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Document 62012CJ0092

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 26 de abril de 2012.
    Health Service Executive contra S. C. e A. C.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court (Irlanda).
    Competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental ― Regulamento (CE) n.° 2201/2003 ― Filho menor que reside habitualmente na Irlanda, onde foi objeto de repetidas colocações ― Comportamentos agressivos e perigosos para a própria criança ― Decisão de colocação da criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento em Inglaterra ― Âmbito de aplicação material do regulamento ― Artigo 56.° ― Modalidades de consulta e de aprovação ― Obrigação de reconhecer ou de declarar executória a decisão de colocar a criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento ― Medidas provisórias ― Processo prejudicial urgente.
    Processo C‑92/12 PPU.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2012:255

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    26 de abril de 2012 ( *1 )

    «Competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental — Regulamento (CE) n.o 2201/2003 — Filho menor que reside habitualmente na Irlanda, onde foi objeto de repetidas colocações — Comportamentos agressivos e perigosos para a própria criança — Decisão de colocação da criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento em Inglaterra — Âmbito de aplicação material do regulamento — Artigo 56.o — Modalidades de consulta e de aprovação — Obrigação de reconhecer ou de declarar executória a decisão de colocar a criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento — Medidas provisórias — Processo prejudicial urgente»

    No processo C-92/12 PPU,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pela High Court (Irlanda), por decisão de 16 de fevereiro de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 17 de fevereiro de 2012, no processo

    Health Service Executive

    contra

    S. C.,

    A. C.,

    estando presente:

    Attorney General,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus, A. Rosas (relator), A. Ó Caoimh e A. Arabadjiev, juízes,

    advogado-geral: J. Kokott,

    secretário: L. Hewlett, administradora principal,

    visto o pedido do órgão jurisdicional de reenvio, de 16 de fevereiro de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 17 de fevereiro de 2012, de submeter o reenvio prejudicial a tramitação urgente, em conformidade com o disposto no artigo 104.o-B do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

    vista a decisão da Segunda Secção, de 29 de fevereiro de 2012, de deferir o referido pedido,

    vistos os autos e após a audiência de 26 de março de 2012,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação do Health Service Executive, por A. Cox, advocate, F. McEnroy, SC, e S. McKechnie, BL,

    em representação de S. C., por G. Durcan, SC, B. Barrington, BL, e C. Ghent, advocate,

    em representação de A. C., por C. Stewart, SC, F. McGath, BL, N. McGrath, solicitor, e C. Dignam, advocate,

    em representação da Irlanda, por E. Creedon, na qualidade de agente, assistida por C. Corrigan, SC, C. Power, BL, e K. Duggan,

    em representação do Governo alemão, por J. Kemper, na qualidade de agente,

    em representação do Governo do Reino Unido, por H. Walker, na qualidade de agente, assistida por M. Gray, barrister,

    em representação da Comissão Europeia, por M. Wilderspin e D. Calciu, na qualidade de agentes,

    ouvida a advogada-geral,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do Regulamento (CE) n.o 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1347/2000 (JO L 338, p. 1, a seguir «regulamento»), em particular dos seus artigos 1.°, 28.° e 56.°

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Health Service Executive (Direção de Saúde Pública, a seguir «HSE») a uma criança e à sua mãe, a propósito da colocação dessa criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada em Inglaterra.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    O segundo, quinto, décimo sexto e vigésimo primeiro considerandos do regulamento enunciam:

    «(2)

    O Conselho Europeu de Tampere aprovou o princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais como pedra angular da criação de um verdadeiro espaço judiciário e identificou o direito de visita como uma prioridade.

    […]

    (5)

    A fim de garantir a igualdade de tratamento de todas as crianças, o presente regulamento abrange todas as decisões em matéria de responsabilidade parental, incluindo as medidas de proteção da criança, independentemente da eventual conexão com um processo matrimonial.

    […]

    (16)

    O presente regulamento não impede que, em caso de urgência, os tribunais de um Estado-Membro ordenem medidas provisórias ou cautelares em relação a pessoas ou bens presentes nesse Estado-Membro.

    […]

    (21)

    O reconhecimento e a execução de decisões proferidas num Estado-Membro têm por base o princípio da confiança mútua e os fundamentos do não reconhecimento serão reduzidos ao mínimo indispensável.»

    4

    O âmbito de aplicação do regulamento é definido no seu artigo 1.o O n.o 1, alínea b), deste artigo, prevê que o regulamento é aplicável, independentemente da natureza do tribunal, às matérias civis relativas à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental. O artigo 1.o, n.o 2, do regulamento enumera as matérias visadas no referido n.o 1, alínea b), entre as quais figura, nomeadamente, na alínea d), «a colocação da criança ao cuidado de uma família de acolhimento ou de uma instituição». O artigo 1.o, n.o 3, alínea g), do regulamento prevê que o regulamento não é aplicável às medidas tomadas na sequência de infrações penais cometidas por crianças.

    5

    Nos termos do artigo 2.o do regulamento:

    «Para efeitos do presente regulamento, entende-se por:

    1)

    ‘Tribunal’, todas as autoridades que nos Estados-Membros têm competência nas matérias abrangidas pelo âmbito de aplicação do presente regulamento por força do artigo 1.o;

    […]

    4)

    ‘Decisão’, qualquer decisão […] relativa à responsabilidade parental proferida por um tribunal de um Estado-Membro, independentemente da sua designação, tal como ‘acórdão’, ‘sentença’ ou ‘despacho judicial’;

    […]

    7)

    ‘Responsabilidade parental’, o conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou coletiva por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou aos bens de uma criança. O termo compreende, nomeadamente, o direito de guarda e o direito de visita;

    […]

    9)

    ‘Direito de guarda’, os direitos e as obrigações relativos aos cuidados devidos à criança e, em particular, o direito de decidir sobre o seu lugar de residência;

    […]»

    6

    O artigo 8.o, n.o 1, do regulamento prevê:

    «Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal.»

    7

    O artigo 15.o do regulamento permite, excecionalmente e sob certas condições, a transferência do processo pelos tribunais de um Estado-Membro competentes para conhecer do mérito, se considerarem que um tribunal de outro Estado-Membro, com o qual a criança tenha uma ligação particular, se encontra mais bem colocado para conhecer do processo, e se tal servir o superior interesse da criança.

    8

    O artigo 20.o do regulamento permite, em caso de urgência, que os tribunais de um Estado-Membro tomem as medidas provisórias ou cautelares relativas às pessoas presentes nesse Estado, previstas na sua legislação, mesmo que, por força do referido regulamento, um tribunal de outro Estado-Membro seja competente para conhecer do mérito.

    9

    No capítulo III, secção 1, do regulamento, o artigo 21.o deste, intitulado «Reconhecimento das decisões», prevê:

    «1.   As decisões proferidas num Estado-Membro são reconhecidas nos outros Estados-Membros, sem quaisquer formalidades.

    […]

    3.   Sem prejuízo do disposto na secção 4 do presente capítulo, qualquer parte interessada pode requerer, nos termos dos procedimentos previstos na secção 2 do presente capítulo, o reconhecimento ou o não reconhecimento da decisão.

    A competência territorial dos tribunais indicados na lista comunicada por cada Estado-Membro à Comissão nos termos do artigo 68.o é determinada pela lei do Estado-Membro em que é apresentado o pedido de reconhecimento ou de não reconhecimento.

    4.   Se o reconhecimento de uma decisão for invocado a título incidental num tribunal de um Estado-Membro, este é competente para o apreciar.»

    10

    O artigo 23.o do regulamento, intitulado «Fundamentos de não reconhecimento de decisões em matéria de responsabilidade parental», enumera as circunstâncias em que uma decisão proferida em matéria de responsabilidade parental não é reconhecida, entre as quais figura, na alínea g), deste artigo, o caso em que «não tiver sido respeitado o procedimento previsto no artigo 56.o».

    11

    No capítulo III, secção 2, do regulamento, o seu artigo 28.o, intitulado «Decisões com força executória», dispõe:

    «1.   As decisões proferidas num Estado-Membro sobre o exercício da responsabilidade parental relativa a uma criança, que aí tenham força executória e que tenham sido citadas ou notificadas, são executadas noutro Estado-Membro depois de nele terem sido declaradas executórias a pedido de qualquer parte interessada.

    2.   Todavia, no Reino Unido, essas decisões só são executadas em Inglaterra e no País de Gales, na Escócia ou na Irlanda do Norte depois de registadas para execução, a pedido de qualquer parte interessada, numa dessas partes do Reino Unido, consoante o caso.»

    12

    Nos termos do artigo 31.o do regulamento:

    «1.   O tribunal a que for apresentado o pedido [declaração de executoriedade] deve proferir a sua decisão no mais curto prazo. Nem a pessoa contra a qual a execução é requerida nem a criança podem apresentar quaisquer observações nesta fase do processo.

    2.   O pedido só pode ser indeferido por um dos motivos previstos nos artigos 22.°, 23.° e 24.°

    3.   A decisão não pode em caso algum ser revista quanto ao mérito.»

    13

    O artigo 33.o do regulamento confere a qualquer das partes, nomeadamente, o direito de recorrer da decisão relativa ao pedido de declaração de executoriedade. No n.o 5, o referido artigo prevê que o «recurso contra a declaração de executoriedade é interposto no prazo de um mês a contar da sua notificação. Se a parte contra a qual é pedida a execução tiver a sua residência habitual num Estado-Membro diferente daquele onde foi proferida a declaração de executoriedade, o prazo de recurso é de dois meses a contar da data em que tiver sido feita a citação pessoal ou domiciliária».

    14

    O artigo 34.o do regulamento, intitulado «Tribunais de recurso e meios de impugnação», dispõe que da decisão de um recurso só cabe um dos recursos previstos na lista comunicada por cada Estado-Membro à Comissão nos termos do artigo 68.o do regulamento.

    15

    No capítulo III, secção 4, do regulamento, por força, respetivamente, dos seus artigos 41.° e 42.°, o direito de visita concedido por uma decisão executória proferida num Estado-Membro e o regresso da criança resultante de uma decisão executória proferida num Estado-Membro são reconhecidos e gozam de força executória noutro Estado-Membro sem necessidade de qualquer declaração que lhes reconheça essa força e sem que seja possível contestar o seu reconhecimento, se essa decisão for homologada pelo juiz no Estado-Membro de origem.

    16

    O capítulo IV do regulamento, intitulado «Cooperação entre autoridades centrais em matéria de responsabilidade parental», inclui os artigos 53.° a 58.° Nos termos do artigo 53.o do regulamento, cada Estado-Membro designa uma ou várias autoridades centrais encarregadas de o assistir na aplicação do presente regulamento, especificando as respetivas competências territoriais ou materiais.

    17

    O artigo 55.o do regulamento, sob a epígrafe «Cooperação em casos específicos de responsabilidade parental», prevê, na sua alínea d):

    «A pedido de uma autoridade central de outro Estado-Membro ou do titular da responsabilidade parental, as autoridades centrais cooperam em casos específicos, a fim de cumprir os objetivos do presente regulamento, devendo, para o efeito, atuando diretamente ou através de autoridades públicas ou outras entidades, tomar todas as medidas apropriadas, nos termos da legislação desse Estado-Membro em matéria de proteção de dados pessoais, para:

    […]

    d)

    Fornecer todas as informações e assistência úteis para a aplicação do artigo 56.o pelos tribunais».

    18

    O artigo 56.o do regulamento, intitulado «Colocação da criança noutro Estado-Membro», prevê:

    «1.   Quando o tribunal competente por força dos artigos 8.° a 15.° previr a colocação da criança numa instituição ou numa família de acolhimento e essa colocação ocorrer noutro Estado-Membro, consultará previamente a autoridade central ou outra autoridade competente deste último Estado-Membro se a intervenção de uma autoridade pública para os casos internos de colocação de crianças estiver prevista nesse Estado-Membro.

    2.   A decisão de colocação a que se refere o n.o 1 só pode ser tomada no Estado-Membro requerente, se a autoridade competente do Estado-Membro requerido a tiver aprovado.

    3.   As normas relativas à consulta ou à aprovação a que se referem os n.os 1 e 2 são reguladas pelo direito nacional do Estado-Membro requerido.

    4.   Quando o tribunal competente por força dos artigos 8.° a 15.° decidir da colocação da criança numa família de acolhimento, essa colocação ocorrer noutro Estado-Membro e a intervenção de uma autoridade pública para os casos internos de colocação de crianças não estiver prevista nesse Estado-Membro, o tribunal prevenirá a autoridade central ou outra autoridade competente deste último Estado-Membro.»

    Quadro jurídico irlandês

    19

    Resulta da resposta a um pedido de esclarecimentos dirigido ao órgão jurisdicional de reenvio, ao abrigo do artigo 104.o, n.o 5, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, e das observações apresentadas por A. C., que não existe no direito irlandês nenhum quadro legislativo suscetível de fundar a competência para autorizar ou regulamentar a colocação de uma criança, com fins terapêuticos e educativos, numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento, quer no interior quer no exterior desse Estado. A High Court declarou-se, contudo, competente para se pronunciar sobre os referidos pedidos de colocação em instituições de prestação de cuidados em regime de internamento.

    20

    Pretende-se que os princípios jurisprudenciais desenvolvidos pelo órgão jurisdicional de reenvio sejam substituídos por um quadro legislativo. Esse regime foi previsto na alteração à Lei relativa à proteção da infância [Child Care (Amendment) Act 2011], mas ainda não entrou em vigor.

    21

    Decorre da decisão de reenvio que, em direito irlandês, pode ser submetido à High Court um pedido de colocação de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento, para sua proteção. No exercício das suas competências próprias e constitucionais de proteção e defesa dos direitos das crianças, esse órgão jurisdicional pode, excecionalmente e por curtos períodos, ordenar a colocação de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento, para sua proteção, em nome do seu superior interesse e desde que existam razões terapêuticas que justifiquem essa colocação. Para esse efeito, pode autorizar a colocação de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada no estrangeiro. Essas decisões são unicamente adotadas com caráter provisório e estão sujeitas a uma fiscalização jurisdicional periódica e intensiva, normalmente de periodicidade mensal.

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    Circunstâncias de facto na origem do litígio no processo principal

    22

    S. C. é uma criança de nacionalidade irlandesa que reside habitualmente na Irlanda. A sua mãe, A. C., vive em Londres (Reino Unido). A decisão de reenvio não indica a residência do pai.

    23

    Em 2000, a criança foi voluntariamente colocada no HSE, autoridade oficial responsável pelas crianças entregues aos cuidados públicos na Irlanda. Em 20 de julho de 2000, por despacho, a District Court atribuiu ao HSE a responsabilidade pela prestação de cuidados a S. C. até que atingisse a idade de 18 anos, nos termos do artigo 18.o da Lei relativa à proteção da infância (Child Care Act, 1991).

    24

    Desde uma idade precoce, S. C. foi objeto de repetidas colocações em famílias de acolhimento e em instituições de prestação de cuidados em regime aberto ou de internamento, situadas na Irlanda.

    25

    S. C. é particularmente vulnerável e tem importantes necessidades de proteção. Evadiu-se várias vezes dos locais em que foi colocada sendo o seu comportamento caracterizado por repetidos comportamentos de risco, bem como por atos de violência, de agressão e de autodestruição.

    26

    A última colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento na Irlanda não teve sucesso. A criança isolou-se, recusou implicar-se no seu programa de cuidados terapêuticos e a sua situação degradou-se rapidamente. Evadiu-se e cometeu várias tentativas de suicídio.

    27

    Todos os profissionais de saúde reconheceram que, para sua própria proteção, a criança devia permanecer numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento para que pudesse ser submetida a uma avaliação clínica e às intervenções terapêuticas adequadas. Consideraram, todavia, que nenhuma instituição na Irlanda podia responder às necessidades específicas de S. C.

    28

    Devido a estas circunstâncias particulares, o HSE considerou que as necessidades em termos de cuidados, proteção e bem-estar da criança exigiam o recurso urgente a uma colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento, situada em Inglaterra. A escolha da instituição parece ter sido determinada pelo facto de S. C. ter continuamente exprimido o desejo de se aproximar da sua mãe e pelo facto de nenhuma outra alternativa poder responder melhor às suas necessidades específicas.

    29

    Por razões de urgência, o HSE apresentou um pedido de medidas provisórias no qual requeria que a High Court ordenasse a colocação de S. C. na instituição de prestação de cuidados em regime de internamento escolhida, situada em Inglaterra.

    Processo com vista à aprovação da colocação por parte da autoridade competente do Estado-Membro requerido, na aceção do artigo 56.o, n.o 2, do regulamento

    30

    Em 29 de setembro de 2011, o HSE informou a autoridade central irlandesa da pendência de um processo na High Court com vista à colocação da criança noutro Estado-Membro, em aplicação do artigo 56.o do regulamento. Insistiu para obter da autoridade central da Inglaterra e País de Gales a aprovação, prevista no artigo 56.o do regulamento, para a colocação de S. C. A autoridade central irlandesa informou o HSE de que o pedido de aprovação ao abrigo deste artigo tinha sido apresentado à autoridade central da Inglaterra e País de Gales.

    31

    Em 25 de outubro de 2011, o International Child Abduction and Contact Unit (ICACU), em representação do Lord Chancellor, que é a autoridade central da Inglaterra e País de Gales, assim como o Official Solicitor (responsável administrativo da autoridade central da Inglaterra e País de Gales) enviaram uma carta à autoridade central irlandesa, com cabeçalho da instituição de prestação de cuidados em regime de internamento e do conselho municipal da cidade na qual se situa esta instituição, que apresentaram como sendo proveniente desta autoridade local. A referida carta indicava que a instituição de prestação de cuidados em regime de internamento tinha aceitado a colocação de S. C.

    32

    Em 10 de novembro de 2011, o ICACU e o Official Solicitor comunicaram à autoridade central irlandesa uma carta da instituição de prestação de cuidados em regime de internamento na qual esta última confirmava poder oferecer a S. C. a colocação prevista no artigo 56.o do regulamento. Indicaram que encerravam o processo, dando a colocação como confirmada.

    Despacho de colocação da High Court

    33

    Em 2 de dezembro de 2011, a High Court, agindo no âmbito das suas competências em matéria de responsabilidade parental, decidiu que o bem-estar de S. C. a obrigava a proceder urgentemente à transferência da criança para uma instituição de prestação de cuidados terapêuticos e educativos em regime de internamento em Inglaterra. Ordenou, por conseguinte, a colocação de S. C. nessa instituição especializada em Inglaterra, por um breve período e a título provisório, tendo previsto controlar regularmente as suas condições de colocação e o seu bem-estar. Essa colocação, caracterizada por uma detenção forçada, é chamada «secure care» em direito irlandês (a seguir «prestação de cuidados em regime de internamento»).

    34

    No seu despacho de medidas provisórias, o órgão jurisdicional de reenvio declarou, nomeadamente, que a autoridade central da Inglaterra e País de Gales tinha dado a aprovação exigida pelo artigo 56.o, n.o 2, do regulamento e que a mesma não era incompatível com as disposições do regulamento nem da lei. Sublinhou que, dada a urgência do processo, não tinha sido decidida a questão relativa a um eventual processo de reconhecimento e de obtenção de uma declaração de executoriedade da decisão de colocação ao abrigo do regulamento, em Inglaterra e no País de Gales.

    35

    Com base neste despacho, o HSE transferiu S. C. para Inglaterra, onde a criança ainda reside para prestação de cuidados em regime de internamento. Quando da transferência, o HSE não tinha requerido uma declaração de executoriedade do despacho de colocação no Reino Unido.

    Processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio

    36

    O órgão jurisdicional de reenvio constatou que todas as partes no processo, com exceção da própria criança, estão de acordo a respeito do facto de que a colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento responde às necessidades específicas da criança. Contudo, atendendo às observações das partes e aos elementos de prova apresentados, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas a respeito de um certo número de questões.

    37

    Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio considera que deve ser decidida a questão de saber se, na medida em que diz respeito a uma medida de privação da liberdade, o despacho de 2 de dezembro de 2011 é abrangido pelo âmbito de aplicação do regulamento.

    38

    Em segundo lugar, os elementos de prova apresentados no órgão jurisdicional de reenvio não indicam claramente qual o órgão específico, expressamente designado no direito nacional inglês como «autoridade competente» na aceção do artigo 56.o do regulamento.

    39

    Numa declaração sob compromisso de honra apresentada no órgão jurisdicional de reenvio, a autoridade central da Inglaterra e País de Gales declarou que, com efeito, não era a «autoridade competente» na aceção do artigo 56.o do regulamento e que não existia qualquer autoridade competente designada para efeitos deste artigo, no sentido de que vários organismos podiam preencher esta função.

    40

    O órgão jurisdicional de reenvio realça que, na prática, parece que a aprovação exigida ao abrigo do referido artigo é emitida pela instituição em que a criança deverá ser colocada. Caso um órgão jurisdicional de um Estado-Membro pudesse ordenar a colocação de uma criança numa instituição situada no território de outro Estado-Membro, no qual a própria instituição é a «autoridade competente», poderia surgir um conflito de interesses, na medida em que essa instituição poderia lucrar com a colocação. O órgão jurisdicional de reenvio refere que, segundo o perito a que recorreu, a aprovação exigida pelo artigo 56.o do regulamento deve emanar de um organismo público.

    41

    Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas a respeito do reconhecimento e da declaração de executoriedade do despacho que prevê a colocação de S. C.

    42

    Sublinha que, se o processo para obtenção do reconhecimento e de uma declaração de executoriedade de uma decisão de colocação de uma criança deve ser instaurado e concluído antes de esta ser colocada por um Estado-Membro noutro Estado-Membro, tal poderia, na prática, em situações de urgência, tornar o regulamento inoperante. Ao invés, se uma criança for colocada no Estado-Membro de acolhimento antes da conclusão desse processo e se o despacho de colocação não puder produzir efeitos antes desta data, tal circunstância pode igualmente comprometer os interesses da criança, nomeadamente, em matéria de proteção.

    43

    Tendo em conta os elementos de prova apresentados, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas a respeito da questão de saber se as autoridades pertinentes do Reino Unido podem legalmente tomar medidas, com base no despacho de 2 de dezembro de 2011, em particular antes que a força executória deste despacho seja declarada. Se essas medidas só puderem ser tomadas no âmbito da adoção, pelos tribunais ingleses, de medidas cautelares e provisórias ao abrigo do artigo 20.o do regulamento, isso implica que decisões importantes relativas à proteção de S. C. poderiam ser adotadas, durante um período longo e num momento crítico em relação à sua colocação e detenção, por um tribunal em cuja jurisdição se situa a sua residência habitual. Essa situação seria contrária a um dos objetivos fundamentais do regulamento.

    44

    O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto ao comportamento a adotar no caso de a detenção se revelar contrária ao regulamento e quanto à questão de saber se, nesse caso, S. C. poderá simplesmente sair da instituição em que se encontra presentemente detida quando todas as partes reconhecem, exceto a própria criança, que é do seu superior interesse aí permanecer temporariamente.

    45

    Em quarto lugar, os elementos de prova apresentados sugerem que poderão ser necessárias novas aprovações, ao abrigo do artigo 56.o do regulamento, e novos pedidos de reconhecimento e de declaração de executoriedade da decisão de colocação, a cada renovação do despacho que coloca a criança em prestação de cuidados em regime de internamento.

    46

    Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a imposição de tais exigências quando da renovação dos despachos teria implicações graves para a execução prática e efetiva dos despachos proferidos pelo órgão jurisdicional de reenvio ou para a continuidade da colocação de crianças como S. C. Impor a obtenção de uma nova aprovação e de uma nova declaração de reconhecimento e de executoriedade para cada uma dessas renovações comprometeria a finalidade deste sistema de colocação.

    47

    Para avaliar a melhor forma de proteger os interesses da criança no processo principal e decidir se a sua colocação na instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada em Inglaterra deve ser mantida, a High Court decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Uma decisão que prevê a detenção de um menor por um determinado período de tempo noutro Estado-Membro, numa instituição que presta cuidados de caráter terapêutico e educativo, está abrangida pelo âmbito de aplicação material do [regulamento]?

    2)

    Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, que eventuais obrigações resultam do artigo 56.o do [regulamento] no que se refere à natureza do mecanismo de consulta e de aprovação, com vista a assegurar a proteção efetiva de um menor que deve ser detido nessas condições?

    3)

    Se um órgão jurisdicional de um Estado-Membro tiver considerado a colocação de um menor por um determinado período numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento noutro Estado-Membro e tiver obtido a aprovação desse Estado em conformidade com o artigo 56.o do [regulamento], a decisão do órgão jurisdicional que ordena a colocação de um menor por um determinado período numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro deve ser reconhecida e/ou declarada executória nesse outro Estado-Membro antes de a colocação poder ser efetuada?

    4)

    Uma decisão do órgão jurisdicional que ordena a colocação do menor por um determinado período numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro, aprovada por esse Estado-Membro em conformidade com o artigo 56.o do [regulamento], produz efeitos jurídicos nesse outro Estado-Membro antes de ser concedida a declaração de reconhecimento e/ou de executoriedade após a conclusão do processo para a obtenção dessa declaração de reconhecimento e/ou executoriedade?

    5)

    Se uma decisão do órgão jurisdicional que ordena a colocação de um menor por um determinado período numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro ao abrigo do artigo 56.o do [regulamento] for renovada por um determinado período adicional, deve a aprovação do outro Estado-Membro, [referida neste] artigo 56.o, ser obtida para cada renovação?

    6)

    Se uma decisão do órgão jurisdicional que ordena a colocação do menor por um determinado período numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro ao abrigo do artigo 56.o do [regulamento] for renovada por um determinado período adicional, deve a decisão ser reconhecida e/ou declarada executória nesse outro Estado-Membro em relação a cada renovação?»

    Quanto à tramitação urgente

    48

    A High Court solicitou que o presente reenvio prejudicial seja submetido à tramitação urgente prevista no artigo 104.o-B do Regulamento de Processo.

    49

    O órgão jurisdicional de reenvio fundamentou este pedido indicando, por um lado, que este processo diz respeito a uma criança, detida contra a sua vontade para sua proteção, numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento. Expõe, por outro lado, que se trata igualmente de um processo respeitante à guarda de uma criança que reside habitualmente na Irlanda e que foi colocada numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada no território de outro Estado-Membro, dependendo a sua própria competência da aplicabilidade do regulamento a este processo de colocação e, por conseguinte, da resposta às questões submetidas. Na sua resposta a um pedido de esclarecimentos, sublinhou que a situação da criança exige medidas urgentes. A criança aproxima-se da maioridade, momento a partir do qual já não será abrangida pela competência do órgão jurisdicional de reenvio em matéria de proteção da infância, exigindo o seu estado que seja colocada numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento por um curto período e devendo ser posto em prática um programa que implique uma liberdade enquadrada e crescente de modo a permitir que seja colocada junto da sua família em Inglaterra.

    50

    Nestas condições, a Segunda Secção do Tribunal de Justiça decidiu, em 29 de fevereiro de 2012, sob proposta do juiz-relator, ouvida a advogada-geral, deferir o pedido do órgão jurisdicional de reenvio no sentido de submeter o reenvio prejudicial a tramitação urgente.

    Observações preliminares

    51

    Paralelamente ao pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio ordenou ao HSE que requeresse a assistência da High Court of Justice (England & Wales), Family Division (Reino Unido), em aplicação do artigo 20.o do regulamento, para assegurar a proteção e a manutenção efetiva da criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento em Inglaterra, até decisão do Tribunal de Justiça no presente processo.

    52

    Em 24 de fevereiro de 2012, o HSE submeteu um pedido de medidas provisórias e cautelares à High Court of Justice (England & Wales), Family Division, ao abrigo do artigo 20.o do regulamento, respeitante à colocação de S. C. em Inglaterra. No mesmo dia, este último órgão jurisdicional deferiu este pedido. Ordenou, nomeadamente, a título provisório, que, enquanto não fosse proferida qualquer decisão da High Court of Justice, S. C. deve residir na instituição de prestação de cuidados em regime de internamento em Inglaterra, para aí receber a assistência e os tratamentos necessários, e que o diretor e o pessoal dessa instituição podem tomar determinadas decisões, incluindo, caso seja necessário, o uso razoável da força, para manter ou reconduzir S. C. à instituição em causa.

    53

    O HSE pediu igualmente que a decisão do órgão jurisdicional de reenvio que, em 2 de dezembro de 2011, ordenou a colocação de S. C. numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento em Inglaterra fosse declarada executória no Reino Unido relativamente a S. C., representada pelo seu tutor, a A. C. e à autoridade local de que depende esta instituição. O pedido de registo deste despacho foi apresentado em 24 de fevereiro de 2012.

    54

    Por despacho de 8 de março de 2012, a High Court of Justice (England & Wales), Family Division, declarou que a decisão do órgão jurisdicional de reenvio, de 2 de dezembro de 2011, tinha sido registada e tinha força executória em Inglaterra e no País de Gales, em conformidade com o artigo 28.o, n.o 2, do regulamento. O registo foi enviado ao HSE para notificação aos recorridos no processo principal.

    55

    O órgão jurisdicional de reenvio indicou, na sua resposta ao pedido de esclarecimentos formulado pelo Tribunal de Justiça, que renovou o despacho de colocação de 2 de dezembro de 2011 por várias vezes, concretamente, em 6, 9, 16 e 21 de dezembro de 2011, em 11, 23 e 27 de janeiro de 2012, em 3, 7, 9, 16, e 24 de fevereiro de 2012 e em 9 de março deste mesmo ano.

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à primeira questão

    56

    Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que prevê a colocação de uma criança numa instituição de prestação de cuidados terapêuticos e educativos em regime de internamento situada noutro Estado-Membro, que implica, para efeitos de proteção, uma privação de liberdade durante um determinado período, é abrangida pelo âmbito de aplicação material do regulamento.

    57

    Resulta do quinto considerando do regulamento que, para garantir a igualdade de todas as crianças, este regulamento abrange todas as decisões em matéria de responsabilidade parental, incluindo as medidas de proteção da criança (acórdão de 27 de novembro de 2007, C, C-435/06, Colet., p. I-10141, n.os 47 e 48).

    58

    O artigo 1.o, n.o 1, alínea b), do regulamento dispõe que o mesmo se aplica, em matéria civil, «à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental».

    59

    O artigo 2.o, n.o 7, do regulamento define a «responsabilidade parental» como o «conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou coletiva por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou aos bens de uma criança». Este conceito, objeto de definição ampla (acórdão C, já referido, n.o 49), inclui, nomeadamente, «o direito de guarda e o direito de visita», designando o direito de guarda os direitos e as obrigações relativos aos cuidados devidos à criança e, em particular, o direito de decidir sobre o seu lugar de residência, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 9, do regulamento. Nos termos do artigo 2.o, n.o 8, do regulamento, é titular da responsabilidade parental «qualquer pessoa que exerça a responsabilidade parental em relação a uma criança». É, por conseguinte, indiferente que o direito de guarda tenha sido, como no processo principal, transferido para uma administração.

    60

    O conceito de «matérias civis» na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea b), do regulamento deve ser interpretado no sentido de que pode mesmo abranger medidas que, segundo o direito nacional de um Estado-Membro, pertencem ao âmbito do direito público (acórdão C, já referido, n.o 51). Assim, o Tribunal de Justiça declarou que a decisão de um Estado-Membro que prevê o cuidado e a colocação de uma criança numa família de acolhimento que reside noutro Estado-Membro é abrangida pelo conceito de matérias civis, quando essa decisão tiver sido tomada no quadro das normas de direito público de um Estado-Membro relativas à proteção de menores (acórdão de 2 de abril de 2009, A, C-523/07, Colet., p. I-2805, n.o 29).

    61

    O referido artigo 1.o prevê, no seu n.o 2, alínea d), que estas matérias podem dizer respeito «[à] colocação da criança ao cuidado de uma família de acolhimento ou de uma instituição».

    62

    Assim, o artigo 56.o do regulamento visa expressamente a colocação de uma criança numa instituição de outro Estado-Membro.

    63

    Na verdade, os artigos 1.°, n.o 2, alínea d), e 56.° do regulamento não fazem expressamente referência às decisões dos órgãos jurisdicionais de um Estado-Membro de colocar uma criança numa instituição de outro Estado-Membro, quando essa colocação inclua um período de privação de liberdade com fins terapêuticos e educativos. Tal circunstância não pode, contudo, excluir estas decisões do âmbito de aplicação do regulamento. Com efeito, resulta do n.o 30 do acórdão C, já referido, que a enumeração que consta do artigo 1.o, n.o 2, do regulamento não é taxativa e tem caráter indicativo, como demonstra a utilização do termo «nomeadamente».

    64

    Como alegaram todas as partes e governos que apresentaram observações no Tribunal de Justiça, o conceito de colocação numa instituição deve ser interpretado no sentido de que abrange a colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento. Com efeito, qualquer outra interpretação privaria do benefício do regulamento as crianças particularmente vulneráveis que necessitam dessa colocação e seria contrária à finalidade do regulamento, exposta no seu quinto considerando, que é a de garantir a igualdade de todas as crianças.

    65

    Estão previstas exclusões do âmbito de aplicação do regulamento no artigo 1.o, n.o 3, deste último. A alínea g) desta disposição apenas exclui do âmbito de aplicação do regulamento as «medidas tomadas na sequência de infrações penais cometidas por crianças» e, por conseguinte, as medidas de detenção de uma criança que punem a prática de uma infração penal. Daqui resulta que a colocação acompanhada de medidas privativas de liberdade é abrangida pelo âmbito de aplicação do regulamento se essa colocação for ordenada para proteger a criança, e não para a sancionar.

    66

    Por conseguinte, importa responder à primeira questão submetida que uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que prevê a colocação de uma criança numa instituição de cuidados terapêuticos e educativos em regime de internamento situada noutro Estado-Membro, e que implica, para sua proteção, uma privação de liberdade durante um período determinado, é abrangida pelo âmbito de aplicação material do regulamento.

    Quanto à segunda questão

    67

    Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio procura saber qual é o alcance das obrigações que decorrem do artigo 56.o do regulamento quanto à natureza da consulta e ao mecanismo de aprovação da colocação de uma criança quando, como no processo principal, essa colocação dá lugar a uma privação de liberdade.

    68

    O órgão jurisdicional de reenvio considera que, em princípio, não incumbe ao órgão jurisdicional de um Estado-Membro apreciar o que subjaz à aprovação de uma dada colocação noutro Estado-Membro. Na medida em que o presente processo diz respeito à proteção do superior interesse de uma criança colocada numa instituição de cuidados em regime de internamento situada num Estado-Membro diferente daquele a que pertence o órgão jurisdicional que previu a colocação e que se encontra numa situação de particular vulnerabilidade, o órgão jurisdicional de reenvio questiona-se sobre se, à luz do artigo 24.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), o artigo 56.o deve ser interpretado no sentido de que obriga qualquer órgão jurisdicional de um Estado-Membro que pretenda colocar uma criança numa instituição de outro Estado-Membro a verificar se recebeu uma aprovação válida por parte da autoridade competente deste Estado-Membro.

    69

    Neste contexto, procura saber se a autoridade competente para a aprovação deve ser um organismo expressamente designado por uma medida adotada pelo Estado-Membro a que pertence, que possa garantir que foi feita uma apreciação independente da questão de saber se a colocação prevista trará à criança os cuidados e a proteção apropriados e se a mesma será efetuada no seu superior interesse. De qualquer modo, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a autoridade competente não pode ser a instituição na qual está prevista a colocação.

    70

    A este respeito, importa realçar que o artigo 56.o, n.o 1, do regulamento prevê que é obrigatória a consulta da autoridade central do Estado requerido ou de outra autoridade competente desse Estado-Membro, quando a intervenção da autoridade pública está prevista para os casos internos de colocação de crianças. Quando essa intervenção não estiver prevista, apenas é obrigatório, ao abrigo do artigo 56.o, n.o 4, do regulamento, prevenir a autoridade central do Estado requerido ou outra autoridade competente desse Estado-Membro.

    71

    No caso em apreço, o Governo do Reino Unido indicou que numa situação de colocação interna de uma criança, que seria, de resto, comparável à que está em causa no processo principal, é necessária a intervenção de um organismo público.

    72

    Nos termos do artigo 56.o, n.o 2, do regulamento, a decisão sobre a colocação de uma criança noutro Estado-Membro só pode ser tomada se a «autoridade competente» do Estado requerido tiver aprovado a colocação.

    73

    Decorre da formulação «a autoridade central ou outra autoridade competente», constante do artigo 56.o, n.o 1, do regulamento, que a autoridade central pode ser uma autoridade competente. O conceito de «autoridade competente» visado no artigo 56.o, n.o 2, deste regulamento designa, por conseguinte, ou a «autoridade central» ou qualquer «outra autoridade competente» na aceção do n.o 1 deste artigo. Daqui decorre que o artigo 56.o do regulamento permite instituir nesta matéria um sistema descentralizado que compreende várias autoridades competentes.

    74

    O artigo 56.o do regulamento deve ser lido em conjugação com os artigos 53.° a 55.° deste último.

    75

    Assim, o artigo 53.o do regulamento prevê a designação por cada Estado-Membro de uma autoridade central encarregada «de o assistir na aplicação do […] regulamento», cujas competências territoriais ou materiais especifica. O seu artigo 54.o enuncia as funções gerais das autoridades centrais e indica que as mesmas adotam medidas para melhorar a aplicação do regulamento.

    76

    O artigo 55.o do regulamento dispõe que as autoridades centrais, a pedido de outra autoridade central de outro Estado-Membro ou do titular da responsabilidade parental, cooperam em casos específicos, a fim de cumprir os objetivos do regulamento. Por força da alínea d) desta disposição, as autoridades centrais, atuando diretamente ou através de autoridades públicas ou de outras entidades, adotam todas as medidas apropriadas para fornecer todas as informações e assistência úteis para a aplicação do artigo 56.o do regulamento pelos tribunais.

    77

    Além das obrigações referidas nos artigos 53.° a 56.° do regulamento, os Estados-Membros dispõem de uma margem de apreciação quanto ao mecanismo de aprovação.

    78

    Com efeito, o artigo 56.o, n.o 3, do regulamento prevê expressamente que as normas relativas à obtenção da aprovação são reguladas pelo direito nacional do Estado-Membro requerido.

    79

    Contudo, como nomeadamente sublinharam A. C. e a Comissão, o Estado requerido deve garantir que a legislação nacional não põe em causa os objetivos do regulamento ou não o priva do seu efeito útil.

    80

    O artigo 56.o, n.o 2, do regulamento visa permitir, por um lado, que as autoridades competentes do Estado requerido aprovem, ou não, o eventual acolhimento da criança em causa e, por outro, que os órgãos jurisdicionais do Estado requerente se assegurem, antes de tomarem a decisão de colocar uma criança numa instituição, de que serão tomadas medidas no Estado requerido para que a colocação ocorra nesse Estado.

    81

    Como decorre da própria letra do artigo 56.o, n.o 2, do regulamento, a colocação deve ser aprovada pela autoridade competente do Estado-Membro requerido antes de o órgão jurisdicional do Estado-Membro requerente ter tomado a decisão de colocação. O caráter obrigatório da aprovação é sublinhado pelo facto de o artigo 23.o, alínea g), do regulamento prever que uma decisão em matéria de responsabilidade parental não é reconhecida se o processo previsto no artigo 56.o não foi respeitado.

    82

    Os Estados-Membros são, por conseguinte, chamados a prever regras e procedimentos claros sobre a aprovação prevista no artigo 56.o do regulamento, de forma a garantir a segurança jurídica e a celeridade. Os procedimentos devem nomeadamente permitir que o órgão jurisdicional que prevê a colocação identifique facilmente a autoridade competente e que a autoridade competente dê ou recuse a sua aprovação num curto prazo.

    83

    A este respeito, importa sublinhar a importância do papel das autoridades centrais, nos termos do artigo 55.o do regulamento. É essencial, para a realização dos objetivos visados pelo regulamento, que as autoridades centrais, a pedido de uma autoridade central de outro Estado-Membro ou do titular da responsabilidade parental, cooperem a fim de, nomeadamente, garantir que os órgãos jurisdicionais do Estado-Membro requerente dispõem de informações precisas e claras sobre a aplicação do artigo 56.o do regulamento.

    84

    No que respeita ao conceito de autoridade competente de um Estado-Membro para efeitos da aprovação de uma decisão de colocação tomada por um órgão jurisdicional de outro Estado-Membro, importa referir que o termo «autoridade» designa, em princípio, uma autoridade de direito público.

    85

    Todas as partes e governos que apresentaram observações estão de acordo sobre esta interpretação.

    86

    Por outro lado, a referida interpretação resulta da própria letra do artigo 56.o do regulamento. Certas versões linguísticas do regulamento indicam que é exigida a aprovação de uma autoridade estatal. Outras versões linguísticas do mesmo recorrem a conceitos que sugerem o caráter estatal da entidade competente para a aprovação. Além disso, o artigo 56.o, n.o 1, do regulamento refere as «autoridades públicas» cuja intervenção é requerida para as colocações de menores internas num Estado-Membro.

    87

    Importa contudo tomar em consideração as conceções divergentes dos Estados-Membros a respeito da questão de saber o que é ou não abrangido pelo direito público, na medida em que o artigo 56.o, n.o 3, do regulamento, no que respeita às normas do mecanismo de aprovação, remete para o direito nacional do Estado-Membro requerido.

    88

    De qualquer modo, importa realçar que uma aprovação proveniente de uma instituição que acolhe crianças mediante remuneração não pode, por si só, constituir a aprovação de uma autoridade competente na aceção do artigo 56.o, n.o 2, do regulamento. Com efeito, a apreciação independente do caráter apropriado da colocação proposta representa uma medida essencial de proteção da criança, em particular se essa colocação implicar uma privação de liberdade. Uma instituição que lucra com a colocação não está em condições de se pronunciar de forma independente a este respeito.

    89

    Devido às circunstâncias particulares do processo principal, como expostas nos n.os 38 a 40 do presente acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio teve dúvidas a respeito da questão de saber se é possível proceder a uma regularização, no caso de o juiz que previu a colocação se ter baseado numa aprovação aparente, sem que tenha conseguido verificar se a referida aprovação provinha efetivamente da autoridade competente, apesar de, no interesse da criança, a colocação já ter sido efetuada.

    90

    Na audiência, sublinhou-se que, no superior interesse da criança, seria desejável que essa regularização fosse autorizada a posteriori caso se viesse a demonstrar que tinham sido levadas a cabo diligências para obter a aprovação, mas o juiz que decidiu a colocação não tinha a certeza se a aprovação, exigida pelo artigo 56.o do regulamento, tinha sido validamente concedida por parte da autoridade competente do Estado-Membro requerido. Nesse caso, tratar-se-ia unicamente de corrigir certos aspetos do procedimento.

    91

    Assim, a Comissão evocou uma situação na qual o juiz que decidiu a colocação pensou dispor da aprovação ao abrigo do artigo 56.o do regulamento, mas, devido a um mal-entendido, adotou uma decisão que ultrapassa a aprovação dada pela autoridade competente do Estado requerido. Nesse caso, a Comissão não levanta objeções a que o regulamento seja interpretado no sentido de que, durante o processo de execução, o juiz suspenda o processo e que, nesse momento, seja possível obter a aprovação ao abrigo do artigo 56.o do regulamento.

    92

    A este respeito, importa que, quando o juiz do Estado-Membro requerente decidir sobre uma colocação com base numa aprovação aparente da autoridade competente, mas as informações a respeito do processo de aprovação ao abrigo do artigo 56.o do regulamento levantarem dúvidas quanto ao pleno respeito das exigências deste artigo, lhe seja possível corrigir a situação a posteriori de modo a garantir que a aprovação foi validamente dada.

    93

    Em contrapartida, caso não exista qualquer consulta entre as autoridades centrais em causa ou qualquer aprovação por parte de uma autoridade competente do Estado-Membro requerido, o processo para obtenção da aprovação deve recomeçar e o juiz do Estado-Membro requerente deve adotar uma nova decisão de colocação depois de ter verificado que a aprovação foi validamente obtida.

    94

    Resta ainda precisar que, no processo principal, o Governo do Reino Unido indicou na audiência que, ao invés do que indica a decisão de reenvio, a instituição de prestação de cuidados em regime de internamento em causa neste processo não é uma instituição de direito privado, sendo dirigida pela autoridade local, de modo que a aprovação exigida pelo artigo 56.o do regulamento foi validamente dada.

    95

    Por conseguinte, há que responder à segunda questão submetida que a aprovação prevista no artigo 56.o, n.o 2, do regulamento deve ser dada, previamente à adoção da decisão sobre a colocação de uma criança, por uma autoridade competente de direito público. Não basta que a instituição na qual a criança deve ser colocada dê a sua aprovação. Em circunstâncias como as do processo principal, nas quais o órgão jurisdicional do Estado-Membro que decidiu a colocação tem dúvidas quanto à existência de uma autorização válida do Estado-Membro requerido, na medida em que não foi possível determinar com certeza qual era a autoridade competente neste último Estado, é possível uma regularização para assegurar que a exigência de aprovação constante do artigo 56.o do regulamento foi plenamente respeitada.

    Quanto à terceira e quarta questões

    96

    Com a terceira e quarta questões, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que ordena a colocação forçada de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro deve, antes da sua execução no Estado-Membro requerido, ser reconhecida e declarada executória nesse Estado-Membro. Pretende igualmente saber se essa decisão de colocação produz efeitos jurídicos no Estado-Membro requerido antes de a sua executoriedade aí ter sido declarada.

    97

    Em resposta às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça ao abrigo do artigo 24.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 54.o-B do Regulamento de Processo, o Governo do Reino Unido indicou que o despacho de 2 de dezembro de 2011 foi registado e declarado executório no Reino Unido por despacho da High Court of Justice (England & Wales), Family Division, Principal Registry (Reino Unido), de 8 de março de 2012.

    98

    O HSE, S. C., A. C., a Irlanda e o Governo alemão alegam que o artigo 21.o do regulamento institui uma presunção de reconhecimento das decisões proferidas pelos órgãos jurisdicionais de um Estado-Membro em todos os Estados-Membros. Também, quando um órgão jurisdicional de um Estado-Membro previu a colocação de uma criança, durante um período determinado, numa instituição situada noutro Estado-Membro e obteve a aprovação deste Estado, em conformidade com o artigo 56.o do regulamento, não é sempre necessária a apresentação de um requerimento destinado a obter a declaração da executoriedade desta decisão de colocação para que esta produza efeitos no Estado-Membro requerido, incluindo numa situação como a do processo principal.

    99

    O Governo do Reino Unido e a Comissão consideram, em contrapartida, que essa decisão não produz nenhum efeito enquanto não for declarada a sua executoriedade por um órgão jurisdicional de reenvio do Estado-Membro requerido.

    Quanto ao reconhecimento

    100

    Em conformidade com o artigo 21.o do regulamento, as decisões proferidas num Estado-Membro são reconhecidas nos outros Estados-Membros, sem quaisquer formalidades.

    101

    Como decorre do segundo considerando do regulamento, o princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais é a pedra angular da criação de um verdadeiro espaço judiciário (acórdão de 15 de julho de 2010, Purrucker, C-256/09, Colet., p. I-7353, n.o 70).

    102

    Em consonância com o vigésimo primeiro considerando do referido regulamento, este reconhecimento deve ter por base o princípio da confiança mútua.

    103

    Foi essa confiança mútua que permitiu a criação de um sistema obrigatório de competências, que todos os órgãos jurisdicionais abrangidos pelo âmbito de aplicação do regulamento devem respeitar, e a renúncia correlativa pelos Estados-Membros às suas normas internas de reconhecimento e de exequatur em proveito de um mecanismo simplificado de reconhecimento e de execução das decisões proferidas no âmbito de processos em matéria de responsabilidade parental (acórdão Purrucker, já referido, n.o 72). Como precisa o artigo 24.o do referido regulamento, os órgãos jurisdicionais dos outros Estados-Membros não podem controlar a apreciação que o primeiro órgão jurisdicional faz da sua própria competência. Além disso, o artigo 26.o do regulamento prevê que uma decisão não pode em caso algum ser revista quanto ao mérito.

    104

    Os motivos do não reconhecimento das decisões em matéria de responsabilidade parental são taxativamente enumerados no artigo 23.o do regulamento. Nos termos deste artigo 23.o, alínea g), uma decisão em matéria de responsabilidade parental não é reconhecida se o procedimento previsto no artigo 56.o do regulamento não foi respeitado.

    105

    A decisão, por parte de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro, de colocar uma criança numa instituição de outro Estado-Membro beneficia do reconhecimento neste último Estado, a menos que, e até que, tenha sido tomada uma decisão de não reconhecimento nesse outro Estado-Membro.

    106

    Não resulta dos autos que uma parte interessada tenha requerido a adoção de uma decisão de não reconhecimento da decisão de colocação, em aplicação do artigo 21.o, n.o 3, do regulamento.

    Quanto à necessidade de uma declaração de execução

    107

    Nos termos do artigo 28.o, n.o 1, do regulamento, as «decisões proferidas num Estado-Membro sobre o exercício da responsabilidade parental relativa a uma criança, que aí tenham força executória e que tenham sido citadas ou notificadas, são executadas noutro Estado-Membro depois de nele terem sido declaradas executórias a pedido de qualquer parte interessada».

    108

    No Reino Unido, o registo para execução dessas decisões em Inglaterra e no País de Gales, na Escócia ou na Irlanda do Norte, consoante o local em que a decisão deve ser executada, substitui a declaração de executoriedade, em conformidade com o artigo 28.o, n.o 2, do regulamento.

    109

    S. C. alegou que, de modo geral, o regulamento não exige que uma medida coerciva contra uma criança seja declarada executória. Essa declaração de executoriedade apenas é exigida para efeitos de execução coerciva de uma decisão relativa a adultos. Ora, no litígio no processo principal, o tutor e a mãe de S. C., que é parte no processo, deram o seu acordo sobre a colocação. O Governo alemão seguiu uma abordagem semelhante na audiência, alegando que as medidas destinadas a garantir a aplicação de uma decisão tomada contra a vontade de uma criança não são abrangidas pelo conceito de execução.

    110

    A este respeito, importa recordar que uma decisão que ordena a colocação de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento faz parte das decisões sobre o exercício da responsabilidade parental. No processo principal, a criança opõe-se à decisão jurisdicional que ordenou a sua colocação nessa instituição na medida em que se encontra, contra a sua vontade, privada de liberdade. O órgão jurisdicional de reenvio sublinha, além disso, que, se S. C. conseguisse evadir-se da instituição de prestação de cuidados em regime de internamento na qual está colocada, seria necessária a assistência das autoridades do Reino Unido para a reconduzir com uso da força a esta instituição, para sua própria proteção.

    111

    Uma decisão que ordena a colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento diz respeito ao direito fundamental à liberdade reconhecido no artigo 6.o da Carta a «[t]oda a pessoa», e, por conseguinte, igualmente a um «menor».

    112

    Importa acrescentar que, caso as pessoas que exercem a responsabilidade parental tenham consentido na colocação de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento, a posição dessas pessoas pode ser modificada devido a alterações de circunstâncias.

    113

    Daqui decorre que, para assegurar o bom funcionamento do sistema previsto no regulamento, a execução coerciva, em relação a uma criança, de uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que ordena a sua colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento de outro Estado-Membro pressupõe que foi declarada a executoriedade dessa decisão neste último Estado.

    114

    Atendendo à particular urgência do processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio, o HSE, S. C., a Irlanda e o Governo alemão manifestaram, no entanto, a sua preocupação quanto à perda de tempo inerente à tramitação de um procedimento de execução. Só foi prevista uma colocação em Inglaterra por não haver qualquer possibilidade de colocação adequada na Irlanda, e porque não podia mais ser adiada devido ao risco agudo de atentado à integridade física da criança em causa.

    115

    No essencial, a sua argumentação repousa na ideia de que a execução, num Estado-Membro, de uma colocação decidida noutro Estado-Membro, devido à urgência e ao superior interesse da criança, não pode ser subordinada a uma declaração de executoriedade, por parte do Estado requerido, da decisão de colocação tomada no Estado requerente. A exigência de uma declaração da força executória ameaçaria a eficácia das colocações transfronteiriças.

    116

    Ora, há que salientar que o legislador da União, no capítulo III, secção 4, do regulamento, renunciou expressamente, por razões de rapidez, a impor uma declaração de executoriedade para duas categorias de decisões, concretamente, certas decisões relativas ao direito de visita e certas decisões que exigem o regresso da criança. Esta declaração é em certa medida substituída pela certidão do juiz de origem que, nesses casos, deve acompanhar a decisão judicial abrangida por uma dessas categorias de decisões.

    117

    Por conseguinte, a emissão da certidão no Estado-Membro de origem, prevista no artigo 42.o, n.o 1, do regulamento, é reconhecida e reveste automaticamente força executória noutro Estado-Membro, sem que seja possível opor-se ao seu reconhecimento (acórdão de 22 de dezembro de 2010, Aguirre Zarraga, C-491/10 PPU, Colet., p. I-14247, n.o 48).

    118

    Decorre do regulamento que apenas as duas categorias de decisões expressamente visadas podem, em determinadas condições, ser executadas num Estado-Membro, apesar de aí não terem sido declaradas executórias. Por conseguinte, deve ser seguido o procedimento de exequatur nas demais decisões em matéria de responsabilidade parental que exigem execução noutro Estado-Membro.

    119

    Circunstâncias de particular urgência não podem, por conseguinte, implicar, por si só, que as medidas de execução noutro Estado-Membro se possam basear numa decisão que ordena uma colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento cuja força executória ainda não foi reconhecida.

    120

    O procedimento de aprovação previsto no artigo 56.o, n.o 2, do regulamento não se pode substituir a uma declaração de executoriedade. Com efeito, estes dois procedimentos têm uma finalidade diferente. Enquanto a aprovação, na aceção desta disposição, visa levantar obstáculos suscetíveis de impedir uma colocação transfronteiriça, a declaração de executoriedade destina-se a permitir a execução de uma decisão de colocação numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento. Além disso, o artigo 56.o do regulamento não exige a intervenção de um juiz, podendo a autoridade competente ser um organismo administrativo.

    121

    Sem prejuízo das alterações que, sendo caso disso, o legislador da União poderá vir a decidir introduzir no regulamento para dar resposta às preocupações expressas pelos vários interessados que apresentaram observações na audiência a respeito da perda de tempo inerente à tramitação de um procedimento de execução, importa examinar quais são as possibilidades oferecidas por este regulamento para encontrar soluções eficazes no caso de uma colocação transfronteiriça que necessite de particular celeridade, de modo a garantir o seu efeito útil e o seu bom funcionamento.

    122

    A este respeito, resulta do artigo 31.o, n.o 1, do regulamento que o tribunal a que foi apresentado o pedido de declaração de executoriedade deve proferir a sua decisão no mais curto prazo, sem que nem a pessoa contra a qual a execução é requerida nem a criança possam apresentar observações nesta fase do processo. O pedido só pode ser indeferido por um dos motivos de não reconhecimento previstos nos artigos 22.° a 24.° do regulamento. A decisão não pode em caso algum ser revista quanto ao mérito.

    123

    O artigo 33.o do regulamento dispõe que qualquer das partes pode recorrer da decisão relativa ao pedido de declaração de executoriedade no prazo de um mês a contar da sua notificação. Se a parte contra a qual é pedida a execução tiver a sua residência habitual num Estado-Membro diferente daquele onde foi proferida a declaração de executoriedade, o prazo de recurso é de dois meses a contar da data em que tiver sido feita a citação. O artigo 34.o do regulamento prevê que da decisão de um recurso só cabe um dos recursos previstos na lista comunicada por cada Estado-Membro à Comissão nos termos do artigo 68.o do regulamento.

    124

    Foi sublinhado, na audiência, que a duração dos processos previstos nos artigos 33.° e 34.° do regulamento pode ser considerável e assim prejudicar a eficácia e efeito útil do referido regulamento.

    125

    A este respeito, para evitar que o efeito suspensivo de um recurso de uma decisão relativa à declaração de executoriedade possa comprometer o prazo curto previsto no artigo 31.o do regulamento, importa, como observou a advogada-geral na sua tomada de posição, e como propôs a Comissão na audiência, interpretar o regulamento no sentido de que a decisão de colocação adquire executoriedade a partir do momento em que o órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido declarou a sua força executória, em conformidade com o referido artigo 31.o

    126

    A letra do regulamento não se opõe a tal interpretação. Com efeito, o seu artigo 28.o, n.o 1, dispõe que as decisões sobre o exercício da responsabilidade parental proferidas num Estado-Membro são executadas noutro Estado-Membro depois de nele terem sido declaradas executórias a pedido de qualquer parte interessada.

    127

    Para efeitos da interpretação e aplicação do regulamento, importa ter em conta o critério do superior interesse da criança, à luz do artigo 24.o da Carta. Ora, o superior interesse da criança pode exigir, em casos de colocação transfronteiriça de excecional urgência, que se permita uma solução flexível para a duração do procedimento de exequatur, se, na falta dessa solução, a finalidade subjacente à decisão que ordena a colocação transfronteiriça for comprometida pelo decurso do tempo.

    128

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça decidiu que, contrariamente ao procedimento previsto nos artigos 33.° a 35.° do regulamento para o pedido de declaração de executoriedade, as decisões proferidas em conformidade com o seu capítulo III, secção 4 (direito de visita e regresso do menor), podem ser declaradas executórias pelo tribunal de origem independentemente de qualquer possibilidade de recurso, quer no Estado-Membro de origem quer no Estado-Membro de execução (acórdão de 11 de julho de 2008, Rinau, C-195/08 PPU, Colet., p. I-5271, n.o 84).

    129

    Resulta do exposto que, para não privar o regulamento do seu efeito útil, a decisão do órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido relativa ao pedido de declaração de executoriedade deve ser tomada com particular celeridade sem que os recursos dessa decisão do órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido possam ter efeito suspensivo.

    130

    Além disso, o artigo 20.o, n.o 1, do regulamento prevê que os tribunais do Estado-Membro onde a criança se encontre são autorizados, sob certas condições, a tomar as medidas provisórias ou cautelares previstas pela lei desse Estado, ainda que o referido regulamento confira a um tribunal de outro Estado-Membro a competência para conhecer do mérito. Na medida em que constitui uma exceção ao sistema de competência previsto pelo referido regulamento, esta disposição deve ser objeto de interpretação estrita (acórdão de 23 de dezembro de 2009, Detiček, C-403/09 PPU, Colet., p. I-12193, n.o 38).

    131

    Essas medidas são aplicáveis às crianças que, tendo a sua residência habitual num Estado-Membro, permaneçam a título temporário ou ocasional noutro Estado-Membro e se encontrem numa situação suscetível de prejudicar gravemente o seu bem-estar, incluindo a sua saúde ou o seu desenvolvimento, o que justifica assim a adoção imediata de medidas de proteção. A natureza provisória dessas medidas decorre do facto de, por força do artigo 20.o, n.o 2, do regulamento, estas deixarem de produzir efeitos quando o tribunal do Estado-Membro competente para conhecer do mérito tomar as medidas que considerar adequadas (acórdão A, já referido, n.o 48).

    132

    No processo principal, a pedido do HSE, a High Court of Justice (England & Wales), Family Division, proferiu um despacho ao abrigo do artigo 20.o do regulamento que prevê as medidas provisórias e cautelares necessárias à colocação para fins de proteção de S. C. até ao termo do procedimento de declaração de executoriedade do despacho de 2 de dezembro de 2011.

    133

    Há que responder à terceira e quarta questões submetidas que o regulamento deve ser interpretado no sentido de que uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que ordenar a colocação forçada de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro deve, antes da sua execução no Estado-Membro requerido, ser declarada executória nesse Estado-Membro. Para não privar este regulamento do seu efeito útil, a decisão do órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido relativa ao pedido de declaração de executoriedade deve ser tomada com particular celeridade, sem que os recursos interpostos dessa decisão do órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido possam ter efeito suspensivo.

    Quanto à quinta e sexta questões

    134

    Com a quinta e sexta questões, que devem ser analisadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, quando o órgão jurisdicional de um Estado-Membro que ordenou a colocação de uma criança numa instituição de outro Estado-Membro por um determinado período adotar, ao abrigo do artigo 56.o do regulamento, uma nova decisão para prolongar a duração da colocação, é exigida a aprovação da autoridade competente do Estado-Membro requerido prevista no artigo 56.o, n.o 2, do regulamento e a declaração de executoriedade ao abrigo do artigo 28.o do regulamento, para cada renovação.

    135

    Na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio pretende ordenar a colocação provisória por um período tão curto quanto possível e, em caso de necessidade, renovar as decisões de colocação por períodos igualmente breves, não lhe parece possível que seja exigida a aplicação, a cada renovação, dos procedimentos de aprovação e de execução dessas decisões.

    136

    O HSE, S. C. e a Irlanda consideram que, mesmo pressupondo que a aplicação do artigo 28.o do regulamento é necessária numa situação como a do processo principal, não é necessário obter uma nova declaração de executoriedade da decisão de colocação para cada decisão que prolonga o período de colocação, uma vez que a declaração de executoriedade da decisão de colocação inicial se aplica à decisão de prorrogação ou de renovação da mesma.

    137

    O Governo alemão, o Governo do Reino Unido e a Comissão alegam, pelo contrário, que qualquer decisão de prorrogação da decisão de colocação inicial deve ser simultaneamente aprovada pela autoridade competente do Estado-Membro requerido, a menos que a aprovação inicial dada por este organismo tenha sido expressa de forma a englobar as eventuais prorrogações, e, de qualquer forma, declarada executória no Estado-Membro requerido como se se tratasse de uma nova decisão.

    138

    Importa a este respeito recordar que resulta do n.o 81 do presente acórdão que um órgão jurisdicional de um Estado-Membro só pode proferir uma decisão de colocação de uma criança numa instituição situada noutro Estado-Membro se a autoridade competente do Estado requerido aprovou previamente essa colocação. Daqui decorre que, quando a autoridade competente do Estado-Membro requerido aprovou uma colocação limitada no tempo pelo órgão jurisdicional competente, essa colocação não pode ser prorrogada sem que essa autoridade tenha dado nova aprovação.

    139

    Assim, quando, como no processo principal, a colocação seja prevista por um período muito breve, a aprovação dada para esta colocação não pode produzir efeitos no fim do período fixado para essa colocação, a menos que tenham sido autorizadas eventuais prorrogações deste período.

    140

    Por conseguinte, o órgão jurisdicional de um Estado-Membro que pretenda colocar uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro poderia, respeitando a finalidade dessas colocações que é a de prever uma detenção por um período limitado e de verificar, em intervalos de tempo próximos, se a detenção deve ou não ser mantida, requerer a aprovação por um período suficiente para evitar os inconvenientes relacionados com as medidas de aprovação repetidas e de curta duração, sem prejuízo do direito desse órgão jurisdicional, durante o período abrangido pela aprovação, de reduzir a duração da colocação da criança em função do seu superior interesse.

    141

    No que diz respeito ao procedimento de execução, importa referir que, quando uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro de colocar uma criança numa instituição situada noutro Estado-Membro é declarada executória, as medidas de execução só se podem basear na decisão declarada executória dentro dos limites que resultam da própria decisão.

    142

    A este respeito, no contexto do Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2001, L 12, p. 1), o Tribunal de Justiça decidiu que não há razão para atribuir a uma sentença, na sua execução, direitos que não lhe são atribuídos no Estado-Membro de origem ou efeitos que uma sentença do mesmo tipo, diretamente proferida no Estado-Membro requerido, não teria (acórdãos de 28 de abril de 2009, Apostolides, C-420/07, Colet., p. I-3571, n.o 66, e de 13 de outubro de 2011, Prism Investments, C-139/10, Colet., p. I-9511, n.o 38).

    143

    Se da decisão de colocação resulta que a colocação só foi ordenada por uma duração determinada, esta decisão, caso venha a ser declarada executória, não pode servir de fundamento à execução forçada de uma colocação por um período superior ao que nela é indicado.

    144

    Daqui decorre que cada nova decisão de colocação implica uma nova declaração de executoriedade.

    145

    Sendo caso disso, à semelhança da possibilidade mencionada no n.o 140 do presente acórdão, o órgão jurisdicional que ordena a colocação pode, contudo, prever ordenar a colocação por um período adequado, de modo a evitar os inconvenientes relacionados com as declarações de executoriedade repetidas e de curta duração, e verificar, em intervalos de tempo próximos, a necessidade de rever a decisão durante o período abrangido pela declaração de executoriedade.

    146

    Por conseguinte, há que responder à quinta e sexta questão submetidas que, quando tiver sido dada por uma duração determinada, a aprovação de uma colocação ao abrigo do artigo 56.o, n.o 2, do regulamento não se aplica às decisões cujo objeto seja prolongar a duração da colocação. Em tais circunstâncias, deve ser requerida uma nova aprovação. Uma decisão de colocação tomada num Estado-Membro e declarada executória noutro Estado-Membro apenas pode ser executada neste último Estado-Membro pelo período indicado na decisão de colocação.

    Quanto às despesas

    147

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

     

    1)

    Uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que prevê a colocação de uma criança numa instituição de cuidados terapêuticos e educativos em regime de internamento situada noutro Estado-Membro, e que implica, para sua proteção, uma privação de liberdade durante um período determinado, é abrangida pelo âmbito de aplicação material do Regulamento (CE) n.o 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1347/2000.

     

    2)

    A aprovação prevista no artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser dada, previamente à adoção da decisão sobre a colocação de uma criança, por uma autoridade competente de direito público. Não basta que a instituição na qual a criança deve ser colocada dê a sua aprovação. Em circunstâncias como as do processo principal, nas quais o órgão jurisdicional do Estado-Membro que decidiu a colocação tem dúvidas quanto à existência de uma autorização válida do Estado-Membro requerido, na medida em que não foi possível determinar com certeza qual era a autoridade competente neste último Estado, é possível uma regularização para assegurar que a exigência de aprovação constante do artigo 56.o do Regulamento n.o 2201/2003 foi plenamente respeitada.

     

    3)

    O Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que uma decisão de um órgão jurisdicional de um Estado-Membro que ordenar a colocação forçada de uma criança numa instituição de prestação de cuidados em regime de internamento situada noutro Estado-Membro deve, antes da sua execução no Estado-Membro requerido, ser declarada executória nesse Estado-Membro. Para não privar este regulamento do seu efeito útil, a decisão do órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido relativa ao pedido de declaração de executoriedade deve ser tomada com particular celeridade, sem que os recursos dessa decisão do órgão jurisdicional do Estado-Membro requerido possam ter efeito suspensivo.

     

    4)

    Quando tiver sido dada por uma duração determinada, a aprovação de uma colocação ao abrigo do artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento n.o 2201/2003 não se aplica às decisões cujo objeto seja prolongar a duração da colocação. Em tais circunstâncias, deve ser requerida uma nova aprovação. Uma decisão de colocação tomada num Estado-Membro e declarada executória noutro Estado-Membro apenas pode ser executada neste último Estado-Membro pelo período indicado na decisão de colocação.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: inglês.

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