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Document 62013CJ0447

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 13 de novembro de 2014.
    Riccardo Nencini contra Parlamento Europeu.
    Recurso de decisão do Tribunal Geral – Membro do Parlamento Europeu – Subsídios destinados a cobrir as despesas efetuadas no exercício das funções parlamentares – Repetição do indevido – Recuperação – Prescrição – Prazo razoável.
    Processo C‑447/13 P.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2014:2372

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    13 de novembro de 2014 ( *1 )

    «Recurso de decisão do Tribunal Geral — Membro do Parlamento Europeu — Subsídios destinados a cobrir as despesas efetuadas no exercício das funções parlamentares — Repetição do indevido — Recuperação — Prescrição — Prazo razoável»

    No processo C‑447/13 P,

    que tem por objeto um recurso de decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 2 de agosto de 2013,

    Riccardo Nencini, residente em Barberino di Mugello (Itália), representado por M. Chiti, avvocato,

    recorrente,

    sendo a outra parte no processo:

    Parlamento Europeu, representado por S. Seyr e N. Lorenz, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    recorrido em primeira instância,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, K. Lenaerts, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Segunda Secção, J.‑C. Bonichot (relator), A. Arabadjiev e J. L. da Cruz Vilaça, juízes,

    advogado‑geral: M. Szpunar,

    secretário: M. Aleksejev, administrador,

    vistos os autos e após a audiência de 3 de abril de 2014,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 19 de junho de 2014,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    Com o seu recurso, R. Nencini pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia Nencini/Parlamento (T‑431/10 e T‑560/10, EU:T:2013:290, a seguir «acórdão recorrido»), por um lado, na medida em que, no processo T‑560/10, julgou improcedentes os seus pedidos relativos, a título principal, à anulação da decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu, de 7 de outubro de 2010, relativa à recuperação de determinados montantes recebidos pelo recorrente, antigo membro do Parlamento Europeu, a título de reembolso de despesas de viagem e de assistência parlamentar que foram indevidamente pagas, e da nota de débito do diretor‑geral da Direção‑Geral das Finanças do Parlamento n.o 315653, de 13 de outubro de 2010, e de qualquer ato conexo ou prévio, e, a título subsidiário, à remessa do processo ao secretário‑geral do Parlamento para que determine de novo equitativamente o montante cuja recuperação é pedida, e, por outro, na medida em que esse acórdão pôs a seu cargo a totalidade das despesas efetuadas no processo T‑560/10 e parte das despesas do processo T‑431/10.

    Antecedentes do litígio

    2

    Os antecedentes do litígio foram expostos nos n.os 1 a 8 do acórdão recorrido e podem ser resumidos da seguinte forma.

    3

    O recorrente foi membro do Parlamento durante a legislatura que decorreu entre o ano de 1994 e o ano de 1999.

    4

    Na sequência de uma investigação do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF), o Parlamento iniciou, em dezembro de 2006, um processo de verificação, em matéria de despesas de assistência parlamentar e de viagem, que visava, designadamente, o recorrente.

    5

    Em 16 de julho de 2010, o secretário‑geral do Parlamento adotou a decisão n.o 311847 relativa a um processo de recuperação de determinados montantes indevidamente pagos a título de reembolso de despesas de viagem e de assistência parlamentar respeitantes ao recorrente (a seguir «primeira decisão do secretário‑geral»).

    6

    Na primeira decisão do secretário‑geral, redigida em inglês, considerou‑se que o montante de 455903,04 euros (do qual 46550,88 euros se referem às despesas de viagem e 409 352,16 euros aos subsídios de assistência parlamentar) (a seguir «montante controvertido») tinha sido, nos termos da regulamentação sobre as despesas e os subsídios dos deputados do Parlamento, indevidamente pago ao recorrente durante o seu mandato parlamentar. Uma nota de débito do diretor‑geral da Direção‑Geral das Finanças do Parlamento, com o n.o 312331, de 4 de agosto de 2010, relativa à cobrança do montante controvertido (a seguir «primeira nota de débito»), foi notificada ao recorrente.

    7

    Em 7 de outubro de 2010, o secretário‑geral do Parlamento adotou uma decisão redigida em italiano, que substituía a primeira decisão do secretário‑geral (a seguir «segunda decisão do secretário‑geral»), acompanhada da nota de débito do diretor‑geral da Direção‑Geral das Finanças do Parlamento n.o 315653, do mesmo dia, que substituiu a primeira nota de débito quanto ao montante controvertido (a seguir «segunda nota de débito»). Estes dois atos foram comunicados ao recorrente em 13 de outubro de 2010.

    Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

    8

    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de setembro de 2010, o recorrente impugnou, no processo T‑431/10, a primeira decisão do secretário‑geral, a primeira nota de débito e todos os atos conexos ou prévios.

    9

    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 10 de dezembro de 2010, o recorrente impugnou, no processo T‑560/10, a segunda decisão do secretário‑geral e a segunda nota de débito, bem como a primeira decisão do secretário‑geral, a primeira nota de débito e todos os atos conexos ou prévios.

    10

    Os pedidos de medidas provisórias apresentados paralelamente pelo recorrente foram indeferidos pelos despachos do presidente do Tribunal Geral Nencini/Parlamento (T‑431/10 R, EU:T:2010:441) e Nencini/Parlamento (T‑560/10 R, EU:T:2011:40).

    11

    Os processos T‑431/10 e T‑560/10 foram apensados para efeitos da fase escrita, da fase oral e do acórdão.

    12

    Na audiência de 18 de abril de 2012, o recorrente informou o Tribunal Geral da sua desistência do recurso no processo T‑431/10.

    13

    No acórdão recorrido, o Tribunal Geral homologou a desistência do recorrente no processo T‑431/10 e ordenou, consequentemente, o cancelamento desse processo do registo.

    14

    Decidindo sobre o processo T‑560/10, o Tribunal Geral considerou que os pedidos de anulação do recorrente relativos a «todos os atos conexos ou prévios» à segunda decisão do secretário‑geral eram dirigidos contra atos puramente preparatórios e eram, consequentemente, inadmissíveis.

    15

    Considerou, além disso, que os pedidos do recorrente relativos à anulação da segunda nota de débito eram dirigidos contra um ato puramente confirmativo da segunda decisão do secretário‑geral e, por conseguinte, também eram inadmissíveis.

    16

    Quanto ao mérito, o Tribunal Geral julgou os pedidos do recorrente relativos à anulação da segunda decisão do secretário‑geral improcedentes.

    17

    Através do acórdão recorrido, o Tribunal Geral condenou o recorrente nas despesas no processo T‑560/10, incluindo as despesas do processo de medidas provisórias e condenou cada uma das partes a suportar as suas próprias despesas no processo T‑431/10, incluindo as despesas do processo de medidas provisórias.

    Recurso

    18

    A recorrente conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

    anular o acórdão recorrido na medida em que julga os seus pedidos de anulação da segunda decisão do secretário‑geral improcedentes;

    a título subsidiário, remeter o processo ao secretário‑geral do Parlamento para que determine equitativamente o montante devido;e

    condenar o Parlamento nas despesas efetuadas no Tribunal Geral nos processos T‑431/10 e T‑560/10, bem como nas despesas efetuadas no processo no Tribunal de Justiça.

    19

    O Parlamento conclui pedindo que seja negado provimento ao presente recurso e que o recorrente seja condenado nas despesas.

    Quanto ao recurso

    20

    O recorrente invoca cinco fundamentos de recurso. Os seus quatro primeiros fundamentos estão ligados aos motivos pelos quais o Tribunal Geral rejeitou a sua argumentação com vista à anulação da segunda decisão do secretário‑geral. O seu quinto fundamento refere‑se à condenação nas despesas, pelo Tribunal Geral, tanto no processo T‑431/10 como no processo T‑560/10.

    21

    O Parlamento alega que esses fundamentos são inadmissíveis ou improcedentes.

    Quanto aos pedidos do recurso relativos à condenação nas despesas no processo T‑431/10

    22

    Há que recordar que, por força do artigo 58.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, não pode ser interposto recurso que tenha por único fundamento o montante das despesas ou a determinação da parte que as deve suportar.

    23

    No caso vertente, há que salientar que o dispositivo do acórdão recorrido inclui, no que se refere ao processo T‑431/10, os n.os 3 e 4, segundo os quais, respetivamente, esse processo é cancelado do registo do Tribunal Geral e cada uma das partes suporta as suas próprias despesas no referido processo.

    24

    Contudo, no presente recurso, o recorrente contesta apenas os fundamentos da parte do acórdão recorrido que se referem ao n.o 4 do seu dispositivo, relativo às despesas.

    25

    Ora, conforme resulta da disposição do Estatuto do Tribunal de Justiça acima mencionada, a fiscalização da determinação da parte que deve suportar as despesas processuais não se insere na competência deste último (v., designadamente, despacho Eurostrategies/Comissão, C‑122/07 P, EU:C:2007:743, n.o 24).

    26

    Os pedidos do recurso, na parte em que se referem à condenação nas despesas no processo T‑431/10, são inadmissíveis. Os pedidos do recurso, na parte em que se referem a este processo, devem, como tal, ser julgados improcedentes.

    Quanto aos pedidos do recurso relativos ao processo T‑560/10

    Argumentos das partes

    27

    Tendo o recorrente invocado sem sucesso, em primeira instância, que o crédito que lhe é exigido se encontrava prescrito, alega, através do primeiro fundamento de recurso, que o Tribunal Geral violou as regras da prescrição aplicáveis no caso vertente. Com efeito, na determinação da data em que começa a correr o prazo de prescrição, o Tribunal Geral cometeu, em primeiro lugar, um erro na interpretação do artigo 73.o‑A do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho, de 25 de junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 248, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 1995/2006 do Conselho, de 13 de dezembro de 2006 (JO L 390, p. 1, a seguir «regulamento financeiro»), e do artigo 85.o‑B do Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002 da Comissão, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 (JO L 357, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 478/2007 da Comissão, de 23 de abril de 2007 (JO L 111, p. 13, a seguir «regulamento de execução»).

    28

    Segundo o recorrente, sob pena de infringir os princípios da segurança jurídica e da proteção efetiva, o prazo de prescrição quinquenal previsto pela norma hierarquicamente superior, a saber, o artigo 73.o‑A do regulamento financeiro, é, no que se refere ao período durante o qual deve ser determinado o direito de crédito, de natureza diferente do prazo referido no artigo 85.o‑B do regulamento de execução, que se aplica apenas ao período durante o qual o crédito deve ser recuperado. A data em que esses dois prazos começam a correr não pode, portanto, ser a mesma, ao contrário do que o Tribunal Geral considerou.

    29

    Embora a interpretação proposta não tenha sido admitida, o recorrente invoca, em segundo lugar, a título de exceção, a ilegalidade desses dois regulamentos, na medida em que violam os princípios gerais que regulam a prescrição e os princípios da segurança jurídica e da proteção efetiva, bem como os direitos de defesa de que beneficia o devedor. Em terceiro lugar, o recorrente imputa ao Tribunal Geral o facto de ter apreciado autonomamente o argumento invocado em apoio do fundamento relativo à violação das regras da prescrição, que se baseava no desrespeito, pelo Parlamento, do prazo razoável para determinar o seu crédito.

    30

    O Parlamento alega que esse fundamento é inadmissível na medida em que, por um lado, o recorrente invoca os mesmos argumentos que apresentou em primeira instância, segundo os quais existem dois prazos de prescrição. Por outro lado, a exceção de ilegalidade é invocada pela primeira vez, no âmbito do presente recurso.

    31

    O Parlamento salienta que, em todo o caso, o referido fundamento é improcedente, uma vez que o Tribunal Geral aplicou corretamente as disposições perfeitamente claras dos artigos 73.°‑A do regulamento financeiro e 85.°‑B do regulamento de execução, artigos esses que foram invocados pelo próprio recorrente.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    – Quanto à admissibilidade do primeiro fundamento do recurso, na parte em que se refere à interpretação dos artigos 73.°‑A do regulamento financeiro e 85.°‑B do regulamento de execução

    32

    Por força dos artigos 256.° TFUE, 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e 169.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, um recurso de uma decisão do Tribunal Geral deve indicar de modo preciso os elementos impugnados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido. Não respeita esta exigência um recurso que, sem sequer conter uma argumentação especificamente destinada a identificar o erro de direito de que alegadamente padece o acórdão recorrido, se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e argumentos já alegados no Tribunal Geral.

    33

    Em contrapartida, quando um recorrente contesta a interpretação ou a aplicação do direito da União feita pelo Tribunal Geral, as questões de direito examinadas em primeira instância podem ser novamente discutidas em sede de recurso. Com efeito, se um recorrente não pudesse assim basear o seu recurso em fundamentos e argumentos já utilizados pelo Tribunal Geral, o processo de recurso da decisão do Tribunal Geral ficaria privado de uma parte do seu sentido.

    34

    Ora, o primeiro fundamento de recurso destina‑se, precisamente, a pôr em causa a interpretação do regulamento financeiro e do regulamento de execução adotada pelo Tribunal Geral para afastar o primeiro fundamento invocado em primeira instância. O recorrente põe assim em causa a resposta expressa desse tribunal a uma questão de direito no acórdão recorrido, que pode ser objeto de fiscalização pelo Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso.

    35

    O primeiro fundamento do recurso deve, pois, ser julgado admissível, na medida em que se refere à interpretação, pelo Tribunal Geral, dos artigos 73.°‑A do regulamento financeiro e 85.°‑B do regulamento de execução.

    – Quanto à procedência do primeiro fundamento de recurso, na parte em que se refere à interpretação, pelo Tribunal Geral, dos artigos 73.°‑A do regulamento financeiro e 85.°‑B do regulamento de execução

    36

    Importa recordar que, por um lado, segundo o artigo 73.o‑A do regulamento financeiro, «[s]em prejuízo das disposições da regulamentação específica e da aplicação da Decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios [da União Europeia], os créditos [da União] sobre terceiros, bem como os créditos de terceiros sobre [a União] são sujeitos a um prazo de prescrição de cinco anos. A data a considerar para o cálculo do prazo de prescrição e as condições para a sua interrupção serão fixadas nas normas de execução». Por outro lado, o artigo 85.o‑B, n.o 1, primeiro parágrafo, do regulamento de execução, «[o] prazo de prescrição dos créditos [da União] sobre terceiros começa a correr na data em que termina o prazo comunicado ao devedor na nota de débito».

    37

    Para afastar o fundamento do recorrente relativo ao facto de, à data da adoção da segunda decisão do secretário‑geral, 7 de outubro de 2010, a ação do Parlamento que visava obter a repetição do montante controvertido ter prescrito, nos termos do artigo 73.o‑A do regulamento financeiro, o Tribunal Geral, em primeiro lugar, considerou, em substância, nos n.os 39 e 40 do acórdão recorrido, que, segundo as disposições conjugadas desse artigo e do artigo 85.o‑B do regulamento de execução, o prazo de prescrição só começou a correr na data‑limite comunicada ao recorrente na segunda nota de débito, ou seja, em 20 de janeiro de 2011. Concluiu, no n.o 41 do acórdão recorrido, que, em 7 de outubro de 2010, o prazo de prescrição ainda não tinha começado a correr e que, por conseguinte, nessa data, ainda não tinha prescrito.

    38

    Em segundo lugar, o Tribunal Geral considerou, no n.o 43 do acórdão recorrido, que o recorrente também pretendera imputar ao Parlamento o não cumprimento das exigências que lhe incumbem nos termos do princípio do prazo razoável, que se opõe, atendendo à exigência fundamental de segurança jurídica, a que as instituições da União possam retardar indefinidamente o exercício dos seus poderes. O Tribunal Geral recordou que o dever de respeitar um prazo razoável na condução dos processos administrativos constitui um princípio geral do direito da União, cuja observância é assegurada pelo juiz da União, e que esse princípio é retomado, como componente do direito a uma boa administração, pelo artigo 41.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

    39

    Após ter considerado que o respeito de um prazo razoável é necessário em todos os casos em que, no silêncio dos textos aplicáveis, os princípios da segurança jurídica ou da proteção da confiança legítima obstem a que as instituições da União possam agir sem limite de tempo, o Tribunal Geral verificou, nos n.os 45 e 46 do acórdão recorrido, que, no caso vertente, nem o regulamento financeiro, nem o regulamento de execução precisam o prazo em que uma nota de débito deve ser comunicada e que, consequentemente, lhe cabe verificar se o Parlamento respeitou as obrigações que lhe incumbem nos termos do princípio do prazo razoável.

    40

    Nos n.os 47 e 49 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou, por um lado, que o período de tempo que decorreu entre o fim do mandato parlamentar do recorrente, em 1999, e a data da adoção da segunda decisão do secretário‑geral, 7 de outubro de 2010, não é isento de críticas na ótica do princípio do prazo razoável. Por outro lado, os factos imputados ao interessado estavam ligados a documentos contabilísticos já então na posse do Parlamento, cuja atenção, quanto ao risco de erros, devia, de resto, ter sido suscitada por uma carta do recorrente de 13 de julho de 1999 na qual solicitava um esclarecimento acerca das modalidades de reembolso das despesas de assistência parlamentar.

    41

    O Tribunal Geral concluiu, no n.o 50 do acórdão recorrido, que o processo de verificação iniciado pelo Parlamento podia ter sido diligenciado mais cedo e que a segunda decisão do secretário‑geral também podia ter sido adotada mais cedo, pelo que o Parlamento não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam nos termos do princípio do prazo razoável.

    42

    Todavia, considerou que o fundamento relativo à violação do princípio do prazo razoável devia ser julgado improcedente porque apenas pode conduzir à anulação de um ato se a referida violação tiver afetado o exercício dos direitos de defesa do seu destinatário. Ora, o Tribunal Geral considerou, no n.o 52 do acórdão recorrido, que, no caso vertente, o recorrente não invocou, nas observações que apresentou a esse respeito, nenhum argumento relativo a um prejuízo para os seus direitos de defesa devido a essa violação.

    43

    A este propósito, importa salientar que o artigo 73.o‑A do regulamento financeiro fixa uma regra geral que prevê um prazo de prescrição dos créditos da União de cinco anos, e remete a fixação da data a considerar para o cálculo desse prazo para as normas de execução que, por força do artigo 183.o desse regulamento, devem ser adotadas pela Comissão Europeia.

    44

    Decorre destas disposições, por um lado, que o artigo 73.o‑A do regulamento financeiro não pode, por si só, sem as suas normas de execução, ser utilmente invocado para provar que um crédito da União prescreveu.

    45

    Por outro lado, ao fixar uma regra geral que prevê um prazo de prescrição de cinco anos, o legislador da União considerou que esse prazo era suficiente para proteger os interesses do devedor relativamente às exigências dos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, e para permitir aos órgãos da União obter o reembolso de quantias indevidamente pagas. Conforme salientou o advogado‑geral no n.o 50 das suas conclusões, o artigo 73.o‑A do regulamento financeiro visa, designadamente, limitar no tempo a possibilidade de cobrança dos créditos da União sobre terceiros, a fim de satisfazer o princípio da boa gestão financeira. As normas de execução da regra assim instituída pelo artigo 73.o‑A só podem ser adotadas em conformidade com os esses objetivos.

    46

    A este respeito, o artigo 85.o‑B do regulamento de execução fixa o início da contagem do prazo de prescrição a partir da data‑limite comunicada ao devedor na nota de débito, ou seja, no documento pelo qual o apuramento de um crédito pelo gestor orçamental é levado ao conhecimento do devedor a quem é fixada uma data‑limite de pagamento, nos termos do artigo 78.o do regulamento de execução.

    47

    Conforme salientou o Tribunal Geral no n.o 45 do acórdão recorrido, importa todavia constatar que nem o regulamento financeiro, nem o regulamento de execução precisam o prazo em que uma nota de débito deve ser comunicada a partir da data do facto gerador do crédito em causa.

    48

    Como tal, conforme se recordou no n.o 44 do acórdão recorrido, o princípio da segurança jurídica exige, no silêncio dos textos aplicáveis, que a instituição em causa proceda a essa comunicação num prazo razoável. Com efeito, se tal não ocorrer, o gestor orçamental, a quem compete determinar, na nota de débito, a data‑limite de pagamento que, nos próprios termos do artigo 85.o‑B do regulamento de execução, constitui o início da contagem do prazo de prescrição, pode fixar livremente a data desse início de contagem, sem ligação com o momento em que o crédito em causa surgiu, o que, manifestamente, vai contra o princípio da segurança jurídica e da finalidade do artigo 73.o‑A do regulamento financeiro.

    49

    A este respeito, cabe admitir, tendo em conta esse artigo 73.o‑A, que se deve presumir que o prazo de comunicação de uma nota de débito não é razoável quando essa comunicação tem lugar depois de um período de cinco anos a contar do momento em que a instituição estava normalmente em condições de exigir o seu crédito. Esta presunção só pode ser ilidida se a instituição em causa provar que, apesar das diligências efetuadas, o atraso na sua ação se deve ao comportamento do devedor, designadamente às suas manobras dilatórias ou à sua má‑fé. Na falta dessa prova, deve então constatar‑se que a instituição não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam nos termos do princípio do prazo razoável.

    50

    No caso vertente, conforme declarou o Tribunal Geral nos n.os 46 a 50 do acórdão recorrido, o Parlamento só adotou e comunicou a segunda decisão do secretário‑geral e a segunda nota de débito ao recorrente em outubro de 2010, sendo que o mandato parlamentar do interessado terminou no final de 1999, que o Parlamento tomou conhecimento dos factos em questão em 18 de março de 2005, data em que o relatório final do OLAF lhe foi transmitido, e que dispunha, antes dessa data, dos documentos contabilísticos referentes a esses factos. Não havendo provas de um comportamento do interessado suscetível de explicar esse atraso, o Tribunal Geral considerou corretamente que, no caso vertente, o Parlamento não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam nos termos do princípio do prazo razoável.

    51

    Todavia, tendo considerado, nos n.os 51 e 52 do acórdão recorrido, que essa violação do princípio do prazo razoável não podia implicar a anulação da segunda decisão do secretário‑geral, uma vez que o recorrente não provou que a referida violação afetou os seus direitos de defesa, o Tribunal Geral errou quanto às consequências a retirar da violação do princípio do prazo razoável, dado que o legislador da União adotou uma disposição geral que impõe às instituições da União que ajam dentro de um determinado prazo.

    52

    Com efeito, ao adotar, como se referiu no n.o 45 do presente acórdão, uma regra geral segundo a qual, conforme resulta do artigo 73.o‑A do regulamento financeiro, os créditos da União sobre terceiros prescrevem no termo de um prazo de cinco anos, o legislador da União pretendeu conferir aos eventuais devedores da União uma garantia segundo a qual, findo esse prazo, não podem, em princípio, segundo as exigências de segurança jurídica e de proteção da confiança legítima, ser objeto de medidas de cobrança desses créditos, relativamente aos quais não têm de provar que não são devedores.

    53

    Importa, pois, ter em conta a vontade claramente expressa do legislador da União de limitar no tempo a possibilidade de as instituições procederem à cobrança dos créditos da União sobre terceiros, para tirar consequências da constatação de um incumprimento de uma dessas instituições das obrigações que lhe incumbiam nos termos do princípio do prazo razoável.

    54

    Atendendo às exigências de segurança jurídica e de proteção da confiança legítima subjacentes a essa vontade do legislador, não é pertinente, no caso vertente, a jurisprudência, recordada pelo Tribunal Geral no n.o 51 do acórdão recorrido, segundo a qual uma violação do princípio do prazo razoável apenas pode conduzir à anulação do ato impugnado se a referida violação tiver afetado os direitos de defesa.

    55

    Nestas condições, uma vez que, no caso vertente, o Tribunal Geral verificou que o Parlamento não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam nos termos do princípio do prazo razoável, não podia, sem com isso cometer um erro de direito, abster‑se de anular a segunda decisão do secretário‑geral por o recorrente não ter invocado uma violação dos seus direitos de defesa.

    56

    Daí decorre que o Tribunal Geral errou ao rejeitar o primeiro fundamento do recorrente.

    57

    À luz das considerações precedentes, e sem que seja necessário examinar os outros argumentos e fundamentos apresentados pelas partes, há que anular o acórdão recorrido na parte que respeita ao processo T‑560/10.

    Quanto ao recurso no Tribunal Geral

    58

    Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, este último pode, em caso de anulação do acórdão recorrido, decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

    59

    No caso em apreço, o Tribunal de Justiça considera que o recurso de anulação interposto por R. Nencini no Tribunal Geral está em condições de ser julgado e que, como tal, há que decidi‑lo definitivamente.

    60

    O primeiro fundamento do recorrente, relativo à prescrição e a uma violação do princípio do prazo razoável, deve ser julgado procedente pelos motivos expostos nos n.os 48 a 50 do presente acórdão.

    61

    Por conseguinte, há que anular a segunda decisão do secretário‑geral e a segunda nota de débito.

    Quanto às despesas

    62

    Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado improcedente ou se o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

    63

    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Ao abrigo desta mesma disposição, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal de Justiça pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

    64

    No caso vertente, deve salientar‑se, por um lado, que o recorrente foi vencido no seu recurso no que se refere ao processo T‑431/10. Por outro lado, o Parlamento foi vencido no âmbito do recurso no que se refere ao processo T‑560/10. Consequentemente, uma vez que ambas as partes requereram a condenação da outra parte nas despesas, há que condenar o Parlamento a suportar, além das suas próprias despesas, três quartos das despesas efetuadas pelo recorrente no âmbito do presente recurso.

    65

    Quanto às despesas efetuadas em primeira instância no processo T‑560/10, serão suportadas pelo Parlamento.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

     

    1)

    O acórdão do Tribunal Geral da União Europeia, Nencini/Parlamento (T‑431/10 e T‑560/10, EU:T:2013:290), é anulado na parte que respeita ao processo T‑560/10.

     

    2)

    A decisão do secretário‑geral do Parlamento Europeu, de 7 de outubro de 2010, relativa à recuperação de determinados montantes recebidos por Riccardo Nencini, antigo membro do Parlamento Europeu, a título de reembolso de despesas de viagem e de assistência parlamentar, e a nota de débito do diretor‑geral da Direção‑Geral das Finanças do Parlamento Europeu n.o 315653, de 13 de outubro de 2010, são anuladas.

     

    3)

    O Parlamento Europeu é condenado a suportar, além das suas próprias despesas, três quartos das despesas efetuadas por Riccardo Nencini no âmbito do presente recurso.

     

    4)

    O Parlamento Europeu é condenado nas despesas efetuadas em primeira instância no processo T‑560/10.

     

    5)

    É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: italiano.

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