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Document 62001CC0342

    Conclusões do advogado-geral Mischo apresentadas em 3 de Abril de 2003.
    María Paz Merino Gómez contra Continental Industrias del Caucho SA.
    Pedido de decisão prejudicial: Juzgado de lo Social nº 33 de Madrid - Espanha.
    Política social - Igualdade de tratamento entre homens e mulheres - Licença por maternidade - Trabalhador feminino cuja licença por maternidade coincide com as férias anuais de todo o pessoal, fixadas num acordo colectivo em matéria de férias anuais.
    Processo C-342/01.

    Colectânea de Jurisprudência 2004 I-02605

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2003:199

    Conclusions

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL
    JEAN MISCHO
    apresentadas em 3 de Abril de 2003(1)



    Processo C‑342/01



    María Paz Merino Gómez
    contra
    Continental Industrias del Caucho SA


    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Juzgado de lo Social de Madrid (Espanha)]

    «Política social – Igualdade de tratamento entre homens e mulheres – Licença de maternidade – Trabalhador feminino cuja licença de maternidade coincide com o período de encerramento anual do seu local de trabalho, acordado numa convenção colectiva em matéria de férias anuais»






    I – Introdução

    1.        Uma trabalhadora cuja licença de maternidade coincida com o período fixado por acordo colectivo para as férias anuais dos trabalhadores da empresa terá o direito de beneficiar integralmente das férias anuais num período diferente do convencionado por esse acordo? Tal é o problema submetido, no caso concreto, pelo Juzgado de lo Social de Madrid (Espanha).

    II – O enquadramento jurídico

    A – O direito comunitário

    2.        Para resolver o problema suscitado pelo órgão jurisdicional nacional, o Tribunal de Justiça é chamado a interpretar um certo número de disposições da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho  (2) , da Directiva 92/85/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho (décima directiva especial na acepção do n.° 1 do artigo 16.° da Directiva 89/391/CEE)  (3) , bem como da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho  (4) .

    1. A Directiva 93/104

    3.        O artigo 7.° desta directiva dispõe:

    «Férias anuais

    1.
    Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que todos os trabalhadores beneficiem de férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas, de acordo com as condições de obtenção e de concessão previstas nas legislações e/ou práticas nacionais.

    2.
    O período mínimo de férias anuais remuneradas não pode ser substituído por retribuição financeira, excepto nos casos de cessação da relação de trabalho.»

    4.        O artigo 15.° desta directiva prevê:

    «Disposições mais favoráveis

    A presente directiva não impede os Estados‑Membros de aplicarem ou introduzirem disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis à protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores, ou de promoverem ou permitirem a aplicação de convenções colectivas ou acordos celebrados entre parceiros sociais mais favoráveis à protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores.»

    2. A Directiva 92/85

    5.        O artigo 2.° desta directiva dá definições gerais dos conceitos de «trabalhadora grávida», de «trabalhadora puérpera» e de «trabalhadora lactante» para efeitos desta directiva.

    6.        O n.° 1 do artigo 8.° da referida directiva lê‑se como se segue:

    «Licença de maternidade

    1.
    Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que as trabalhadoras referidas no artigo 2.° beneficiem de uma licença de maternidade de, pelo menos, 14 semanas consecutivas, a gozar antes e/ou depois do parto em conformidade com as legislações e/ou práticas nacionais.»

    7.        O artigo 11.° da mesma directiva dispõe:

    «Direitos decorrentes do contrato de trabalho

    A fim de garantir às trabalhadoras, na acepção do artigo 2.°, o exercício dos direitos de protecção da sua segurança e saúde reconhecidos pelo presente artigo, prevê‑se que:

    [...]

    2.
    No caso referido no artigo 8.°:

    a)
    Devem ser garantidos os direitos decorrentes do contrato de trabalho das trabalhadoras referidas no artigo 2.° não referidos na alínea b) do presente ponto;

    b)
    Devem ser garantidos a manutenção de uma remuneração e/ou o benefício de uma prestação adequada às trabalhadoras, na acepção do artigo 2.°

    [...]»

    3. A Directiva 76/207

    8.        O n.° 1 do artigo 2.° desta directiva prevê:

    «O princípio da igualdade de tratamento, na acepção das disposições adiante referidas, implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer directa, quer indirectamente, nomeadamente pela referência à situação matrimonial ou familiar.»

    9.        O n.° 1 do artigo 5.° da referida directiva lê‑se como se segue:

    «A aplicação do princípio da igualdade de tratamento no que se refere às condições de trabalho, incluindo as condições de despedimento, implica que sejam asseguradas aos homens e às mulheres as mesmas condições, sem discriminação em razão do sexo.»

    B – O direito interno

    1. A lei aplicável

    10.      O artigo 38.° do Estatuto de los Trabajadores (Estatuto dos Trabalhadores) aprovado pelo Real Decreto Legislativo n.° 1/1995, de 24 de Março (BOE n.° 75, de 29 de Março de 1995, com a última modificação de 9 de Julho de 2001), dispõe:

    «1.
    O período de férias anuais remuneradas, que não pode ser substituído por compensação económica, será o estabelecido por convenção colectiva ou contrato individual. Em caso algum a sua duração poderá ser inferior a trinta dias de calendário.

    2.
    O período ou períodos em que se gozam serão fixados de comum acordo entre o empresário e o trabalhador, em conformidade com o estabelecido, tal sendo o caso, nas convenções colectivas sobre a planificação anual de férias.

    [...]»

    11.      O n.° 4 do artigo 48.° do Estatuto de los Trabajadores tal como resulta da Ley 39/1999 para promover la Conciliacíon de la Vida familiar y laboral de las Personas trabajadoras (lei destinada a promover a conciliação da vida familiar e da vida profissional dos trabalhadores, de 5 de Novembro de 1999)  (5) .

    «Em caso de parto, o contrato é suspenso por um período ininterrupto de dezasseis semanas, que pode ser prorrogado, em caso de nascimentos múltiplos, de duas semanas por cada filho a partir do segundo. O período de licença é repartido à escolha da interessada, desde que seis semanas se sigam imediatamente ao parto [...]»

    2. A convenção colectiva e o acordo colectivo

    12.      As relações entre a sociedade Continental Industrial del Caucho SA, fabricante de pneus, e os seus trabalhadores regem‑se pela convenção colectiva para a indústria química. Esta última prevê, no artigo 46.°, relativo à suspensão do contrato por causa de maternidade, um período de 16 semanas equivalente ao período legal. O artigo 43.° da mesma convenção regula as férias e a sua duração, que é de trinta dias de calendário, especificando que, pelo menos 15 dias devem ser gozados de forma ininterrupta entre os meses de Junho e de Setembro.

    13.      Por acordo colectivo celebrado entre a demandada e os representantes dos trabalhadores em 7 de Maio de 2001 (a seguir «acordo colectivo») – que é o resultado de uma conciliação obtida por ocasião de um procedimento de resolução de um conflito colectivo, instaurado a pedido da representação dos trabalhadores – foram fixados dois períodos gerais para as férias do pessoal, o primeiro de 16 de Julho a 12 de Agosto de 2001 e o segundo de 6 de Agosto a 2 de Setembro de 2001.

    14.      Esse acordo prevê igualmente que, a título excepcional, seis trabalhadores possam gozar as férias no mês de Setembro. Relativamente a esse período de férias excepcional, é dada preferência aos trabalhadores que não puderam escolher as datas das suas férias no ano precedente.

    III – Os factos e o litígio no processo principal

    15.      M. P. Merino Gómez está empregada na sociedade demandada desde 12 de Setembro de 1994. A sua licença de maternidade começou em 5 de Maio de 2001 e terminou em 24 de Agosto de 2001.

    16.      M. P. Merino Gómez pediu para gozar as suas férias anuais de 25 de Agosto a 21 de Setembro de 2001 ou, a título subsidiário, de 1 de Setembro a 27 de Setembro de 2001, ou seja, um período consecutivo ao da sua licença de maternidade. Ora, como vimos, o acordo colectivo previa que, a título excepcional, seis trabalhadores pudessem gozar as férias no mês de Setembro, sendo dada preferência aos trabalhadores que não tivessem podido escolher as datas das suas férias no ano anterior. A demandante pôde escolher as datas das suas férias em 2000 e, por conseguinte, em conformidade com o referido acordo, ela não teria, normalmente, podido gozar as suas férias durante o período excepcional compreendido entre 1 e 30 de Setembro de 2001.

    17.      A sociedade demandada recusou conceder o período de férias pedido.

    18.      Em 6 de Junho de 2001, M. P. Merino Gómez propôs no Juzgado de lo Social de Madrid uma acção contra a demandada para obter a licença que ela exigia.

    19.      O tribunal de reenvio evoca a jurisprudência desenvolvida por um certo número de órgãos jurisdicionais espanhóis que tiveram de conhecer de processos relativos a uma sobreposição entre a data da licença de maternidade e a fixada colectivamente para as férias do pessoal. Segundo essa jurisprudência, em tais casos, a trabalhadora não teria o direito de gozar as suas férias anuais num período distinto do fixado pelo acordo colectivo concluído na empresa, pois o respeito do que foi assim acordado em convenção tem primazia sobre o direito às férias individuais da trabalhadora.

    20.      O juiz de reenvio não partilha dessa opinião e invoca o direito comunitário e a jurisprudência do Tribunal de Justiça que, em seu entender, confirmam o ponto de vista da demandada. Considera necessário interrogar o Tribunal de Justiça quanto ao princípio e à extensão dos direitos, decorrentes da lei ou de convenção, de M. P. Merino Gómez, submetendo‑lhe duas questões prejudiciais.

    IV – Questão de direito

    A – A primeira questão prejudicial

    21.      Esta enuncia:

    «Quando os acordos colectivos celebrados entre a empresa e os representantes dos trabalhadores estabelecem as datas de gozo de férias para todo o pessoal e se demonstra que são coincidentes com as da licença de maternidade de uma trabalhadora, o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 93/104, o artigo 11.°, n.° 2, alínea a), da Directiva 92/85 e o artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 76/207 asseguram o direito desta trabalhadora a gozar as suas férias anuais em período diferente do acordado e não coincidente com o da sua licença por maternidade?»

    22.      Contra a jurisprudência nacional evocada, o juiz de reenvio invoca a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao artigo 7.° da Directiva 93/104  (6) , ao artigo 8.° da Directiva 92/85  (7) e à Directiva 76/207  (8) .

    23.      O juiz de reenvio considera que resulta dessa jurisprudência que o princípio da igualdade de tratamento e da não discriminação da mulher grávida ou lactante exige que uma trabalhadora tenha o direito de gozar as suas férias anuais num período distinto não coincidente com o da sua licença de maternidade, se as datas deste coincidirem com as datas das férias anuais previamente fixadas por acordo colectivo entre a empresa e a representação dos trabalhadores. Admitir a sobreposição das duas licenças implicaria a anulação de uma das duas, neste caso, das férias anuais.

    24.      Segundo o juiz de reenvio, o facto de as datas de férias para o pessoal terem sido fixadas previamente por acordo colectivo não constitui obstáculo a tal conclusão. Para dar cumprimento à regulamentação comunitária que garante o princípio da igualdade de tratamento e de não discriminação e o direito às férias anuais, aquele acordo deveria ter previsto a situação específica das trabalhadoras grávidas da empresa, garantindo‑lhes o duplo direito à licença de maternidade e às férias anuais. Baseando‑se no acórdão Lewen  (9) , o juiz de reenvio considera que, não o fazendo, o referido acordo violou o direito comunitário aplicável.

    25.      M. P. Merino Gómez, os Governos espanhol e italiano bem como a Comissão propõem que se responda à primeira questão em sentido afirmativo.

    26.     M. P. Merino Gómez alega que as Directivas 93/104, 92/85 e 76/207 não permitem que se confundam licença de maternidade e férias anuais e opõem‑se a uma absorção da primeira pelas segundas. Considera que a protecção do direito à maternidade deve prevalecer sobre qualquer convenção colectiva. A confusão com outro direito como o relativo às férias anuais constitui uma ofensa ao seu direito fundamental à maternidade. É que qualquer interpretação deve garantir a proibição de discriminação em razão do sexo, que faz parte dos princípios fundamentais.

    27.      Para o Governo espanhol, cujo ponto de vista corresponde largamente ao do juiz de reenvio, as Directivas 93/104, 92/85 e 76/207 garantem o direito de uma trabalhadora a beneficiar das suas férias anuais num período distinto do acordado na convenção e não coincidente com o da sua licença de maternidade.

    28.      O Governo italiano refere‑se ao seu direito nacional, que, tanto pela interpretação jurisprudencial como pela implementação das directivas comunitárias, resolveu, em sentido mais favorável à trabalhadora, a questão da adição da licença de maternidade e das férias anuais. O Estado italiano teria, portanto, interesse em que a decisão a tomar assegurasse a homogeneidade do tratamento dos trabalhadores e dos custos que incumbem às empresas no quadro da União Europeia.

    29.      Nós partilhamos das observações atrás resumidas, mas aderimos mais particularmente ao raciocínio mais detalhado apresentado pela Comissão, que retomamos a seguir.

    30.      A Comissão salienta, com razão, que, para responder à questão submetida, deve examinar‑se, antes de mais, a natureza do direito reivindicado. O ponto de partida da análise deve ser o n.° 1 do artigo 7.° da Directiva 93/104 relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, que regulamenta o direito dos trabalhadores às férias anuais e prevê: «Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que todos os trabalhadores beneficiem de férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas [...]».

    31.      O Tribunal de Justiça teve ocasião de se pronunciar sobre a natureza e o alcance desse direito no seu acórdão BECTU  (10) em que afirmou que devia declarar‑se que o n.° 1 do artigo 7.° da Directiva 93/104 impõe aos Estados‑Membros uma obrigação clara e precisa. Trata‑se, ademais, de uma obrigação que não poderá ser derrogada, uma vez que o artigo 17.° da directiva enumera limitativamente as disposições que podem ser objecto de derrogações previstas pelos Estados‑Membros ou pelos parceiros sociais, e que o referido artigo 7.° não figura entre essas disposições. Assim, o Tribunal de Justiça concluiu:

    «Resulta de quanto precede que o direito a férias anuais remuneradas de cada trabalhador deve ser considerado um princípio do direito social comunitário que reveste especial importância, que não pode ser derrogado e cuja execução pelas autoridades nacionais competentes apenas pode ser efectuada dentro dos limites expressamente enunciados pela própria Directiva 93/104» 11  –Ibidem, n.° 43..

    32.      As férias anuais constituem, portanto, um direito do trabalhador que reveste carácter absoluto e não admite qualquer excepção nem derrogação, pelo que o n.° 1 do artigo 7.° da Directiva 93/104, segundo o qual os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias «de acordo com as condições de obtenção e de concessão previstas nas legislações e/ou práticas nacionais», deve ser entendido no sentido de que as regras de aplicação nacionais devem, de qualquer forma, respeitar esse direito fundamental  (12) .

    33.      O facto de, nos termos do n.° 2 do artigo 7.° da Directiva 93/104, o período mínimo de férias anuais remuneradas não poder ser substituído por retribuição financeira é uma prova suplementar de que as férias anuais remuneradas são um direito absoluto. Trata‑se do direito a um repouso real e efectivo, a fim de permitir ao trabalhador recuperar fisicamente, em conformidade com os objectivos de protecção da segurança e da saúde do trabalhador que são os da directiva.

    34.      Como corolário de todos os aspectos supramencionados do direito a um período mínimo de férias anuais remuneradas, o Tribunal de Justiça recordou  (13) que, segundo o quinto considerando da Directiva 93/104, «a melhoria da segurança, da higiene e da saúde dos trabalhadores no trabalho constitui um objectivo que não se pode subordinar a considerações de ordem puramente económica». Daí se deduz que não existe qualquer derrogação ao direito às férias anuais por motivos económicos.

    35.      No que respeita à licença de maternidade, o artigo 8.° da Directiva 92/85 impõe aos Estados‑Membros a obrigação de tomar as medidas necessárias para que as trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes «beneficiem de uma licença de maternidade de, pelo menos, 14 semanas consecutivas, a gozar antes e/ou depois do parto em conformidade com as legislações e/ou práticas nacionais».

    36.      Trata‑se, ainda nesse caso, de um direito de carácter absoluto, que não sofre qualquer derrogação nem limitação e cujo objectivo é, como indicou o Tribunal de Justiça, garantir à trabalhadora um período mínimo de repouso, não só com a preocupação de protecção da sua condição biológica, mas também para lhe permitir ocupar‑se do seu filho no período que se segue ao parto.

    37.      No caso concreto, a trabalhadora beneficiou de uma licença de maternidade por força do direito absoluto que lhe reconhece a Directiva 92/85 e, porque esse período coincide com o que é fixado para as férias anuais dos trabalhadores da empresa, ela vê‑se privada do direito às suas férias anuais: é‑lhe, portanto, negado um direito absoluto de que deve beneficiar qualquer trabalhador em razão da sua condição de trabalhador, por força da Directiva 93/104.

    38.      Além disso, a própria Directiva 92/85 prevê expressamente, no n.° 2, alínea a), do seu artigo 11.°, a obrigação de os Estados‑Membros garantirem às trabalhadoras os direitos decorrentes do contrato de trabalho em caso de licença de maternidade.

    39.      No mesmo sentido, a Directiva 76/207 relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho, dispõe, no n.° 1 do seu artigo 5.°, que «a aplicação do princípio da igualdade de tratamento no que se refere às condições de trabalho, incluindo as condições de despedimento, implica que sejam asseguradas aos homens e às mulheres as mesmas condições, sem discriminação em razão do sexo».

    40.      O Tribunal de Justiça lembrou a importância deste princípio no seu acórdão Thibault  (14) , em que declarou:

    «O princípio da não discriminação exige que o trabalhador feminino, que continua a estar ligado à sua entidade patronal pelo contrato de trabalho durante a licença de maternidade, não se veja privado do benefício das suas condições de trabalho que se aplicam tanto aos trabalhadores femininos como aos trabalhadores masculinos e que decorrem desta relação de trabalho.»

    41.     É incontestável, no caso em apreço, que um direito tão fundamental como o direito a um período mínimo de férias anuais remuneradas, que deve ser garantido a qualquer trabalhador, é um direito decorrente do contrato de trabalho e deve ser protegido em qualquer hipótese. Se se produzir, como no caso de M. P. Merino Gómez, uma sobreposição entre o período de licença de maternidade e o período fixado com carácter geral para as férias anuais do pessoal, há que tomar as medidas requeridas para que a trabalhadora possa beneficiar da totalidade das suas férias anuais noutra altura.

    42.      A Comissão lembra igualmente, com razão, que o Tribunal de Justiça considerou que os dias de licença de maternidade são equiparáveis aos dias de trabalho pois, se assim não fosse, os trabalhadores do sexo feminino seriam, enquanto trabalhadores, objecto de discriminação  (15) .

    43.      Finalmente, o último aspecto da primeira questão submetida pelo juiz a quo diz respeito à natureza do acto normativo que está na origem da controvérsia, ou seja, o acordo colectivo que é o resultado de uma conciliação obtida num procedimento de resolução de um conflito colectivo, instaurado a pedido dos representantes dos trabalhadores. A este propósito, há que notar que esse acordo regulamenta exclusivamente os períodos de férias anuais para o conjunto do pessoal, bem como as derrogações possíveis, e não regula outros aspectos da relação de trabalho. O facto de aquele acordo ter sido celebrado isoladamente, sem ter em conta situações específicas, tais como a situação da trabalhadora em licença de maternidade que se vê na impossibilidade de gozar as suas férias anuais durante o período fixado porque esse período coincide com a sua licença de maternidade, pode explicar a existência dessa situação discriminatória, que priva a trabalhadora do direito fundamental de beneficiar de férias anuais, que é inerente à sua condição de trabalhadora.

    44.      Como, acertadamente, a Comissão sublinha ainda, é evidente que o acordo colectivo controvertido está igualmente sujeito à obrigação de respeitar o princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres, no que respeita às condições de trabalho decorrentes do contrato. No acórdão Lewen  (16) , o Tribunal de Justiça, com efeito, afirmou:

    «Deve recordar‑se, em primeiro lugar, que, tendo um carácter imperativo, a proibição da discriminação entre trabalhadores do sexo [masculino] e trabalhadores do sexo feminino não só se impõe à acção das autoridades públicas, mas estende‑se também a quaisquer convenções que visem regular de forma colectiva o trabalho assalariado, bem como aos contratos entre particulares (v., nomeadamente, acórdãos de 7 de Fevereiro de 1991, Nimz, C‑184/89, Colect., p. I‑297, n.° 11, e de 9 de Setembro de 1999, Krüger, C‑281/97, Colect., p. I‑5127, n.° 20). Esta proibição impõe‑se também à acção unilateral de uma entidade patronal relativamente ao pessoal que emprega.»

    45.      Estamos plenamente conscientes do facto de as licenças de maternidade poderem criar sérios problemas de organização às empresas ou às administrações, sobretudo quando elas forem pequenas. Entendemos mesmo, como o Governo alemão observou noutro processo  (17) , que as mulheres têm em relação à sua entidade patronal uma obrigação de lealdade que lhes impõe tomar em consideração estes problemas.

    46.      Também reconhecemos, no entanto, que o acordo colectivo no caso concreto, prevê que, a título excepcional, seis trabalhadores possam gozar as suas férias no mês de Setembro. Relativamente a esse período de férias excepcional, é dada preferência aos trabalhadores que não puderam escolher as datas das suas férias no ano precedente.

    47.      Portanto, teria sido possível prever uma excepção análoga a favor de uma trabalhadora que deu à luz, sem com isso perturbar o funcionamento da empresa.

    48.      Por todas estas razões, concluímos, consequentemente, que é indicado que se responda à primeira questão da seguinte forma:

    «Quando acordos colectivos celebrados entre a empresa e os representantes dos trabalhadores fixem os períodos de férias anuais do pessoal e quando a licença de maternidade de uma trabalhadora coincida com esses períodos, o n.° 1 do artigo 7.° da Directiva 93/104, o n.° 2, alínea a), do artigo 11.° da Directiva 92/85 e o n.° 1 do artigo 5.° da Directiva 76/207 garantem o direito dessa trabalhadora de gozar as suas férias anuais em período diferente do acordado em convenção e não coincidente com o da sua licença de maternidade.»

    B – A segunda questão prejudicial

    49.      Ela é enunciada nos seguintes termos:

    «No caso de se responder afirmativamente à pergunta anterior, o conteúdo material do direito ao gozo de férias anuais abrange exclusivamente as quatro semanas de férias referidas no artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 93/104 ou é extensivo aos 30 dias fixados pela legislação nacional no artigo 38.°, n.° 1, do Estatuto dos Trabalhadores?»

    50.      O juiz de reenvio lembra que a trabalhadora dispõe, em conformidade com a legislação nacional, de um período de licença de maternidade de duas semanas a mais do que o mínimo fixado no n.° 1, primeiro parágrafo, do artigo 8.° da Directiva 92/85 e que a regulamentação nacional lhe confere igualmente direito a trinta dias de calendário de férias, ou seja, dois dias a mais do que as quatro semanas (vinte e oito dias) reconhecidas pelo artigo 7.° da Directiva 93/104.

    51.      Uma vez que se trata de uma transposição do direito comunitário que o direito nacional melhora, o juiz de reenvio considera que deve reconhecer‑se à trabalhadora um direito de 30 dias de calendário de férias, previsto pela legislação nacional e aprovado pela convenção colectiva aplicável.

    52.      Para o Governo espanhol, o conteúdo material do direito às férias anuais estende‑se aos 30 dias de calendário fixados pela legislação espanhola no n.° 1 do artigo 38.° do Real Decreto Legislativo n.° 1/95 que estabelece o estatuto dos trabalhadores.

    53.      O Governo italiano sublinha que uma resposta à primeira questão inspirada no princípio da inexistência de discriminação baseada no sexo deveria implicar a aplicação do direito espanhol para regulamentar as férias.

    54.      Propõe, portanto, que se responda que o conteúdo do direito às férias tal como acaba de ser reconhecido é conforme ao que é previsto para os outros trabalhadores por cada regulamentação nacional.

    55.      A Comissão considera que o Tribunal de Justiça respondeu a esta questão no seu recente acórdão Finalarte e o.  (18) no qual, após ter recordado que a Directiva 93/104 prevê apenas disposições mínimas no que respeita ao período das férias remuneradas e que o artigo 15.° confere aos Estados‑Membros a faculdade de adoptar disposições mais favoráveis à protecção da segurança e da saúde dos trabalhadores, declara que cabe a cada Estado‑Membro determinar o período das férias remuneradas necessário no interesse geral.

    56.      A Comissão propõe, por isso, que se responda que, quando um Estado‑Membro, que faz uso da faculdade que lhe conferem os artigos 7.°, n.° 1, e 15.° da Directiva 93/104, alongou o período de férias anuais remuneradas na sua legislação nacional, é esta que é aplicável aos trabalhadores desse Estado‑Membro.

    57.      Propomos ao Tribunal de Justiça que responda no mesmo sentido que os dois governos e a Comissão.

    58.      A partir do momento que um Estado‑Membro optou por um período de férias anual mais longo que o período mínimo imposto pela directiva, as empresas devem garantir esse período às mulheres como aos homens sob pena de violar o princípio da igualdade de tratamento.

    59.      Reduzir o período de férias anuais das mulheres que beneficiaram de uma licença de maternidade durante o período das férias colectivas violaria também o n.° 2, alínea a), do artigo 11.° da Directiva 92/85, que exige a manutenção, em relação às mulheres, dos direitos decorrentes do contrato de trabalho.

    60.      Todavia, propomos ao Tribunal de Justiça que não responda exactamente nos mesmos termos que a Comissão, que se refere a um Estado‑Membro «que faz uso da faculdade que lhe conferem os artigos 7.°, n.° 1, e 15.° da Directiva 93/104». Com efeito, não é devido a uma faculdade que lhes foi conferida pela referida directiva que os Estados‑Membros podem prever um período de férias anuais mais longo, mas devido à sua competência para decretar a legislação do trabalho que lhes parece mais adequada. A Comunidade interveio somente para estabelecer, no quadro dessa directiva, disposições mínimas.

    61.      A resposta que propomos que o Tribunal de Justiça dê à segunda questão será, por isso, a seguinte:

    «O conteúdo material do direito às férias anuais estende‑se, em tal caso, a todo o período previsto pela legislação nacional.»

    V – Conclusão

    62.      Tendo em conta as considerações que precedem, propomos que se dê às questões submetidas as seguintes respostas:

    «1)
    Quando acordos colectivos celebrados entre a empresa e os representantes dos trabalhadores fixem os períodos de férias anuais para todo o pessoal e quando a licença de maternidade de uma trabalhadora coincida com esses períodos, o n.° 1 do artigo 7.° da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, o n.° 2, alínea a), do artigo 11.° da Directiva 92/85/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho (décima directiva especial na acepção do n.° 1 do artigo 16.° da Directiva 89/391/CEE) e o n.° 1 do artigo 5.° da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho, garantem o direito dessa trabalhadora de gozar as suas férias anuais em período diferente do acordado em convenção e não coincidente com o da sua licença de maternidade.

    2)
    O conteúdo material do direito às férias anuais estende‑se, em tal caso, a todo o período previsto pela legislação nacional.»


    1
    Língua original: francês.


    2
    JO L 307, p. 18.


    3
    JO L 348, p. 1.


    4
    JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70.


    5
    BOE n.° 266, de 6 de Novembro de 1999.


    6
    Acórdão de 26 de Junho de 2001, BECTU (C‑173/99, Colect., p. I‑4881).


    7
    Acórdão de 27 de Outubro de 1998, Boyle e o. (C‑411/96, Colect., p. I‑6401).


    8
    Acórdão de 30 de Abril de 1998, Thibault (C‑136/95, Colect., p. I‑2011).


    9
    Acórdão de 21 de Outubro de 1999 (C‑333/97, Colect., p. I‑7243).


    10
    Já referido na nota 6.


    11
    .Ibidem, n.° 43.


    12
    .Ibidem, n.° 53.


    13
    .Ibidem, n.° 59.


    14
    Já referido na nota 8, n.° 29.


    15
    Acórdão Lewen, já referido na nota 9, n.os 41 e 42.


    16
    .Ibidem, n.° 26.


    17
    V. acórdão de 27 de Fevereiro de 2003, Busch (C‑320/01, Colect., p. I‑0000).


    18
    Acórdão de 25 de Outubro de 2001 (C‑49/98, C‑50/98, C‑52/98 a C‑54/98 e C‑68/98 a C‑71/98, Colect., p. I‑7831, n.° 58).

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