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Document 62000CC0304

Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 21 de Março de 2002.
Regina contra Ministry of Agriculture, Fisheries and Food, ex parte W.H. Strawson (Farms) Ltd e J.A. Gagg & Sons (a firm).
Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Crown Office) - Reino Unido.
Política agrícola comum - Sistema integrado de gestão e de controlo relativo a certos regimes de ajudas comunitárias - Artigo 9.º, n.º 2, do Regulamento (CEE) n.º 3887/92 - Pedido de ajudas 'superfície' - Sanções - Prazo de prescrição.
Processo C-304/00.

Colectânea de Jurisprudência 2002 I-10737

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2002:205

62000C0304

Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 21 de Março de 2002. - Regina contra Ministry of Agriculture, Fisheries and Food, ex parte W.H. Strawson (Farms) Ltd e J.A. Gagg & Sons (a firm). - Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Crown Office) - Reino Unido. - Política agrícola comum - Sistema integrado de gestão e de controlo relativo a certos regimes de ajudas comunitárias - Artigo 9.º, n.º 2, do Regulamento (CEE) n.º 3887/92 - Pedido de ajudas 'superfície' - Sanções - Prazo de prescrição. - Processo C-304/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-10737


Conclusões do Advogado-Geral


1. A High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Crown Office) (Reino Unido), convida o Tribunal de Justiça a interpretar o artigo 9.° do Regulamento (CEE) n.° 3887/92 da Comissão, de 23 de Dezembro de 1992, que estabelece as normas de execução do sistema integrado de gestão e de controlo relativo a determinados regimes de ajudas comunitárias .

O tribunal de reenvio pretende, essencialmente, saber se o artigo 9.° , n.° 2, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que autoriza a autoridade nacional competente a aplicar de forma «retroactiva» as sanções previstas pelo referido artigo aos exploradores agrícolas que de boa fé tenham cometido um erro na declaração das superfícies agrícolas para as quais requerem as ajudas «superfícies» .

I - O enquadramento jurídico comunitário

A - O regime das ajudas aplicável às culturas arvenses e às retiradas de terras

O Regulamento (CEE) n.° 1765/92

2. O Regulamento n.° 1765/92 institui um sistema de apoio aos produtores de determinadas culturas arvenses.

3. Nos termos do n.° 1 do artigo 2.° deste regulamento, os produtores comunitários de culturas arvenses podem requerer um pagamento compensatório nas condições fixadas nos artigos 2.° a 13.° do referido regulamento.

4. O artigo 2.° , n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1765/92 enuncia que «[o] pagamento compensatório será concedido relativamente à superfície ocupada com culturas arvenses ou consagrada à retirada de terras, em conformidade com o artigo 7.° [] do presente regulamento [...]».

B - As modalidades de aplicação dos regimes de ajudas

O Regulamento (CEE) n.° 3508/92

5. A fim de simplificar a gestão dos diversos regimes de ajudas, designadamente o previsto pelo Regulamento n.° 1765/92, o Regulamento n.° 3508/92 institui um sistema integrado de gestão e de controlo relativo às referidas ajudas .

6. Nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 3508/92:

«1. Para poder beneficiar de um ou mais regimes comunitários sujeitos ao disposto no presente regulamento, cada agricultor apresentará, em relação a cada ano, um pedido de ajudas superfícies em que se indiquem:

- as parcelas agrícolas, incluindo as superfícies forrageiras, as parcelas agrícolas sujeitas a uma medida de retirada de terras para culturas arvenses e as parcelas deixadas em pousio,

- eventualmente, quaisquer outras informações necessárias, quer as previstas nos regulamentos relativos aos regimes comunitários quer as previstas pelo Estado-Membro em questão.

[...]

3. O Estado-Membro pode decidir que o pedido de ajudas superfícies inclua apenas as alterações em relação ao pedido de ajudas superfícies do ano anterior.

[...]

6. Em relação a cada uma das parcelas agrícolas declaradas, o agricultor indicará a sua superfície e localização, devendo estes elementos permitir a identificação da parcela no âmbito do sistema alfanumérico de identificação das parcelas agrícolas.»

O Regulamento n.° 3887/92

7. O regulamento estabelece as normas de execução do sistema integrado.

8. O n.° 1 do artigo 4.° do regulamento define as informações que deve conter um pedido de ajudas «superfícies». Trata-se, designadamente, de elementos que permitam a identificação de todas as parcelas agrícolas da exploração, a sua superfície, a sua localização, a sua utilização, bem como o regime de ajudas em causa.

9. Nos termos do n.° 1 do artigo 6.° do regulamento, os controlos administrativos e no local serão efectuados de modo a assegurar a verificação eficaz do respeito das condições de concessão das ajudas e dos prémios.

10. O n.° 4 do artigo 6.° do regulamento prevê que os pedidos objecto de controlos no local serão determinados pela autoridade competente com base, designadamente, numa análise de riscos, bem como num elemento de representatividade dos pedidos de ajudas apresentados. A análise de riscos tomará em consideração os montantes da ajuda, o número de parcelas, a superfície ou o número de animais objecto do pedido de ajudas, a evolução registada em relação ao ano anterior, as verificações efectuadas aquando dos controlos realizados nos anos anteriores e outros parâmetros a determinar pelos Estados-Membros.

11. O n.° 7 do artigo 6.° do referido regulamento tem a seguinte redacção:

«A determinação da área das parcelas agrícolas será efectuada por qualquer meio apropriado definido pela autoridade competente e que garanta um rigor de medição pelo menos equivalente ao exigido pelas medições oficiais de acordo com as disposições nacionais. Esta autoridade fixará uma margem de tolerância, tendo, designadamente, em conta a técnica de medição utilizada, a precisão dos documentos oficiais disponíveis, a situação local (como o declive ou a forma das parcelas) e o disposto no parágrafo seguinte.

Pode ser tomada em consideração a área total de uma parcela agrícola, desde que esta seja integralmente utilizada, de acordo com as normas usuais do Estado-Membro ou da região em causa. Nos demais casos, será tomada em consideração a área realmente utilizada.»

12. O artigo 9.° do Regulamento n.° 3887/92, como era aplicável aos pedidos de ajudas apresentados em 1993, em 1994 e em 1995, tem a seguinte redacção:

«1. Sempre que se verificar que a área efectivamente determinada é superior à declarada no pedido de ajudas superfícies, será tomada em consideração para o cálculo do montante da ajuda a área declarada.

2. Sempre que se verificar que a área declarada num pedido de ajudas superfícies excede a área determinada, o montante da ajuda será calculado com base na área efectivamente determinada aquando do controlo. Todavia, salvo caso de força maior, a área efectivamente determinada será diminuída:

- do dobro do excedente verificado, no caso de este ser superior a 2%, ou a 2 hectares, e inferior ou igual a 10% da área determinada,

- de 30%, no caso de o excedente verificado ser superior a 10% e inferior ou igual a 20% da área determinada.

No caso de o excedente verificado ser superior a 20% da área determinada, não será concedida qualquer ajuda ligada à superfície.

Todavia, se se tratar de uma falsa declaração feita deliberadamente ou por negligência grave, o agricultor em causa será excluído do benefício:

- do regime de ajuda em causa a título do ano civil em questão

e

- em caso de uma falsa declaração feita deliberadamente, de qualquer regime de ajuda referido no n.° 1 do artigo 1.° do Regulamento (CEE) n.° 3508/92 a título do ano civil seguinte, em relação a uma área igual àquela para a qual tiver sido recusado o seu pedido de ajudas.

As diminuições acima referidas não serão aplicadas se, relativamente à determinação da área, o agricultor provar que se baseou correctamente em informações reconhecidas pela autoridade competente.

[...]

Para efeitos da aplicação do presente artigo, entende-se por área determinada aquela em relação à qual tenham sido respeitadas todas as condições regulamentares.»

13. O artigo 9.° , n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro e segundo travessões, do Regulamento n.° 3887/92 foi posteriormente alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1648/95 . Os primeiro e segundo travessões desta disposição foram substituídos pela seguinte redacção :

«[...] do dobro do excedente verificado, no caso de este ser superior a 3%, ou a 2 hectares, e inferior ou igual a 20% da área determinada.»

14. Esta alteração é aplicável aos pedidos de ajudas apresentados para os anos de 1996 e seguintes. Todavia, por força do artigo 2.° , n.° 2, do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2988/95 , também se aplica de forma retroactiva às infracções cometidas ao abrigo do regime das disposições do regulamento. Este artigo 2.° , n.° 2, dispõe, com efeito, que «[s]e disposições da regulamentação comunitária que estabelecem sanções administrativas forem alteradas em momento posterior, as disposições menos severas são aplicáveis retroactivamente» .

15. Por força do primeiro parágrafo do n.° 1 do artigo 14.° do Regulamento n.° 3887/92, em caso de pagamento indevido, o agricultor em causa fica obrigado a reembolsar os montantes em questão, acrescidos de juros calculados em função do prazo decorrido entre o seu pagamento pela autoridade competente e o reembolso do excesso pelo beneficiário.

II - Os factos e a tramitação processual

A - Os antecedentes do litígio na causa principal

16. Após a reforma da política agrícola comum realizada em 1992 , os agricultores estão habilitados ao recebimento de uma ajuda comunitária cujo montante é proporcional à superfície cultivada. Em conformidade com os objectivos prosseguidos por esta reforma e com a instituição de um sistema integrado, os produtores são compensados pela perda de rendimentos resultante das diminuições dos preços de apoio agrícolas impostas pela Comunidade a fim de aproximar estes preços dos preços do mercado mundial. No Reino Unido, este regime de ajudas concedidas às terras arvenses é conhecido sob a designação de «Arable Area Payments Scheme».

17. W. H. Strawson (Farms) Ltd e J. A. Gagg & Sons (a firm), exploradores agrícolas, requereram pagamentos ao abrigo do regime das ajudas «superfícies» para o ano civil de 1997.

18. Tinham anteriormente obtido pagamentos da mesma natureza para os anos civis de 1993 a 1996, inclusive.

19. Para determinar a superfícies das parcelas agrícolas para as quais foram pedidas as ajudas, as recorrentes na causa principal fundaram-se essencialmente nos mapas realizados pelo Ordnance Survey (Instituto Geográfico Nacional). Após 1993, o Ministry of Agriculture, Fisheries and Food , autoridade competente encarregada da gestão no Reino Unido do sistema integrado e de efectuar os pagamentos referentes ao regime das ajudas «superfícies», precisou, nas suas orientações, que as superfícies indicadas nos mapas OS são em regra geral admissíveis para o preenchimento dos pedidos de ajudas. Todavia, aquando de diversos controlos efectuados pelo MAFF no decurso do ano de 1997, este descobriu que, para certos terrenos, a superfície e o pedido a ela referente tinham sido sobrestimados, ao passo que, relativamente a outros, estes elementos foram subestimados.

20. Resulta do despacho de reenvio que os erros cometidos pelas recorrentes na causa principal não resultam de graves negligências e não são intencionais. Na sequência destas inspecções, o MAFF determinou a superfície referente às ajudas «superfícies» em 1997 e aplicou as sanções previstas no artigo 9.° do Regulamento n.° 3887/92. Resulta ainda do despacho de reenvio que o litígio entre as recorrentes na causa principal e o MAFF não respeita à forma como este último tratou os pedidos de ajudas «superfícies» para o ano civil de 1997, mas sim sobre o tratamento que foi dado aos pedidos apresentados para os anos civis compreendidos entre 1993 e 1996, inclusive.

21. Após ter efectuado uma compensação entre os pagamentos feitos por excesso e por defeito, o MAFF recalculou os pagamentos efectuados para cada um destes anos com base nas disposições do artigo 9.° do regulamento, que previam sanções para o caso de sobreavaliação das superfícies declaradas para os efeitos das ajudas «superfícies». Por outras palavras, o montante das ajudas «superfícies» requerido para os anos de 1993 a 1996 foi calculado com base na superfície efectivamente determinada aquando das inspecções efectuadas em 1997. Esta superfície foi seguidamente reduzida nos termos das modalidades previstas no artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.° 3887/92, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n.° 1648/95. Perante uma diferença entre a superfície declarada e a que foi determinada compreendida entre 3% e 20%, o MAFF reduziu a superfície na medida do dobro do excedente. Quando o excedente era superior a 20%, o MAFF decidiu que não era devida qualquer ajuda ligada à superfície. Por conseguinte, informou as recorrentes na causa principal das sanções aplicadas para os anos de 1993 a 1996 no quadro dos pagamentos compensatórios nos termos do sistema de apoio aos produtores de determinadas culturas arvenses.

22. J. A. Gagg & Sons (a firm) e W. H. Strawson (Farms) Ltd contestaram estarem obrigados a proceder ao pagamento ao MAFF de, respectivamente, as quantias de 21 052,90 GBP e de 6 770,06 GBP e recorreram para o órgão jurisdicional de reenvio. Os recorrentes na causa principal admitem os termos da decisão do MAFF no que toca às medidas por este último tomadas e referentes aos pedidos de ajudas «superfície» requeridos para o ano civil de 1997. Reconhecem ainda que, por força do artigo 14.° do regulamento, também devem proceder à restituição das quantias recebidas em excesso para os anos de 1993 a 1996. Defendem apenas que as sanções previstas pelo artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do referido regulamento não podem ser aplicadas às ajudas pagas nos termos dos anos de 1993 a 1996. Fundam a sua pretensão no princípio da não retroactividade das disposições de natureza penal.

23. Entendendo que a solução do litígio na causa principal exigia a interpretação de certas disposições do direito comunitário, a High Court decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial.

B - A questão prejudicial

24. «Quando

i) como resultado de uma inspecção, a autoridade nacional competente se apercebe que um requerente nos termos das ajudas superfícies cometeu um erro (que não é nem intencional nem o resultado de uma negligência grosseira) que resultou em exceder a área declarada a superfície que pode beneficiar da ajuda; e que

ii) a autoridade competente está convencida, devido a essa inspecção e outras verificações, que o recorrente cometeu o mesmo erro em anos anteriores, dando origem em cada um desses anos a uma área declarada em excesso relativamente à superfície que pode beneficiar da ajuda,

deve esta autoridade reduzir a superfície efectivamente determinada na inspecção nos termos das modalidades previstas no artigo 9.° , n.° 2, do Regulamento (CEE) n.° 3887/92 da Comissão para efeitos de cálculo da ajuda devida relativamente aos anos anteriores?»

III - Apreciação

25. Essencialmente, o juiz de reenvio pretende saber se o artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que autoriza a autoridade competente a aplicar, como sanções, reduções das superfícies que podem beneficiar da ajuda, em razão dos erros cometidos na determinação das superfícies agrícolas verificados na sequência de uma fiscalização efectuada no decurso de um determinado ano, no que toca às ajudas pagas para os anos anteriores à referida fiscalização.

26. A título liminar, recordo que, nos termos de uma jurisprudência constante , o reenvio prejudicial representa um instrumento de colaboração directa entre o tribunal nacional e o tribunal comunitário. De igual modo, o Tribunal de Justiça tem invariavelmente decidido que a apreciação dos factos da causa se inscreve na competência do tribunal nacional e que não pode modificar o conteúdo das questões prejudiciais .

27. Todavia, o Tribunal de Justiça também tem decidido invariavelmente que, no quadro de um processo nos termos do artigo 234.° CE, para fornecer uma resposta útil ao tribunal de reenvio, pode retirar da redacção das questões colocadas, tendo em atenção os dados expostos pelo tribunal nacional na sua decisão de reenvio , os elementos de interpretação que se inscrevem no direito comunitário .

28. Com base nesta jurisprudência, o Tribunal de Justiça já procedeu à reformulação de questões prejudiciais para ter em conta o objecto do litígio e as necessidades reais do tribunal a quo, como foram expostos na fundamentação da decisão de reenvio.

29. Por outras palavras, no quadro da missão de colaboração entre os tribunais nacionais e o tribunal comunitário instituída pelo artigo 234.° CE, o Tribunal de Justiça pode retirar dos dados factuais fundamentais os elementos de interpretação do direito comunitário relevante e fornecer ao tribunal de reenvio a resposta que lhe é necessária para decidir do litígio na causa principal .

30. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça pode formular a questão colocada de forma a permitir ao tribunal a quo resolver o litígio na causa principal no respeito das disposições relevantes do direito comunitário.

31. Donde decorre, em meu entender, que, para fornecer uma resposta útil ao tribunal de reenvio, o Tribunal de Justiça pode também tomar em consideração os dados factuais, quando estes dados sejam:

- susceptíveis de receber uma qualificação jurídica no quadro dos diplomas comunitários sobre a interpretação dos quais o Tribunal de Justiça é interrogado;

- expostos nos fundamentos da decisão de reenvio;

- omitidos pelo tribunal a quo na redacção da questão que foi submetida ao Tribunal de Justiça, e

- de natureza a lhe permitir decidir do litígio sobre o qual se tem que pronunciar no respeito das disposições comunitárias relevantes.

32. No caso em apreço, resulta dos fundamentos do despacho de reenvio que o tribunal a quo se interroga essencialmente sobre a regularidade da sanção que consiste numa redução de determinada superfície na sequência dos controlos efectuados no decurso do ano de 1997 no que respeita às ajudas pagas para os anos civis de 1993 a 1996. Todavia, na redacção da questão que foi submetida ao Tribunal de Justiça, o tribunal de reenvio omite indicar um dado de facto essencial .

33. Com efeito, a decisão de reenvio precisa que:

«As requerentes calcularam as superfícies respeitantes a estes pedidos [ou seja, os que foram apresentados para os anos civis de 1993 a 1997] por referência aos mapas realizados pela Ordnance Survey. Após 1993, as instruções do MAFF referentes aos pagamentos do [sistema integrado] precisam que as superfícies indicadas nos mapas realizados pelo [OS] são, em regra geral, admitidas para a instrução dos pedidos de ajudas» .

34. Este dado factual deve conduzir a que o Tribunal de Justiça entenda que a High Court considera que as recorrentes na causa principal declararam as superfícies que podem beneficiar da ajuda no que respeita aos pedidos apresentados para os anos civis que cobrem o período de 1993 a 1997 com base nas informações reconhecidas (e, portanto, consideradas como fiáveis) pelo MAFF .

35. Ora, o artigo 9.° , n.° 2, quarto parágrafo, do Regulamento n.° 3887/92 dispõe expressamente que:

«As diminuições acima referidas não serão aplicadas se, relativamente à determinação da área, o agricultor provar que se baseou correctamente em informações reconhecidas pela autoridade competente.»

36. Esta disposição visa, portanto, especificamente situações como aquelas sobre as quais se deve pronunciar o tribunal a quo no quadro do litígio na causa principal. O artigo 9.° , n.° 2, quarto parágrafo, do Regulamento n.° 3887/92 é claro e preciso. Em aplicação desta disposição, a autoridade competente está proibida de reduzir a superfície efectivamente determinada aquando de um controlo segundo as modalidades previstas no artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.° 3887/92, para os efeitos de cálculo das ajudas devidas, quando, para a determinação da superfície que pode beneficiar da ajuda, o agricultor se tenha correctamente baseado nas informações reconhecidas pela referida autoridade.

37. Diga-se, sem mais, que erros análogos cometidos nos anos anteriores ao controlo também não podem conduzir a diminuições das superfícies que podem beneficiar das ajudas «superfícies» nos termos das modalidades previstas no artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.° 3887/92 .

38. À luz das precedentes considerações, proponho que o Tribunal de Justiça reformule a questão prejudicial de forma a permitir ao tribunal de reenvio decidir do litígio que lhe foi submetido no respeito das disposições comunitárias relevantes. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça deverá responder à questão que versa sobre a interpretação das disposições do artigo 9.° , n.° 2, quarto parágrafo, do Regulamento n.° 3887/92, numa hipótese como a descrita pela High Court. No fundo, o Tribunal de Justiça deve declarar se essa disposição autoriza uma autoridade competente a aplicar, nas circunstâncias do caso em apreço, sanções como aquelas que aplicou .

39. À luz das precedentes considerações, proponho ainda que o Tribunal de Justiça responda pela negativa a esta questão.

40. Contudo, não posso deixar de referir um elemento importante que se revelou na audiência perante o Tribunal de Justiça. Nessa ocasião, o quadro factual e processual interno exposto pela High Court foi largamente comentado pelo representante do Governo do Reino Unido, que defende que essa apresentação é incompleta. Com efeito, segundo este, as superfícies agrícolas indicadas nos mapas OS só são reconhecidas pela autoridade competente na condição expressa de os terrenos agrícolas assim medidos não terem sofrido modificações após a publicação destes mapas. Indica que um manual para a sua aplicação fornece todas as precisões úteis a este respeito. Portanto, alega que, contrariamente ao teor da decisão de reenvio, os mapas OS só são reconhecidos pela autoridade competente na condição de o requerente ter respeitado as recomendações que figuram no manual de aplicação. Acrescenta que as recorrentes na causa principal não respeitaram as instruções que figuram no manual e que, por esse facto, o litígio na causa principal refere-se a erros nas declarações de superfícies agrícolas que não têm origem em informações reconhecidas pela autoridade competente. Estes diferentes elementos terão sido discutidos perante a High Court e por esta última decididos a favor do MAFF. Com efeito, a High Court terá considerado que as recorrentes na causa principal não fizeram a prova de que se basearam correctamente em informações reconhecidas pela autoridade competente para determinar as superfícies que podiam beneficiar das ajudas. Por conseguinte, terá afastado a aplicação do artigo 9.° , n.° 2, quarto parágrafo, do regulamento. As recorrentes na causa principal não contestaram esta apresentação dos factos.

41. Importa recordar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a apreciação dos factos da causa é da competência exclusiva do tribunal nacional e que, no quadro do processo instituído pelo artigo 234.° CE, o tribunal nacional deve fornecer os elementos factuais que permitam ao Tribunal de Justiça ter um suficiente conhecimento do objecto do litígio e dos seus interesses em jogo a fim de fornecer uma interpretação útil do direito comunitário.

42. A contestação do quadro factual e processual interno exposto pela High Court deve ser decidida pelo tribunal nacional competente nos termos das regras nacionais aplicáveis.

43. A título subsidiário, penso porém que devo levar mais longe este raciocínio. Com efeito, se o quadro factual e processual exposto pelo Governo do Reino Unido na audiência no Tribunal de Justiça corresponde à realidade , importa evitar que o tribunal de reenvio se veja obrigado a submeter ao Tribunal de Justiça um novo pedido prejudicial e, por conseguinte, que se exponha à delonga suplementar inerente a este novo pedido. Com efeito, se o tribunal de reenvio considerar que os erros cometidos de boa fé pelos requerentes de ajudas «superfícies» não têm origem em informações reconhecidas pela autoridade competente, importará que se declare se essa autoridade pode aplicar, a título de sanções, diminuições das superfícies que podem beneficiar da ajuda, em razão dos erros cometidos na determinação das superfícies agrícolas como foram verificados na sequência de um controlo efectuado no decurso de determinado ano, no que se refere às ajudas pagas nos termos dos anos anteriores a este controlo.

44. Em conformidade com as observações do Governo francês, penso que as recorrentes na causa principal confundem a noção de retroactividade das sanções penais com a de prescrição do exercício da acção penal. O princípio da não retroactividade das sanções penais é um princípio comum a todas as ordens jurídicas dos Estados-Membros, consagrado pelo artigo 7.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais. Faz parte integrante dos princípios gerais do direito, cujo respeito o Tribunal de Justiça assegura . O Tribunal de Justiça já declarou que as disposições do direito comunitário não podem ter por efeito determinar ou agravar a responsabilidade penal dos autores de infracções cometidas antes da entrada em vigor destas disposições . Portanto, a retroactividade designa a aplicação de uma norma jurídica a factos ocorridos antes da sua entrada em vigor. Em contrapartida, a prescrição constitui um modo de extinção de um direito ou de uma acção judicial que resulta do seu não exercício antes do termo de um prazo fixado pela lei.

45. No presente caso, se as inspecções só ocorreram em 1997, o facto gerador das sanções, ou seja, o erro na determinação das superfícies que podem beneficiar da ajuda, pode ter existido num momento em que ainda não se tinha verificado a prescrição. Trata-se, portanto, de saber se a acção do MAFF estava prescrita no que se refere aos anos de 1993 a 1996.

46. O artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do regulamento, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n.° 1648/95, prevê que, em caso de erro cometido de boa fé relativamente à superfície declarada, o montante da ajuda será calculado com base na superfície efectivamente determinada aquando do controlo, diminuída de uma certa percentagem que tem em conta a importância quantitativa do erro. Segundo o Tribunal de Justiça, estas sanções aplicadas aos requerentes que cometeram um erro de boa fé respeitam o princípio da proporcionalidade .

47. O regulamento não contém qualquer disposição referente aos prazos de prescrição para o exercício da acção das autoridades competentes no caso da verificação de erros desta natureza. Todavia, o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/95, aplicável no caso em apreço , dispõe que a prescrição referente às sanções e aos pedidos de reembolso de pagamentos efectuados em excesso decorrentes de irregularidades é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de uma irregularidade continuada ou repetida, do dia em que cessou essa irregularidade .

48. À luz das precedentes considerações, proponho ao Tribunal de Justiça, a título subsidiário, que declare ao tribunal de reenvio que, numa hipótese factual como a exposta pelo Governo do Reino Unido, o artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do regulamento, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n.° 1648/95, não se opõe a que uma autoridade competente aplique, a título de sanções, as diminuições das superfícies que podem beneficiar da ajuda, em razão de erros cometidos na determinação das superfícies agrícolas como foram verificados na sequência de um controlo efectuado no decurso de um determinado ano, no que se refere às ajudas pagas nos termos dos anos anteriores ao referido controlo. Contudo, a acção da autoridade competente deve respeitar os prazos de prescrição instituídos pelo artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/95.

Conclusão

49. Nestas condições, proponho que o Tribunal de Justiça responda do seguinte modo à High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Crown Office):

«O artigo 9.° , n.° 2, quarto parágrafo, do Regulamento (CEE) n.° 3887/92 da Comissão, de 23 de Dezembro de 1992, que estabelece as normas de execução do sistema integrado de gestão e de controlo relativo a determinados regimes de ajudas comunitárias, deve ser interpretado no sentido de que:

i) quando, na sequência de uma inspecção, a autoridade competente se apercebe de que:

- um requerente de ajudas superfícies cometeu um erro que conduziu a uma área sobreavaliada relativamente à superfície que pode beneficiar da ajuda e que foram cometidos erros similares nos anos precedentes, mas que

- o referido requerente pode provar ter-se correctamente baseado em informações reconhecidas pela autoridade competente para a determinação das superfícies que podem beneficiar da ajuda;

ii) a referida autoridade não deve reduzir a superfície efectivamente determinada aquando da inspecção segundo as modalidades do artigo 9.° , n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.° 3887/92 para os efeitos do cálculo da ajuda devida para os anos que precederam a referida inspecção.»

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