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Document 62007CO0512
Order of the President of the Court of 13 January 2009.#Achille Occhetto and European Parliament v Beniamino Donnici.#Appeal - Application for interim measures - Suspension of operation of a measure - Members of the European Parliament - Verification of credentials - Declaration of election of a member as a result of the withdrawal of candidates on the same list - Verification of the validity of the withdrawal - Decision of the European Parliament declaring invalid the mandate of a candidate declared to be a member.#Joined cases C-512/07 P(R) and C-15/08 P(R).
Despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 13 de Janeiro de 2009.
Achille Occhetto e Parlamento Europeu contra Beniamino Donnici.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Medidas provisórias - Suspensão da execução - Deputados ao Parlamento Europeu - Verificação dos poderes - Eleição de um deputado resultante da desistência de candidatos da mesma lista - Verificação da validade da desistência - Decisão do Parlamento Europeu que declara inválido o mandato de um candidato proclamado deputado.
Processos apensos C-512/07 P(R) e C-15/08 P(R).
Despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 13 de Janeiro de 2009.
Achille Occhetto e Parlamento Europeu contra Beniamino Donnici.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Medidas provisórias - Suspensão da execução - Deputados ao Parlamento Europeu - Verificação dos poderes - Eleição de um deputado resultante da desistência de candidatos da mesma lista - Verificação da validade da desistência - Decisão do Parlamento Europeu que declara inválido o mandato de um candidato proclamado deputado.
Processos apensos C-512/07 P(R) e C-15/08 P(R).
Colectânea de Jurisprudência 2009 I-00001
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2009:3
DESPACHO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
13 de Janeiro de 2009 ( *1 )
Nos processos apensos C-512/07 P(R) e C-15/08 P(R),
que têm por objecto dois recursos e decisões do Tribunal de Primeira Instância interpostos ao abrigo do artigo 57.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrados na secretaria do Tribunal de Justiça em, respectivamente, 22 de Novembro de 2007 e ,
Achille Occhetto, residente em Roma (Itália), representado por P. De Caterini e F. Paola, avvocati, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
e
Parlamento Europeu, representado por H. Krück, N. Lorenz e L. Visaggio, na qualidade de agentes,
recorrentes,
sendo as outras partes no processo:
Beniamino Donnici, residente em Castrolibero (Itália), representado por M. Sanino, G. M. Roberti, I. Perego e P. Salvatore, avvocati,
recorrente em primeira instância,
República Italiana, representada por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por P. Gentili, avvocato dello Stato,
interveniente em primeira instância,
O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
ouvido o advogado-geral, M. Poiares Maduro,
profere o presente
Despacho
1 |
Nas suas petições respectivas, A. Occhetto e o Parlamento Europeu pedem a anulação do despacho do juiz das medidas provisórias do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 15 de Novembro de 2007, Donnici/Parlamento (T-215/07 R, Colect., p. II-4673, a seguir «despacho recorrido»), através do qual foi ordenada a suspensão da execução da decisão do Parlamento Europeu de relativa à verificação dos poderes de B. Donnici [2007/2121(REG), a seguir «decisão controvertida»]. |
2 |
Dado que existe conexão entre os referidos recursos por via do respectivo objecto, estes devem, nos termos do artigo 43.o do Regulamento de Processo, ser apensos para efeitos do presente despacho. |
Enquadramento jurídico
Acto de 1976
3 |
Os artigos 6.o a 8.o, 12.o e 13.o, n.o 3, do Acto relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu por sufrágio universal directo anexo à Decisão 76/787/CECA, CEE, Euratom do Conselho, de 20 de Setembro de 1976 (JO 1976, L 278, p. 5), conforme alterada e renumerada pela Decisão 2002/772/CE, Euratom do Conselho, de e de (JO L 283, p. 1, a seguir, «Acto de 1976»), prevêem o seguinte: «Artigo 6.o 1. Os deputados do Parlamento Europeu votam individualmente e pessoalmente. Não podem receber ordens nem estar vinculados a quaisquer instruções. 2. Os deputados do Parlamento Europeu beneficiam dos privilégios e imunidades que lhes são aplicáveis por força do protocolo, de 8 de Abril de 1965, relativo aos Privilégios e Imunidades das Comunidades Europeias. Artigo 7.o 1. A qualidade de deputado do Parlamento Europeu é incompatível com a de:
2. A partir das eleições de 2004 para o Parlamento Europeu, o mandato de deputado do Parlamento Europeu é incompatível com o de membro de um Parlamento nacional. Em derrogação desta regra e sem prejuízo do disposto no n.o 3:
[…] Artigo 8.o Sob reserva do disposto no presente acto, o processo eleitoral será regulado, em cada Estado-Membro, pelas disposições nacionais. Essas disposições nacionais, que podem eventualmente ter em conta as particularidades de cada Estado-Membro, não devem prejudicar globalmente o carácter proporcional do sistema de escrutínio. […] Artigo 12.o O Parlamento Europeu verificará os poderes dos deputados do Parlamento Europeu. Para o efeito, registará os resultados proclamados oficialmente pelos Estados-Membros e deliberará sobre as reclamações que possam eventualmente ser feitas com base nas disposições do presente Acto, com excepção das disposições nacionais para que ele remete. Artigo 13.o […] 3. Sempre que a legislação de um Estado-Membro determine expressamente a perda do mandato de um deputado do Parlamento Europeu, o seu mandato cessa por força das disposições dessa legislação. As autoridades nacionais competentes informam o Parlamento Europeu desse facto.» |
Regimento do Parlamento Europeu
4 |
Os artigos 3.o e 4.o, n.os 3 e 9, do Regimento do Parlamento Europeu estabelecem o seguinte: «Artigo 3.o Verificação de poderes 1. Após as eleições para o Parlamento Europeu, o Presidente convidará as autoridades competentes dos Estados-Membros a comunicarem sem demora ao Parlamento os nomes dos deputados eleitos, a fim de que todos os deputados possam ocupar o seu lugar no Parlamento desde a abertura da primeira sessão que se seguir às eleições. Ao mesmo tempo, o Presidente chamará a atenção das referidas autoridades para as disposições pertinentes do [Acto de 1976], convidando-as a tomar as medidas necessárias para evitar qualquer incompatibilidade com o mandato de deputado ao Parlamento Europeu. 2. Os deputados cuja eleição tiver sido comunicada ao Parlamento deverão declarar por escrito, antes de ocuparem o seu lugar no Parlamento, que não exercem quaisquer funções incompatíveis com o mandato de deputado ao Parlamento Europeu, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 7.o do [Acto de 1976]. Após eleições gerais, a declaração em causa deverá ser feita, sempre que possível, o mais tardar seis dias antes da sessão constitutiva do Parlamento. Enquanto os seus poderes não tiverem sido verificados ou não tiver havido decisão sobre uma eventual impugnação, os deputados terão assento no Parlamento e nos respectivos órgãos no pleno gozo dos seus direitos, desde que tenham assinado previamente a declaração escrita acima citada. Se, com base em factos verificáveis a partir de fontes acessíveis ao público, se comprovar que um deputado exerce funções incompatíveis com o mandato de deputado ao Parlamento Europeu, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 7.o do [Acto de 1976], o Parlamento, mediante informação prestada pelo seu Presidente, verificará a abertura de vaga. 3. Com base em relatório da comissão competente, o Parlamento verificará sem demora os poderes e deliberará sobre a validade do mandato de cada um dos deputados recém-eleitos, bem como sobre eventuais impugnações apresentadas nos termos do disposto no [Acto de 1976], com excepção das que se baseiem em leis eleitorais nacionais. 4. O relatório da comissão competente basear-se-á na comunicação oficial de cada Estado-Membro relativa à totalidade dos resultados eleitorais, especificando os nomes dos candidatos eleitos e dos eventuais substitutos, pela ordem de classificação decorrente da votação. Os mandatos dos deputados só poderão ser validados após estes terem feito as declarações escritas previstas no presente artigo e no Anexo I ao presente Regimento. O Parlamento pode pronunciar-se em qualquer momento, com base em relatório da comissão competente, sobre qualquer impugnação da validade do mandato de um dos seus membros. 5. Caso a nomeação de um deputado resulte da desistência de candidatos inscritos numa mesma lista, a comissão incumbida da verificação de poderes assegurará a conformidade dessa desistência com o espírito e a letra do [Acto de 1976] e do n.o 3 do artigo 4.o do presente Regimento. 6. A comissão competente assegurará que qualquer informação susceptível de afectar o exercício do mandato de um deputado ao Parlamento Europeu ou a ordem de classificação dos suplentes seja imediatamente comunicada ao Parlamento pelas autoridades dos Estados-Membros ou da União, mencionando, quando se tratar de nomeação, a data a partir da qual a mesma deverá produzir efeitos. Sempre que as autoridades competentes dos Estados-Membros iniciem um processo susceptível de culminar na perda do mandato de um deputado, o Presidente solicitar-lhes-á ser regularmente informado do andamento do processo. O Presidente consultará a comissão competente, sob proposta da qual o Parlamento poderá pronunciar-se. Artigo 4.o Duração do mandato parlamentar […] 3. Os deputados que renunciarem ao mandato notificarão o Presidente da sua renúncia, bem como da data em que a mesma produzirá efeitos, a qual não deverá ser posterior a três meses após a notificação. Esta notificação assumirá a forma de acta redigida na presença do Secretário-Geral ou de um seu representante e será assinada por este e pelo deputado em questão e imediatamente submetida à comissão competente, que a inscreverá na ordem do dia da primeira reunião que realizar após a recepção da notificação. Caso a comissão competente entenda que o pedido de renúncia não está conforme com o espírito ou a letra do [Acto de 1976], informará desse facto o Parlamento, a fim de este decidir sobre a verificação ou não verificação da abertura da vaga. Caso contrário, a abertura da vaga ocorrerá na data indicada pelo deputado cessante na acta de renúncia ao mandato. O Parlamento não será chamado a votar sobre esta matéria. […] 9. No caso de a aceitação ou renúncia do mandato estarem feridas de erro material ou de vícios do consentimento, o Parlamento reserva-se o direito de declarar a invalidade do mandato examinado ou de recusar a verificação da abertura de vaga». |
Estatuto dos deputados do Parlamento Europeu
5 |
Nos termos do quarto considerando da Decisão 2005/684/CE, Euratom do Parlamento Europeu, de 28 de Setembro de 2005, que aprova o estatuto dos deputados ao Parlamento Europeu (JO L 262, p. 1, a seguir, «estatuto dos deputados»), «[a] liberdade e a independência dos deputados, consagradas no artigo 2.o, deveriam ser regulamentadas, visto que não são mencionadas em nenhum texto de direito primário. As declarações mediante as quais os deputados se comprometem a renunciar ao seu mandato num determinado momento, ou as declarações em branco sobre a renúncia ao mandato, que podem ser utilizadas por um partido de forma discricionária, são incompatíveis com a liberdade e a independência dos deputados e, por conseguinte, não podem ter força jurídica vinculativa.» |
6 |
O quinto considerando do estatuto dos deputados precisa que o n.o 1 do artigo 3.o desse diploma retoma integralmente as disposições do n.o 1 do artigo 6.o do Acto de 1976. |
7 |
Os artigos 2.o e 30.o do estatuto dos deputados dispõem o seguinte: «Artigo 2.o 1. Os deputados ao Parlamento Europeu gozam de liberdade e independência. 2. São nulos os acordos em matéria de renúncia ao mandato antes do termo ou no final da legislatura. […] Artigo 30.o O presente Estatuto entra em vigor no primeiro dia da legislatura do Parlamento Europeu que tem início em 2009.» |
Factos na origem do litígio
8 |
Os factos que estiveram na origem do litígio encontram-se expostos nos n.os 6 a 17 do despacho recorrido nos seguintes termos:
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Tramitação processual no Tribunal de Primeira Instância e despacho recorrido
9 |
Por petição entrada na secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 22 de Junho de 2007, B. Donnici interpôs, ao abrigo do artigo 230.o, quarto parágrafo, CE, um recurso de anulação da decisão controvertida. Em requerimento separado, apresentou um pedido de medidas provisórias a fim de obter a suspensão da execução dessa mesma decisão. |
10 |
A. Occhetto e a República Italiana foram autorizados a intervir em apoio, respectivamente, das posições do Parlamento e de B. Donnici. |
11 |
B. Donnici apresentou dois fundamentos em apoio do seu recurso de anulação. Por um lado, sustentou que o Parlamento, ao adoptar a decisão controvertida, infringiu as regras e princípios que determinam a sua competência em matéria de verificação de poderes dos seus membros. Por outro, contestou a adequação da fundamentação dessa decisão. |
12 |
No despacho recorrido, o juiz das medidas provisórias procedeu, antes de mais, a uma apreciação prima facie dos fundamentos jurídicos invocados por B. Donnici em apoio do seu recurso de anulação, a fim de determinar se a condição relativa ao fumus boni juris estava preenchida. Terminada essa análise, concluiu que o fundamento relativo à incompetência do Parlamento para adoptar a decisão controvertida era sério e não podia ser recusado sem se proceder a uma análise mais profunda, que só o juiz do processo principal tem competência para efectuar. Assim, concluiu que, nesse caso, essa condição estava preenchida. |
13 |
Em seguida, o juiz das medidas provisórias considerou que a suspensão da execução solicitada era necessária para evitar um prejuízo grave e irreparável aos interesses de B. Donnici, dada, nomeadamente, a duração limitada dos mandatos dos membros do Parlamento e a impossibilidade, que resulta da decisão controvertida, de B. Donnici prosseguir o exercício do seu mandato. |
14 |
Por último, o juiz das medidas provisórias procedeu à ponderação dos interesses em presença, salientando que, atenta a aparente igualdade entre os interesses específicos e imediatos respectivos de B. Donnici e A. Occhetto, havia que tomar em consideração interesses mais gerais. Assim, ao sublinhar o interesse da República Italiana em que a sua legislação eleitoral seja respeitada pelo Parlamento e o carácter sólido e sério da argumentação de B. Donnici, concluiu que as condições para o deferimento do pedido de suspensão da execução da decisão controvertida estavam reunidas e, por isso, deferiu o pedido de B. Donnici nesse sentido. |
Pedidos das partes
15 |
Nas suas petições respectivas, A. Occhetto e o Parlamento pedem a anulação do despacho recorrido. Em apoio dos seus recursos, invocam fundamentos relativos a uma incorrecta apreciação do fumus boni juris e da urgência e a uma incorrecta ponderação dos interesses em causa. |
16 |
B. Donnici e o Governo italiano pedem que seja negado provimento aos recursos. Relativamente ao recurso de A. Occhetto, B. Donnici pede, a título principal, que seja julgado inadmissível. |
Quanto ao presente recurso
Quanto à admissibilidade do recurso de A. Occhetto
17 |
B. Donnici sustenta que o recurso de A. Occhetto se funda, essencialmente, na tese segundo a qual, no presente caso, a renúncia ao cargo de deputado enferma de um vício de consentimento. Assim, essa renúncia não é válida, cabendo ao Parlamento verificá-la na fase da verificação dos poderes. Ora, segundo B. Donnici, A. Occhetto não invocou a existência de um vício do consentimento nem nos órgãos jurisdicionais nacionais nem perante o juiz comunitário das medidas provisórias. Conclui-se, portanto, que o recurso de A. Occhetto se funda, essencialmente, em elementos que só no presente processo foram invocados pela primeira vez. Acresce que a verificação das circunstâncias de que pode depender a existência de um vício de consentimento implica um apuramento e uma apreciação de elementos de facto, o que é de excluir num recurso como o presente. É por estas razões que B. Donnici pede que o recurso de A. Occhetto seja julgado inadmissível. |
18 |
A este respeito, há que observar que, embora no quadro do seu recurso A. Occhetto apresente uma série de considerações relativas à validade da sua renúncia ao mandato de deputado e à existência de um vício de consentimento, também é certo que esse recurso se baseia numa série de fundamentos relativos a uma incorrecta interpretação das disposições do Acto de 1976 e da urgência e a uma incorrecta ponderação dos interesses em causa. |
19 |
Nestas condições, há que concluir pela admissibilidade do recurso de A. Occhetto. |
Quanto aos fundamentos relativos a uma incorrecta interpretação do fumus boni juris
20 |
No que se refere à apreciação do fumus boni juris pelo juiz das medidas provisórias, os recorrentes invocam três fundamentos, relativos, respectivamente:
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Quanto ao fundamento relativo a uma incorrecta interpretação do artigo 12.o do Acto de 1976
— Argumentação dos recorrentes
21 |
Segundo A. Occhetto e o Parlamento, o juiz das medidas provisórias, ao considerar que, por força do artigo 12.o do Acto de 1976, o Parlamento deve limitar-se a registar os resultados eleitorais anunciados pelas autoridades nacionais competentes e não dispõe de nenhuma competência de princípio para velar pelo cumprimento do direito comunitário pelos Estados-Membros, interpretou incorrectamente essa disposição tanto do ponto de vista da sua redacção como do contexto geral em que se insere. |
22 |
Embora, nos termos do artigo 12.o do Acto de 1976, o Parlamento deva apenas «registar» os resultados das verificações das autoridades nacionais, realizadas ao abrigo da legislação dos Estados-Membros, também é certo que detém um poder autónomo de verificação com base nas disposições do direito comunitário. Tratando-se de um processo que surge no quadro da formação de uma instituição comunitária, existe um nível normativo comunitário que não visa harmonizar os processos nacionais, mas sim estabelecer um padrão mínimo susceptível de evitar distorções que tenham a sua origem nas disparidades entre os processos nacionais. Neste sentido, o artigo 12.o do Acto de 1976 atribui ao Parlamento o poder de deliberar sobre as reclamações fundadas nas disposições desse Acto. Este poder tem de ser necessariamente exercido não só com base no conteúdo literal do referido Acto, mas também com base nos princípios gerais que subjazem a esse diploma no seu conjunto. |
23 |
Assim, contrariamente ao que entendeu o juiz das medidas provisórias, a segunda frase do artigo 12.o do Acto de 1976 não visa limitar o poder do Parlamento, antes indicando as duas modalidades segundo as quais se articula o exercício desse poder. Embora, no que respeita à verificação realizada no quadro da legislação nacional, o Parlamento deva limitar-se a registá-la, goza de plenos poderes de verificação no quadro do direito comunitário. |
24 |
Em apoio desta interpretação do artigo 12.o do Acto de 1976, os recorrentes invocam, em primeiro lugar, o artigo 8.o desse diploma, que confirma, em seu entender, esta articulação em dois níveis do poder de verificação do Parlamento. Com efeito, ao enunciar que o processo eleitoral «será regulado, em cada Estado-Membro, pelas disposições nacionais», mas «sob reserva do disposto no presente acto», esta última disposição indica os dois parâmetros com base nos quais se exerce o poder de verificação. |
25 |
Em segundo lugar, existe no Parlamento uma prática institucional que inequivocamente demonstra que esta instituição tende a efectuar a verificação dos poderes dos seus membros à luz das referências comunitárias. |
26 |
Esta prática ficaria demonstrada, por um lado, pelo relatório da comissão do regulamento, da verificação dos poderes e imunidades do Parlamento, sobre a alteração dos artigos 7.o e 8.o do regimento do Parlamento Europeu, relativo à verificação dos poderes e à duração do mandato parlamentar (A3-0166/94), e que correspondem, respectivamente, aos artigos 3.o e 4.o do regimento do Parlamento actualmente em vigor. |
27 |
Por outro lado, os recorrentes sublinham que, no artigo 2.o da sua resolução sobre as impugnações da validade dos mandatos parlamentares relacionadas com o «sistema do torniquete» (JO 1983, C 68, p. 31), o Parlamento Europeu afirma que «a impugnação da validade do mandato dos novos membros ou a contestação da validade dos mandatos já verificados, com base em reservas de natureza jurídica contra o ‘sistema do torniquete’, não se justificam. De qualquer modo, seria inútil estabelecer um sistema complexo de verificações, articulado em dois níveis, nacional e comunitário, para em seguida o nível normativo comunitário ser inexistente e o Parlamento, no exercício do seu poder de verificação, apenas registar os resultados apurados a nível nacional». |
28 |
Em terceiro lugar, os acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de Julho de 2005, Le Pen/Parlamento (C-208/93 P, Colect., p. I-6051), e do Tribunal de Primeira Instância de , Le Pen/Parlamento (T-353/00, Colect., p. II-1729), nos quais se baseou o juiz das medidas provisórias, não constituem precedentes jurisprudenciais pertinentes para efeitos da apreciação do mérito da presente causa. Com efeito, o processo que esteve na origem desses acórdãos dizia respeito à validade de uma decisão pela qual o Parlamento registou uma deliberação das autoridades nacionais que pôs termo ao mandato parlamentar do interessado e, portanto, integrava o contexto do artigo 13.o, n.o 2, do Acto de 1976, e não o do artigo 12.o De qualquer modo, o historial do referido processo demonstra que a delimitação dos poderes do Parlamento em caso de perda de um mandato parlamentar é uma questão complexa que não pode ser apreciada no quadro de um processo de medidas provisórias. |
— Apreciação
29 |
A título preliminar, há que salientar que este fundamento suscita a questão da extensão dos poderes de verificação de que o Parlamento dispõe ao abrigo do artigo 12.o do Acto de 1976. A fim de se apreciar se o juiz das medidas provisórias se baseou numa incorrecta interpretação dessa disposição e, portanto, numa apreciação inexacta da extensão desses poderes, importa analisar quer a letra da referida disposição quer o contexto geral em que esta se insere. |
30 |
A este respeito, há que recordar, antes de mais, que o artigo 12.o do Acto de 1976 prevê expressamente que o Parlamento, por um lado, «registará» os resultados anunciados oficialmente pelos Estados-Membros e, por outro, só pode decidir sobre as eventuais reclamações «com base nas disposições [desse] Acto, com excepção das disposições nacionais para que ele remete». |
31 |
Conclui-se que, à primeira vista, o texto do artigo 12.o do Acto de 1976 parece militar em favor de uma sua interpretação restritiva. A este respeito, ao contrário do que sustentam os recorrentes, o acórdão do Tribunal de Justiça Le Pen/Parlamento Europeu, já referido, no qual se baseou o juiz das medidas provisórias, é especialmente pertinente. Com efeito, a utilização da expressão «registará» foi aí interpretada no contexto do Acto de 1976 no sentido de indicar que o Parlamento não dispõe de qualquer margem de apreciação na matéria (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça Le Pen/Parlamento, já referido, n.o 50). |
32 |
Além disso, no que se refere à verificação dos poderes dos membros do Parlamento, o artigo 12.o do Acto de 1976 e o artigo 3.o, n.o 3, do regimento do Parlamento Europeu conferem a esta instituição o poder de deliberar sobre a validade do mandato de cada um dos seus membros recém-eleitos, bem como sobre eventuais impugnações apresentadas nos termos do disposto no Acto de 1976, embora, respectivamente, «com excepção das disposições nacionais para que ele remeta» e «com excepção das [impugnações] que se baseiem em leis eleitorais nacionais». Ora, estas excepções também são indicações claras de que o Parlamento, de um modo geral, não tem competência para se pronunciar sobre a legalidade dos processos eleitorais nacionais à luz do direito comunitário (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça Le Pen/Parlamento, já referido, n.o 51). |
33 |
Além disso, o argumento segundo o qual esta interpretação do artigo 12.o do Acto de 1976 conduz a que os poderes de verificação de que o Parlamento dispõe em virtude desse artigo fiquem vazios de conteúdo não pode ser acolhido. Com efeito, tal como o juiz das medidas provisórias correctamente recordou, o Parlamento tem toda a competência para se pronunciar, no quadro do referido artigo, sobre a situação de um candidato eleito que possua uma das qualidades incompatíveis com a de membro do Parlamento Europeu enumeradas no artigo 7.o do Acto de 1976. |
34 |
Por último, no que se refere à prática institucional invocada pelo Parlamento, e independentemente da questão de saber se uma prática unilateral de uma instituição comunitária pode, por si só, vincular o Tribunal de Justiça quanto à interpretação das disposições do Tratado ou do direito comunitário derivado em questão, basta salientar que, em qualquer caso, os elementos invocados a este respeito pelo Parlamento, ou seja, um relatório da comissão do regulamento, da verificação dos poderes e da imunidades do Parlamento datado de 1994 e uma resolução de 1983, bastam para demonstrar a existência de uma prática institucional constante. |
35 |
Com base nestas considerações, há que concluir que o juiz das medidas provisórias não cometeu nenhum erro de direito manifesto no que respeita à interpretação do artigo 12.o do Acto de 1976. |
36 |
O presente fundamento deve, portanto, ser julgado improcedente. |
Quanto ao fundamento relativo a uma incorrecta interpretação do artigo 6.o do Acto de 1976
37 |
No segundo fundamento, os recorrentes sustentam que o juiz das medidas provisórias cometeu um erro de direito ao considerar que o artigo 6.o do Acto de 1976 apenas confere competência ao Parlamento para garantir o livre exercício do mandato parlamentar aos membros do Parlamento Europeu em funções. Assim, o livre exercício só seria assegurado relativamente aos acordos que têm incidência sobre o exercício do mandato do parlamentar, e não relativamente aos acordos que impedem em absoluto o exercício do mandato pretendido pelos eleitores. |
38 |
Os recorrentes, ao considerarem que não era razoável limitar o alcance do artigo 6.o do Acto de 1976 apenas aos membros do Parlamento em funções, dado que essa disposição tem por objecto proteger a liberdade de acção dos membros do Parlamento, privilegiam uma interpretação teleológica desse artigo. Segundo entendem, uma interpretação dessa norma à luz do seu objectivo deveria conduzir à sua aplicação também aos candidatos oficialmente inscritos na ordem de classificação pós-eleitoral, pois esses candidatos fazem potencialmente parte da composição do Parlamento. |
39 |
Neste contexto, o artigo 6.o do Acto de 1976, que exige a autonomia dos deputados e enuncia a proibição do mandato vinculado, constitui um princípio de ordem geral de carácter obrigatório destinado a garantir o bom funcionamento do Parlamento. A remissão para as «disposições do presente acto» constante do artigo 12.o do Acto de 1976 deve, portanto, dizer necessariamente respeito aos princípios gerais que subjazem a esse acto e que são inerentes à correcta verificação dos poderes pelo Parlamento. Esses princípios, que resultam nomeadamente do artigo 6.o do referido Acto, constituem de facto o corolário do princípio fundamental enunciado no artigo 3.o do Protocolo Adicional n.o 1 à CEDH, que tem carácter imperativo, por força do qual os Estados contratantes se obrigam a organizar eleições livres «em condições que assegurem a livre expressão da opinião do povo na eleição do órgão legislativo». |
40 |
Em apoio desta interpretação do artigo 6.o do Acto de 1976, os recorrentes invocam, por um lado, o artigo 2.o do estatuto dos deputados, que, apesar de ainda não estar em vigor, constitui uma codificação do conteúdo normativo do referido artigo 6.o e, por conseguinte, do estado actual do direito comunitário na matéria. Por outro lado, referem as disposições dos artigos 3.o, n.o 5, e 4.o, n.os 3 e 9, do regimento do Parlamento Europeu, sustentando que o juiz das medidas provisórias deveria ter tido em consideração essas disposições na interpretação do artigo 6.o do Acto de 1976, o que implicaria que teria chegado à conclusão de que os princípios enunciados no referido artigo 6.o se aplicam igualmente em situações susceptíveis de ter incidência na composição do Parlamento. |
41 |
A este respeito, há que recordar que, tal como o juiz das medidas provisórias correctamente observou, o texto do artigo 6.o do Acto de 1976 visa expressamente os «membros do Parlamento Europeu». Mais, esse artigo menciona a prerrogativa de voto dos referidos membros, prerrogativa essa que, por natureza, não pode ser associada à qualidade de candidato anunciado oficialmente na ordem de classificação pós-eleitoral. |
42 |
É certo que, regra geral, a interpretação de uma disposição do direito comunitário não pode traduzir-se numa vinculação estrita à sua letra, independente do seu contexto e da sua finalidade. No entanto, independentemente da questão de saber se o recurso a esse método de interpretação pode conduzir a uma interpretação contra legem no presente caso, há que observar que os elementos invocados nesse sentido pelos recorrentes não são susceptíveis de demonstrar que a interpretação do artigo 6.o do Acto de 1976 adoptada pelo juiz das medidas provisórias é manifestamente incorrecta. |
43 |
Em primeiro lugar, mesmo admitindo que o artigo 6.o do Acto de 1976 se baseia em certos princípios gerais, designadamente no artigo 3.o do Protocolo Adicional n.o 1 à CEDH, também é certo que constitui uma expressão muito concreta desses princípios. Assim, o referido artigo 6.o não pode, por si só, constituir o fundamento de uma competência geral do Parlamento para apreciar a legalidade dos processos eleitorais dos Estados-Membros à luz do conjunto desses princípios e da CEDH. |
44 |
No que se refere, em segundo lugar, ao artigo 2.o do estatuto dos deputados, importa salientar que o quarto considerando desse estatuto enuncia que «[a] liberdade e a independência dos deputados, consagradas no artigo 2.o [desse estatuto], deveriam ser regulamentadas, visto que não são mencionadas em nenhum texto de direito primário». Ora, estas asserções, conjugadas com o quinto considerando do mesmo diploma, que precisa que o artigo 3.o, n.o 1, do mesmo retoma integralmente as disposições do artigo 6.o, n.o 1, do Acto de 1976, constituem prima facie indícios claros de que o artigo 2.o do estatuto dos deputados não constitui uma codificação do referido artigo 6.o |
45 |
Em terceiro lugar, foi correctamente que o juiz das medidas provisórias considerou que, em conformidade com o princípio da hierarquia das normas, uma disposição do regimento do Parlamento Europeu não pode derrogar as disposições do Acto de 1976. Com efeito, o referido regimento é um acto de organização interna que não pode instituir, em benefício do Parlamento, competências não expressamente reconhecidas num acto normativo, no caso em apreço no Acto de 1976 (v., neste sentido, acórdão de 21 de Outubro de 2008, Marra, C-200/07 e C-201/07, Colect., p. I-7929, n.o 38). Donde se conclui que, pelo menos no quadro de uma análise relativa ao fumus boni juris, são as disposições do regimento do Parlamento Europeu que devem ser interpretadas à luz da letra e do espírito das disposições do Acto de 1976, e não o contrário. |
46 |
Nestas condições, há que concluir que o despacho recorrido não enferma de um erro manifesto de direito no que se refere à interpretação do artigo 6.o do Acto de 1976. |
47 |
Portanto, este fundamento também deve ser julgado improcedente. |
Quanto ao fundamento relativo a um erro de fundamentação no que respeita à incidência da alegada ilegalidade da decisão da comissão eleitoral italiana que proclamou B. Donnici membro do Parlamento sobre a decisão do Parlamento Europeu relativa à verificação dos poderes de B. Donnici
48 |
No que se refere à apreciação da incidência da alegada ilegalidade da decisão da comissão eleitoral italiana que proclama B. Donnici membro do Parlamento sobre a decisão do Parlamento relativa à verificação dos poderes do referido B. Donnici, a fundamentação do despacho recorrido sofre de erros e é contraditória. Em especial, o Parlamento considera que, para rejeitar a sua argumentação segundo a qual a sua própria decisão sobre a verificação dos poderes seria ilegal se se fundasse num acto nacional ilegal, o juiz das medidas provisórias baseou-se em precedentes jurisprudenciais não pertinentes, ou seja, no acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Dezembro de 1992, Oleificio Borelli/Comissão (C-97/91, Colect., p. I-6313, n.os 10 e 12), e no despacho do Presidente do Tribunal de Primeira Instância de , Kronberger/Parlamento (T-18/07 R, Colect., p. II-50, n.os 38 a 40), em vez de tomar em consideração o acórdão de , Suécia/Comissão (C-64/05, Colect., p. I-11389). |
49 |
O Parlamento, segundo afirma, através da decisão controvertida recusou validar o mandato de uma pessoa designada pelas autoridades nacionais, por essa decisão ser contrária ao princípio do mandato livre, que é uma regra que, textualmente, tem por destinatário o Parlamento Europeu e lhe confere um poder de controlo. Com efeito, seria absurdo admitir, por um lado, que as autoridades judiciais e administrativas nacionais têm a obrigação de aplicar o direito comunitário, eventualmente não aplicando normas nacionais em contrário, e, por outro, que o Parlamento Europeu não dispõe desse poder. |
50 |
A este respeito, há que recordar que no acórdão Oleificio Borelli/Comissão, já referido, que dizia respeito à interpretação do artigo 13.o, n.o 3, do Regulamento (CEE) n.o 355/77 do Conselho, de 15 de Fevereiro de 1977, relativo a uma acção comum para a melhoria das condições de transformação e comercialização dos produtos agrícolas (JO L 51, p. 1; EE 03 F11 p. 239), o Tribunal de Justiça considerou que um projecto só pode beneficiar da participação do Fundo Europeu de orientação e Garantia Agrícola se recolher o parecer favorável do Estado-Membro em cujo território deve ser executado e que, por conseguinte, no caso de parecer negativo, a Comissão não pode prosseguir o procedimento de análise do projecto segundo as regras estabelecidas por esse mesmo regulamento, nem, por maioria de razão, controlar a regularidade do parecer assim emitido. Destes elementos o Tribunal de Justiça concluiu que as irregularidades de que este parecer possa eventualmente sofrer não podem, em caso algum, afectar a validade da decisão através da qual a Comissão recusa a participação pedida (acórdão Oleificio Borelli/Comissão, já referido, n.os 11 e 12). |
51 |
Baseando-se nesta jurisprudência, o juiz das medidas provisórias considerou que, quando um acto nacional se integra num processo de decisão comunitário e, em virtude da repartição de competências existente no domínio em causa, vincula de tal forma a instância comunitária de decisão que esse acto nacional determina a decisão comunitária a adoptar, as irregularidades que eventualmente viciem esse acto nacional não podem, em caso algum, afectar a validade da decisão da instância comunitária. Ora, este ensinamento resulta claramente dos n.os 10 a 12 do acórdão Oleificio Borelli/Comissão, já referido, e é pertinente no presente processo, sobretudo se se atender à repartição de competências resultante do artigo 12.o do Acto de 1976. |
52 |
Ao invés, no n.o 93 do acórdão Suécia/Comissão, já referido, que dizia respeito à interpretação do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), o Tribunal de Justiça precisou que o artigo 4.o, n.o 5, desse regulamento não tem por objectivo instituir uma partilha entre duas competências, uma nacional, a outra comunitária, que tenham objectivos distintos, mas institui um processo decisório que tem por único objectivo determinar se o acesso a um documento deve ser recusado ao abrigo de uma das excepções materiais enunciadas no artigo 4.o, n.os 1 a 3, do referido regulamento, processo em que participam tanto a instituição comunitária como o Estado-Membro em causa. |
53 |
Conclui-se que, ao invocar este último acórdão, o Parlamento sustenta que o artigo 12.o do Acto de 1976 prevê não uma repartição de competências entre as autoridades nacionais e o Parlamento e o exercício dessas competências no quadro de processos distintos, mas um processo decisório único no qual participam tanto o Parlamento como as autoridades nacionais. Ora, atentas as considerações expostas nos n.os 29 a 34 do presente despacho, não é, à primeira vista, esse o caso. |
54 |
À luz das considerações expostas, há que concluir que o despacho recorrido não sofre de um erro de fundamentação no que respeita à incidência da alegada ilegalidade da decisão da comissão eleitoral italiana que proclamou B. Donnici membro do Parlamento sobre a decisão deste relativa à verificação dos poderes de B. Donnici. |
55 |
Importa, portanto, julgar este fundamento improcedente. |
Quanto ao fundamento relativo a uma incorrecta apreciação da urgência
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O Parlamento sustenta que a apreciação da urgência que o juiz das medidas provisórias efectuou sofre de um erro de direito, porquanto este se fundou apenas nos eventuais prejuízos que B. Donnici sofreria, sem ter em consideração os eventuais prejuízos causados à representação política. Segundo o Parlamento, se a execução da decisão controvertida não fosse suspensa o lugar do deputado em questão continuaria a ser ocupado por uma pessoa da mesma orientação política que B. Donnici, pelo que o interesse deste não é susceptível de justificar que, do ponto de vista da representação política, seja ordenada a suspensão da execução da decisão controvertida. |
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A este respeito, basta recordar que, segundo jurisprudência constante, a finalidade do processo de medidas provisórias é garantir a plena eficácia do acórdão quanto ao mérito. Para alcançar este objectivo, importa que as medidas requeridas sejam urgentes, no sentido de que é necessário, para evitar um prejuízo grave e irreparável aos interesses do requerente, que sejam decretadas e produzam os seus efeitos antes da decisão no processo principal [despacho do Presidente do Tribunal de Justiça de 25 de Março de 1999, Willeme/Comissão, C-65/99 P(R), Colect., p. I-1857, n.o 62]. |
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Conclui-se que, para apreciar a urgência das medidas requeridas, o juiz das medidas provisórias deve tomar em consideração apenas os interesses do requerente, em especial a existência do risco de se causar um prejuízo grave e irreparável a esses interesses, sem atender a outros elementos de carácter geral, como, no presente caso, a continuidade da representação política, elementos que apenas poderiam eventualmente ser tidos em consideração no quadro da ponderação dos interesses em presença. |
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Por conseguinte, o fundamento do Parlamento relativo à apreciação da urgência deve também ser julgado improcedente. |
Quanto ao fundamento relativo a um erro de direito cometido no quadro da ponderação dos interesses
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Com o seu último fundamento, os recorrentes sustentam que, ao proceder à ponderação dos interesses em causa, o juiz das medidas provisórias cometeu um erro de direito. Em apoio deste fundamento apresentam três argumentos. |
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Em primeiro lugar, consideram que o juiz das medidas provisórias cometeu um erro de apreciação ao entender que os interesses de B. Donnici e de A. Occhetto são iguais. Ao fazê-lo, não retirou as consequências do facto de A. Occhetto ter obtido mais votos de preferência e, portanto, possuir um interesse superior ao de B. Donnici no que respeita ao exercício do mandato parlamentar. |
62 |
Em segundo lugar, o juiz das medidas provisórias não teve em consideração o interesse público em que seja assegurado o mais elevado nível de legitimidade política do Parlamento Europeu, legitimidade essa que se funda no sufrágio popular. Ora, no caso em apreço, a tomada em consideração do interesse público deveria ter conduzido o juiz das medidas provisórias a recusar a suspensão da execução da decisão controvertida, uma vez que esta medida implicava que a pessoa que obteve menos votos ocupasse o lugar no Parlamento, reduzindo assim a legitimidade política do Parlamento. Em qualquer caso, mesmo na hipótese de uma decisão de mérito favorável a B. Donnici, a recusa de ordenar a suspensão da execução da decisão controvertida não causava um prejuízo irreparável à legitimidade política do Parlamento, porquanto, no decurso do período compreendido entre a decisão das medidas provisórias e a decisão de mérito, o Parlamento contaria entre os seus membros uma pessoa superiormente legitimada pelo sufrágio popular. |
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Em terceiro lugar, os recorrentes consideram que o despacho recorrido enferma de um erro de direito porque o juiz das medidas provisórias utilizou o fumus boni juris para apreciar a existência da urgência e a proeminência dos interesses de B. Donnici. Com efeito, segundo alegam, ainda que a jurisprudência pareça admitir a possibilidade de uma certa compensação mútua entre o elemento de fumus boni iuris e o da urgência, também é certo que não é possível que a presença de um destes dois elementos seja suficiente para compensar a falta do outro. |
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Ora, segundo os recorrentes, no quadro da ponderação dos interesses, o juiz das medidas provisórias deveria ter concluído que, no presente caso, não existia a menor urgência. A este respeito, invocam o despacho do Presidente do Tribunal de Justiça de 31 de Julho de 2003, Le Pen/Parlamento (C-208/03 P-R, Colect., p. I-7939, n.o 106), do qual resulta que, no quadro da ponderação dos interesses pertinentes, o juiz das medidas provisórias deve examinar se a eventual anulação do acto controvertido pelo juiz do processo principal permitiria a inversão da situação resultante da sua execução imediata e, inversamente, se a suspensão da execução do referido acto seria de natureza a impedir o seu pleno efeito, no caso de ser negado provimento ao recurso no processo principal. Ora, se, no caso vertente, o juiz das medidas provisórias tivesse efectuado a segunda parte dessa avaliação, teria chegado necessariamente à conclusão de que a suspensão da execução da decisão controvertida apenas podia impedir o pleno efeito dessa decisão caso o recuso de anulação fosse julgado improcedente. Conclui-se que a existência de um elemento de urgência era absolutamente insuficiente no presente caso. |
65 |
A este respeito, há que salientar que o juiz das medidas provisórias concluiu, num primeiro momento, que, em caso de anulação da decisão controvertida pelo juiz do processo principal, o prejuízo que B. Donnici sofreria se não fosse suspensa a execução dessa decisão seria irreparável, tendo, em seguida, procedido à ponderação dos interesses em causa, sublinhando antes de mais o interesse de A. Occhetto na execução da decisão controvertida, que implica a manutenção do seu mandato. Segundo o juiz das medidas provisórias, se a execução da decisão controvertida é susceptível de causar um prejuízo irreversível a B. Donnici, o mesmo risco existe, inversamente, para A. Occhetto em caso de admissão do pedido de suspensão da execução dessa decisão, atenta a probabilidade de a prolação de um eventual acórdão que negue provimento ao recurso quanto ao mérito só ter lugar após ter decorrido o essencial, se não a totalidade, do período que lhe resta do seu mandato. |
66 |
Tendo, assim, chegado à conclusão que existe igualdade entre os interesses específicos e imediatos respectivos de B. Donnici e A. Occhetto, o juiz das medidas provisórias prosseguiu o seu raciocínio tendo em consideração os interesses mais gerais que, em tais circunstâncias, são de especial importância. A este respeito, considerou que, sendo incontestável que a República Italiana tem interesse em ver a sua legislação em matéria eleitoral respeitada pelo Parlamento, este tem um interesse geral na manutenção das suas decisões. Todavia, considerou que nenhum destes interesses pode prevalecer na ponderação dos interesses em causa. |
67 |
Só depois de ter concluído existir esta igualdade entre os interesses específicos e gerais em presença é que o juiz das medidas provisórias teve em consideração a seriedade dos fundamentos invocados por B. Donnici para admitir um fumus boni juris baseando-se, a este propósito, numa jurisprudência bem assente, ou seja, os despachos do Presidente do Tribunal de Justiça de 23 de Fevereiro de 2001, Áustria/Conselho (C-445/00 R, Colect., p. I-1461, n.o 110); de , NDC Health/IMS Health e Comissão [C-481/01 P(R), Colect., p. I-3401, n.o 63], e Le Pen/Parlamento, já referido (n.o 110). |
68 |
Importa observar que os argumentos invocados pelos recorrentes não são susceptíveis de pôr em causa esta análise do juiz das medidas provisórias. |
69 |
A este respeito, cabe salientar, por um lado, que a ponderação dos interesses em presença que o juiz das medidas provisórias efectuou conduziu-o a constatar uma igualdade entre os interesses específicos de B. Donnici e de A. Occhetto. Ora, esta igualdade dos interesses não pode equivaler a uma inexistência de urgência. Pelo contrário, o risco de um prejuízo irreparável, único critério da urgência, está bem presente no caso em apreço, quer no que se refere a B. Donnici quer, em caso de deferimento do pedido de suspensão da execução, quanto a A. Occhetto. |
70 |
Por outro lado, ao contrário do que alegam os recorrentes, o juiz das medidas provisórias apreciou os interesses mais gerais do Parlamento, designadamente o seu interesse na manutenção das suas decisões. Todavia, em vez de atender a esses interesses de modo isolado, ponderou-os, correctamente, com o interesse da República Italiana em ver a sua legislação em matéria eleitoral respeitada pelo Parlamento. O mesmo se diga no que respeita à legitimidade política do Parlamento e ao seu interesse em que o lugar seja ocupado pelo candidato que obteve mais votos. Se a presença de tais interesses não pode ser contestada, o interesse da República Italiana em que os deputados italianos eleitos segundo os processos eleitorais nacionais e confirmados por um dos mais importantes órgãos jurisdicionais desse Estado-Membro ocupem os seus lugares no Parlamento Europeu também não pode ser ignorado. |
71 |
Por conseguinte, o fundamento dos recorrentes relativo a um erro de direito no quadro da ponderação dos interesses em presença deve também ser julgado improcedente. |
72 |
Uma vez que todos os fundamentos foram julgados improcedentes, deve ser negado provimento ao presente recurso. |
Quanto às despesas
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Nos termos do artigo 69.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.o do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Tendo B. Donnici pedido a condenação dos recorrentes e tendo estes sido vencidos nos seus fundamentos, há que os condenar nas despesas de B. Donnici. |
Pelos fundamentos expostos, o presidente do Tribunal de Justiça decide: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: italiano.