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Document 62003CJ0053

Acórdão do Tribunal (Grande Secção) de 31 de Maio de 2005.
Synetairismos Farmakopoion Aitolias & Akarnanias (Syfait) e outros contra GlaxoSmithKline plc e GlaxoSmithKline AEVE.
Pedido de decisão prejudicial: Epitropi Antagonismou - Grécia.
Admissibilidade - Conceito de órgão jurisdicional nacional - Abuso de posição dominante - Recusa em aprovisionar os grossistas de produtos farmacêuticos - Comércio paralelo.
Processo C-53/03.

Colectânea de Jurisprudência 2005 I-04609

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2005:333

Processo C‑53/03

Synetairismos Farmakopoion Aitolias & Akarnanias (Syfait) e o.

contra

GlaxoSmithKline plc      e      GlaxoSmithKline AEVE, anteriormente Glaxowellcome AEVE

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Epitropi Antagonismou)

«Admissibilidade – Conceito de órgão jurisdicional nacional – Abuso de posição dominante – Recusa em aprovisionar os grossistas de produtos farmacêuticos – Comércio paralelo»

Conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs apresentadas em 28 de Outubro de 2004 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 31 de Maio de 2005 

Sumário do acórdão

Questões prejudiciais – Submissão ao Tribunal de Justiça – Órgão jurisdicional nacional na acepção do artigo 234.° CE – Conceito – «Epitropi Antagonismou» (Direcção Geral da Concorrência da Grécia) – Exclusão

(Artigo 234.° CE)

Para apreciar se o órgão de reenvio possui a natureza de um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234.° CE, questão que releva unicamente do direito comunitário, o Tribunal de Justiça tem em conta um conjunto de elementos, tais como a origem legal do órgão, a sua permanência, o carácter obrigatório da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação, pelo órgão, das normas de direito, bem como a sua independência. Além disso, só um órgão que tenha de decidir um processo nele pendente, que deva conduzir a uma decisão de carácter jurisdicional, pode recorrer ao Tribunal de Justiça.

O Epitropi Antagonismou (Direcção Geral da Concorrência da Grécia) não preenche estes critérios. Em primeiro lugar, está sob a tutela do Ministro do Desenvolvimento, facto que implica que este esteja habilitado, dentro de certos limites, a fiscalizar a legalidade das suas decisões. Depois, muito embora os seus membros gozem de independência pessoal e funcional, não é menos verdade que a revogação ou a anulação da sua nomeação não parecem estar sujeitas a garantias especiais, facto que não parece adequado para impedir, de forma eficaz, as intervenções ou pressões indevidas do poder executivo em relação aos referidos membros. Além disso, o seu presidente está encarregado da coordenação e da orientação geral do seu secretariado e é o chefe hierárquico do pessoal deste mesmo secretariado, de modo que o Epitropi Antagonismou, órgão decisório, na medida em que tem uma ligação funcional com o seu secretariado, que é um órgão de instrução que emite as propostas com base nas quais o Epitropi Antagonismou decide, não se distingue claramente como terceiro relativamente ao órgão estatal que, pela sua função, pode aparentar‑se com uma parte no quadro de um processo em matéria de concorrência. Finalmente, uma autoridade de concorrência como o Epitropi Antagonismou é obrigada a trabalhar em estreita colaboração com a Comissão das Comunidades Europeias e pode, por força do artigo 11.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1/2003 relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado, ser privada de competência por decisão da Comissão, com a consequência de o processo pendente nessa autoridade não conduzir a uma decisão de carácter jurisdicional.

(cf. n.os 29‑37)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

31 de Maio de 2005 (*)

«Admissibilidade – Conceito de órgão jurisdicional nacional – Abuso de posição dominante – Recusa em aprovisionar os grossistas de produtos farmacêuticos – Comércio paralelo»

No processo C‑53/03,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Epitropi Antagonismou (Grécia), por decisão de 22 de Janeiro de 2003, entrado no Tribunal de Justiça em 5 de Fevereiro de 2003, no processo

Synetairismos Farmakopoion Aitolias & Akarnanias (Syfait) e o.,

Panellinios syllogos farmakapothikarion,

Interfarm – A. Agelakos & Sia OE e o.,

K. P. Marinopoulos Anonymos Etairia emporias kai dianomis farmakeftikon proïonton e o.

contra

GlaxoSmithKline plc,

GlaxoSmithKline AEVE, anteriormente Glaxowellcome AEVE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann, C. W. A. Timmermans, A. Rosas e R. Silva de Lapuerta, presidentes de secção, C. Gulmann (relator), R. Schintgen, N. Colneric e S. von Bahr, juízes,

advogado‑geral: F. G. Jacobs,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 18 de Maio de 2004,

vistas as observações escritas apresentadas:

–       em representação de Synetairismos Farmakopoion Aitolias & Akarnanias (Syfait) e o., por P. Kaponis e S. Orfanoudakis, dikigoroi,

–       em representação de Panellinios syllogos farmakapothikarion e K. P. Marinopoulos Anonymos Etairia emporias kai dianomis farmakeftikon proïonton e o., por L. Roumanias e G. Papaïoannou, dikigoroi, e W. Rehmann, Rechtsanwalt,

–       em representação de Farmakeftikos Syndesmos Anonymi Emporiki Etairia, por D. Chatzinikolis, dikigoros,

–       em representação de Interfarm A. Agelakos & Sia OE e o., por G. Mastorakos, dikigoros,

–       em representação da GlaxoSmithKline plc e da GlaxoSmithKline AEVE, por D. Kyriakis, dikigoros, I. Forrester, QC, e A. Schulz, Rechtsanwalt,

–       em representação do Governo sueco, por A. Kruse, na qualidade de agente,

–       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por T. Christoforou e F. Castillo de la Torre, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral apresentadas na audiência de 28 de Outubro de 2004,

profere o presente

Acórdão

1       O pedido de decisão prejudicial diz respeito à interpretação do artigo 82.° CE.

2       Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que, no Epitropi Antagonismou (comissão helénica da concorrência), opõe as denunciantes, a saber, as associações Synetairismos Farmakopoion Aitolias & Akarnanias (Syfait) e o. (a seguir «Syfait e o.») e Panellinios syllogos farmakapothikarion (a seguir «PSF»), bem como as sociedades Interfarm – A. Agelakos & Sia OE e o. (a seguir «Interfarm e o.») e K. P. Marinopoulos Anonymos Etairia emporias kai dianomis farmakeftikon proïonton e o. (a seguir «Marinopoulos e o.»), à sociedade de direito britânico GlaxoSmithKline plc (a seguir «GSK plc») e à sua filial de direito grego GlaxoSmithKline AEVE, anteriormente Glaxowellcome AEVE (a seguir «GSK AEVE»), relativamente à recusa de estas duas últimas sociedades satisfazerem as encomendas de determinados produtos farmacêuticos no mercado grego.

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

3       O artigo 82.° CE estabelece:

«É incompatível com o mercado comum e proibido, na medida em que tal seja susceptível de afectar o comércio entre os Estados‑Membros, o facto de uma ou mais empresas explorarem de forma abusiva uma posição dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste.

Estas práticas abusivas podem, nomeadamente, consistir em:

a)      Impor, de forma directa ou indirecta, preços de compra ou de venda ou outras condições de transacção não equitativas;

b)      Limitar a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores;

c)      Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando‑os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;

d)      Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objecto desses contratos.»

 Legislação nacional

4       O artigo 2.° da Lei n.° 703/1977, relativa ao controlo dos monopólios e dos oligopólios e à protecção da livre concorrência (FEK A’ 278), alterada pela Lei n.° 2941/2001 (FEK A’ 201, a seguir «Lei n.° 703/1977»), corresponde, no essencial, às disposições do artigo 82.° CE.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

5       Syfait e o. são associações de farmacêuticos estabelecidos no território da Grécia. A sua actividade principal é a gestão e a manutenção de um entreposto conjunto de produtos farmacêuticos que adquirem a diversas sociedades farmacêuticas, a fim de assegurar o aprovisionamento dos seus membros.

6       A PSF é uma associação de grossistas de produtos farmacêuticos estabelecidos no território da Grécia, que visa a protecção dos interesses dos seus membros.

7       As sociedades Interfarm e o. são grossistas de produtos farmacêuticos estabelecidos no território da Grécia. Marinopoulos e o. são sociedades de distribuição de produtos farmacêuticos que operam na Grécia.

8       A GSK AEVE tem sede na Grécia e é totalmente controlada pela GSK plc, sociedade de produção de produtos farmacêuticos estabelecida no Reino Unido, resultante da fusão, ocorrida em 2000, das sociedades Glaxowellcome plc e SmithKline Beecham.

9       A GSK AEVE importa e distribui numerosas especialidades farmacêuticas, entre as quais os medicamentos Imigran, Lamictal e Serevent. Estes medicamentos são medicamentos originais, resultantes da investigação e da tecnologia, pertencentes à categoria dos medicamentos sujeitos a receita médica.

10     Os membros de Syfait e o. e da PSF, bem como as sociedades Interfarm e o. e Marinopoulos e o., compram à GSK AEVE, nomeadamente, os referidos medicamentos, em todas as suas formas de apresentação, para os distribuírem depois no mercado nacional e no estrangeiro.

11     Até Novembro de 2000, a GSK AEVE satisfez todas as encomendas que lhe foram feitas. Uma grande parte dos fornecimentos correspondentes a estas encomendas foi reexportada para outros Estados‑Membros, em especial para o Reino Unido, devido ao preço sensivelmente mais baixo dos medicamentos Imigran, Lamictal e Serevent na Grécia.

12     A partir do início do mês de Novembro de 2000, a GSK AEVE invocou situações de grave escassez no mercado grego, causadas, segundo ela, pela reexportação por terceiros, para modificar o seu sistema de distribuição na Grécia e deixar de satisfazer as encomendas das denunciantes no processo principal e as de terceiros. Declarou que passaria a fornecer directamente os hospitais e as farmácias.

13     Em Fevereiro de 2001, considerando que o aprovisionamento de medicamentos tinha, em certa medida, sido normalizado e que os stocks dos hospitais e das farmácias tinham sido reconstituídos, a GSK AEVE substituiu o método de venda anterior por outro sistema de distribuição.

14     As denunciantes no processo principal submeterem ao Epitropi Antagonismou a questão da comercialização pela GSK AEVE dos medicamentos Imigran, Lamictal e Serevent no mercado grego, no quadro dos sistemas de distribuição que se sucederam desde Novembro de 2000. Acusaram esta sociedade de não ter satisfeito integralmente as encomendas que lhe foram feitas. Tal comportamento constitui, segundo elas, um abuso de posição dominante, na acepção do artigo 2.° da Lei n.° 703/1977 e do artigo 82.° CE.

15     Em 3 de Agosto de 2001, o Epitropi Antagonismou, por decisão n.° 193/111, relativa a medidas provisórias, determinou que a GSK AEVE, até ser tomada uma decisão no processo principal, deveria satisfazer as encomendas relativas aos três medicamentos em causa. A GSK AEVE requereu ao Dioikitiko Efeteio Athinon (tribunal administrativo de segunda instância de Atenas) que suspendesse esta decisão, mas este tribunal veio a confirmá‑la por sentença de 10 de Janeiro de 2002, pelo que aquela decisão se mantinha em vigor à data da decisão de reenvio.

16     O Epitropi Antagonismou indica que a GSK AEVE cumpriu as medidas provisórias ordenadas pela decisão n.° 193/111, pelo menos na medida em que foi aprovisionada pela GSK plc. Este aprovisionamento terá sido superior às necessidades de consumo do mercado nacional. As provas apresentadas ao Epitropi Antagonismou pela GSK AEVE demonstram contudo que as encomendas ultrapassaram consideravelmente esse nível, em particular em Setembro de 2001, de forma que nem todas as encomendas puderam ser satisfeitas.

17     Na sua decisão de reenvio, o Epitropi Antagonismou esclarece que a GSK AEVE e a GSK plc agiram de acordo com a circular emitida em 27 de Novembro de 2001 pelo Ethnikos Organismos Farmakon (instituto nacional dos produtos farmacêuticos), de acordo com a qual todos os intervenientes na distribuição de medicamentos sujeitos a receita médica «devem aprovisionar o mercado nacional em quantidades, pelo menos, iguais às prescritas […] acrescidas de uma percentagem determinada (25%) com o objectivo de cobrir as necessidades extraordinárias e as que possam resultar de uma eventual alteração das circunstâncias».

18     Além disso, a GSK AEVE apresentou, em 5 de Dezembro de 2001, ao Epitropi Antagonismou um pedido de certidão negativa, nos termos do artigo 11.° da Lei n.° 703/1977, relativamente à sua recusa de cobrir mais de 125% das necessidades do mercado grego.

19     Tendo de apreciar simultaneamente este pedido de certidão negativa da GSK AEVE e as queixas de Syfait e o., da PSF, de Interfarm e o. e de Marinopoulos e o. contra a GSK AEVE e a GSK plc, o Epitropi Antagonismou pergunta em que medida a recusa de estas duas sociedades satisfazerem plenamente as encomendas feitas pelas referidas denunciantes constitui um abuso de posição dominante, na acepção do artigo 82.° CE. Não se verificando esse abuso, o Epitropi Antagonismou afirma poder determinar em que medida estão preenchidas as condições de emissão da certidão negativa solicitada pela GSK AEVE.

20     Nestas circunstâncias, o Epitropi Antagonismou decidiu suspender a instância e colocar ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      A recusa de uma empresa em posição dominante satisfazer integralmente as encomendas que lhe são feitas pelos grossistas farmacêuticos, recusa essa que se deve à sua tentativa de limitar a actividade exportadora desses grossistas e de limitar, assim, os prejuízos que lhe advêm da comercialização paralela é, em si mesma, abusiva, na acepção do artigo 82.° CE? A resposta a esta questão é influenciada pelo facto de a comercialização paralela se revelar particularmente lucrativa para as sociedades grossistas devido às divergências nos preços ditadas por intervenção estatal nos Estados‑Membros da União Europeia, isto é, devido ao facto de, no mercado dos produtos farmacêuticos, não existirem condições de concorrência estritas, mas um sistema que é regulado, em grande medida, por intervenção estatal? Finalmente, uma autoridade nacional de concorrência tem como missão aplicar as regras comunitárias da concorrência, do mesmo modo, em mercados que funcionam de forma competitiva e em mercados em que a concorrência é distorcida por intervenções estatais?

2)      Caso o Tribunal de Justiça considere que a restrição da comercialização paralela, pelas razões acima indicadas, não constitui sempre uma prática abusiva quando é executada por uma empresa em posição dominante, como deve ser apreciada uma eventual exploração abusiva dessa posição?

Mais precisamente:

a)      O critério a utilizar é o da percentagem em que é excedido o consumo interno normal e/ou o prejuízo sofrido pela empresa em posição dominante em relação ao seu volume de negócios global e aos lucros totais? Caso seja dada resposta afirmativa a esta questão, como determinar o montante desse excesso e o montante desse prejuízo – considerando este último uma percentagem do volume de negócios e dos lucros totais – acima dos quais se torna abusivo o comportamento em causa?

b)      Deve ser seguida uma abordagem fundada na ponderação dos interesses em jogo e, em caso afirmativo, quais os interesses que devem ser objecto de ponderação?

Mais precisamente:

i)      Influencia a resposta o facto de o consumidor‑doente final retirar um benefício financeiro limitado da comercialização paralela?

ii)      Devem ser tidos em conta, e até que ponto, os interesses dos organismos de segurança social em medicamentos mais baratos?

c)      Que outros critérios e que outras abordagens são consideradas indicadas no presente caso?»

 Quanto à competência do Tribunal de Justiça

21     A título liminar, deve apreciar‑se a questão de saber se o Epitropi Antagonismou é um órgão jurisdicional nacional na acepção do artigo 234.° CE e se, por consequência, o Tribunal de Justiça tem competência para se pronunciar sobre as questões que lhe são colocadas.

 A legislação nacional relativa ao Epitropi Antagonismou

22     O artigo 8.°, n.° 1, da Lei n.° 703/1977 estabelece:

«É criado um Epitropi Antagonismou que funciona como autoridade independente. Os seus membros gozam de independência pessoal e funcional e, no exercício das suas funções, apenas estão sujeitos à lei e à sua consciência. O Epitropi Antagonismou tem autonomia administrativa e financeira e fica submetido à tutela do Ministro [...] [do Desenvolvimento].»

23     O Epitropi Antagonismou é composto por nove membros designados de acordo com a composição prevista no artigo 8.°, n.° 3, da Lei n.° 703/1977. Quatro membros, assim como os seus suplentes, são escolhidos pelo ministro com base em listas de três candidatos apresentadas, respectivamente, por quatro organizações profissionais. Os outros membros incluem um membro do Conselho Jurídico do Estado ou qualquer alto magistrado, dois professores universitários, dos quais um jurista e outro economista, bem como duas personalidades reconhecidas com experiência em direito económico e em política da concorrência. Nos termos do artigo 8.°, n.° 5, da Lei n.° 703/1977, os membros do Epitropi Antagonismou, assim como os seus suplentes, são nomeados pelo Ministro do Desenvolvimento por um mandato de três anos.

24     Nos termos do artigo 8.°, n.° 6, da referida lei:

«O presidente do Epitropi Antagonismou e o seu suplente são designados pelo Ministro [do Desenvolvimento], de entre os membros [do Epitropi Antagonismou]. […] O presidente do Epitropi Antagonismou é um funcionário do Estado e exerce essa função em exclusividade por toda a duração do seu mandato […]»

25     Segundo o artigo 8.°, n.° 7, da Lei n.° 703/1977:

«Durante o seu mandato, o presidente e os membros não podem exercer nenhuma outra função pública ou uma actividade profissional privada, no âmbito de uma empresa ou não, com ou sem remuneração, que seja incompatível com as suas funções e com os deveres decorrentes da sua qualidade de membros do Epitropi Antagonismou.»

26     No que se refere às relações entre o Epitropi Antagonismou e o seu Secretariado, o artigo 8.° c, n.° 1, alínea b), da referida lei estabelece:

«O presidente coordena e dirige o Secretariado [do Epitropi Antagonismou].»

27     O artigo 8.° c, n.° 1, alínea d), da referida lei prevê:

«O presidente é o chefe hierárquico do pessoal do Secretariado do Epitropi Antagonismou e exerce o respectivo poder disciplinar.»

28     Segundo o n.° 3 deste mesmo artigo 8.° c, o presidente do Epitropi Antagonismou pode delegar no director‑geral ou nos directores do Secretariado do Epitropi Antagonismou o exercício de uma parte dos seus poderes. O director‑geral do Secretariado é nomeado por três anos renováveis, por decisão do Ministro do Desenvolvimento, mediante parecer favorável do Epitropi Antagonismou, tal como previsto no artigo 8.° d, n.° 1, segunda frase, da Lei n.° 703/1977.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

29     Segundo jurisprudência constante, para apreciar se o organismo de reenvio possui a natureza de um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234.° CE, questão que releva unicamente do direito comunitário, o Tribunal de Justiça tem em conta um conjunto de elementos, tais como a origem legal do órgão, a sua permanência, o carácter obrigatório da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação, pelo órgão, das normas de direito, bem como a sua independência (v., designadamente, acórdãos de 17 de Setembro de 1997, Dorsch Consult, C‑54/96, Colect., p. I‑4961, n.° 23; de 21 de Março de 2000, Gabalfrisa e o., C‑110/98 a C‑147/98, Colect., p. I‑1577, n.° 33; de 30 de Novembro de 2000, Österreichischer Gewerkschaftsbund, C‑195/98, Colect., p. I‑10497, n.° 24; e de 30 de Maio de 2002, Schmid, C‑516/99, Colect., p. I‑4573, n.° 34). Além disso, os órgãos jurisdicionais nacionais só podem recorrer ao Tribunal de Justiça se perante eles se encontrar pendente um litígio e se forem chamados a pronunciar‑se no âmbito de um processo que deva conduzir a uma decisão de carácter jurisdicional (v., designadamente, acórdãos de 12 de Novembro de 1998, Victoria Film, C‑134/97, Colect., p. I‑7023, n.° 14, e Österreichischer Gewerkschaftsbund, já referido, n.° 25).

30     A este respeito, deve salientar‑se, em primeiro lugar, que o Epitropi Antagonismou está sob a tutela do Ministro do Desenvolvimento. Ora, tal tutela implica que este ministro esteja habilitado, dentro de certos limites, a fiscalizar a legalidade das decisões do Epitropi Antagonismou.

31     Em segundo lugar, muito embora os membros do Epitropi Antagonismou gozem, nos termos da Lei n.° 703/1977, de independência pessoal e funcional e, no exercício das suas funções, apenas estejam sujeitos à lei e à sua consciência, não é menos verdade que a revogação ou a anulação da sua nomeação não parecem estar sujeitas a garantias especiais. Ora, tal sistema não parece adequado para impedir, de forma eficaz, as intervenções ou pressões indevidas do poder executivo relativamente aos membros do Epitropi Antagonismou (v., neste sentido, o acórdão de 4 de Fevereiro de 1999, Köllensperger e Atzwanger, C‑103/97, Colect., p. I‑551, n.° 21).

32     Deve ainda recordar‑se que, de acordo com o artigo 8.° c, n.° 1, alíneas b) e d), da mesma lei, por um lado, o presidente do referido organismo está encarregado da coordenação e da orientação geral do Secretariado e, por outro, é o chefe hierárquico do pessoal deste mesmo Secretariado, exercendo poder disciplinar sobre o mesmo.

33     A este respeito, importa salientar que o Tribunal de Justiça, nos n.os 39 e 40 do acórdão Gabalfrisa e o., já referido, considerou que os Tribunales Económico‑Administrativos (Espanha) eram terceiros relativamente aos serviços da Administração Fiscal encarregados da gestão, da cobrança e da liquidação do IVA, designadamente devido à separação funcional existente entre eles. Ora, o Epitropi Antagonismou, órgão decisório, na medida em que tem uma ligação funcional com o seu Secretariado, que é um órgão de instrução que emite as propostas com base nas quais o Epitropi Antagonismou decide, não se distingue claramente como terceiro relativamente ao órgão estatal que, pela sua função, pode aparentar‑se com uma parte no quadro de um processo em matéria de concorrência.

34     Finalmente, importa recordar que uma autoridade de concorrência como o Epitropi Antagonismou é obrigada a trabalhar em estreita colaboração com a Comissão das Comunidades Europeias e pode, por força do artigo 11.°, n.° 6, do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003, L 1, p. 1), ser privada de competência por decisão da Comissão. Neste contexto, deve referir‑se que o artigo 11.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1/2003 mantém, em substância, a regra do artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.°] e [82.°] do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), segundo a qual as autoridades de concorrência dos Estados‑Membros são automaticamente privadas de competência quando a Comissão der início a um processo (v., a este respeito, o décimo sétimo considerando do Regulamento n.° 1/2003).

35     Ora, só uma entidade que tenha de decidir um processo nela pendente, que deva conduzir a uma decisão de carácter jurisdicional, pode recorrer ao Tribunal de Justiça (v. acórdãos, já referidos, Victoria Film, n.° 14, e Österreichischer Gewerkschaftsbund, n.° 25).

36     Sempre que a Comissão fizer cessar a competência de uma autoridade nacional da concorrência como o Epitropi Antagonismou, o processo pendente nessa autoridade não conduzirá a uma decisão de carácter jurisdicional.

37     Das razões expostas, globalmente apreciadas, decorre que o Epitropi Antagonismou não tem natureza jurisdicional, na acepção do artigo 234.° CE.

38     Assim, o Tribunal de Justiça não tem competência para responder às questões que lhe foram submetidas pelo Epitropi Antagonismou.

 Quanto às despesas

39     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o Epitropi Antagonismou, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias não tem competência para responder às questões que lhe foram submetidas pelo Epitropi Antagonismou, por decisão de 22 de Janeiro de 2003.

Assinaturas


* Língua do processo: grego.

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