por um Estado‑Membro a solicitar, ao proponente que indique na proposta qual a parte do contrato que tenciona subcontratar com terceiros, bem como quais os subcontratantes propostos.

Esta indicação não interfere na questão da responsabilidade do operador económico principal.»

19

Entre as categorias de serviços enumeradas no anexo II A dessa mesma diretiva, figura a categoria 2, que remete para os seguintes serviços:

«Serviços de transporte terrestre […], incluindo os serviços de veículos blindados e os serviços de mensagens, com exceção do transporte do correio».

20

Nos termos do artigo 90.o, n.o 1, primeira frase, da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18 (JO 2014, L 94, p. 65):

«Os Estados‑Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até 18 de abril de 2016.»

21

Nos termos do artigo 91.o, primeiro parágrafo, da Diretiva 2014/24:

«A Diretiva [2004/18 alterada] é revogada com efeitos a partir de 18 de abril de 2016.»

Factos no processo principal e questões prejudiciais

22

Em 7 de março de 2015, as entidades adjudicantes publicaram no suplemento do Jornal Oficial da União Europeia, com o número 2015/S 047‑081632, um anúncio de concurso relativo à prestação de serviços públicos de transporte de passageiros por autocarro em certas linhas regionais. Segundo este anúncio de concurso, os proponentes estavam autorizados a recorrer a empresas subcontratadas na proporção máxima de 30% da prestação, calculada em função dos quilómetros do itinerário.

23

A Hörmann Reisen interpôs na Vergabekammer Südbayern (Câmara dos Contratos Públicos da Baviera do Sul, Alemanha) um recurso destinado a impugnar a legalidade desta limitação da subcontratação. Alega que esta limitação é incompatível com a Diretiva 2004/18 alterada e acrescenta que, embora seja verdade que o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 prevê efetivamente a limitação do recurso à subcontratação, este regulamento não é aplicável ao procedimento em causa no processo principal, em virtude do seu artigo 5.o, n.o 1.

24

As entidades adjudicantes recordam que o artigo 5.o, n.o 1, terceira frase, do Regulamento n.o 1370/2007 prevê que, «[s]empre que os contratos devam ser adjudicados nos termos das Diretivas [2004/17] ou [2004/18], não se aplica o disposto nos n.os 2 a 6 [desse] artigo». Estas entidades deduzem daqui que as restantes disposições desse regulamento, e designadamente o seu artigo 4.o, n.o 7, continuam a ser aplicáveis a tais contratos. Por último, segundo as referidas entidades, a limitação do recurso à subcontratação a uma proporção de 30% da prestação, imposta no anúncio do concurso em causa no processo principal, corresponde à obrigação enunciada nesta última disposição, segundo a qual o operador «é obrigado a prestar ele próprio uma parte substancial dos serviços públicos de transporte».

25

O órgão jurisdicional de reenvio refere que o litígio no processo principal incide essencialmente sobre a questão de saber se as entidades adjudicantes tinham o direito de limitar o recurso à subcontratação a 30% da prestação em causa, calculada em função dos quilómetros do itinerário, por aplicação do artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007, no âmbito de um procedimento de adjudicação efetuado ao abrigo do artigo 5.o, n.o 1, deste regulamento, em conjugação com a Diretiva 2004/18 alterada ou com a Diretiva 2014/24.

26

Quanto ao contrato público de serviços em causa no processo principal, este órgão jurisdicional precisa que o valor deste contrato ultrapassa o limiar previsto no artigo 7.o, alínea b), primeiro travessão, da Diretiva 2004/18 alterada, isto é, 207000 euros, sem IVA.

27

Nestas condições, a Vergabekammer Südbayern (Câmara dos Contratos Públicos da Baviera do Sul) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

No caso de um procedimento de concurso nos termos do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento [n.o 1370/2007], em conjugação com a Diretiva [2004/18 alterada] ou a Diretiva 2014/24/UE, apenas são aplicáveis, em princípio, as disposições destas diretivas, sendo portanto excluída a aplicação das disposições do Regulamento [n.o 1370/2007] que divirjam das referidas diretivas?

2)

A admissibilidade da subcontratação num procedimento de concurso nos termos do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento [n.o 1370/2007], em conjugação com a Diretiva [2004/18 alterada] ou a Diretiva [2014/24], é regulada, por conseguinte, exclusivamente pelas regras desenvolvidas pelo Tribunal de Justiça em relação à Diretiva [2004/18 alterada] e pelo disposto no artigo 63.o, n.o 2, da Diretiva [2014/24], ou pode uma autoridade adjudicante, [por derrogação às referidas normas], impor aos proponentes em tal procedimento uma percentagem mínima de prestação própria (em função dos quilómetros do itinerário) nos termos do artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento [n.o 1370/2007]?

3)

Caso o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento [n.o 1370/2007] seja aplicável aos procedimentos de concurso nos termos do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento [n.o 1370/2007], em conjugação com a Diretiva [2004/18 alterada] ou a Diretiva [2014/24], pode a autoridade adjudicante, atendendo ao considerando 19 do Regulamento [n.o 1370/2007], estabelecer uma quota de prestação própria, de modo que a imposição, pela entidade adjudicante, de uma quota de prestação própria de 70% em função dos quilómetros do itinerário pode ser justificada?»

Quanto às questões prejudiciais

Observações preliminares

28

Por um lado, há que salientar que o Tribunal de Justiça já qualificou a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg (Câmara dos Contratos Públicos do Governo do Distrito de Arnsberg, Alemanha) de órgão jurisdicional, na aceção do artigo 267.o TFUE (acórdão de 18 de setembro de 2014, Bundesdruckerei, C‑549/13, EU:C:2014:2235, n.os 20 a 23).

29

Ora, não resulta de nenhum elemento dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que, no presente processo, esta qualificação não possa ser igualmente atribuída à Vergabekammer Südbayern (Câmara dos Contratos Públicos da Baviera do Sul).

30

Por outro lado, há que salientar que, nas questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio refere, além do Regulamento n.o 1370/2007 e da Diretiva 2004/18, a Diretiva 2014/24.

31

No que diz respeito à aplicabilidade da Diretiva 2014/24, importa salientar que o anúncio de concurso em causa no processo principal foi publicado em 7 de março de 2015, ou seja, antes do termo do prazo de transposição das disposições pertinentes da Diretiva 2014/24, fixado para 18 de abril de 2016, nos termos do seu artigo 90.o, n.o 1.

32

Ora, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a diretiva aplicável é, em princípio, a que está em vigor no momento em que a entidade adjudicante escolhe o tipo de procedimento que vai adotar e dirime definitivamente a questão de saber se existe ou não a obrigação de proceder à abertura prévia de um concurso para a adjudicação de um contrato público. Em contrapartida, são inaplicáveis as disposições de uma diretiva cujo prazo de transposição expirou após esse momento (acórdão de 7 de abril de 2016, Partner Apelski Dariusz, C‑324/14, EU:C:2016:214, n.o 83 e jurisprudência referida).

33

Nestas condições, a Diretiva 2014/24 não é aplicável ratione temporis ao processo principal.

Quanto à primeira e à segunda questão

34

Com a primeira e a segunda questão, que devem ser analisadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que, num procedimento de adjudicação de um contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro, o artigo 4.o, n.o 7, deste regulamento continua a ser aplicável a esse contrato.

35

Segundo as indicações que constam da decisão de reenvio, o contrato em causa no processo principal diz respeito a serviços públicos de transporte rodoviário de passageiros, na aceção do artigo 1.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007, e tem por objeto serviços públicos de transporte de passageiros por autocarro, conforme previsto no artigo 5.o, n.o 1, deste regulamento, sem contudo revestir a forma de um contrato de concessão de serviços.

36

Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, primeira frase, do Regulamento n.o 1370/2007, um contrato como o que está em causa no processo principal deve, em princípio, ser adjudicado de acordo com as regras estabelecidas nesse regulamento.

37

No entanto, quando um contrato não reveste a forma de um contrato de concessão de serviços, conforme definido na Diretiva 2004/17 ou na Diretiva 2004/18 alterada, o contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro é adjudicado em conformidade com os procedimentos previstos por essas diretivas, nos termos do artigo 5.o, n.o 1, segunda frase, do Regulamento n.o 1370/2007.

38

Além disso, o artigo 5.o, n.o 1, terceira frase, do Regulamento n.o 1370/2007 prevê, para o caso da adjudicação de um contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro, que «não se aplica o disposto nos n.os 2 a 6 [desse] artigo».

39

Assim, verifica‑se que o artigo 5.o, n.o 1, segunda frase, do Regulamento n.o 1370/2007 contém uma derrogação à regra geral estabelecida no artigo 5.o, n.o 1, primeira frase, deste regulamento e que o alcance exato desta derrogação é em seguida precisado no artigo 5.o, n.o 1, terceira frase, do referido regulamento, que enuncia a não aplicação do seu artigo 5.o, n.os 2 a 6.

40

Nenhuma outra disposição do referido artigo 5.o ou do Regulamento n.o 1370/2007 alarga mais o alcance da referida derrogação.

41

Daqui resulta que, para efeitos da adjudicação de um contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro como o que está em causa no processo principal, apenas não se aplica o disposto no artigo 5.o, n.os 2 a 6, do Regulamento n.o 1370/2007, continuando, porém, a ser aplicáveis as restantes disposições deste regulamento.

42

Nestas condições, conclui‑se que o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 se aplica em caso de adjudicação de um contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro abrangido pelo artigo 5.o, n.o 1, deste regulamento.

43

Esta conclusão é corroborada pelo objeto do Regulamento n.o 1370/2007.

44

Com efeito, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do referido regulamento, este tem por objetivo «definir o modo como, no respeito das regras do direito [da União], as autoridades competentes podem intervir no domínio do transporte público de passageiros para assegurar a prestação de serviços de interesse geral que sejam, designadamente, mais numerosos, mais seguros, de melhor qualidade e mais baratos do que aqueles que seria possível prestar apenas com base nas leis do mercado».

45

O facto de o Regulamento n.o 1370/2007, pela sua natureza, se destinar a prever modalidades de intervenção em regimes gerais de contratos públicos implica que contém regras especiais em relação a estes últimos.

46

A este respeito, importa salientar que a Diretiva 2004/18 alterada é de aplicação geral, enquanto o Regulamento n.o 1370/2007 apenas tem por objeto os serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros.

47

Ora, na medida em que tanto o artigo 4.o, n.o 7, deste regulamento como o artigo 25.o da Diretiva 2004/18 alterada contêm regras relativas à subcontratação, há que considerar que a primeira disposição constitui uma regra especial relativamente às previstas na segunda disposição e, enquanto lex specialis, prevalece sobre estas.

48

Nestas condições, há que responder à primeira e à segunda questão submetidas que o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que, num procedimento de adjudicação de um contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro, o artigo 4.o, n.o 7, deste regulamento continua a ser aplicável a esse contrato.

Quanto à terceira questão

49

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a entidade adjudicante fixe em 70% a proporção de prestação autónoma pelo operador encarregado da gestão e da prestação de um serviço público de transporte de passageiros por autocarro como o que está em causa no processo principal.

50

Nos termos do artigo 4.o, n.o 7, primeira frase, do Regulamento n.o 1370/2007, os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem ser transparentes quanto à possibilidade ou impossibilidade de subcontratação e, caso esta seja possível, quanto à sua extensão.

51

Daqui decorre que, no que diz respeito à subcontratação da gestão e da prestação de um serviço público de transportes regido pelo referido regulamento, o legislador da União conferiu às autoridades competentes um amplo poder de apreciação.

52

A este respeito, importa salientar que, na medida em que é possível uma entidade adjudicante proibir à adjudicatária do contrato, em caso de celebração desse contrato em conformidade com o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007, a subcontratação de um serviço público de transporte de passageiros por autocarro, o poder de apreciação referido no número anterior inclui a possibilidade de apenas proibir a subcontratação de uma parte do contrato.

53

Além disso, relativamente à subcontratação no âmbito da gestão e da prestação do serviço público de transporte de passageiros por autocarro, o artigo 4.o, n.o 7, segunda frase, do Regulamento n.o 1370/2007 não autoriza, para o contrato em causa, uma subcontratação completa, uma vez que prevê que o operador encarregado desse serviço é obrigado a prestar ele próprio uma parte substancial do mesmo. Só no caso de o contrato de serviço público abranger simultaneamente a conceção, o estabelecimento e a exploração de serviços públicos de transporte de passageiros é que pode ser autorizada a subcontratação total da prestação daqueles serviços, ao abrigo do artigo 4.o, n.o 7, terceira frase, desse regulamento.

54

Daqui decorre que o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 não se opõe a que a entidade adjudicante limite, de forma substancial, a possibilidade de se recorrer à subcontratação no âmbito de um concurso como o que está em causa no processo principal.

55

No caso vertente, o aviso de concurso em causa no processo principal constitui um documento do concurso que precisa, de forma transparente, conforme resulta inequivocamente da decisão de reenvio, que o recurso à subcontratação está limitado a uma proporção correspondente a 30% da prestação, calculada em função dos quilómetros do itinerário.

56

Tendo em conta o exposto, há que constatar que esta limitação não ultrapassa o poder de apreciação que o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 confere às autoridades competentes.

57

Assim, há que responder à terceira questão submetida que o artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a entidade adjudicante fixe em 70% a proporção de prestação autónoma pelo operador encarregado da gestão e da prestação de um serviço público de transporte de passageiros por autocarro como o que está em causa no processo principal.

Quanto às despesas

58

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

O artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que, num procedimento de adjudicação de um contrato de serviço público de transporte de passageiros por autocarro, o artigo 4.o, n.o 7, deste regulamento continua a ser aplicável a esse contrato.

 

2)

O artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a entidade adjudicante fixe em 70% a proporção de prestação autónoma pelo operador encarregado da gestão e da prestação de um serviço público de transporte de passageiros por autocarro como o que está em causa no processo principal.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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