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Document 62006TJ0410

Acórdão do Tribunal Geral (Oitava Secção) de 4 de Março de 2010.
Foshan City Nanhai Golden Step Industrial Co., Ltd contra Conselho da União Europeia.
Dumping - Importações de calçado com a parte superior de couro natural originário da China e do Vietname - Cálculo do valor normal por estimativa - Preço de exportação - Direitos de defesa - Prejuízo - Dever de fundamentação.
Processo T-410/06.

Colectânea de Jurisprudência 2010 II-00879

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2010:70

Processo T‑410/06

Foshan City Nanhai Golden Step Industrial Co., Ltd

contra

Conselho da União Europeia

«Dumping – Importações de calçado com a parte superior de couro natural originário da China e do Vietname – Cálculo do valor normal por estimativa – Preço de exportação – Direitos de defesa – Prejuízo – Dever de fundamentação»

Sumário do acórdão

1.      Política comercial comum – Defesa contra as práticas de dumping – Margem de dumping – Determinação do valor normal – Recurso ao valor construído – Poder de apreciação das instituições comunitárias quanto ao método de cálculo

[Regulamento do Conselho n.° 384/96, artigo 2.°, n.° 1, c)]

2.      Política comercial comum – Defesa contra as práticas de dumping – Fixação de direitos antidumping – Método de cálculo

(Regulamento do Conselho n.° 384/96, artigo 9.°, n.° 4)

3.      Política comercial comum – Defesa contra as práticas de dumping – Processo antidumping – Direitos de defesa – Comunicação da informação final pela Comissão às empresas

(Regulamento do Conselho n.° 384/96, artigo 20.°, n.os 2 e 4)

4.      Direito comunitário – Princípios – Direitos de defesa – Observância no âmbito dos procedimentos administrativos – Antidumping – Obrigação de as instituições assegurarem a informação das empresas em causa – Documento de divulgação final adicional

(Regulamento do Conselho n.° 384/96, artigo 20.°, n.° 5)

5.      Política comercial comum – Defesa contra as práticas de dumping – Prejuízo – Período a tomar em consideração

(Regulamento do Conselho n.° 384/96, artigo 3.°, n.° 2)

1.      O artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do Regulamento antidumping de base n.° 384/96 confere às instituições uma ampla margem de apreciação para escolher o método segundo o qual devem proceder ao cálculo das despesas com as vendas, das despesas administrativas e dos outros encargos gerais e de uma margem de lucro no quadro do cálculo do valor normal por estimativa.

Nestas condições, a fiscalização do juiz comunitário incide sobre o comprimento das regras de procedimento, a exactidão material dos factos que serviram de base à escolha impugnada, a inexistência de erro manifesto na apreciação desses factos ou de desvio de poder.

Além disso, o mesmo artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base prevê que esse método deve ser razoável. Assim, o juiz comunitário só pode declarar um erro manifesto de apreciação relativo ao método escolhido se este for desrazoável. Portanto, a existência de outros métodos razoáveis que poderiam ter sido seguidos para esse efeito não afecta a legalidade do efectivamente escolhido, não podendo o juiz comunitário sobrepor a sua apreciação à das instituições a esse respeito.

Assim, neste âmbito, as instituições podem considerar, que era mais razoável utilizar as informações relativas aos lucros realizados no mercado interno do país de produção, por empresas de dimensão comparável à do produtor, que não suporta encargos de venda nem encargos gerais particularmente elevados, tendo obtido igualmente o estatuto de empresa que evolui em economia de mercado na altura de inquéritos recentes sobre outros produtos que não os produtos em causa, e em relação aos quais as instituições dispunham de dados fiáveis, do que basear‑se relativas a lucros realizados na venda dos produtos em causa em mercados totalmente diferentes.

Com efeito, resulta, do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento antidumping de base que, quando as instituições aplicam essa disposição para calcular uma margem de lucro razoável, não são obrigadas a utilizar os dados relativos a produtos da mesma categoria geral, mas devem zelar por que a margem de lucro estabelecida segundo um método razoável não exceda a margem de lucro realizada na venda dos produtos da mesma categoria geral. Além disso, deve interpretar‑se essa disposição no sentido de que as instituições seriam impedidas de estabelecer uma margem de lucro se não dispuserem de uma base de cálculo fiável respeitante à margem de lucro realizada nas vendas de produtos da mesma categoria geral.

(cf. n.os 64 a 67, 71e 74)

2.      Segundo o artigo 9.°, n.° 4, última frase, do Regulamento antidumping de base n.° 384/96 «[o] montante do direito antidumping não excederá a margem de dumping estabelecida, devendo, no entanto, ser inferior à margem de dumping, caso um direito inferior seja suficiente para eliminar o prejuízo para a indústria comunitária». Esta regra tem por consequência que um produtor ao qual foram impostos direitos antidumping não pode contestá‑los pelo facto de o inquérito concluir por uma margem de prejuízo sobreavaliada no caso de a taxa dos direitos ter sido fixada ao nível da margem de dumping, quando este é inferior tanto à margem de prejuízo falsamente considerada como à margem de prejuízo real.

(cf. n.° 94)

3.      As empresas envolvidas num inquérito que preceda a adopção de um regulamento antidumping devem ser colocadas em condições de, no decurso do procedimento administrativo, dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados e sobre os elementos de prova invocados pela Comissão em apoio da sua apreciação sobre a existência de uma prática de dumping e do prejuízo que daí resulta.

Neste contexto, o carácter incompleto da divulgação final solicitada pelas partes nos termos do artigo 20.°, n.° 2, do Regulamento de base n.° 384 só leva à ilegalidade de um regulamento que institui direitos antidumping definitivos quando, devido a essa omissão, as partes interessadas não tiverem sido colocadas em condições de defenderem utilmente os seus interesses Tal será nomeadamente o caso quando a omissão incide sobre factos ou considerações diferentes dos utilizados para as medidas provisórias, aos quais deve ser concedida uma atenção especial na divulgação final, segundo a referida disposição. Tal é igualmente o caso, por identidade de razões, quando a omissão incidir sobre factos ou considerações diferentes daqueles em que se baseia uma decisão tomada pela Comissão ou pelo Conselho posteriormente à comunicação do documento de divulgação final, como decorre do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do referido regulamento de base.

O facto de a Comissão ter alterado a sua análise na sequência dos comentários que as partes interessadas formularam sobre o documento de divulgação final não constitui, todavia, por si só, uma violação dos direitos de defesa. Com efeito, como resulta do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base, o documento de divulgação final não constitui um obstáculo a qualquer decisão que possa vir a ser tomada pela Comissão ou pelo Conselho. Essa disposição limita‑se a impor à Comissão o dever de comunicar, desde que possível, os factos e as considerações diferentes dos que apoiam a sua abordagem inicial contida no documento de divulgação final. Por conseguinte, para determinar se a Comissão respeitou os direitos das partes interessadas que decorrem do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base, há ainda que verificar se a Comissão lhes comunicou os factos e as considerações feitas para efeitos da nova análise sobre o prejuízo e sobre a forma das medidas requeridas para o eliminar, na medida em que diferiam das feitas no documento de divulgação final.

(cf. n.os 111 a 112 e 117 a 118)

4.      Ao conceder ao produtor sujeito a um inquérito antidumping um prazo inferior a dez dias para comentar o documento de divulgação final adicional, a Comissão infringiu o artigo 20.°, n.° 5, do Regulamento antidumping de base n.° 384/96. Todavia, essa circunstância não pode, em si mesma, conduzir à anulação do regulamento impugnado. Com efeito, é necessário ainda demonstrar que o facto de dispor de um prazo inferior ao prazo legal foi de molde a afectar concretamente os seus direitos de defesa no quadro do processo em causa.

(cf. n.° 124)

5.      A instituição de direitos antidumping não constitui a sanção de um comportamento anterior, mas uma medida de defesa e protecção contra a concorrência desleal resultante das práticas de dumping. Assim, é necessário levar a cabo o inquérito com base em informações tão actuais quanto possível a fim de poder fixar direitos antidumping que sejam adequados à protecção da indústria comunitária contra as práticas de dumping.

Quando as instituições comunitárias reconhecem que as importações de um produto sujeito até então a restrições quantitativas aumentam após a extinção das referidas restrições, podem ter em conta esse aumento para efeitos da sua apreciação do prejuízo sofrido pela indústria comunitária.

(cf. n.os 133 e 134)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

4 de Março de 2010 (*)

«Dumping – Importações de calçado com a parte superior de couro natural originário da China e do Vietname – Cálculo do valor normal por estimativa – Preço de exportação – Direitos de defesa – Prejuízo – Dever de fundamentação»

No processo T‑410/06,

Foshan City Nanhai Golden Step Industrial Co., Ltd, com sede em Lishui (China), representada por I. MacVay, solicitor, R. Thompson, QC, e K. Beal, barrister,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por J.‑P. Hix, na qualidade de agente, assistido por G. Berrisch, advogado,

recorrido,

apoiado pela

Comissão Europeia, representada por H. van Vliet e T. Scharf, na qualidade de agentes,

e pela

Confédération européenne de l’industrie de la chaussure (CEC), com sede em Bruxelas (Bélgica), representada inicialmente por P. Vlaemminck, G. Zonnekeyn e S. Verhulst e, mais tarde, por P. Vlaemminck e A. Hubert, advogados,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação parcial do Regulamento (CE) n.° 1472/2006 do Conselho, de 5 de Outubro de 2006, que institui um direito antidumping definitivo e estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China e do Vietname (JO L 275, p. 1), na medida em que diz respeito à recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: M. E. Martins Ribeiro, presidente, S. Papasavvas (relator) e A. Dittrich, juízes,

secretário: C. Kantza, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 20 de Fevereiro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O artigo 1.°, n.os 1 e 2, do Regulamento (CE) n.° 384/96 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1995, relativo à defesa contra as importações objecto de dumping de países não membros da Comunidade Europeia (JO 1996, L 56, p. 1), conforme alterado (a seguir, «regulamento de base») dispõe:

«1. Qualquer produto objecto de dumping pode ser sujeito a um direito antidumping sempre que a sua introdução em livre prática na Comunidade causar prejuízo.

2. Um produto é objecto de dumping se o seu preço de exportação para a Comunidade for inferior ao preço comparável de um produto similar, no decurso de operações comerciais normais, estabelecido para o país de exportação.»

2        No que respeita à determinação da existência de dumping, o artigo 2.° do regulamento de base prevê as regras aplicáveis para efeitos de comparação entre o valor normal do produto em questão e o preço de exportação, sendo, a margem de dumping, segundo o n.° 12 da mesma disposição, o montante em que o valor normal excede o preço de exportação.

3        O artigo 2.°, n.° 1, primeiro e segundo parágrafos, e o artigo 2.°, n.os 3 e 6, do regulamento de base têm a seguinte redacção:

«1.      O valor normal baseia‑se habitualmente nos preços pagos ou a pagar, no decurso de operações comerciais normais, por clientes independentes no país de exportação.

Todavia, quando o exportador no país de exportação não produzir ou vender um produto similar, o valor normal pode ser estabelecido com base em preços de outros vendedores ou produtores.

[…]

3. Quando, no decurso de operações comerciais normais, não forem efectuadas vendas de um produto similar, ou quando estas forem insuficientes, ou sempre que, em virtude de uma situação especial do mercado, essas vendas não permitirem uma comparação adequada, o valor normal do produto similar será calculado com base no custo de produção no país de origem, acrescido de um montante razoável para os encargos de venda, despesas administrativas e outros encargos gerais, bem como para os lucros, ou com base nos preços de exportação, no decurso de operações comerciais normais, para um país terceiro adequado, desde que esses preços sejam representativos.

[…]

6.      Os montantes correspondentes aos encargos de venda, às despesas administrativas e a outros encargos gerais, bem como aos lucros, deverão basear‑se em dados concretos relativos à produção e às vendas do produto similar no decurso de operações comerciais normais, pelo exportador ou produtor sujeito a inquérito. Quando não for possível determiná‑los nestes termos, os montantes serão determinados com base:

a)      Na média ponderada dos montantes efectivamente determinados em relação a outros exportadores ou produtores objecto de inquérito no que respeita à produção e às vendas do produto similar no mercado interno do país de origem;

b)      Nos montantes efectivamente aplicáveis à produção e às vendas da mesma categoria geral de produtos, no decurso de operações comerciais normais, do produtor ou exportador em causa no mercado interno do país de origem;

c)      Em qualquer outro método razoável, desde que o montante correspondente aos lucros determinado deste modo não exceda o lucro normalmente obtido por outros exportadores ou produtores com as vendas de produtos da mesma categoria geral no mercado interno do país de origem.»

4        Quanto às condições de concessão do tratamento de empresa que opera em economia de mercado (a seguir, «TEM»), o artigo 2.°, n.° 7, alínea b), do regulamento de base prevê:

«Nos inquéritos antidumping relativos a importações originárias da República Popular da China […], o valor normal será determinado de acordo com o disposto nos n.os 1 a 6, caso se prove, com base em pedidos devidamente fundamentados, apresentados por um ou mais produtores objecto de inquérito […], a prevalência de condições de economia de mercado para esse produtor ou produtores no que se refere ao fabrico e à venda do produto similar em causa. […]»

5        O artigo 2.°, n.os 8 e 9, primeiro parágrafo, do regulamento de base dispõe:

«8. O preço de exportação é o preço efectivamente pago ou a pagar pelo produto vendido pelo país de exportação para a Comunidade.

9. Quando não houver preço de exportação [… ele] pode ser calculado com base no preço a que os produtos importados são revendidos pela primeira vez a um comprador independente ou não forem revendidos no mesmo estado em que foram importados, noutra base razoável.»

6        Quanto à determinação da existência de um prejuízo, o artigo 3.°, n.os 2, 3 e 6, do regulamento de base prevê:

«2. A determinação da existência de prejuízo deve basear‑se em elementos de prova positivos e incluir um exame objectivo a) do volume das importações objecto de dumping e do seu efeito nos preços dos produtos similares no mercado comunitário e b) da repercussão dessas importações na indústria comunitária.

3. Verificar‑se‑á se houve um aumento significativo do volume das importações objecto de dumping quer em termos absolutos, quer em relação à produção ou ao consumo na Comunidade. Relativamente aos efeitos nos preços das importações objecto de dumping, verificar‑se‑á se houve uma subcotação importante dos preços provocada pelas importações objecto de dumping em relação aos preços de um produto similar da indústria comunitária ou se, por outro lado, essas importações tiveram como efeito depreciar significativamente os preços ou impedir aumentos significativos de preços que, de outro modo, teriam ocorrido. Nenhum destes elementos, considerados isoladamente ou em conjunto, constitui necessariamente uma indicação determinante.

[…]

6. É necessário demonstrar, através de todos os elementos de prova relevantes apresentados em conformidade com o n.° 2, que as importações objecto de dumping estão a causar prejuízo na acepção do presente regulamento. Concretamente, tal facto implicará a demonstração de que o volume e/ou os níveis de preços identificados nos termos do n.° 3 se repercutem na indústria comunitária conforme disposto no n.° 5 e de que esta repercussão pode ser classificada de importante.»

7        Segundo o artigo 9.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base «[o] montante do direito antidumping não excederá a margem de dumping estabelecida, devendo, no entanto, ser inferior à margem de dumping, caso um direito inferior seja suficiente para eliminar o prejuízo para a indústria comunitária».

8        O artigo 20.°, n.os 1, 2, 4 e 5, do regulamento de base dispõe:

«1. Os autores de denúncia, os importadores, os exportadores, as associações representativas e os representantes do país de exportação podem requerer a divulgação das informações sobre os factos e considerações essenciais, com base nos quais foram instituídas as medidas provisórias. Os pedidos de divulgação devem ser apresentados por escrito imediatamente a seguir à instituição das medidas provisórias, devendo a divulgação ser efectuada por escrito o mais cedo possível após o pedido.

2. As partes referidas no n.° 1 podem solicitar a divulgação final dos factos e considerações essenciais com base nos quais se tenciona recomendar a instituição de medidas definitivas, ou o encerramento de um inquérito ou processo sem instituição de medidas, devendo ser conferida uma especial atenção à divulgação de quaisquer factos ou considerações diferentes dos utilizados para as medidas provisórias.

[…]

4. A divulgação final, que terá devidamente em conta a protecção de informações confidenciais, será efectuada por escrito no mais curto prazo, normalmente o mais tardar um mês antes da decisão definitiva ou da apresentação pela Comissão de qualquer proposta de instituição de medidas definitivas nos termos do artigo 9.° Caso a Comissão não esteja em posição de divulgar determinados factos ou considerações nesse momento, estes serão divulgados o mais brevemente possível após essa data. A divulgação não prejudicará qualquer decisão posterior que possa vir a ser tomada pela Comissão ou pelo Conselho, mas caso tal decisão se baseie em factos ou considerações diferentes, estes devem ser divulgados o mais cedo possível.

5. As observações apresentadas depois da divulgação final só serão tomadas em consideração se forem recebidas no prazo fixado pela Comissão para cada caso, que será de pelo menos dez dias, tendo devidamente em conta a urgência da questão.»

 Antecedentes do litígio e regulamento impugnado

9        A recorrente, a Foshan City Nanhai Golden Step Industrial Co., Ltd, é uma empresa produtora de calçado com sede na China.

10      As importações de calçado proveniente da China que é incluído em certas classes da Nomenclatura Combinada estavam sujeitas a um regime de contingentes quantitativos que expirou em 1 de Janeiro de 2005.

11      Na sequência de uma denúncia apresentada em 30 de Maio de 2005 pela Confédération européenne de l’industrie de la chaussure (CEC), a Comissão das Comunidades Europeias deu início a um processo antidumping respeitante às importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da China e do Vietname. O aviso de início desse processo foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 7 de Julho de 2005 (JO C 166, p. 14, a seguir, «aviso de início de processo»).

12      Em 23 de Março de 2006, a Comissão aprovou o Regulamento (CE) n.° 553/2006 que institui um direito antidumping provisório sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China e do Vietname (JO L 98, p. 3, a seguir, «regulamento provisório»).

13      Segundo o considerando 9 do regulamento provisório, o inquérito sobre o dumping e o prejuízo abrangeu o período compreendido entre 1 de Abril de 2004 e 31 de Março de 2005 (a seguir, «período de inquérito»). A análise dos elementos úteis para a avaliação do prejuízo incidiu sobre o período compreendido entre 1 de Janeiro de 2001 e 31 de Março de 2005 (a seguir, «período considerado»)

14      Tendo em conta a necessidade de determinar um valor normal para os produtos dos produtores‑exportadores chineses e vietnamitas que pudessem não vir a beneficiar do TEM, a Comissão procedeu a uma inspecção com vista a estabelecer o valor normal com base nos dados referentes a um país análogo, neste caso, a República Federativa do Brasil, nas instalações de três empresas brasileiras (considerando 8 do regulamento provisório).

15      Resulta do considerando 57 do regulamento provisório que, no quadro da determinação do dumping, a Comissão recorreu à técnica de amostragem prevista no artigo 17.° do regulamento de base. Para esse efeito, a Comissão escolheu uma amostra que compreende treze produtores‑exportadores chineses que representam mais de 20% do volume das exportações chinesas para a Comunidade Europeia. Segundo o considerando 8, alínea c), do regulamento provisório, a recorrente constitui a quinta empresa na lista dos produtores‑exportadores chineses que fazem parte da amostra.

16      Quanto ao preço de exportação, a Comissão expôs, no considerando 130 do regulamento provisório, que, nos casos em que as exportações para a Comunidade foram efectuadas por intermédio de empresas de comercialização independentes, os preços de exportação foram estabelecidos com base nos preços do produto vendido para exportação às empresas de comercialização pelos produtores em causa, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 8, do regulamento de base (v. n.° 4 supra).

17      Segundo o considerando 131 do regulamento provisório, a comparação entre o valor normal e o preço de exportação foi efectuada no estádio à saída da fábrica. Para efeitos de uma comparação equitativa, foram devidamente tidas em conta, sob a forma de ajustamentos, as diferenças que afectam os preços e a sua comparabilidade, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 10, do regulamento de base (considerando 132 do regulamento provisório).

18      Quanto ao prejuízo, a Comissão examinou, nomeadamente, a subcotação dos preços de importação. Para esse efeito, os preços de importação cif, fronteira comunitária, após desalfandegamento, foram sobreajustadas para ter em conta os custos suportados na Comunidade pelos importadores, tais como os relativos à concepção, à selecção das matérias‑primas, etc. e foram comparados com os preços da indústria comunitária no estádio à saída da fábrica e no estádio comercial. Essa comparação deu lugar a uma margem de subcotação de 12,8% para o calçado originário da China (considerandos 167 e 168 do regulamento provisório).

19      Por carta de 7 de Abril de 2006, a Comissão transmitiu à recorrente, nos termos do artigo 14.°, n.° 2, do artigo 20.°, n.° 1, do regulamento de base, respectivamente, uma cópia do regulamento provisório e um documento com informações sobre os pormenores que suportam os factos e considerações essenciais com base nos quais os direitos antidumping provisórios foram impostos. A Comissão convidou a recorrente a transmitir‑lhe os seus eventuais comentários sobre esses documentos até 8 de Maio de 2006.

20      Por correio electrónico de 27 de Abril de 2006, a recorrente queixou‑se do carácter lacunoso das informações que figuram no documento de divulgação intermédio pondo o acento nos dados relativos aos ajustamentos dos preços para efeitos do cálculo do dumping e da subcotação. A recorrente reiterou essas críticas nas suas observações escritas apresentadas em 8 de Maio de 2006.

21      Por correio electrónico de 16 de Maio de 2006, a recorrente sublinhou, nomeadamente, que o ajustamento do seu preço de exportação de 15% a título de despesas de investigação e de desenvolvimento era inferior às despesas reais efectuadas para esse efeito, dado que não tomava em conta os encargos e as margens importantes das empresas de comercialização, por intermédio das quais certos produtores chineses encaminhavam a sua produção para o mercado europeu..

22      Por carta de 7 de Julho de 2006, a Comissão transmitiu à recorrente, em aplicação do artigo 20.°, n.os 2 a 4, do regulamento de base, um documento de divulgação final sobre os factos e considerações essenciais que baseiam a proposta de impor direitos antidumping definitivos.

23      No título H desse documento, a Comissão expôs as suas considerações quanto às medidas antidumping definitivas que seriam propostas ao Conselho da União Europeia. Quanto ao tipo de medidas, a Comissão expôs, em primeiro lugar, que compromissos por parte dos produtores de não venderem abaixo do nível de preço que eliminava o prejuízo importante que sofria a indústria comunitária não constituíam medidas adequadas e, em segundo lugar, que havia que aplicar um sistema de direitos diferidos (pontos 278 a 291 do documento de divulgação final).

24      No que respeita ao sistema de direitos diferidos, a Comissão salientou que o volume das importações teve um efeito prejudicial importante sobre a indústria comunitária a partir de 1 de Janeiro de 2005, data da extinção do regime de contingentes (v. n.° 10 supra). Com efeito, durante os primeiros meses do ano de 2005, incluídos no período de inquérito (v. n.° 13 supra), a indústria comunitária conheceu, proporcionalmente, o declínio mais significativo no decurso do período considerado no que respeita a vários indicadores económicos, tais como a rentabilidade, os preços de venda, as quotas de mercado, as vendas, o emprego e a produção. Nestas condições, a Comissão dedicou atenção especial ao elemento quantitativo das práticas de dumping na determinação da existência de um prejuízo. Assim, considerou que só as importações que ultrapassassem um certo volume estavam na origem de um prejuízo e que, não era necessária por isso, uma intervenção sob a forma de direitos ad valorem para restabelecer condições de concorrência leal, Portanto, os direitos antidumping deviam ser unicamente aplicados às quantidades de produtos importados para além de um determinado volume anual. No caso em apreço, tal sistema de direitos diferidos seria adequado para efeitos da eliminação do prejuízo, na medida em que tomaria em conta os efeitos do regime de contingentes e em que equilibraria os interesses das partes interessadas. Seria, portanto, às importações de mais de 140 milhões de pares de sapatos por ano provenientes da China que os direitos antidumping propostos deveriam aplicar-se. Esse volume reflectia a apreciação da Comissão sobre as importações provenientes da China em 2005, tendo em conta as quantidades importadas em 2004 (pontos 285 a 287 e 291 do documento de divulgação final).

25      Assim, a Comissão propôs a imposição de um direito antidumping definitivo, igual à margem de eliminação do prejuízo, às importações de mais de 140 milhões de pares de sapatos por ano originários da China. Essa margem era estabelecida ao nível da subcotação dos preços de referência, a saber, 23% (ponto 293 do documento de divulgação final).

26      Por carta de 10 de Julho de 2006, a Comissão completou o documento de divulgação final com considerações respeitantes à situação da recorrente e relativas à concessão do TEM, ao cálculo do valor normal e ao cálculo do prejuízo. Quanto ao cálculo do valor normal, a Comissão indicou que utilizaria os dados provenientes da contabilidade da recorrente para determinar o custo de produção. Todavia, para determinar o montante dos encargos de venda, das despesas administrativas, dos outros encargos gerais e a margem de lucro, a Comissão utilizou dados provenientes de duas outras empresas chinesas que efectuaram vendas domésticas representativas e que beneficiaram do TEM no quadro de inquéritos recentes. Resulta do cálculo efectuado uma margem de dumping de 9,7%.

27      Quanto ao cálculo do prejuízo, a Comissão referiu, na carta de 10 de Julho de 2006, que lhe era impossível tomar em conta, para estabelecer o preço cif, fronteira comunitária, e, por consequência, a margem de subcotação, a margem de lucro da empresa de comercialização que encaminha a produção da recorrente para o mercado comunitário, porque essa empresa não tinha colaborado no inquérito. Além disso, a tomada em conta dessa margem de lucro não seria necessária, dado que a Comissão tinha subajustado o valor normal estabelecido com base nos dados provenientes do Brasil para subtrair os custos suportados por essa empresa de comercialização (marketing, investigação e desenvolvimento, etc.). A Comissão convidou a recorrente a transmitir‑lhe os seus comentários até 18 de Julho de 2006.

28      A recorrente apresentou os seus comentários, nomeadamente, por carta de 18 de Julho de 2006 e contestou tanto o cálculo do valor normal como a determinação do preço cif de importação, fronteira comunitária, que, em sua opinião, devia ser majorado com a margem de lucro realizada pela empresa de comercialização que encaminha a sua produção para o mercado comunitário. Além disso, a recorrente queixou‑se de que a Comissão não lhe comunicara nem os dados quantificados que serviram de base para o cálculo dos encargos de venda, das despesas administrativas e dos outros encargos gerais bem como da margem de lucro nem os sectores de actividades das empresas de que emanavam esses dados.

29      Por carta de 28 de Julho de 2006, a Comissão transmitiu à recorrente um documento de divulgação final adicional. Segundo os dois primeiros parágrafos, esse documento tinha por objecto informar as partes interessadas de uma mudança em relação à configuração dos direitos antidumping definitivos que seriam propostos. A Direcção‑geral (DG) «Comércio» da Comissão examinara as observações formuladas por algumas partes interessadas quanto ao sistema de direitos diferidos inicialmente contemplado (v. n.os 23 a 25 supra). Por intermédio desse documento, a Comissão abandonou a ideia de tal sistema. No quadro da sua nova abordagem, a Comissão sublinhou que o aumento verdadeiramente prejudicial das importações tinha tido lugar durante o ano de 2004, e isso até ao fim do período de inquérito, e que 2005 tinha sido o primeiro ano durante o qual as importações de calçado proveniente da China já não estavam sujeitas a um regime de contingentes. Além disso, a Comissão estabeleceu um volume de importações não prejudicial baseando‑se nas importações originárias da China e do Vietname em 2003, concretamente, 109 milhões de pares de sapatos. Em conformidade com essa nova abordagem, o impacto económico desse volume devia ser tomado em consideração na determinação do nível de eliminação do prejuízo. Assim, por um lado, o nível de eliminação do prejuízo foi diminuído a fim de ter em conta o volume de importações não prejudicial e, por outro, os direitos definitivos foram aplicados a partir do primeiro par importado. Segundo esse método, que prevê quatro etapas expostas nesse documento, a Comissão concluiu, em relação às importações provenientes da China, com base na «regra do direito inferior», pela imposição de um direito antidumping definitivo igual ao nível requerido para a eliminação do prejuízo, na ocorrência 16,5%. Todavia, no que diz respeito às importações de calçado proveniente da produção da recorrente, a Comissão propôs, ainda em conformidade com «a regra do direito inferior», a imposição de um direito de 9,7%, ou seja, igual à sua margem de dumping.

30      Para efeitos da formalização dessa nova proposta, a Comissão anexou à carta de 28 de Julho de 2006 os pontos que deviam figurar no novo título H do documento de divulgação final e substituir os que figuram no título correspondente deste (v. n.° 23 supra). A Comissão expôs, nos pontos 278 e 279 que devem figurar no novo título H do documento de divulgação final, que só as importações que excedam um certo volume antes da extinção do regime de contingentes podiam causar um prejuízo importante, de modo que, no quadro da determinação do nível de eliminação do prejuízo com base nos resultados do período de inquérito, o facto de certas quantidades importadas não terem causado prejuízo devia ser tomado em consideração. Por conseguinte, as quantidades que não causavam prejuízo importante deviam ser tomadas em consideração na determinação do nível de eliminação do prejuízo. No ponto 280 do mesmo documento, a Comissão expôs o método que tinha sido aplicado.

31      Por correio electrónico de 2 de Agosto de 2006, a recorrente comunicou os seus comentários sobre o documento de divulgação final adicional, observando, no entanto, que nem o tempo concedido nem as informações fornecidas pela Comissão para esse efeito eram suficientes.

32      Por carta de 22 de Agosto de 2006, a Comissão informou a recorrente de que as empresas de onde eram provenientes os dados relativos aos encargos de venda, às despesas administrativas e aos encargos gerais bem como à margem de lucro pertenciam aos sectores dos produtos químicos e da engenharia. Nessa carta, a Comissão confirmou que, apesar da diferença entre esses sectores, os dados utilizados eram «razoáveis» e «comparáveis aos tipos de encargos suportados» pela recorrente.

33      Em 5 de Outubro de 2006, o Conselho adoptou o Regulamento (CE) n.° 1472/2006 que institui um direito antidumping definitivo e estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China e do Vietname (JO L 275, p. 1, a seguir, «regulamento impugnado»). Por virtude do regulamento impugnado, o Conselho instituiu um direito antidumping definitivo sobre as importações de calçado com a parte superior de couro natural ou reconstituído, com exclusão do calçado para desporto, do calçado de tecnologia especial, das pantufas e outro calçado de interior e do calçado com biqueira protectora originário da China e classificado em vários códigos da Nomenclatura Combinada (artigo 1.° do regulamento impugnado). Segundo o artigo 3.° do regulamento impugnado, este vigorava durante dois anos.

34      Segundo os considerandos 71 e 72 do regulamento impugnado, à recorrente, que foi incluído na amostra dos produtores chineses em que incidiu o inquérito, foi concedido o TEM. Esse estatuto tinha‑lhe sido recusado na fase do regulamento provisório pela razão de que ela não era livre de determinar o volume das suas vendas sem intervenção significativa do Estado. Todavia, a recorrente apresentou em seguida elementos de prova que demonstram que essa circunstância não estava apurada.

35      Segundo o considerando 98 do regulamento impugnado, o cálculo do valor normal, no que diz respeito à recorrente, devia ser efectuado com base nos dados relativos às suas vendas domésticas e aos seus custos de produção. No entanto, segundo o considerando 99 do regulamento impugnado, na ausência de vendas no mercado interno chinês no decurso do período de inquérito, o valor normal não pôde ser estabelecido com base nos preços internos da recorrente, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do regulamento de base. Além disso, tendo em conta que nenhum outro produtor chinês que faz parte da amostra obtivera o TEM, o que tornou impossível a aplicação do artigo 2.°, n.° 1, segundo parágrafo, do regulamento de base, as instituições deveriam ter calculado o valor normal com base nos custos de produção da recorrente acrescidos de um montante razoável para os encargos de venda, as despesas administrativas e os outros encargos gerais bem como de uma margem de lucro razoável, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 3, do regulamento de base (considerandos 100 e 101 do regulamento impugnado).

36      Dado que a recorrente não realizara qualquer venda doméstica e que nenhum outro produtor chinês obteve o TEM, os encargos de venda, as despesas administrativas, os outros encargos gerais e a margem de lucro deveriam ter sido determinados com base num método razoável, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base (v. n.° 3 supra). Para esse efeito, a Comissão recorreu aos dados provenientes de outros produtores‑exportadores chineses que obtiveram, no quadro de outros inquéritos, o TEM e que realizaram vendas domésticas no decurso de operações comerciais normais, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 2, do regulamento de base (considerandos 102 e 103 do regulamento impugnado).

37      Quanto ao preço de exportação e à sua comparação com o valor normal, o Conselho confirmou, nos considerandos 123 e 138 do regulamento impugnado, as apreciações da Comissão que figuram nos considerandos 128 a 133 do regulamento provisório (v. n.os 16 e 17 supra).

38      Segundo o considerando 146 do regulamento impugnado, a margem de dumping, expressa em percentagem do preço cif de importação, fronteira comunitária, foi fixada para a recorrente em 9,7%.

39      No que se refere à subcotação dos preços, o Conselho teve de rever para baixo o ajustamento dos preços de importação (v. n.° 18 supra), tendo presente, nomeadamente, o facto de a maioria dos importadores não ter podido provar a afirmação segundo a qual os seus custos de investigação e de desenvolvimento atingiam os considerados na fase provisória. Assim, o Conselho procedeu a um novo cálculo que deu lugar a uma margem de subcotação dos preços de 13,5% para o calçado originário da China (considerandos 180 a 182 do regulamento impugnado).

40      Quanto ao nível de direitos necessário para efeitos de eliminação do prejuízo ocasionado pelas importações provenientes da China, o Conselho expôs nos considerandos 296 a 301 do regulamento impugnado, retomando os pontos 275 a 280 que figuram no novo título H do documento de divulgação final e anexados ao documento de divulgação final adicional, que havia que ter em conta as particularidades do presente processo, e, nomeadamente, a existência do regime de contingentes até 1 de Janeiro de 2005. Tendo o regime de contingentes impedido a indústria comunitária de sofrer um prejuízo importante, quando o crescimento das importações após a extinção desse regime teve um efeito prejudicial particularmente sensível, o Conselho considerou que só as importações que ultrapassassem um certo volume antes da supressão do regime de contingentes podiam causar um prejuízo importante. Por conseguinte, o limiar de prejuízo, determinado com base nos resultados do período de inquérito, devia tomar em consideração o facto de certos volumes de importações não terem causado prejuízo importante. Essa operação, que se baseou no valor dos volumes importados em 2003, redundou, em relação às importações provenientes da China, num limiar de prejuízo de 16,5% em vez do limiar de 23% que teria sido aplicado, segundo o considerando 295 do regulamento impugnado, se o Conselho não tivesse tido em conta as particularidades do presente processo.

41      No entanto, em conformidade com a «regra do direito inferior» (v. n.° 17 supra), o nível do direito definitivo foi fixado, no que respeita à recorrente, com base na sua margem de dumping, que era inferior ao nível de direito requerido para eliminação do prejuízo. Por conseguinte, a taxa do direito antidumping definitivo aplicável ao preço líquido, franco‑fronteira comunitária, antes do desalfandegamento, foi estabelecido, para o calçado proveniente da produção da recorrente em 9,7% (considerandos 302, 323 e 324 e artigo 1.°, n.° 3, do regulamento impugnado).

 Tramitação processual e pedidos das partes

42      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 21 de Dezembro de 2006, a recorrente interpôs o presente recurso.

43      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de Abril de 2007, a Comissão que fosse autorizada a intervir no presente processo em apoio dos pedidos do Conselho.

44      Por acto apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de Abril de 2007, a CEC pediu para intervir no presente processo em apoio das conclusões do Conselho.

45      Por despacho de 2 de Agosto de 2007, o presidente da Segunda Secção do Tribunal admitiu os pedidos de intervenção formulados pela Comissão e pela CEC.

46      A CEC apresentou o seu articulado de intervenção em 17 de Agosto de 2007.

47      Tendo a composição das Secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz‑relator foi afectado à Oitava Secção, à qual, o presente processo foi, por consequência, distribuídos.

48      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal decidiu abrir a fase oral do processo e, no quadro de medidas de organização do processo, a recorrente e o Conselho foram convidados a responder por escrito a duas questões.

49      Por cartas recebidas em 2 de Fevereiro de 2009, essas partes concordaram com as medidas de organização do processo adoptadas pelo Tribunal.

50      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 20 de Fevereiro de 2009.

51      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular o regulamento impugnado na medida em que lhe diz respeito;

–        condenar o Conselho nas despesas.

52      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        julgar o recurso inadmissível ou negar‑lhe provimento;

–        condenar a recorrente nas despesas.

53      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne negar provimento ao recurso.

54      A CEC conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas ligadas à sua intervenção.

 Questão de direito

55      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca quatro fundamentos, relativos respectivamente:

–        à violação do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base bem como à violação dos seus direitos de defesa quanto ao cálculo da sua margem de dumping;

–        à violação do artigo 3.° do regulamento de base e à falta de fundamentação;

–        à violação dos seus direitos de defesa bem como à falta de fundamentação no que diz respeito ao tipo de direitos definitivos aplicado;

–        a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação respeitante ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base bem como à violação dos direitos de defesa quanto ao cálculo da margem de dumping

 Argumentos das partes

56      A recorrente considera que, ao utilizar margens de lucro de dois exportadores chineses pertencentes a sectores totalmente diferentes do seu para determinar a sua margem de lucro, a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação e violou o artigo 2.° do regulamento de base.

57      A esse propósito, a recorrente recorda que o direito antidumping de 9,7% aplicado aos seus produtos foi estabelecido com base na sua margem de dumping individual, por força da «regra do direito inferior» (v. n.os 7 e 41 supra).

58      No caso em apreço, a Comissão determinou o lucro da recorrente com base numa média dos lucros apurados em dois processos antidumping anteriores relativos aos sectores dos produtos químicos e da engenharia (v. n.° 26 supra). Ora, com toda a evidência, o calçado com a parte superior de couro natural não está incluído na mesma categoria geral que os produtos químicos ou da engenharia, o que o Conselho não contesta. A Comissão reconhece, na sua correspondência, que os referidos sectores eram diferentes do calçado.

59      As instituições cometeram um erro manifesto de apreciação ao utilizar as margens de lucro registadas nos dois sectores supramencionados. Com efeito, poderiam ter utilizado ou a margem de lucro que a recorrente realizava com as suas vendas de exportação (6,7%) ou a margem de lucro‑alvo de 6% estabelecida para a indústria comunitária, ou a margem de lucro de pelo menos um produtor da amostra que realiza vendas significativas no mercado chinês e que não obteve o TEM «unicamente na base de uma confusão respeitante aos seus estatutos». A Comissão é obrigada a explicar em que medida as suas verificações respeitantes aos estatutos dessa empresa tornavam não fiáveis os dados contabilísticos desta, relativos à sua margem de lucro realizada no mercado chinês. Além disso, as instituições poderiam ter utilizado a margem de lucro de produtores que não fazem parte da amostra, se o Tribunal considerar que, no quadro dos recursos por eles interpostos, a Comissão deveria ter examinado os seus pedidos com vista à concessão do TEM ou de um tratamento individual (a seguir, «TI»). O argumento segundo o qual as instituições deveriam dar mais importância ao mercado geográfico e basearem‑se, por isso, em vendas de produtos diferentes efectuadas na China em lugar de se basearem em vendas de produtos similares efectuadas no estrangeiro é, por outro lado, desprovido de fundamento. Com efeito, o Conselho não demonstrara a existência de uma diferença substancial quanto à margem de lucro em função do destino dos produtos. Assim, as instituições não tiveram em conta todas as circunstâncias pertinentes nem avaliaram os elementos dos autos com toda a diligência requerida para determinar o valor normal de uma forma razoável.

60      A Comissão violou igualmente os direitos de defesa da recorrente ao não a ter informado, num prazo razoável, da sua intenção de utilizar as despesas com as vendas, as despesas administrativas, os outros encargos gerais e a margem de lucro dos operadores pertencentes a sectores diferentes do seu, e isto sem fundamentar suficientemente a rejeição do método razoável proposto pela recorrente. A Comissão só informou a recorrente da sua opção de utilizar os dados das empresas que pertencem aos sectores dos produtos químicos e da engenharia em 22 de Agosto de 2006, isto é, após a o termo do prazo para a apresentação de observações sobre o documento de divulgação final adicional. A ausência de comunicação dos pormenores respeitantes às despesas com as venda, às despesas administrativas, aos outros encargos gerais e à margem de lucro nos quais a Comissão baseou o seus cálculos, apesar dos pedidos da recorrente, constitui também uma violação dos seus direitos de defesa. Assim, a Comissão não colocou a recorrente em condições de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade, a pertinência e o carácter razoável dos factos e das circunstâncias alegados e sobre os elementos de prova por ela considerados quanto à existência do dumping e do prejuízo. Teria sido possível à Comissão comunicar esses elementos omitindo o nome das empresas que lhos transmitiram. Finalmente, a Comissão não informou a recorrente da sua posição segundo a qual as margens de lucro realizadas nas vendas domésticas podiam diferir das realizadas nas vendas de exportação, desempenhando o destino dos produtos, segundo a Comissão, um papel determinante a esse respeito, nem comunicou elementos que demonstrem a existência de tal diferença.

61      A recorrente alega que, em 152 pedidos de TEM/TI, a Comissão examinara apenas doze, circunstância que a privou de dados pertinentes susceptíveis de serem utilizados para efeitos do cálculo da sua margem de lucro.

62      Quanto ao argumento subsidiário do Conselho relativo à margem de dumping, no caso de esse fundamento ser acolhido (v. n.° 75 infra), a recorrente sublinha que a instituição recorrida não aduz qualquer elemento susceptível de apoiar a margem proposta de 2,6%. Todavia, a recorrente declara‑se disposta a tomar posição sobre a taxa justificada do direito antidumping desde que o Conselho forneça informações detalhadas a esse respeito.

63      O Conselho, apoiado pela Comissão e pela CEC, contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

–       Quanto à alegada violação do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base

64      Há que salientar de imediato que o artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base confere às instituições uma ampla margem de apreciação para escolher o método segundo o qual devem proceder ao cálculo das despesas com as vendas, das despesas administrativas e dos outros encargos gerais e de uma margem de lucro no quadro do cálculo do valor normal por estimativa.

65      Nestas condições, a fiscalização do juiz comunitário incide sobre o comprimento das regras de procedimento, a exactidão material dos factos que serviram de base à escolha impugnada, a inexistência de erro manifesto na apreciação desses factos ou de desvio de poder (acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Outubro de 1991, Nölle, C‑16/90, Colect., p. I‑5163, n.° 12 e de 29 de Maio de 1997, Rotexchemie, C‑26/96, Colect., p. I‑2817, n.° 11; acórdão do Tribunal Geral de 13 de Julho de 2006, Shandong Reipu Biochemicals/Conselho, T‑413/03, Colect., p. II‑2243, n.° 62).

66      Além disso, o artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base prevê que esse método deve ser razoável. Assim, o juiz comunitário só pode declarar um erro manifesto de apreciação relativo ao método escolhido se este for desrazoável. Portanto, a existência de outros métodos razoáveis que poderiam ter sido seguidos para esse efeito não afecta a legalidade do efectivamente escolhido, não podendo o juiz comunitário sobrepor a sua apreciação à das instituições a esse respeito.

67      Resulta, por outro lado, do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base que, quando as instituições aplicam essa disposição para calcular uma margem de lucro razoável, não são obrigadas a utilizar os dados relativos a produtos da mesma categoria geral, mas devem zelar por que a margem de lucro estabelecida segundo um método razoável não exceda a margem de lucro realizada na venda dos produtos da mesma categoria geral.

68      Assim, é sem razão que a recorrente afirma que o recurso a dados relativos aos sectores dos produtos químicos e da engenharia constitui uma violação do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base, pela razão de que os produtos correspondentes não pertencem à mesma categoria geral que o calçado.

69      No que diz respeito ao método utilizado, há que salientar que, como alega o Conselho, a escolha do método foi feita tendo em conta a necessidade de estabelecer margens de lucro realizadas no mercado interno. Ora, tendo os lucros da recorrente sido realizados em vendas de exportação, quando às outras empresas da amostra foi concedido o TEM, as instituições tinham o direito de considerar que os dados relativos às suas margens de lucro não constituíam uma base de cálculo fiável. Por consequência, as instituições não dispunham de qualquer dado verificado no que respeita às vendas domésticas de calçado em condições de mercado na China. Além disso, as instituições tinham igualmente o direito de considerar que a utilização, sugerida pela recorrente, da margem de lucro‑alvo de 6% realizada pela indústria comunitária no seu próprio mercado não era de molde a reflectir a margem de lucro realizada pelos produtores chineses no mercado interno e de privilegiar assim a influência do local de venda do produto na referida margem.

70      Nestas condições, competia às instituições elaborar, exercendo o seu amplo poder de apreciação e tendo em conta os dados fiáveis e verificáveis de que podiam dispor, um método que permitisse calcular uma margem de lucro razoável.

71      Assim, as instituições puderam considerar, no âmbito da margem de apreciação que lhes é reservada pelo artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base, que era mais razoável utilizar as informações relativas aos lucros realizados no mercado chinês, por empresas de dimensão comparável à da recorrente, que não suporta encargos de venda nem encargos gerais particularmente elevados, tendo obtido igualmente o TEM na altura de inquéritos recentes sobre outros produtos que não o calçado, e em relação aos quais as instituições dispunham de dados fiáveis, do que as relativas a lucros realizados na venda de calçado em mercados totalmente diferentes. Ora, a recorrente não aduziu qualquer elemento tendente a demonstrar que essa consideração estava afectada por erro manifesto de apreciação. Além disso, o método utilizado era o método disponível mais adequado para efeitos do estabelecimento de uma margem de lucro razoável, dada a inexistência de outras informações à disposição da Comissão.

72      Quanto à proposta da recorrente que tem a ver com a utilização dos dados relativos à indústria comunitária, deve reconhecer‑se que, como alega o Conselho, o mercado comunitário do calçado não é comparável ao mercado Chinês e que, além disso, sofreu distorções em razão das importações chinesas e vietnamitas que foram objecto de dumping.

73      No que diz respeito ao argumento segundo o qual a Comissão não teve em conta as informações apresentadas por empresas que não fazem parte da amostra e cujos pedidos de TEM/TI não foram, por isso, examinados, não pode aceitar‑se, uma vez que a recorrente não indica em que medida a decisão de não examinar esses pedidos está afectada de ilegalidade. Além disso, o Tribunal Geral decidiu no seu acórdão de hoje mesmo, Brosmann Footwear (HK) e o./Conselho (T‑401/06, ainda não publicado na Colectânea, n.os 83 a 105), que essa decisão era conforme ao regulamento de base.

74      Embora seja verdade que, nos termos do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base, o montante correspondente ao lucro estabelecido segundo um método razoável não deve exceder o lucro normalmente realizado nas vendas de produtos da mesma categoria geral no mercado interno do país de origem, deve interpretar‑se essa disposição no sentido de que as instituições seriam impedidas de estabelecer uma margem de lucro se não dispuserem de uma base de cálculo fiável respeitante à margem de lucro realizada nas vendas de produtos da mesma categoria geral.

75      Daqui resulta que esta parte do primeiro fundamento deve ser rejeitada.

–        Quanto à alegada violação dos direitos de defesa

76      Há que salientar de imediato que, no anexo II da sua carta de 10 de Julho de 2006, a Comissão comunicou à recorrente as taxas médias das despesas com as vendas, das despesas administrativas e de outros encargos gerais bem como a margem de lucro acrescentando que esses dados provinham de empresas chinesas que efectuaram vendas domésticas representativas e às quais foi concedido o TEM. Além disso, pela sua carta de 22 de Agosto de 2006, a Comissão informou a recorrente dos sectores a que pertenciam as empresas de que emanavam as informações relativas aos encargos com as vendas, às despesas administrativas e aos encargos gerais bem como à margem de lucro. Na referida carta, a Comissão expôs igualmente que a utilização desses dados era justificada pelo facto de as empresas em causa serem de dimensão comparável à da recorrente, que não tinham despesas com as vendas nem encargos gerais particularmente elevados, que elas tinham obtido igualmente o TEM na altura de inquéritos recentes, que as suas margens de lucro eram semelhantes e que nenhum dado relativo às vendas domésticas da indústria chinesa do calçado estava disponível no caso em apreço.

77      Portanto, há que considerar que, pela carta de 22 de Agosto de 2006, a Comissão respondeu aos pedidos de informações complementares da recorrente respeitantes aos dados quantificados relativos aos custos gerais e à margem de lucro. A recorrente não pode, a esse respeito, censurar a Comissão por lhe ter comunicado os sectores aos quais pertenciam as empresas cujos dados tinham sido utilizados após o termo do prazo fixado para apresentar observações sobre o documento de divulgação final adicional. Com efeito, não resulta do artigo 20.°, n.° 5, do regulamento de base que a Comissão seja obrigada a conceder um prazo mínimo de dez dias para as partes interessadas formularem comentários sobre uma carta que envia em resposta às suas observações sobre a divulgação final. Tal teria acontecido unicamente se a carta de 22 de Agosto de 2006 contivesse «factos e considerações essenciais com base nos quais se tencionava recomendar a instituição de medidas definitivas» na acepção do artigo 20.°, n.° 2, do regulamento de base.

78      Ora, deve observar‑se que os factos e considerações essenciais com base nos quais a Comissão planeou recomendar medidas definitivas foram levados ao conhecimento da recorrente no documento de divulgação final e no documento de divulgação final adicional. Em contrapartida, a carta de 22 de Agosto de 2006 contém apenas explicações complementares. Com efeito, a carta de 22 de Agosto de 2006 não contém qualquer modificação nem mesmo adaptação de interesse secundário da abordagem seguida pela Comissão.

79      Deve acrescentar‑se que o facto de, na carta de 18 de Julho de 2006, a recorrente ter afirmado que o nível da margem de lucro utilizada pela Comissão para estabelecer o valor normal era demasiado elevado, tendo em conta os dados que são, em sua opinião, razoáveis para a indústria do calçado, confirma que sabia que os dados em causa provinham de outros sectores que não o do calçado.

80      Além disso, resulta dos n.os 68 a 74 supra que a Comissão não tinha a obrigação de recorrer aos dados relativos a produtos incluídos na mesma categoria geral. Portanto, o argumento essencial que a recorrente formulou na sua carta de 18 de Julho de 2006 e que reafirmou na audiência, segundo o qual o acesso aos dados em causa devia permitir‑lhe avaliar se estes diziam efectivamente respeito a produtos incluídos na mesma categoria geral, não pode vingar.

81      O argumento da recorrente, segundo o qual a não comunicação dos dados que apoiam os cálculos da Comissão constitui uma violação dos seus direitos de defesa, também não pode, por outro lado, proceder. Sem que o Tribunal se tenha de pronunciar sobre a natureza confidencial dos referidos dados, invocada pelo Conselho, há que reconhecer que esses dados não eram indispensáveis à recorrente para efeitos do exercício dos seus direitos de defesa. Com efeito, a própria recorrente sugeriu à Comissão, na base de dados que considerava razoáveis e actuais, taxas médias das despesas com as vendas, das despesas administrativas e de outros encargos gerais bem como de uma margem de lucro no quadro do seu cálculo alternativo do valor normal, que figura na carta de 18 de Julho de 2006 e que deve, em sua opinião, conduzir a que nenhuma margem de dumping seja estabelecida em relação a ela.

82      De qualquer forma, nada impedia a recorrente, na sequência da carta de 22 de Agosto de 2006, de formular comentários à Comissão. A esse propósito, o argumento avançado pela recorrente, segundo o qual poderia ter tentado obter dados que permitissem explicar as razões pelas quais as margens de lucro registadas nesses sectores eram mais elevadas do que as registadas na indústria do calçado se tivesse sido informada da escolha dos sectores tomados em consideração numa fase precoce do procedimento, não pode ser admitido. Com efeito, a recorrente não forneceu ao Tribunal Geral qualquer elemento que demonstre que tinha feito diligências com vista a obter os dados requeridos após a recepção da carta da Comissão de 22 de Agosto de 2006.

83      Nestas condições, há que considerar que os direitos de defesa da recorrente não foram violados.

84      Portanto, o primeiro fundamento deve ser rejeitado.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 3.° do regulamento de base

 Argumentos das partes

85      A recorrente sublinha que a Comissão procedeu ao cálculo de uma margem de prejuízo individual resultante das suas exportações para o mercado comunitário. Quanto à determinação do seu preço de exportação para efeitos do cálculo do prejuízo, o Conselho não teve em conta, no regulamento impugnado, o facto de vender os seus produtos a empresas de comercialização independentes que desempenham o papel de intermediários entre os produtores chineses e os distribuidores instalados no mercado europeu. Dessa omissão resulta um preço de exportação inferior ao preço real e, por isso, uma margem de subcotação dos preços (e, portanto, um prejuízo) artificialmente sobreavaliado.

86      Segundo a recorrente, as empresas de comercialização independentes, como a sociedade Pagoda, que é um negociante intermediário em vendas importantes com destino ao mercado comunitário para outros produtores chineses e vietnamitas de calçado e que colaborava com ela para as suas vendas com destino a outros mercados, suportam uma parte importante do custo de produção e de comercialização, nomeadamente em matéria de marketing, de organização das exportações e de investigação e de desenvolvimento, Esses custos, bem como as margens de lucro das empresas de comercialização, deveriam ter sido tomadas em conta para determinar o preço cif, fronteira comunitária, e, por isso, calcular a subcotação dos preços e o prejuízo resultante das exportações da recorrente.

87      A despeito do facto de a Comissão conhecer o papel e as margens de lucro das empresas de comercialização de forma quantificada, números cuja fiabilidade não foi contestada, não cumpriu o seu dever de proceder a um exame objectivo do conjunto dos elementos pertinentes para efeitos da determinação da existência de um prejuízo, em conformidade com o disposto no artigo 3.° do regulamento de base e no artigo 3.° do Acordo sobre a aplicação do artigo VI do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 (GATT) (JO, L 336, p. 103), que figura no Anexo 1A do Acordo que institui a Organização Mundial de Comércio (OMC) (JO 1994, L 336, p. 3). Com efeito, como a recorrente alegou no procedimento administrativo, é errado utilizar, para efeitos de cálculo do prejuízo, um preço de exportação baseado no preço fob Hong Kong sem lhe acrescentar os encargos pertinentes para estabelecer o preço cif, fronteira comunitária. Assim, o acréscimo ao preço fob Hong Kong apenas dos encargos de seguro e de transporte daria lugar a um preço de exportação mais baixo que o preço real, circunstância que, também ela, redundaria na sobreavaliação da margem de subcotação.

88      Na ocorrência, a Comissão sustentou, sem fundamentar a sua apreciação, que a tomada em conta das margens das empresas de comercialização não era necessária, dado que os dados relativos ao valor normal coligidos no Brasil (v. n.° 14 supra) tinham sido subajustados a fim de subtrair deles os elementos de custo que essa margem visa cobrir (investigação e desenvolvimento, marketing, etc.). Ora, a Comissão não forneceu qualquer outra precisão quanto aos elementos específicos do custo em questão nem explicou em que medida os dados relativos ao valor normal coligidos no Brasil eram pertinentes para calcular a subcotação da recorrente, que obteve o TEM e, por isso, os dados coligidos nesse país não lhe dizem respeito. O ajustamento de 9,3% do preço de exportação operado pelo Conselho a título das despesas de investigação e de desenvolvimento, como o alegou a recorrente no procedimento administrativo, é inferior à margem de lucro de 38% que realizaria a Novi, empresa de comercialização que encaminha a produção da recorrente para o mercado europeu. Além disso, esse ajustamento não tem por objectivo tomar em consideração o papel das empresas intermediárias de comercialização.

89      Ao não tomar em consideração todos os encargos suportados entre o preço fob da recorrente e a chegada à fronteira comunitária, por um lado, e ao não tomar em conta as margens de lucro das empresas de comercialização independentes, como a Pagoda, por outro, a Comissão efectuou um cálculo errado da margem de subcotação respeitante à recorrente. Um cálculo correcto teria conduzido à imposição de um direito antidumping inferior, ou mesmo nulo. O facto de os produtores europeus não recorrerem a outras empresas para a concepção dos modelos, para os controlos de qualidade, para a negociação dos preços, para a logística, etc. não pode justificar a não tomada em conta desses custos suportados pela recorrente para efeitos do cálculo do preço cif, fronteira comunitária, dos seus produtos. Com efeito, é só por referência a esse preço cif que há que apreciar a existência de uma subcotação.

90      A questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo Conselho contra o presente fundamento (ver n.os 91 e 92 infra) não tem fundamento, pois ela assenta em afirmações não verificáveis na ausência de novo cálculo por parte da Comissão. A questão pertinente, a esse propósito, é a de saber se o acréscimo de uma margem adicional de comercialização de cerca de 38% do preço cif, fronteira comunitária, da recorrente teria conduzido a uma margem de prejuízo inferior à margem de dumping da recorrente, o que é inteiramente possível. Além disso, contrariamente ao que sugere o Conselho (v. n.° 92 infra), quanto ao presente fundamento, a petição satisfaz os requisitos formais requeridos pelo artigo 44.° do Regulamento de Processo.

91      O Conselho deve recordar que, em conformidade com a «regra do direito inferior» (v. n.° 41 supra), o nível do direito definitivo foi fixado, no que diz respeito à recorrente, na base da sua margem de dumping (9,7%) que era inferior ao nível do direito requerido para a eliminação do prejuízo (16,5%. Portanto, o segundo fundamento só poderia influir na validade do regulamento impugnado se fosse demonstrado que o nível de eliminação do prejuízo tinha de ser inferior à margem de dumping da recorrente. Ora, mesmo tendo em conta a margem de lucro da Novi, as margens de subcotação e de prejuízo ascenderiam, respectivamente, a 28% e a 20% para a recorrente. Portanto, o referido fundamento é «inoperante e inadmissível».

92      O Conselho alega igualmente que, quanto ao segundo fundamento, a petição não satisfaz os requisitos formais previstos pelo artigo 44.° do Regulamento de Processo. Com efeito, a recorrente não expôs os factos em que assenta a sua argumentação, nem explicou em que medida as instituições agiram ilegalmente, mas limitou‑se a uma série de afirmações não demonstradas. Trata‑se, portanto, de um fundamento inadmissível.

93      De resto, o Conselho refuta a procedência do ponto de vista jurídico do presente fundamento.

 Apreciação do Tribunal Geral

94      Deve salientar‑se, de imediato, que a «regra do direito inferior» tem por consequência que um produtor ao qual foram impostos direitos antidumping não pode contestá‑los pelo facto de o inquérito concluir por uma margem de prejuízo sobreavaliada no caso de a taxa dos direitos ter sido fixada ao nível da margem de dumping, quando este é inferior tanto à margem de prejuízo falsamente considerada como à margem de prejuízo real (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 1988, Brother Industries/Conselho, C-250/85, Colect., p. 5683, n.° 24).

95      No caso em apreço, como resulta da carta da Comissão de 10 de Julho de 2006, e, nomeadamente, do seu anexo consagrado ao cálculo do prejuízo, a subcotação relativa ao modelo exportado pela recorrente para o mercado comunitário ascende a 32,3%, ao passo que a subcotação dos preços de referência ascende a 66%. A recorrente não contestou nem o método nem os números utilizados para efeitos desse cálculo.

96      Além disso, resulta dos desenvolvimentos que figuram no título III da carta da recorrente de 18 de Julho de 2006 que as empresas de comercialização, por intermédio das quais os produtores chineses encaminham a sua produção para o mercado europeu, realizam uma margem de lucro de 25 a 38%. Segundo a recorrente, essa margem deveria ter sido adicionada ao seu preço cif, fronteira comunitária, o que teria reduzido a diferença entre este último preço e os preços da indústria comunitária e, por isso, a margem de subcotação.

97      Ora, resulta dos cálculos que o Conselho efectuou no documento anexado à tréplica que, mesmo que se tivesse majorado o preço cif, fronteira comunitária, da recorrente de uma margem de lucro de 38% alegadamente realizada pela Novi, a margem de subcotação dos preços de referência teria sido estabelecida em 20,05% tendo em conta as quantidades importadas que não causam prejuízo importante, isto é, a um nível que excede o da margem de dumping da recorrente, na base da qual foi estabelecido o direito definitivo (9,7%, v. n.° 41 supra). A este propósito, há que acrescentar que, mesmo tendo em conta o cálculo alternativo apresentado no quadro das respostas da recorrente às questões escritas do Tribunal Geral, segundo o qual o ajustamento adicional de 38% opera‑se após o ajustamento de 17,30% efectuado a título dos direitos aduaneiros, de investigação e de desenvolvimento, etc., a margem de subcotação dos preços de referência assim estabelecida ascende a 15,32%, isto é, a nível superior ao nível de eliminação do prejuízo.

98      Daqui resulta que o segundo fundamento deve ser rejeitado por inoperância.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 20.° do regulamento de base, à violação dos direitos da defesa e à falta de fundamentação

 Argumentos das partes

99      A recorrente alega que as instituições não lhe comunicaram de forma adequada a nova análise factual respeitante ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária nem lhe proporcionaram a possibilidade de apresentar os seus comentários sobre essa nova apreciação relativa à configuração dos direitos definitivos (v. n.os 29 e 30 supra). Além disso, a Comissão não explicou suficientemente as razões que impunham a mudança da sua análise e a utilização de dados diferentes dos contidos na sua primeira proposta.

100    Quando, no documento de divulgação final de 7 de Julho de 2006, a Comissão considerava que a importação de um volume de 140 milhões de pares de sapatos por ano não tinha efeito prejudicial para a indústria comunitária, diminuiu significativamente esse número para 41,5 milhões de pares no seu documento de divulgação final adicional de 28 de Julho de 2006, sem explicar as razões que justificam essa mudança que teve «o efeito perverso» de inverter, por intermédio de uma manipulação operada na com base nos anos de referência, o valor dos direitos impostos entre a China e o Vietname. Quanto ao seu rácio económico, os contingentes instituídos por um sistema de direitos diferidos são destinados a fazer face às pressões resultantes do volume das importações que, todavia, não são consideradas ser procedentes de práticas desleais, ao passo que as medidas antidumping são concebidas para responder às práticas desleais de dumping. Atendendo a essas diferenças, o prazo de cinco dias concedido pela Comissão à recorrente para apresentar as suas observações sobre a nova proposta é insuficiente, facto de que a recorrente se queixou durante o procedimento administrativo.

101    O regulamento impugnado, em cujo considerando 301 cuja a última proposta da Comissão foi seguida, não comporta fundamentação suficiente face a esta divergência e não indica as razões que justificam a aplicação do novo método. Em contrapartida, o considerando 301 do regulamento impugnado limita‑se a reproduzir os termos do ponto 280 do documento de divulgação final adicional, que não contém mais informações. Além disso, o documento de divulgação final adicional não contém qualquer número ou cálculo que sirva de base ao método descrito no considerando 301 do regulamento impugnado e não permite explicar o recurso a anos, valores e volumes diferentes dos que tinham sido utilizados na primeira proposta. As instituições violaram, por outro lado, o artigo 20.° do regulamento de base, que exige a comunicação dos pormenores que suportam os factos e as considerações essenciais com base nos quais a Comissão entendeu propor a adopção das medidas definitivas. Com efeito, a apreciação factual que suporta a nova abordagem da Comissão não foi explicada nem justificada.

102    De resto, a Comissão violou os direitos de defesa da recorrente na medida em que não lhe permitiu fazer valer utilmente a sua posição sobre um número de questões importantes, tais como o carácter razoável da nova proposta, a exactidão e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados, os cálculos efectuados e os elementos apresentados pela Comissão em apoio das suas conclusões sobre o dumping e o prejuízo sofrido pela indústria comunitária. Com efeito, os dois sistemas são caracterizados por diferenças fundamentais na análise factual em que se baseiam. Essas diferenças deram lugar a consequências radicalmente opostas para os produtores chineses e vietnamitas sem que, mesmo assim, a Comissão tenha explicado como chegara a esse resultado ou tenha dado ocasião aos interessados de exercer os seus direitos de defesa.

103    A tentativa do Conselho de minimizar as diferenças entre as propostas expondo que o sistema adoptado tem em conta o facto de que só importações acima de certos limiares de volume causam prejuízo implica a imposição de direitos antidumping sobre importações que não causam prejuízo, o que é contrário ao artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base. O facto de a recorrente ter podido formular algumas observações em relação a esse sistema, num prazo inferior ao prazo mínimo de dez dias previsto pelo artigo 20.°, n.° 5, do regulamento de base, não pode, por outro lado, ser considerado contra ela, nem pode remediar a insuficiência das informações fornecidas pela Comissão. Com efeito, a questão de saber se o prazo concedido pela Comissão era adequado para efeitos do respeito dos direitos de defesa da recorrente deve ser apreciada à luz da extensão da mudança no método adoptado pela Comissão bem como da inexistência de dados ou de explicações sobre a nova apreciação jurídica e factual. A esse propósito, a recorrente observa que, quando as instituições não proporcionam explicações adequadas sobre o método e a apreciação dos factos que efectuam, o facto de poder ter formulado alguns comentários é de valor limitado e não implica que tenham sido satisfeitas as exigências do artigo 20.° do regulamento de base, dos princípios gerais do direito comunitário e do direito da OMC. Além disso, a própria Comissão adoptou um calendário muito restritivo, facto que excluiu qualquer dilação do prazo concedido para formular comentários sobre o documento de divulgação final adicional. Além disso, as discussões que duraram vários meses incidiram sobre o sistema de direitos diferidos e não sobre o sistema finalmente adoptado.

104    A recorrente considera que, em razão das falhas do documento de divulgação final adicional e do prazo insuficiente concedido, não teve a possibilidade de expor à Comissão as razões pelas quais a abordagem adoptada era inadequada ou desrazoável nem de apresentar o seu ponto de vista sobre o método ou os dados quantitativos que suportam a proposta contida nesse documento.

105    Finalmente, a recorrente acrescenta que, se tivesse sido colocada de forma adequada em condições de formular comentários sobre o documento de divulgação final adicional, teria avançado, em primeiro lugar, que o sistema proposto equivalia a uma violação do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base, na medida em que redunda na imposição de direitos antidumping a importações que não causam prejuízo, em segundo lugar, que a margem de prejuízo individual deveria ter sido calculada em relação a ela e, em terceiro lugar, que a última proposta da Comissão era desrazoável e desproporcionada, na medida em que a apreciação factual revista, que não foi explicada nem justificada, teve o «efeito perverso» de inverter o encargo respectivo das medidas antidumping entre a China e o Vietname.

106    O Conselho, apoiado pela Comissão e pela CEC, contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

107    Através do seu terceiro fundamento, em primeiro lugar, a recorrente alega que as instituições violaram o artigo 20.° do regulamento de base pelo facto de a Comissão, por um lado, não ter comunicado os elementos em que baseou os cálculos efectuados no documento de divulgação final adicional e, por outro, não lhe concedeu um prazo suficiente e conforme ao disposto no n.° 5 do mesmo artigo para apresentar observações completas sobre a nova abordagem.

108    Em segundo lugar, a recorrente alega que as instituições não expuseram nem nos documentos de divulgação final ou de divulgação final adicional, nem no regulamento impugnado os motivos que justificavam o método aplicado para tomar em conta a existência de um volume de importações que não causa prejuízo e que consiste em diminuir a margem de prejuízo em vez de isentar as importações não prejudiciais da imposição de direitos antidumping. Estas circunstâncias constituem uma violação dos direitos de defesa da recorrente bem como falta de fundamentação.

109    A título preliminar, há que salientar que o artigo 20.° do regulamento de base prevê regras relativas ao exercício do direito das partes em causa, nomeadamente dos exportadores, a serem ouvidos, o qual constitui um dos direitos fundamentais reconhecidos pela ordem jurídica comunitária e comporta o direito de ser informado dos principais factos e considerações com base nos quais é encarada a hipótese de recomendar a instituição de direitos antidumping definitivos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de Junho de 1991, Al‑Jubail Fertilizer/Conselho, C‑49/88, Colect., p. I‑3187, n.° 15, e acórdão do Tribunal Geral de 19 de Novembro de 1998, Champion Stationery e o./Conselho, T‑147/97, Colect., p. II‑4137, n.° 55).

110    Nestas condições, há que interpretar os argumentos das recorrentes relativos à violação do artigo 20.° do regulamento de base como referindo‑se a uma violação dos seus direitos de defesa, como são consagrados pela ordem jurídica comunitária, inclusive por essa disposição (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 21 de Novembro de 2002, Kundan e Tata/Conselho, T‑88/98, Colect., p. II‑4897, n.° 131).

111    A este propósito, há que recordar que as empresas envolvidas num inquérito que preceda a adopção de um regulamento antidumping devem ser colocadas em condições de, no decurso do procedimento administrativo, dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados e sobre os elementos de prova invocados pela Comissão em apoio da sua apreciação sobre a existência de uma prática de dumping e do prejuízo que daí resulta (acórdãos do Tribunal de Justiça Al‑Jubail Fertilizer/Conselho, n.° 109 supra, n.° 17, e de 3 de Outubro de 2000, Industrie des poudres sphériques/Conselho, C‑458/98 P, Colect., p. I‑8147, n.° 99; acórdãos do Tribunal Geral Champion Stationery e o./Conselho, T‑147/97, n.° 109 supra, n.° 55, e Kundan e Tata/Conselho, n.° 110 supra, n.° 132).

112    Deve igualmente salientar‑se, neste contexto, que o carácter incompleto da divulgação final só leva à ilegalidade de um regulamento que institui direitos antidumping definitivos se, devido a essa omissão, as partes interessadas não tiverem sido colocadas em condições de defenderem utilmente os seus interesses Tal será nomeadamente o caso quando a omissão incide sobre factos ou considerações diferentes dos utilizados para as medidas provisórias, aos quais deve ser concedida uma atenção especial na divulgação final, segundo o artigo 20.°, n.° 2, do regulamento de base. Tal é igualmente o caso, por identidade de razões, quando a omissão incidir sobre factos ou considerações diferentes daqueles em que se baseia uma decisão tomada pela Comissão ou pelo Conselho posteriormente à comunicação do documento de divulgação final, como decorre do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base.

113    No caso em apreço, como foi salientado nos n.os 23 a 25 supra, a Comissão preconizou, em primeiro lugar, no documento de divulgação final, um sistema de direitos diferidos, baseado no facto de só as importações de mais de 140 milhões de pares de sapatos por ano causarem um prejuízo na acepção do artigo 3.° do regulamento de base. Esta apreciação apoiava‑se na existência do regime de contingentes quantitativos até 1 de Janeiro de 2005, que teria impedido esse prejuízo, bem como num cálculo das quantidades que foram importadas da China em 2005. Segundo essa proposta, devia ser aplicado um direito antidumping definitivo às importações originárias da China para além de 140 milhões de pares de sapatos por ano. Esse direito era igual à margem de subcotação dos preços de referência, no caso 23%.

114    Todavia, como foi exposto nos n.os 28 e 29 supra, a Comissão alterou, no quadro do documento de divulgação final adicional, a sua proposta relativa à forma dos direitos necessária para a eliminação do prejuízo. Essa nova abordagem assentava igualmente na existência de um volume de importações que não causa prejuízo na acepção do artigo 3.° do regulamento de base. No entanto, segundo o documento de divulgação final adicional, tanto o método de cálculo desse volume de importações não prejudicial como o impacto desse volume na forma dos direitos definitivos propostos diferiam dos evocados no documento de divulgação final.

115    Em particular, no documento de divulgação final adicional, em primeiro lugar, a Comissão recordou que a margem de subcotação dos preços de referência para as importações provenientes da China ascendia a 23%. Em segundo lugar, estabeleceu que o volume das importações provenientes desse país durante o período de inquérito ascendia a 38% das importações provenientes dos dois países em causa. Essa percentagem, aplicada à totalidade das importações provenientes da China e do Vietname em 2003 (109 milhões de pares de sapatos), correspondia a cerca de 41,5 milhões de pares de sapatos, volume que foi considerado não causar prejuízo à indústria comunitária. Em terceiro lugar, a Comissão considerou que esse volume representava 28,26% das importações provenientes da China em 2005. Finalmente, em quarto lugar, reduziu a margem de prejuízo inicialmente estabelecida (23%) de 28,26% o que deu lugar a uma margem de prejuízo «ponderada» de 16,5%.

116    Resulta do que precede que as diferenças entre o método apresentado no documento de divulgação final e o apresentado no documento de divulgação final adicional são as seguintes. Em primeiro lugar, em vez de estabelecer o volume anual de importações não prejudicial ao nível das importações provenientes da China em 2005, a Comissão estabeleceu esse volume anual multiplicando os 109 milhões de pares de sapatos importados em 2003 por 38%. Trata‑se da percentagem que representavam as importações originárias desse país em relação ao conjunto das importações provenientes dos dois países em causa durante o período de inquérito. Em segundo lugar, em vez de isentar esse volume anual, qualificado de não prejudicial nos pontos 278 a 280 do documento de divulgação final adicional, da aplicação de um direito antidumping, a Comissão optou por ter em conta esse volume diminuindo o nível de eliminação do prejuízo e aplicando os direitos antidumping a partir do primeiro par importado.

117    A este propósito, deve reconhecer‑se que o facto de a Comissão ter alterado a sua análise na sequência dos comentários que as partes interessadas formularam sobre o documento de divulgação final não constitui, por si só, uma violação dos direitos de defesa. Com efeito, como resulta do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base, o documento de divulgação final não constitui um obstáculo a qualquer decisão que possa vir a ser tomada pela Comissão ou pelo Conselho. Essa disposição limita‑se a impor à Comissão o dever de comunicar, desde que possível, os factos e as considerações diferentes dos que apoiam a sua abordagem inicial contida no documento de divulgação final. É, com efeito, por intermédio dessa exposição que os interessados ficam em condições de compreender os motivos que levaram as instituições a adoptar uma posição diferente.

118    Por conseguinte, para determinar se a Comissão respeitou os direitos da recorrente que decorrem do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base, há ainda que verificar se a Comissão lhe comunicou os factos e as considerações feitas para efeitos da nova análise sobre o prejuízo e sobre a forma das medidas requeridas para o eliminar, na medida em que estes diferiam das feitas no documento de divulgação final (v. n.° 112 supra).

119    A esse propósito, antes de mais, a Comissão expôs no documento de divulgação final adicional que a sua nova abordagem permitia não fazer distinções entre as diferentes categorias de importadores.

120    Em seguida, quanto aos elementos na base dos quais a Comissão procedeu ao ajustamento da margem de prejuízo de 23 para 16,5%, é sem razão que a recorrente alega que não teve a eles acesso. Com efeito, o método descrito no n.° 115 supra respeitante ao ajustamento da margem de prejuízo tendo em conta um volume de importações não prejudicial figura no documento de divulgação final adicional. É verdade que esse documento não dá informação sobre o volume exacto das importações provenientes da China em 2005, que permitiria verificar que a percentagem de 28,26% corresponde à realidade. Todavia, dado que, segundo a Comissão, os 41,5 milhões de pares de sapatos representam 28,26% da totalidade das importações provenientes da China em 2005, pode daí deduzir‑se que essas importações ascenderam a 146,85 milhões de pares de sapatos. Esse cálculo foi retomado, aliás, pela própria recorrente no seu correio electrónico de 2 de Agosto de 2006 (v. n.° 31 supra).

121    Resulta das considerações que precedem que a Comissão comunicou às recorrentes o raciocínio que seguiu para calcular a margem de prejuízo tendo em conta um volume de importações não prejudicial. A Comissão expôs também a totalidade dos elementos quantificados que considerou pertinentes para esse efeito, de modo que os direitos de defesa da recorrente não foram violados nesse aspecto.

122    Há também que sublinhar que o fundamento da recorrente, tal como foi desenvolvido na petição, é relativo à da violação dos seus direitos de defesa e não do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base. Daqui resulta que a questão de saber se o sistema adoptado no regulamento impugnado é compatível com o artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base, na medida em que impõe direitos antidumping a importações inferiores ao limiar anual que foi considerado como não causando prejuízo, não foi submetida como tal à fiscalização do Tribunal.

123    Quanto ao prazo concedido, as partes estão de acordo quanto ao facto de que expirava em 2 de Agosto de 2006.

124    Concedendo à recorrente um prazo inferior a dez dias para comentar o documento de divulgação final adicional, a Comissão infringiu o artigo 20.°, n.° 5, do regulamento de base (v., neste sentido, acórdão Champion Stationery e o./Conselho, n.° 109 supra, n.° 80). Todavia, essa circunstância não pode, em si mesma, conduzir à anulação do regulamento impugnado. Com efeito, é necessário ainda demonstrar que o facto de dispor de um prazo inferior ao prazo legal foi de molde a afectar concretamente os seus direitos de defesa no quadro do processo em causa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 28 de Outubro de 2004, Shanghai Teraoka Electronic/Conselho, T‑35/01, Colect., p. II‑3663, n.° 331).

125    A este propósito, deve salientar‑se que a recorrente recordou, no quadro do seu correio electrónico de 2 de Agosto de 2006, os cálculos da Comissão e que apresentou um cálculo alternativo que chegou a um resultado diferente e, em sua opinião, equitativo. Portanto, a recorrente compreendeu o raciocínio da Comissão e esteve também em condições de lhe propor uma outra abordagem, sem pedir uma dilação do prazo concedido. Nestas condições, deve reconhecer‑se que esteve em condições de fazer valer utilmente o seu ponto de vista.

126    Daqui resulta que os direitos de defesa da recorrente não foram violados.

127    Por identidade de razões, há que rejeitar a argumentação da recorrente deduzida da falta de fundamentação no que respeita ao método aplicado para o cálculo do nível de eliminação do prejuízo. Com efeito, a fundamentação do regulamento impugnado deve ser apreciada tendo em conta, nomeadamente, as informações que foram comunicadas à recorrente e as observações que apresentou durante o procedimento administrativo (acórdão do Tribunal Geral de 15 de Dezembro de 1999, Petrotub e Republica/Conselho, T‑33/98 e T‑34/98, Colect., p. II‑3837, n.° 107).

128    No caso dos autos, tal como foi salientado no n.° 40 supra, os considerandos 296 a 301 do regulamento impugnado contêm as apreciações que levaram o Conselho à adopção do sistema finalmente aplicado. Por conseguinte, atento o facto de a Comissão ter comunicado à recorrente o raciocínio que seguiu para calcular a margem de prejuízo tendo em conta um volume de importações não prejudicial e de lhe ter exposto igualmente a totalidade dos elementos quantificados que considerou serem pertinentes para esse efeito (v. n.os 119 a 121 supra), há que concluir que o regulamento impugnado está suficientemente fundamentado do ponto de vista do direito.

129    Portanto, o terceiro fundamento deve ser rejeitado.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação no que respeita ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária

 Argumentos das partes

130    A recorrente considera que a decisão relativa ao prejuízo não é baseada num período suficientemente longo de importações normais e, por isso, não assenta em dados fiáveis e objectivos. Com efeito, dado que o período de inquérito se estende de 1 de Abril de 2004 a 31 de Março de 2005, a Comissão concluiu que o aumento das importações após a extinção do regime de contingentes teve um efeito prejudicial particularmente sensível para a indústria comunitária tomando em conta apenas um período de três meses, a saber, o primeiro trimestre de 2005. Os indícios manifestos da existência de um prejuízo importante em 2004 aos quais faz referência a Comissão no ponto 277 que figura do novo título H no documento de divulgação final adicional não significam que um prejuízo importante tenha efectivamente sido causado em 2004. A inexistência de prejuízo importante em 2004 é corroborada pelo facto de o aumento das importações desse ano ter sido fraco em comparação com 2003 e confirmada pelo ponto 285 do documento de divulgação final. Contrariamente ao que alega o Conselho, os contingentes quantitativos não têm por objecto uma protecção contra as importações que são objecto de dumping. Além disso, a análise dos factores de prejuízo em relação a 2003 não é pertinente, dado que, como o admitiu a Comissão, nessa altura, não existia dumping prejudicial.

131    Ora, os três primeiros meses de 2005 constituem o período inicial de abertura de um mercado submetido durante mais de doze anos à aplicação de um regime de contingentes quantitativos rigoroso. Como a Comissão salientou no documento de divulgação final, esse período a seguir à extinção do regime de contingentes foi artificialmente falseado por expectativas ligadas a esse evento. Segundo a recorrente, o regulamento impugnado é, portanto, baseado em dados relativos a um curto período que não podia fornecer elementos fiáveis devido à derrogação dos contingentes. Daqui resulta que o Conselho violou o artigo 3.°, n.° 2, do regulamento de base.

132    O Conselho, apoiado pela Comissão e pela CEC, contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

133    Em primeiro lugar, há que salientar que a instituição de direitos antidumping não constitui uma sanção de um comportamento anterior, mas uma medida de defesa e protecção contra a concorrência desleal resultante das práticas de dumping. Assim, é necessário levar a cabo o inquérito com base em informações tão actuais quanto possível a fim de poder fixar direitos antidumping que sejam adequados à protecção da indústria comunitária contra as práticas de dumping (acórdão Industrie des poudres sphériques/Conselho, n.° 111 supra, n.os 91 e 92, e acórdão do Tribunal Geral de 14 de Novembro de 2006, Nanjing Metalink/Conselho, T‑138/02, Colect., p. II‑4347, n.° 60).

134    Assim, quando as instituições reconhecem que as importações de um produto sujeito até então a restrições quantitativas aumentam após a extinção das referidas restrições, podem ter em conta esse aumento para efeitos da sua apreciação do prejuízo sofrido pela indústria comunitária.

135    Em segundo lugar, como o Conselho observa, a apreciação da Comissão que figura no n.° 283 do documento de divulgação final, segundo a qual o volume dos produtos importados aumentou após a extinção do regime de contingentes, não demonstra que as instituições se tenham fundado unicamente nesse elemento quantitativo para concluir pela existência de um prejuízo.

136    Finalmente, como resulta dos considerandos 162, 168 a 170, 187 a 206 e 216 a 240 do regulamento impugnado, as instituições tomaram em conta vários factores, respeitantes ao prejuízo e ao nexo de causalidade, relativos não só ao último trimestre do período de inquérito, mas também ao período considerado.

137    Daqui resulta que o quarto fundamento deve ser afastado.

138    Nestas condições, há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

139    Por força do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos do Conselho.

140    Em conformidade com o disposto no artigo 87.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, a Comissão e a CEC suportarão a suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Foshan City Nanhai Golden Step Industrial Co., Ltd suportará as suas próprias despesas bem como as efectuadas pelo Conselho da União Europeia.

3)      A Comissão Europeia e a Confédération européenne de l’industrie de la chaussure (CEC) suportarão as suas próprias despesas.

Martins Ribeiro

Papasavvas

Dittrich

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 4 de Março de 2010.

Assinaturas

Índice


Quadro jurídico

Antecedentes do litígio e regulamento impugnado

Tramitação processual e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base bem como à violação dos direitos de defesa quanto ao cálculo da margem de dumping

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

– Quanto à alegada violação do artigo 2.°, n.° 6, alínea c), do regulamento de base

Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 3.° do regulamento de base

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 20.° do regulamento de base, à violação dos direitos da defesa e à falta de fundamentação

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao quarto fundamento, relativo a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação no que respeita ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto às despesas


* Língua do processo: inglês.

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