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Document 62005CJ0029

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 13 de Março de 2007.
Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) contra Kaul GmbH.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Marca comunitária - Processo de oposição - Apresentação de factos e de provas novos em apoio de um recurso interposto na Câmara de Recurso do IHMI.
Processo C-29/05 P.

Colectânea de Jurisprudência 2007 I-02213

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2007:162

Processo C‑29/05 P

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

contra

Kaul GmbH

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Marca comunitária – Processo de oposição – Apresentação de factos e de provas novos em apoio de um recurso interposto na Câmara de Recurso do IHMI»

Sumário do acórdão

Marca comunitária – Processo de recurso

(Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigos 59.° e 74.°, n.° 2)

Quando conhece de um recurso de uma decisão que indeferiu a oposição ao registo de um sinal como marca comunitária, a Câmara de Recurso goza de uma margem de apreciação para decidir, fundamentando a sua decisão a esse respeito, se há ou não que ter em conta para a decisão que deve proferir factos ou provas que a parte que formulou oposição apresenta, pela primeira vez, nas alegações do recurso, pelo que, por um lado, não tem necessariamente de tomar em consideração esses factos e provas e, por outro, não pode ser excluída oficiosamente a tomada em consideração desses factos e provas.

Com efeito, em primeiro lugar, da redacção do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, sobre a marca comunitária, nos termos do qual o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) pode não tomar em consideração os factos que as partes não tenham alegado ou as provas que não tenham sido produzidas em tempo útil, resulta que, regra geral e salvo disposição em contrário, a apresentação de factos e de provas pelas partes continua a ser possível após a expiração dos prazos a que essa apresentação se encontra sujeita nos termos das disposições do Regulamento n.° 40/94 e que o Instituto não está proibido de ter em conta factos e provas invocados ou apresentados tardiamente. Contudo, resulta igualmente da referida redacção que essa invocação ou apresentação tardia de factos e de provas não é de natureza a conferir à parte que a efectua um direito incondicional a que esses factos e provas sejam tomados em consideração pelo Instituto.

Em segundo lugar, não há nenhuma razão de princípio ligada à natureza do processo que segue os seus trâmites na Câmara de Recurso, ou à competência desta instância, que obste a que, para decidir sobre o recurso que nela foi interposto, a referida câmara tome em consideração factos ou provas apresentados pela primeira vez na fase desse recurso.

Em terceiro lugar, o artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, que precisa as condições de interposição de um recurso na Câmara de Recurso, não pode ser interpretado no sentido de conceder ao autor desse recurso um novo prazo com vista à apresentação de factos e de provas em apoio da sua oposição, pelo que esses factos e provas não podem ser considerados apresentados «em tempo útil», na acepção do artigo 74.°, n.° 2, do regulamento.

(cf. n.os 41‑43, 49, 60‑62, 64, 67, 68)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

13 de Março de 2007 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Marca comunitária – Processo de oposição – Apresentação de factos e de provas novos em apoio de um recurso interposto na Câmara de Recurso do IHMI»

No processo C‑29/05 P,

que tem por objecto o recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrado em 25 de Janeiro de 2005,

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. von Mühlendahl e G. Schneider, na qualidade de agentes,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Kaul GmbH, com sede em Elmshorn (Alemanha), representada por G. Würtenberger e R. Kunze, Rechtsanwälte,

recorrente em primeira instância,

Bayer AG, com sede em Leverkusen (Alemanha),

parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann, C. W. A. Timmermans, A. Rosas, K. Lenaerts e J. Klučka, presidentes de secção, J. N. Cunha Rodrigues, R. Silva de Lapuerta, K. Schiemann (relator), G. Arestis, A. Borg Barthet, M. Ilešič e J. Malenovský, juízes,

advogada‑geral: E. Sharpston,

secretário: K. Sztranc‑Sławiczek, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 27 de Junho de 2006,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 26 de Outubro de 2006,

profere o presente

Acórdão

1        No presente recurso, o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «IHMI») pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 10 de Novembro de 2004, Kaul/IHMI – Bayer (ARCOL) (T‑164/02, Colect., p. II‑3807, a seguir «acórdão recorrido»), através do qual este anulou a decisão da Terceira Câmara de Recurso do IHMI, de 4 de Março de 2002 (processo R 782/2000‑3) (a seguir «decisão controvertida»), que rejeitou a oposição da Kaul GmbH (a seguir «Kaul») ao registo, como marca comunitária, do sinal nominativo «ARCOL».

2        Nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que, na referida decisão, a Câmara de Recurso tinha considerado erradamente que elementos de facto não submetidos à Divisão de Oposição do IHMI, que decidiu em primeira instância, não podiam ser apresentados pela primeira vez por um recorrente, em apoio do seu recurso, numa Câmara de Recurso. Nos termos do referido acórdão, a Câmara de Recurso é, pelo contrário, obrigada a tomar esses elementos em consideração para julgar o recurso nela interposto.

3        No presente recurso, o IHMI sustenta que, ao decidir dessa forma, o Tribunal de Primeira Instância interpretou incorrectamente as disposições do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), e do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 (JO L 303, p. 1, a seguir «regulamento de execução»).

 Quadro jurídico

 O regulamento n.° 40/94

4        O artigo 8.° do Regulamento n.° 40/94, intitulado «Motivos relativos de recusa», dispõe, no n.° 1, alínea b):

«Após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado:

[...]

b)      Quando, devido à sua identidade ou semelhança com a marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida; o risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior.»

5        O artigo 42.°, n.° 3, do referido regulamento prevê:

«A oposição deve ser apresentada por escrito e fundamentada, só se considerando apresentada após pagamento da taxa de oposição. O opositor pode apresentar em seu apoio factos, provas e observações num prazo fixado pelo Instituto.»

6        O artigo 52.° do Regulamento n.° 40/94, intitulado «Causas de nulidade relativa», prevê, no n.° 1, alínea a):

«A marca comunitária é declarada nula na sequência de pedido apresentado ao Instituto ou de um pedido reconvencional numa acção de contrafacção:

a)      Sempre que exista uma marca anterior, referida no n.° 2 do artigo 8.°, e que se encontrem preenchidas as condições enunciadas no n.° 1 ou no n.° 5 do mesmo artigo.»

7        O artigo 57.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, que está inserido no título VII deste regulamento, que regula o processo de recurso, enuncia, designadamente, que «[a]s decisões dos examinadores das Divisões de Oposição, da Divisão Jurídica e de Administração de Marcas e das Divisões de Anulação são susceptíveis de recurso».

8        Nos termos do artigo 59.° do referido regulamento:

«O recurso deve ser interposto por escrito no Instituto num prazo de dois meses a contar da data de notificação da decisão a que se refere. […] As alegações com os fundamentos do recurso devem ser apresentadas por escrito num prazo de quatro meses a contar da data de notificação da decisão.»

9        O artigo 61.° do mesmo regulamento, que tem por epígrafe «Exame do recurso», dispõe:

«1.      Se o recurso for admissível, a Câmara de Recurso verificará se lhe pode ser dado provimento.

2.      Durante o exame do recurso, a Câmara de Recurso convidará as partes, tantas vezes quantas forem necessárias, a apresentar, num prazo que lhes fixará, as suas observações sobre as notificações que lhes enviou ou sobre as comunicações das outras partes.»

10      O artigo 62.° do Regulamento n.° 40/94, intitulado «Decisão do recurso», enuncia:

«1.      Depois de analisar o mérito do recurso, a Câmara de Recurso delibera sobre ele. A referida câmara pode exercer as competências da instância que tomou a decisão contestada, ou remeter o processo à referida instância, para lhe ser dado seguimento.

2.      Se a Câmara de Recurso remeter o processo à instância que tomou a decisão contestada a fim de lhe ser dado seguimento, esta instância fica vinculada à fundamentação e ao dispositivo da decisão da Câmara de Recurso, desde que os factos da causa sejam os mesmos.

[...]»

11      O artigo 63.° do regulamento, intitulado «Recurso para o Tribunal de Justiça», prevê:

«1.      As decisões das Câmaras de Recurso sobre recursos são susceptíveis de recurso para o Tribunal de Justiça.

2.      O recurso terá por fundamento incompetência, preterição de formalidades essenciais, violação do Tratado, do presente regulamento ou de qualquer norma jurídica sobre a sua aplicação, ou desvio de poder.

3.      O Tribunal de Justiça é competente para anular e para reformar a decisão impugnada.

[...]»

12      O artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, que está inserido na primeira secção, intitulada «Disposições gerais», do título IX, consagrado às disposições processuais, dispõe, sob a epígrafe «Exame oficioso dos factos», o seguinte:

«1.      No decurso do processo, o Instituto procederá ao exame oficioso dos factos; contudo, num processo respeitante a motivos relativos de recusa do registo, o exame limitar‑se‑á às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes.

2.      O Instituto pode não tomar em consideração os factos que as partes não tenham alegado ou as provas que não tenham sido produzidas em tempo útil.»

13      Nos termos do artigo 76.°, n.° 1, do referido regulamento:

«Em qualquer processo no Instituto, podem ser tomadas nomeadamente as seguintes medidas de instrução:

a)      Audição das partes;

b)      Pedido de informações;

c)      Apresentação de documentos e amostras;

d)      Audição de testemunhas;

e)      Peritagem;

f)      Declarações escritas prestadas sob juramento ou solenemente, ou que tenham efeito equivalente segundo a legislação do Estado em que forem prestadas.»

 O regulamento de execução

14      A regra 16, n.° 3, do regulamento de execução dispõe:

«Caso não sejam apresentados juntamente com o acto de oposição ou no período subsequente, as indicações sobre os factos, comprovativos e argumentos e os correspondentes documentos justificativos referidos no n.° 1, bem como os comprovativos referidos no n.° 2, podem ser apresentados após o início do processo de oposição, dentro de um prazo fixado pelo Instituto nos termos do n.° 2 da regra 20.»

15      A regra 20, n.° 2, do referido regulamento prevê:

«No caso de o acto de oposição não incluir indicações sobre os factos, comprovativos e argumentos previstos nos n.os 1 e 2 da regra 16, o Instituto convidará o opositor a apresentar esses elementos num prazo que fixará. Todos os elementos apresentados pelo opositor serão comunicados ao requerente, a quem será dada a possibilidade de se pronunciar no prazo fixado pelo Instituto.»

 Antecedentes do litígio

16      Os antecedentes do litígio submetido ao Tribunal de Primeira Instância, conforme resultam do acórdão recorrido, podem ser resumidos da forma que se segue.

17      Em 3 de Abril de 1996, a Atlantic Richfield Co. pediu ao IHMI o registo, como marca comunitária, do sinal nominativo «ARCOL», designadamente, para «produtos químicos destinados a conservar alimentos».

18      Em 20 de Outubro de 1998, a Kaul formulou oposição contra esse pedido, invocando a existência de risco de confusão, na acepção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. A este respeito, a Kaul invocou a marca comunitária anterior de que é titular, a saber, o sinal nominativo «CAPOL», registada para «produtos químicos destinados a conservar alimentos, nomeadamente matérias‑primas para alisar e conservar alimentos pré‑confeccionados, em especial doçarias».

19      Tendo concluído pela inexistência de risco de confusão, a Divisão de Oposição do IHMI rejeitou essa oposição em 30 de Junho de 2000.

20      Em apoio do recurso que interpôs dessa decisão, a Kaul alegou, designadamente, como tinha feito perante a Divisão de Oposição, que a marca de que é titular tem um carácter distintivo elevado, de forma que deve, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, beneficiar de maior protecção. A este respeito, afirmou, contudo, que este carácter distintivo elevado resultava não apenas do facto de o vocábulo «CAPOL» não ser descritivo dos produtos considerados, tal como já tinha alegado na Divisão de Oposição, mas também da circunstância de a referida marca ter adquirido notoriedade pelo uso. Para demonstrar esta notoriedade, a Kaul apresentou, em anexo ao seu articulado entregue na Câmara de Recurso, uma declaração de honra do seu director‑geral e uma lista dos seus clientes.

21      Na decisão controvertida, a Câmara de Recurso do IHMI considerou, designadamente, que não podia tomar em consideração o eventual carácter distintivo elevado da marca anterior, ligado à sua notoriedade, uma vez que esse elemento e as provas supramencionadas destinadas a comprová‑lo tinham sido apresentados pela primeira vez em apoio do recurso nela interposto.

 O acórdão recorrido

22      Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 24 de Maio de 2002, a Kaul interpôs recurso de anulação da decisão controvertida. Invocou quatro fundamentos em apoio do referido recurso, relativos, respectivamente, à violação, em primeiro lugar, da obrigação de examinar os elementos por ela apresentados na Câmara de Recurso, em segundo lugar, do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, em terceiro lugar, dos princípios de direito processual admitidos nos Estados‑Membros e das regras processuais aplicáveis no IHMI e, em quarto e último lugar, do dever de fundamentação.

23      O Tribunal de Primeira Instância julgou o primeiro fundamento procedente e anulou a decisão controvertida com base no mesmo, sem se pronunciar sobre os outros fundamentos do recurso. A este respeito, decidiu, designadamente, o seguinte, nos n.os 25 a 30 do acórdão recorrido:

«25      Antes de mais, há que referir que os elementos apresentados pela recorrente na Câmara de Recurso consistem numa declaração de honra do director‑geral da recorrente e numa lista dos clientes desta.

26      Esses documentos, relativos à intensidade da exploração da marca da recorrente, foram apresentados por esta última em apoio da argumentação já avançada na Divisão de Oposição – então apenas baseada em considerações relativas à inexistência de carácter descritivo da marca da recorrente –, segundo a qual essa marca gozava de elevado grau de carácter distintivo e devia, por esse facto, beneficiar de uma protecção mais elevada.

27      A Câmara de Recurso, nos n.os 10 a 12 da decisão [controvertida], e depois o IHMI, no n.° 30 da sua contestação, consideraram que essa nova exposição de factos não pode ser tomada em consideração, uma vez que ocorreu após o termo dos prazos fixados pela Divisão de Oposição.

28      No entanto, importa referir que essa posição não é compatível com a continuidade funcional entre as instâncias do IHMI afirmada pelo Tribunal de Primeira Instância tanto no que respeita ao processo ex parte [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY‑DRY), T‑163/98, Colect., p. II‑2383, n.os 38 a 44, não invalidado quanto a esse ponto pelo acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 2001, Procter & Gamble/IHMI […], C‑383/99 P, Colect., p. I‑6251, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2002, Procter & Gamble/IHMI (Forma de um sabão), T‑63/01, Colect., p. II‑5255, n.° 21] como no que respeita ao processo inter partes [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Setembro de 2003, Henkel/IHMI – LHS (UK) (KLEENCARE), T‑308/01, Colect., p. II‑3253, n.os 24 a 32].

29      Com efeito, foi decidido que decorre da continuidade funcional entre as instâncias do IHMI que, no âmbito de aplicação do artigo 74.°, n.° 1, in fine, do Regulamento n.° 40/94, a Câmara de Recurso está obrigada a fundamentar a sua decisão em todos os elementos de facto e de direito que a parte interessada tenha apresentado quer no processo perante a unidade que decidiu em primeira instância quer, com a única ressalva do n.° 2 do mesmo artigo, no próprio processo de recurso (acórdão KLEENCARE, já referido, n.° 32). Assim, e contrariamente ao que defende o IHMI, tratando‑se do processo inter partes, a continuidade funcional existente entre as diferentes instâncias do IHMI não tem por consequência que uma parte que, na unidade que decide em primeira instância, não apresentou nessa unidade determinados elementos de facto ou de direito nos prazos impostos não possa, por força do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, invocar os referidos elementos na Câmara de Recurso. Pelo contrário, a continuidade funcional tem como consequência que essa parte pode invocar os referidos elementos na Câmara de Recurso, sem prejuízo do respeito, nesta instância, do artigo 74.°, n.° 2, do referido regulamento.

30      Por conseguinte, uma vez que, no caso vertente, a apresentação dos elementos de facto controvertidos não é tardia, na acepção do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, mas ocorreu em anexo ao articulado apresentado pela recorrente na Câmara de Recurso, em 30 de Outubro de 2000, ou seja, no prazo de quatro meses previsto no artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, esta última não podia recusar‑se a tomar esses elementos em consideração.»

24      No n.° 34 do referido acórdão, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que «a Câmara de Recurso não podia, sem violar o artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, recusar examinar os elementos de facto apresentados pela recorrente no articulado de 30 de Outubro de 2000 para efeitos de demonstrar o elevado grau de carácter distintivo da marca anterior, que resulta da utilização, reivindicada pela recorrente, dessa marca no mercado».

 Quanto ao presente recurso

25      No seu recurso, o IHMI pede que o Tribunal de Justiça anule o acórdão recorrido e remeta o processo ao Tribunal de Primeira Instância, para que este decida sobre os outros fundamentos do recurso. Pede igualmente que as outras partes no processo sejam condenadas nas despesas.

26      A Kaul pede que seja negado provimento ao recurso e que o IHMI seja condenado nas despesas.

 Argumentos das partes

27      Através do seu fundamento único, que se divide em duas partes, o IHMI sustenta que, ao decidir, nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido, que a Câmara de Recurso do IHMI estava obrigada, no âmbito de um processo de oposição, a tomar em consideração os elementos de facto e de prova apresentados pela primeira vez em apoio do articulado referido no artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, o Tribunal de Primeira Instância violou diversas disposições do referido regulamento e do regulamento de execução.

28      Através da primeira parte desse fundamento, o IHMI alega que, ao decidir nos referidos números que o princípio da continuidade funcional obriga a Câmara de Recurso a essa tomada em consideração, o Tribunal de Primeira Instância interpretou e aplicou incorrectamente as disposições conjugadas do artigo 42.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 e das regras 16, n.° 3, e 20, n.° 2, do regulamento de execução, bem como o artigo 62.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94.

29      O prazo imposto ao opositor pelo IHMI, com base nessas três primeiras disposições, para apresentar factos e provas em apoio da sua oposição constitui, com efeito, um prazo peremptório no termo do qual essa apresentação na Divisão de Oposição fica excluída, salvo se o IHMI prorrogar esse mesmo prazo.

30      Os factos e as provas não apresentados no referido prazo também não podem ser apresentados na Câmara de Recurso, nem conduzir à anulação da decisão proferida pela Divisão de Oposição. Ao contrário do decidido pelo Tribunal de Primeira Instância, a continuidade funcional entre as Divisões de Oposição e as Câmaras de Recurso, que encontra expressão no artigo 62.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, diz respeito à competência decisória das referidas instâncias, mas não pode privar de efeito os prazos precisos que a regulamentação comunitária prevê com vista ao enquadramento da tramitação do processo de oposição.

31      Esta interpretação também é imposta pela ratio legis do processo de oposição, que visa permitir a identificação precoce de conflitos entre marcas e a tomada de uma decisão administrativa rápida a este respeito. De resto, uma decisão que rejeita a oposição não tem carácter definitivo, uma vez que, de acordo com o artigo 52.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, não impede a posterior instauração de um procedimento de anulação ou a posterior formulação de um pedido reconvencional, no âmbito de uma acção baseada em contrafacção, com base em fundamentos idênticos aos invocados em apoio da oposição.

32      Através da segunda parte do referido fundamento, o IHMI sustenta que, ao decidir, nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido, que a apresentação de elementos de facto ou de prova na fase de recurso é feita «em tempo útil», na acepção do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, se ocorrer no prazo de quatro meses referido no artigo 59.° do referido regulamento, de forma que a Câmara de Recurso deve tomar esses elementos em consideração, o Tribunal de Primeira Instância aplicou incorrectamente a primeira disposição.

33      A título principal, o IHMI sustenta a este respeito que o referido artigo 74.°, n.° 2, não se destina a ser aplicado quando a apresentação de elementos de facto ou de prova está, como no presente caso, sujeita a um prazo peremptório no órgão que decide em primeira instância. Tendo recorrido aos termos «em tempo útil», «not in due time» ou ainda «verspätet», a referida disposição traduz precisamente a preocupação de evitar atrasos injustificados quando esses prazos peremptórios não tenham sido fixados.

34      A título subsidiário, o IHMI alega que o Tribunal de Primeira Instância restringiu indevidamente o alcance do referido artigo 74.°, n.° 2, ao decidir que esta disposição só pode ser aplicada, no âmbito do processo de recurso, quando a apresentação de elementos de facto e de prova ocorre após o termo do prazo de quatro meses referido no artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, o artigo 74.°, n.° 2, deste regulamento também deve poder ser aplicado noutras circunstâncias, por exemplo, porque essa apresentação já podia e devia ter ocorrido perante a Divisão de Oposição.

35      Segundo a Kaul, que aborda o fundamento invocado no seu todo, o Tribunal de Primeira Instância decidiu correctamente que as Câmaras de Recurso devem ter em conta elementos novos, desde que a apresentação dos mesmos, incluindo nessas câmaras, não seja intempestiva na acepção do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94. É o que se passa no presente caso, dado que a apresentação em litígio ocorreu no prazo referido no artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94.

36      A Câmara de Recurso constitui uma segunda instância chamada a apreciar de novo o mérito, sem qualquer restrição, antes de qualquer fiscalização jurisdicional, que, sendo confiada ao Tribunal de Primeira Instância e ao Tribunal de Justiça, está, por seu lado, limitada a questões de direito.

37      Os artigos 61.°, n.° 2, e 76.° do Regulamento n.° 40/94 confirmam que a Câmara de Recurso dispõe de competências idênticas às da entidade que decidiu em primeira instância, designadamente para convidar as partes a apresentar observações ou ordenar medidas de instrução. Lido em conjugação com estas disposições, o artigo 62.°, n.° 1, do referido regulamento indica que a Câmara de Recurso é obrigada a decidir, à luz de todos os factos de que dispõe, se considerar ser possível adoptar uma decisão com um dispositivo idêntico ao da decisão que lhe foi submetida.

38      Na opinião da Kaul, resulta do artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 que a apresentação de factos e de provas nos processos inter partes compete apenas às partes. Assim, as partes devem conservar o direito de aprofundar o debate em sede de recurso, designadamente, à luz da decisão proferida em primeira instância.

39      Além disso, o facto de a decisão do IHMI poder ser adoptada com base em matéria de facto o mais ampla possível é conforme tanto aos princípios da segurança jurídica e da economia processual como à finalidade do processo de oposição, que visa permitir que os conflitos entre marcas sejam resolvidos antes do registo da marca, no interesse do bom funcionamento do mercado interno.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

40      Estando as duas partes do fundamento estreitamente ligadas, há que apreciá‑las em conjunto.

 Quanto ao artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94

41      A fim de decidir sobre o fundamento considerado no seu todo, há que observar que, em primeiro lugar, conforme resulta da redacção do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, o IHMI pode não tomar em consideração os factos que as partes não tenham alegado ou as provas que não tenham sido produzidas em tempo útil.

42      Ao contrário do que o IHMI sustenta, resulta dessa redacção que, regra geral e salvo disposição em contrário, a apresentação de factos e de provas pelas partes continua a ser possível após a expiração dos prazos a que essa apresentação se encontra sujeita nos termos das disposições do Regulamento n.° 40/94 e que o IHMI não está proibido de ter em conta factos e provas invocados ou apresentados tardiamente.

43      Em contrapartida, resulta de forma igualmente inequívoca da referida redacção que essa invocação ou apresentação tardia de factos e de provas não é de natureza a conferir à parte que a efectua um direito incondicional a que esses factos e provas sejam tomados em consideração pelo IHMI. Ao precisar que este «pode», num caso destes, entender não tomar em consideração esses factos e provas, o artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 atribui, com efeito, ao IHMI um amplo poder de apreciação para efeitos de decidir se deve ou não tomá‑los em conta, devendo fundamentar a sua decisão quanto a este aspecto.

44      Esta tomada em consideração pelo IHMI, quando é chamado a decidir no âmbito de um processo de oposição, é, em particular, susceptível de se justificar se este considerar, por um lado, que os elementos apresentados tardiamente são, à primeira vista, susceptíveis de revestir relevância real no que diz respeito ao resultado da oposição que nele foi apresentada e, por outro, que a fase do processo em que essa apresentação tardia ocorre e as circunstâncias que a envolvem não se opõem a essa tomada em consideração.

45      Tal como o IHMI alegou com razão, a circunstância de ser obrigado a tomar em consideração, em todas as situações, os factos e provas apresentados pelas partes num processo de oposição fora dos prazos impostos para esse efeito pelas disposições do Regulamento n.° 40/94 equivaleria, por outro lado, a privar de efeito útil as referidas disposições.

46      Pelo contrário, a interpretação dada ao artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, nos n.° 42 a 44 do presente acórdão, é susceptível de preservar esse efeito útil, ao mesmo tempo que permite conciliar diversos imperativos.

47      Por um lado, com efeito, é conforme ao princípio da boa administração e à necessidade de assegurar a boa tramitação e a eficácia dos processos que as partes sejam incentivadas a respeitar os prazos que lhes são fixados pelo IHMI para fins de instrução de um processo. A circunstância de este poder, eventualmente, decidir não ter em conta os factos e provas apresentados pelas partes fora dos prazos impostos deveria, por si só, ter esse efeito incentivador.

48      Por outro lado, ao preservar, contudo, a possibilidade de a instância chamada a resolver o litígio tomar em consideração factos e provas apresentados tardiamente pelas partes, a referida interpretação é, pelo menos no que diz respeito ao processo de oposição, susceptível de contribuir para evitar que sejam registadas marcas cuja utilização pudesse, mais tarde, ser contestada com sucesso através de um processo de anulação ou no âmbito de uma acção baseada em contrafacção. Ora, como o Tribunal de Justiça já decidiu, razões de segurança jurídica e de boa administração militam nesse sentido (v., designadamente, acórdão de 6 de Maio de 2003, Libertel, C‑104/01, Colect., p. I‑3793, n.° 59).

 Quanto à natureza do processo na Câmara de Recurso do IHMI e quanto ao artigo 62.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94

49      Em segundo lugar, deve observar‑se que não há nenhuma razão de princípio ligada à natureza do processo que segue os seus trâmites na Câmara de Recurso, ou à competência desta instância, que obste a que, para decidir sobre o recurso que nela foi interposto, a referida câmara tome em consideração factos ou provas apresentados pela primeira vez na fase desse recurso.

50      A este respeito, deve recordar‑se que os litígios com origem numa oposição a um pedido de registo de marca estão potencialmente sujeitos a quatro níveis de controlo.

51      Com efeito, um processo incumbe, numa primeira fase, ao IHMI; antes de mais, às suas Divisões de Oposição e, em sede de recurso, às suas Câmaras de Recurso, que, não obstante as garantias de independência de que elas mesmas e os seus membros beneficiam, não deixam de ser instâncias do IHMI. A este processo sucede‑se, numa segunda fase, uma eventual fiscalização jurisdicional pelo Tribunal de Primeira Instância e, eventualmente, em sede de recurso da respectiva decisão, pelo Tribunal de Justiça.

52      Conforme previsto no artigo 63.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, o Tribunal de Primeira Instância só pode anular ou reformar a decisão de uma Câmara de Recurso do IHMI, com fundamento em «incompetência, preterição de formalidades essenciais, violação do Tratado, do [referido] regulamento ou de qualquer norma jurídica sobre a sua aplicação, ou desvio de poder».

53      Resulta designadamente desta disposição que o Tribunal de Primeira Instância só pode anular ou reformar a decisão objecto do recurso se, no momento em que foi adoptada, estivesse viciada por um desses motivos de anulação ou de reforma. Em contrapartida, esse Tribunal não pode anular ou reformar a referida decisão por motivos que tenham surgido posteriormente à respectiva pronúncia (acórdão de 11 de Maio de 2006, Sunrider/IHMI, C‑416/04 P, Colect., p. I‑4237, n.os 54 e 55).

54      Como o Tribunal de Primeira Instância já decidiu acertada e reiteradamente, resulta igualmente da referida disposição que os factos que não foram invocados pelas partes nas instâncias do IHMI também não podem ser invocados na fase do recurso interposto nesse órgão jurisdicional comunitário. Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância é chamado a apreciar a legalidade da decisão da Câmara de Recurso, fiscalizando a aplicação do direito comunitário efectuada por esta, atendendo, em particular, aos elementos de facto que foram submetidos à referida câmara (v., neste sentido, acórdão de 18 de Julho de 2006, Rossi/IHMI, C‑214/05 P, Colect., p. I‑7057, n.° 50), mas não pode, em contrapartida, efectuar essa fiscalização tendo em consideração elementos de facto apresentados pela primeira vez perante ele.

55      Segundo a lógica da arquitectura institucional recordada nos n.os 50 e 51 do presente acórdão, a fiscalização jurisdicional exercida desta forma pelo Tribunal de Primeira Instância não pode consistir numa simples duplicação da fiscalização previamente efectuada pela Câmara de Recurso do IHMI.

56      A este respeito, resulta do artigo 62.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 que, após analisar o mérito do recurso, a Câmara de Recurso delibera sobre o mesmo e, ao fazê‑lo, pode «exercer as competências da instância que tomou a decisão contestada», isto é, no presente caso, pronunciar‑se ela própria sobre a oposição, rejeitando‑a ou declarando‑a fundada, confirmando ou infirmando nessa medida a decisão impugnada.

57      Assim, resulta do artigo 62.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 que, por força do recurso nela interposto, a Câmara de Recurso é chamada a proceder a uma nova apreciação integral do mérito da oposição, tanto quanto à matéria de direito como à matéria de facto.

58      Tal como a Kaul recordou, resulta, além disso, dos artigos 61.°, n.° 2, e 76.° do Regulamento n.° 40/94 que, para efeitos da apreciação do mérito do recurso nela interposto, a Câmara de Recurso convida as partes, tantas vezes quantas forem necessárias, a apresentar as suas observações sobre as notificações que lhes envia e pode igualmente decidir sobre medidas de instrução, entre as quais figura a apresentação de elementos de facto ou de prova. O artigo 62.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 precisa, por seu lado, que se a Câmara de Recurso remeter o processo à instância que tomou a decisão contestada, a fim de lhe ser dado seguimento, esta última instância fica vinculada à fundamentação e ao dispositivo da decisão da Câmara de Recurso «desde que os factos da causa sejam os mesmos». Estas disposições demonstram, por sua vez, a possibilidade de enriquecimento do substrato factual nas diversas fases do processo que segue os seus trâmites no IHMI.

 Quanto aos artigos 42.°, n.° 3, e 59.° do Regulamento n.° 40/94

59      Em terceiro lugar, resulta do artigo 42.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 que quem apresentou oposição ao registo de uma marca, com o fundamento de que esta deve ser recusada com base no artigo 8.°, n.° 1, deste regulamento, pode apresentar factos, provas e observações em apoio da referida oposição no prazo que lhe for fixado pelo IHMI para esse efeito.

60      Diversamente deste artigo 42.°, n.° 3, o artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, que precisa as condições de interposição de um recurso na Câmara de Recurso, não faz referência à apresentação de factos ou de provas, mas unicamente à apresentação, num prazo de quatro meses, de alegações que exponham os fundamentos do recurso.

61      Donde resulta que, ao contrário do que o Tribunal de Primeira Instância decidiu no n.° 30 do acórdão recorrido, o referido artigo 59.° não pode ser interpretado no sentido de conceder ao autor desse recurso um novo prazo com vista à apresentação de factos e de provas em apoio da sua oposição.

62      Logo, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito quando considerou, no referido número, que esses factos e provas são apresentados «em tempo útil», na acepção do artigo 74.°, n.° 2, e quando deduziu desta afirmação que a Câmara de Recurso é obrigada a tomá‑los em consideração na decisão que é chamada a proferir sobre o recurso nela interposto.

63      Com efeito, resulta dos n.os 41 a 43 do presente acórdão que, uma vez que, tal como se verifica no presente caso, esses factos e provas não foram invocados e apresentados pela parte interessada nos prazos que lhe foram fixados para esse efeito em aplicação das disposições do Regulamento n.° 40/94, nem, consequentemente, «em tempo útil» na acepção do artigo 74.°, n.° 2, do referido regulamento, a referida parte não beneficia de um direito incondicional a que esses factos e provas sejam tidos em conta pela Câmara de Recurso, dispondo esta, pelo contrário, de uma margem de apreciação para decidir se deve ou não tomar isso em consideração para efeitos da decisão que tem de proferir.

64      Decorre do que precede que, ao decidir nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido que a Câmara de Recurso é obrigada a tomar em consideração factos e provas que a parte que formulou oposição a um pedido de registo de marca apresenta, pela primeira vez, nas alegações do recurso que interpôs na referida câmara contra uma decisão proferida por uma Divisão de Oposição, e ao anular a decisão controvertida unicamente devido ao facto de a Câmara de Recurso se ter recusado, no presente caso, a tomar isso em consideração, o Tribunal de Primeira Instância violou as disposições conjugadas dos artigos 42.°, n.° 3, 59.° e 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94.

65      Daqui resulta que o acórdão recorrido deve ser anulado.

 Quanto ao recurso em primeira instância

66      Nos termos do artigo 61.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, este, em caso de anulação da decisão do Tribunal de Primeira Instância, pode ele próprio decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância para julgamento.

67      No presente caso, o Tribunal de Justiça, tal como o Tribunal de Primeira Instância já antes tinha feito no n.° 27 do acórdão recorrido, verifica que, nos n.os 10 e 12 da decisão controvertida, a Câmara de Recurso recusou tomar em consideração os factos e as provas apresentados pela Kaul em apoio do seu recurso, considerando, no essencial, que essa tomada em consideração estava obrigatoriamente excluída, dado que esses factos e essas provas não tinham sido previamente apresentados na Divisão de Oposição nos prazos fixados por esta.

68      Ora, esta tese da Câmara de Recurso, igualmente defendida pelo IHMI tanto durante o processo no Tribunal de Primeira Instância como no âmbito do presente recurso, viola o artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, conforme resulta dos n.os 41 a 43 do presente acórdão, a referida disposição atribui à Câmara de Recurso, perante a qual são apresentados tardiamente factos ou provas, uma margem de apreciação para decidir se há ou não que ter em conta estes últimos para efeitos da decisão que deve proferir.

69      Em vez de exercer o poder de apreciação que desta forma lhe é atribuído, a Câmara de Recurso considerou erradamente, no presente caso, que não tinha margem de manobra para ter eventualmente em consideração os factos e as provas em causa.

70      Donde resulta que a decisão controvertida deve ser anulada.

 Quanto às despesas

71      Nos termos do artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se for dado provimento ao recurso e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do mesmo regulamento, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.°, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

72      No presente caso, deve observar‑se que, embora o acórdão recorrido seja anulado, o Tribunal de Justiça, através do presente acórdão, dá provimento ao recurso da Kaul e anula a decisão da Câmara de Recurso do IHMI. Daqui resulta que se deve condenar o IHMI nas despesas efectuadas pela Kaul tanto em primeira instância como no âmbito do presente recurso, de acordo com o pedido formulado por esta última.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

1)      É anulado o acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 10 de Novembro de 2004, Kaul/IHMI – Bayer (ARCOL) (T‑164/02).

2)      É anulada a decisão da Terceira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 4 de Março de 2002 (processo R 782/2000‑3).

3)      O IHMI é condenado nas despesas relativas tanto ao processo em primeira instância como ao presente recurso.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.

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