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Document 62005CC0240

Conclusões do advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas em 22 de Junho de 2006.
Administration de l'enregistrement et des domaines contra Eurodental Sàrl.
Pedido de decisão prejudicial: Cour d'appel - Luxemburgo.
Sexta Directiva IVA - Isenções - Artigos 13.º, A, n.º 1, alínea e), 17.º, n.º 3, alínea b), e 28.º-C, A, alínea a) - Direito a dedução - Produção e reparação de próteses dentárias - Operações intracomunitárias relativas a operações isentas no interior do Estado-Membro - Efeitos do regime derrogatório e transitório previsto no artigo 28.º, n.º 3, alínea a), conjugado com o anexo E, ponto 2 - Princípio da neutralidade fiscal - Harmonização parcial do IVA.
Processo C-240/05.

Colectânea de Jurisprudência 2006 I-11479

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2006:426

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

DÁMASO RUIZ‑JARABO COLOMER

apresentadas em 22 de Junho de 2006 1(1)

Processo C‑240/05

Administration de l’enregistrement et des domaines

contra

Eurodental Sàrl

(pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour d’appel do Grão‑Ducado do Luxemburgo)

«Sexta Directiva IVA – Operações no interior de um país – Isenções – Próteses dentárias – Direito de dedução – Entregas de bens e prestações de serviços intracomunitárias – Isenções – Operações intracomunitárias que também estariam isentas se fossem puramente internas – Princípio da neutralidade»





I –    Introdução

1.     A Sexta Directiva do imposto sobre o valor acrecentado (2) (a seguir «IVA») contempla as isenções internas, que não dão direito a deduzir o tributo suportado, ao lado das que favorecem determinadas operações intracomunitárias, beneficiárias dessa dedução.

2.     A Cour d’appel do Luxemburgo (tribunal de recurso) quer saber se uma actividade económica que está isenta sem direito a dedução, quando desenvolvida num Estado‑Membro, também o está quando transcende as suas fronteiras.

3.     Esta questão prejudicial chama a atenção para as relações entre as isenções de determinadas actividades nacionais, previstas no artigo 13.° da Sexta Directiva, e as previstas para as transacções interestatais no artigo 15.°, relativas às prestações de serviços e às entregas de bens anteriores a 1 de Janeiro de 1993, e no artigo 28.°‑C (3) no que se refere a esta última categoria de tratamento depois da referida data.

4.     Em especial, pretende‑se esclarecer se, na produção e reparação de próteses dentárias no Luxemburgo, que usufruem do referido benefício fiscal, se pode deduzir o imposto pago quando os clientes residam na Alemanha.

II – A Sexta Directiva

A –    As isenções no interior do país

5.     A Sexta Directiva submete a tributação as entregas de bens e as prestações de serviços (4) efectuadas a título oneroso dentro de um país por qualquer pessoa que exerça de modo independente actividades de produção, comércio ou de assistência, incluídas nas profissões liberais (artigos 2.°, n.° 1, e 4.°, n.os 1 e 2).

6.     O título X regula as isenções e o artigo 13.° enumera as que se refere às operações internas, cuja parte A, de entre as que se dizem respeito a actividades de interesse general, refere «[a]s prestações de serviços efectuadas no âmbito da sua actividade pelos mecânicos dentistas, e bem assim o fornecimento de próteses dentárias efectuado pelos dentistas e mecânicos dentistas;» [n.° 1, alínea e)].

7.     Como resulta, acontrario sensu, do artigo 17.°, n.os 1 e 2, estes benefícios fiscais impedem que se deduza o imposto pago, excepto se o sujeito passivo empregar o bem ou utilizar o serviço para as necessidades das suas actividades tributadas.

8.     O n.° 3, alínea a), do artigo 28.° autorizou os Estados‑Membros, durante o período fixado no n.° 4, a exigir o imposto sobre as actividades que, isentas nos termos do artigo 13.°, estejam incluídas no anexo E, cujo n.° 2 cita a alínea e) do n.° 1 da parte A desta última disposição. Nos termos do artigo 4.°, n.° 14, quarto parágrafo, da Umsatzsteuergesetz de 1991 (lei alemã do imposto sobre o valor acrescentado) (5), a isenção relativa aos médicos e aos dentistas não se aplica à entrega ou à reparação de próteses dentárias e de aparelhos de ortodontia se o profissional os produzir ou reparar nas suas instalações.

B –    Isenções nas operações intracomunitárias

1.      Antes de 1 de Janeiro de 1993

9.     Na redacção original da Sexta Directiva, esta categoria de transacções era equiparada às extracomunitárias, sendo referidas no artigo 15.°, cujos três primeiros números dispensavam as entregas de bens expedidos ou transportados para fora de um Estado‑Membro e as prestações de serviços efectuadas nesses bens (6).

10.   O artigo 17.°, n.° 3, alínea b), permitia deduzir nestes casos o imposto pago.

2.      Depois de 1 de Janeiro de 1993

11.   A Directiva 91/680 inseriu na Sexta Directiva um novo título XVI A, com o título «Regime transitório de tributação das trocas comerciais entre Estados‑Membros», para facilitar, depois de suprimidos os controlos fiscais nas fronteiras internas a partir de 1 de Janeiro de 1993, a passagem ao regime definitivo de tributação das trocas no sistema comum do IVA (7).

12.   Nesta regulação provisória, estão sujeitas a IVA as «aquisições intracomunitárias» a título oneroso, no território de um país, por um sujeito passivo que age nessa qualidade, ou por uma pessoa colectiva que não seja sujeito passivo, quando o vendedor for um sujeito passivo que aja nessa qualidade [artigo 28.°‑A, n.° 1, alínea a), primeiro parágrafo].

13.   Exceptuam‑se as entregas de bens «expedidos ou transportados, pelo vendedor ou pelo adquirente ou por conta destes […] efectuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa colectiva que não seja sujeito passivo, agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de início da expedição ou do transporte» [artigo 28.°‑C, A, alínea a)]. Também estão excluídas as aquisições intracomunitárias de bens cuja entrega pelos sujeitos passivos estaria isenta dentro do país [artigo 28.°‑C, B, alínea a)].

14.   Finalmente, o artigo 17.°, n.° 3, alterado pelo artigo 28.°‑ F, n.° 1, permite deduzir o IVA suportado, se o sujeito passivo utilizar os bens ou serviço para as necessidades: 1) das operações relativas a actividades económicas sujeitas ao imposto, efectuadas no estrangeiro, que, se tivessem sido efectuadas num Estado‑Membro, tivessem dado direito à dedução [alínea a)]; e 2) das isentas nos termos do artigo 15.° e do artigo 28.°‑C, A e C([alínea b)].

III – Litígio no processo principal e questões prejudiciais

15.   A sociedade luxemburguesa Eurodental SARL dedica‑se à produção e à reparação de próteses dentárias na sequência de encomendas efectuadas por clientes residentes na Alemanha.

16.   Por decisão de 26 de Março de 1997, a Administração do Grão‑Ducado negou‑lhe o direito à dedução do IVA, que tinha pago pelos bens utilizados para efectuar as entregas e as prestações de serviços no país vizinho. Alegou que o artigo 44.° (no qual se prevê a isenção para as próteses dentárias) da lei de 12 de Fevereiro de 1979, que altera e completa a lei de 5 de Agosto de 1969, relativa ao IVA (8), prevalece sobre o artigo 43.° (que regula a isenção das entregas intracomunitárias), sem que, no entanto, seja aplicável o artigo 49.°, n.° 2, alínea a), que autoriza a dedução do imposto correspondente aos bens utilizados para as actividades do artigo 43.°

17.   O Tribunal d’arrondissement (tribunal de primeira instância), em decisão de 16 de Dezembro de 2002, considerou que a dedução tinha sido indevidamente recusada, alegando que os referidos artigos 43.° e 44.° abordam transacções distintas: um, as exteriores, e o outro, as interiores. O artigo 49.° aplica‑se às primeiras, não se atendendo à sua natureza, pelo que nenhuma disposição consagra o primado do artigo 44.° sobre o artigo 43.° Em sua opinião, numa entrega intracomunitária existe sempre o direito de dedução (9).

18.   A administração fiscal interpôs recurso, alegando que a interpretação preconizada outorgava um tratamento de favor às entregas de próteses que tinham por destino a Alemanha relativamente às que eram praticadas no Grão‑Ducado, desrespeitando o princípio da neutralidade do sistema comum do IVA.

19.   Considerando que o teor dos textos normativos em discussão não resolvia a controvérsia, a Cour d’appel decidiu submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1. Uma entrega de bens que, quando efectuada no território de um Estado‑Membro, está isenta, ao abrigo do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea e), da Sexta Directiva […] e não dá direito à dedução do imposto pago a montante por força do artigo 17.° da referida directiva, é abrangida pelo âmbito de aplicação, nomeadamente, do artigo 15.°, n.os 1 e 2, da referida directiva, na versão anterior a 1 de Janeiro de 1993, e do artigo 28.°‑C, A, alínea a), aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1993, e consequentemente pelo âmbito de aplicação do artigo 17.°, n.° 3, alínea b), da referida directiva, que dá direito à dedução do imposto pago a montante quando for efectuada por um operador estabelecido num Estado‑Membro da Comunidade a um operador estabelecido num outro Estado‑Membro e quando os pressupostos de aplicação, respectivamente, do artigo 15.°, n.os 1 e 2, da referida directiva na versão anterior a 1 de Janeiro de 1993, e do artigo 28.°‑C, A, alínea a), aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1993, se encontram reunidos?

2. Uma prestação de serviços que, quando efectuada no território de um Estado‑Membro, está isenta, ao abrigo do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea e) da Sexta Directiva […] e não dá direito à dedução do imposto pago a montante por força do artigo 17.° da referida directiva, é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 15.°, n.° 3, na versão anterior a 1 de Janeiro de 1993 (não estando prevista nenhuma disposição de isenção para 1993), e consequentemente no âmbito de aplicação do artigo 17.°, n.° 3, alínea b), da referida directiva, que dá direito à dedução quando for efectuada por um operador estabelecido num Estado‑Membro da Comunidade a um operador estabelecido num outro Estado‑Membro e quando os pressupostos de aplicação do artigo 15.°, n.° 3, na versão anterior a 1 de Janeiro de 1993, se encontram reunidos?»

IV – Processo no Tribunal de Justiça

20.   Apresentaram observações escritas, no prazo fixado no artigo 23.° do Estatuto, a Eurodental, a Administração luxemburguesa demandada no litígio principal, o Governo alemão e a Comissão.

21.   Não tendo nenhum dos interessados requerido a abertura da fase oral, o próprio Tribunal de Justiça, na reunião geral de 13 de Dezembro de 2005, decidiu iniciar a deliberação, nos termos do artigo 104.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, considerando que não eram necessárias conclusões do advogado‑geral.

22.   Na conferência, a Terceira Secção, à qual o processo foi atribuído, decidiu em 6 de Abril de 2006 remetê‑lo à reunião geral que, em 25 de Abril, manteve a atribuição decidida, tendo no entanto considerado necessária a apresentação de conclusões e a realização de audiência, pedindo às partes que apresentassem por escrito o seu entendimento sobre a pertinência para a resolução da questão prejudicial da opção apresentada pela República Federal da Alemanha, ao abrigo do artigo 28.°, n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, sujeitando a tributação, com carácter transitório, a entrega e a reparação de próteses dentárias e de aparelhos de ortodontia feita por profissionais residentes no seu território.

23.   Na audiência, que teve lugar em 31 de Maio de 2006, compareceram os representantes da Eurodental e da Comissão que reiteraram as respectivas posições.

V –    Análise das questões prejudiciais

24.   As presentes questões prejudiciais, que há que resumir numa só, permitem que se estudem as relações entre dois tipos de isenções existentes na Sexta Directiva: as de algumas actividades internas de interesse geral, previstas no artigo 13.°, A, n.° 1, e aquelas de que beneficiam as operações intracomunitárias. A primeira questão refere‑se à entrega de bens antes e depois de 1 de Janeiro de 1993, ao passo que a segunda se refere às prestações de serviços anteriores a essa data.

25.   O conflito surgiu porque a actividade empresarial do processo principal se pode subsumir no âmbito dos dois tipos de deduções, ou pela sua natureza (actividade de mecânicos dentistas), ou pela sua modalidade (intracomunitária), sendo, no entanto, diferentes as consequências, na medida em que, se se considerar que se inclui na primeira classe, não terá direito a deduzir o IVA pago, o que acontecerá na outra situação.

26.   A solução do dilema suscita uma dupla análise: o das isenções à luz da neutralidade do imposto, pedra angular do sistema, e o da situação única e transitória das transacções intracomunitárias.

A –    Neutralidade das isenções no interior de um país

27.   O IVA incide sobre os actos de consumo, como manifestação indirecta da capacidade económica das pessoas, objectivo que se atinge tributando as funções dos empresários ou dos profissionais, que, através da técnica da repercussão, transferem a carga para o consumidor final. Consegue‑se desta forma um imposto «neutro», pois só o sofre o último elo da cadeia, aquele que recebe o produto ou beneficia da prestação.

28.   Esta exigência estrutural conduz a que aquele que intervém numa fase intermédia do processo deduza o tributo suportado, tal como se prevê no artigo 17.°, n.os 1 e 2, da Sexta Directiva. Depois de pago o imposto e utilizados os bens ou serviços para as necessidades das suas operações tributáveis, pode deduzir o imposto. Assim, se os utilizar em actividades não sujeitas ou isentas, não haverá qualquer exigibilidade e o direito à dedução não existe, uma vez que não há obrigação tributária (10).

29.   Nesta linha, o acórdão BLP Group (11) declarou que, com excepção dos casos expressamente previstos, o sujeito passivo que, para efectuar uma operação isenta, utilizar um serviço relativamente ao qual liquidou o IVA não tem direito de deduzir o IVA pago a montante, mesmo quando pretenda efectuar uma operação sujeita a imposto.

B –    Regime transitório na circulação intracomunitária de bens

30.   Indiquei no n.° 11 das presentes conclusões que a Sexta Directiva foi alterada pela Directiva 91/680/CEE, para, depois de suprimidos os controlos fiscais nas fronteiras internas, facilitar a passagem para um regime definitivo de tributação das trocas no sistema comum do IVA, tributando as trocas no Estado‑Membro de origem. No entanto, uma vez que em 31 de Dezembro de 1992 (dia que antecedeu essa supressão) não estavam reunidas as condições necessárias, manteve‑se durante um determinado período, ainda em curso, a regra da tributação no destino. Por este motivo, o artigo 28.°‑C, A, alínea a), introduz a dispensa das entregas intracomunitárias, fazendo tributar as aquisições desta classe no Estado‑Membro receptor.

31.   Por outras palavras, no percurso para a regulamentação definitiva são tributadas, a título temporário, as aquisições na Comunidade dos sujeitos passivos ou das pessoas colectivas que não revistam essa qualidade, entendendo‑se que efectuado o facto tributário no Estado‑Membro de chegada da expedição ou do transporte para o fornecimento das mercadorias [artigos 28.°‑A, n.° 1, alínea a), e 28.°‑B, A, n.° 1, da Sexta Directiva].

32.   Estas normas só se justificam por, ao se exigir o imposto no país de acolhimento, a neutralidade só ficar assegurada se se permitir àquele que o suporta que o repercuta ou deduza, uma vez que não reúne a condição de consumidor final, mas sim a de sujeito passivo que utiliza os bens em situações efectivamente tributadas.

33.   Neste processo de equiparação das trocas interestatais às puramente nacionais, desaparece, para efeitos fiscais, o tratamento que a passagem na fronteira provoca, pelo que a entrega no país de origem fica isenta do imposto [artigo 28.°‑C, A, alínea a)], uma vez que a recepção tributa no país de acolhimento uma pessoa que pode deduzir o imposto [artigo 28.°‑A, A, alínea a)], deixando que o fenómeno da repercussão continue o seu percurso em direcção ao destinatário.

34.   Adquire assim toda a lógica o artigo 17.°, n.° 3, alínea b), na redacção do artigo 28.°‑F, n.° 1, que autoriza o sujeito passivo a deduzir o IVA, quando emprega os bens ou os serviços para as necessidades da suas actividades isentas (12) nos termos do artigo 28.°‑C, A, pois aquele que efectuar a passagem de um Estado‑Membro para outro sairá «ileso», como se não tivesse existido nem intervindo.

C –    Conflito de normas inexistente

35.   A presente discussão, baseada na índole intracomunitária da transacção, perde sentido quando a dispensa, ao abrigo do artigo 13.° da Sexta Directiva, se refere à natureza do negócio.

36.   Se numa entrega transfronteiriça não sujeita a tributo, que também não o estaria se tivesse dimensão puramente interna, o sujeito passivo deduzisse o IVA, criar‑se‑ia uma vantagem anticoncorrencial em benefício de quem actua a partir do exterior, desfazendo‑se o equilíbrio procurado (13), que pretende não apenas que os elos intermédios da cadeia recuperem o imposto para que a tributação incida exclusivamente sobre o destinatário, mas que procura também um tratamento igualitário (14), à margem da cadeia em que cada empresário se encontra e do lugar da Comunidade a partir do qual intervém (15).

37.   Por outras palavras: admite‑se a dedução do IVA repercutido nas fases anteriores unicamente pela sua qualidade de intracomunitárias e não por outros critérios; é desta forma que se entende que não se aceite a dedução para as isenções do artigo 28.°‑C, B, alínea a), ou seja, para as aquisições transfronteiriças de mercadorias cuja entrega efectuada por sujeitos passivos estivesse dispensada num Estado, excepto se, como referido no artigo 17.°, n.° 3, alínea a), não obstante a sua transcendência interna, tivessem dado lugar à exigibilidade.

38.   Isto é reforçado pela alínea c) do artigo 17, n.° 3, que reconhece especificamente o direito de deduzir o imposto pago em determinadas isenções do artigo 13.°, B, quando o negócio ultrapassa as fronteiras da Comunidade. A referida alínea c) seria desnecessária, como alegam a Eurodental e o Governo alemão, essas isenções, ao alcançarem dimensão internacional, ficassem directamente abrangidas pelo artigo 17.°, n.° 3, alínea b).

39.   A Comissão explica este entendimento de forma extremamente clara nas observações escritas deste incidente prejudicial ao argumentar que, se se atribuísse à Eurodental a possibilidade de dedução, outorgar‑se‑lhe‑ia uma situação de privilégio relativamente aos concorrentes que intervêm no mercado nacional e que não beneficiam desta possibilidade, incentivando a fraude e encorajando as sociedades a deslocarem‑se para Estados‑Membros diferentes daquele em que efectivamente desenvolvem a sua actividade.

40.   O Governo alemão alega correctamente que, se se tivesse optado, nos termos do artigo 28.°, n.° 3, alínea a), por deduzir no seu país as transacções relativas às próteses dentárias, as transacções de âmbito intracomunitário poderiam ser mais gravosas para o consumidor, uma vez que são tributadas na Alemanha e não há dedução do IVA pago no Luxemburgo (16). Mas este efeito, provocado pela falta de harmonização total deste imposto indirecto, provém da legítima opção das autoridades alemãs, que, transitoriamente, deixaram fora do regime comum determinadas actividades, pelo que têm de assumir as consequências (17). Não parece admissível consagrar um corte geral do princípio da neutralidade e da coerência do sistema apelando a uma particularidade nacional livremente escolhida (18), que passaria para o fisco de outros Estados‑Membros, neste caso o luxemburguês, o encargo financeiro decorrente dessa decisão unilateral.

41.   Atendendo ao teor da redacção original dos artigos 15.°, n.° 3, e 17.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, as considerações relativas às entregas de bens, tanto antes como depois de 1 de Janeiro de 1993, também são aplicáveis às prestações de serviços anteriores a essa data, referidas na segunda questão prejudicial.

42.   Em definitivo, uma operação intracomunitária isenta não dá origem ao direito de deduzir o imposto pago se, ao se limitar ao âmbito nacional, o negócio também beneficiar da dispensa devido ao seu conteúdo (19).

VI – Conclusão

43.   À luz do acima exposto, proponho ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre as questões prejudiciais formuladas pela Cour d’appel do Grão‑Ducado do Luxemburgo, declarando que:

«As entregas de bens e as prestações de serviços a que se refere o artigo 13.°, A, n.° 1, alínea e), da Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, Sexta Directiva relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, estão isentas nos termos do referido preceito, mesmo quando se trate de operações intracomunitárias, reguladas nos artigos 15.°, n.os 1, 2 e 3 (na redacção original e na da Directiva 91/680/CEE), e 28.°‑C, A, alínea a), sem que, por conseguinte, dêem lugar à dedução prevista no artigo 17.°»


1 – Língua original: espanhol.


2 – Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54).


3 – Esta disposição foi introduzida pela Directiva 91/680/CEE do Conselho, de 16 de Dezembro de 1991, que completa o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e altera, tendo em vista a abolição das fronteiras fiscais, a Sexta Directiva 77/388/CEE (JO L 376, p. 1).


4 – A «prestação de serviços» constitui uma categoria residual, que inclui qualquer contrato que não reúna os requisitos da entrega de bens (artigo 6.° da Sexta Directiva).


5 – BGBl. 1991, p. 351.


6 – Nas conclusões do processo no qual se proferiu o acórdão de 16 de Setembro de 2004, Cimber Air (C‑382/02, Colect., p. I‑8379), refiro que «[n]o tráfego internacional de bens impera o denominado princípio de tributação no local de destino ou de consumo final. Em consequência, se se pretender evitar a ‘exportação’ de impostos indirectos do país de origem – o que implicaria a existência de uma dupla tributação –, há que estabelecer um regime de isenção das transacções externas» (n.° 17).


7 – Os terceiro, oitavo e nono considerandos da Directiva 91/680 referem este objectivo.


8 – Mémorial A 1979, p. 186.


9 – O pedido da Eurodental improcedeu porque, segundo os tribunais luxemburgueses, não foram apresentados os documentos necessários.


10 – Para uma análise da mecânica das deduções no IVA, consulte‑se Alguacil Marí, P., e Orón Moratal, G., «La deducción en el IVA español y su adecuación a la Sexta Directiva», em Noticias/C.E.E., n.os 67 e 68, Agosto/Setembro de 1990, p. 101. Colmenar Valdés, S., «El derecho a la deducción en el IVA», na Revista de Derecho Financiero y Hacienda Pública, n.° 157, 1982, p. 327, sustenta que, «estando funcionalmente ligada a dedução do que foi pago na fase anterior àquilo que há que cumprir na seguinte, nos casos em que não existe obrigação tributária também não parece que deva existir dedução do que foi anteriormente suportado, uma vez que desapareceu a razão última que justificava o direito à dedução».


11 – Acórdão de 6 de Abril de 1995 (C‑4/94, Colect., p. I‑983).


12 – No litígio principal permitir‑se‑ia ao mecânico dentista descontar o tributo pago pelo material destinado a produzir a prótese, uma vez que o utiliza na sua actividade isenta.


13 – No presente processo, o profissional que fornece os seus produtos fora do Luxemburgo podia deduzir o IVA existente até à sua intervenção, situação que não é permitida ao profissional que opera dentro das fronteiras.


14 – Terra B., e Kajus, J., A Guide to the European VAT Directives, volume I, Introduction to European VAT and other indirect taxes, 2006, pp. 418 a 422, explicam que a neutralidade do IVA constitui uma ideia complexa, que abrange uma importância legal, para conferir um tratamento não discriminatório perante a lei, outra económica, para optimizar a eleição dos meios de produção, e uma terceira concorrencial, para não distorcer o mercado


15 – O acórdão de 26 de Setembro de 1996, Debouche (C‑302/93, Colect., p. I‑4495), especialmente no n.° 19, recusou a um agente económico que pratica actos isentos de se prevalecer da sua situação intracomunitária para recuperar o imposto, se este direito não lhe tivesse sido conferido no interior do país.


16 – Numa situação como a do litígio principal, o paciente na Alemanha pagaria ao dentista uma factura que incluiria: a) o material utilizado para a produção no Luxemburgo da prótese, com o IVA correspondente (IVA residual); b) os honorários do mecânico dentista; e c) os honorários do dentista alemão. Desta forma, a repercussão económica seria maior para o consumidor final se não se permitisse a dedução do IVA residual, pelo que a solução, segundo o Governo alemão, passaria por a tolerar.


17 – O acórdão de 7 de Março de 2002, Comissão/Finlândia (C‑169/00, Colect., p. I‑2433), relembrou, no n.° 32, que as excepções previstas ao abrigo do artigo 28.°, n.° 3, não pertencem ao regime comum do IVA.


18 – Apenas outros dois países – a Bélgica e a Hungria – assumiram esta mesma opção.


19 – Esta é a solução sugerida pelo Comité Consultivo do Imposto sobre o Valor Acrescentado, criado ao abrigo do artigo 29.° da Sexta Directiva, na sua 60.ª reunião, que teve lugar em 20 e 21 de Março de 2000 (TAXUD/1876/00 – Rév. 1, Comité de la TVA, Orientations de la 60ème réunion, 20 et 21 mars 2000).

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