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Document 62014CJ0141

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 14 de janeiro de 2016.
Comissão Europeia contra República da Bulgária.
Incumprimento de Estado — Diretiva 2009/147/CE — Conservação das aves selvagens — Zonas de proteção especial Kaliakra e Belite skali — Diretiva 92/43/CEE — Proteção dos habitats naturais e das espécies que vivem no estado selvagem — Sítio de importância comunitária Kompleks Kaliakra — Diretiva 2011/92/UE — Avaliação das incidências de determinados projetos no ambiente — Aplicabilidade ratione temporis do regime de proteção — Deterioração dos habitats naturais das espécies e perturbação das espécies — Energia eólica — Turismo.
Processo C-141/14.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:8

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

14 de janeiro de 2016 ( *1 )

«Incumprimento de Estado — Diretiva 2009/147/CE — Conservação das aves selvagens — Zonas de proteção especial Kaliakra e Belite skali — Diretiva 92/43/CEE — Proteção dos habitats naturais e das espécies que vivem no estado selvagem — Sítio de importância comunitária Kompleks Kaliakra — Diretiva 2011/92/UE — Avaliação das incidências de determinados projetos no ambiente — Aplicabilidade ratione temporis do regime de proteção — Deterioração dos habitats naturais das espécies e perturbação das espécies — Energia eólica — Turismo»

No processo C‑141/14,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, que deu entrada em 24 de março de 2014,

Comissão Europeia, representada por E. White, C. Hermes e P. Mihaylova, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República da Bulgária, representada por E. Petranova e D. Drambozova, na qualidade de agentes,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente da Segunda Secção, exercendo funções de presidente da Terceira Secção, C. Toader (relatora) e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 20 de maio de 2015,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 3 de setembro de 2015,

profere o presente

Acórdão

1

Na sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, ao:

não ter incluído a totalidade dos territórios das zonas importantes para a conservação das aves (a seguir «ZICA») na zona de proteção especial (a seguir «ZPE») que abrange a região de Kaliakra (a seguir «ZPE Kaliakra»), a República da Bulgária não classificou como ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, à conservação, por um lado, das espécies biológicas referidas no anexo I da Diretiva 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2009, relativa à conservação das aves selvagens (JO 2010, L 20, p. 7, a seguir «diretiva ‘aves’»), e, por outro, das espécies migratórias não referidas neste anexo, cuja ocorrência seja regular na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação desta diretiva, e, por conseguinte, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.os 1 e 2, da dita diretiva;

aprovar a execução dos projetos «AES Geo Energy», «Windtech», «Brestiom», «Disib», «Eco Energy» e «Longman Investment» no território da ZICA que abrange a região de Kaliakra (a seguir «ZICA Kaliakra») que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves»;

aprovar a execução dos projetos «Kaliakra Wind Power», «EVN Enertrag Kavarna», «TSID — Atlas», «Vertikal — Petkov & Cie» e «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort» nos territórios da ZPE Kaliakra, do sítio de importância comunitária «Kompleks Kaliakra» (a seguir «SIC Kompleks Kaliakra») e da ZPE que abrange a região de Belite skali (a seguir «ZPE Belite skali»), a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7, a seguir «diretiva ‘habitats’»);

não ter avaliado corretamente o efeito cumulativo dos projetos «AES Geo Energy», «Windtech», «Brestiom», «Disib», «Eco Energy» e «Longman Investment», cuja execução no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, foi aprovada pela República da Bulgária, este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força das disposições conjugadas dos artigos 2.°, n.o 1, e 4.°, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO L 26, p. 1), e do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b).

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva «aves»

2

De acordo com o seu artigo 1.o, n.o 1, a diretiva «aves» diz respeito à conservação de todas as espécies de aves que vivem naturalmente no estado selvagem no território europeu dos Estados‑Membros ao qual é aplicável o Tratado UE. Tem por objeto a proteção, a gestão e o controlo dessas espécies e regula a sua exploração.

3

O artigo 4.o desta diretiva dispõe:

«1.   As espécies mencionadas no anexo I são objeto de medidas de conservação especial respeitantes ao seu habitat, de modo a garantir a sua sobrevivência e a sua reprodução na sua área de distribuição.

Para o efeito, são tomadas em consideração:

a)

As espécies ameaçadas de extinção;

b)

As espécies vulneráveis a certas modificações dos seus habitats;

c)

As espécies consideradas raras, porque as suas populações são reduzidas ou porque a sua repartição local é restrita;

d)

Outras espécies necessitando de atenção especial devido à especificidade do seu habitat.

Tem‑se em conta, para proceder às avaliações, […] as tendências e as variações dos níveis populacionais.

Os Estados‑Membros classificam, nomeadamente, em [ZPE] os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação destas espécies na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente diretiva.

2.   Os Estados‑Membros tomam medidas semelhantes para as espécies migratórias não referidas no anexo I e cuja ocorrência seja regular, tendo em conta as necessidades de proteção na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente diretiva no que diz respeito às suas áreas de reprodução, de muda e de invernada e às zonas de repouso e alimentação nos seus percursos de migração. Com esta finalidade, os Estados‑Membros atribuem uma importância especial à proteção das zonas húmidas e muito particularmente às de importância internacional.

[…]

4.   Os Estados‑Membros tomam as medidas adequadas para evitar, nas zonas de proteção referidas nos n.os 1 e 2, a poluição ou a deterioração dos habitats, bem como as perturbações que afetam as aves, desde que tenham um efeito significativo a propósito dos objetivos do presente artigo. Para além destas zonas de proteção, os Estados‑Membros esforçam‑se igualmente por evitar a poluição ou a deterioração dos habitats.»

Diretiva «habitats»

4

O artigo 6.o, n.os 2 a 4, da diretiva «habitats» prevê:

«2.   Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objetivos da presente diretiva.

3.   Os planos ou projetos não diretamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas suscetíveis de afetar esse sítio de forma significativa, individualmente ou em conjugação com outros planos e projetos, serão objeto de uma avaliação adequada das suas incidências sobre o sítio no que se refere aos objetivos de conservação do mesmo. Tendo em conta as conclusões da avaliação das incidências sobre o sítio e sem prejuízo do disposto no n.o 4, as autoridades nacionais competentes só autorizarão esses planos ou projetos depois de se terem assegurado de que não afetarão a integridade do sítio em causa e de terem auscultado, se necessário, a opinião pública.

4.   Se, apesar de a avaliação das incidências sobre o sítio ter levado a conclusões negativas e na falta de soluções alternativas, for necessário realizar um plano ou projeto por outras razões imperativas de reconhecido interesse público, incluindo as de natureza social ou económica, o Estado‑Membro tomará todas as medidas compensatórias necessárias para assegurar a proteção da coerência global da rede Natura 2000. O Estado‑Membro informará a Comissão das medidas compensatórias adotadas.

No caso de o sítio em causa abrigar um tipo de habitat natural e/ou uma espécie prioritária, apenas podem ser evocadas razões relacionadas com a saúde do homem ou a segurança pública ou com consequências benéficas primordiais para o ambiente ou, após parecer da Comissão, outras razões imperativas de reconhecido interesse público.»

Diretiva 2011/92

5

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2011/92:

«Os Estados‑Membros tomarão as disposições necessárias para garantir que, antes de concedida a aprovação, os projetos que possam ter impactos significativos no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensão ou localização, fiquem sujeitos a um pedido de autorização e a uma avaliação dos seus impactos no ambiente. Esses projetos são definidos no artigo 4.o»

6

O artigo 4.o, n.os 2 e 3, desta diretiva dispõe:

«2.   Sem prejuízo do disposto no artigo 2.o, n.o 4, os Estados‑Membros determinarão, relativamente aos projetos incluídos no anexo II, se o projeto deve ser submetido a uma avaliação nos termos dos artigos 5.° a 10.° Os Estados‑Membros procedem a essa determinação:

a)

Com base numa análise caso a caso;

ou

b)

Com base nos limiares ou critérios por eles fixados.

Os Estados‑Membros podem decidir aplicar os dois procedimentos referidos nas alíneas a) e b).

3.   Se forem efetuadas análises caso a caso ou fixados limiares ou critérios para efeitos do disposto no n.o 2, são tidos em conta os critérios de seleção relevantes fixados no anexo III.»

7

O anexo III, ponto 1, alínea b), da referida diretiva prevê que as características dos projetos devem ser tidas em conta sobretudo em relação aos efeitos cumulativos com outros projetos.

Ato de adesão da República da Bulgária à União Europeia

8

O Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2005, L 157, p. 203) entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007.

Antecedentes do litígio e fase pré‑contenciosa

9

A região de Kaliakra, situada no litoral búlgaro do Mar Negro, constitui um sítio importante para a conservação de numerosas espécies de aves e dos seus habitats, razão pela qual esta região foi designada ZICA pela organização não governamental BirdLife International.

10

Em 18 de dezembro de 2007, a República da Bulgária criou, nos termos da diretiva «aves», a ZPE Kaliakra. No entanto, esta zona de proteção só cobria dois terços do território da ZICA Kaliakra. A República da Bulgária estabeleceu igualmente, a oeste da ZPE Kaliakra e fora da ZICA Kaliakra, a ZPE Belite skali. Além disso, este Estado‑Membro propôs à Comissão a designação, sob o nome de «Kompleks Kaliakra», de um sítio de interesse comunitário (a seguir «SIC Kompleks Kaliakra») que engloba a quase totalidade da superfície da ZPE Kaliakra e da ZPE Belite skali.

11

Na sequência de queixas formuladas pela Sociedade Búlgara para a Proteção das Aves (Bulgarsko druzhestvo za zashtita na ptitsite) a propósito da insuficiência do âmbito geográfico da ZPE Kaliakra e das consequências negativas de vários projetos de atividades económicas para os habitats naturais e os habitats de espécies de aves, a Comissão enviou à República da Bulgária, em 6 de junho de 2008, uma carta de notificação para cumprir, instando este Estado‑Membro a corrigir os incumprimentos constatados às obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.os 1 e 2, da diretiva «aves», no que diz respeito a seis ZPE, entre as quais a ZPE Kaliakra. Não tendo ficado satisfeita com as diferentes respostas dadas pela República da Bulgária, a Comissão enviou, em 1 de dezembro de 2008, uma segunda carta de notificação para cumprir, intimando‑a a corrigir os incumprimentos às obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves» e das disposições conjugadas dos artigos 2.°, n.o 1, e 4.°, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92 e do respetivo anexo III, na medida em que o referido Estado‑Membro tinha autorizado a instalação de várias turbinas eólicas na ZICA Kaliakra. A República da Bulgária respondeu a estas notificações em 30 de janeiro de 2009 e, posteriormente, transmitiu por diversas vezes informações adicionais.

12

Em 30 de setembro de 2011, a Comissão enviou à República da Bulgária uma terceira carta de notificação para cumprir complementar que, por um lado, se destinava a consolidar as duas notificações para cumprir precedentes e, por outro, continha novos pedidos relativos aos territórios da ZICA Kaliakra, da ZPE Belite skali e do SIC Kompleks Kaliakra. Esta carta levantava dois grupos de questões: o âmbito geográfico insuficiente do território da ZPE Kaliakra e as incidências de vários projetos na ZPE Kaliakra, na ZPE Belite skali, no SIC Kompleks Kaliakra e na zona que devia ter sido classificada como ZPE segundo o inventário das ZICA, mas que não o tinha sido.

13

Em 30 de janeiro de 2012, a República da Bulgária informou a Comissão de que os projetos por esta enumerados tinham sido, na sua maioria, aprovados antes da sua adesão à União ou antes da inclusão das zonas em causa na rede Natura 2000, pelo que o direito da União não era aplicável a estes locais.

14

Por carta de 22 de junho de 2012, a Comissão emitiu um parecer fundamentado no qual acusava a República da Bulgária de não ter cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.os 1, 2 e 4, da diretiva «aves», do artigo 6.o, n.os 2, 3 e 4, da diretiva «habitats» e das disposições conjugadas dos artigos 2.°, n.o 1, e 4.°, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92 e do respetivo anexo III.

15

A República da Bulgária respondeu a este parecer fundamentado e, com base em informações adicionais, informou a Comissão de que tinha tomado várias medidas para corrigir as irregularidades verificadas.

16

Considerando que a situação se mantinha insatisfatória, a Comissão propôs a presente ação, em 24 de março de 2014.

Quanto à ação

Quanto à primeira acusação, relativa à violação do artigo 4.o, n. os 1 e 2, da diretiva «aves »

Argumentos das partes

17

Com a sua primeira acusação, a Comissão alega que, ao não ter incluído na ZPE Kaliakra a totalidade das zonas da ZICA Kaliakra que era importante proteger tendo em vista a conservação das aves, a República da Bulgária não classificou como ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, à conservação tanto das espécies biológicas referidas no anexo I da diretiva «aves» como das espécies migratórias não referidas neste anexo, mas cuja ocorrência seja regular na zona de aplicação geográfica marítima e terrestre desta diretiva, de modo que este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.os 1 e 2, desta diretiva.

18

A Comissão considera que a República da Bulgária, nas suas várias comunicações adicionais, reconheceu estar em falta com a sua obrigação de classificar como ZPE a totalidade do território da ZICA Kaliakra. Foram, assim, adotadas várias medidas para corrigir as infrações constatadas, a saber, estender a ZPE Kaliakra até aos limites da ZICA Kaliakra. Além disso, um ato jurídico de 6 de fevereiro de 2014, publicado no Darzhaven vestnik n.o 15, de 21 de fevereiro de 2014, decide formalmente da extensão da zona de proteção. No entanto, estas medidas não alteram formalmente a situação de infração, uma vez que foram adotadas após o termo do prazo indicado por esta instituição no seu parecer fundamentado, ou seja, após 22 de agosto de 2012.

19

Em apoio desta acusação, a Comissão, baseando‑se em vários elementos científicos, refere, em substância, três argumentos:

20

Em primeiro lugar, esta instituição alega que os territórios da ZICA Kaliakra não classificados como ZPE são de grande importância para várias espécies, do ponto de vista ornitológico, e constituem um «gargalo migratório» típico situado na via Pontica, a segunda maior via migratória da Europa.

21

Neste contexto, a Comissão afirma que o conjunto dos territórios abrangidos pela ZICA Kaliakra deve ser considerado uma única unidade funcional para as aves migratórias, ou seja, uma região única que não deve ser fragmentada. Acrescenta que a exclusão dos terrenos cultiváveis da ZPE Kaliakra deixa sem proteção vários corredores migratórios e áreas de repouso utilizados por uma parte significativa das populações migratórias na zona costeira, nomeadamente, a cegonha branca, o gavião‑de‑pé‑curto, a águia calçada, o tartaranhão caçador, o tartaranhão de peito branco, o falcão‑de‑pés‑vermelhos e outras espécies.

22

Em seguida, segundo a Comissão, a parte da ZICA Kaliakra não classificada como ZPE oferece habitats de nidificação a determinadas populações de aves, nomeadamente a calhandra‑comum (Melanocorypha calandra), a calhandrinha‑comum (Calandrella brachydactyla), o alcaravão (Burhinus oedicnemus) e a petinha‑dos‑campos (Anthus campestris). Além disso, esta zona não classificada é um importante território de caça para várias espécies voadoras que figuram entre as aves nidificadoras no formulário normalizado de dados e que são expressamente mencionadas na avaliação da ZPE. Entre estas espécies figuram, nomeadamente, aves de rapina, como o gavião‑de‑pé‑curto (Accipiter brevipes), o bútio‑mourisco (Buteo rufinus) e o bufo‑real (Bubo bubo).

23

Por último, a Comissão salienta que a totalidade da população mundial do ganso‑de‑pescoço‑ruivo (Branta ruficollis), considerada uma espécie ameaçada a nível global, passa o inverno na região em causa, ao passo que mais de 80% dos habitats que permitem aos gansos alimentarem‑se estão situados na parte não protegida da ZICA Kaliakra.

24

A República da Bulgária contesta o alegado incumprimento. Afirma que, com a criação da ZPE Kaliakra no decurso do ano de 2007, se procedeu à classificação dos territórios mais apropriados, em número e em extensão, à conservação das espécies em causa, nos termos do artigo 4.o, n.os 1 e 2, da diretiva «aves». A correspondência trocada com a Comissão e as medidas empreendidas por este Estado‑Membro expressam apenas a sua vontade de dialogar com esta instituição, em conformidade com o dever de cooperação.

25

Em resposta aos estudos apontados pela Comissão, a República da Bulgária apresenta diversos estudos científicos dos quais decorre, segundo este Estado‑Membro, que a zona de Kaliakra não constitui um «gargalo migratório» para as aves. Além disso, este Estado‑Membro alega que, embora tenha definitivamente decidido estender a ZPE Kaliakra até aos limites da ZICA com o mesmo nome, nenhum elemento científico, de natureza ornitológica, justifica a integração nesta ZPE dos terrenos agrícolas situados na ZICA Kaliakra, dado que estes terrenos não formam necessariamente uma unidade natural com os terrenos situados perto da costa, já protegidos enquanto ZPE. As aves nidificadoras típicas dos habitats situados nesta zona de proteção fazem o ninho, efetivamente, bastante menos nestes terrenos agrícolas adjacentes.

26

Este Estado‑Membro contesta igualmente o facto de a região de Kaliakra ser um local de repouso para uma grande parte das populações de aves migratórias. Com efeito, resulta de vários relatórios de peritagem que estes locais variam em função do itinerário preciso seguido por estas aves e das condições meteorológicas. No que diz respeito ao ganso‑de‑pescoço‑ruivo, espécie ameaçada a nível mundial, a República da Bulgária invoca vários relatórios de acordo com os quais as zonas mais importantes para a sua alimentação se situam fora da ZICA Kaliakra, na proximidade dos lagos Shabla e Durankulak.

Apreciação do Tribunal de Justiça

27

Em primeiro lugar, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o artigo 4.o, n.os 1 e 2, da diretiva «aves» impõe aos Estados‑Membros a classificação como ZPE dos territórios que obedeçam aos critérios ornitológicos definidos por estas disposições (acórdão Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, n.o 36 e jurisprudência aí referida).

28

Em segundo lugar, os Estados‑Membros são obrigados a classificar como ZPE todos os locais que, em aplicação de critérios ornitológicos, se revelem os mais apropriados com vista à conservação das espécies em causa (acórdão Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, n.o 37 e jurisprudência aí referida).

29

Em terceiro lugar, o Tribunal de Justiça já declarou que a margem de apreciação de que gozam os Estados‑Membros na escolha dos territórios mais apropriados à classificação como ZPE não se refere à oportunidade de classificar como ZPE os territórios que se revelem os mais apropriados segundo critérios ornitológicos, mas apenas a aplicação destes critérios com vista à identificação dos territórios mais apropriados à conservação das espécies enumeradas no anexo I da diretiva «aves» (acórdão Comissão/Áustria, C‑209/04, EU:C:2006:195, n.o 33 e jurisprudência aí referida).

30

Por último, em quarto lugar, relativamente à classificação parcial de determinadas regiões, o Tribunal de Justiça já declarou, por um lado, que a classificação como ZPE não pode resultar de um exame isolado do valor ornitológico de cada uma das superfícies em causa, mas deve ser efetuada com base na consideração dos limites naturais do ecossistema em causa e, por outro, que os critérios ornitológicos, em que a classificação deve assentar exclusivamente, devem ter fundamento científico (acórdão Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007;780, n.o 142).

31

No presente processo, é pacífico que a ZICA Kaliakra é de importância primordial para várias espécies de aves e o seu habitat. Segundo dados fornecidos à Comissão pela República da Bulgária, o sítio de Kaliakra alberga um total de 310 espécies de aves, das quais uma centena deve ser alvo de medidas especiais de conservação em relação ao seu habitat, 95 constam do anexo I da diretiva «aves», assim como um grande número de aves migratórias. Das 310 espécies de aves presentes, 106 são de importância europeia no plano da conservação, 17 estão ameaçadas a nível mundial, 21 estão classificadas na categoria «SPEC 2» e 68 na categoria «SPEC 3» como espécies que apresentam um estado de conservação preocupante na Europa.

32

Em primeiro lugar, quanto à presença de aves nidificadoras na parte da ZICA Kaliakra não classificada inicialmente, há que observar, como salientou a advogada‑geral nos n.os 41 a 43 das suas conclusões, que a República da Bulgária explicou, de forma plausível e sem ser contestada neste ponto pela Comissão, que as aves nidificadoras típicas dos habitats inicialmente protegidos e situados perto da costa fazem o ninho em muito menor medida nas zonas constituídas por terrenos agrícolas. Além disso, a presença muito limitada do gavião‑de‑pé‑curto (Accipiter brevipes), do bútio mourisco (Buteo rufinus) e do bufo real (Bubo bubo), a ponto de a organização não governamental BirdLife não os mencionar enquanto motivo para a identificação do sítio de Kaliakra como ZICA, não é suficiente para se considerar estes terrenos agrícolas como os mais apropriados à conservação das espécies em causa.

33

Em seguida, quanto às aves migratórias, a Comissão considera, em coerência com a avaliação desta zona como ZICA e baseando‑se num estudo levado a cabo durante o ano de 2005 especialmente para identificar os «gargalos migratórios» na Bulgária, que a ZICA Kaliakra constitui um gargalo desse tipo. Com efeito, segundo este estudo, foram observadas mais de 30000 aves planadoras perto de Kaliakra, ao longo desse ano. Esta conclusão não é contrariada pelo argumento da República da Bulgária segundo o qual, na zona em causa, só esporadicamente são observados bandos de aves migratórias, na medida em que a rota da migração é influenciada pelas condições do vento.

34

Com efeito, conforme salientou a advogada‑geral no n.o 50 das suas conclusões, resulta precisamente dos elementos fornecidos por este Estado‑Membro que estas concentrações de aves não são nem aleatórias nem completamente excecionais e que, pelo contrário, acontecem regularmente quando se verificam as condições de vento favoráveis. Ora, quando ocorrem estas concentrações, as superfícies agrícolas da ZICA Kaliakra não classificadas inicialmente constituem precisamente habitats necessários ao repouso e à alimentação das aves migratórias.

35

Por conseguinte, a ZICA Kaliakra faz parte das zonas mais apropriadas à conservação das aves durante a migração.

36

Por último, deve também afastar‑se o argumento da República da Bulgária segundo o qual a parte da ZICA Kaliakra que foi posteriormente classificada como ZPE não era, contudo, de grande importância para a conservação do ganso‑de‑pescoço‑ruivo considerado como uma espécie mundialmente ameaçada, cuja população mundial passa o inverno, quase toda, na costa oeste do Mar do Norte. De acordo com um estudo a que este Estado‑Membro se refere, esta espécie não busca alimento, todos os anos, nas partes do território resultantes da extensão da ZPE Kaliakra. No entanto, como sublinha a Comissão, decorre deste mesmo estudo que, pelo menos durante dois dos cinco anos do período de observação, entre os anos de 1995 e 2000, vários milhares de gansos‑de‑pescoço‑ruivo buscaram alimento nesta parte da ZICA Kaliakra, posteriormente classificada como ZPE.

37

Além disso, conforme sublinha a advogada‑geral nos n.os 60 a 63 das suas conclusões, o facto de as observações mais recentes tenderem a demonstrar que o ganso‑de‑pescoço‑ruivo está menos presente nessas partes do território que, originariamente, não foram objeto de classificação como ZPE não exclui que estas constituam um sítio de importância primordial para a alimentação desta espécie de ave, na medida em que as referidas observações só começaram após a construção de um grande número de instalações eólicas nessas partes do território.

38

Por conseguinte, há que julgar procedente a primeira acusação da Comissão.

Quanto à terceira acusação, relativa ao incumprimento das disposições do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats », no que diz respeito à aprovação dos projetos nas ZPE Kaliakra e Belite skali e no território do SIC Kompleks Kaliakra

Argumentos das partes

39

Com a sua terceira acusação, que importa apreciar em segundo lugar, a Comissão pede que se declare que, ao aprovar os projetos das instalações eólicas denominadas «Kaliakra Wind Power», «EVN Enertrag Kavarna», «TSID — Atlas», «Vertikal — Petkov & Cie» e o projeto imobiliário «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort» no território das ZPE Kaliakra e Belite skali e do SIC Kompleks Kaliakra, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats», na interpretação que lhe foi dada pelo Tribunal de Justiça nos acórdãos Dragaggi e o. (C‑117/03, EU:C:2005:16) e Bund Naturschutz in Bayern e o. (C‑244/05, EU:C:2006:579), uma vez que este Estado‑Membro não tomou as medidas adequadas para evitar a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies e as perturbações que afetam as espécies para cuja conservação estes territórios foram classificados como ZPE ou SIC.

40

A Comissão alega que, antes da sua classificação como ZPE, ou seja, entre 1 de janeiro de 2007 e 18 de dezembro de 2007, o regime jurídico aplicável às correspondentes partes do território de Kaliakra e de Belite skali era o do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves», na interpretação que lhe foi dada pelo Tribunal de Justiça nos acórdãos Comissão/França (C‑96/98, EU:C:1999:580) e Comissão/França (C‑374/98, EU:C:2000:670). Na sequência da classificação do sítio como ZPE, ou seja, após 18 de dezembro de 2007, o regime jurídico aplicável a estas duas ZPE é o do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats».

41

No que diz respeito ao SIC Kompleks Kaliakra, a Comissão alega que, antes da inclusão desta zona na lista europeia dos SIC, mas após a sua classificação como projeto de SIC na lista nacional, ou seja, de 18 de dezembro de 2007 a 15 de dezembro de 2008, o regime jurídico aplicável era o precisado pelo Tribunal de Justiça nos seus acórdãos Dragaggi e o. (C‑117/03, EU:C:2005:16) e Bund Naturschutz in Bayern e o. (C‑244/05, EU:C:2006:579), em concreto:

No que se refere aos sítios suscetíveis de ser identificados como SIC, mencionados nas listas nacionais transmitidas à Comissão, entre os quais podem figurar, nomeadamente, os sítios que alojam tipos de habitats naturais prioritários ou espécies prioritárias, os Estados‑Membros estão, por força da diretiva «habitats», obrigados a tomar medidas de proteção adequadas, à luz do objetivo de conservação referido nesta diretiva, a salvaguardar o interesse ecológico que esses sítios revestem a nível nacional.

O regime de proteção adequada aplicável aos sítios que constam de uma lista nacional transmitida à Comissão, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da diretiva «habitats», exige que os Estados‑Membros se oponham a qualquer intervenção que possa comprometer seriamente as características ecológicas desses sítios.

42

Em primeiro lugar, no que diz respeito às ZPE Kaliakra e Belite skali, a Comissão alega, com base em relatórios científicos, que os vários projetos aprovados pela República da Bulgária (infraestruturas relacionadas com a produção de energia eólica, campo de golfe, hotéis, habitações, etc.), mencionados no n.o 39 do presente acórdão, têm incidências negativas significativas nas aves, nos habitats e nas espécies prioritárias. Assim, na ZPE Kaliakra, a destruição direta de habitats de espécies de aves que constam do anexo I da diretiva «aves» está estimada em, pelo menos, 15,8% da superfície total desta zona. Na ZPE Belite skali, 456,23 hectares de terras, que representam 10,9% da superfície desta zona e que abrigam habitats estepários prioritários, principalmente habitats de nidificação para espécies de aves que constam do anexo I da diretiva «aves», foram irremediavelmente destruídos.

43

A execução destes diferentes projetos, autorizados pela República da Bulgária, implicou assim a destruição dos habitats que abrigam, designadamente, as seguintes espécies de aves, enumeradas no anexo I da diretiva «aves» e que constam igualmente do formulário normalizado de dados relativo a estas duas ZPE: o chasco‑de‑peito‑preto (Oenanthe pleschanka), a calhandra‑real (Melanocorypha calandra), a calhandrinha‑comum (Calandrella brachydactyla), o alcaravão (Burhinus oedicnemus), o bútio‑mourisco (Buteo rufinus), o gavião‑de‑pé‑curto (Accipiter brevipes) e o rolieiro (Coracias garrulus).

44

Em segundo lugar, quanto ao SIC Kompleks Kaliakra, a Comissão acusa a República da Bulgária de não o ter protegido suficientemente dos prejuízos causados pela execução dos projetos relacionados com a produção de energia eólica, ou seja, os projetos «Kaliakra Wind Power», «EVN Enertrag Kavarna» e «Vertikal — Petkov & Cie», e do projeto de infraestruturas turísticas «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort». A este respeito, esta instituição estima que estes projetos acarretaram, no âmbito deste SIC, a destruição irremediável de 587,51 hectares de terras que abrigavam o habitat prioritário «Estepes ponto‑sarmáticas», previsto no anexo I da diretiva «habitats», sob o código 62C0*, ou seja, 24,5% desse habitat.

45

Em resposta a estas alegações, a República da Bulgária invoca que o artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats» não é aplicável a projetos autorizados antes da sua adesão à União e, por conseguinte, também não é aplicável à sua execução. Com efeito, os três projetos de produção de energia eólica e o projeto de complexos hoteleiros em causa foram aprovados durante o ano de 2005 e o seu impacto na conservação dos habitats naturais não podia, por conseguinte, ser examinado à luz desta diretiva.

46

Além disso, a Comissão não esclarece como foram obtidos os números e os dados indicados nos n.os 42 a 45 do presente acórdão.

47

Por último, quanto às incidências negativas significativas no SIC Kaliakra, a República da Bulgária opõe igualmente o argumento segundo o qual os quatro projetos mencionados pela Comissão na sua ação foram aprovados por este Estado‑Membro durante o ano de 2005, pelo que não pode ser acusada de, eventualmente, não ter cumprido as obrigações de uma diretiva que lhe não era oponível antes da sua adesão à União.

Apreciação do Tribunal de Justiça

48

A título preliminar, importa observar que, tendo em conta as informações prestadas pela República da Bulgária na sua contestação, segundo as quais não autorizou a execução do projeto «TSID — Atlas», a Comissão decidiu excluir esse projeto da presente ação por incumprimento.

49

Além disso, como bem salienta a advogada‑geral nos n.os 71 a 73 das suas conclusões, há que entender esta terceira acusação no sentido de que a Comissão alega que a República da Bulgária não cumpriu, por um lado, as obrigações que decorrem do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats», ao não se ter oposto à execução dos projetos nas ZPE Kaliakra e Belite skali, e, por outro, os deveres de proteção provisórios decorrentes dos acórdãos Dragaggi e o. (C‑117/03, EU:C:2005:16) e Bund Naturschutz in Bayern e o. (C‑244/05, EU:C:2006:579), ao não se ter oposto aos que foram executados no perímetro do SIC Kompleks Kaliakra proposto. Com esta acusação, a Comissão não visa, assim, as decisões de autorização dos projetos adotadas pela República da Bulgária antes da sua adesão à União, mas a sua execução após essa adesão e a deterioração dos sítios supramencionados daí decorrente.

50

Importa, pois, examinar, em primeiro lugar, se o artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats» era suscetível de aplicação, ratione temporis, à situação em causa, no sentido de que esta disposição era suscetível de obrigar a República da Bulgária a opor‑se à execução, nas ZPE Kaliakra e Belite skali, dos projetos «Kaliakra Wind Power», «EVN Enertrag Kavarna», «Vertikal — Petkov & Cie» e «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort».

51

A este respeito, resulta de jurisprudência do Tribunal de Justiça que o artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats» também se aplica a instalações cujo projeto tenha sido aprovado pela autoridade competente antes de a proteção prevista pela referida diretiva se tornar aplicável à zona de proteção em causa (v., neste sentido, acórdão Comissão/Espanha, C‑404/09, EU:C:2011:768, n.o 124).

52

Com efeito, o Tribunal de Justiça já decidiu que, embora esses projetos não estejam submetidos às prescrições relativas ao processo de avaliação prévia das incidências do projeto no sítio em causa, consagradas na diretiva «habitats», a sua execução está abrangida pelo artigo 6.o, n.o 2, desta diretiva (acórdãos Stadt Papenburg, C‑226/08, EU:C:2010:10, n.os 48 e 49, e Comissão/Espanha, C‑404/09, EU:C:2011:768, n.o 125).

53

No caso em apreço, tratando‑se, por um lado, do projeto «Kaliakra Wind Power», que visa a construção de 35 instalações eólicas, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que o mesmo foi autorizado no decurso do ano de 2006 e entrou em funcionamento em 5 de junho de 2008. O projeto «EVN Enertrag Kavarna», que, por seu lado, tinha por objeto a construção de 32 instalações eólicas, foi autorizado em 26 de julho de 2006. Esta última autorização foi, posteriormente, restringida a 20 instalações, das quais oito foram construídas e estão a funcionar desde 8 de junho de 2012. Três outras instalações foram autorizadas no decurso de 2005, no âmbito do projeto «Vertikal — Petkov & Cie». Uma ação contra estas três autorizações deu lugar, em 26 de julho de 2007, a um acordo judicial, na sequência do qual teve início a exploração de duas instalações, respetivamente, em 24 de abril de 2008 e em 14 de fevereiro de 2011, ao passo que a terceira instalação não foi construída.

54

Por outro lado, no que diz respeito ao projeto turístico «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort» na ZPE Belite skali, que abrange a construção de um campo de golfe e de um centro termal, foi emitida uma primeira licença de construção em 22 de dezembro de 2005, enquanto a licença de exploração foi concedida em 6 de abril de 2010.

55

Das considerações tecidas nos n.os 51 e 52 do presente acórdão decorre que a execução destes projetos e a atividade originada pelas instalações que deles resultaram, apesar de terem sido autorizadas antes da adesão da República da Bulgária e antes de as diretivas «aves» e «habitats» se aplicarem a estas autorizações, estão abrangidas pelo artigo 6.o, n.o 2, desta última diretiva.

56

Em segundo lugar, no que toca à acusação de que a República da Bulgária não tomou as medidas adequadas para evitar a deterioração de determinados habitats de espécies e a perturbação causada às aves pela atividade relacionada com as instalações resultantes da execução dos quatro projetos em causa nas ZPE Kaliakra e Belite skali, importa recordar que uma atividade só é conforme com o artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats» se for garantido que não cria nenhuma perturbação suscetível de afetar de maneira significativa os objetivos da referida diretiva, em especial, os respetivos objetivos de conservação (acórdão Comissão/Espanha, C‑404/09, EU:C:2011:768, n.o 126 e jurisprudência aí referida).

57

Daqui decorre que a presente acusação só procederá se a Comissão fizer prova bastante de que a República da Bulgária não tomou as medidas de proteção adequadas que consistem em evitar que as atividades de exploração das instalações resultantes destes projetos — desde que tenham ocorrido após a classificação como ZPE dos sítios de Kaliakra e de Belite skali — deteriorem os habitats de determinadas espécies e provoquem, em detrimento destas, perturbações suscetíveis de ter efeitos significativos à luz do objetivo da diretiva «habitats» de assegurar a conservação destas espécies (v., por analogia, acórdão Comissão/Espanha, C‑404/09, EU:C:2011:768, n.o 128).

58

No entanto, para se poder constatar um incumprimento do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats», não cabe à Comissão provar a existência de uma relação causal entre a exploração das instalações resultantes de um projeto e uma perturbação significativa provocada às espécies em questão. Com efeito, é suficiente que esta instituição demonstre a existência de uma probabilidade ou de um risco de essa exploração provocar tais perturbações (v., neste sentido, acórdão Comissão/Espanha, C‑404/09, EU:C:2011:768, n.o 142 e jurisprudência aí referida).

59

A este respeito, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que, tendo em conta a forte densidade das instalações eólicas implantadas na ZPE Kaliakra, nomeadamente no âmbito do projeto «Kaliakra Wind Power», a sua atividade é suscetível de provocar perturbações significativas e uma deterioração dos habitats de espécies de aves protegidas. O mesmo se diga da parte da ZPE Belite skali afetada pelas instalações do «Thracian Cliffs Golf & Spa», cuja exploração altera as características dos habitats em causa.

60

Tendo em conta as considerações que precedem, há que julgar procedente, nesta medida, a presente acusação invocada pela Comissão.

61

Em contrapartida, quanto, em terceiro lugar, à destruição substancial do habitat prioritário «Estepes ponto‑sarmáticas», de que se fala no n.o 44 do presente acórdão, a República da Bulgária alega, sem ser contestada, que os trabalhos de preparação dos solos que destruíram estes habitats situados no território do SIC Kompleks Kaliakra foram realizados antes da adesão deste Estado‑Membro à União. Por conseguinte, a destruição dos referidos habitats não é suscetível de constituir, ratione temporis, um incumprimento do direito da União.

62

Além disso, há que observar, como salientou a advogada‑geral no n.o 107 das suas conclusões, que se um tipo de habitat já estiver destruído nas superfícies afetadas, a exploração posterior das instalações resultantes da execução dos projetos não poderá deteriorá‑lo ainda mais. Por conseguinte, a ação da Comissão não é procedente a este respeito.

Quanto à segunda acusação, relativa ao incumprimento das disposições do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves », no que diz respeito à aprovação dos projetos na ZICA Kaliakra

Argumentos das partes

63

Com a sua segunda acusação, a Comissão pede que se declare que, ao aprovar os projetos «AES Geo Energy», «Windtech», «Brestiom», «Disib», «Eco Energy» e «Longman Investment» no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves», na interpretação dada pelo Tribunal de Justiça nos acórdãos Comissão/França (C‑96/98, EU:C:1999:580) e Comissão/França (C‑374/98, EU:C:2000:670).

64

A Comissão alega que, ao não ter tomado as medidas adequadas tendo em conta o objetivo de conservação previsto na diretiva «aves» e ao autorizar ou tolerar intervenções que, em primeiro lugar, criam o risco de comprometer seriamente as características ecológicas da parte da ZICA Kaliakra não classificada como ZPE, em segundo lugar, reduzem significativamente a superfície deste sítio, em terceiro lugar, conduzem ao desaparecimento de espécies prioritárias presentes no referido sítio e, por último, levam à destruição desse mesmo sítio ou ao aniquilamento das suas características representativas, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves». A este título, a Comissão alega que, nesta parte da ZICA Kaliakra, estão irremediavelmente perdidos 1450 hectares de terras que abrigam habitats e zonas de alimentação e de repouso para espécies de aves referidas no anexo I da diretiva «aves».

65

Por seu lado, a República da Bulgária presta informações relativas à situação factual de diversos projetos de investimentos e alega, designadamente, que, no ano de 2012, foi introduzido na legislação nacional um prazo de prescrição de cinco anos, que limita, assim, a duração da validade das autorizações emitidas para a execução destes projetos, de modo que todos aqueles cuja execução não foi iniciada no prazo fixado serão suspensos.

Apreciação do Tribunal de Justiça

66

O artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves» exige que os Estados‑Membros tomem as medidas adequadas para evitar, nas ZPE, a poluição ou a deterioração dos habitats, bem como as perturbações que afetem as aves, desde que tenham um efeito significativo tendo em conta os objetivos desse artigo.

67

A este respeito, importa recordar, em primeiro lugar, que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, os Estados‑Membros devem respeitar as obrigações que resultam do artigo 4.o, n.o 4, primeiro período, da diretiva «aves», mesmo que as zonas em causa não tenham sido classificadas como ZPE, embora o devessem ter sido (v. acórdão Comissão/Espanha, C‑186/06, EU:C:2007:813, n.o 27 e jurisprudência aí referida).

68

Conforme resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, os projetos em causa situam‑se em territórios que, como foi observado no n.o 38 do presente acórdão, deviam ter sido objeto de classificação pela República da Bulgária, o que, todavia, só ocorreu posteriormente ao termo, em 22 de agosto de 2012, do prazo fixado no parecer fundamentado.

69

Em segundo lugar, com vista a provar a existência de um incumprimento das obrigações decorrentes do artigo 4.o, n.o 4, primeiro período, da diretiva «aves», conforme salienta a advogada‑geral no n.o 115 das suas conclusões, há que referir, mutatis mutandis, a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de incumprimento do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats», na medida em que a letra desta disposição corresponde, em grande medida, ao artigo 4.o, n.o 4, primeira frase, da diretiva «aves» (v., neste sentido, acórdão Comissão/Irlanda, C‑117/00, EU:C:2002:366, n.o 26 e jurisprudência aí referida).

70

Segundo essa jurisprudência, e conforme resulta do n.o 58 do presente acórdão, deve ser declarada uma violação da disposição em causa, desde que a Comissão demonstre a existência da probabilidade ou do risco de um projeto deteriorar os habitats de espécies de aves protegidas ou provocar perturbações significativas a estas espécies.

71

Por conseguinte, há que examinar se a Comissão demonstrou a existência da probabilidade ou do risco de os projetos em causa na parte da ZICA Kaliakra tardiamente classificada como ZPE provocarem as deteriorações e perturbações referidas no número precedente do presente acórdão.

72

Por um lado, resulta da contestação da República da Bulgária, cujos elementos a este respeito não são contestados pela Comissão, que, relativamente aos três projetos mencionados no n.o 63 do presente acórdão, em concreto, os projetos «Windtech», «Brestiom» e «Eco Energy», apenas foi decidido que não era necessário proceder a uma avaliação de impacto ambiental. Este Estado‑Membro não lhes concedeu nenhuma autorização adicional e as instalações não foram construídas. Entretanto, as decisões sobre a desnecessidade de uma avaliação de impacto ambiental caducaram.

73

Por conseguinte, no que diz respeito a estes três projetos, a segunda acusação da Comissão não procede.

74

Por outro lado, quanto aos outros três projetos em causa no n.o 63 do presente acórdão, denominados «AES Geo Energy», «Disib» e «Longman Investment», resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a República da Bulgária emitiu autorizações adicionais e que as instalações eólicas autorizadas foram construídas. Assim, na sequência de uma avaliação de impacto ambiental realizada no decurso do ano de 2008, o primeiro destes projetos obteve uma licença de construção para 52 turbinas eólicas, cuja exploração foi iniciada em 15 de novembro de 2011. O segundo e o terceiro projeto beneficiaram, respetivamente, também, de uma licença emitida após a adesão da República da Bulgária à União, que levou à construção de duas turbinas eólicas que entraram em funcionamento no decurso do ano de 2008.

75

Ora, conforme já foi afirmado no n.o 59 do presente acórdão, a exploração de instalações eólicas é suscetível de provocar perturbações significativas e uma deterioração dos habitats de espécies de aves protegidas.

76

O facto de, segundo os resultados das observações realizadas pela central eólica «AES Geo Energy», a que se refere a República da Bulgária, as zonas em causa continuarem a ser frequentadas pelos gansos‑de‑pescoço‑ruivo e de, quando as condições de vento são favoráveis, o fluxo migratório se concentrar no sítio de Kaliakra não se opõe a esta conclusão. Com efeito, as obrigações de proteção existem mesmo antes de se verificar uma diminuição do número de aves ou de se concretizar a ameaça de extinção de uma espécie de ave protegida (v., neste sentido, acórdão Comissão/Espanha, C‑186/06, EU:C:2007:813, n.o 36 e jurisprudência aí referida).

77

Além disso, conforme salientou a advogada‑geral no n.o 128 das suas conclusões, estes dados parecem indicar uma perda de atratividade, visto que a utilização das superfícies pelos gansos‑de‑pescoço‑ruivo é inferior relativamente aos picos registados antes da construção das turbinas eólicas.

78

Das considerações que precedem resulta que, ao aprovar os projetos de instalações eólicas «AES Geo Energy», «Disib» e «Longman Investment» no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves».

Quanto à quarta acusação, relativa ao incumprimento das disposições dos artigos 2.°, n.o 1, e 4.°, n. os 2 e 3, da Diretiva 2011/92, bem como do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b)

Argumentos das partes

79

Com a sua quarta acusação, a Comissão alega que, ao não ter avaliado corretamente o efeito cumulativo dos projetos de instalações eólicas cuja construção foi autorizada no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, ou seja, os projetos «AES Geo Energy», «Windtech», «Brestiom», «Disib», «Eco Energy» e «Longman Investman», a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força das disposições conjugadas dos artigos 2.°, n.o 1, e 4.°, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92 e do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b).

80

Segundo a Comissão, em relação a quatro destes projetos, ou seja, os projetos «Windtech», «Brestiom», «Eco Energy» e «Longman Investment», a República da Bulgária decidiu não proceder a uma avaliação de impacto ambiental. Em relação a um deles, o «AES Geo Energy», este Estado‑Membro decidiu realizar semelhante estudo de impacto, sem que, no entanto, o mesmo tivesse em conta quer o efeito cumulativo dos prejuízos provocados na ZICA Kaliakra pelos diferentes projetos autorizados, quer o efeito de afastamento e a perturbação que as instalações eólicas induzem no comportamento das aves, quer o efeito de barreira das turbinas, quer a perda e a deterioração que estas instalações comportam em detrimento dos diferentes habitats de aves.

81

Em apoio desta acusação, a Comissão alega ainda que, quanto aos quatro projetos que não foram objeto de um estudo de impacto ambiental, as decisões nesse sentido estão, no essencial, redigidas de forma idêntica. Por outro lado, tais decisões não se fundamentam em argumentos pertinentes que demonstrem que o projeto em causa não terá incidências negativas significativas no território designado como ZICA e identificado para inclusão na rede Natura 2000.

82

A República da Bulgária alega que, nas decisões mencionadas no número anterior do presente acórdão, se afirmou expressamente que não era expectável qualquer efeito cumulativo com outros projetos. Além disso, este Estado‑Membro defende que os projetos «Disib» e «AES Geo Energy» devem ser excluídos da presente ação na medida em que os pedidos de avaliação da necessidade de realizar um estudo de impacto ambiental foram apresentados antes de 1 de janeiro de 2007.

Apreciação do Tribunal de Justiça

83

A título preliminar, há que salientar, por um lado, que a Comissão considerou que houve violação da Diretiva 2011/92, apesar de as decisões que invoca em apoio da sua ação terem sido adotadas pela República da Bulgária no decurso do ano de 2007, numa altura em que estava em vigor a Diretiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO L 175, p. 40; EE 15 F6 p. 9), conforme alterada pela Diretiva 2003/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de maio de 2003 (JO L 156, p. 17). No entanto, como bem sublinha a advogada‑geral no n.o 139 das suas conclusões, as disposições das Diretivas 85/337 e 2011/92 pertinentes no caso em apreço são substancialmente idênticas.

84

Por outro lado, resulta da réplica da Comissão que, tendo em conta as informações prestadas pela República da Bulgária na sua contestação, esta instituição pretende excluir desta acusação os projetos de instalações eólicas «Disib» e «AES Geo Energy».

85

Nestas condições, há que examinar, em primeiro lugar, se o Tribunal de Justiça dispõe de elementos suficientes para declarar que a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.°, n.o 1, e 4.°, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92, bem como do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b), ao não avaliar corretamente o efeito cumulativo dos projetos das instalações eólicas «Windtech», «Brestiom», «Eco Energy» e «Longman Investment» aprovados nas zonas da ZICA Kaliakra que só foram classificadas como ZPE depois da data fixada pela Comissão no seu parecer fundamentado.

86

Como se afirmou no n.o 72 do presente acórdão, quanto aos projetos «Windtech», «Brestiom» e «Eco Energy», não foi concedida nenhuma licença de construção e, segundo as indicações fornecidas pela República da Bulgária, as decisões sobre a necessidade de uma avaliação de impacto ambiental caducaram por não terem sido executadas no prazo de cinco anos preceituado pela legislação nacional. Só o projeto «Longman Investment» foi executado e está em funcionamento desde 16 de junho de 2008.

87

A este respeito, quanto aos projetos «Windtech», «Brestiom» e «Eco Energy», nenhum elemento dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça permite demonstrar uma violação do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2011/92.

88

Com efeito, é verdade que as decisões sobre a necessidade de uma avaliação de impacto ambiental ainda eram válidas na data fixada pela Comissão no parecer fundamentado complementar, ou seja, em 22 de agosto de 2012, e só caducaram cinco anos após a sua adoção, ou seja, respetivamente, em 24 e 28 de setembro de 2012. Ora, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, e as alterações ocorridas posteriormente não podem ser tomadas em consideração pelo Tribunal de Justiça (v., neste sentido, acórdão Comissão/Bélgica, C‑421/12, EU:C:2014:2064, n.o 45).

89

Todavia, conforme resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça e como salienta a advogada‑geral nos n.os 148 e 149 das suas conclusões, as decisões que considerem desnecessária a realização de um estudo de impacto ambiental de um projeto não equivalem, em direito nacional, a uma decisão de autorização da execução desse mesmo projeto, o qual carece ainda de uma licença de construção. Por conseguinte, há que declarar que a República da Bulgária não pode ser criticada por ter dispensado os projetos «Windtech», «Brestiom» e «Eco Energy» da realização de um estudo de impacto ambiental «antes de concedida a aprovação» na aceção do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2011/92. Não obstante, na medida em que a decisão sobre a necessidade de proceder a uma avaliação de impacto ambiental deve, contudo, ser adotada em conformidade com esta diretiva, nomeadamente com o artigo 4.o, n.os 2 e 3, e com o respetivo anexo III, é possível uma violação destas disposições, mesmo que o projeto nunca tenha obtido todas as autorizações necessárias.

90

Quanto ao projeto executado «Longman Investment», relativamente ao qual foi decidido que não era necessário realizar um estudo de impacto ambiental antes de concedida a aprovação necessária, há que concluir que a República da Bulgária pode não ter cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força quer do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2011/92 quer do artigo 4.o, n.os 2 e 3, e do respetivo anexo III.

91

No que diz respeito, em segundo lugar, à verificação prévia da necessidade de uma avaliação de impacto ambiental, importa recordar que, nos termos do artigo 4.o, n.o 2, primeiro parágrafo, da Diretiva 2011/92, os Estados‑Membros determinam, com base numa análise caso a caso ou com base nos limiares ou nos critérios por eles fixados, se os projetos abrangidos pelo anexo II desta diretiva devem ser submetidos a uma avaliação de impacto ambiental. Entre esses projetos figuram, no ponto 3 deste anexo, as instalações para aproveitamento da energia eólica para a produção de eletricidade (centrais eólicas).

92

Quanto à fixação desses limiares ou critérios, importa recordar que, na verdade, o artigo 4.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 85/337 confere aos Estados‑Membros uma margem de apreciação nessa matéria. Contudo, essa margem de apreciação está limitada pela obrigação, enunciada no artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva, de submeter a um estudo de impacto ambiental os projetos suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização (acórdãos Salzburger Flughafen, C‑244/12, EU:C:2013:203, n.o 29, e Marktgemeinde Straßwalchen e o., C‑531/13, EU:C:2015:79, n.o 40).

93

Assim, os critérios e os limiares mencionados no artigo 4.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 85/337 têm o objetivo de facilitar a apreciação das características concretas de um projeto, para determinar se o mesmo está sujeito à obrigação de uma avaliação de impacto ambiental (acórdãos Salzburger Flughafen, C‑244/12, EU:C:2013:203, n.o 30, e Marktgemeinde Straßwalchen e o., C‑531/13, EU:C:2015:79, n.o 41).

94

Daqui resulta que as autoridades nacionais competentes a quem tenha sido apresentado um pedido de autorização de um projeto incluído no anexo II desta diretiva devem proceder a um exame especial, para apurarem se, tendo em conta os critérios previstos no anexo III da referida diretiva, se deve proceder a uma avaliação de impacto ambiental (acórdão Marktgemeinde Straßwalchen e o., C‑531/13, EU:C:2015:79, n.o 42).

95

Quanto à questão de saber se, tendo em conta a aplicação conjugada do artigo 4.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92 e do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b), convinha examinar o efeito cumulativo dos diferentes projetos eólicos aprovados para a ZICA Kaliakra, o Tribunal de Justiça já declarou que há que apreciar as características de um projeto, nomeadamente, em relação aos seus efeitos cumulativos com outros projetos. Na verdade, o facto de o efeito cumulativo de um projeto com outros projetos não ser tido em conta pode ter o resultado prático de o subtrair à obrigação de avaliação, quando, considerado em conjunto com outros projetos, seja suscetível de ter efeitos significativos no ambiente (acórdão Marktgemeinde Straßwalchen e o., C‑531/13, EU:C:2015:79, n.o 43 e jurisprudência aí referida).

96

Daqui resulta que compete a uma autoridade nacional, sempre que verifique que um projeto deve ser sujeito a uma avaliação de impacto ambiental, examinar o impacto que este pode ter conjuntamente com outros projetos (acórdão Marktgemeinde Straßwalchen e o., C‑531/13, EU:C:2015:79, n.o 45). Ora, no caso em apreço, decorre dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que as decisões em questão se limitam a constatar que não era expectável qualquer efeito cumulativo. Como salienta a advogada‑geral no n.o 161 das suas conclusões, a simples alegação, pela República da Bulgária, de que não haverá efeito cumulativo não prova, contudo, que esta conclusão tenha sido alcançada com base numa apreciação circunstanciada, visto que o referido Estado‑Membro não fornece, aliás, elementos de prova a esse respeito.

97

Por conseguinte, há que concluir que, por um lado, ao não ter avaliado de forma apropriada o efeito cumulativo, no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, dos projetos de instalações eólicas «Windtech», «Brestiom», «Eco Energy» e «Longman Investman», quando da verificação da necessidade de proceder a uma avaliação de impacto ambiental, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92, bem como do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b), e, por outro, ao ter autorizado, contudo, a execução do projeto de instalações eólicas «Longman Investment», este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva.

98

Resulta das considerações precedentes que, ao:

não ter incluído a totalidade dos territórios das zonas importantes para a conservação das aves na ZPE Kaliakra, a República da Bulgária não classificou como ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, à conservação, por um lado, das espécies biológicas referidas no anexo I da diretiva «aves» e, por outro, das espécies migratórias não referidas neste anexo, mas cuja ocorrência seja regular na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação desta diretiva, e, por conseguinte, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.os 1 e 2, da dita diretiva;

aprovar a execução dos projetos «AES Geo Energy», «Disib» e «Longman Investment» no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 4, da diretiva «aves»;

aprovar a execução dos projetos «Kaliakra Wind Power», «EVN Enertrag Kavarna» e «Vertikal — Petkov & Cie» assim como «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort» no território, respetivamente, das ZPE Kaliakra e Belite skali, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da diretiva «habitats»;

não ter, por um lado, avaliado corretamente o efeito cumulativo dos projetos «Windtech», «Brestiom», «Eco Energy» e «Longman Investment» no território da ZICA Kaliakra que não foi classificado como ZPE, mas que o deveria ter sido, e, por outro, ao ter autorizado, contudo, a execução do projeto «Longman Investment», este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força, respetivamente, por um lado, do artigo 4.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92 e do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b), e, por outro, do artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva.

Quanto às despesas

99

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da República da Bulgária e tendo sido julgadas procedentes, no essencial, as acusações que lhe foram dirigidas, há que condená‑la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

 

1)

Ao:

não ter incluído a totalidade dos territórios das zonas importantes para a conservação das aves na zona de proteção especial que abrange a região de Kaliakra, a República da Bulgária não classificou como zona de proteção especial os territórios mais apropriados, em número e em extensão, à conservação, por um lado, das espécies biológicas referidas no anexo I da Diretiva 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2009, relativa à conservação das aves selvagens, e, por outro, das espécies migratórias não referidas neste anexo, mas cuja ocorrência seja regular na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação desta diretiva, de modo que este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.os 1 e 2, da dita diretiva;

aprovar a execução dos projetos «AES Geo Energy», «Disib» e «Longman Investment» no território da zona importante para a conservação das aves que abrange a região de Kaliakra que não foi classificado como zona de proteção especial, mas que o deveria ter sido, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 4, da Diretiva 2009/147;

aprovar a execução dos projetos «Kaliakra Wind Power», «EVN Enertrag Kavarna» e «Vertikal — Petkov & Cie» assim como «Thracian Cliffs Golf & Spa Resort» no território, respetivamente, das zonas de proteção especial que abrangem as regiões de Kaliakra e de Belite skali, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens;

não ter, por um lado, avaliado corretamente o efeito cumulativo dos projetos «Windtech», «Brestiom», «Eco Energy» e «Longman Investment» no território da zona importante para a conservação das aves que abrange a região de Kaliakra que não foi classificado como zona de proteção especial, mas que o deveria ter sido, e, por outro, ao ter autorizado, contudo, a execução do projeto «Longman Investment», a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força, respetivamente, por um lado, do artigo 4.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2011/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente, e do respetivo anexo III, ponto 1, alínea b), e, por outro, do artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva.

 

2)

A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

 

3)

A República da Bulgária é condenada nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 )   Língua do processo: búlgaro.

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