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Document 61998CJ0082

Acórdão do Tribunal (Quarta Secção) de 25 de Maio de 2000.
Max Kögler contra Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.
Recurso de anulação - Recurso de funcionário - Coeficiente de correcção aplicável à pensão de reforma.
Processo C-82/98 P.

Colectânea de Jurisprudência 2000 I-03855

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2000:282

61998J0082

Acórdão do Tribunal (Quarta Secção) de 25 de Maio de 2000. - Max Kögler contra Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. - Recurso de anulação - Recurso de funcionário - Coeficiente de correcção aplicável à pensão de reforma. - Processo C-82/98 P.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-03855


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Fundamentos - Admissibilidade - Condições - Apresentação de argumentos igualmente deduzidos no Tribunal de Primeira Instância - Irrelevância

[Tratado CE, artigo 168._-A (actual artigo 225._ CE); Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, artigo 51._, primeiro parágrafo; Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, artigo 112._, n._ 1, alínea c)]

2 Funcionários - Remuneração - Pensões - Coeficiente de correcção - Fixação dos coeficientes de correcção para a Alemanha - Princípio da protecção da confiança legítima - Princípio da boa fé - Violação - Inexistência

(Regulamentos do Conselho n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93)

3 Funcionários - Recurso - Acto que causa prejuízo - Conceito - Folha de pensão notificada individualmente ao funcionário e que fixa de cada vez o montante da sua pensão

(Estatuto dos Funcionários, artigos 90._, n._ 2, e 91._)

Sumário


1 Resulta do artigo 168._-A do Tratado (actual artigo 225._ CE), do artigo 51._, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 112._, n._ 1, alínea c), do Regulamento de Processo que um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância deve indicar de modo preciso os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido.

Desde que estas condições estejam preenchidas, um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância pode assentar numa argumentação já apresentada em primeira instância a fim de demonstrar que o Tribunal de Primeira Instância violou o direito comunitário ao rejeitar os fundamentos e argumentos que lhe foram apresentados pelo recorrente.

(cf. n.os 19-23)

2 Um funcionário não pode invocar uma violação do princípio da confiança legítima na ausência de garantias precisas que lhe hajam sido fornecidas pela administração.

Dado que os Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93 do Conselho não permitem de forma alguma considerar como certo que o Conselho adoptaria novos coeficientes de correcção com efeito retroactivo para a Alemanha, não se pode considerar que o Conselho tenha criado, através destes regulamentos, uma confiança legítima quanto à adopção desses novos coeficientes.

Além disso, dado que não fez nascer esperanças fundadas quanto a este ponto, também não se pode considerar que o Conselho tenha violado o princípio da boa fé ao não adoptar esses novos coeficientes.

(cf. n.os 33-36, 41)

3 Uma folha de pensão constitui um acto que causa prejuízo, na acepção do artigo 90._, n._ 2, do Estatuto, susceptível de ser objecto de uma reclamação e eventualmente de um recurso, na medida em que seja notificada individualmente ao funcionário e fixe de cada vez o montante da sua pensão.

(cf. n._ 47)

Partes


No processo C-82/98 P,

Max Kögler, antigo funcionário do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, residente em Konz (Alemanha), representado por T. Baltes, advogado no foro de Trier, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório de R. Weber, 3, rue de la Loge,

recorrente,

que tem por objecto um recurso do despacho do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Terceira Secção) de 20 de Janeiro de 1998, Kögler/Tribunal de Justiça (T-160/96, ColectFP, p. I-A-15 e II-35), em que se pede a anulação desse despacho,

sendo as outras partes no processo:

Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, representado por Timothy Millett, consultor jurídico para os assuntos administrativos, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na sede do Tribunal de Justiça, Kirchberg,

recorrido em primeira instância,

e

Conselho da União Europeia, representado por M. Bauer e D. Canga Fano, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de A. Morbili, director-geral da Direcção dos Assuntos Jurídicos do Banco Europeu de Investimento, 100, boulevard Konrad Adenauer,

interveniente em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quarta Secção),

composto por: D. A. O. Edward, presidente de secção, A. La Pergola e H. Ragnemalm (relator), juízes,

advogado-geral: J. Mischo,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto, posteriormente R. Grass, secretário,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 24 de Junho de 1999, durante a qual M. Kögler foi representado por T. Baltes, o Tribunal de Justiça por B. Zimmerman, tradutor, na qualidade de agente, e o Conselho por M. Bauer,

visto o despacho de 25 de Outubro de 1999 que ordena a reabertura dos debates,

visto o relatório para audiência,

visto a renúncia das partes a uma nova audiência,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 3 de Fevereiro de 2000,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 26 de Março de 1998, Max Kögler (a seguir «recorrente») interpôs, nos termos do artigo 49._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, recurso do despacho do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Janeiro de 1998, Kögler/Tribunal de Justiça (T-160/96, ColectFP, p. 1-A-15 e II-35, a seguir «despacho recorrido»), pelo qual este declarou manifestamente inadmissível o seu recurso destinado, nomeadamente, a obter a anulação da decisão do comité de reclamações do Tribunal de Justiça, de 1 de Julho de 1996, de indeferimento da reclamação do recorrente destinada a obter a aplicação dos coeficientes de correcção baseados no custo de vida em Berlim para o novo cálculo e fixação definitiva da sua pensão relativa ao período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994.

Enquadramento jurídico e factos do litígio

2 O enquadramento jurídico e os factos na origem do presente recurso estão expostos no despacho recorrido nos seguintes termos:

«1 O recorrente é antigo director da direcção da tradução do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. Foi reformado a partir de 1 de Dezembro de 1987. Enquanto funcionário reformado, residiu sempre em Konz, Alemanha.

2 Nos termos do n._ 1 do artigo 82._ do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir `Estatuto'), as pensões dos antigos funcionários estão sujeitas ao coeficiente de correcção fixado para o país em que o titular da pensão prove ter residência.

3 Na sequência da reunificação da Alemanha, Berlim tornou-se, em 1 de Outubro de 1990, a capital deste Estado-Membro.

4 Nos seus acórdãos de 27 de Outubro de 1994, Benzler/Comissão (T-536/93, ColectFP, p. II-777), e Chavane de Dalmassy e o./Comissão (T-64/92, ColectFP, p. II-723), o Tribunal de Primeira Instância declarou que os artigos 6._, n._ 2, por um lado, do Regulamento (CEE, CECA, Euratom) n._ 3834/91 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1991, que adapta, com efeitos a partir de 1 de Julho de 1991, as remunerações e as pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias, bem como os coeficientes de correcção aplicáveis a essas remunerações e pensões (JO L 361, p. 13, a seguir `Regulamento n._ 3834/91'), e, por outro, do Regulamento (CEE, Euratom, CECA) n._ 3761/92 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1992, que adapta, com efeitos a partir de 1 de Julho de 1992, as remunerações e as pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias, bem como os coeficientes de correcção aplicáveis a essas remunerações e pensões (JO L 383, p. 1, a seguir `Regulamento n._ 3761/92'), na medida em que fixam um coeficiente de correcção provisório para a Alemanha com base no custo de vida em Bona, violam o princípio constante do anexo XI do Estatuto, segundo o qual o coeficiente de correcção de um Estado-Membro deve ser fixado tendo em conta o custo de vida na sua capital, dado que Berlim se tornou na capital da Alemanha em 3 de Outubro de 1990. Em consequência, o Tribunal de Primeira Instância anulou respectivamente as folhas de remuneração e de pensão dos recorrentes nestes processos tal como estavam elaboradas com fundamento nos referidos regulamentos.

5 Por outro lado, está provado que os coeficientes de correcção, qualificados em nota de rodapé nos referidos regulamentos de `número provisório' e a respeito dos quais se refere serem aplicados `sem prejuízo das decisões que o Conselho venha a adoptar na sequência da proposta da Comissão', não foram alterados posteriormente.

6 Na sequência dos acórdãos acima mencionados, foram levadas a cabo diversas reuniões no seio do Conselho para determinar as medidas requeridas pela execução desses acórdãos. O Conselho aprovou posteriormente, em 19 de Dezembro de 1994, o Regulamento (CECA, CE, Euratom) n._ 3161/94 do Conselho, que adapta, com efeitos a partir de 1 de Julho de 1994, as remunerações e as pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias, bem como os coeficientes de correcção aplicáveis a essas remunerações e pensões (JO L 335, p. 1). O n._ 1, do artigo 6._ deste regulamento prevê, com efeito a partir de 1 de Julho de 1994, um coeficiente de correcção geral para a Alemanha baseado pela primeira vez em Berlim, bem como coeficientes de correcção específicos para Bona, Karlsruhe e Munique.

7 Posteriormente, o Regulamento (CE, Euratom, CECA) n._ 2963/95 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1995, que adapta, a contar de 1 de Julho de 1995, as remunerações e as pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias bem como os coeficientes de correcção aplicáveis a essas remunerações e pensões (JO L 310, p. 1), confirmou a fixação de um coeficiente de correcção geral para a Alemanha com base no custo de vida em Berlim, com efeito retroactivo a 1 de Julho de 1995.

8 Ora, o recorrente considera que o Tribunal de Justiça deveria ter aplicado às suas pensões relativas ao período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994 os coeficientes de correcção baseados no custo de vida em Berlim, e não no custo de vida em Bona. Em consequência, apresentou reclamação, por carta de 29 de Janeiro de 1996, nos termos do n._ 1 do artigo 90._ do Estatuto, pedindo uma nova fixação retroactiva da respectiva pensão.

9 O pedido do recorrente foi indeferido por decisão do secretário do Tribunal de Justiça, na qualidade de autoridade investida do poder de nomeação (a seguir `AIPN'), de 12 de Março de 1996.

10 Em 10 de Maio de 1996, o recorrente apresentou no comité de reclamações do Tribunal de Justiça (a seguir `comité') uma reclamação com o mesmo objectivo do anterior pedido, solicitando ainda que a instituição indicasse uma data próxima para o novo cálculo.

11 Esta reclamação foi indeferida em 1 de Julho de 1996, com o fundamento de ter sido apresentada fora de prazo, sendo por isso inadmissível. Os `actos que causem prejuízo' na acepção do artigo 90._, n._ 2, do Estatuto são, no caso em apreço, as folhas de pensão referentes aos períodos em causa. Por conseguinte, o recorrente tinha deixado prescrever os prazos de recurso estatutários.»

O despacho recorrido

3 Por requerimento inicial entrado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 16 de Outubro de 1996, o recorrente pediu a anulação da decisão do comité de 1 de Julho de 1996 bem como, a título principal, o novo cálculo e a fixação definitiva da pensão relativa ao período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994 de acordo com os coeficientes de correcção baseados no custo de vida em Berlim fixados anualmente pelo Conselho e, a título subsidiário, a fixação de uma data próxima em que esse novo cálculo e essa fixação definitiva da pensão deveriam ser efectuados.

4 O Tribunal concluiu pela inadmissibilidade do recurso com o fundamento de que a reclamação do recorrente era, ela mesma, inadmissível por estar fora do prazo.

5 Resulta do n._ 33 do despacho recorrido que o recorrente invocou dois argumentos a fim de contestar esta questão prévia de inadmissibilidade. Por um lado, alegou, no essencial, que o Conselho se tinha «comprometido firmemente» a fixar em definitivo os coeficientes de correcção qualificados de «provisórios» em notas de rodapé dos Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e seguintes e que, nestas circunstâncias, o princípio da protecção da confiança legítima se opunha à tese segundo a qual deveria ter apresentado reclamação contra essas folhas de pensão numa fase anterior. Por outro lado, alegou que o seu recurso não visava um acto da AIPN mas uma omissão desta.

6 No que respeita ao primeiro argumento, o Tribunal sublinhou, no n._ 34 do despacho recorrido, que é jurisprudência constante que um funcionário não pode invocar violação do princípio da confiança legítima na ausência de garantias precisas que lhe hajam sido fornecidas pela administração.

7 Ora, o Tribunal considerou, nos n.os 35 a 37 do despacho recorrido, que, pelas notas de rodapé dos Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e seguintes, o Conselho se tinha apenas reservado a possibilidade de alterar os coeficientes de correcção para a Alemanha, sem assumir a obrigação de o fazer retroactivamente.

8 Daqui o Tribunal concluiu, no n._ 38 do despacho recorrido, não poder afirmar-se que o Conselho haja dado ao recorrente «garantias precisas», como exigia a jurisprudência relativa ao princípio da protecção da confiança legítima. Por conseguinte, o Tribunal entendeu que «o recorrente não pode invocar que o Conselho criou na sua esfera jurídica uma `confiança legítima' que lhe permita esperar poder escapar à aplicação dos prazos estatutários acima mencionados».

9 No que respeita ao segundo argumento do recorrente, o Tribunal declarou, no n._ 39 do despacho recorrido, que as folhas de pensão mensais comunicadas ao recorrente entre 1 de Julho de 1991 e 30 de Junho de 1994 constituem manifestamente actos que lhe causam prejuízo na medida em que fixam, de cada vez, o montante da sua pensão. Segundo o Tribunal, na medida em que aquelas folhas foram comunicadas individualmente ao recorrente, este deveria ter apresentado, de cada vez, reclamação nos três meses seguintes, cumprindo assim o prazo previsto no artigo 90._ do Estatuto. Ora, o Tribunal salientou que o recorrente tinha apresentado a sua reclamação em 10 de Maio de 1996, isto é, quase dois anos após o termo do prazo legal que correu a partir da recepção da última folha de Junho de 1994. Por conseguinte, o Tribunal declarou o recurso inadmissível em razão da intempestividade da apresentação da reclamação do recorrente.

10 Por outro lado, o Tribunal recordou, no n._ 41 do despacho recorrido, que um funcionário que não apresentou, nos prazos previstos nos artigos 90._ e 91._ do Estatuto, recurso de anulação de um acto que lhe causou prejuízo não pode, através de um pedido de indemnização do prejuízo provocado por esse acto, reparar esta omissão e obter assim novos prazos de recurso.

11 Ora, segundo o Tribunal, no n._ 42 do despacho recorrido, o recurso do recorrente, pretensamente fundado em omissão do Conselho, devia ser considerado como destinando-se a contornar os prazos previstos nos artigos 90._ e 91._ do Estatuto uma vez que tinha como objectivo, por um lado, a anulação de uma decisão do comité que não fazia mais do que confirmar uma inadmissibilidade preexistente e, por outro, obter, através de acção do tipo indemnizatório, o montante adicional que teria recebido se lhe tivesse sido aplicado o coeficiente de correcção «Berlim» a partir de 1991.

12 O Tribunal rejeitou, por conseguinte, o recurso por ser manifestamente inadmissível.

O presente recurso

13 Com o seu recurso, o recorrente pede que o Tribunal de Justiça se digne:

- anular o despacho recorrido,

- anular a decisão do comité de 1 de Julho de 1996,

- declarar que as pensões do recorrente devem ser de novo calculadas e fixadas definitivamente de acordo com o coeficiente de correcção baseado no custo de vida em Berlim fixado anualmente pelo Conselho ou, subsidiariamente, fixar uma data próxima daquela em que esse novo cálculo e essa fixação definitiva serão efectuados,

- condenar o Tribunal de Justiça e o Conselho nas despesas.

14 O recorrente invoca três fundamentos em apoio do seu recurso baseados, em primeiro lugar, no facto de o Tribunal de Primeira Instância ter interpretado mal os Regulamentos n.os 3834/91 e 3761/92 e o Regulamento (Euratom, CECA, CE) n._ 3608/93 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, que adapta, com efeitos a partir de 1 de Julho de 1993, as remunerações e as pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias, bem com os coeficientes de correcção aplicáveis a essas remunerações e pensões (JO L 328, p. 1), ao declarar que o Conselho não se tinha comprometido, com estes regulamentos, a adoptar um coeficiente definitivo para a Alemanha, em segundo lugar, no facto de o Tribunal não ter examinado os argumentos do recorrente baseados no princípio da boa fé ou tê-los desnaturado e, em terceiro lugar, no facto de o Tribunal de Primeira Instância ter modificado o objecto do litígio ao alegar que o seu pedido era dirigido contra as folhas de pensão quando visava a omissão da AIPN em fixar a sua pensão de uma forma definitiva.

15 O Tribunal de Justiça conclui pedindo a rejeição do recurso e a condenação do recorrente nas despesas.

16 O Conselho conclui pedindo a rejeição do recurso por manifesta inadmissibilidade e, subsidiariamente, por falta de fundamento e a condenação do recorrente nas despesas.

Apreciação do Tribunal de Justiça

Quanto à admissibilidade

17 O Conselho alega que o presente recurso é manifestamente inadmissível por dois motivos.

18 Em primeiro lugar, alega que o recorrente não indica com precisão os elementos impugnados do despacho cuja anulação é pedida, bem como os fundamentos jurídicos específicos em que assenta esse pedido. O recorrente limitava-se a repetir ou reproduzir literalmente os fundamentos e argumentos formulados perante o Tribunal, visando assim obter um simples reexame do requerimento inicial apresentado em primeira instância, com desrespeito dos termos do artigo 49._, primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça.

19 A este respeito, deve recordar-se, a título liminar, que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, resulta igualmente dos artigos 168._-A do Tratado CE (actual artigo 225._ CE) e 51._, primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça que o recurso só pode assentar em fundamentos relativos à violação de normas jurídicas, com exclusão de qualquer apreciação da matéria de facto (v., nomeadamente, acórdão de 28 de Maio de 1998, New Holland Ford/Comissão, C-8/95 P, Colect., p. I-3175, n._ 25).

20 Além disso, nos termos do artigo 112._, n._ 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, o recurso deve conter os fundamentos e argumentos jurídicos invocados.

21 Resulta destas disposições que um recurso deve indicar de modo preciso os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido (v., nomeadamente, acórdão New Holland Ford/Comissão, já referido, n._ 23).

22 No caso vertente, resulta da petição entrada no Tribunal de Justiça que o recorrente tomou posição sobre os elementos contestados do despacho cuja anulação é pedida, de forma que o seu recurso contém a explicação dos erros de direito pretensamente cometidos pelo Tribunal de Primeira Instância, bem como a exposição dos fundamentos jurídicos invocados pelo recorrente.

23 Deve observar-se seguidamente que um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância pode assentar numa argumentação já apresentada em primeira instância a fim de demonstrar que o Tribunal de Primeira Instância violou o direito comunitário ao rejeitar os fundamentos e argumentos que lhe foram apresentados pelo recorrente.

24 No caso vertente, resulta da petição entrada no Tribunal de Justiça que o recurso não constitui uma mera reprodução textual dos fundamentos e argumentos apresentados no requerimento inicial em primeira instância.

25 Nestas condições, há que rejeitar o primeiro argumento do Conselho.

26 O Conselho alega, em segundo lugar, que a apreciação feita pelo Tribunal de Primeira Instância das conclusões que o recorrente deveria retirar da formulação dos Regulamentos n.os 3834/91 e 3761/92 bem como das respostas do Conselho às questões colocadas pelo Tribunal no processo Benzler/Comissão, já referido, é uma apreciação de facto que escapa ao controlo do Tribunal de Justiça.

27 A este respeito, basta concluir que a interpretação dos regulamentos aplicáveis é uma questão de direito susceptível de constituir objecto de recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância.

28 Daqui decorre que o segundo argumento do Conselho não pode ser aceite e, por conseguinte, há que examinar o recurso quanto ao mérito.

Quanto ao mérito 29 O recorrente invoca três fundamentos em apoio do seu recurso.

30 Em primeiro lugar, considera que, ao afirmar, no n._ 35 do despacho recorrido, que o coeficiente de correcção deve ser considerado definitivo, o Tribunal de Primeira Instância adoptou uma interpretação dos Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93 contrária ao respectivo texto bem como ao n._ 18 do acórdão Benzler, já referido. Por conseguinte, entende que o Tribunal rejeitou sem razão o seu argumento baseado na protecção da confiança legítima.

31 Segundo o recorrente, o carácter provisório da fixação do coeficiente de correcção decorre claramente da expressão «decisões que o Conselho venha a adoptar» empregue pelo Conselho nas notas de rodapé dos Regulamentos n.os 3761/92 e 3608/93 nas suas versões francesa e alemã. Esta conclusão resultava igualmente do Regulamento n._ 3834/91, que qualifica os coeficientes de correcção fixados para a Alemanha de «número provisório» e que, além disso, no seu último considerando, justifica expressamente o carácter provisório da fixação dos referidos coeficientes.

32 Por outro lado, o próprio Conselho, nas suas respostas às questões que lhe foram colocadas pelo Tribunal de Primeira Instância nos processos Benzler/Comissão e Chavane de Dalmassy/Comissão, já referidos, tinha manifestado claramente a sua vontade de substituir, em data ainda indeterminada e com efeito retroactivo, os coeficientes de correcção provisórios por coeficientes definitivos. Nestas circunstâncias, o princípio da protecção da confiança legítima opunha-se à tese segundo a qual o recorrente devia ter contestado as suas folhas de pensão numa fase anterior.

33 A este respeito, deve sublinhar-se que foi a justo título que o Tribunal, no n._ 34 do despacho recorrido, recordou que um funcionário não pode invocar uma violação do princípio da confiança legítima na ausência de garantias precisas que lhe hajam sido fornecidas pela administração.

34 Ora, como salientou o Tribunal, nos n.os 35 e 36 do despacho recorrido, a interpretação proposta pelo recorrente constitui apenas um dos significados possíveis das disposições litigiosas. No que diz respeito à expressão «sem prejuízo das decisões que o Conselho venha a adoptar», resulta de uma comparação das diferentes versões linguísticas que o Conselho se reserva a possibilidade de alterar os coeficientes de correcção.

35 Daqui decorre, por conseguinte, que, embora os Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93 não excluam a possibilidade de o Conselho adoptar novos coeficientes de correcção com efeito retroactivo, não permitem de forma alguma dar essa hipótese como certa.

36 Nestas circunstâncias, não pode considerar-se que o Tribunal cometeu um erro de direito ao declarar, no n._ 38 do despacho recorrido, que o Conselho não criou, na esfera jurídica do recorrente, uma confiança legítima que lhe permitisse esperar poder escapar à aplicação dos prazos estatutários para reclamar.

37 O primeiro fundamento deve, por conseguinte, ser rejeitado.

38 O recorrente alega, em segundo lugar, que, ao interpretar as disposições dos regulamentos já referidos, o Tribunal de Primeira Instância não examinou os argumentos que o recorrente retira do princípio da boa fé ou desnatura-os ao declarar que o Conselho não lhe dera motivos para esperar que lhe fosse aplicado um coeficiente baseado no custo de vida em Berlim, quando o recorrente apenas alega que podia legitimamente esperar a fixação definitiva de um coeficiente de correcção, qualquer que ele fosse.

39 Ao adoptar a versão alemã dos Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93, o

Conselho tinha levado o recorrente a acreditar que, no momento próprio, seria adoptado com efeito retroactivo um regime definitivo de regras ainda desconhecidas, que resolveria as eventuais carências do regime provisório e contra o qual poderia actuar, em caso de necessidade, através das vias de recurso estatutárias. Os coeficientes de correcção aplicáveis à pensão do recorrente não tinham sido fixados de forma definitiva nos três regulamentos aplicáveis, mas apenas de forma provisória, fazendo deste modo nascer no recorrente a esperança de uma posterior fixação definitiva com efeito retroactivo.

40 Como salienta o advogado-geral nos n.os 44 e 45 das suas conclusões, o segundo fundamento do recorrente não é dissociável do primeiro na medida em que, no caso vertente, só haveria violação do princípio da boa fé se as expectativas do recorrente quanto à atitude futura do Conselho fossem justificadas.

41 Como resulta dos n.os 34 a 36 do presente acórdão, o Tribunal declarou a justo título que o Conselho não tinha criado, na esfera jurídica do recorrente, esperanças fundadas que lhe permitissem acreditar que ele adoptaria um novo regulamento respeitante aos coeficientes de correcção para a Alemanha fixados nos Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93. Portanto, o Conselho não violou o princípio da boa fé.

42 Mesmo supondo que o recorrente tivesse alegado perante o Tribunal que havia motivos para esperar, não a aplicação retroactiva de um coeficiente baseado no custo de vida em Berlim, mas somente a fixação de um coeficiente definitivo, qualquer que ele fosse, tal circunstância seria irrelevante uma vez que esta segunda esperança era, ela mesma, infundada.

43 Em terceiro lugar, o recorrente acusa o Tribunal de ter modificado, nos n.os 39 a 42 do despacho recorrido, o objecto do litígio a fim de poder declarar o recurso inadmissível. O seu pedido endereçado à AIPN bem como o seu recurso para o Tribunal de Primeira Instância não eram dirigidos contra as folhas provisórias que lhe foram enviadas, mas contra o facto de o regulamento definitivo e as folhas previstas nos regulamentos do Conselho se terem feito esperar, indevidamente, muito tempo.

44 Foi apenas no final de 1995 que o recorrente ficou convencido de que, de ora avante, só a falta de vontade do Conselho impedia este último de fixar igualmente o coeficiente de correcção definitivo para o período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994. Segundo ele, a não fixação de um coeficiente de correcção definitivo podia, por conseguinte, ser admitida enquanto perdurassem as incertezas ligadas à imprevisível situação gerada pela surpreendente reunificação da Alemanha.

45 O recorrente alega, diversamente do que o Tribunal de Primeira Instância afirmou no n._ 42 do despacho recorrido, pretender apenas que se declare que o carácter provisório desta situação, criada por essas disposições, não pode ser mantido por mais tempo. Quer invocar o seu direito a que as folhas de pensão provisórias que lhe foram enviadas para o período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994 sejam substituídas por folhas definitivas.

46 O recorrente acrescenta que o princípio da igualdade de tratamento proíbe que a fixação definitiva de um coeficiente de correcção para a Alemanha relativo ao período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1993 seja baseada num custo de vida diferente do de Berlim.

47 Em primeiro lugar, no que respeita ao argumento do recorrente segundo o qual o seu recurso era dirigido contra a omissão da AIPN, deve recordar-se que, conforme jurisprudência do Tribunal de Justiça, a folha de remuneração constitui um acto que causa prejuízo na acepção do artigo 90._, n._ 2, do Estatuto, susceptível de ser objecto de uma reclamação e eventualmente de um recurso (v., nomeadamente, acórdão de 4 de Julho de 1985, Delhez e o./Comissão, 264/83, Recueil, p. 2179, n._ 20). Por consequência, uma vez que as folhas de pensão mensais para o período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994 foram notificadas individualmente ao recorrente e lhe causaram prejuízo, estava aberta a este a possibilidade de apresentar reclamação contra cada uma delas nos três meses seguintes à respectiva notificação, de acordo com o artigo 90._ do Estatuto.

48 Daqui resulta ter sido a justo título que o Tribunal de Primeira Instância concluiu que não havia omissão da AIPN, pois esta tinha comunicado ao recorrente os actos que lhe causaram prejuízo e são, por conseguinte, susceptíveis de recurso.

49 Seguidamente, no que respeita ao argumento do recorrente segundo o qual as suas folhas de pensão, embora possam ser consideradas decisões definitivas do ponto de vista da admissibilidade de um recurso apresentado contra elas, não deixam de ser folhas provisórias pois têm como fundamento disposições provisórias, pelo que não regulam a sua situação de forma definitiva e que nem a necessidade de garantir a segurança das situações jurídicas nem, por consequência, os prazos de recurso, podem ser opostos ao recorrente, deve recordar-se que, apesar de os Regulamentos n.os 3834/91, 3761/92 e 3608/93, em que estão baseadas as folhas de pensão do recorrente para o período de 1 de Julho de 1990 a 30 de Junho de 1993, terem fixado de forma provisória o coeficiente de correcção para a Alemanha, não se pode alterar os actos constituídos por estas folhas enquanto o Conselho não alterar, com efeito retroactivo, os referidos regulamentos. Portanto, cada uma das folhas de pensão, que estabelece os direitos individuais do recorrente para o período em causa, constitui um acto definitivo e que causa prejuízo, na acepção dos artigos 90._ e 91._ do Estatuto, que o interessado deveria ter impugnado no prazo estatutário de três meses.

50 Por último, no que respeita ao argumento do recorrente segundo o qual o Tribunal modificou igualmente o objecto do recurso ao considerar, no n._ 42 do despacho recorrido, que o recurso visava obter a atribuição, relativamente ao período de 1 de Julho de 1991 a 30 de Junho de 1994, de uma pensão calculada em função do custo de vida de Berlim, basta concluir que este elemento não é essencial para a validade do raciocínio do Tribunal. Tendo-se o Tribunal pronunciado sobre as vias de recurso à disposição do recorrente e tendo declarado o único recurso à sua disposição como fora do prazo, o objectivo com que o mesmo interpôs este recurso é indiferente.

51 Nestas circunstâncias, o argumento do recorrente baseado no princípio da igualdade de tratamento deve ser considerado inoperante.

52 Resulta das considerações precedentes que deve ser negado provimento ao presente recurso.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

53 Nos termos do artigo 69._, n._ 2, do Regulamento de Processo, aplicável ao recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118._, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. O artigo 69._, n._ 4, do regulamento de Processo dispõe que os Estados-Membros e as instituições que intervenham no processo suportarão as suas próprias despesas. Tendo o Tribunal de Justiça pedido a condenação do recorrente nas despesas e tendo este sido vencido nos seus fundamentos, há que condená-lo nas despesas da presente instância. O Conselho suportará as suas próprias despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quarta Secção)

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) Max Kögler é condenado nas despesas.

3) O Conselho da União Europeia suportará as suas próprias despesas.

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