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Document 62005CJ0344

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 9 de Novembro de 2006.
Comissão das Comunidades Europeias contra Joël De Bry.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Funcionário - Classificação de serviço - Relatório de evolução na carreira - Exercício de 2001/2002 - Direitos de defesa - Artigo 26.º, segundo parágrafo, do Estatuto.
Processo C-344/05 P.

Colectânea de Jurisprudência 2006 I-10915;FP-I-B-2-00019
Colectânea de Jurisprudência – Função Pública 2006 II-B-2-00127

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2006:710

Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória

Partes

No processo C‑344/05 P,

que tem por objecto um recurso nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrado em 21 de Setembro de 2005,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por L. Lozano Palacios e H. Kraemer, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Joël De Bry, funcionário da Comissão das Comunidades Europeias, residente em Woluwe‑St‑Lambert (Bélgica), representado por S. Orlandi, avocat, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente na primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, R. Schintgen, J. Klučka, R. Silva de Lapuerta e L. Bay Larsen (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Poiares Maduro,

secretário: R. Grass,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 13 de Julho de 2006,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão

1. Com o seu recurso, a Comissão das Comunidades Europeias pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 12 de Julho de 2005, De Bry/Comissão (T‑157/04, ainda não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão impugnado»), através do qual este anulou a decisão da Comissão de 26 de Maio de 2003 (a seguir «decisão controvertida») que tornou definitivo o relatório de evolução na carreira (a seguir «REC») de J. De Bry, funcionário, relativo ao período compreendido entre 1 de Julho de 2001 e 31 de Dezembro de 2002.

Quadro jurídico

2. O artigo 26.°, primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias, na redacção aplicável aos factos do presente litígio (a seguir «Estatuto»), dispõe:

«O processo individual do funcionário deve conter:

a) todos os documentos relativos à sua situação administrativa e todos os relatórios referentes à sua competência, rendimento e comportamento;

b) as observações feitas pelo funcionário relativamente aos referidos documentos.

Todos os elementos devem ser registados, numerados e classificados sequencialmente, não podendo a instituição opor a um funcionário nem alegar contra ele documentos a que alude a alínea a), se dos mesmos não lhe tiver sido dado conhecimento antes de serem classificados.»

3. O artigo 43.° do Estatuto enuncia:

«A competência, o rendimento e a conduta no serviço de cada funcionário, com excepção dos que usufruam dos graus A1 e A2, são objecto de um relatório periódico, elaborado pelo menos de dois em dois anos, segundo as regras estabelecidas por cada instituição, de acordo com o disposto no artigo 110.°

O relatório é dado a conhecer ao funcionário. Este pode apor‑lhe todas as observações que julgar úteis.»

4. O artigo 110.°, primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto prevê que as disposições gerais de execução do mesmo são adoptadas por cada instituição, após consulta do seu Comité de Pessoal e parecer do Comité do Estatuto e depois são levadas ao conhecimento do pessoal.

5. Em 26 de Abril de 2002, a Comissão adoptou uma decisão relativa às disposições gerais de execução do artigo 43.° do Estatuto (a seguir «decisão DGE 43»), através da qual introduziu um novo sistema de classificação.

6. O artigo 1.° da decisão DGE 43 prevê a elaboração de um REC todos os anos.

7. Os artigos 7.° e 8.° regulam o procedimento de avaliação. Após uma auto‑avaliação redigida pelo funcionário avaliado e de uma entrevista entre este e o avaliador, o seu chefe de unidade, o REC é elaborado pelo avaliador e pelo homologador, superior hierárquico daquele, que o transmitem ao interessado. O funcionário avaliado tem então o direito de pedir uma entrevista com o homologador, o qual tem a faculdade de alterar ou de confirmar o REC. Este é transmitido novamente ao interessado. De seguida, o funcionário avaliado pode pedir ao homologador que submeta o seu caso à comissão paritária de avaliação (a seguir «CPA»). A CPA assegura que o REC foi elaborado equitativamente, objectivamente e em conformidade com as normas de avaliação habituais. Verifica igualmente se os procedimentos foram devidamente respeitados, designadamente em matéria de diálogos e de prazos. Emite um parecer fundamentado. Este parecer, que é notificado ao funcionário avaliado, ao avaliador e ao homologador, é transmitido ao avaliador de recurso, superior hierárquico do homologador, que confirma ou altera o REC, antes de o transmitir ao interessado. Caso o avaliador de recurso se afaste das recomendações constantes do parecer da CPA, é obrigado a fundamentar a sua decisão.

8. Durante o mês de Julho de 2002, a Comissão publicou um documento intitulado «Sistema de avaliação do pessoal centrado na evolução da carreira – Guia» (a seguir «guia da avaliação»). Nos termos deste guia, o REC contém uma avaliação das competências, do rendimento e da conduta no serviço de cada funcionário. As três rubricas de avaliação assim estabelecidas são constituídas por escalões distintos que correspondem, no máximo, a seis, dez e quatro pontos, respectivamente.

Factos na origem do litígio

9. Foi elaborado um REC sobre J. De Bry, funcionário do grau A5, afectado ao Secretariado‑Geral da Comissão, no dia 18 de Fevereiro de 2003, para o período compreendido entre 1 de Julho de 2001 e 31 de Dezembro de 2002.

10. Nos termos da decisão DGE 43, aquele pediu a revisão da sua avaliação. Em 19 de Março de 2003, o homologador introduziu algumas alterações aos comentários descritivos, tendo mantido as classificações atribuídas.

11. Na rubrica «Conduta no serviço», acrescentou o seguinte comentário:

«O Sr. J. De Bry está sempre disponível [para] terminar o seu trabalho com recurso a horas extraordinárias durante a semana, e até mesmo em fim‑de‑semana. Contudo, apesar desta disponibilidade fora do horário normal de trabalho, verifica‑se frequentemente que não respeita esse horário normal.»

12. Em 26 de Março de 2003, J. De Bry submeteu o seu caso à CPA. Pela decisão controvertida, adoptada pelo avaliador de recurso, foi indeferido o seu recurso.

13. Em 26 de Agosto de 2003, J. De Bry reclamou, ao abrigo do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto. A reclamação foi indeferida pela Entidade Competente para Proceder a Nomeações (a seguir «ECPN»), em 6 de Janeiro de 2004.

Recurso para o Tribunal de Primeira Instância e acórdão impugnado

14. Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 22 de Abril de 2004, J. De Bry interpôs recurso de anulação da decisão controvertida.

15. Baseou‑se, no essencial, em quatro fundamentos, relativos respectivamente:

– a uma violação do artigo 14.° do Estatuto, nos termos do qual qualquer funcionário que, no exercício das suas funções, deva pronunciar‑se sobre uma questão em cujo tratamento ou em cuja solução tenha um interesse pessoal de natureza a comprometer a sua independência deve dar conhecimento do facto à AIPN;

– a uma violação do dever de fundamentação;

– a uma incoerência entre certos comentários descritivos e a classificação quantificada correspondente;

– a uma violação dos direitos de defesa.

16. No âmbito do quarto fundamento, alegou que a crítica quanto ao desrespeito do horário de trabalho só podia ser feita no REC se o funcionário tivesse tido a possibilidade de apresentar previamente as suas observações sobre essa crítica, o que não se passou no presente caso. A alegada falta de pontualidade devia ter dado lugar, quando ocorreu, a chamadas de atenção que lhe permitissem expor o seu ponto de vista.

17. O Tribunal de Primeira Instância convidou a Comissão a pronunciar‑se sobre a eventual pertinência, para o procedimento de avaliação em litígio, do artigo 26.° do Estatuto e da jurisprudência segundo a qual o objectivo desta disposição consiste em assegurar o respeito dos direitos de defesa do funcionário.

18. A Comissão respondeu que o artigo 26.° do Estatuto pressupõe a existência de «documentos» e não impõe a sua criação, em particular sob a forma de advertências escritas dirigidas ao funcionário.

19. No n.° 94 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância acolheu o quarto fundamento ao decidir, no que diz respeito à crítica relativa ao horário de trabalho, que a Comissão tinha violado os direitos de defesa garantidos pelo artigo 26.° do Estatuto.

20. Na sequência deste facto, julgou o terceiro fundamento procedente nos n. os  95 e 96 do mesmo acórdão, na medida em que, tendo a declaração da falta de pontualidade sido julgada ilegal, se devia considerar não escrita no REC a crítica correspondente, de modo que a coerência entre a classificação «suficiente» e os comentários que constavam da rubrica «Conduta no serviço» estava significativamente afectada.

21. O Tribunal de Primeira Instância julgou os restantes fundamentos suscitados pelo recorrente improcedentes.

22. Por último, anulou a decisão controvertida e condenou a Comissão nas despesas.

23. No n.° 83 do acórdão impugnado, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que o respeito dos direitos de defesa do funcionário avaliado implica que os elementos factuais como os que estão em causa no presente caso, para lhe serem oponíveis, deviam ter sido consignados em «documentos», na acepção do artigo 26.°, primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto, deviam ter sido previamente integrados no seu processo individual ou, pelo menos, deviam ter‑lhe sido previamente comunicados.

24. No n.° 86 do mesmo acórdão, o Tribunal de Primeira Instância considerou que o funcionário, sob pena de serem violados os seus direitos de defesa garantidos pelo artigo 26.° do Estatuto, devia ter sido confrontado, através de advertência escrita, com a declaração da sua falta de pontualidade em tempo útil, ou seja, num prazo razoável a contar do dia do facto censurado, o que lhe teria permitido, designadamente, defender utilmente os seus interesses, seja contestando essa crítica, seja tendo‑a em consideração para melhorar a sua conduta no serviço, nem que fosse apenas para obter uma melhor classificação.

25. Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância declarou no n.° 91 do acórdão impugnado que o n.° 3.1 do guia da avaliação, que a Comissão impôs a si própria como regra de conduta, convida os avaliadores, durante todo o período de avaliação, a coligirem exemplos de trabalhos, a conservarem cópias deles ou a redigirem notas. No mesmo passo do acórdão impugnado, observou que, nos termos do n.° 3.2 do guia da avaliação, as informações devem referir‑se a elementos precisos do comportamento e ocorrer tão rapidamente quanto possível após um trabalho.

Pedidos das partes perante o Tribunal de Justiça

26. A Comissão conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

– anular o acórdão impugnado;

– decidir o litígio, julgar os pedidos por ela apresentados em primeira instância procedentes e, consequentemente, negar provimento ao recurso;

– a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância;

– condenar J. De Bry nas despesas da instância, incluindo as suas próprias despesas no processo perante o Tribunal de Primeira Instância.

27. J. De Bry conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

– negar provimento ao presente recurso por ser manifestamente improcedente;

– condenar a Comissão nas despesas.

Quanto ao recurso

28. A recorrente suscita um único fundamento de anulação, dividido em duas partes, relativo a um erro de direito cometido pelo Tribunal de Primeira Instância na aplicação, por um lado, do princípio do respeito dos direitos de defesa e, por outro, do artigo 26.°, segundo parágrafo, do Estatuto.

Argumentos das partes

29. No âmbito da primeira parte deste fundamento, a Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância ignorou o alcance do princípio geral do respeito dos direitos de defesa.

30. Estes direitos exercem‑se unicamente no interior do próprio processo que é susceptível de conduzir à adopção de um acto lesivo.

31. Não implicam para o autor de tal acto o dever de enviar à pessoa em causa uma advertência antes do início de tal processo.

32. No âmbito da segunda parte do seu fundamento, a Comissão afirma que a obrigação, consagrada pelo Tribunal de Primeira Instância, de consignar, por escrito, um elemento de facto susceptível de ser censurado a um funcionário não resulta do artigo 26.°, segundo parágrafo, do Estatuto.

33. Esta última disposição pressupõe a existência de «documentos», na acepção do primeiro parágrafo, alínea a), do mesmo artigo. Não impõe a obrigação de criar esses documentos.

34. J. De Bry alega que o artigo 26.° do Estatuto visa assegurar o respeito dos direitos de defesa do funcionário. Este artigo tem por objectivo evitar que decisões da ECPN que afectam a situação administrativa e a carreira do funcionário se baseiem em elementos de facto relativos ao seu comportamento que não foram integrados no seu processo individual nem comunicados ao interessado.

35. Consequentemente, a seu ver, o Tribunal de Primeira Instância teve razão ao anular a decisão controvertida, em conformidade com a jurisprudência assente.

36. J. De Bry acrescenta que o Tribunal de Primeira Instância devia efectivamente verificar se a Comissão aplicou, quando da elaboração do REC, as novas directivas internas resultantes, em particular, do n.° 3.1 do guia da avaliação, cujo respeito lhe incumbia.

Apreciação do Tribunal de Justiça

37. Nos termos de jurisprudência assente, o respeito dos direitos de defesa em qualquer processo dirigido contra uma pessoa e susceptível de levar à adopção de um acto que lese os interesses desta constitui um princípio fundamental do direito comunitário e deve ser garantido mesmo na falta de regulamentação especial (v., designadamente, acórdãos de 10 de Julho de 1986, Bélgica/Comissão, 234/84, Colect., p. 2263, n.° 27, e de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑288/96, Colect., p. I‑8237, n.° 99).

38. Este princípio exige que seja dada à pessoa em causa a possibilidade de expor utilmente o seu ponto de vista relativamente aos elementos que lhe possam ser imputados no acto a praticar (v., neste sentido, acórdãos Bélgica/Comissão, já referido, n.° 27, in fine , e de 3 de Outubro de 2000, Industrie des poudres sphériques/Conselho, C‑458/98 P, Colect., p. I‑8147, n.° 99).

39. No entanto, como garantia processual, o princípio fundamental do respeito dos direitos de defesa não pode ser interpretado, no domínio da avaliação do pessoal das Comunidades Europeias, no sentido de que impõe, antes do procedimento que culmina nessa avaliação, um dever de advertência prévia.

40. Esta conclusão não é afectada pelo artigo 26.°, primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto, na medida em que este artigo sujeita a oponibilidade a um funcionário de qualquer relatório relativo à sua competência, ao seu rendimento ou ao seu comportamento à respectiva comunicação ao interessado antes do arquivo do mesmo no seu processo individual.

41. Com efeito, as disposições correspondentes, cujo objectivo é assegurar o direito de defesa do funcionário (v., designadamente, acórdãos de 28 de Junho de 1972, Brasseur/Parlamento, 88/71, Recueil, p. 499, n.° 11, Colect., p. 173, e de 12 de Fevereiro de 1987, Bonino/Comissão, 233/85, Colect., p. 739, n.° 11), dizem respeito aos documentos já existentes. Impedem que, durante o processo de avaliação, esses documentos sejam tidos em conta contra o funcionário avaliado sem que lhe tenham sido comunicados antes do respectivo arquivo no seu processo individual. Não impõe a elaboração prévia de documentos que dêem forma a toda e a qualquer alegação de factos censurados ao interessado.

42. Da mesma forma que o próprio princípio fundamental, o artigo 26.° do Estatuto não impõe assim uma obrigação de advertência prévia.

43. O princípio fundamental do respeito dos direitos de defesa deve permitir ao interessado, durante o procedimento de avaliação, defender‑se da alegação de factos susceptíveis de lhe serem imputados. Este objectivo é materializado, em particular, pelo artigo 26.°, primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto, bem como pela decisão DGE 43, cujas disposições asseguram o respeito do contraditório durante todo o procedimento, tal como resulta do n.° 7 do presente acórdão.

44. O papel do princípio fundamental do respeito dos direitos de defesa não é também o de permitir ao funcionário adaptar para o futuro o seu comportamento a fim de evitar que os factos apurados sejam efectivamente tidos em conta contra ele. Como o advogado‑geral salientou nos n. os  53 e 54 das conclusões, o melhoramento da conduta no serviço constitui um objectivo que excede o âmbito de aplicação do respeito dos direitos de defesa, sendo esse objectivo, na realidade, prosseguido com o próprio relatório de classificação.

45. Consequentemente, ao declarar, nos n. os  83 e 86 do acórdão impugnado, a existência de uma violação dos direitos de defesa garantidos pelo artigo 26.° do Estatuto, devido à falta de uma advertência escrita prévia, o Tribunal de Primeira Instância fez uma aplicação errada simultaneamente do princípio fundamental do respeito dos direitos de defesa e do referido artigo 26.° do Estatuto.

46. Esta conclusão não é posta em causa pela fundamentação contida no n.° 91 do acórdão impugnado, relativa ao guia da avaliação, que a Comissão impôs a si própria, segundo o Tribunal de Primeira Instância, enquanto regra de conduta.

47. Com efeito, embora o capítulo 3 do guia da avaliação preconize uma «transmissão de informações construtiva […] feita regularmente e em tempo devido», relativamente «a elementos precisos do comportamento», «tão rápido quanto possível após um trabalho», e embora convide os avaliadores «a coligir exemplos de trabalhos […], a conservarem cópias deles ou a redigirem notas», enuncia igualmente que a transmissão de informações é feita «através, por exemplo, de avaliações formais e informais e de um diálogo individual». Assim, não impõe de forma alguma a elaboração sistemática de uma advertência escrita por cada facto susceptível de ser objecto de censura.

48. Por último, há que observar que, devido aos erros de direito cometidos na interpretação do princípio fundamental do respeito dos direitos de defesa e do artigo 26.° do Estatuto, o Tribunal de Primeira Instância, nos n. os  95 e 96 do acórdão impugnado, deduziu depois erradamente a existência de uma incoerência que viciava o conteúdo do REC, tendo, de seguida, acolhido o terceiro fundamento perante ele suscitado (v. n.° 20 do presente acórdão).

49. Resulta do exposto que o acórdão impugnado deve ser anulado parcialmente, na parte em que anulou a decisão controvertida por violação dos direitos de defesa garantidos pelo artigo 26.° do Estatuto e, consequentemente, por incoerência entre certos comentários descritivos e a classificação quantificada correspondente, no que diz respeito à crítica do desrespeito do horário de trabalho.

Quanto às consequências da anulação do acórdão impugnado

50. Nos termos do artigo 61.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, quando o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal de Primeira Instância, pode decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

51. Há que aplicar esta disposição ao presente caso, já que o processo está efectivamente em condições de ser julgado.

Quanto ao fundamento relativo à violação dos direitos de defesa

52. Pelos motivos expostos nos n. os  37 a 44 do presente acórdão, nem o princípio fundamental do respeito dos direitos de defesa nem o artigo 26.°, primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto sujeitam a possibilidade de considerar um facto imputado no REC de um funcionário à realização, antes do procedimento que culmina na adopção desse relatório, de uma advertência escrita, bem como à respectiva comunicação ao interessado.

53. Por conseguinte, não tem fundamento a crítica feita pelo recorrente à Comissão por, no REC controvertido, ter feito a censura de desrespeito do horário de trabalho sem lhe ter chamado a atenção para esse facto antes do procedimento de avaliação.

54. Consequentemente, o fundamento relativo a uma violação dos direitos de defesa deve ser julgado improcedente.

Quanto ao fundamento relativo a uma incoerência entre certos comentários descritivos e a classificação quantificada correspondente, no que diz respeito à crítica de desrespeito do horário de trabalho

55. Não se tendo declarado ilegal a constatação de falta de pontualidade, deve considerar‑se que a crítica baseada nesta constatação consta regularmente do texto do REC controvertido.

56. Nestas condições, a coerência entre a nota «suficiente» e os comentários que constam da rubrica «Conduta no serviço» não é afectada.

57. Daqui resulta que o fundamento relativo a uma incoerência entre certos comentários descritivos e a classificação quantificada correspondente deve igualmente ser julgado improcedente no que diz respeito à crítica de desrespeito do horário de trabalho.

58. Resulta do exposto que deve ser negado provimento ao recurso.

Quanto às despesas

59. O artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo dispõe que, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, igualmente aplicável aos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.° do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Contudo, em conformidade com o artigo 70.° do Regulamento de Processo, igualmente aplicável por força do artigo 122.°, segundo parágrafo, deste regulamento aos recursos interpostos pelas instituições, nos litígios entre as Comunidades e os seus agentes, as despesas efectuadas pelas instituições ficam a cargo destas.

60. No caso em apreço, J. De Bry foi vencido e a Comissão pediu a sua condenação nas despesas. Em aplicação das disposições acima referidas do Regulamento de Processo, há que decidir que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas relacionadas com o presente processo e as que efectuou no processo em primeira instância.

Parte decisória

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

1) O acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 12 de Julho de 2005, De Bry/Comissão (T‑157/04), é anulado parcialmente, na parte em que anulou a decisão da Comissão de 26 de Maio de 2003 que tornou definitivo o relatório de evolução na carreira de J. De Bry, relativo ao período compreendido entre 1 de Julho de 2001 e 31 de Dezembro de 2002, por violação dos direitos de defesa garantidos pelo artigo 26.° do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias e, em consequência disso, pela existência de incoerência entre certos comentários descritivos e a classificação quantificada correspondente, no que diz respeito à crítica de desrespeito do horário de trabalho.

2) É negado provimento ao recurso.

3) Cada parte suportará as suas próprias despesas relacionadas com o presente processo e as efectuadas no processo em primeira instância.

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