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Document 62008CJ0303

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 22 de Dezembro de 2010.
Land Baden-Württemberg contra Metin Bozkurt.
Pedido de decisão prejudicial: Bundesverwaltungsgericht - Alemanha.
Acordo de Associação CEE-Turquia - Reagrupamento familiar - Artigo 7.º, primeiro parágrafo, da Decisão n.º 1/80 do Conselho de Associação - Cônjuge de uma trabalhadora turca que coabitou com esta durante mais de cinco anos - Manutenção do direito de residência após o divórcio - Condenação do interessado por violência exercida contra a ex-mulher - Abuso de direito.
Processo C-303/08.

Colectânea de Jurisprudência 2010 I-13445

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:800

Processo C-303/08

Land Baden-Württemberg

contra

Metin Bozkurt

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht)

«Acordo de associação CEE‑Turquia – Reagrupamento familiar – Artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação – Cônjuge de uma trabalhadora turca que coabitou com esta durante mais de cinco anos – Manutenção do direito de residência após o divórcio – Condenação do interessado por violência exercida contra a ex‑mulher – Abuso de direito»

Sumário do acórdão

1.        Acordos internacionais – Acordo de Associação CEE-Turquia – Conselho de Associação instituído pelo Acordo de Associação CEE-Turquia – Decisão n.º 1/80 – Reagrupamento familiar

(Protocolo Adicional ao Acordo de Associação CEE‑Turquia, artigo 59.°; Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação CEE‑Turquia, artigo 7.°, n.° 1)

2.        Acordos internacionais – Acordo de Associação CEE-Turquia – Conselho de Associação instituído pelo Acordo de Associação CEE-Turquia – Decisão n.º 1/80 – Reagrupamento familiar

(Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação CEE/Turquia, artigo. 7.°, n.° 1, e 14.°, n.° 1)

1.        O artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação CEE‑Turquia deve ser interpretado no sentido de que um nacional turco que, na sua qualidade de membro da família de uma trabalhadora turca integrada no mercado regular de emprego de um Estado‑Membro e por ter residido com o seu cônjuge durante um período continuado de pelo menos cinco anos, beneficia dos direitos relativos ao estatuto conferido com fundamento no segundo travessão da referida disposição não perde o benefício desses direitos em razão do divórcio proferido em data posterior à aquisição destes.

Com efeito, direitos legalmente adquiridos por um nacional turco com fundamento no artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 existem, independentemente da manutenção das condições que eram exigidas para fazer nascer esses direitos, de modo que o membro da família já titular de direitos nos termos da referida decisão está em posição de consolidar progressivamente a sua situação no Estado‑Membro de acolhimento e de aí se integrar duradouramente, levando uma vida independente da da pessoa por intermédio da qual obteve esses direitos.

Tal interpretação do artigo 7.°, n.° 1, já referido, não é incompatível com as exigências do artigo 59.° do Protocolo Adicional do Acordo de Associação CEE-Turquia uma vez que a situação do membro da família de um trabalhador migrante turco não pode ser utilmente comparada à de um membro da família de um nacional de um Estado‑Membro, tendo em conta as diferenças sensíveis existentes entre a respectiva situação jurídica.

(cf. n.os 40, 45, 46, disp. 1)

2.        Não constitui um abuso de direito o facto de um nacional turco se prevalecer de um direito legalmente adquirido nos termos do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação CEE‑Turquia, quando o interessado, após ter obtido o benefício desse direito por intermédio do seu ex‑cônjuge, cometeu contra este uma infracção grave que deu lugar à sua condenação penal.

Pelo contrário, o artigo 14.°, n.° 1, da mesma decisão não se opõe a que uma medida de expulsão seja tomada contra um nacional turco que tenha sido alvo de condenações penais, desde que o seu comportamento pessoal constitua uma ameaça actual, real e suficientemente grave que afecta um interesse fundamental da sociedade. Cabe ao órgão jurisdicional competente apreciar se é esse o caso. Este deve além disso, velar pelo respeito tanto do princípio da proporcionalidade como dos direitos fundamentais do interessado. Mais especificamente, uma medida de expulsão baseada no artigo 14.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80 só pode ser decidida se o comportamento pessoal do interessado revela um risco concreto de novas perturbações graves da ordem pública.

(cf. n.os 60, 61, disp. 2)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

22 de Dezembro de 2010 (*)

«Acordo de associação CEE‑Turquia – Reagrupamento familiar – Artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação – Cônjuge de uma trabalhadora turca que coabitou com ela durante mais de cinco anos – Manutenção do direito de residência após o divórcio – Condenação do interessado por violência exercida contra a ex‑mulher – Abuso de direito»

No processo C‑303/08,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha), por decisão de 24 de Abril de 2008, entrado no Tribunal de Justiça em 8 de Julho de 2008, no processo

Land Baden‑Württemberg

contra

Metin Bozkurt,

sendo interveniente:

Vertreter des Bundesinteresses beim Bundesverwaltungsgericht,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, presidente de secção, J.‑J. Kasel (relator), A. Borg Barthet, E. Levits e M. Berger, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação do Land Baden‑Württemberg, por M. Schenk, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo alemão, por M. Lumma e N. Graf Vitzthum, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo dinamarquês, por J. Bering Liisberg e R. Holdgaard, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por W. Ferrante, avvocato dello Stato,

–        em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por V. Kreuschitz e G. Rozet, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 8 de Julho de 2010,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação (a seguir «Decisão n.° 1/80»). O Conselho de Associação foi instituído pelo Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia, assinado em 12 de Setembro de 1963, em Ancara, pela República da Turquia, por um lado, e pelos Estados‑Membros da CEE e pela Comunidade, por outro, e concluído, aprovado e confirmado em nome desta última pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de Dezembro de 1963 (JO 1964, 217, p. 3685; EE 11 F1 p. 18).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Land Baden‑Wurttemberg (a seguir «Land») a M. Bozkurt, nacional turco, relativamente a um processo de expulsão do interessado do território alemão.

 Quadro jurídico

3        O artigo 59.° do Protocolo Adicional, assinado em 23 de Novembro de 1970, em Bruxelas, e concluído, aprovado e confirmado em nome da Comunidade pelo Regulamento (CEE) n.° 2760/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972 (JO L 293, p. 1; EE 11 F1 p. 213), tem a seguinte redacção:

«Nos domínios abrangidos pelo presente protocolo, a Turquia não pode beneficiar de um tratamento mais favorável do que aquele que os Estados‑Membros aplicam entre si por força do Tratado que institui a Comunidade.»

4        A secção 1 do capítulo II da Decisão n.° 1/80, sob a epígrafe «Disposições sociais», é consagrada às «[q]uestões relativas ao emprego e à livre circulação dos trabalhadores». Esta secção inclui os artigos 6.° a 16.° da referida decisão.

5        Nos termos do artigo 6.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 7.° relativamente ao livre acesso ao emprego dos membros da sua família, o trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro:

–        tem direito nesse Estado‑Membro, após um ano de emprego regular, à renovação da sua autorização de trabalho para a mesma entidade patronal, se dispuser de um emprego;

–        tem direito nesse Estado‑Membro, após três anos de emprego regular e sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados‑Membros da Comunidade, a responder, dentro da mesma profissão, a outra oferta de emprego de uma entidade patronal de sua escolha, feita em condições normais e registada nos serviços de emprego desse Estado‑Membro;

–        beneficia nesse Estado‑Membro, após quatro anos de emprego regular, do livre acesso a qualquer actividade assalariada da sua escolha.»

6        O artigo 7.° da Decisão n.° 1/80 dispõe:

«Os membros da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro que tenham sido autorizados a reunir‑se‑lhe:

–        têm o direito de responder – sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados‑Membros da Comunidade – a qualquer oferta de emprego, desde que residam regularmente nesse Estado‑Membro há pelo menos três anos;

–        beneficiam nesse Estado‑Membro do livre acesso a qualquer actividade assalariada de sua escolha, desde que aí residam regularmente há pelo menos cinco anos.

Os filhos dos trabalhadores turcos que tenham obtido uma formação profissional no país de acolhimento poderão, independentemente da duração da sua residência nesse Estado‑Membro, desde que um dos pais tenha legalmente trabalhado no Estado‑Membro interessado pelo menos três anos, responder a qualquer oferta de emprego nesse Estado.»

7        O artigo 14.°, n.° 1, da mesma decisão tem a seguinte redacção:

«As disposições da presente secção são aplicáveis sem prejuízo das limitações justificadas por razões de ordem pública, de segurança e de saúde públicas.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

8        M. Bozkurt, nascido na Turquia em 1959, foi autorizado a entrar em território alemão em Abril de 1992.

9        No mês de Setembro de 1993, casou com uma nacional turca que exercia na Alemanha uma actividade assalariada regular e, por esse facto, era titular de uma autorização de residência permanente. A mulher obteve a nacionalidade alemã em 1999.

10      Na sequência do seu casamento, M. Bozkurt obteve, no mês de Outubro de 1993, uma autorização de residência temporária, que se converteu em permanente em Outubro de 1998, a saber, após o interessado preencher a condição de residência há cinco anos enunciada no artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da Decisão n.° 1/80.

11      A partir de Junho de 2000, viveu separado da mulher, da qual se divorciou em Novembro de 2003.

12      Durante a sua residência na Alemanha, M. Bozkurt teve vários empregos. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a duração exacta dos períodos de emprego não pôde ser estabelecida devido à inexistência de indicações precisas e de documentos justificativos apresentados para este efeito pelo interessado.

13      A partir do início do ano de 2000, M. Bozkurt esteve de baixa por doença durante aproximadamente 18 meses, período no decurso do qual foi operado a um tumor no cérebro.

14      Na sequência desta interrupção de trabalho, foi despedido pelo seu empregador. Desde então, está desempregado e recebe prestações de subsistência nos termos da parte II do Código Social (Sozialgesetzbuch, Teil II). Alojado num primeiro momento numa residência municipal, vive desde Novembro de 2005 num pequeno apartamento que o irmão lhe arrendou.

15      Quando já havia sido condenado em 1996 e em 2000 por ofensas corporais e crime de dano, M. Bozkurt, em Maio de 2004, foi considerado culpado de violação e ofensas corporais na pessoa da sua mulher durante uma estada na Turquia em Julho de 2002. O interessado, na sequência de uma decisão parcialmente favorável em sede de recurso, viu a sua pena definitivamente fixada, em 17 de Janeiro de 2005, em dois anos de prisão, com execução suspensa, pelo que, como se encontrava em prisão preventiva, foi libertado.

16      Por decisão de 26 de Julho de 2005, o Land decidiu expulsar M. Bozkurt com execução imediata (a seguir «ordem de expulsão»), baseando‑se na última condenação que lhe foi aplicada, que confirmava a sua predisposição para recorrer à violência. O Land considerou que o interessado não podia invocar os direitos previstos nos artigos 6.° ou 7.° da Decisão n.° 1/80, por não ter encontrado novo emprego num prazo razoável após o seu despedimento e não fazer esforços sérios para esse fim.

17      Tendo M. Bozkurt recorrido da ordem de expulsão, o Verwaltungsgericht Stuttgart determinou, num primeiro momento, a suspensão dessa ordem e, num segundo momento, anulou‑a por sentença de 5 de Julho de 2006.

18      Por acórdão de 14 de Março de 2007 do Verwaltungsgerichtshof Baden‑Württemberg, foi negado provimento ao recurso daquela decisão interposto pelo Land. Esse tribunal considerou, com efeito, que, tendo em conta os períodos de residência regular já cumpridos na Alemanha por M. Bozkurt, este último podia reivindicar o seu direito de residência com fundamento no artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da Decisão n.° 1/80. Assim, a ordem de expulsão era ilegal por não estar em conformidade com as condições aplicáveis aos nacionais da União, as quais, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, devem ser respeitadas quanto aos nacionais turcos titulares de um direito de residência nos termos da Decisão n.° 1/80. Esse tribunal considerou, além disso, que as circunstâncias de M. Bozkurt estar no desemprego desde 2000, de se encontrar definitivamente excluído do mercado de trabalho por doença grave e de ter estado preso durante cerca de nove meses não o fizeram perder o estatuto jurídico que lhe confere a referida disposição da Decisão n.° 1/80, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual o direito de residência, uma vez adquirido, é independente da persistência das condições que permitiram essa aquisição.

19      O Land interpôs então recurso de «Revision» para o Bundesverwaltungsgericht, alegando, por um lado, que M. Bozkurt tinha entretanto perdido o seu direito de residência na Alemanha em razão da sua exclusão do mercado de trabalho e que, por outro lado, não podia validamente basear‑se no artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, uma vez que tinha atentado gravemente contra a integridade física da pessoa da qual derivam os seus direitos.

20      Partilhando a análise jurídica desenvolvida pelo Verwaltungsgerichtshof Baden‑Württemberg no seu acórdão de 14 de Março de 2007, o Bundesverwaltungsgericht considera que, para decidir o litígio que lhe foi submetido, importa determinar se, no momento em que foi decretada a ordem de expulsão, M. Bozkurt podia invocar a protecção conferida pelo artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80.

21      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio considera que não existe ainda jurisprudência do Tribunal de Justiça quanto à questão de saber se o direito de residência num Estado‑Membro, adquirido por um nacional turco na sua qualidade de membro da família de uma trabalhadora turca regularmente integrada no mercado de trabalho desse Estado, se perde ou não pela dissolução do casamento ocorrida após a aquisição regular do direito em questão.

22      Além disso, o referido órgão jurisdicional questiona‑se sobre se, tendo em conta as circunstâncias factuais particulares que caracterizam o processo principal, um nacional turco como M. Bozkurt pode validamente invocar o direito de residência com fundamento no artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, sem que tal atitude se possa considerar como revestindo natureza abusiva. Há especialmente que determinar se o beneficiário de um direito regularmente adquirido pode ser dele privado no caso de se revelar a posteriori indigno relativamente à pessoa da qual derivara esse direito.

23      Considerando que, nestas condições, a resolução do litígio submetido à sua apreciação exige uma interpretação da Decisão n.° 1/80, o Bundesverwaltungsgerich decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O direito ao emprego e à residência adquirido pelo cônjuge, ao abrigo do artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da [Decisão n.° 1/80], como membro da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro, mantém‑se mesmo depois do divórcio?

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

2)      A invocação do direito de residência decorrente do direito da ex‑mulher, ao abrigo do artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da [Decisão n.° 1/80], constitui um abuso de direito quando o [dito] nacional turco, depois de adquirir esse direito, a violou e agrediu e este comportamento foi punido com uma pena de prisão de dois anos?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

24      Resulta dos autos que o nacional turco em causa no processo principal satisfazia todas as condições necessárias para beneficiar legalmente do estatuto jurídico previsto no artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da Decisão n.° 1/80 antes da dissolução do seu casamento.

25      Nestas condições, há que entender a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio como perguntando, no essencial, se o artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 deve ser interpretado no sentido de que um nacional turco como o recorrente no processo principal, que, na sua qualidade de membro da família de uma trabalhadora turca integrada no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro e pelo facto de ter residido com o seu cônjuge durante um período contínuo de pelo menos cinco anos, beneficia dos direitos relativos ao estatuto jurídico conferido com fundamento no segundo travessão da referida disposição, perde o benefício destes direitos em razão do divórcio proferido em data posterior à aquisição destes.

26      Para responder a esta questão, importa, em primeiro lugar, observar que, como decorre da própria letra do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, a aquisição dos direitos previstos nesta disposição está subordinada a duas condições cumulativas prévias, a saber, por um lado, a pessoa em causa deve ser membro da família de um trabalhador turco que já esteja integrado no mercado regular de trabalho do Estado‑Membro de acolhimento e, por outro, deve ter sido autorizada pelas instâncias competentes desse Estado a juntar‑se aí ao referido trabalhador. É pacífico que, no caso concreto, estas condições eram satisfeitas tanto por M. Bozkurt como pela sua mulher.

27      Em segundo lugar, em conformidade com o sistema implementado pelas partes contratantes no âmbito da referida disposição, os direitos conferidos por esta ao nacional turco que preenche as condições recordadas no número precedente são progressivamente alargados em função da duração da residência efectiva do interessado com o trabalhador turco já regularmente presente no Estado‑Membro de acolhimento.

28      Assim, após essa residência regular durante três anos, o nacional turco em causa adquire o direito de responder a qualquer oferta de emprego, sob a única reserva da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados‑Membros da União Europeia (artigo 7.°, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.° 1/80).

29      Após dois anos suplementares de residência regular no território do Estado‑Membro de acolhimento, o mesmo nacional turco beneficia do livre acesso a qualquer actividade assalariada à sua escolha (artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da mesma decisão). No caso concreto, M. Bozkurt satisfaz incontestavelmente este critério.

30      Deve precisar‑se neste contexto que, ao contrário do sistema previsto no âmbito do artigo 6.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80, baseado no exercício de um emprego regular durante certos períodos, o critério pertinente para a aplicação do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da mesma decisão é, assim, a residência regular junto do trabalhador migrante turco. Após essa residência com uma determinada duração, o interessado obtém o direito a um emprego, mas esta disposição não faz disso uma obrigação nem uma condição para a aquisição de um direito garantido pela Decisão n.° 1/80 (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 7 de Julho de 2005, Aydinli, C‑373/03, Colect., p. I‑6181, n.os 29 e 31; de 18 de Julho de 2007, Derin, C‑325/05, Colect., p. I‑6495, n.° 56; e de 25 de Setembro de 2008, Er, C‑453/07, Colect., p. I‑7299, n.os 31 a 34). A situação de um nacional turco como o que está em causa no processo principal no que respeita ao emprego é, por isso, desprovida de pertinência.

31      Importa recordar, em terceiro lugar, que o Tribunal de Justiça já decidiu diversas vezes que, por um lado, o referido artigo 7.°, primeiro parágrafo, produz um efeito directo e que, por outro, os períodos de residência como os enunciados requerem, sob pena de serem privados de qualquer efeito, o reconhecimento de um direito correlativo de residência (v., designadamente, acórdãos Er, já referido, n.os 25 e 26, e de 18 de Dezembro de 2008, Altun, C‑337/07, Colect., p. I‑10323, n.os 20 e 21).

32      Em quarto lugar, importa sublinhar que o sistema de aquisição progressiva dos direitos previstos no artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 prossegue um duplo objectivo.

33      Num primeiro momento, antes da expiração do período inicial de três anos, a referida disposição visa permitir a presença de membros da família do trabalhador migrante junto deste último, com o fim de assim favorecer, através do reagrupamento familiar, o emprego e a residência do trabalhador turco já regularmente integrado no Estado‑Membro de acolhimento (v., designadamente, acórdãos de 17 de Abril de 1997, Kadiman, C‑351/95, Colect., p. I‑2133, n.os 35 e 36; de 22 de Junho de 2000, Eyüp, C‑65/98, Colect., p. I‑4747, n.° 26; e de 11 de Novembro de 2004, Cetinkaya, C‑467/02, Colect., p. I‑10895, n.° 25).

34      Em seguida, a mesma disposição entende reforçar a inserção duradoura da família do trabalhador migrante turco no Estado‑Membro de acolhimento, atribuindo ao membro da família em causa, após três anos de residência regular, a possibilidade de aceder ele próprio ao mercado de trabalho. O objectivo essencial assim prosseguido é consolidar a posição do referido membro da família, que se encontra, nesta fase, já regularmente integrado no Estado‑Membro de acolhimento, dando‑lhe os meios de ganhar a sua própria vida no Estado em questão e, por isso, de aí se constituir uma situação autónoma relativamente à do trabalhador migrante (v., designadamente, acórdãos, já referidos, Eyüp, n.° 26; Cetinkaya, n.° 25; Aydinli, n.° 23; e Derin, n.os 50 e 71).

35      O Tribunal de Justiça deduziu daqui que, se o membro da família é, em princípio e salvo motivos legítimos, obrigado a residir efectivamente com o trabalhador migrante enquanto ele próprio não tem o direito de aceder ao mercado de trabalho – noutros termos, antes da expiração do período de três anos –, pelo contrário, esse já não é o caso quando o interessado tenha adquirido legalmente esse direito nos termos do artigo 7.°, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.° 1/80 e, por maioria de razão, quando, após cinco anos, é titular de um direito incondicional ao emprego (v. acórdão Derin, já referido, n.° 51 e jurisprudência referida).

36      Com efeito, desde que estejam preenchidas as condições do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, esta disposição confere ao membro da família de um trabalhador turco um direito próprio de acesso ao mercado de emprego no Estado‑Membro de acolhimento assim como, correlativamente, o direito de continuar a residir no território deste.

37      Estes direitos têm certamente a sua origem na situação ocupada no passado pelo familiar trabalhador turco no território do mesmo Estado e por intermédio do qual o membro da sua família adquiriu um direito de residência.

38      Todavia, como a Comissão das Comunidades Europeias defende com pertinência nas suas observações escritas, quando o membro da família desse trabalhador obteve ele próprio um direito individual nos termos do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, atingiu um nível de integração suficiente no Estado‑Membro de acolhimento para que a sua situação possa ser vista como autonomizável da do seu familiar que tinha tornado possível o seu acesso ao território desse Estado e, logo, como autónoma relativamente à da do seu familiar (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Derin, n.os 50 e 71, e Altun, n.os 59 e 63).

39      Tal interpretação impõe‑se igualmente no que toca à finalidade da Decisão n.° 1/80 considerada no seu conjunto, a propósito da qual já foi reiteradamente decidido que se destina a favorecer a situação dos migrantes turcos no Estado‑Membro de acolhimento, favorecendo a integração gradual neste último dos trabalhadores turcos que preenchem as condições previstas numa disposição desta decisão e que, por conseguinte, beneficiam dos direitos que esta lhes confere (v., designadamente, acórdãos de 16 de Março de 2000, Ergat, C‑329/97, Colect., p. I‑1487, n.os 43 e 44; Derin, já referido, n.° 53; e Altun, já referido, n.os 28 e 29).

40      Ora, foi nesta óptica que o Tribunal de Justiça considerou que direitos como os legalmente adquiridos por M. Bozkurt com fundamento no artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 existem independentemente da manutenção dessas condições que eram exigidas para fazer nascer esses direitos (v. acórdãos, já referidos, Ergat, n.° 40; Cetinkaya, n.° 31; Aydinli, n.° 26; Derin, n.° 53; e Altun, n.° 36), de modo que o membro da família já titular de direitos nos termos da referida decisão está em posição de consolidar progressivamente a sua situação no Estado‑Membro de acolhimento e de aí se integrar duradouramente, levando uma vida independente da da pessoa por intermédio da qual obteve esses direitos (v., neste sentido, designadamente, acórdão Ergat, já referido, n.os 43 e 44).

41      A interpretação recordada no número anterior não é mais que a expressão do princípio mais geral de respeito dos direitos adquiridos, consagrado pelo acórdão de 16 de Dezembro de 1992, Kus (C‑237/91, Colect., p. I‑6781, n.os 21 e 22), princípio segundo o qual, quando o nacional turco pode validamente invocar direitos nos termos de uma disposição da Decisão n.° 1/80, estes direitos já não dependem da persistência das circunstâncias que lhes deram origem, não sendo imposta uma condição dessa natureza por essa decisão. No processo que deu origem ao referido acórdão Kus, a circunstância em causa era precisamente um casamento que tinha permitido ao nacional turco em questão entrar no território do Estado‑Membro de acolhimento, tendo esse casamento sido seguido de um divórcio ocorrido num momento em que o interessado já tinha adquirido direitos, no caso concreto em aplicação do artigo 6.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80. Importa recordar que, através do n.° 22 do acórdão de 5 de Outubro de 1994, Eroglu (C‑355/93, Colect., p. I‑5113), este mesmo princípio passou a ser aplicável nos termos do artigo 7.° da mesma decisão (v., no mesmo sentido, designadamente, acórdãos, já referidos, Ergat, n.° 40; Aydinli, n.° 26; Derin, n.° 50; e Altun, n.os 42 e 43).

42      Em quinto lugar, no que respeita às circunstâncias que implicam perda de direitos que o artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 reconhece aos membros da família de um trabalhador turco que preenchem as condições enunciadas no referido parágrafo, é jurisprudência constante que os limites a esses direitos só podem ser de dois tipos, a saber, o facto de a presença do migrante turco no território do Estado‑Membro de acolhimento constituir, em razão do seu comportamento pessoal, um perigo efectivo e grave para a ordem pública, a segurança ou a saúde públicas, na acepção do artigo 14.°, n.° 1, da mesma decisão, ou o facto de o interessado ter abandonado o território desse Estado durante um período significativo e sem motivos legítimos (v., designadamente, acórdãos, já referidos, Er, n.° 30, e Altun, n.° 62).

43      O carácter exaustivo dos limites enunciados no número precedente foi reafirmado pelo Tribunal de Justiça de forma constante (v., designadamente, acórdãos, já referidos, Cetinkaya, n.° 38; Derin, n.° 54; Er, n.° 30; e Altun, n.° 62).

44      De todas considerações precedentes, há que deduzir que o divórcio dos cônjuges, quando é proferido após a aquisição válida pelo membro da família em causa dos direitos conferidos pelo artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, é desprovido de pertinência quanto à manutenção dos referidos direitos em benefício do respectivo titular, mesmo se, inicialmente, este último só os pode obter por intermédio do seu ex‑cônjuge.

45      Cabe, por fim, precisar que a interpretação dada no número anterior não é incompatível com as exigências do artigo 59.° do Protocolo Adicional assinado em 23 de Novembro de 1970. Com efeito, como salientou a advogada‑geral nos n.os 50 a 52 das suas conclusões, por motivos análogos aos desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça nos n.os 62 a 67 do acórdão Derrin, já referido, bem como no n.° 21 do acórdão de 4 de Outubro de 2007, Polat (C‑349/06, Colect., p. I‑8167), a situação do membro da família de um trabalhador migrante turco não pode ser utilmente comparada à de um membro da família de um nacional de um Estado‑Membro, tendo em conta as diferenças sensíveis existentes entre a respectiva situação jurídica (v., neste sentido, acórdão de 21 de Janeiro de 2010, Bekleyen, C‑462/08, Colect., p. I‑0000, n.os 35 a 38 e 43).

46      Em face do exposto, há então que responder à primeira questão que o artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80 deve ser interpretado no sentido de que um nacional turco como o recorrente no processo principal que, na sua qualidade de membro da família de uma trabalhadora turca integrada no mercado regular de emprego de um Estado‑Membro e por ter residido com o seu cônjuge durante um período continuado de pelo menos cinco anos, beneficia dos direitos relativos ao estatuto conferido com fundamento no segundo travessão da referida disposição não perde o benefício desses direitos em razão do divórcio proferido em data posterior à aquisição destes.

 Quanto à segunda questão

47      É jurisprudência constante que os particulares não podem fraudulenta ou abusivamente prevalecer‑se de normas de direito da União e que os órgãos jurisdicionais nacionais podem, caso a caso, baseando‑se em elementos objectivos, ter em conta o comportamento abusivo ou fraudulento das pessoas em causa para lhes recusar, se for caso disso, o benefício das disposições do referido direito (v., designadamente, acórdãos de 9 de Março de 1999, Centros, C‑212/97, Colect., p. I‑1459, n.° 25; de 21 de Fevereiro de 2006, Halifax e o., C‑255/02, Colect., p. I‑1609, n.° 68; e de 20 de Setembro de 2007, Tum e Dari, C‑16/05, Colect., p. I‑7415, n.° 64).

48      Foi por isso que o Tribunal de Justiça excluiu que os períodos de emprego que um nacional turco só tinha podido cumprir graças a um comportamento fraudulento que deu lugar a uma condenação possam ser considerados regulares para a aplicação do artigo 6.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80, uma vez que o interessado não preenchia, na realidade, as condições previstas por esta disposição e não tinha por esse facto beneficiado legalmente de um direito nos termos desta última (v. acórdãos de 5 de Junho de 1997, Kol, C‑285/95, Colect., p. I‑3069, n.os 26 e 27, e de 11 de Maio de 2000, Savas, C‑37/98, Colect., p. I‑2927, n.° 61).

49      Não se pode, com efeito, admitir que um nacional turco pretenda obter para si indevidamente o benefício das vantagens garantidas por uma das disposições da Decisão n.° 1/80.

50      Todavia, no caso concreto, resulta dos autos transmitidos ao Tribunal de Justiça pelo órgão jurisdicional de reenvio que os órgãos jurisdicionais nacionais que decidiram quanto ao mérito do processo actualmente pendente no Bundesverwaltungsgericht constataram expressamente que M. Bozkurt beneficiava legalmente do estatuto jurídico previsto no artigo 7.°, primeiro parágrafo, segundo travessão, da Decisão n.° 1/80. Não foi sequer apresentado ao Tribunal de Justiça nenhum elemento que deixasse entender que, no processo principal, se tratava de um casamento fictício contraído com o único objectivo de beneficiar abusivamente de vantagens previstas no direito de associação CEE‑Turquia.

51      Nestas condições, é forçoso concluir que, no processo principal, M. Bozkurt não fez mais que exercer os direitos que lhe são expressamente conferidos pela Decisão n.° 1/80 e para a obtenção dos quais satisfez todas as condições requeridas.

52      Ora, o facto de esse nacional turco se prevalecer plenamente do benefício dos direitos garantidos pela referida decisão e que adquiriu regularmente no passado não poderia, em si mesmo, ser considerado como constituindo um abuso de direito.

53      Todavia, o órgão jurisdicional de reenvio, sem colocar uma questão relativa à interpretação do artigo 14.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80, pergunta‑se sobre se, nas circunstâncias particulares do processo principal, a reivindicação por M. Bozkurt do estatuto jurídico adquirido nos termos do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da mesma decisão não é susceptível de ofender a ordem pública, tendo em conta a infracção penal grave que cometeu, posteriormente a esta aquisição, contra a pessoa que lhe tinha permitido beneficiar do referido estatuto.

54      A este respeito, cumpre precisar que é o artigo 14.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80 que define o quadro jurídico apropriado que permite apreciar em que medida um nacional turco que tenha sido objecto de condenações penais pode ser privado, por meio de uma expulsão do Estado‑Membro de acolhimento, dos direitos que lhe confere directamente esta decisão (v., designadamente, acórdão Derrin, já referido, n.° 74).

55      Quanto à determinação do alcance da excepção de ordem pública prevista na referida disposição, há que fazer referência, em conformidade com jurisprudência constante, à interpretação dada à mesma excepção em matéria de livre circulação dos trabalhadores nacionais dos Estados‑Membros da União (v., designadamente, acórdão Polat, já referido, n.° 30).

56      O Tribunal de Justiça sempre salientou que a referida excepção constitui uma derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de pessoas, que deve ser objecto de interpretação estrita e cujo âmbito não pode ser unilateralmente determinado pelos Estados‑Membros (v., designadamente, acórdão Polat, já referido, n.° 33 e jurisprudência referida).

57      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o recurso, por parte de uma autoridade nacional, ao conceito de ordem pública pressupõe, além da perturbação da ordem social que qualquer infracção à lei constitui, a existência de uma ameaça real e suficientemente grave que afecte um interesse fundamental da sociedade (acórdão Polat, já referido, n.° 34 e jurisprudência referida).

58      Também as medidas tomadas por razões de ordem pública ou de segurança pública devem basear‑se exclusivamente no comportamento pessoal do interessado. Tais medidas não podem por isso ser ordenadas automaticamente após uma condenação penal e com a finalidade de prevenção geral (acórdão Polat, já referido, n.os 31 e 35).

59      A existência de uma condenação penal só pode, assim, ser tida em conta na medida em que as circunstâncias que deram origem à condenação revelem a existência de um comportamento pessoal que constitua uma ameaça actual para a ordem pública (acórdão Polat, já referido, n.° 32 e jurisprudência referida).

60      Compete, por isso, às autoridades nacionais em causa proceder caso a caso a uma apreciação do comportamento pessoal do autor da infracção, bem como do carácter actual, real e suficientemente grave do perigo que representa para a ordem e segurança públicas, e essas autoridades devem, além disso, velar pelo respeito tanto do princípio da proporcionalidade como dos direitos fundamentais do interessado. Mais especificamente, uma medida de expulsão baseada no artigo 14.°, n.° 1, da Decisão n.° 1/80 só pode ser decidida se o comportamento pessoal do interessado revelar um risco concreto de novas perturbações graves da ordem pública (v. acórdão Derin, já referido, n.° 74).

61      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que:

–        não constitui um abuso de direito o facto de um nacional turco como o recorrente no processo principal se prevalecer de um direito legalmente adquirido nos termos do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, quando o interessado, após ter obtido o benefício desse direito por intermédio do seu ex‑cônjuge, cometeu contra este uma infracção grave que deu lugar à sua condenação penal;

–        pelo contrário, o artigo 14.°, n.° 1, da mesma decisão não se opõe a que uma medida de expulsão seja tomada contra um nacional turco que tenha sido alvo de condenações penais, desde que o seu comportamento pessoal constitua uma ameaça actual, real e suficientemente grave que afecta um interesse fundamental da sociedade. Cabe ao órgão jurisdicional competente apreciar se é esse o caso no processo principal.

 Quanto às despesas

62      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

1)      O artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação, adoptada pelo Conselho de Associação instituído pelo Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia, deve ser interpretado no sentido de que um nacional turco como o recorrente no processo principal que, na sua qualidade de membro da família de uma trabalhadora turca integrada no mercado regular de emprego de um Estado‑Membro e por ter residido com o seu cônjuge durante um período continuado de pelo menos cinco anos, beneficia dos direitos relativos ao estatuto conferido com fundamento no segundo travessão da referida disposição não perde o benefício desses direitos em razão do divórcio proferido em data posterior à aquisição destes.

2)      Não constitui um abuso de direito o facto de um nacional turco como o recorrente no processo principal se prevalecer de um direito legalmente adquirido nos termos do artigo 7.°, primeiro parágrafo, da Decisão n.° 1/80, quando o interessado, após ter obtido o benefício desse direito por intermédio do seu ex‑cônjuge, cometeu contra este uma infracção grave que deu lugar à sua condenação penal.

Pelo contrário, o artigo 14.°, n.° 1, da mesma decisão não se opõe a que uma medida de expulsão seja tomada contra um nacional turco que tenha sido alvo de condenações penais, desde que o seu comportamento pessoal constitua uma ameaça actual, real e suficientemente grave que afecta um interesse fundamental da sociedade. Cabe ao órgão jurisdicional competente apreciar se é esse o caso no processo principal.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.

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