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Document 62008CJ0279

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 8 de Septembro de 2011.
    Comissão Europeia contra Reino dos Países Baixos.
    Recurso de decisão do Tribunal Geral - Auxílios de Estado - Artigo 87.º, n.º 1, CE - Sistema de transacção de direitos de emissão para os óxidos de azoto - Qualificação da medida nacional de auxílio de Estado - Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado comum - Conceito de selectividade - Vantagem financiada através de recursos do Estado - Protecção do ambiente - Dever de fundamentação - Admissibilidade.
    Processo C-279/08 P.

    Colectânea de Jurisprudência 2011 I-07671

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:551

    Processo C‑279/08 P

    Comissão Europeia

    contra

    Reino dos Países Baixos

    «Recurso de decisão do Tribunal Geral – Auxílios de Estado – Artigo 87.°, n.° 1, CE – Sistema de transacção de direitos de emissão de óxidos de azoto – Qualificação da medida nacional de auxílio de Estado – Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado comum – Conceito de ‘selectividade’ – Vantagem financiada através de recursos do Estado – Protecção do ambiente – Dever de fundamentação – Admissibilidade»

    Sumário do acórdão

    1.        Recurso de anulação – Actos susceptíveis de recurso – Conceito – Actos que produzem efeitos jurídicos vinculativos – Decisão que qualifica uma medida notificada de auxílio de Estado e a declara compatível com o mercado comum – Inclusão

    (Artigos 87.° CE, 88.° CE e 230.° CE; Regulamento n.° 659/1999 do Conselho)

    2.        Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Carácter selectivo da medida

    (Artigo 87.°, n.° 1, CE)

    3.        Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Carácter selectivo da medida

    (Artigo 87.°, n.° 1, CE)

    4.        Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Apreciação segundo o critério das condições normais de mercado

    (Artigo 87.°, n.° 1, CE)

    5.        Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Auxílios provenientes de recursos do Estado

    (Artigo 87.°, n.° 1, CE)

    6.        Auxílios concedidos pelos Estados – Decisão da Comissão que qualifica uma medida de auxílio de Estado – Dever de fundamentação – Alcance

    (Artigos 87.°, n.° 1, CE e 296.° TFUE)

    1.        Caso a Comissão constate, após a análise preliminar, que a medida notificada, na medida em que é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE, não suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum, toma uma decisão de não levantar objecções nos termos do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo 88.° Essa decisão dá origem, nomeadamente, à aplicação do procedimento previsto para os regimes de auxílios existentes pelo referido regulamento, e, em especial, a dos artigos 17.° a 19.° e 21.° do referido regulamento, que impõe ao Estado‑Membro a obrigação de transmitir à Comissão um relatório anual sobre todos os regimes de auxílios existentes.

    Portanto, uma qualificação errada de uma medida como auxílio de Estado tem consequências jurídicas para o Estado‑Membro notificante na medida em que fica sujeito a uma vigilância constante da Comissão e a um controlo periódico por sua parte, de modo que esse Estado‑Membro goza de uma estrita margem de manobra na execução da medida notificada.

    Daqui decorre necessariamente que uma decisão fundamentada nos n.os 1 e 3 do artigo 87.° CE que, ao qualificar a medida em causa de auxílio de Estado, a declara compatível com o mercado comum deve ser considerada um acto recorrível nos termos do artigo 230.° CE. Essa decisão de compatibilidade na acepção do artigo 87.°, n.os 1 e 3, CE tem igualmente carácter definitivo e não constitui uma medida preparatória.

    (cf. n.os 40‑42)

    2.        Para provar que uma medida susceptível de ser qualificada de auxílio de Estado é aplicada de modo selectivo a certas empresas ou a certas produções, compete à Comissão demonstrar que a mesma introduziu diferenciações entre as empresas que estão, em relação ao objectivo da medida em causa, numa situação factual e jurídica comparável.

    A este respeito, dado que a Comissão declara, na sua decisão, que determinadas empresas que beneficiam de uma mediada qualificada de auxílio de Estado fazem parte de um grupo específico de grandes empresas industriais activas no comércio entre os Estados‑Membros e beneficiam de uma vantagem que não está disponível para outras empresas que consiste no facto de poder acompanhar o valor económico das reduções de emissões que efectuam, convertendo‑as em direitos de emissão negociáveis, ou, eventualmente, de evitar o risco de dever pagar coimas quando ultrapassam o limite de emissões de óxidos de azoto fixado pelas autoridades nacionais, comprando esses direitos de emissão a outras empresas abrangidas pela medida em causa, quando as outras empresas não têm essas possibilidades, a Comissão não é obrigada a pormenorizar mais a sua decisão. No caso de um programa de auxílios, pode limitar‑se a estudar as características do programa em causa para apreciar, nos fundamentos da sua decisão, se, em razão das modalidades que este programa prevê, este assegura uma vantagem sensível aos beneficiários relativamente aos seus concorrentes e é susceptível de beneficiar essencialmente empresas que participam nas trocas comerciais entre Estados.

    (cf. n.os 62‑63, 65)

    3.        O artigo 87.°, n.° 1, CE não distingue consoante as causas ou os objectivos das interpretações estatais, mas define‑os em função dos seus efeitos. Mesmo que a protecção do ambiente constitua um dos objectivos essenciais da Comunidade Europeia, a necessidade de ter em consideração esse objectivo não justifica a exclusão de medidas selectivas do âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE, podendo os objectivos ambientais ser utilmente levados em conta, de qualquer forma, no âmbito da apreciação da compatibilidade do auxílio de Estado com o mercado comum nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE).

    Tratando‑se, especialmente, de uma medida que aplica um sistema de transação de direitos de emissão de óxidos de azoto, que faz uma diferenciação entre as empresas fundada no critério quantitativo como o critério da capacidade térmica total instalada das empresas, as emissões importantes de oxido de azoto das empresas abrangidas pela medida em causa e a norma específica de redução que impende sobre essas empresas não são suficientes para essa medida deixar de ter a qualificação de medidas selectivas no sentido do artigo 87.°, n.° 1, CE dado que a diferenciação entre as empresas não pode ser considerada inerente a um regime que tem por objectivo reduzir a poluição de origem industrial e, portanto, por si só justificada por considerações de ordem ecológica. Uma vez que esse critério de distinção não é justificado pela natureza nem pela economia geral da medida em causa não retira à medida em causa a sua natureza de auxílio de Estado.

    A este respeito, incumbe ao Estado‑Membro, que introduziu essa diferenciação entre as empresas, demonstrar que essa diferenciação é efectivamente justificada pela natureza e pela economia do sistema em causa.

    (cf. n.os 75‑78)

    4.        São considerados auxílios de Estado as intervenções que, independentemente da forma que assumam, sejam susceptíveis de favorecer directa ou indirectamente empresas, ou que devam ser consideradas uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado.

    É o caso de um sistema em que apenas certas empresas têm a possibilidade de poder acompanhar o valor económico das reduções de emissões de óxido de azoto que efectuam, convertendo‑as em direitos de emissão negociáveis, ou, eventualmente, de evitar o risco de dever pagar coimas quando ultrapassam o limite de emissões de óxidos de azoto fixado pelas autoridades nacionais, comprando esses direitos de emissão a outras empresas abrangidas pela medida em causa, dado que a negociabilidade dos direitos de emissão de óxidos de azoto depende, antes de mais, do facto de o Estado, por um lado, autorizar a venda desses direitos e, por outro, permitir às empresas que emitiram óxidos de azoto em excesso adquirir a outras empresas os direitos de emissão em falta, permitindo dessa maneira a criação de um mercado para esses direitos.

    A negociabilidade destes direitos não pode ser considerada uma contrapartida, ao preço do mercado, dos esforços desenvolvidos pelas empresas abrangidas pela medida em causa para diminuírem as suas emissões de óxidos de azoto, uma vez que os custos de redução das referidas emissões fazem parte dos encargos que incidem normalmente sobre o orçamento da empresa.

    Por outro, a faculdade de as empresas escolherem entre os custos de aquisição de direitos de emissão e os custos ligados às medidas destinadas a reduzir as emissões de óxidos de azoto constitui uma vantagem para elas. Além disso, a faculdade de as empresas abrangidas pela medida em causa poderem negociar todos os direitos de emissão e não apenas os créditos ocorridos no final do ano pela diferença positiva entre a emissão autorizada e a emissão verificada constitui uma vantagem suplementar para essas empresas. Com efeito, estas últimas podem dispor de liquidez vendendo os direitos de emissão antes da realização das condições para a sua atribuição definitiva, independentemente do facto de lhes ser aplicável um limite e do facto de as empresas que ultrapassam a norma de emissão imposta deverem compensar o excedente no ano seguinte.

    (cf. n.os 87‑91)

    5.        Para que as vantagens possam ser qualificadas de auxílios na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, devem, por um lado, ser concedidas directa ou indirectamente através de recursos estatais e, por outro lado, ser imputáveis ao Estado.

    Tal é o caso de uma empresa do Estado que coloca gratuitamente à disposição de certas empresas direitos de emissão de óxidos de azoto em vez de os vender ou adjudicá‑los em hasta pública, e instaura um regime que prevê a possibilidade de negociar esses direitos no mercado, mesmo que estejam ligados a um limite máximo, concedendo também às empresas abrangidas pela medida em causa a possibilidade de comprarem direitos de emissão para evitar o pagamento de coimas. A negociabilidade dos direitos de emissão de óxidos de azoto é uma vantagem permitida pelo legislador nacional a certas empresas, que pode implicar um encargo suplementar para os poderes públicos, sob a forma de uma exoneração da obrigação do pagamento de coimas ou outras sanções pecuniárias. Além disso, esse sistema tem como consequência a criação, sem contrapartida concreta dada ao Estado, de direitos de emissão que, devido ao seu carácter negociável, têm valor económico, ao dar a esses direitos de emissão um carácter de bens imateriais negociáveis e ao colocá‑los gratuitamente à disposição das empresas em causa em vez de vender esses direitos ou adjudicá‑los em hasta pública, renuncia efectivamente a recursos públicos.

    Por outro lado, o facto de essa medida permitir às empresas compensar entre si os excedentes e as faltas relativamente à norma imposta e de essa medida criar um quadro legal para limitar as emissões de óxidos de azoto de modo rentável para as empresas com grandes instalações demonstra que as empresas abrangidas pela medida em causa dispõem de uma alternativa relativamente à aplicação de uma coima pelo Estado.

    (cf. n.os 103, 106‑108)

    6.        Aplicado à qualificação de uma medida de auxílio de Estado, o dever de fundamentação exige que se indiquem as razões pelas quais a Comissão considera que a medida em causa integra o âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE. A este respeito, a Comissão não está obrigada a obrigada a demonstrar os efeitos reais dos auxílios sobre as trocas comerciais entre os Estados‑Membros e uma distorção efectiva da concorrência, mas apenas a examinar se esses auxílios são susceptíveis de afectar essas trocas comerciais e falsear a concorrência. Assim, quando resulta das circunstâncias em que um auxílio foi concedido que este é susceptível de afectar as trocas comerciais entre Estados‑Membros e falsear ou ameaçar falsear a concorrência, incumbe à Comissão evocar essas circunstâncias nos fundamentos da sua decisão.

    (cf. n.° 131)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

    8 de Setembro de 2011 (*)

    «Recurso de decisão do Tribunal Geral – Auxílios de Estado – Artigo 87.°, n.° 1, CE – Sistema de transacção de direitos de emissão de óxidos de azoto – Qualificação da medida nacional de auxílio de Estado – Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado comum – Conceito de ‘selectividade’ – Vantagem financiada através de recursos do Estado – Protecção do ambiente – Dever de fundamentação – Admissibilidade»

    No processo C‑279/08 P,

    que tem por objecto um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (actualmente Tribunal Geral), nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, interposto em 23 de Junho de 2008,

    Comissão Europeia, representada por C. Urraca Caviedes, K. Gross e H. van Vliet, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    recorrente,

    sendo as outras partes no processo:

    Reino dos Países Baixos, representado por C. M. Wissels e D. J. M. de Grave, na qualidade de agentes,

    recorrente em primeira instância,

    apoiado por:

    República Francesa, representada por G. de Bergues, A.‑L. Vendrolini, J. Gstalter e B. Cabouat, na qualidade de agentes,

    República da Eslovénia, representada por V. Klemenc, na qualidade de agente,

    Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por E. Jenkinson, S. Behzadi‑Spencer, S. Ossowski e H. Walker, na qualidade de agentes, assistidos por K. Bacon, barrister,

    intervenientes no presente recurso,

    República Federal da Alemanha, representada por M. Lumma, B. Klein e T. Henze, na qualidade de agentes,

    interveniente em primeira instância,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

    composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, R. Silva de Lapuerta, E. Juhász, G. Arestis (relator) e J. Malenovský, juízes,

    advogado‑geral: P. Mengozzi,

    secretário: C. Strömholm, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 14 de Outubro de 2010,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 22 de Dezembro de 2010,

    profere o presente

    Acórdão

    1        Com o seu recurso, a Comissão das Comunidades Europeias pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 10 de Abril de 2008, Países Baixos/Comissão (T‑233/04, Colect., p. II‑591, a seguir «acórdão recorrido»), através do qual foi anulada a decisão C(2003) 1761 final da Comissão, de 24 de Junho de 2003, relativa ao auxílio de Estado N 35/2003 respeitante ao sistema de transacção de direitos de emissão para os óxidos de azoto notificado pelo Reino dos Países Baixos (a seguir «decisão controvertida»).

    2        Com o seu recurso subordinado, o Reino dos Países Baixos pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido na parte em que o primeiro fundamento suscitado por esse Estado, relativo ao facto de não haver uma vantagem financiada por recursos do Estado, foi julgado improcedente.

    3        Com o seu recurso subordinado, a República Federal da Alemanha pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido.

     Quadro jurídico

    4        A Directiva 2001/81/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2001, é relativa ao estabelecimento de valores‑limite nacionais de emissão de determinados poluentes atmosféricos (JO L 309, p. 22). Os Estados‑Membros deviam pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento a esta directiva antes de 27 de Novembro de 2002 e informar imediatamente a Comissão desse facto.

    5        Nos termos do artigo 4.° desta directiva, até 2010, os Estados‑Membros devem limitar as suas emissões nacionais de óxidos de azoto (a seguir «NOx») a quantidades não superiores aos valores‑limite de emissão anual fixados no anexo I da referida directiva. Esse limite foi fixado, para o Reino dos Países Baixos, em 260 quilotoneladas.

     Antecedentes do litígio

    6        Os n.os 8 a 20 do acórdão recorrido, a seguir reproduzidos, expõem o quadro factual na origem do litígio:

    «8      Por ofício de 23 de Janeiro de 2003, as autoridades neerlandesas, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE, notificaram à Comissão um sistema de transacção de direitos de emissão para os NOx (a seguir ‘medida em causa’). Pediram à Comissão que adoptasse uma decisão que declarasse que a medida em causa não constituía um auxílio, na acepção do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93.° […] CE (JO L 83, p. 1).

    9      Em 24 de Junho de 2003, a Comissão adoptou a [decisão controvertida].

    10      Na [decisão controvertida], a Comissão começa por descrever a medida em causa no respectivo ponto 1. Relativamente ao valor‑limite nacional neerlandês de emissão de NOx definido pela Directiva 2001/81, as autoridades neerlandesas fixaram um objectivo de 55 quilotoneladas de emissão de NOx em 2010 para as suas grandes instalações industriais, ou seja, para cerca de 250 empresas.

    11      Quanto ao funcionamento desse sistema, a Comissão, no ponto 1.2 da [decisão controvertida], refere que a legislação nacional deve fixar, para cada instalação industrial, uma norma relativa de emissão de NOx a respeitar. A empresa pode respeitar a norma de emissão estabelecida quer através da adopção de medidas de redução das emissões de NOx na sua própria instalação, quer através da aquisição de direitos de emissão a outras empresas, quer conjugando as duas opções. As reduções de emissão, sob a forma de créditos de NOx, são propostas no mercado de transacção dos direitos de emissão pelas instalações cujas emissões são inferiores à norma de emissão.

    12      A emissão anual total de NOx de uma instalação, corrigida pelos eventuais créditos de NOx vendidos ou comprados, deve corresponder ao nível de emissão autorizado para a referida instalação. A emissão anual autorizada – em números absolutos – é calculada em função da norma de emissão relativa e da quantidade de energia utilizada pela referida instalação.

    13      No fim de cada ano, as autoridades neerlandesas verificam se as instalações respeitaram a norma de emissão estabelecida. Cada ano, os créditos de NOx podem ser comprados, guardados ou emprestados para períodos futuros. Se uma instalação ultrapassar a norma de emissão estabelecida, deve compensar o excedente no ano seguinte. Além disso, esse excedente a compensar sofre um agravamento de 25% para desencorajar os excessos. Se uma instalação não conseguir respeitar a sua norma de emissão, as autoridades neerlandesas aplicam‑lhe uma coima eficaz, proporcional e dissuasiva.

    14      Por último, no âmbito da medida em causa, as empresas não têm de adquirir direitos de emissão para poderem produzir. Devem tão‑só respeitar a norma de emissão.

    15      No ponto 1.3 da [decisão controvertida], a Comissão descreve o método de cálculo da norma de emissão e depois, no ponto 1.4 da mesma, as diferenças existentes entre o sistema ‘cap‑and‑trade’ e o sistema ‘dynamic cap’, do tipo da medida em causa. Afirma que, segundo as autoridades neerlandesas, a medida em causa difere da outra variante dos sistemas de direitos negociáveis, o sistema ‘cap‑and‑trade’, em que as licenças de emissão são atribuídas às empresas. As novas empresas ou as que queiram alargar as suas actividades devem, antes de mais, adquirir a quantidade necessária de licenças. No âmbito da medida em causa, essas empresas não têm essa obrigação, devendo simplesmente respeitar a respectiva norma de emissão, que depende do seu consumo de energia e é adaptada em função desse mesmo consumo.

    16      Nos pontos 1.5 e 1.6 da [decisão controvertida], a Comissão esclarece, em seguida, que a medida em causa se aplicará a todas as empresas industriais que tenham potência instalada superior a 20 megawatts térmicos (MWth), em paralelo com a regulamentação comunitária. As autoridades neerlandesas continuarão a aplicar os valores‑limite de emissão fixados pelas diversas directivas comunitárias em vigor.

    17      Na apreciação da medida em causa (ponto 3 da [decisão controvertida]), a Comissão começa por evocar a sua prática decisória relativa aos sistemas de transacção de direitos de emissão e distingue dois tipos de sistemas, do seguinte modo:

    ‘1)      Os sistemas em que as autorizações de emissão ou de poluição negociáveis são consideradas activos incorpóreos que representam um valor de mercado que o Estado poderia igualmente ter vendido ou adjudicado, o que origina um lucro cessante (ou uma perda de recursos estatais), pelo que constituem um auxílio de Estado, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, [CE];

    2)      Os sistemas em que as autorizações de emissão ou de poluição negociáveis são consideradas uma prova oficial de que determinada produção não poderá ser vendida ou adjudicada ao beneficiário da autorização, pelo que não há lucro cessante – e, por conseguinte, não está em causa um recurso estatal –, o que, por sua vez, implica que não esteja em causa um auxílio de Estado, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, [CE].’

    18      Em seguida, a Comissão expõe as razões que a levaram a concluir que a medida em causa, que consiste, no essencial, na concessão, pelo Estado, a título gratuito, de créditos de NOx a um grupo específico de empresas que exercem actividades comerciais entre Estados‑Membros, constituía um auxílio de Estado. Segundo a [decisão controvertida], as autoridades neerlandesas dispunham da possibilidade de vender ou adjudicar os direitos de emissão. Assim, ao oferecer gratuitamente créditos de NOx como activos incorpóreos, o Estado‑Membro sofre um dano na forma de lucro cessante. A Comissão conclui que esse sistema inclui recursos estatais, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE. O fortalecimento da posição das empresas em causa afecta o comércio entre Estados‑Membros.

    19      Por último, no ponto 3.3 da [decisão controvertida], a Comissão analisa a compatibilidade da medida em causa com o mercado comum.

    20      Em conclusão, no ponto 4 da [decisão controvertida], a Comissão declara que a medida em causa constitui um auxílio de Estado, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, acrescentando que esse auxílio é compatível com o mercado comum nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE e do artigo 61.°, n.° 3, alínea c), do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE). A Comissão ordena às autoridades neerlandesas que lhe transmitam anualmente um relatório relativo à execução da medida em causa e que lhe notifiquem previamente qualquer adaptação das condições em que o auxílio é concedido.»

     Tramitação processual no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

    7        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 5 de Setembro de 2003, o Reino dos Países Baixos interpôs recurso da decisão controvertida (processo C‑388/03).

    8        Por despacho de 17 de Fevereiro de 2004, o presidente do Tribunal de Justiça admitiu a intervenção da República Federal da Alemanha no processo em apoio do Reino dos Países Baixos.

    9        Por despacho de 8 de Junho de 2004, o Tribunal de Justiça remeteu o processo ao Tribunal de Primeira Instância, nos termos da Decisão 2004/407/CE, Euratom do Conselho, de 26 de Abril de 2004, que altera os artigos 51.° e 54.° do Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça (JO L 132, p. 5).

    10      Por notificação de 13 de Dezembro de 2004, o Tribunal de Primeira Instância convidou o Reino dos Países Baixos e a República Federal da Alemanha a apresentarem as suas observações sobre as conclusões a extrair do despacho do Tribunal de Justiça de 28 de Janeiro de 2004, Países Baixos/Comissão (C‑164/02, Colect., p. I‑1177), a respeito da admissibilidade do recurso. Estes apresentaram as suas observações, respectivamente, em 14 e 12 de Janeiro de 2005.

    11      O Reino dos Países Baixos, apoiado pela República Federal da Alemanha, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    –        anular a decisão controvertida, na medida em que a Comissão considera que a medida em causa constitui um auxílio, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE; e

    –        condenar a Comissão nas despesas.

    12      A Comissão concluiu pedindo que o Tribunal se digne:

    –        a título principal, julgar o recurso inadmissível ou, a título subsidiário, negar provimento ao recurso; e

    –        condenar o Reino dos Países Baixos nas despesas.

    13      A Comissão sustentou que o recurso da decisão controvertida era inadmissível. Essa decisão, que qualificou a medida em causa de auxílio de Estado compatível com o mercado comum, não é susceptível de recurso, porque não afectava os interesses do Reino dos Países Baixos.

    14      O Tribunal de Primeira Instância declarou o recurso admissível, concluindo, no n.° 42 do acórdão recorrido, que a referida decisão produzia seguramente efeitos jurídicos vinculativos. Em primeiro lugar, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que a qualificação de auxílio de Estado permitiu à Comissão analisar a compatibilidade da medida em causa com o mercado comum. Em segundo lugar, essa qualificação deu origem à aplicação do procedimento previsto para os regimes de auxílios existentes pelo Regulamento n.° 659/1999, nomeadamente do disposto nos artigos 17.° a 19.° e 21.° desse regulamento, que impõe ao Estado‑Membro a obrigação de transmitir à Comissão um relatório anual sobre todos os sistemas de auxílios existentes. Em terceiro lugar, essa qualificação podia também ter influência na concessão de um novo auxílio, por força das regras relativas ao cúmulo de auxílios de origens diversas, previstas, nomeadamente, no ponto 74 do enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente (JO 2001, C 37, p. 3).

    15      Em apoio dos seus pedidos, o Reino dos Países Baixos invocou dois fundamentos, relativos, respectivamente, à violação do artigo 87.° CE e ao não cumprimento do dever de fundamentação.

    16      Quanto ao primeiro fundamento, que está dividido em duas partes, o Reino dos Países Baixos, apoiado pela República Federal da Alemanha, alega que a medida em causa não constitui uma vantagem financiada através de recursos do Estado e que o requisito de selectividade previsto no artigo 87.° CE não é preenchido pelas empresas beneficiárias dessa medida.

    17      Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao facto de não existir uma vantagem financiada através de recursos do Estado, o Tribunal de Primeira Instância declarou que a medida em causa não se baseia em direitos de emissão atribuídos directamente pelo Estado. Todavia, a possibilidade de negociar esses direitos conferiu‑lhes um valor no mercado que pode ser vendido pelas empresas em qualquer altura. Além disso, ao comprarem os direitos de emissão, as empresas escapam a uma coima. Os direitos de emissão, equiparados a activos incorpóreos, foram postos gratuitamente à disposição das empresas em causa, quando podiam ter sido vendidos ou adjudicados em hasta pública. O Reino dos Países Baixos renunciou, assim, a recursos do Estado. Consequentemente, a medida em causa constitui uma vantagem concedida às empresas destinatárias através de recursos do Estado.

    18      Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à inexistência de selectividade, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que a medida em causa, considerada no seu todo, não favorecia certas empresas ou certas produções, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

    19      Em primeiro lugar, o critério de aplicação da medida, que é a capacidade térmica total das instalações industriais, constitui um critério objectivo. Segundo o Tribunal de Primeira Instância, dado que a medida em causa é aplicável às empresas mais poluentes, esse critério objectivo está em conformidade com o objectivo prosseguido, que é o da protecção do ambiente, e com a lógica interna do sistema.

    20      Em segundo lugar, foi declarado que a situação factual e jurídica das empresas sujeitas a esse valor‑limite específico de emissão de NOx não pode ser comparada à de empresas às quais esse valor‑limite não se aplica. Às grandes instalações industriais abrangidas por esse regime específico é imposta, sob pena de aplicação de uma coima, uma norma de emissão ou uma taxa de desempenho padrão estrita que é progressivamente reduzida até 2010. A Comissão não demonstrou a existência de um regime geral aplicável a empresas numa situação factual e jurídica comparável à das instalações sujeitas à medida em causa, mas que não proporciona a vantagem que representa a negociabilidade dos direitos de emissão de NOx. Assim, a medida em causa não constitui uma excepção a qualquer regime geral. Nestas condições, a medida em causa não favorece certas empresas ou certas produções, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE. Não estando o critério da selectividade preenchido, a referida medida não pode ser qualificada de auxílio de Estado.

    21      O Tribunal de Primeira Instância não teve de se pronunciar quanto ao segundo fundamento na medida em que anulou a decisão controvertida no final da apreciação do primeiro fundamento.

     Tramitação processual no Tribunal de Justiça

    22      Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 23 de Dezembro de 2008, a República da Eslovénia e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte foram autorizados a intervir em apoio dos pedidos do Reino dos Países Baixos.

    23      Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 8 de Maio de 2009, a República Francesa foi autorizada a intervir em apoio dos pedidos do Reino dos Países Baixos na audiência, se a esta houver lugar.

     Pedidos das partes

    24      No seu recurso, a Comissão pede ao Tribunal que:

    –        anule o acórdão recorrido;

    –        declare o recurso de anulação inadmissível;

    –        a título subsidiário, julgue improcedente o recurso de anulação; e

    –        condene o Reino dos Países Baixos nas despesas efectuadas nos processos no Tribunal de Primeira Instância e no Tribunal de Justiça.

    25      Na sua contestação, o Reino dos Países Baixos pede ao Tribunal que:

    –        negue provimento ao presente recurso;

    –        nos termos do recurso subordinado, anule o acórdão recorrido, na parte em que o primeiro fundamento suscitado por esse Estado, relativo ao facto de não haver uma vantagem financiada por recursos do Estado, foi julgado improcedente; e

    –        condene a Comissão no pagamento das despesas efectuadas nos processos no Tribunal de Primeira Instância e no presente recurso.

    26      Na sua contestação, a República Federal da Alemanha pede ao Tribunal que:

    –        a título principal:

    –        negue provimento ao presente recurso;

    –        através do recurso subordinado, anule o acórdão recorrido; e

    –        condene a Comissão nas despesas;

    –        a título subsidiário, se o Tribunal considerar que o recurso subordinado é inadmissível:

    –        negue provimento ao presente recurso;

    –        no caso de o Tribunal julgar procedente o recurso da Comissão, anule totalmente o acórdão recorrido; e

    –        condene a Comissão nas despesas.

    27      Na suas alegações de intervenção, a República da Eslovénia pede ao Tribunal que:

    –        negue provimento ao presente recurso; e

    –        condene a Comissão nas despesas.

    28      Nas suas alegações de intervenção, o Reino Unido pede ao Tribunal de Justiça que:

    –        negue provimento ao presente recurso; e

    –        condene a Comissão nas despesas efectuadas nos processos no Tribunal de Primeira Instância e no presente recurso.

     Quanto ao presente recurso

    29      A Comissão suscitou dois fundamentos em apoio do seu recurso. O primeiro fundamento é relativo à violação do artigo 230.° CE respeitante à legitimidade de um Estado‑Membro cujo auxílio foi aprovado. Através do segundo fundamento, suscitado a título subsidiário, a Comissão invoca a violação do artigo 87.°, n.° 1, CE quanto aos conceitos de «certas empresas» ou de «certas produções» previstas nesta disposição.

     Quanto ao primeiro fundamento

     Argumentos das partes

    30      O primeiro fundamento está dividido em duas partes. Na primeira parte, a Comissão alega que o texto preciso do dispositivo da decisão da Comissão cuja anulação é pedida não é determinante. Além disso, no n.° 47 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância apresenta de forma errada o dispositivo da decisão da Comissão adoptado no processo que deu origem ao despacho Países Baixos/Comissão, já referido. Por conseguinte, o n.° 47 do acórdão recorrido desvirtua os factos e é, portanto, baseado num critério errado de admissibilidade. De qualquer forma, a distinção efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância, no n.° 47 do acórdão recorrido, entre a decisão em causa no despacho Países Baixos/Comissão, já referido, e a decisão controvertida não é pertinente.

    31      Através da segunda parte do primeiro fundamento, a Comissão sustenta que é incorrecta a conclusão segundo a qual a qualificação da medida em causa de auxílio de Estado deu origem a certas consequências jurídicas. Com efeito, é jurisprudência constante que o conceito de auxílio de Estado é um conceito objectivo. A medida estatal controvertida ou é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE ou não o é. Não há que considerar que as consequências da decisão controvertida para o Estado‑Membro em causa, descritas pelo Tribunal de Primeira Instância no n.° 41 do acórdão recorrido (transmissão de relatórios, não haver cúmulo de auxílios), resultam da tomada de posição da Comissão, elas apenas dependem da questão de saber se a medida em causa é abrangida pelo artigo 87.°, n.° 1, CE. Relativamente aos limites do cúmulo dos auxílios, suscitados pelo Tribunal de Primeira Instância, a Comissão observa que são aplicáveis se a medida em causa constituir um auxílio, sem ter em consideração o facto de a Comissão ter ou não indicado na decisão controvertida que era esse o caso.

    32      O Reino dos Países Baixos assinala, em resposta à primeira parte do primeiro fundamento, que a decisão controvertida diverge substancialmente da decisão que deu origem ao despacho Países Baixos/Comissão, já referido. No caso em apreço, o Reino dos Países Baixos não pediu que se fiscalizasse a legalidade da medida em causa em relação aos artigos 87.° CE e 88.° CE. Pelo contrário, esse Estado‑Membro pediu expressamente à Comissão que não qualificasse a referida medida de auxílio de Estado. O presente recurso visa explicitamente o dispositivo da decisão controvertida, ao invés do recurso que deu origem ao despacho Países Baixos/Comissão, já referido.

    33      Quanto à argumentação relativa à segunda parte do primeiro fundamento, o Reino dos Países Baixos sublinha que a simples qualificação de uma medida nacional de auxílio de Estado vai permitir à Comissão examinar a compatibilidade da medida com o mercado comum. A Comissão tem, a este respeito, competência exclusiva. A referida qualificação obriga um Estado‑Membro a respeitar as obrigações decorrentes do Regulamento n.° 659/1999. Além disso, a qualificação pela Comissão de uma medida nacional de auxílio de Estado tem também consequências quanto ao processo nos órgãos jurisdicionais nacionais no que diz respeito a medidas nacionais comparáveis.

    34      Por outro lado, a República Federal da Alemanha, a República Francesa, a República da Eslovénia e o Reino Unido sustentam também que a decisão controvertida é recorrível ao abrigo do artigo 230.° CE.

     Apreciação do Tribunal

    35      No âmbito do primeiro fundamento, a Comissão contesta, em primeiro lugar, a conclusão a que chegou o Tribunal de Primeira Instância, no n.° 47 do acórdão recorrido, segundo o qual o presente processo deve ser distinguido do processo que deu origem ao despacho Países Baixos/Comissão, já referido. Neste último processo, o Reino dos Países Baixos pediu, com efeito, a anulação da decisão em causa «na medida em que, na referida decisão, a Comissão qualifica[va] de auxílios de Estado, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, os pagamentos efectuados pelas autoridades portuárias», quando essa conclusão não figurava no dispositivo desta decisão.

    36      A este respeito, decorre do n.° 20 do referido despacho que, na sua notificação de regime de auxílios em causa, o Estado‑Membro tinha solicitado à Comissão que apreciasse a legalidade da medida à luz dos artigos 87.° CE e 88.° CE, de modo que a dita decisão, adoptada nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE, por um lado, e nos termos do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, por outro, não pode alterar de forma caracterizada a situação jurídica do Reino dos Países Baixos. O Tribunal de Justiça concluiu também, nos n.os 21 a 24 desse mesmo despacho, que o dispositivo da decisão em causa não constituía de forma alguma uma tomada de posição sobre a natureza de empresa das autoridades portuárias nem sobre a natureza económica da totalidade das actividades destas últimas, que essa decisão não prejudicava nada a qualificação, à luz do artigo 87.°, n.° 1, CE, de eventuais outras contribuições concedidas às autoridades portuárias e que a parte contestada da fundamentação da referida decisão não tinha produzido efeitos jurídicos vinculativos susceptíveis de afectarem os interesses do Reino dos Países Baixos.

    37      Ao invés, no caso em apreço, decorre do n.° 8 do acórdão recorrido que as autoridades neerlandesas, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE, notificaram a Comissão da medida em causa pedindo a essa instituição que adoptasse uma decisão que declarasse a inexistência do auxílio, na acepção do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999. No seu recurso no Tribunal de Primeira Instância, o Reino dos Países Baixos contestou expressamente, por um lado, o facto de não ser provido o seu pedido de não qualificar a medida em causa de auxílio de Estado e, por outro, a fundamentação da decisão controvertida que indeferiu esse pedido. Além disso, decorre da decisão controvertida, bem como do acórdão recorrido, que a Comissão qualificou a medida em causa de auxílio de Estado antes de a declarar compatível com o mercado comum.

    38      Nestas circunstâncias, o Tribunal de Primeira Instância não cometeu um erro de direito ao distinguir o caso em apreço, que diz respeito ao pedido expresso do Estado‑Membro em causa no sentido de que a Comissão declare que a medida é adoptada em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 659/1999, do que foi objecto do processo que deu origem ao despacho Países Baixos/Comissão, já referido.

    39      Em segundo lugar, a Comissão contesta o n.° 41 do acórdão recorrido no sentido de que a qualificação da medida em causa de auxílio de Estado deu origem a consequências jurídicas no Estado‑Membro em questão. A Comissão sustenta que o conceito de auxílio de Estado é um conceito objectivo e que as consequências descritas pelo Tribunal de Primeira Instância não dependem dessa qualificação, mas da questão de saber se a medida em causa é abrangida pelo artigo 87.°, n.° 1, CE.

    40      A este respeito, há que recordar que, caso a Comissão constate, após a análise preliminar, que a medida notificada, na medida em que é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE, não suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum, toma uma decisão de não levantar objecções nos termos do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 659/1999 (acórdão de 24 de Maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 44). Foi com razão que o Tribunal de Primeira Instância salientou, no n.° 41 do acórdão recorrido, que essa decisão dá origem, nomeadamente, à aplicação do procedimento previsto para os regimes de auxílios existentes pelo Regulamento n.° 659/1999, e, em especial, a dos artigos 17.° a 19.° e 21.° deste, que impõe ao Estado‑Membro a obrigação de transmitir à Comissão um relatório anual sobre todos os regimes de auxílios existentes.

    41      Como observou o advogado‑geral, nos n.os 24 e 27 das suas conclusões, uma qualificação errada de uma medida como auxílio de Estado tem consequências jurídicas para o Estado‑Membro notificante na medida em que fica sujeito a uma vigilância constante da Comissão e a um controlo periódico por sua parte, de modo que esse Estado‑Membro goza de uma estrita margem de manobra na execução da medida notificada.

    42      Daqui decorre necessariamente que uma decisão fundamentada nos n.os 1 e 3 do artigo 87.° CE que, ao qualificar a medida em causa de auxílio de Estado, a declara compatível com o mercado comum deve ser considerada um acto recorrível nos termos do artigo 230.° CE. Essa decisão de compatibilidade na acepção do artigo 87.°, n.os 1 e 3, CE tem igualmente carácter definitivo e não constitui uma medida preparatória.

    43      Em face destas considerações, há que julgar improcedente o primeiro fundamento do recurso da Comissão.

     Quanto ao segundo fundamento

    44      A Comissão sustenta, no essencial, que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito na sua análise da selectividade da decisão controvertida. Através do seu segundo fundamento, a Comissão contesta, por um lado, a fundamentação do acórdão recorrido que levou a considerar que a medida em causa não favorece certas empresas ou certas produções, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, e, por outro, a conclusão a que chegou o Tribunal de Primeira Instância, segundo a qual, mesmo que a medida em causa favorecesse certas empresas ou certas produções, não constituía um auxílio de Estado dado que favorece o ambiente e é justificada pela natureza ou pela economia geral do sistema no qual está inserida.

     Quanto à primeira parte do segundo fundamento

    –       Argumentos das partes

    45      Através da primeira parte do segundo fundamento, a Comissão sustenta que o facto de o critério de aplicação da medida em causa ser, segundo o Tribunal de Primeira Instância, um critério objectivo e não um critério geográfico ou sectorial é irrelevante. A este respeito, a Comissão sublinha, no âmbito de um primeiro argumento, que o facto de todas as grandes instalações estarem sujeitas ao valor‑limite de emissão é inoperante, dado que esse valor‑limite é apenas susceptível de demonstrar que os auxílios controvertidos fazem parte de um regime de auxílios, e não de um auxílio individual. Segundo a Comissão, a medida em causa, que diz respeito a um grupo restrito de empresas, concretamente cerca de 250, constitui uma medida selectiva.

    46      No âmbito de um segundo argumento, a Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância aplicou um critério errado para declarar a selectividade da medida em causa e impôs, erradamente, um ónus de prova incorrecto e impossível à Comissão. A Comissão deveria apresentar os elementos que demonstram que todas as outras empresas neerlandesas estavam sujeitas às mesmas obrigações que aquelas a que estão sujeitas as 250 empresas destinatárias. A Comissão expõe, a este respeito, que, mesmo que nenhuma outra empresa neerlandesa fosse obrigada à mínima limitação em matéria de emissões de NOx, a medida em causa constitui mesmo assim um auxílio de Estado. Com efeito, o Reino dos Países Baixos poderia impor a essas 250 empresas uma medida «tradicional» de tipo vinculativo, sem lhes dar a possibilidade de transaccionar os direitos de emissão de NOx. Ao invés, o número de empresas a que esse Estado‑Membro oferece essa vantagem é restrito, dado que, no caso concreto, só 250 empresas que dispõem de uma potência instalada superior a 20 MWth estão abrangidas. Por conseguinte, a medida é selectiva.

    47      O Reino dos Países Baixos responde que o facto pelo qual o Tribunal de Primeira Instância constatou que a medida em causa é objectiva, sem âmbito geográfico ou sectorial, não pode ser posto em causa no recurso para o Tribunal de Justiça para anular a constatação pelo Tribunal de Primeira Instância do carácter não selectivo da medida em causa. Segundo o Reino dos Países Baixos, o argumento da Comissão é, portanto, inadmissível. O Tribunal de Primeira Instância mencionou esse ponto unicamente a título de constatação de facto e não como fundamento essencial da sua apreciação relativa à selectividade da referida medida. Quanto à comparação entre as empresas neerlandesas que não são abrangidas pelo regime em causa e as 250 empresas que podem negociar os direitos de emissão de NOx, o Reino dos Países Baixos, em primeiro lugar, expõe que estas últimas empresas, que dispõem de grandes instalações industriais, estão sujeitas a obrigações suplementares. Essas obrigações suplementares têm por efeito estabelecer uma diferença substancial, em matéria de emissões de NOx, entre aquelas empresas e as outras.

    48      Segundo a República Federal da Alemanha, é claro que, para o Tribunal de Primeira Instância, o critério da objectividade é uma condição necessária, mas não suficiente, para responder negativamente à questão da selectividade de uma medida. O efeito da medida é o critério decisivo de apreciação. O Tribunal de Justiça só considera uma medida como selectiva quando for selectiva nos factos mesmo que não tenha sido implementada segundo critérios objectivos. Esta constatação resulta também dos acórdãos referidos pela Comissão. O Tribunal de Primeira Instância decidiu, no caso em apreço, que as 250 empresas que participam no sistema de transacção de direitos de emissão não se encontram numa situação comparável de direito ou de facto à das outras empresas. A República Federal da Alemanha sustenta que cabe à Comissão provar que outras empresas, numa situação comparável à das empresas abrangidas pela medida em causa, são sujeitas às mesmas regras para as emissões de NOx, mas excluídas do sistema de transacção de direitos de emissão. O que é decisivo é unicamente a questão de saber se a medida em causa constitui uma excepção relativamente a uma regra mais geral.

    49      Segundo a República da Eslovénia, o critério que há que ter em consideração para apreciar a selectividade de uma medida é determinar se esta é aplicável a todas as empresas que estão numa situação comparável. Esse Estado‑Membro considera que o regime em causa tem por objectivo a protecção do ambiente e tem em conta as características concretas dos grandes poluidores para atingir esse objectivo. Às empresas poluentes são impostos encargos financeiros mais significativos do que às outras e a sua situação jurídica é tratada de modo diferente.

    –       Apreciação do Tribunal

    50      Decorre de jurisprudência constante que a circunstância de o número de empresas passível de beneficiar da medida em causa ser muito significativo, ou de essas empresas pertencerem a sectores de actividade diferentes, não basta para pôr em causa a sua natureza selectiva e, portanto, para afastar a qualificação de auxílio de Estado (acórdãos de 17 de Junho de 1999, Bélgica/Comissão, C‑75/97, Colect., p. I‑3671, n.° 32; de 8 de Novembro de 2001, Adria‑Wien Pipeline e Wietersdorfer & Peggauer Zementwerke, C‑143/99, Colect., p. I‑8365, n.° 48; e de 13 de Fevereiro de 2003, Espanha/Comissão, C‑409/00, Colect., p. I‑1487, n.° 48). Nos casos em que a medida em questão é regida por critérios objectivos de aplicação horizontal, esta circunstância também não põe em causa o seu carácter selectivo, pois apenas serve para demonstrar que os auxílios controvertidos integram um regime de auxílios, não constituindo um auxílio individual (v., neste sentido, acórdão Espanha/Comissão, já referido, n.° 49).

    51      Com efeito, o artigo 87.°, n.° 1, CE define as intervenções estatais em função dos respectivos efeitos, e, portanto, independentemente das técnicas utilizadas pelos Estados‑Membros para intervir (v. acórdão de 22 de Dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, Colect., p. I‑10505 n.° 89).

    52      Por outro lado, nos n.os 84 e 86 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância, ao invocar os n.os 34 e 41 do acórdão Adria‑Wien Pipeline e Wietersdorfer & Peggauer Zementwerke, já referido, confirma, acertadamente, que uma medida estatal só tem a natureza de um auxílio se for susceptível de favorecer certas empresas ou certas produções relativamente a outras empresas que se encontrem numa situação factual e jurídica comparável à luz do objectivo prosseguido pela medida em causa.

    53      No n.° 88 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância declarou que «[o] critério de aplicação da medida em causa é, assim, objectivo, sem nenhuma consideração de ordem geográfica ou sectorial. Tendo em conta que a medida em causa se aplica às empresas mais poluentes, esse critério objectivo está, além disso, de acordo com o objectivo prosseguido, que é o da protecção do ambiente, e com a lógica interna do sistema».

    54      Todavia, o Tribunal de Primeira Instância também observou, no n.° 89 do acórdão recorrido, que «a norma de emissão ou a taxa de desempenho padrão [Performance Standard Rate (PSR)] estrita [que será] progressivamente [reduzida] até 2010 só é imposta, sob pena da aplicação de uma coima, às empresas abrangidas por esse regime». Em seguida, prosseguiu a sua análise, nos n.os 91 e seguintes, explicando, no essencial, que a Comissão não demonstrou, na decisão controvertida, que as empresas não destinatárias da medida em causa são sujeitas a encargos equivalentes aos que decorrem da mesma, de modo que essas outras empresas poderiam ser consideradas como estando numa situação comparável à das empresas abrangidas pela medida em causa. Com base em todas estas considerações, o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 96 do acórdão recorrido, que a medida em causa não favorece certas empresas.

    55      Assim, decorre da interpretação conjugada dos n.os 84 a 96 do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância não concluiu, como sustenta a Comissão, que a aplicação do critério objectivo da capacidade térmica total instalada superior a 20 MWth das empresas em causa é suficiente para afastar a tese da Comissão quanto ao carácter selectivo da medida em causa. Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância declarou que essa medida é aplicável às grandes empresas sem nenhuma outra consideração geográfica ou sectorial. Estas constatações factuais efectuadas pelo Tribunal de Primeira Instância, quanto ao carácter objectivo da medida, reforçam o seu raciocínio segundo o qual a medida em causa não é selectiva, uma vez que uma medida que é aplicável com base em critérios subjectivos seria selectiva por hipótese. Cumpre precisar que o Tribunal de Primeira Instância não se apoia exclusivamente nestas constatações para concluir que esta medida não é selectiva.

    56      Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância não declarou, contrariamente ao que sustenta a Comissão, que a medida em causa não tinha carácter selectivo nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE pelo simples facto de a medida ser regida por um critério objectivo.

    57      Nestas circunstâncias, há que rejeitar o primeiro argumento da primeira parte do segundo fundamento da Comissão.

    58      No âmbito do segundo argumento da primeira parte do segundo fundamento, a Comissão põe em causa as considerações feitas pelo Tribunal de Primeira Instância nos n.os 89 a 96 do acórdão recorrido e sustenta, no essencial, que o Tribunal de Primeira Instância aplicou um critério errado segundo o qual a Comissão deveria apresentar os elementos que demonstram que todas as outras empresas no Estado‑Membro em questão estavam sujeitas às mesmas obrigações que as abrangidas pela medida em causa. Segundo a Comissão, o Tribunal de Primeira Instância impôs‑lhe um ónus de prova excessivo e supérfluo na medida em que decorre claramente da decisão controvertida e do acórdão recorrido que todas as empresas dos Países Baixos estão sujeitas a restrições em matéria de emissões de NOx. Segundo a Comissão, o Reino dos Países Baixos nunca invocou o argumento relativo à inexistência de selectividade da medida em causa pelo facto de as outras empresas não estarem sujeitas a obrigações idênticas ou comparáveis.

    59      A título preliminar, há que recordar que, segundo jurisprudência assente, decorre dos artigos 225.° CE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça que o Tribunal de Justiça não é competente para proceder ao apuramento dos factos nem, em princípio, para analisar as provas que o Tribunal Geral considerou sustentarem esses factos. Com efeito, quando essas provas tiverem sido obtidas regularmente e os princípios gerais de direito e as normas processuais aplicáveis em matéria de ónus e produção da prova tiverem sido respeitados, compete exclusivamente ao Tribunal Geral a apreciação do valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos. Essa apreciação não constitui, por isso, excepto em caso de desvirtuação desses elementos, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça (v. acórdãos de 18 de Março de 2010, Trubowest Handel e Makarov/Conselho e Comissão, C‑419/08 P, ainda não publicado na Colectânea, n.os 30 e 31, e de 2 de Setembro de 2010, Comissão/Deutsche Post AG, C‑399/08 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 63).

    60      Todavia, no respeitante às regras processuais aplicáveis em matéria de ónus e administração da prova, o Tribunal de Justiça é competente para examinar, no âmbito do recurso, por força da jurisprudência acima referida, se compete à Comissão provar o carácter selectivo da medida em causa.

    61      Com efeito, decorre de jurisprudência assente que a qualificação de auxílio exige que todas as condições previstas no artigo 87.°, n.° 1, CE estejam preenchidas (acórdão de 15 de Julho de 2004, Pearle e o., C‑345/02, Colect., p. I‑7139, n.° 32 e jurisprudência referida). Como foi salientado no n.° 52 do presente acórdão, o Tribunal de Primeira Instância, acertadamente, considerou que uma vantagem económica concedida por um Estado‑Membro só tem a natureza de um auxílio se for susceptível de favorecer certas empresas ou certas produções.

    62      Assim, para provar que a medida em causa é aplicada de modo selectivo a certas empresas ou a certas produções, compete à Comissão demonstrar que a mesma introduziu diferenciações entre as empresas que estão, em relação ao objectivo da medida em causa, numa situação factual e jurídica comparável. No entanto, há também que referir que o conceito de auxílio não visa as medidas que criam uma diferenciação entre empresas em matéria de encargos quando essa diferenciação resultar da natureza e da economia do sistema de encargos em causa (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Abril de 2004, Países Baixos/Comissão, C‑159/01, Colect., p. I‑4461, n.° 42 e jurisprudência referida). Compete ao Estado‑Membro que introduziu essa diferenciação entre empresas em matéria de encargos demonstrar que a mesma está efectivamente justificada pela natureza e pela economia do sistema em causa (acórdão Países Baixos/Comissão, já referido, n.° 43).

    63      A este respeito, importa declarar, como observa a Comissão no ponto 3.1 da decisão controvertida, que as empresas que participam no sistema «dynamic cap» fazem parte de um grupo específico de grandes empresas industriais activas no comércio entre os Estados‑Membros e beneficiam de uma vantagem que não está disponível para outras empresas. Com efeito, essas empresas beneficiam de uma vantagem que consiste no facto de poder acompanhar o valor económico das reduções de emissões que efectuam, convertendo‑as em direitos de emissão negociáveis, ou, eventualmente, de evitar o risco de dever pagar coimas quando ultrapassam o limite de emissões NOx por unidade de energia fixado pelas autoridades nacionais, comprando esses direitos de emissão a outras empresas abrangidas pela medida em causa (v., a este respeito, n.os 92 a 96 do presente acórdão), quando as outras empresas não têm essas possibilidades, o que é suficiente, em princípio, para demonstrar que o Reino dos Países Baixo introduziu uma diferenciação entre empresas em matéria de encargos, na acepção da jurisprudência referida no n.° 61 do presente acórdão.

    64      Com efeito, as partes concordam, como confirmaram na audiência, que cada uma das empresas cujas actividades provoquem emissões de NOx deve cumprir as obrigações em matéria de limite ou de redução dessas emissões, independentemente de ser abrangida ou não pela medida em causa. Para cumprir as obrigações que assim lhes incumbem, por força da legislação nacional, só as empresas que são abrangidas pela medida em causa detêm as possibilidades descritas no número anterior, o que constitui uma vantagem de que outras empresas, numa situação comparável, não beneficiam.

    65      A este respeito, há que sublinhar que a Comissão não era obrigada a pormenorizar mais a sua decisão. No caso de um programa de auxílios, pode limitar‑se a estudar as características do programa em causa para apreciar, nos fundamentos da sua decisão, se, em razão das modalidades que este programa prevê, este assegura uma vantagem sensível aos beneficiários relativamente aos seus concorrentes e é susceptível de beneficiar essencialmente empresas que participam nas trocas comerciais entre Estados‑Membros (v. acórdão de 7 de Março de 2002, Itália/Comissão, C‑310/99, Colect., p. I‑2289, n.° 89).

    66      Daqui decorre que, ao decidir, nos n.os 92 e 93 do acórdão recorrido, que a Comissão não carreou nenhum elemento claro que demonstrasse que as duas categorias de empresas mencionadas no n.° 64 do presente acórdão estavam sujeitas a obrigações da mesma natureza e que estavam, assim, em situações comparáveis, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito quanto ao ónus da prova que incumbia à Comissão.

    67      No caso vertente, basta sublinhar que a decisão controvertida indica claramente, e aplica à situação em apreço, o critério de selectividade que uma medida deve satisfazer para constituir um auxílio de Estado. A Comissão invocou a existência, no Estado‑Membro em questão, de leis relativas à gestão do ambiente e à poluição atmosférica que não prevêem a medida em causa. Por outro lado, teve em consideração o facto de as empresas neerlandesas, que não sejam as 250 grandes instalações abrangidas pela medida em causa estarem, igualmente sujeitas a certas exigências quanto às emissões de NOx.

    68      Decorre das considerações precedentes que a primeira parte do segundo fundamento é procedente.

     Quanto à segunda parte do segundo fundamento

    –       Argumentos das partes

    69      No âmbito da segunda parte do segundo fundamento, a Comissão sustenta que nem o objectivo de protecção do ambiente da medida em causa nem a natureza ou a economia geral do sistema em que esta medida está inserida lhe retira a sua natureza de auxílio de Estado.

    70      Em primeiro lugar, a Comissão invoca a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual, para determinar se a medida estatal constitui um auxílio de Estado, o n.° 1 do artigo 87.° CE não faz distinções consoante as causas ou os objectivos das intervenções estatais, mas define‑os em função dos seus efeitos. A Comissão precisa que, no caso em que é possível invocar o objectivo da protecção do ambiente, isso prejudica a função da Comissão que consiste em examinar se o auxílio não altera as condições das trocas comerciais contrariamente ao interesse comum.

    71      Em segundo lugar, a Comissão alega que o Tribunal de Primeira Instância considerou a medida em causa justificada devido à natureza ou à economia geral do sistema na qual ela se insere. Segundo a Comissão, esta interpretação é errada dado que o Tribunal de Primeira Instância concluiu anteriormente que a Comissão não provou a existência de um regime geral que demonstre que a medida em causa favorecia certas empresas nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE. Além disso, a Comissão acrescenta que compete ao Estado‑Membro demonstrar que essa medida é justificada pela natureza ou pela economia geral do sistema de que faz parte. No caso em apreço, o Reino dos Países Baixos não efectuou essa demonstração.

    72      Ao invocar o acórdão de 6 de Setembro de 2006, Portugal/Comissão (C‑88/03, Colect., p. I‑7115), a Comissão sustenta que não resulta da natureza e da economia geral de um sistema mais vasto que prevê as restrições das emissões de NOx que a negociabilidade dos direitos de NOx deve ser concedida às empresas abrangidas pela medida em causa. À semelhança do Tribunal de Justiça no acórdão Adria‑Wien Pipeline e Wietersdorfer & Peggauer Zementwerke, já referido, a Comissão considera que todas as reduções das emissões de NOx são benéficas para o ambiente sem distinguir a origem dessas reduções, quer dizer, a capacidade térmica inferior ou superior a 20 MWth das instalações.

    73      O Reino dos Países Baixos responde que esse fundamento assenta numa interpretação errada do acórdão recorrido. Em seu entender, o Tribunal de Primeira Instância não considera que o objectivo da protecção do ambiente retira à medida em causa o seu carácter de medida de auxílio. Sublinha que essas constatações eram feitas a título subsidiário. De qualquer modo, o Reino dos Países Baixos considera que o Tribunal de Primeira Instância declarou acertadamente que, mesmo numa situação em que está em causa um regime geral, a distinção estabelecida entre as empresas é justificada, dado que assenta apenas na quantidade de emissões de NOx e na norma específica de redução que incide sobre as empresas com emissões significativas. O critério da medida em causa, concretamente a quantidade de emissões, encontrava justificação na natureza e na economia de um regime geral que tem por objectivo reduzir a poluição atmosférica.

    –       Apreciação do Tribunal

    74      O Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.° 99 do acórdão recorrido, que «a determinação das empresas beneficiárias é justificada pela natureza e pela economia geral do sistema devido às grandes quantidades de NOx que emitem e à norma específica de redução que sobre elas impende» e que as «considerações de ordem ecológica justificam que se distingam as empresas que emitem grandes quantidades de NOx das outras empresas». O Tribunal de Primeira Instância declarou que, «além disso, este critério está em conformidade com o objectivo prosseguido, concretamente, a protecção do ambiente, e com a lógica interna do sistema».

    75      Segundo jurisprudência assente, o artigo 87.°, n.° 1, CE não distingue consoante as causas ou os objectivos das interpretações estatais, mas define‑os em função dos seus efeitos. Mesmo que a protecção do ambiente constitua um dos objectivos essenciais da Comunidade Europeia, a necessidade de ter em consideração esse objectivo não justifica a exclusão de medidas selectivas do âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE, podendo os objectivos ambientais ser utilmente levados em conta, de qualquer forma, no âmbito da apreciação da compatibilidade do auxílio de Estado com o mercado comum nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE (acórdãos, já referidos, Espanha/Comissão, n.° 46, e British Aggregates/Comissão, n.° 92).

    76      No caso em apreço, as emissões importantes de NOx das empresas abrangidas pela medida em causa e a norma específica de redução que impende sobre essas empresas não são suficientes para essa medida deixar de ter a qualificação de medidas selectivas nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE. Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.° 55 das suas conclusões, essa diferenciação entre as empresas fundada no critério quantitativo, quer dizer, o critério da capacidade térmica total superior a 20 MWth, não pode ser considerada inerente a um regime que tem por objectivo reduzir a poluição de origem industrial e, portanto, por si só justificada por considerações de ordem ecológica.

    77      Por outro lado, há que recordar que incumbe ao Estado‑Membro que introduziu essa diferenciação entre as empresas demonstrar que essa diferenciação é efectivamente justificada pela natureza e pela economia do sistema em causa (v., neste sentido, acórdão Países Baixos/Comissão, já referido, n.° 43).

    78      Nestas condições, o critério de distinção utilizado pela legislação nacional em causa, quer dizer a capacidade térmica superior a 20 MWth das instalações, não é justificado pela natureza nem pela economia geral desta, de modo que não retira à medida em causa a sua natureza de auxílio de Estado.

    79      Tendo em conta as considerações expostas, a segunda parte do segundo fundamento é também procedente e, portanto, todo o fundamento é procedente.

     Quanto aos recursos subordinados

    80      Na medida em que o Tribunal de Justiça dá provimento ao recurso da Comissão, há que analisar os recursos subordinados interpostos pelo Reino dos Países Baixos e pela República Federal da Alemanha.

    81      Esses dois Estados‑Membros suscitam um fundamento idêntico relativo ao erro de direito que alegadamente o Tribunal de Primeira Instância cometeu ao considerar que a medida em causa deve ser considerada uma vantagem financiada através de recursos do Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

    82      Este fundamento está dividido em duas partes que têm por objectivo, por um lado, a fundamentação do Tribunal de Primeira Instância, exposta nos n.os 63 a 74 do acórdão recorrido, segundo a qual a negociabilidade dos direitos de emissão prevista pela medida em causa constitui uma vantagem para as empresas sujeitas à norma de emissão de NOx e, por outro, a fundamentação do Tribunal de Primeira Instância, nos n.os 74 a 77 desse acórdão, quanto ao facto de a medida em causa constituir uma vantagem concedida às empresas através de recursos do Estado.

     Quanto à primeira parte do fundamento único

     Argumentos das partes

    83      Na primeira parte do fundamento único, o Reino dos Países Baixos alega que a medida em causa parte da fixação de uma norma de emissão suplementar a cumprir por certas empresas. A quantidade de créditos negociáveis não é, portanto, fixada antecipadamente e depende totalmente da redução suplementar que as empresas poderão realizar relativamente à norma. Sublinha que, em caso de ultrapassagem da norma imposta, a coima é uma sanção suplementar que não constitui uma alternativa ao fornecimento dos créditos de emissão em falta. Além disso, segundo o Reino dos Países Baixos, a constatação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância, no n.° 70 do acórdão recorrido, segundo a qual qualquer empresa abrangida por esse regime pode, em qualquer momento, vender esse direito, é errada.

    84      Segundo a República Federal da Alemanha, as empresas em causa só podem obter uma vantagem financeira ao abrigo de um direito negociável devido aos esforços que realizam para reduzir as suas emissões, o que representa uma contrapartida de um valor adequado para os certificados negociáveis. A este respeito, esse Estado‑Membro recorda os efeitos negativos da medida em causa para as empresas que não estão em condições de respeitar as quantidades de emissões autorizadas. Uma emissão que ultrapasse o valor‑limite é afectada pelos custos para a compra de direitos de emissão que são determinados pelo intermediário do mercado ou por uma coima. As empresas só podem obter um direito negociável e a vantagem económica a ele ligado pelos seus próprios esforços, quando conseguem reduzir as suas quotas de emissão abaixo do limite autorizado.

    85      Segundo a República Federal da Alemanha, os esforços das empresas para diminuírem as suas emissões constituem a contrapartida desse bem negociável e o próprio valor desse bem não é, por definição, uma vantagem. Por outro lado, o conceito de créditos de direitos de emissão como «opção futura» não afecta a obrigação das empresas de respeitarem os objectivos em matéria de emissão e não é, por definição, sempre vantajoso.

     Apreciação do Tribunal

    86      Há que recordar que o artigo 87.°, n.° 1, CE define os auxílios de Estado como os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos do Estado, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. O conceito de auxílio de Estado, na acepção desta disposição, é mais lato do que o de subvenção, pois não se limita a abranger prestações positivas, como as próprias subvenções, compreendendo também intervenções que, de formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, e que, pelo mesmo facto, sem serem subvenções no sentido estrito da palavra, são da mesma natureza e têm efeitos idênticos. Figura entre as vantagens indirectas que têm os mesmos efeitos que as subvenções o fornecimento de bens ou serviços em condições preferenciais (v. acórdãos de 14 de Setembro de 2004, Espanha/Comissão, C‑276/02, Colect., p. I‑8091, n.° 24, e de 1 de Julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, Colect., p. I‑4777, n.° 123).

    87      Além disso, decorre da jurisprudência que são considerados auxílios de Estado as intervenções que, independentemente da forma que assumam, sejam susceptíveis de favorecer directa ou indirectamente empresas, ou que devam ser consideradas uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, Colect., p. I‑7747, n.° 84 e jurisprudência referida).

    88      À luz da jurisprudência referida, há que declarar que a negociabilidade dos direitos de emissão de NOx depende, antes de mais, do facto de o Estado, por um lado, autorizar a venda desses direitos e, por outro, permitir às empresas que emitiram NOx em excesso adquirir a outras empresas os direitos de emissão em falta, permitindo dessa maneira a criação de um mercado para esses direitos (v., também, n.os 64, 65 e 87 a 96 do presente acórdão). Esta constatação decorre igualmente do n.° 70 do acórdão recorrido no qual o Tribunal de Primeira Instância, acertadamente, declarou que, ao tornar esses direitos de emissão negociáveis, o Reino dos Países Baixos conferiu‑lhes um valor no mercado.

    89      Quanto aos argumentos segundo os quais a negociabilidade destes direitos constitui uma contrapartida, ao preço do mercado, dos esforços desenvolvidos pelas empresas abrangidas pela medida em causa para diminuírem as suas emissões de NOx, devem ser rejeitados em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 86 do presente acórdão devido ao facto de os custos de redução das referidas emissões fazerem parte dos encargos que incidem normalmente sobre o orçamento da empresa.

    90      Relativamente aos argumentos segundo os quais a negociabilidade desses direitos não pode ser considerada uma vantagem concreta para as empresas em causa devido à imprevisibilidade do mercado, há que observar que a faculdade, para essas empresas, de escolherem entre os custos de aquisição de direitos de emissão e os custos ligados às medidas destinadas a reduzir as emissões de NOx constitui uma vantagem para elas. Além disso, a faculdade de as empresas abrangidas pela medida em causa poderem negociar todos os direitos de emissão e não apenas os créditos ocorridos no final do ano pela diferença positiva entre a emissão autorizada e a emissão verificada constitui uma vantagem suplementar para essas empresas. Com efeito, estas últimas podem dispor de liquidez vendendo os direitos de emissão antes da realização das condições para a sua atribuição definitiva, independentemente do facto de lhes ser aplicável um limite e as empresas que ultrapassam a norma de emissão imposta devam compensar o excedente no ano seguinte.

    91      Por conseguinte, a medida em causa, que comporta a negociabilidade desses direitos de emissão, deve ser considerada uma vantagem económica que a empresa beneficiária não obteria em condições normais de mercado.

    92      Por outro lado, a conclusão que figura no n.° 73 do acórdão recorrido, segundo a qual a medida em causa permite às empresas, que emitiram mais NOx que a norma de emissão fixada e cujo saldo no fim do ano é, portanto, negativo, escapar a uma coima comprando direitos de emissão àquelas que tiveram um excedente de emissão, é contestada pelo Reino dos Países Baixos.

    93      A este respeito, o Reino dos Países Baixos sustenta que, no caso da norma imposta ser excedida, a coima é uma sanção suplementar que não constitui uma alternativa ao fornecimento dos créditos de emissão em falta.

    94      No caso em apreço, há que declarar que os argumentos do Reino dos Países Baixos não põem em causa, de modo preciso e suficiente, a conclusão do Tribunal de Primeira Instância segundo a qual a medida em causa confere às empresas em questão a faculdade de comprarem os créditos de emissão no mercado, antes do final do ano, dado que os valores‑limite de emissão são anuais. Essa conclusão implica que certas empresas, antes da verificação pelas autoridades nacionais do cumprimento do limite aplicável, utilizam a faculdade de comprar os direitos de emissão em falta e, por conseguinte, evitam exceder a norma de emissão e, portanto, ter de pagar uma coima.

    95      Daqui decorre que o argumento do Reino dos Países Baixos, que põe em causa a constatação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância, no n.° 73 do acórdão recorrido, nos termos da qual as empresas podem evitar o pagamento de uma coima comprando direitos de emissão, não pode ser procedente.

    96      Nestas condições, há que rejeitar a primeira parte do fundamento único, relativa à interpretação e à aplicação erradas do conceito de vantagem, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

     Quanto à segunda parte do fundamento único

     Argumentos das partes

    97      Quanto à segunda parte do fundamento único, relativa ao conceito de financiamento através de recursos do Estado, o Reino dos Países Baixos contesta as conclusões a que chegou o Tribunal de Primeira Instância nos n.os 75 a 77 do acórdão recorrido. Em especial, esse Estado‑Membro considera que o Tribunal de Primeira Instância fez uma interpretação errada do conceito do financiamento através dos recursos do Estado como o Tribunal de Justiça o aplicou no acórdão de 13 de Março de 2001, PreussenElektra (C‑379/98, Colect., p. I‑2099). Quanto à medida em causa, o Reino dos Países Baixos considera que é determinante declarar que não houve uma transferência directa ou indirecta dos recursos do Estado na sequência da repartição do encargo financeiro suplementar entre as empresas. Dado que a norma de emissão imposta é um encargo suplementar para as empresas em questão, a medida em causa, que consiste numa «compensação», serve unicamente para permitir às empresas em questão repartirem elas próprias os encargos suplementares decorrentes dessa norma.

    98      Segundo o Reino dos Países Baixos, a coima aplicada à ultrapassagem da norma imposta é uma sanção suplementar que não constitui uma alternativa ao fornecimento dos créditos de emissão em falta. O mero facto de o valor dos créditos decorrer da legislação não significa que a condição de financiamento desses créditos pelos recursos do Estado está preenchida. Na tréplica, esse Estado‑Membro precisa que o facto de certas receitas sob a forma de coimas escaparem ao Estado quando as empresas respeitam as suas obrigações não pode constituir um elemento pertinente à luz da regulamentação relativa aos auxílios de Estado. Acrescenta que, se um outro sistema de trocas de direitos de emissão pode gerar receitas para o Estado‑Membro, isso não é suficiente para demonstrar que esse Estado perde recursos na acepção do artigo 87.° CE, dado que não optou por esse sistema alternativo.

    99      A República Federal da Alemanha contesta também a constatação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância segundo a qual o sistema de transacções de direitos de emissão em causa constitui uma vantagem concedida às empresas em questão através de recursos do Estado. No modelo neerlandês, todas as empresas devem cumprir as mesmas obrigações relativas a um limite a não ultrapassar. A questão de saber se os certificados estão no mercado, e por qual montante, depende da maneira como as empresas cumprem as suas obrigações no domínio das emissões. As empresas criam elas mesmas os seus próprios activos. Se uma empresa ultrapassar o valor‑limite, tem de suportar os custos de compra de direitos de emissão que são determinados pelo intermediário do mercado ou suportar uma coima. As empresas só podem obter um direito negociável e a vantagem económica a ele ligado quando conseguirem reduzir as suas quotas de emissão a fim de não ultrapassar o limite autorizado.

    100    Além disso, segundo a República Federal da Alemanha, a equiparação da atribuição gratuita de direitos de emissão à venda de bens pela autoridade pública não é pertinente à luz do princípio aplicável, concretamente, o do investidor privado que age segundo as leis do mercado. Com o sistema de transacções de direitos de emissão, o Estado fixa um quadro normativo.

    101    Esse Estado‑Membro sustenta, por um lado, que o preço de venda não pode ser previsível e, por outro, que a possibilidade de recorrer à venda antecipada não representa uma vantagem definitiva. Alega que a não cobrança das coimas está simplesmente ligada ao facto de a empresa não ultrapassar os limites. A compra de direitos de emissão a empresas «overachievers» é efectuada através dos meios próprios da empresa e constitui, do ponto de vista económico, um equivalente à faculdade de a própria empresa reduzir as suas emissões abaixo do limite autorizado. Não há por parte do Estado nenhuma renúncia a recursos.

     Apreciação do Tribunal

    102    No n.° 75 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância considerou que, ao colocar gratuitamente à disposição das empresas em questão os direitos de emissão de NOx em vez de os vender ou adjudicá‑los em hasta pública, e ao instaurar um regime que prevê a possibilidade de negociar esses direitos no mercado, mesmo que estejam ligados a um limite máximo, o Reino dos Países Baixos conferiu aos referidos direitos a natureza de activos incorpóreos e renunciou a recursos do Estado.

    103    Como decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, para que as vantagens possam ser qualificadas de auxílios na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, devem, por um lado, ser concedidas directa ou indirectamente através de recursos estatais e, por outro lado, ser imputáveis ao Estado (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, Colect., p. I‑4397, n.° 24 e jurisprudência referida).

    104    A este respeito, importa salientar que, segundo jurisprudência assente, não é necessário estabelecer, em todos os casos, que houve uma transferência de recursos estatais para que a vantagem concedida a uma ou mais empresas possa ser considerada um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE (v. acórdão França/Comissão, já referido, n.° 36).

    105    Por outro lado, a distinção feita nessa disposição entre os «auxílios concedidos pelos Estados» e auxílios «provenientes de recursos estatais» não significa que todas as vantagens conferidas por um Estado constituem auxílios, sejam ou não financiados por meio de recursos do Estado, mas pretende unicamente incluir nesse conceito tanto as vantagens conferidas directamente pelo Estado como as conferidas através de um organismo público ou privado, designado ou instituído por esse Estado (acórdãos PreussenElektra, já referido, n.° 58, e de 5 de Março de 2009, UTECA, C‑222/07, Colect., p. I‑1407, n.° 43).

    106    No caso em apreço, essa vantagem concedida pelo legislador nacional, concretamente, a negociabilidade dos direitos de emissão de NOx, pode implicar um encargo suplementar para os poderes públicos sob a forma de uma exoneração da obrigação do pagamento de coimas ou outras sanções pecuniárias (v., neste sentido, acórdão de 17 de Junho de 1999, Piaggio, C‑295/97, Colect., p. I‑3735, n.° 42). Com efeito, ao estabelecer o sistema «dynamic cap», o Reino dos Países Baixos deu às empresas abrangidas pela medida em causa a possibilidade de comprarem direitos de emissão para evitar o pagamento de coimas. Além disso, esse sistema tem como consequência a criação, sem contrapartida concreta dada ao Estado, de direitos de emissão que, devido ao seu carácter negociável, têm valor económico. Há que declarar que o Estado‑Membro poderia vender esses direitos, eventualmente em hasta pública, se tivesse estruturado este regime de outra forma (v., a este respeito, n.os 63, 64 e 86 a 96 do presente acórdão).

    107    Assim, a constatação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância no n.° 75 do acórdão recorrido, segundo a qual as empresas em causa podem vender livremente os seus direitos de emissão mesmo que estejam vinculadas a um limite máximo, não é posta em causa pelos argumentos apresentados. Como considerou o advogado‑geral no n.° 87 das suas conclusões, o Estado‑Membro, ao dar a esses direitos de emissão um carácter de bens imateriais negociáveis e ao colocá‑los gratuitamente à disposição das empresas em causa em vez de vender esses direitos ou adjudicá‑los em hasta pública, renuncia efectivamente a recursos públicos.

    108    Além disso, o facto de essa medida permitir às empresas compensar entre si os excedentes e as faltas relativamente à norma imposta e de essa medida criar um quadro legal para limitar as emissões de NOx de modo rentável para as empresas com grandes instalações demonstra que as empresas abrangidas pela medida em causa dispõem de uma alternativa relativamente à aplicação de uma coima pelo Estado.

    109    Quanto aos argumentos que invocam o acórdão PreussenElektra, já referido, o Tribunal de Primeira Instância, acertadamente, distingue esse acórdão em relação ao caso em apreço. Por força desse acórdão, uma regulamentação de um Estado‑Membro que, por um lado, obriga as empresas privadas de fornecimento de electricidade a comprar a electricidade produzida na sua zona de fornecimento a partir de fontes de energia renováveis a preços mínimos superiores ao valor económico real desse tipo de electricidade e, por outro, reparte o encargo financeiro resultante desta obrigação entre as referidas empresas de fornecimento de electricidade e os exploradores privados de redes de electricidade situados a montante não constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

    110    O Tribunal de Justiça considerou, no dito acórdão, que, mesmo que o encargo financeiro decorrente da obrigação de compra a preços mínimos fosse susceptível de se repercutir de forma negativa nos resultados económicos das empresas sujeitas a essa obrigação e de originar a diminuição das receitas fiscais do Estado, essa consequência era inerente a tal regulamentação e não poderia ser considerada constituir um meio de conceder aos produtores de electricidade a partir de fontes de energia renováveis uma determinada vantagem a cargo do Estado.

    111    Pelo contrário, no caso em apreço, como salientou o advogado‑geral no n.° 92 das suas conclusões, essa renúncia não pode ser considerada «inerente» a qualquer instrumento destinado a regular as emissões de poluentes atmosféricos através de um sistema de transacção de direitos de emissão. Com efeito, quando recorre a esses instrumentos, o Estado dispõe, em princípio, de uma escolha entre a atribuição gratuita e a alienação ou a adjudicação em hasta pública desses direitos. Além disso, no presente processo, existe um vínculo suficientemente directo entre a medida em causa e a perda de receitas, vínculo que não existia entre a imposição da obrigação de aquisição e a eventual diminuição das receitas fiscais em causa no processo que deu origem ao acórdão PreussenElektra, já referido. Os factos não são pois comparáveis nos dois processos e a solução adoptada pelo Tribunal de Justiça no acórdão PreussenElektra, já referido, não pode ser transposta para o caso em apreço.

    112    Assim, a solução adoptada pelo Tribunal de Justiça no acórdão PreussenElektra, já referido, não pode ser transposta para o caso em apreço. Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância concluiu acertadamente no n.° 75 do acórdão recorrido que o Reino dos Países Baixos renunciou a esses recursos.

    113    Nestas condições, há que negar provimento aos recursos subordinados do Reino dos Países Baixos e da República Federal da Alemanha.

     Quanto às consequências da procedência do segundo fundamento do recurso principal e da improcedência dos recursos subordinados

    114    À luz de todas estas considerações, há que anular o acórdão recorrido, na medida em que anulou a decisão controvertida.

    115    Em conformidade com o artigo 61.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, em caso de anulação da decisão do Tribunal Geral, o Tribunal de Justiça pode decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral para julgamento. Afigura‑se que é este o caso no presente processo.

     Quanto ao recurso em primeira instância

    116    Decorre das considerações expostas no presente acórdão que a decisão controvertida não viola o artigo 87.°, n.° 1, CE dado que a Comissão concluiu nessa decisão que a medida em causa dá origem a um auxílio de Estado às empresas destinatárias da decisão.

    117    Com efeito, decorre dos n.os 86 a 96 e 102 a 113 do presente acórdão que o Tribunal de Primeira Instância não cometeu erros de direito ao confirmar a tese da Comissão segundo a qual a medida em causa dá origem, para as empresas por ela abrangidas, a uma vantagem financiada através de recursos estatais. Além disso, pelas razões expostas nos n.os 59 a 79 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça julgou procedente o segundo fundamento do recurso invocado pela Comissão e destinado a pôr em causa a análise efectuado pelo Tribunal de Primeira Instância no que diz respeito ao carácter selectivo da mencionada vantagem. Aliás, decorre desses fundamentos, bem como dos que fundamentaram o não provimento dos recursos subordinados, que a Comissão pôde concluir com razão, na decisão controvertida, que a vantagem decorrente da medida em causa é aplicada de modo selectivo.

    118    O primeiro fundamento de anulação do Reino dos Países Baixos aduzido em primeira instância contra a referida decisão deve, por conseguinte, ser rejeitado.

    119    O Tribunal de Primeira Instância considerou que não era necessário tomar posição sobre o segundo fundamento invocado pelo Reino dos Países Baixos dado que anulou a decisão controvertida na medida em que esta declara que a medida em causa constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

    120    Por conseguinte, há que examinar este segundo fundamento relativo à violação do dever de fundamentação.

     Quanto ao segundo fundamento do recurso em primeira instância

     Argumentos das partes

    121    O Reino dos Países Baixos sustenta que a Comissão violou o dever de fundamentação ao não indicar as razões pelas quais o regime notificado é qualificado de auxílio de Estado. Segundo esse Estado‑Membro, a Comissão cometeu um erro de facto ao afirmar que um produtor, que não respeita a sua norma de emissão e ao qual é aplicada uma coima, recebe créditos de NOx. Afigura‑se que, no sistema notificado, um produtor só tem créditos se emitir NOx abaixo da norma que lhe é atribuída e se deixar um espaço inutilizado para as emissões.

    122    Por outro lado, o Reino dos Países Baixos salienta contradições no raciocínio prosseguido pela Comissão na decisão controvertida. Essa instituição invoca especialmente a aplicação de um sistema que distribui gratuitamente créditos afirmando também em seguida que estes últimos constituem uma contrapartida à redução de emissões de NOx. Esse Estado‑Membro explica que o sistema aplicado não concede nenhum crédito poluidor, concretamente ao autor das emissões que ultrapassam a norma imposta. Só o empresário que reduzir as suas emissões abaixo dessa norma pode obter créditos. Além disso, a Comissão não expôs de modo aprofundado a conclusão segundo a qual o referido sistema não tem a sua preferência, especialmente porque se trata de um sistema «dynamic‑cap», cujo resultado no ambiente é incerto e cujas despesas de administração e de aplicação são mais elevadas do que as do sistema «cap‑and‑trade».

    123    Além disso, a Comissão não demonstrou, em conformidade com as exigências impostas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, a sua afirmação segundo a qual o sistema notificado afecta as trocas comerciais e falseia a concorrência entre os Estados‑Membros.

    124    A Comissão responde, em primeiro lugar, que é evidente que qualquer produtor que emita NOx recebe gratuitamente créditos de emissão. Esta constatação não é contrária à conclusão de que as empresas devem dar uma contrapartida, sob a forma de investimentos ambientais complementares, para realmente acrescentar esses activos aos seus lucros disponíveis através de uma venda. Em segundo lugar, quanto às dúvidas expressas pela Comissão sobre a eficácia do sistema em causa, essas passagens da decisão controvertida não dizem respeito à fundamentação da questão de saber se esse sistema constitui um auxílio de Estado. Em terceiro lugar, o raciocínio prosseguido pela Comissão na decisão controvertida demonstra de que forma a concessão gratuita de direitos de emissão a grandes empresas industriais neerlandesas afecta as trocas comerciais entre os Estados‑Membros.

     Apreciação do Tribunal

    125    Cumpre recordar que, segundo jurisprudência assente, a fundamentação exigida pelo artigo 296.° TFUE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e evidenciar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas directa e individualmente afectadas pelo acto podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um acto satisfaz as exigências do dito artigo 296.° deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. acórdãos de 6 de Julho de 1993, CT Control (Rotterdam) e JCT Benelux/Comissão, C‑121/91 e C‑122/91, Colect., p. I‑3873, n.° 31, e de 30 de Setembro de 2003, Eurocoton e o./Conselho, C‑76/01 P, Colect., p. I‑10091, n.° 88).

    126    Relativamente ao argumento do Reino dos Países Baixos segundo o qual a Comissão concluiu sem razão, no ponto 3.2 da decisão controvertida, que uma empresa que não respeita o limite de emissão imposto recebe mesmo assim créditos NOx, constitui uma repetição do argumento exposto nos n.os 45 e 46 da petição apresentada em primeira instância no âmbito do fundamento relativo ao conceito de inexistência de recursos do Estado e no n.° 65 da petição do presente processo, já rejeitado pelo Tribunal de Justiça no n.° 94 do presente acórdão. De qualquer forma, este argumento diz mais respeito a um erro de facto do que a um incumprimento de um dever de fundamentação a propósito da conclusão, na decisão controvertida, da existência de um auxílio de Estado. Por conseguinte, há que rejeitar este argumento.

    127    Além disso, segundo o Reino dos Países Baixos, existe uma contradição na fundamentação da Comissão que, por um lado, assenta no facto de um Estado‑Membro ter a intenção de criar um sistema que distribui gratuitamente créditos NOx e, por outro, considera que o facto de as empresas abrangidas reduzirem as suas emissões a fim de poder beneficiar do auxílio potencial constitui uma contrapartida, sugerindo assim que os créditos não são na realidade concedidos gratuitamente. A este respeito, há que sublinhar que a primeira conclusão da Comissão diz respeito à existência a um auxílio de Estado no ponto 3.2 da decisão controvertida na medida em que as autoridades neerlandesas dispunham da faculdade de vender ou de adjudicar os direitos de emissão e, ao oferecer gratuitamente os créditos de NOx como activos incorpóreos, tinha lucros cessantes. A constatação, efectuada no ponto 3.3 da decisão controvertida, segundo a qual o facto de as empresas serem encorajadas a reduzir as suas emissões de uma forma mais significativa do que o limite que lhes é imposto constitui uma contrapartida, «em conformidade com o espírito das orientações para os auxílios de Estado em matéria de protecção do ambiente», da vantagem concedida a essas empresas pela medida em causa faz parte da apreciação da compatibilidade da medida em causa com o mercado interno. Consequentemente, não decorre nenhuma contradição do raciocínio prosseguido pela Comissão.

    128    Por conseguinte, o argumento do Reino dos Países Baixos deve ser rejeitado.

    129    Em seguida, esse Estado‑Membro sustenta que o raciocínio da Comissão é impreciso quando afirma que o sistema «dynamic cap», como foi adoptado, não constitui a opção preferida, dado que os efeitos desse sistema no ambiente são mais incertos e as despesas de administração e de aplicação são mais elevadas do que no sistema «cap‑and‑trade». A este respeito, essas considerações figuram no ponto 4 da decisão controvertida. Como considerou o advogado‑geral no n.° 101 das suas conclusões, essas considerações não fazem parte da fundamentação quanto à qualificação da medida em causa de auxílio nem da fundamentação sobre a apreciação da compatibilidade desta medida com o mercado comum. Portanto, o argumento do Reino dos Países Baixos deve ser rejeitado.

    130    Quanto à exigência de fundamentação por parte da Comissão relativamente à questão de saber se o sistema em causa é susceptível de afectar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros e de falsear ou ameaçar falsear a concorrência, a Comissão indica, no ponto 3.2 da decisão controvertida, que as empresas que beneficiam do sistema em causa são as empresas de grande dimensão que fazem comércio entre os Estados‑Membros. Segundo a Comissão, a sua posição é reforçada pela medida em causa que lhes confere uma vantagem concorrencial, quer dizer um rendimento adicional para cobrir uma parte dos seus custos de produção. Por conseguinte, esta vantagem pode afectar o comércio entre os Estados‑Membros.

    131    Aplicado à qualificação de uma medida de auxílio, o dever de fundamentação exige que se indiquem as razões pelas quais a Comissão considera que a medida em causa integra o âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE. A este respeito, segundo a jurisprudência, a Comissão não está obrigada a obrigada a demonstrar os efeitos reais dos auxílios sobre as trocas comerciais entre os Estados‑Membros e uma distorção efectiva da concorrência, mas apenas a examinar se esses auxílios são susceptíveis de afectar essas trocas comerciais e falsear a concorrência (acórdãos de 15 de Dezembro de 2005, Itália/Comissão, C‑66/02, Colect., p. I‑10901, n.° 111, e de 9 de Junho 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 134). Assim, quando resulta das circunstâncias em que um auxílio foi concedido que este é susceptível de afectar as trocas comerciais entre Estados‑Membros e falsear ou ameaçar falsear a concorrência, incumbe à Comissão evocar essas circunstâncias nos fundamentos da sua decisão (v., designadamente, acórdãos de 7 de Junho de 1988, Grécia/Comissão, C‑57/86, Colect., p. 2855, n.° 15; de 24 de Outubro de 1996, Alemanha e o./Comissão, C‑329/93, C‑62/85 e C‑63/95, Colect., p. I‑5151, n.° 52; de 19 de Setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, Colect., p. I‑6857, n.° 98; de 28 de Janeiro de 2003, Alemanha/Comissão, C‑334/99, Colect., p. I‑1139, n.° 59; Portugal/Comissão, já referido, n.° 89; e de 30 de Abril de 2009, Comissão/Itália e Wam, C‑494/06 P, Colect., p. I‑3639, n.° 49).

    132    No ponto 3.2 da decisão controvertida, a Comissão observa, logo depois de ter declarado a existência de uma vantagem para as empresas abrangidas pela medida em causa, que estas constituem «um grupo grande de empresas industriais que estão activas no comércio entre Estados‑Membros». Prossegue declarando que «a posição dessas empresas será reforçada por este regime, o que pode ameaçar uma modificação das condições no mercado para os seus concorrentes», antes de acrescentar que «este reforço deve ser considerado que afecta o comércio».

    133    Por conseguinte, há que declarar que a Comissão evocou, na decisão controvertida, as circunstâncias em virtude das quais o auxílio em causa, em seu entender, pode afectar as trocas comerciais entre Estados‑Membros e falsear ou ameaçar falsear a concorrência. Atendendo à jurisprudência referida no n.° 125 do presente acórdão, essa decisão é pois suficientemente fundamentada de direito no que diz respeito à maneira como são afectadas as trocas entre Estados‑Membros e à distorção da concorrência.

    134    Em face do exposto, há que rejeitar o fundamento relativo à insuficiência de fundamentação da decisão controvertida em relação aos requisitos de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE. Por conseguinte, deve ser negado provimento ao recurso de primeira instância na sua totalidade.

     Quanto às despesas

    135    Nos termos do artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

    136    Tratando‑se de despesas referentes ao processo em primeira instância, há que precisar que, nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino dos Países Baixos nas despesas e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas referentes ao processo em primeira instância.

    137    No que diz respeito às despesas referentes ao processo no Tribunal de Justiça, há que salientar que, nos termos do artigo 69.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável ao presente recurso nos termos do artigo 118.° do mesmo regulamento, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal de Justiça pode determinar que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. Tendo a Comissão e o Reino dos Países Baixos obtido um vencimento parcial, há que condená‑los a suportar as suas próprias despesas.

    138    Por força do artigo 69.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, igualmente aplicável aos processos de recursos de decisões de primeira instância por força do referido artigo 118.° do mesmo regulamento, os Estados‑Membros que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas. De harmonia com esta disposição, a República Federal da Alemanha suportará as suas próprias despesas tanto na primeira instância como no recurso. De harmonia com a mesma disposição, a República Francesa, a República da Eslovénia e o Reino Unido suportarão as suas próprias despesas.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

    1)      O acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 10 de Abril de 2008, Países Baixos/Comissão (T‑233/04), é anulado.

    2)      É negado provimento aos recursos subordinados.

    3)      É negado provimento ao recurso em primeira instância.

    4)      O Reino dos Países Baixos é condenado nas despesas efectuadas pela Comissão Europeia relativas ao processo em primeira instância e suportará as suas próprias despesas no âmbito do referido processo.

    5)      A Comissão Europeia e o Reino dos Países Baixos suportarão as suas próprias despesas relativas ao presente recurso.

    6)      A República Federal da Alemanha, a República Francesa, a República da Eslovénia e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte suportarão as suas próprias despesas.

    Assinaturas


    * Língua do processo: neerlandês.

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