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Document 61998CC0015

Conclusões do advogado-geral Fennelly apresentadas em 13 de Abril de 2000.
República Italiana (C-15/98) e Sardegna Lines - Servizi Marittimi della Sardegna SpA (C-105/99) contra Comissão das Comunidades Europeias.
Auxílios de Estado - Auxílios da Região da Sardenha ao sector do transporte marítimo da Sardenha - Violação das regras de concorrência e incidência a nível das trocas entre Estados-Membros - Fundamentação.
Processos apensos C-15/98 e C-105/99.

Colectânea de Jurisprudência 2000 I-08855

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2000:203

61998C0015

Conclusões do advogado-geral Fennelly apresentadas em 13 de Abril de 2000. - República Italiana (C-15/98) e Sardegna Lines - Servizi Marittimi della Sardegna SpA (C-105/99) contra Comissão das Comunidades Europeias. - Auxílios de Estado - Auxílios da Região da Sardenha ao sector do transporte marítimo da Sardenha - Violação das regras de concorrência e incidência a nível das trocas entre Estados-Membros - Fundamentação. - Processos apensos C-15/98 e C-105/99.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-08855


Conclusões do Advogado-Geral


1 Nestes processos apensos, a República Italiana e a Sardegna Lines pedem a anulação de uma decisão da Comissão que declara incompatíveis com o mercado comum determinados auxílios concedidos pela Região da Sardenha às companhias de navegação locais. Estes recursos dizem sobretudo respeito à distinção entre auxílios existentes e auxílios novos ou alterados, na acepção do artigo 93._, n._ 3, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 88._, n._ 3, CE), ao alcance da obrigação da Comissão de fundamentar as suas decisões de auxílios de Estado e à importância, para efeitos da sua análise, das alegadas violações de disposições do Tratado diferentes das relativas aos auxílios de Estado.

I - Contexto factual e legal

A - O regime legal sardo

i) O regime inicial

2 O regime de auxílios em litígio data de 1951. Assim, é necessário comparar as disposições iniciais sardas com as versões posteriores.

3 O regime inicial sardo, a Lei regional sarda n._ 20, de 15 de Maio de 1951 (1) (a seguir «lei regional de 1951»), na redacção da Lei regional n._ 15, de 11 de Julho de 1954 (2) (a seguir «lei regional de 1954»), instituiu um sistema de auxílios financeiros em favor das companhias de navegação (a seguir «regime inicial»). Esse regime previa:

i) a criação de um fundo destinado à concessão de empréstimos às companhias de navegação com vista à construção, aquisição, transformação ou reparação de navios (artigo 1._) (3);

ii) que apenas as empresas com a sua sede social, domicílio fiscal e porto de registo na região da Sardenha podiam beneficiar desses empréstimos (artigo 2._) (4);

iii) os empréstimos não podiam exceder 60% do custo da operação, reduzido a 20% no caso (artigo 5._) da concessão de outros auxílios nacionais em aplicação da Lei (italiana) n._ 75, de 8 de Março de 1949;

iv) a taxa de juro estava limitada a 3,5% ao ano, passando a um máximo de 4,5% se o beneficiário tivesse recebido outros auxílios nacionais (artigo 6._);

v) estes empréstimos deviam ser reembolsados, no máximo, em doze prestações anuais, contadas a partir do terceiro ano seguinte à entrada em serviço do navio para o qual foi concedido o empréstimo (artigo 9._).

ii) As alterações de 1988 ao regime inicial

4 O regime inicial foi alterado pelos artigos 99._ e 100._ da Lei n._ 11 de 1988 (a seguir «lei regional de 1988»), que introduziram novos artigos 2._ e 13._ na lei regional de 1951 e aditaram um segundo parágrafo ao artigo 9._ existente (5). O artigo 2._ do regime alterado (a seguir «regime de 1988») previa que:

«a) a empresa deve ter a sua sede principal efectiva, a sua sede administrativa e o seu porto de registo, bem como, eventualmente, os seus principais armazéns, depósitos e equipamentos acessórios numa das cidades marítimas da região;

b) todos os navios que a empresa possui devem estar inscritos nas circunscrições marítimas da região;

c) a empresa deve utilizar os portos da região como centro das suas actividades de transporte marítimo, aí fazendo normalmente escala; em caso de exploração de serviços regulares, estes devem ter o seu ponto de partida ou incluir uma ou várias escalas periódicas num desses portos;

d) a empresa compromete-se a efectuar as suas reparações nos portos da região desde que os estaleiros navais sardos disponham das capacidades necessárias, salvo em caso de força maior, exigências inevitáveis em matéria de frete ou razões de economia ou rapidez evidentes;

e) para os navios com uma arqueação bruta superior a 250 toneladas, a empresa constitui uma tripulação específica que inclua todas as categorias de marítimos necessárias ao bom funcionamento do navio, recorrendo apenas a marítimos inscritos no registo de inscrição marítima do porto de matrícula; escolhe o pessoal da tripulação, tanto geral como especializado, nesse registo, sendo os únicos limites a este respeito os constantes da legislação nacional sobre a contratação dos marítimos...».

5 O novo artigo 13._ instituiu uma nova forma de auxílio. A Região da Sardenha foi autorizada a conceder um auxílio às empresas que preencham as condições para obter um empréstimo nos termos do regime de 1988, mas que desejem adquirir os seus navios através de operações de locação financeira e não de um empréstimo. A subvenção podia ser igual à diferença entre o custo actual do empréstimo calculado à taxa de 5% e o seu custo calculado à taxa de referência para o crédito naval em Itália. No termo do contrato, os navios em causa podiam ser adquiridos pelo locatário por uma quantia correspondente a 1% do seu preço de aquisição (6).

iii) As outras alterações de 1996

6 A Lei n._ 9, de 15 de Fevereiro de 1996 (a seguir «lei regional de 1996»), revogou simultaneamente o artigo 2._ da lei regional de 1951 e o artigo 99._ da lei regional de 1988, com o objectivo explícito de os tornar compatíveis com o direito comunitário (7). O regime, tal como alterado pela lei regional de 1996 (a seguir «regime de 1996»), introduziu duas inovações importantes. Em primeiro lugar, o artigo 36._, n._ 5, da lei regional de 1996 define como objectivo do fundo, instituído pela lei regional de 1951, «subvencionar os juros a pagar sobre os empréstimos a médio prazo e as operações de locação financeira normais para aquisição, construção e transformação de navios de transporte de passageiros e/ou de mercadorias com destino ou provenientes da Sardenha e das suas ilhas mais pequenas». Em segundo lugar, o artigo 36._, n._ 3, privilegia a concessão de auxílios aos beneficiários que introduzam meios de transporte novos e tecnologia avançada. Pode ser concedido um auxílio até 70% do custo de aquisição de um navio que, todavia, está limitado a 40 000 milhões de ITL.

B - O auxílio recebido pela Sardegna Lines

7 Por contrato de empréstimo celebrado em 22 de Julho de 1992, o Credito Industriale Sardo (uma instituição de crédito sarda, a seguir «Credito») aceitou conceder à Sardegna Lines - Servizi Marittimi della Sardegna SpA, sociedade registada em Cagliari, na Sardenha (a seguir «SL») - um empréstimo de 9 600 000 000 ITL para aquisição de um navio de transporte de passageiros, baptizado de Moby Dream, de um valor de 16 000 000 000 ITL. O montante do empréstimo representava 60% do montante total a investir, uma vez que a SL não tinha anteriormente beneficiado de qualquer auxílio nacional. O montante do empréstimo devia ser pago de uma vez após o pagamento pela SL da diferença entre o empréstimo e o custo total do navio. Os reembolsos só deviam começar a partir do terceiro ano seguinte à entrada em serviço do Moby Dream e deviam ser escalonados em doze prestações anuais de 993 445 913 ITL, que representavam o total do capital emprestado mais os juros à taxa de 3,5%.

C - A decisão da Comissão

8 Foi na sequência de uma denúncia que a Comissão soube da existência do regime de auxílios regional instituído pela lei regional de 1951. Em aplicação do artigo 93._, n._ 3, do Tratado, a Comissão, por ofícios datados de 10 e de 23 de Novembro de 1993, convidou as autoridades italianas a fornecer-lhe informações sobre esse regime de auxílios. A Comissão recebeu algumas informações por ofício de 20 de Dezembro de 1993. Numa reunião bilateral, que se realizou em Roma, em 18 de Janeiro de 1994, entre funcionários da Comissão e os seus homólogos italianos, a Comissão foi informada de que o assunto era da responsabilidade do Ministério dos Transportes e da Navegação Marítima, ao qual seriam transmitidas, para análise, as questões suscitadas pela Comissão. Apesar dos numerosos ofícios posteriormente enviados pela Comissão em 1994 e 1995, nenhuma outra resposta foi recebida das autoridades italianas.

9 Em consequência, por ofício de 24 de Junho de 1996 (a seguir «ofício de abertura I»), a Comissão informou o Governo italiano da sua decisão de iniciar o processo previsto no artigo 93._, n._ 2, do Tratado no que diz respeito aos auxílios concedidos em aplicação do regime de 1988 (8). No ofício de abertura I, a Comissão qualificou os auxílios em questão de auxílios «novos». Nem a República Italiana nem a Região da Sardenha contestaram essa qualificação durante o processo de exame contraditório (9). Todavia, a SL não participou nesse processo.

10 Pouco mais de um ano depois, a Comissão adoptou a Decisão 98/95/CE, de 21 de Outubro de 1997, relativa aos auxílios concedidos pela Região da Sardenha (Itália) ao sector do transporte marítimo da Sardenha (10) (a seguir «decisão de 1997»). Nessa decisão, a Comissão concluiu nomeadamente que: i) o auxílio financeiro concedido ao abrigo do regime de 1988 constitui um auxílio estatal na acepção do artigo 92._, n._ 1 do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87._, n._ 1, CE); ii) foi concedido em violação do artigo 93._, n._ 3, do Tratado; iii) não preenche os critérios para beneficiar das derrogações ao n._ 1 do artigo 92._, especificadas nos n.os 2 e 3 do mesmo artigo (artigo 1._). A Comissão também intimou a República Italiana a proceder à recuperação dos auxílios ilegais concedidos em aplicação do regime de 1988 (artigo 2._). No que se refere à qualificação do auxílio como auxílio de Estado, a Comissão declarou, na parte IV dos considerandos da decisão de 1997 (a seguir «parte IV da decisão»), que:

«O regime de auxílios constitui um auxílio estatal na acepção do n._ 1 do artigo 92._ do Tratado CE, uma vez que: a) as empresas beneficiárias são libertadas de encargos financeiros que teriam normalmente de suportar (juros comerciais normais e outros encargos sobre empréstimos ou operações de locação financeira); b) tais encargos são suportados por recursos estatais (as autoridades da Sardenha); c) os auxílios são selectivos (reservados ao sector do transporte marítimo); d) os auxílios afectam as trocas comerciais entre os Estados-Membros. No que se refere à alínea d), a Comissão assinalou, na sua decisão que inicia o processo, que 90% das mercadorias provenientes dos Estados-Membros são transportadas para a Sardenha por mar e que mais de 90% das mercadorias originárias da Sardenha são transportadas para os Estados-Membros pela mesma via. Além disso, 65% do tráfego turístico (passageiros com veículos) entre o continente e a Sardenha é assegurado por companhias de navegação. As autoridades italianas não contestaram, nas suas observações, estes dados estatísticos, tal como não contestaram a designação do regime de auxílios como auxílio estatal na acepção do n._ 1 do artigo 92._».

11 Por ofício de 14 de Novembro de 1997 (a seguir «ofício de abertura II»), a Comissão notificou a República Italiana da sua decisão de iniciar um processo de exame contraditório separado, nos termos do artigo 93._, n._ 2, do Tratado, no que diz respeito ao regime instituído pela lei regional de 1996 (11). Nesse ofício de abertura II, a Comissão declarou expressamente que a sua apreciação do regime de 1996 não se referia ao de 1998. Ao mesmo tempo que observou que o regime de 1996 «não contém disposições discriminatórias com fundamento na nacionalidade...», a Comissão baseou a sua decisão no facto de ter «sérias dúvidas», que enumerou, quanto à compatibilidade do regime (12).

II - Objecto dos recursos

12 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 22 de Janeiro de 1998 (processo C-15/98), nos termos do artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230._, segundo parágrafo, CE), a República Italiana solicitou a anulação da decisão de 1997 e da decisão alegadamente contida no ofício de abertura II, bem como a condenação da Comissão nas despesas. Na sua petição (processo C-105/99), que foi remetida ao Tribunal de Justiça, a SL solicitou a anulação da decisão de 1997 e a condenação da Comissão nas despesas (13).

13 A Comissão suscita algumas objecções quanto à admissibilidade do recurso da República Italiana. Os fundamentos de anulação invocados pelas recorrentes sobrepõem-se amplamente. Todavia, a República Italiana acusa igualmente a Comissão de erradamente ter dado início a dois processos formais de exame em vez de a um e, desse modo, ter alterado a natureza do processo administrativo que conduziu à adopção da decisão de 1997, de ter igualmente violado os n.os 2 e 3 do artigo 92._ do Tratado ao considerar o regime de 1988 incompatível com o direito comunitário em virtude de as condições que regulam o auxílio concedido nesse quadro infringirem outras disposições fundamentais do Tratado. Por sua vez, a SL alega que a decisão de 1997 é inválida porque ignora a aplicação da Directiva 90/684/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1990, relativa aos auxílios à construção naval (14).

14 Uma vez que os dois recursos se sobrepõem em grande parte, apenas tratarei separadamente os fundamentos distintos invocados pelas recorrentes e os argumentos da Comissão em matéria de admissibilidade.

III - Admissibilidade

A - O recurso da República Italiana (processo C-15/98)

i) Âmbito do pedido

15 A Comissão admite que o mesmo recurso possa comportar pedidos de anulação de diversos actos, mas que: i) o princípio geral é o de que apenas um único acto deve ser visado: o artigo 174._ do Tratado CE (actual artigo 231._ CE) e o artigo 19._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça referem um «acto» no singular; ii) quando a conexão é tal que é suficiente um único recurso, os fundamentos de recurso devem ser formulados de forma clara e precisa; iii) o Tribunal de Justiça admitiu que, em casos excepcionais, o mesmo recurso possa visar diversas decisões, mas apenas se forem paralelas de um ponto de vista processual, temporal e material, ou quando uma for a consequência lógica da outra, ou constitua uma etapa preliminar em relação à outra, o que se verifica no caso em apreço (15).

16 Em meu entender, o primeiro ponto não tem fundamento. A utilização do termo «acto» no singular no artigo 174._ do Tratado não pode ser decisiva, tendo em conta a utilização de «actos» no plural no artigo 173._ do Tratado. É mais apropriada uma abordagem de fundo.

17 A Comissão não contesta «a possibilidade de um único recurso que englobe» várias decisões (16). Partilho da sua opinião, segundo a qual deve existir, contudo, uma conexão suficiente entre esses actos para que o Tribunal de Justiça se possa sobre eles debruçar no âmbito de um único processo, que inclua as observações das partes, escritas ou orais, as conclusões do advogado-geral e o acórdão do Tribunal de Justiça.

18 Em contrapartida, não penso que seja apropriado estabelecer categorias formais de ligação, como as propostas pela Comissão. Bastará que os actos e os fundamentos de recurso estejam ligados de forma suficientemente estreita para que se garanta o seu tratamento num âmbito de um único recurso. No presente processo, estou de acordo com o Governo italiano para afirmar que o nexo é suficiente. O objecto da decisão de 1997 e o do ofício de abertura II estão estreitamente ligados. Os fundamentos invocados pela República Italiana em cada um dos casos são quase idênticos, independentemente do mérito de cada um.

19 Daí resulta, em minha opinião, que o recurso da República Italiana é admissível tanto no que respeita à decisão de 1997 como à decisão contida no ofício de abertura II.

ii) A qualificação do regime da lei de 1988

20 A Comissão contesta igualmente a admissibilidade do recurso da República Italiana na medida em que esta contesta a qualificação do regime da Lei de 1988 adoptada na decisão de 1997. Como a qualificação de auxílio alterado conferida pela Comissão ao regime de 1988 no seu ofício de abertura I tinha efeitos jurídicos obrigatórios, de acordo com a jurisprudência Cenemesa (17) e Italgrani (18), esse ofício podia, portanto, ser impugnado pela República Italiana. Trata-se de efeitos erga omnes decorrentes do ofício, que não são absorvidos pela decisão final. Ao não impugnar o ofício de abertura I, o Governo italiano ultrapassou o prazo para contestar a decisão de 1997, uma vez que esta confirma aquela qualificação. Por outro lado, a Comissão afirma que a contestação da qualificação que adoptou no ofício de abertura II é igualmente intempestiva, visto que nunca autorizou o regime de 1988.

21 Nos acórdãos Cenemesa e Italgrani, o Tribunal de Justiça rejeitou o argumento da Comissão relativo à falta de legitimidade para impugnar uma decisão de iniciar um processo de exame contraditório. No caso em apreço, a Comissão faz um raciocínio a contrario; não só um Estado-Membro pode contestar a qualificação de uma medida como auxílio de Estado, adoptada numa decisão que inicia esse processo, mas, na realidade, deve fazê-lo ou perde o direito de impugnar essa qualificação se esta se mantiver na decisão final da Comissão.

22 Na minha opinião, este ponto de vista não tem qualquer apoio na fundamentação do Tribunal de Justiça nesses processos. Quando a Comissão, ao iniciar um processo de exame contraditório, considera que o auxílio constitui um auxílio novo ou alterado, essa qualificação tem consequências jurídicas importantes. O Estado-Membro em causa não pode conceder o auxílio enquanto a Comissão não tiver decidido que é compatível com o mercado comum - ou que, afinal, não constitui um auxílio de Estado. O Tribunal de Justiça preocupou-se em garantir que os interessados possam contestar «a escolha, pela Comissão, das regras de processo aplicáveis... que tinham efeitos jurídicos» (19).

23 Estou de acordo com o Governo italiano quando este afirma que daí não resulta, por outro lado, que o facto de um Estado-Membro não ter interposto recurso de anulação do ofício de abertura do procedimento o priva do direito de impugnar a decisão final. Não seria justo nem de interesse para a economia do processo encorajar e/ou obrigar os Estados-Membros e as outras partes interessadas, que desejam preservar todos os seus direitos, a interpor recursos de anulação da escolha feita pela Comissão no início do processo de exame contraditório.

24 Como não se contesta que o recurso da República Italiana foi interposto tanto da decisão de 1997 como da decisão adoptada no ofício de abertura II no prazo de dois meses exigido pelo artigo 173._, quinto parágrafo, do Tratado, aumentado dos prazos de dilação aplicáveis em razão da distância, o direito da República Italiana de impugnar a qualificação pela Comissão do regime de 1988 ou do regime de 1996 não fica precludido (20).

B - O recurso da Sardegna Lines (processo C-105/99)

25 A Comissão não contesta a admissibilidade do recurso da SL. Esta alega que o Tribunal de Justiça admitiu implicitamente, no acórdão Alemanha e Pleuger Worthinghton/Comissão (21), que os beneficiários do auxílio podem impugnar as decisões da Comissão que declaram esse auxílio incompatível com o mercado comum. É impossível pretender que o recurso da SL é inadmissível. Com efeito, a SL é directa e individualmente afectada, como exige o artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado. Por outras palavras, embora tendo por destinatária a República Italiana, a decisão de 1997 afecta substancialmente os interesses da SL enquanto destinatária do auxílio impugnado. O direito do destinatário de um auxílio de impugnar uma decisão que declara o referido auxílio incompatível com o mercado comum está actualmente bem consolidado (22). Apenas em circunstâncias excepcionais é que esse direito de acção pode não existir (23).

IV - Exame dos recursos

26 Dada a considerável sobreposição existente entre os argumentos relativos à alegada insuficiência da fundamentação na decisão de 1997 e à pretensamente injustificada qualificação do auxílio como auxílio alterado, examinarei, em primeiro lugar, dois argumentos gerais distintos, invocados, cada um, por uma das recorrentes, mas pondo ambos em causa a validade da decisão de 1997 no seu conjunto.

A - Os vícios alegados no processo administrativo

27 O Governo italiano alega que a Comissão violou os seus direitos de defesa, separando indevidamente em dois processos o exame do que constitui, em substância, o mesmo regime de auxílios. Afirma que o exame das alterações introduzidas num regime de auxílios durante o processo de exame desse regime constitui uma prática jurídica normal (24). Esta cisão teve por efeito alterar o processo de exame contraditório inicial, desencadeado pelo ofício de abertura I, de um processo respeitante à compatibilidade do regime no seu conjunto num processo relativo a pagamentos individuais do auxílio durante o período que vai de 1988 a 1996. Segundo o Governo italiano, o poder da Comissão de apreciar os regimes de auxílios está limitado aos em vigor e àqueles ao abrigo dos quais um auxílio pode ser pago no futuro. Não era esse o caso do regime de 1988 aquando da adopção da decisão de 1997. Além disso, ao alterar a natureza efectiva do inquérito em curso, a Comissão violou os direitos da defesa não apenas da República Italiana, mas também das outras partes interessadas, que, como a República Italiana, tinham o direito de concluir do inquérito inicial que a Comissão só estava preocupada em apreciar a compatibilidade das características gerais do regime de auxílios sardo.

28 A Comissão alega que, nos termos do artigo 93._ do Tratado, é obrigada a proceder à abertura de um processo de exame contraditório quando considere que um projecto relativo à instituição ou alteração de um auxílio de Estado não é compatível com o mercado comum (25). Esta obrigação abrange tanto a instituição como a alteração do auxílio. Como chegara a essa conclusão a propósito das alterações introduzidas pela lei regional de 1996, era obrigada a tomar a decisão descrita no ofício de abertura II. Por outro lado, essa decisão justificava-se por uma questão de economia processual. Face à obrigação de examinar as modificações a um regime de auxílios no quadro do inquérito existente, um Estado-Membro podia sempre prorrogar o processo através de alterações intermináveis do regime cujo exame estava em curso. Resultava claramente do ofício de abertura I que a Comissão tinha a intenção de examinar não um regime abstracto, mas precisamente os auxílios concedidos em aplicação do regime de 1988.

29 Estou convicto, pelas razões apresentadas pela Comissão, que esta não cindiu indevidamente o seu exame dos regimes de 1988 e de 1996. Resulta claramente da redacção do artigo 93._ do Tratado que a Comissão tem simultaneamente o direito e o dever de examinar os regimes de auxílios de Estado em todos os estádios da sua evolução. O n._ 1 do artigo 93._ do Tratado impõe à Comissão que proceda ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes e o n._ 3 do artigo 93._ obriga-a a examinar todos os projectos que visem alterar os auxílios existentes ou instituir novos auxílios.

30 De resto, em minha opinião, este ponto de vista é completamente coerente com a jurisprudência Heineken, em que tinham sido introduzidas alterações a um projecto de auxílio durante a sua adopção pelo Parlamento neerlandês (26). A declaração do Tribunal de Justiça no sentido de que o objectivo do n._ 3 do artigo 93._ do Tratado «não poderia ser alcançado se a Comissão só fosse informada dos projectos iniciais e não das alterações ocorridas posteriormente» e que «essas informações podem ser fornecidas à Comissão no quadro das consultas entre esta e o Estado-Membro em causa, resultantes da notificação inicial» (27), não exige, como alega a República Italiana, que a Comissão examine sempre simultaneamente um regime de auxílios inicial e as alterações introduzidas posteriormente. É claro que essa obrigação não existe «na hipótese em que a alegada alteração constitui na realidade uma medida de auxílio distinta, que deve ser objecto de uma apreciação separada, e que não será, portanto, susceptível de influenciar a apreciação que a Comissão fez do projecto inicial» (28).

31 Assim, a Comissão não está impedida de considerar que a modificação, em especial após um período de tempo considerável (oito anos, no caso vertente), de alterações anteriores a um regime de auxílios existente deve ser objecto de um exame separado. De facto, partilho a opinião da Comissão, segundo a qual, desde que considere que um auxílio novo ou alterado foi concedido sem ter sido notificado, deve, em conformidade com a jurisprudência Rover, iniciar um novo exame contraditório desse suposto auxílio (29). É também o caso quando as alterações anteriores foram, como no caso em apreço, objecto de um exame - ainda que não tenha sido em aplicação de um processo de exame contraditório nos termos do n._ 2 do artigo 93._ do Tratado - ao longo de um certo número de anos antes da adopção pelo Estado-Membro em causa das alterações posteriores.

32 Por outro lado, não tenho qualquer dúvida sobre a improcedência do argumento da República Italiana segundo o qual a Comissão só pode examinar os auxílios concedidos no quadro de regimes que podem permanecer aplicáveis no futuro. O Tribunal de Justiça sublinhou por diversas vezes que os auxílios concedidos ilegalmente devem em princípio ser recuperados de modo a restabelecer o statu quo ante (30). A distorção de concorrência causada por determinados auxílios de Estado que são incompatíveis com o Tratado não acaba só porque o regime de auxílios em aplicação do qual estes foram concedidos deixou de existir. Aceitar o argumento da República Italiana reduziria de forma significativa o poder da Comissão de controlar os auxílios de Estado e equivaleria a pôr em causa a eficácia do direito comunitário em matéria de auxílios de Estado (31).

33 Estou convencido de que o argumento do Governo italiano, respeitante à separação injustificada dos exames dos regimes de 1988 e de 1996, devia ser rejeitado. Como o Governo italiano não apresentou nenhum outro argumento autónomo que possa afectar a validade da decisão contida no ofício de abertura II, e a sua validade não pode, em minha opinião, forçosamente ser afectada por nenhum argumento procedente relativo à decisão de 1997, parece-me claro que, embora admissível, o recurso da República Italiana, na medida em que foi interposto do ofício de abertura II, não pode ser acolhido.

B - A violação da Sétima Directiva

34 A SL alega que a decisão de 1997 é inválida porque não toma em conta a aplicação da Sétima Directiva (32). Alega que esta última abrange o auxílio aos armadores e que a Comissão devia, assim, ter apreciado a compatibilidade do regime de 1988 unicamente por referência aos critérios definidos nessa directiva. Além disso, na réplica, a SL afirmou que a Comissão não explicara, na decisão de 1997, as razões que a levaram a considerar que a Sétima Directiva era inaplicável.

35 Na contestação, a Comissão sublinha que, embora nas suas orientações de 1997 sobre os auxílios de Estado ao transporte marítimo tenha admitido que não se aplicam aos auxílios à construção naval, deve contudo assegurar-se de que o auxílio aos armadores não beneficia efectivamente a construção naval, contrariando as disposições da Sétima Directiva (33). Como a Comissão explica, esse é o sentido da alusão, na decisão de 1997 (parte VI da decisão), à ausência de qualquer «mecanismo» que garanta o respeito das regras aplicáveis à construção naval pelo regime da Lei de 1988. Como isso não foi contestado pela SL, a Comissão refere que o argumento desta não é procedente. Na tréplica, a Comissão contesta, além disso, a afirmação da SL, segundo a qual, como a Sétima Directiva podia ser relevante, as disposições dessa directiva são as únicas aplicáveis ao auxílio em causa, com exclusão de todas as outras regras comunitárias.

36 Embora resulte claramente do texto da Sétima Directiva que ela diz principalmente respeito ao «auxílio à construção naval», resulta do artigo 3._, lido à luz do décimo segundo considerando, que também pode abranger o auxílio aos armadores. Essas disposições são, respectivamente, as seguintes:

«Todas as formas de auxílio aos armadores ou a terceiros, disponíveis como auxílio para a construção ou para a transformação de embarcações, estão sujeitas às regras de notificação previstas no artigo 11._».

«Considerando que, por razões de transparência e de equidade, se justifica continuar a incluir na actual política de auxílios indirectos concedidos à construção naval sob a forma de auxílios aos investimentos concedidos aos armadores para a construção e transformação de embarcações.»

Em consequência, embora a SL possa ter razão ao pretender que a Sétima Directiva era aplicável, esse argumento não a pode ajudar mas, pelo contrário, prejudicar a sua causa. A razão consiste em que o auxílio de Estado aos armadores, na medida em que pode ser considerado «disponível como auxílio para a construção ou para a transformação de embarcações» (sublinhado meu), está sujeito a outra condição obrigatória «específica» de notificação, nos termos do artigo 11._ da Sétima Directiva. O artigo 11._, n._ 2, alínea a), prevê especificamente a notificação de «qualquer regime de auxílio, novo ou já existente, ou qualquer alteração aos regimes de auxílio existentes abrangidos pela presente directiva». Afirmar que apenas a Sétima Directiva era aplicável ao auxílio concedido nos termos do regime de 1988 equivalia, assim, a aceitar que as autoridades italianas tinham cometido uma violação suplementar do direito comunitário, ou seja, nem sequer tinham notificado o regime inicial à Comissão. Como a Comissão não menciona essa violação no ofício de abertura I, considerou clara e correctamente o regime de 1988 como um auxílio aos armadores, que apenas devia ser examinado na perspectiva da obrigação menos pesada de notificação imposta pelo Tratado.

37 O facto de um auxílio concedido a um armador poder afinal beneficiar um construtor não torna automaticamente inaplicáveis as disposições gerais do Tratado em matéria de auxílios de Estado. Cabe recordar que a Sétima Directiva, baseando-se em princípio no (que era então) artigo 92._, n._ 3, alínea d), do Tratado, que «permite ao Conselho, deliberando por maioria qualificada, sob proposta da Comissão, alargar o leque de categorias de auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado comum, para além das [outras] categorias» desta disposição, «introduz a possibilidade de derrogar, em casos específicos, a proibição de auxílios que doutra forma seriam incompatíveis» (34). A Sétima Directiva só poderia, assim, ajudar a SL se fornecesse outra base sobre a qual o regime de 1988 pudesse ser declarado compatível com o mercado comum. Ora, a SL não menciona nada disso. O seu argumento não tem, assim, objecto, na medida em que afirma que a Comissão violou a directiva ao confinar a sua análise, na decisão de 1997, aos fundamentos de eventual compatibilidade, referidos no artigo 92._, n._ 3, do Tratado.

38 Estou, portanto, convencido de que o fundamento decorrente da violação pela Comissão da Sétima Directiva não pode ser acolhido.

C - O carácter suficiente da fundamentação da Comissão

39 É claro, como em especial resulta das alegações orais das recorrentes, que o seu principal fundamento é que a Comissão não fundamentou correctamente a sua decisão, na medida em que declarou que o auxílio concedido nos termos do regime de 1988 era susceptível de falsear ou de ameaçar falsear a concorrência e afectar as trocas entre Estados-Membros.

i) Síntese das observações

40 A República Italiana, apoiada pela SL, afirma que, apesar de em certos casos poder resultar das próprias circunstâncias em que o auxílio foi concedido que essas condições estão preenchidas, a Comissão não deve deixar de evocar essas circunstâncias na sua decisão. Ora, a decisão de 1997 não contém qualquer análise dos potenciais efeitos negativos sobre a concorrência nem qualquer exame dos seus alegados efeitos sobre as trocas comerciais entre Estados-Membros. A condição de fundamentação imposta pelo artigo 190._ do Tratado CE (actual artigo 253._ CE) em relação a um acto comunitário derivado, como definida pelo Tribunal de Justiça, nomeadamente no acórdão Leeuwarder, não se encontra satisfeita (35). A referência às estatísticas de transporte de bens e de serviços entre a Sardenha e os Estados-Membros na parte IV da decisão (citada no n._ 10 supra) não prova que o auxílio afecta o comércio entre Estados-Membros. Essa forte dependência em relação ao transporte marítimo é natural atendendo ao estatuto de ilha da Sardenha. Em qualquer caso, mesmo que a Comissão, na sua decisão de 1997, tivesse analisado em que medida as companhias marítimas que operam a partir de França e de Espanha prestavam serviços à Sardenha, teria chegado à conclusão de que o volume dessas trocas era mínimo (36).

41 A SL observa que o único ponto pertinente em relação aos eventuais efeitos negativos do auxílio sobre a concorrência e sobre o comércio intracomunitário, aos quais alude a Comissão no seu ofício de abertura I, é que «as trocas comerciais entre a parte continental da Itália, a Sardenha e a Córsega têm natureza comunitária, podendo os auxílios concedidos a uma companhia que opere no mercado em questão ser considerados, pela Comissão, como auxílios que falseiam ou ameaçam falsear a concorrência» (37). Todavia, isto não foi reproduzido na decisão de 1997. Não é possível deduzir apenas da insularidade da Sardenha, como a Comissão parece ter feito, que o auxílio às empresas aí estabelecidas afecta inevitavelmente o comércio intracomunitário. A SL alega que a decisão de 1997 não contém nenhuma análise do mercado, nenhuma referência às partes de mercado dos beneficiários, nem qualquer exame coerente dos efeitos do auxílio sobre as trocas.

42 A falta de fundamentação no que diz respeito ao mercado relevante é especialmente marcante se se recordar que, nos termos do artigo 6._, n._ 2, do Regulamento (CEE) n._ 3577/92 do Conselho, de 7 de Dezembro de 1992, relativo à aplicação do princípio da livre prestação de serviços aos transportes marítimos internos nos Estados-Membros (cabotagem marítima) (38), «a cabotagem insular no Mediterrâneo» só foi liberalizada a partir de 1 de Janeiro de 1999. Não existindo, na época dos factos (1988-1996), concorrência entre as companhias marítimas italianas e aquelas que estavam estabelecidas no resto da Comunidade, o auxílio não podia, por definição, afectar o comércio intracomunitário.

43 A Comissão alega que a decisão de 1997 está correctamente fundamentada visto que o auxílio concedido de forma selectiva às empresas lhes permite melhorar a sua situação face aos seus concorrentes e falseia, assim, claramente a concorrência e afecta as trocas comerciais entre Estados-Membros (39). A análise retoma a constante do ofício de abertura I, que não foi contestada pela República Italiana durante o processo de inquérito. Nestas condições, nem uma análise detalhada do mercado nem um exame dos efeitos do auxílio sobre as trocas comerciais eram, segundo a Comissão, necessários (40). Isso é apoiado pelo facto de o Tribunal de Justiça ter declarado que o montante relativamente diminuto do auxílio ou a dimensão relativamente modesta do seu beneficiário não impedem que se qualifique de auxílio de Estado (41). A Comissão nega igualmente que haja uma disparidade entre o ofício de abertura I e a decisão de 1997; um e outra referem-se às mesmas estatísticas de transporte, o primeiro fazendo especificamente referência à natureza comunitária das trocas comerciais entre o continente italiano, a Sardenha e a Córsega, referência que não foi retomada na segunda porque era evidente. Além disso, o facto de os beneficiários do auxílio apenas intervirem no comércio interno de um Estado não basta para impedir qualquer efeito negativo do auxílio sobre as trocas intracomunitárias, visto que pode ajudá-los a reforçar a sua posição concorrencial (42). A remissão que a SL faz para o Regulamento n._ 3577/92 não é pertinente porque a derrogação provisória em matéria de cabotagem que prevê não proíbe a prestação de serviços marítimos internacionais entre a Sardenha e os outros Estados-Membros nem a cabotagem, através de companhias marítimas, entre a Sardenha e o continente italiano. Na tréplica, no recurso interposto pela SL, a Comissão acrescenta que o regulamento também não proibia os não italianos de registarem os seus navios em Itália e, assim, fazerem cabotagem com a Sardenha, aspecto que foi repetido em resposta a uma pergunta escrita do Tribunal de Justiça.

ii) Análise

44 Embora a fundamentação da decisão de 1997 seja (no melhor dos casos) lacónica, a Comissão alega, efectivamente, que os recorrentes conheciam bem os fundamentos da decisão, que, de qualquer modo, em seu entender, são evidentes. A alegada evidência é, portanto, um elemento a reter no exame da argumentação das recorrentes.

45 A afirmação clássica da obrigação das instituições comunitárias de fundamentarem as suas decisões continua a ser a que foi formulada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Remia e o./Comissão (43).

«... embora, nos termos do artigo 190._ do Tratado, a Comissão seja obrigada a mencionar os elementos de facto que justificam a decisão e as condições jurídicas que a levaram a adoptá-la, esta disposição não exige que a Comissão analise todos os elementos de facto e de direito examinados durante o procedimento administrativo. A fundamentação de uma decisão que causa prejuízo deve permitir ao Tribunal de Justiça exercer o seu controlo da legalidade e fornecer ao interessado as indicações necessárias que lhe permitam determinar se a decisão está bem fundamentada.»

Nos processos seguintes, o Tribunal de Justiça sublinhou que o alcance da exigência é «função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas directa e individualmente afectadas pelo acto podem ter em obter explicações» (44). Assim, «a questão de saber se a fundamentação de um acto satisfaz as exigências do artigo 190._ do Tratado deve ser apreciada à luz não somente do seu teor, mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa» (45).

46 No acórdão Philip Morris, ponto de partida apropriado no que diz respeito à exigência de fundamentação nos processos de auxílios de Estado, o Tribunal de Justiça foi confrontado com um fundamento segundo o qual a decisão da Comissão (46) impugnada estava fundamentada «de modo insuficiente ou, pelo menos, incompreensível e/ou contraditória» relativamente à condição segundo a qual o auxílio projectado (destinado a aumentar a capacidade de produção de um dos fabricantes neerlandeses de cigarros da recorrente) afecta as trocas comerciais e falseia a concorrência (47). Em especial, a recorrente referiu que o exame não comportava qualquer análise de mercado e que não fora tomado em conta o efeito negligenciável do auxílio projectado sobre os futuros custos de produção da fábrica. O Tribunal de Justiça rejeitou este argumento. Referiu o facto pacífico segundo o qual, após a realização dos investimentos projectados, a recorrente «assegurará cerca de 50% da produção neerlandesa de cigarros», prevendo «a exportação para os outros Estados-Membros de mais de 80% da sua produção» e que o auxílio projectado representava «3,8% do montante dos investimentos realizados» (48). O Tribunal de Justiça acrescentou (49):

«Quando um auxílio financeiro concedido pelo Estado reforça a posição de uma empresa em relação a outras empresas concorrentes no que respeita às trocas intracomunitárias, estas devem ser consideradas influenciadas pelo auxílio. No caso em apreço, o auxílio que o Governo neerlandês projectava conceder dizia respeito a uma empresa orientada para o comércio internacional, como o prova a elevada percentagem da sua produção que pretende exportar para outros Estados-Membros. O auxílio em questão devia contribuir para o aumento da sua capacidade de produção e, por consequência, para o crescimento da sua capacidade de alimentar os fluxos das trocas, incluindo os que existem entre os Estados-Membros. Por outro lado, o auxílio teria diminuído o custo da transformação das instalações de produção e, por essa razão, teria dado à recorrente uma vantagem na concorrência com os fabricantes que tinham realizado ou tinham a intenção de realizar por sua conta um aumento análogo da capacidade de rendimento das suas instalações.

Estas circunstâncias, que foram evocadas nos considerandos da decisão impugnada e não foram contestadas pela recorrente, constituem uma justificação suficiente para a Comissão decidir que o auxílio projectado era susceptível de afectar as trocas entre Estados-Membros e ameaçava falsear a concorrência entre as empresas estabelecidas nos diversos Estados-Membros» (o sublinhado é meu).

47 O Tribunal de Justiça adquiriu, assim, a convicção de que as informações mencionadas na decisão impugnada suportavam a conclusão da Comissão. Partilho da opinião da SL, segundo a qual o Tribunal de Justiça não enunciou um princípio segundo o qual a simples concessão de um auxílio a determinadas empresas nacionais específicas, que é de facto inerente à natureza do auxílio de Estado, justifica necessariamente a conclusão de que essa concessão preenche todos os requisitos para constituir um auxílio de Estado na acepção do Tratado (50). A Comissão não pode simplesmente presumir que um auxílio a determinadas empresas específicas afecta o comércio intracomunitário e falseia a concorrência. Isso resulta, na realidade, do acórdão Alemanha/Comissão, o primeiro em matéria de fundamentação, em que o Tribunal de Justiça concluiu que a Comissão não tinha fundamentado correctamente a sua decisão de indeferir a concessão de um contingente pautal de 450 000 hectolitros de vinho, mas atribuir um contingente de 100 000 hectolitros (51). Em especial, o Tribunal de Justiça observou que, «exceptuando considerações gerais, indistintamente aplicáveis a outros casos ou que se limitam a reproduzir o Tratado, a Comissão limitou-se a invocar `os elementos de informação recolhidos', sem precisar nenhum deles, para declarar `que a produção dos vinhos em questão [isto é, na Comunidade] é largamente suficiente'» (52).

48 Resulta muito claramente do acórdão Leeuwarder que a Comissão não pode apoiar-se em presunções para formar a base da sua fundamentação nos processos de auxílios de Estado (53). Nesse processo, que dizia respeito à aquisição por uma empresa de desenvolvimento público de uma participação numa fábrica de cartão, o Reino dos Países Baixos e a Leeuwarder contestaram o carácter adequado da fundamentação da Comissão na decisão impugnada, quer em relação à qualificação da aquisição como auxílio, quer em relação à sua conclusão no sentido de ser susceptível de falsear a concorrência e afectar o comércio intracomunitário. Os recorrentes apenas tiveram sucesso quanto ao segundo aspecto da falta de fundamentação. A abordagem do Tribunal de Justiça é muitíssimo relevante para apreciar a validade da decisão da Comissão no presente processo (54):

«Embora, em determinados casos, possa resultar das próprias circunstâncias em que o auxílio foi concedido que este é susceptível de afectar as trocas entre Estados-Membros e falsear ou ameaçar falsear a concorrência, compete no mínimo à Comissão evocar essas circunstâncias nos fundamentos da sua decisão. No caso vertente, esta não o fez, não contendo a decisão controvertida a menor indicação no que respeita à situação do mercado considerado, à parte da LPF nesse mercado, aos fluxos de trocas dos produtos em causa entre os Estados-Membros e às exportações da empresa» (o sublinhado é meu).

49 O acórdão Bremer Vulkan é igualmente útil. O Tribunal de Justiça estabeleceu nesse processo que «as afirmações contidas no acto impugnado e os dados que dele constam não constituem fundamento suficiente para sustentar as conclusões a que a Comissão chegou», a saber, que uma garantia concedida a uma empresa (BV) para a auxiliar a adquirir outra (KAE) podia falsear a concorrência e afectar o comércio intracomunitário (55). A fundamentação com base nestes critérios foi declarada insuficiente porque (56):

«... o acto impugnado não contém a mínima indicação quanto à situação do mercado considerado, à parte da KAE nesse mercado e à posição das empresas concorrentes. Relativamente aos fluxos de trocas dos produtos em causa entre os Estados-Membros, a Comissão contenta-se em citar as importações dos Estados-Membros de produtos de três posições pautais, sem determinar a parte da KAE nessas importações.»

50 Sou de opinião de que a parte IV da decisão (citado no n._ 10) não preenche o critério aplicado pela referida jurisprudência. Fora o facto de se contentar efectivamente em afirmar que o auxílio concedido em aplicação do regime de 1988 satisfaz as quatro condições principais exigidas para ser qualificado de auxílio de Estado na acepção do Tratado, a Comissão invocou - mas, nesse caso, também, unicamente em apoio da sua conclusão, segundo a qual o comércio intracomunitário era afectado - estatísticas muito gerais sobre o transporte marítimo de mercadorias e o tráfico turístico entre, respectivamente, «os Estados-Membros» e a «Sardenha» e a «Comunidade» («Stati membri» na versão italiana, que faz fé) e a «Sardenha». Embora o agente da Comissão tenha reconhecido, em resposta a uma questão colocada na audiência, que essa alusão era um erro e devia - como resulta de forma um pouco mais clara do texto francês da decisão de 1997 - fazer referência ao comércio entre a Itália e a Sardenha, por um lado, e entre a Sardenha e os outros Estados-Membros, por outro, os beneficiários do auxílio - e outras partes interessadas que tivessem considerado a possibilidade de o impugnar - tinham legitimidade para invocar a versão italiana que faz fé e, assim, considerar que a Comissão tinha baseado a sua fundamentação nos valores globais do comércio entre a Sardenha e os Estados-Membros, incluindo a Itália (57).

51 Como essa fundamentação é, na melhor das hipóteses, ambígua, pouco ou nada sustenta a qualificação de auxílio de Estado efectuada pela Comissão. Além disso, em meu entender, resulta claramente da precisão «No que se refere à alínea d)» [«Per quanto riguardo la lettera d)»], que antecede a referência a esses valores, que apenas se destinavam a apoiar a conclusão da Comissão sobre este aspecto, isto é, que «o auxílio tem um efeito sobre as trocas entre Estados-Membros» («l'aiuto incide sugli scambi tra Stati membri»). A Comissão afirma que os critérios de distorção da concorrência e de afectação das trocas entre Estados-Membros estão tão estreitamente ligados que o efeito natural da carácter «selectivo» [«selettivo», referido na alínea c)] do auxílio foi reforçar a situação dos beneficiários relativamente aos seus concorrentes. Ainda que esta afirmação fosse estatisticamente correcta, não aparece na decisão de 1997 como uma justificação da conclusão de que o auxílio falseia a concorrência. Pelo contrário, é simultaneamente uma afirmação de facto e uma conclusão que, num e noutro caso, exigia uma justificação, mas relativamente às quais a Comissão não apresentou nenhuma na decisão de 1997. Em minha opinião, a alegação da Comissão, baseada nos acórdãos Philip Morris e Vlaams Gewest/Comissão, segundo a qual, quando os recursos de Estado ou regionais são atribuídos de forma selectiva a determinadas empresas, o efeito invariável é o de que a concorrência é falseada e o comércio intracomunitário é afectado, é errónea (58). Compete à Comissão expor, ainda que sucintamente, as razões pelas quais em cada caso entende que o auxílio em causa tem esses efeitos. A Comissão não forneceu, manifestamente, essas razões na decisão de 1997.

52 Além disso, uma comparação contextual do teor da decisão de 1997 e do ofício de abertura I não traz qualquer auxílio à Comissão. Como a SL sublinha, esse ofício continha uma afirmação clara respeitante ao «aspecto comunitário» do comércio entre o continente italiano, a Sardenha e a Córsega. Essa afirmação, que foi acompanhada de números que apenas diferiam de forma marginal dos que constam da decisão de 1997, podia facilmente levar os beneficiários do auxílio a ter a impressão de que a Comissão concentraria o seu exame na capacidade de o auxílio falsear a concorrência nesse segmento especial do mercado da prestação de serviços de transporte marítimo. Todavia, parece resultar da tréplica da Comissão, no recurso da República Italiana, da sua resposta à pergunta escrita colocada pelo Tribunal de Justiça e das suas alegações orais, que tinha de facto em vista a potencialidade do auxílio para excluir a concorrência não apenas das companhias marítimas sediadas na Córsega, mas, de forma mais geral, das empresas que operam a partir dos continentes francês e espanhol. Embora as estatísticas apresentadas pela República Italiana na réplica possam justificar o motivo de preocupação da Comissão, nada na decisão de 1997 aponta nesse sentido.

53 Sou igualmente de opinião que a afirmação da SL respeitante à relevância do Regulamento n._ 3577/92 é completamente procedente e que a decisão de 1997 está igualmente por essa razão insuficientemente fundamentada. Como esse regulamento autorizava a República Italiana a continuar a proibir a cabotagem marítima (59) na época em causa, os beneficiários do auxílio nos termos do regime de 1988, como a SL, teriam tido, dada a referência à Córsega no ofício de abertura I, mais razões para pensar que a Comissão apenas tinha em vista as companhias marítimas sediadas em Itália, que prestam serviços entre o continente italiano, a Sardenha e a Córsega como os seus principais concorrentes (60). Todavia, resulta claramente das alegações orais da Comissão e da sua resposta à pergunta colocada pelo Tribunal de Justiça que ela considera o Regulamento n._ 3577/92 como não sendo relevante, visto que não proibia as empresas de outros Estados-Membros - em especial (do continente) de França e de Espanha - de prestarem serviços de transporte marítimo internacionais em concorrência com os serviços prestados pelos beneficiários do auxílio, nos termos do regime de 1988, e porque o benefício do regime não estava reservado para as empresas que prestam serviços de cabotagem. Em meu entender, a inclusão pela própria Comissão de uma breve referência a essas considerações na decisão de 1997 teria provavelmente sido suficiente para a tornar compatível com o artigo 190._ do Tratado.

54 Além do mais, essa referência teria igualmente servido para assegurar a coerência entre essa decisão e um certo número de decisões contemporâneas da Comissão respeitantes ao transporte rodoviário em Itália, nas quais a Comissão remete para a eventual relevância da legislação comunitária correspondente em matéria de abertura da cabotagem aos serviços de transporte rodoviário (61). Estou, portanto, convencido de que a decisão de 1997 devia ser anulada.

55 Em contrapartida, rejeito integralmente as razões apresentadas pelo Governo italiano para justificar o facto de não ter cooperado correctamente com a Comissão, quer antes (v. oitavo parágrafo do ofício de abertura I), quer durante o processo de exame contraditório (a República Italiana confessa, nas suas observações escritas, não ter respondido a um pedido da Comissão de 25 de Novembro de 1996 destinado a obter diferentes informações, entre as quais uma «nota pormenorizada» sobre a estrutura do mercado dos serviços de transporte marítimo). Um Estado-Membro não pode, apenas porque considera que a Comissão lhe pediu sem razão que lhe fosse fornecida uma análise pormenorizada do mercado para efeitos de um processo de exame contraditório, recusar-se a fornecer as estatísticas de que dispõe e que podem facilitar o exame da Comissão (62). Na minha opinião, o comportamento das autoridades italianas nesse caso permitiu à Comissão basear a fundamentação da sua decisão em todas as estatísticas de que dispunha relativas à concorrência de companhias francesas e espanholas no que toca à prestação de serviços de transporte marítimo com destino e proveniente da Sardenha (63). Todavia, não fez nada disso. Apenas presumiu que a existência dessa concorrência era evidente.

D - A qualificação do auxílio impugnado como auxílio «alterado»

56 Se o Tribunal de Justiça acolher a minha posição sobre a insuficiência da fundamentação apresentada em apoio da qualificação pela Comissão do regime de 1988 como auxílio de Estado, não teria a necessidade estrita de apreciar a compatibilidade da qualificação das alterações introduzidas por essa legislação como alterações sujeitas à notificação nos termos do artigo 93._, n._ 3, do Tratado. Todavia, como o carácter adequado da análise que subjaz a essa qualificação constitui um dos pontos mais importantes e certamente a mais recente das questões suscitadas pelos presentes recursos, proponho examinar os diferentes argumentos invocados pelas recorrentes.

i) Síntese das observações

57 A República Italiana alega que a obrigação de notificar à Comissão as alterações a um regime de auxílios existente não tem qualquer efeito sobre o direito de um Estado-Membro continuar a aplicar esse regime. A Comissão apenas pode iniciar um processo de exame contraditório relativamente a essas alterações. Assim, qualquer auxílio estatal concedido em conformidade com essas alterações só pode ser considerado ilegal se essas alterações contribuírem de modo significativo para a incompatibilidade do auxílio.

58 O representante do Governo italiano sublinhou na audiência que nenhuma das condições introduzidas pela lei regional de 1988, com excepção da opção da locação financeira (artigo 100._), constituía uma novidade real ou substancial. Essa facilidade nunca foi utilizada. Não podia, assim, ser considerada modificativa da natureza do auxílio. A obrigação do beneficiário de ter a sua sede principal e o seu porto de registo na Sardenha já era imposta pelo artigo 2._ do regime inicial, enquanto a obrigação de registar todos os navios nos portos sardos, de utilizar estes últimos como centro da sua actividade marítima e de efectuar as reparações dos navios na Sardenha tinha um efeito prático muito limitado, pois essas condições aplicavam-se a empresas que tinham já o seu porto de registo na Sardenha. A obrigação de certos beneficiários utilizarem uma tripulação inscrita no registo de inscrição marítima do porto de matrícula decorre da legislação nacional, que prevê a contratação obrigatória de marítimos inscritos no registo de inscrição marítima de cada porto e, assim, teve simplesmente por efeito beneficiar os portos sardos em relação aos outros portos italianos.

59 A SL alega que apenas alterações que tenham uma incidência real, e não simplesmente formal ou marginal, sobre um regime de auxílio de Estado existente podem ser consideradas novas ou modificadas. Como a decisão de 1997 não contém qualquer indicação das razões pelas quais a Comissão considerou como substanciais as alterações introduzidas pelo regime regional de 1988, quando uma simples comparação com o regime inicial excluiria essa conclusão, a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação. Em apoio dessa conclusão, invoca o acórdão Namur-Les assurances du crédit (64), no qual o Tribunal de Justiça sublinhou a importância de se tomarem em conta disposições legais de base quando se examina se um regime de auxílio existente foi «alterado» e o advogado-geral Lenz equiparou «uma alteração do auxílio» a uma «modificação material desse regime» (65). Na audiência, o advogado da SL alegou que a Comissão devia proceder a um exame meticuloso para determinar se se estava perante um auxílio novo ou alterado, exame que, segundo ele, fazia falta na decisão de 1997.

60 A Comissão refere que não é necessário comparar ponto por ponto um auxílio existente com alterações posteriores introduzidas, dado que o artigo 93._, n._ 3, do Tratado exige a notificação de todas essas alterações, quer digam respeito ao regime base dos auxílios ou às condições em que podem ser concedidos auxílios individuais. Em seu entender, compete à Comissão e não aos Estados-Membros, sem prejuízo do controlo do Tribunal de Justiça, determinar se as alterações afectam de forma significativa um auxílio existente (66). A título subsidiário, alega que, no caso em apreço, as alterações, mesmo consideradas separadamente, e, por maioria de razão, se apreciadas no seu conjunto, constituem manifestamente uma alteração substancial do regime inicial. Quanto ao facto de a SL invocar o acórdão Namur, observa que no caso em apreço não há apenas uma nova lei, a saber, a lei regional de 1988, mas também que essa lei introduziu um certo número de alterações substanciais, todas referidas na parte III dos considerandos da decisão de 1997 (a seguir «parte III da decisão») (67). As novas condições eram indissociáveis do regime inicial e, ao reduzir ainda mais o círculo dos beneficiários potenciais e ao acentuar a natureza discriminatória do regime, acarretavam um aumento da distorção de concorrência assim criada.

ii) Análise

61 Este aspecto dos recursos suscita essencialmente duas questões importantes. A primeira é a da correcção da abordagem adoptada pela Comissão na decisão de 1997; a segunda é a de saber se a Comissão fundamentou suficientemente a sua conclusão segundo a qual o regime inicial foi alterado pela lei regional de 1988, questão essa que se prende intimamente com a questão de saber se a apreciação da Comissão estava correcta quanto ao mérito.

A abordagem adoptada na decisão de 1997

62 Resulta claramente da decisão de 1997 que a Comissão não considerou que o auxílio concedido nos termos do regime de 1988 constituía um auxílio «alterado» simplesmente por ter sido concedido em aplicação desse regime, e não com base no regime inicial. Pelo contrário, considerou que «[a lei regional de 1988] introduziu alterações substanciais no regime de auxílios instituído pela [lei regional de 1951]» (68). Esta abordagem é em meu entender correcta. Todavia, na medida em que a Comissão deixou subentender, nas observações que apresentou ao Tribunal de Justiça, que o simples facto de a lei regional de 1988 alterar as leis regionais de 1951 e 1954 bastava para tornar o regime de 1988 numa «alteração» ao regime para efeitos do artigo 93._, n._ 3, do Tratado, este argumento é, na minha opinião, incorrecto. Só as alterações que constituem modificações substanciais de um regime já existente deviam considerar-se sujeitas à notificação para efeitos do artigo 93._, n._ 3, do Tratado.

63 Isto resulta de uma leitura atenta do acórdão Namur. As circunstâncias desse processo eram sobretudo invulgares. A OND era uma empresa pública que tinha recebido um auxílio de Estado, nos termos de uma lei de 1939, sob a forma de diversas vantagens que, «exceptuando ajustamentos que não põem em causa o essencial dessas vantagens... mantinha-se inalterável em 1 de Fevereiro de 1989...» (69). O Tribunal de Justiça devia examinar se o facto de, a partir dessa data, a OND poder ser considerada como tendo sido autorizada pelos últimos ministros belgas da tutela a alargar o âmbito das suas actividades comerciais de seguro, equivalia a uma alteração do auxílio de Estado existente. O Tribunal de Justiça rejeitou essa possibilidade. Declarou que (70):

«a instituição de um novo auxílio ou a alteração de um auxílio existente não pode, caso o auxílio resulte de disposições legais anteriores que não foram modificadas, ser apreciada em função do auxílio e, designadamente, do seu montante financeiro em cada momento da vida da empresa. É por referência às disposições que o estabelecem, às respectivas modalidades e limites que um auxílio pode ser qualificado como novo ou como alteração de auxílio existente».

64 Precisamente porque não foi introduzida nenhuma alteração às disposições legislativas iniciais e que estas não restringiam o âmbito das actividades comerciais que a OND podia exercer é que o Tribunal de Justiça adquiriu a convicção de que uma renúncia posterior ao que efectivamente tinha sido uma restrição voluntariamente assumida não equivalia a uma «alteração» do regime inicial. Na minha opinião, o acórdão Namur não sustenta, portanto, a ideia de que, quando a legislação que subjaz a um regime de auxílios existente é alterada, os ajustamentos devem ser considerados como «alterações» sujeitas a notificação. Pelo contrário, o Tribunal de Justiça considerou, manifestamente, as alterações no objectivo do auxílio como uma indicação de que o auxílio foi alterado. Se o seu âmbito é afectado substancialmente pela alegada «alteração», deve ser notificada. Apenas uma tal interpretação baseada no bom senso permitiria um grau de segurança jurídica satisfatório para os beneficiários dos auxílios, para os Estados-Membros e para os terceiros interessados que também devem ser protegidos, afastando a necessidade de «proceder à notificação prévia de medidas de natureza muito diversa, que não poderiam ser postas em execução, apesar das dúvidas quanto à possibilidade de as qualificar como novos auxílios» (71).

65 Esta interpretação encontrou apoio, igualmente, nas conclusões do advogado-geral Lenz no processo Namur. Observou que (72):

«A questão de saber se a instituição ou alteração de um auxílio depende principalmente... da presença, entre as medidas de um Estado-Membro que estabelecem benefícios (com natureza de auxílios) em favor de determinadas empresas, de uma alteração com efeitos sobre o conteúdo ou volume desses benefícios. Neste contexto, verifica-se, procedendo à comparação entre os n.os 1 e 3 do artigo 93._, que as noções de `auxílio', na acepção do n._ 3, e de `regime de auxílios', na acepção do n._ 1, são sinónimas. Daqui decorre existir instituição de um auxílio, na acepção do n._ 3 do artigo 93._, quando exista criação de um novo regime de auxílios, ao passo que a alteração de um auxílio pressupõe uma modificação material desse regime».

Além disso, está em conformidade com a opinião clara expressa pelo advogado-geral Mancini no processo Heineken, segundo a qual o artigo 93._, n._ 3, do Tratado (73):

«não permite impor aos Estados uma obrigação absoluta ou integral de comunicação. Por outras palavras, as alterações a comunicar são as que, em razão da sua incidência a nível da vida das empresas ou das relações de concorrência, podem influenciar o parecer da Comissão: e não as outras, ou seja, as puramente formais ou que não são perigosas para a liberdade de concorrência».

O carácter suficiente da fundamentação

66 A SL afirma que as razões dadas na decisão de 1997, em apoio da afirmação da Comissão, segundo a qual as alterações introduzidas no regime inicial pela lei regional de 1988 foram substanciais, não eram suficientes. Tendo em conta os princípios acima expostos (n.os 44 a 54), respeitantes à obrigação de fundamentação, parece-me, não sem hesitação, que os fundamentos fornecidos na parte III da decisão preenchem as condições do artigo 190._ do Tratado.

67 Criticando a República Italiana e a SL por, nas suas observações escritas, terem comparado, ponto a ponto, as disposições da lei regional de 1988 com as das leis regionais de 1951 e de 1954, a própria Comissão contenta-se, de facto, na parte III da sua decisão, com uma abordagem não muito diferente. Resume as principais disposições do regime inicial antes de declarar, como acima observei, que a lei regional de 1988 introduziu «alterações substanciais» a esse regime e de descrever, em seguida, as novas disposições pertinentes dessa última lei. Todavia, não procura, de forma alguma, fundamentar a sua afirmação segundo a qual as alterações eram substanciais. Pelo contrário, mais adiante, na parte V da decisão de 1997 (a seguir «parte V da decisão»), afirma simplesmente que a lei regional de 1951 «foi objecto de alterações substanciais pela Lei [regional] de 1988...». Em substância, a Comissão presumiu efectivamente que uma simples comparação das disposições do regime inicial e com as do regime de 1988 revelaria que as alterações eram substanciais.

68 A Comissão devia evitar essas presunções. A fundamentação deve explicar de forma explícita porque considera que determinadas alterações são substanciais. Os fundamentos indicados não devem ser pormenorizados, em especial, quando, como no caso em apreço, a Comissão considerar que a importância das alterações relevantes é manifesta. Em teoria, essas razões deviam acompanhar a sua conclusão de que as alterações eram substanciais, mas, como confirmado pela já referida jurisprudência do Tribunal de Justiça, basta que resultem de outras partes da decisão em causa. No caso em apreço, apesar da inexistência de fundamentos explícitos em apoio da conclusão da Comissão de que a lei regional de 1988 introduziu alterações substanciais no regime inicial, entendo que, considerada no seu conjunto, a decisão de 1997 preenche as condições do artigo 190._ do Tratado.

69 Em primeiro lugar, resulta claramente de uma simples comparação das disposições relevantes do regime inicial com as do regime da Lei de 1988, descritas na parte III da decisão, mesmo abstraindo da análise feita pela Comissão nas alegações que apresentou ao Tribunal de Justiça, que um certo número de alterações importantes foi introduzido pela lei regional de 1988. Assim, é claro que as condições relativas à localização da sede administrativa do beneficiário do auxílio, à sua actividade marítima, aos seus principais armazéns, depósitos e equipamentos acessórios são todas novas, o mesmo sucedendo com a obrigação de utilizar os portos sardos como centro das suas actividades de transporte marítimo bem como de reparar os seus navios nos estaleiros navais sardos. Igualmente nova é a obrigação de os beneficiários que adquirem navios com uma arqueação bruta superior a 250 toneladas utilizarem uma tripulação inscrita no registo local, facto esse que a Comissão considerou introduzir uma discriminação em razão da nacionalidade a favor dos marítimos sardos, tanto na parte I como na parte VI da decisão (a seguir «partes I e VI da decisão»). No que se refere à locação financeira, os termos utilizados pela Comissão («il regime di aiuti ha altresi introdotto», «the aid scheme also introduced») sublinhavam claramente a sua novidade. Em segundo lugar, a qualificação não foi contestada nem pelo Governo italiano nem pelas autoridades sardas durante o processo de exame contraditório que precedeu a adopção da decisão de 1997. Se é verdade que, pelas razões acima evocadas (n.os 20 a 24), isso não proíbe, evidentemente, que essa qualificação seja agora contestada, nomeadamente pela SL, é um elemento que pode ser tomado em consideração pelo Tribunal de Justiça quando analisa o carácter adequado da fundamentação da Comissão, na condição de a natureza substancial das alterações ser fundamentada. A descrição clara que a Comissão faz das alterações como sendo «substanciais» constitui essa fundamentação no caso em apreço. Finalmente, a análise contida na parte IV da decisão é significativa. A Comissão não declara aí apenas inequivocamente que, em seu entender, a lei regional de 1988 contraria os princípios fundamentais do direito comunitário, ou seja, a liberdade de estabelecimento e a não discriminação em razão da nacionalidade, mas também identifica certos aspectos da mesma que põem em evidência as violações desses princípios já contidos no regime inicial. Assim, no terceiro parágrafo da parte IV da decisão, a Comissão faz expressamente referência à condição de todos os navios do beneficiário do auxílio serem matriculados na Sardenha, ao passo que no quarto parágrafo faz alusão à discriminação em razão da nacionalidade que, na prática, resulta da obrigação de utilizar um contingente de «marítimos locais». Esta fundamentação apoia claramente a sua conclusão, segundo a qual a lei regional de 1988 introduziu alterações substanciais ao regime inicial.

A exactidão da qualificação

70 Todavia, o Governo italiano e a SL contestaram igualmente a exactidão da conclusão da Comissão, segundo a qual as alterações da lei regional de 1988 são substanciais. Afirmam que apenas acrescentam pormenores ou precisões ao regime inicial, os quais, na prática, pouco efeito tiveram. Não posso compartilhar desta opinião. Se é verdade que obrigar os beneficiários do auxílio a possuírem na Sardenha, para além da sua sede e domicílio fiscal, como impunha o regime inicial, também a sua sede administrativa pode ser considerado como outro pormenor destinado a assegurar que apenas as empresas locais beneficiem do auxílio financeiro em causa, o mesmo não se pode dizer das novas condições com vista a que utilizem os portos sardos como centro das suas actividades, matriculem todos os seus navios nesses portos e aí tenham os seus principais armazéns, depósitos e equipamentos acessórios, sem dúvida relativamente a todos os navios. Estas alterações são importantes. Impedem efectivamente as empresas não sardas de beneficiarem do auxílio financeiro em causa, ponto que foi sublinhado pela Comissão na parte VI da decisão, estendendo o benefício indirecto do auxílio a diferentes outras empresas, quase inevitavelmente sardas, que operem nos portos sardos.

71 Por outro lado, ao prever uma condição geral que impõe aos beneficiários a obrigação de utilizar os estaleiros navais locais para todas as suas reparações, a lei regional de 1988 estava claramente em condições de beneficiar, pelo menos indirectamente, os estaleiros navais sardos. A Comissão tem manifestamente razão para temer que essa nova disposição infrinja a Sétima Directiva. A intenção subjacente à condição de utilizar uma tripulação sarda é também clara e importante. Em 1988, a legislação italiana relevante, a que o defensor da República Italiana fez alusão na audiência, obrigava a que se mantivessem, nomeadamente, registos da tripulação actualizados. Embora tivesse afirmado que essa disposição da lei regional de 1988 devia respeitar essa legislação, não mencionou a condição da nacionalidade, directamente discriminatória, contida nessa legislação, condição que o Tribunal de Justiça expressamente declarou incompatível com o direito comunitário no acórdão Merci Convenzionali Porto di Genova (74). Como a obrigação de contratar marítimos sardos conduzia inevitavelmente a excluir todos os marítimos não italianos, a Comissão tinha manifestamente razão, em especial à luz do acórdão Porto di Genova, ao qualificar essa condição de alteração sujeita a notificação.

72 Se é verdade que as alterações introduzidas pela lei regional de 1988 tiveram por efeito directo reduzir o elenco das empresas que podem beneficiar do regime inicial e assim, pelo menos potencialmente, reduzir o montante do auxílio concedido, essa possibilidade não impede tais modificações de serem qualificadas de «alterações», na acepção do artigo 93._, n._ 3, do Tratado. Em primeiro lugar, como o agente da Comissão sublinhou, em resposta a uma pergunta colocada na audiência, essa redução é irrelevante quando conseguida através de alterações que acentuam os efeitos discriminatórios e, portanto, potencialmente os efeitos de distorção do regime de auxílios de base. Em segundo lugar, não aceito que alterações que ao mesmo tempo que reduzem o número potencial de beneficiários de um auxílio o estendem indirectamente a um largo elenco de outros beneficiários, a priori, nacionais, como, no caso vertente, os estaleiros navais locais e a tripulação, possam ser qualificadas de insignificantes, não estando, assim, abrangidas pela obrigação de notificação imposta pelo artigo 93._, n._ 3 do Tratado.

73 Finalmente, é certo que a introdução, pelo artigo 100._ da lei regional de 1988, da locação financeira constituiu, em princípio, uma alteração do regime inicial sujeita a notificação. Todavia, a República Italiana, apoiada pela SL, afirma que, como, no âmbito desse quadro, nenhum auxílio foi concedido durante o período em causa (1988-1996), não pode ser tomada em conta para determinar se as autoridades italianas deviam ter notificado as outras alterações. Esse argumento não procede e deve ser rejeitado.

74 Estou de acordo com a opinião expressa pelo advogado-geral Lenz no processo Namur, segundo a qual «verifica-se, procedendo à comparação entre os n.os 1 e 3 do artigo 93._, que as noções de `auxílios', na acepção do n._ 3, e de `regime de auxílios', na acepção do n._ 1 são sinónimas. Daqui decorre existir instituição de um auxílio, na acepção do n._ 3 do artigo 93._, quando exista criação de um novo regime de auxílios, ao passo que a alteração de um auxílio pressupõe uma modificação material desse regime» (75). A introdução de um método completamente novo para fornecer, de facto, o mesmo nível de auxílio constituía, manifestamente, uma alteração importante do regime inicial. Aceitar o argumento do Governo italiano seria o mesmo que permitir aos Estados-Membros alterar substancialmente regimes de auxílios existentes ou introduzir regimes que, de facto, são novos através da alteração da legislação que prevê um regime de auxílios existente, sem ter de notificar essas alterações à Comissão até se proporem executar essas alterações. Ignorava-se, assim, o facto de o artigo 93._, n._ 3, do Tratado exigir expressamente que os Estados-Membros informem a Comissão «dos projectos destinados a instituir ou a alterar os auxílios». A interpretação estrita da obrigação de os Estados-Membros notificarem as alterações aos auxílios existentes, que está na base do argumento das autoridades italianas, prejudicaria, em meu entender, a eficácia do exame prévio que o Tratado confia à Comissão nos termos do artigo 93._, n._ 3. A necessidade de assegurar a eficácia desse controlo tem sido recordada de forma constante pelo Tribunal de Justiça (76). Não duvido, assim, que a Comissão tinha o direito de ter em conta a alteração introduzida pelo artigo 100._ da lei regional de 1988 no quadro do seu exame destinado a determinar se as diversas modificações introduzidas por essa lei constituíam no seu conjunto «alterações». É o que se passa, a fortiori, quando só durante a pendência do processo no Tribunal de Justiça se verificar que, durante o período em questão, não tinha sido concedido qualquer auxílio ao abrigo de um contrato de locação financeira.

75 Em consequência, recomendo ao Tribunal de Justiça que julgue improcedentes os argumentos das recorrentes que põem em causa a validade da qualificação, pela Comissão, das modificações introduzidas pela lei regional de 1988 como «alterações» sujeitas a notificação para efeitos do artigo 93._, n._ 3, do Tratado.

E - A compatibilidade do regime de auxílios impugnado com o mercado comum

76 Se o Tribunal de Justiça rejeitar a minha principal recomendação respeitante à insuficiência da fundamentação da Comissão, mas aceitar a minha proposta subsidiária quanto à validade da sua qualificação das modificações de 1988 como «alterações» substanciais ao regime inicial, sujeitas a notificação, será necessário examinar os argumentos subsidiários das recorrentes que põem em causa a conclusão da Comissão segundo a qual o auxílio impugnado é incompatível com o mercado comum. Proponho-me assim examinar muito brevemente esses argumentos.

i) A violação de outras disposições do Tratado

77 O fundamento apresentado pelo Governo italiano, segundo o qual a decisão de 1997 devia ser anulada porque a Comissão, com base no facto de o regime de 1988 alegadamente violar os artigos 6._, 48._, n._ 2, e 52._ do Tratado CE, (que passaram, após alteração, a artigos 12._ CE, 39._, n._ 2, CE e 43._ CE), não tinha o direito de considerar que o auxílio controvertido era incompatível com o mercado comum, suscita um problema de uma importância considerável para o controlo pela Comissão dos auxílios de Estado.

78 O Tribunal de Justiça afirmou diversas vezes que o artigo 92._ do Tratado não pode ser utilizado para pôr em causa outras regras do Tratado como as que dizem respeito à livre circulação de mercadorias. Com efeito, «essas regras como as disposições do Tratado relativas aos auxílios de Estado prosseguem um objectivo comum, que é assegurar a livre circulação de mercadorias entre os Estados-Membros em condições normais de concorrência» (77). A Comissão tem, assim, o direito de ter em conta eventuais infracções às outras regras do Tratado quando aprecia a compatibilidade de um regime de auxílios de Estado com o mercado comum. Se se partilhar o ponto de vista expresso pelo advogado-geral Saggio nas conclusões que recentemente apresentou no processo Alemanha/Comissão, no sentido de que a Comissão não pode utilizar o procedimento previsto no artigo 93._ do Tratado para «declarar» uma medida nacional incompatível com outras regras do Tratado estranhas aos auxílios de Estado, essa questão não se coloca neste processo (78). A Comissão, ao exercer o poder que o artigo 92._, n._ 3 do Tratado lhe confere, recusou simplesmente declarar compatível com o mercado comum um auxílio de Estado em que certas condições podem infringir um certo número de princípios fundamentais do direito comunitário.

79 Esta conclusão encontra igualmente apoio no acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Janeiro de 1985, Comissão/França (79), que dizia respeito a um auxílio a agricultores que tinham inicialmente sido objecto de um inquérito, pela Comissão, no quadro de um processo de exame contraditório que a Comissão posteriormente interrompeu para iniciar um processo de infracção nos termos do artigo 169._ do Tratado CE (actual artigo 226._ CE). O Tribunal de Justiça afirmou que, «se a existência do referido processo específico de modo algum obsta a que a compatibilidade de um regime de auxílios seja apreciada em relação a regras comunitárias diferentes das contidas no artigo 92._, de acordo com o processo previsto no artigo 169._, é, todavia, indispensável que a Comissão aplique o procedimento do artigo 93._, n._ 2, se desejar verificar a incompatibilidade desse regime, enquanto auxílio, com o mercado comum» (80).

ii) A aplicação do artigo 92._, n._ 3, do Tratado pela Comissão

80 A República Italiana e a SL apresentam um certo número de argumentos que põem em causa a apreciação da compatibilidade do regime de 1988 pela Comissão, em especial no que se refere ao artigo 92._, n._ 3, alínea a) («auxílios destinados a favorecer o desenvolvimento económico de regiões nas quais o nível de vida é anormalmente baixo ou nas quais subsiste um grave subemprego»), e ao artigo 92._, n._ 3, alínea c) («auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas actividades económicas ou certas regiões, desde que não alterem as condições das trocas numa medida contrária ao interesse comum»). Após examinar cada um desses argumentos, estou convicto que nenhum deles procede.

81 O Tribunal de Justiça sempre reconheceu que a Comissão goza de uma amplo poder de apreciação para determinar a compatibilidade do auxílio de Estado com o mercado comum, visto que o cumprimento da sua missão implica apreciações económicas e sociais complexas que devem ser efectuadas num contexto comunitário (81). Assim, só anulará uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado, a este respeito, se for claro que a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto, cuja prova deve ser apresentada pela parte que pede a anulação (82), ou se a fundamentação utilizada na decisão for claramente incoerente (83). Em consequência, a conclusão da Comissão segundo a qual o regime não podia ser qualificado de auxílio ao desenvolvimento regional para apreciar a eventual aplicação do artigo 92._, n._ 3, alínea a), não é claramente errónea. Se existem poucas dúvidas de que a Sardenha era uma região classificada em objectivo n._ 1, susceptível de beneficiar, na época em questão, do auxílio regional, foi, em minha opinião, com razão que a Comissão considerou que o auxílio em questão constituía um auxílio às companhias marítimas e era, assim, principalmente sectorial (84). A abordagem adoptada na decisão de 1997 também não é incompatível, como a SL pretende no seu recurso, com decisões anteriores da Comissão, tomadas em relação a auxílios concedidos pela Irlanda a certas companhias marítimas. Como sublinha a Comissão na sua contestação, essas decisões foram adoptadas numa época em que se aplicava uma política mais generosa do que a resultante das orientações sobre os auxílios de Estado às companhias de navegação de 3 de Agosto de 1989 (85) e sobre os auxílios estatais aos transportes marítimos (86). A Comissão deve respeitar as suas próprias orientações (87).

82 Em minha opinião, a Comissão também não cometeu um erro manifesto ao rejeitar o recurso ao artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado. As recorrentes não invocaram qualquer elemento que ponha em causa a exactidão da análise da Comissão, segundo a qual o regime de 1988 não respeita a condição de transparência imposta simultaneamente pelas referidas orientações e pela Sétima Directiva. A Comissão não podia aprovar o auxílio se não estivesse convencida de que o limite do auxílio autorizado no quadro do auxílio aos estaleiros navais italianos não seria contornado por benefícios indirectos decorrentes, especialmente no que respeita aos estaleiros navais, do regime de 1988.

F - Recuperação

83 Para o caso de o Tribunal de Justiça confirmar a validade da decisão de 1997, a República Italiana e a SL apresentam diferentes argumentos em apoio da anulação do artigo 2._ da decisão de 1997, que impõe às autoridades italianas a recuperação junto de cada beneficiário do auxílio recebido em aplicação do regime de 1988. Após examinar cada um desses argumentos, estou convencido de que são todos improcedentes.

84 Em especial, considero que o argumento do Governo italiano segundo o qual o artigo 2._ da decisão de 1997 viola as expectativas legítimas dos beneficiários do auxílio não é convincente. Equivale a afirmar que essas empresas podiam razoavelmente considerar que a Comissão não qualificaria de «alterações» as modificações introduzidas pela lei regional de 1988. Em meu entender, não há, em princípio, qualquer razão para tratar as alterações a um auxílio existente, sujeitas a notificação, de maneira diferente de um auxílio novo. «Se a Comissão verificar que um auxílio concedido por um Estado ou proveniente de recursos estatais não é compatível com o mercado comum, decidirá que o Estado em causa deve suprimir ou modificar esse auxílio no prazo que ela fixar» e, «sempre que, contrariamente às disposições do artigo 93._, n._ 3, a subvenção projectada já tiver sido paga, esta decisão pode tomar a forma de injunção às autoridades nacionais para exigir a sua restituição» (88). «Tendo em conta o carácter imperativo do controlo dos auxílios de Estado efectuado pela Comissão nos termos do artigo 93._ do Tratado, as empresas beneficiárias de um auxílio não podem, em princípio, ter uma confiança legítima na regularidade do auxílio, a não ser que este tenha sido concedido no respeito pelo processo previsto pelo referido artigo» (89). Neste processo, parece claro que todos os interessados, incluindo a SL, simplesmente presumiram que as alterações introduzidas por essa legislação não «alteravam» o regime de auxílios de base na perspectiva do Tratado. Esta presunção não pode constituir uma expectativa legítima susceptível de primar sobre o interesse do direito comunitário em assegurar o respeito do artigo 93._, n._ 3, do Tratado.

85 A decisão de 1997 também não introduz uma discriminação injustificável entre beneficiários do auxílio sardo consoante o auxílio tenha sido aprovado antes ou após a entrada em vigor da lei regional de 1988. Partilho da opinião da Comissão segundo a qual, baseando-se na distinção fundamental que o Tratado faz entre auxílio novo e/ou auxílio alterado e auxílio existente, a diferença de tratamento justifica-se claramente.

86 A SL afirma igualmente que a Comissão só pode exigir a recuperação do auxílio de Estado pago ilegalmente durante um período máximo de cinco anos, o que, no seu caso, excluía a recuperação, visto a decisão de 1997 ter sido adoptada mais de cinco anos após da recepção do auxílio. Baseia-se no Regulamento (CEE) n._ 2988/74 do Conselho, de 26 de Novembro de 1974, relativo à prescrição quanto a procedimentos e execução de sanções no domínio do direito dos transportes e da concorrência da Comunidade Económica Europeia (90), que estipula, de uma forma geral, um período limite de cinco anos. Todavia, como a Comissão, penso que, não existindo um prazo legal, seria inapropriado fixar um por analogia com uma legislação que não diz respeito às regras comunitárias em matéria de auxílios de Estado (91). Esta interpretação foi confirmada pela adopção recente do Regulamento n._ 659/1999, cujo artigo 15._ prevê que «os poderes da Comissão para recuperar o auxílio ficam sujeitos a um prazo de prescrição de dez anos» (92).

V - Despesas

87 Nos termos do artigo 69._, n._ 2 do Regulamento de Processo «a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido». Todavia, o artigo 69._, n._ 3, prevê que «se cada parte obtiver vencimento parcial, ou em circunstâncias excepcionais, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes, ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas». Como as recorrentes nestes processos apensos deviam ver acolhido o seu pedido geral de anulação da decisão de 1997 por insuficiência de fundamentação e como requereram a condenação da parte contrária no pagamento das suas despesas, estas deveriam normalmente ser-lhes reembolsadas. Contudo, como a República Italiana também impugnou sem sucesso a validade da decisão contida no ofício de abertura II e a insuficiência de fundamentação da decisão da Comissão de 1997 pode, pelo menos parcialmente, explicar-se pela recusa das autoridades italianas de cooperar plenamente com a Comissão durante o processo de exame contraditório, sugiro que a República Italiana seja condenada a suportar as suas próprias despesas. Como nenhum destes elementos excepcionais afecta a SL, a Comissão deve pagar as suas despesas.

VI - Conclusão

88 À luz das considerações que antecedem, sugiro que o Tribunal de Justiça:

«1) Anule a Decisão 98/95/CE da Comissão, de 21 de Outubro de 1997, relativa aos auxílios concedidos pela Região da Sardenha (Itália) ao sector do transporte marítimo da Sardenha.

2) Condene a Comissão a pagar as despesas da Sardegna Lines no processo C-105/99 e condene a República Italiana e a Comissão a suportarem as respectivas despesas no processo C-15/98.»

(1) - Bolletino ufficiale della Regione autonoma della Sardegna, 15 de Outubro de 1952.

(2) - Bolletino ufficiale della Regione autonoma della Sardegna, 23 de Agosto de 1954.

(3) - É útil notar que a versão inicial do artigo 1._, tal como consta da lei regional de 1951, previa simplesmente que os beneficiários dos empréstimos deviam ser «empresas regionais».

(4) - Nos termos da versão inicial do artigo 2._ da lei regional de 1951, além das condições constantes da versão modificada, os beneficiários deviam ter principalmente interesses marítimos regionais e fornecer serviços marítimos entre os portos e as ilhas da Sardenha e/ou outros portos de armamento.

(5) - Bolletino ufficiale della Regione autonoma della Sardegna, n._ 21, suplemento n._ 1, 6 de Junho de 1988.

(6) - O parágrafo aditado ao artigo 9._ da lei regional de 1951 estipulava que, em caso de incumprimento, mesmo parcial, das condições do artigo 2._, a Região podia suprimir de imediato o benefício do auxílio concedido.

(7) - Bolletino ufficiale della Regione autonoma della Sardegna, n._ 6, suplemento n._ 1, 17 de Fevereiro de 1996.

(8) - JO 1996, C 368, p. 2.

(9) - O adjectivo «contraditório» será utilizado ao longo destas conclusões para qualificar o processo de exame previsto no artigo 93._, n._ 2, do Tratado, visto que é o qualificativo utilizado recentemente pelo Tribunal de Justiça; v., por exemplo, acórdão de 11 de Julho de 1996, SFEI e o. (C-39/94, Colect., p. I-3547, n._ 44).

(10) - JO 1998, L 20, p. 30.

(11) - JO 1997, C 386, p. 6.

(12) - Ibidem, p. 7.

(13) - Este recurso foi inicialmente interposto no Tribunal de Primeira Instância em 6 de Abril de 1998 sob o número de processo T-58/98. Contudo, por despacho de 23 de Março de 1999, o Tribunal de Primeira Instância declinou a sua competência a favor do Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 47._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça.

(14) - JO L 380, p. 27 (a seguir «Sétima Directiva»).

(15) - A Comissão cita como exemplo os acórdãos de 31 de Março de 1965, Ley/Comissão (12/64 e 29/64, Colect. 1965-1968, p. 43, Recueil, p. 143), e de 2 de Março de 1967, Simet e Feram/Alta Autoridade (25/65 e 26/65, Colect. 1965-1968, p. 547, Recueil, p. 39).

(16) - V. acórdão de 21 de Dezembro de 1954, França/Alta Autoridade (1/54, Recueil, p. 7, Colect. 1954-1961, p. 1). O Tribunal de Justiça acolheu expressamente a opinião do advogado-geral Lagrange ao admitir «a possibilidade de um único recurso que abranja as três decisões»; o advogado-geral tinha observado que existia «uma relação de conexão evidente entre as três decisões impugnadas» nesse processo (Recueil, p. 44, Colect. 1954-1961, p. 1).

(17) - Acórdão de 30 de Junho de 1992, Espanha/Comissão (C-312/90, Colect., p. I-4117, a seguir «acórdão Cenemesa»).

(18) - Acórdão de 5 de Outubro de 1994, Itália/Comissão (C-47/91, Colect., p. I-4635, a seguir «acórdão Italgrani»).

(19) - Acórdão Italgrani, já referido, n._ 26.

(20) - Os actos impugnados foram notificados ao Governo italiano, respectivamente, em 12 e 14 de Novembro de 1997, e este apresentou ao Tribunal de Justiça a petição do recurso de anulação em 22 de Janeiro de 1998.

(21) - Acórdão de 13 de Abril de 1994 (C-324/90 e C-342/90, Colect., p. I-1173, a seguir «acórdão Pleuger»).

(22) - V., inicialmente, acórdãos de 17 de Setembro de 1980, Philip Morris Holland/Comissão (730/79, Recueil, p. 2671, n._ 5, a seguir «acórdão Philip Morris»); de 14 de Novembro de 1984, Intermills/Comissão (323/82, Recueil, p. 3809, n._ 5), e de 13 de Março de 1985, Países Baixos e Leeuwarder Papierwarenfabriek/Comissão (296/82 e 318/82, Recueil, p. 809, n._ 13, a seguir «acórdão Leeuwarder»). No acórdão de 9 de Março de 1994, TWD Textilwerke Deggendorf (C-188/92, Colect., p. I-833, n._ 24), o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente que o beneficiário de um auxílio de Estado podia impugnar, nos termos do artigo 173._ do Tratado, a decisão da Comissão que declara o auxílio ilegal e incompatível com o mercado comum. Isto foi implicitamente confirmado no acórdão Pleuger, já referido. Resulta claramente do acórdão de 24 de Outubro de 1996, Alemanha e o./Comissão (C-329/93, C-62/95 e C-63/95, Colect., p. I-5151, a seguir «acórdão Bremer Vulkan»), que a remessa para o Tribunal de Justiça de um recurso de anulação individual interposto no Tribunal de Primeira Instância não podia afectar essa admissibilidade.

(23) - No acórdão de 2 de Fevereiro de 1988, Van der Kooy e o./Comissão (67/85, 68/85 e 70/85, Colect., p. 219), o Tribunal de Justiça negou aos horticultores individuais que haviam beneficiado de uma tarifa de gás preferencial o direito de agir contra uma decisão da Comissão que declara que essa tarifa constitui um auxílio de Estado incompatível, pois, enquanto membros de um importante grupo de produtores, não eram individualmente afectados; v. n._ 15.

(24) - Acórdão de 9 de Outubro de 1984, Heineken Brouwerijen (91/83 e 127/83, Recueil, p. 3435, a seguir «acórdão Heineken»).

(25) - Cita o acórdão de 4 de Fevereiro de 1992, British Aerospace e Rover/Comissão (C-294/90, Colect., p. I-493, n.os 10 e 13, a seguir «acórdão Rover»).

(26) - Já referido na nota 24.

(27) - Já referido, n._ 17.

(28) - Já referido, n._ 21.

(29) - Já referido na nota 25. No acórdão Rover, o Tribunal de Justiça afirmou que, quando a Comissão considerar que foi pago um novo auxílio que não estava abrangido pelo processo de exame anterior e pela aprovação condicional da sua parte de um regime de auxílio, deve iniciar um novo processo de exame contraditório e dar aos interessados a possibilidade de apresentarem as suas observações (n.os 10 a 13).

(30) - V., entre outros, acórdão de 20 de Março de 1997, Alcan Deutschland (C-24/95, Colect., p. I-1591, n._ 23, a seguir «acórdão Alcan»). A Comissão remete para o processo Comissão/Itália (acórdão de 29 de Janeiro de 1998, C-280/95, Colect., p. I-259), em que a República Italiana não contestou que a ordem de recuperação é consequência da declaração de incompatibilidade do auxílio (n._ 10).

(31) - V., a este respeito, o acórdão Comissão/Itália, já referido, n._ 25.

(32) - Já referida na nota 14. A Sétima Directiva foi revogada pelo Regulamento (CE) n._ 3094/95 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1995, relativo aos auxílios à construção naval (JO L 322, p. 1). Todavia, como esse regulamento só entrou em vigor em 31 de Dezembro de 1997, na sequência da alteração efectuada pelo Regulamento (CE) n._ 1904/96 do Conselho, de 27 de Setembro de 1996 (JO L 251, p. 5), apenas será feita referência à Sétima Directiva. O facto de a Comissão apenas fazer referência, na decisão de 1997, aos Regulamentos n.os 3094/95 e 1904/96 não poderá afectar a sua validade, visto ser claro que substituíram a Sétima Directiva e nenhuma das alterações que introduziram é relevante para efeitos do presente processo.

(33) - JO 1997, C 205, p. 5.

(34) - V. acórdão de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Comissão (C-400/92, Colect., p. I-4701, n._ 13). V., igualmente, acórdão de 18 de Maio de 1993, Bélgica/Comissão (C-356/90 e C-180/91, Colect., p. I-2323, n.os 25 e 26). Após a entrada em vigor do Tratado da União Europeia, há quatro parágrafos explícitos no artigo 92._, n._ 3, do Tratado - tendo o Tratado de Amesterdão (artigo 6._, ponto 51) apenas suprimido, com uma finalidade de simplificação, a disposição caduca contida inicialmente na segunda frase do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado.

(35) - Já referido na nota 22.

(36) - Na réplica, a República Italiana sublinha que o transporte de 89% das mercadorias da Sardenha em direcção ao continente italiano se efectua por mar, ao passo que os 11% restantes são transportados para portos do Atlântico e do Mediterrâneo em França e para os portos de Espanha. No que se refere ao transporte de passageiros, o tráfego com o continente italiano representa 97%.

(37) - V. a última frase do oitavo parágrafo do ofício (JO 1996, C 368, pp. 1 e 2).

(38) - JO L 364, p. 7.

(39) - Refere os acórdãos Philip Morris, já referido na nota 22, n._ 11, e de 21 de Março de 1991, Itália/Comissão (C-303/88, Colect., p. I-1433, n._ 27, a seguir «acórdão ENI-Lanerossi»).

(40) - Acórdão de 30 de Abril de 1998, Vlaams Gewest/Comissão (T-214/95, Colect., p. II-717, n._ 67).

(41) - Acórdão de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão (C-278/92 a C-280/92, Colect., p. I-4103, n._ 42, a seguir «acórdão Hytasa»).

(42) - Acórdão de 13 de Julho de 1988, França/Comissão (102/87, Colect., p. 4067, n._ 19).

(43) - Acórdão de 11 de Julho de 1985 (42/84, Recueil, p. 2545, n._ 26).

(44) - Acórdão de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink's France (C-367/95 P, Colect., p. I-1719, n._ 63, a seguir «acórdão Sytraval»). V., igualmente, acórdãos Leeuwarder, já referido, n._ 19; de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão (C-350/88, Colect., p. I-395, n.os 15 e 16), e de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão (C-56/93, Colect., p. I-723, n._ 86 do acórdão e n._ 107 das minhas conclusões).

(45) - Acórdão Sytraval, já referido. V., igualmente, acórdão de 16 de Março de 2000, Compagnie maritime belge Transports e Dafra Lines/Comissão (C-395/96 P e C-396/96 P, Colect., p. I-1365, n.os 56 e 43 a 45 das minhas conclusões nesse processo).

(46) - Decisão 79/743/CEE da Comissão, de 27 de Julho de 1979, relativa a um auxílio que o Governo neerlandês projecta conceder para favorecer o aumento da capacidade de produção de um fabricante de cigarros (JO L 217, p. 17).

(47) - V. relatório para audiência no processo Philip Morris (Recueil 1980, pp. 2671, 2676).

(48) - Acórdão Philip Morris, já referido, n._ 10.

(49) - Ibidem, n.os 11 e 12.

(50) - As informações contidas na decisão Philip Morris da Comissão encontram-se resumidas nas conclusões do advogado-geral Capotorti (Recueil 1980, pp. 2671, 2694). É neste contexto que deve ser compreendida a sua recomendação, seguida pelo Tribunal de Justiça, respeitante à clara possibilidade de o auxílio falsear a concorrência e afectar as trocas comerciais entre Estados-Membros (v. pp. 2696 e 2698).

(51) - Acórdão de 4 de Julho de 1963 (24/62, Colect. 1962-1964, p. 251).

(52) - Acórdão de 4 de Julho de 1963, Alemanha/Comissão, já referido, p. 256.

(53) - Já referido na nota 22. V., igualmente, acórdão Intermills/Comissão, já referido, n.os 37 a 39.

(54) - N._ 24. Neste aspecto seguiu a opinião do advogado-geral Sir Gordon Slynn que, após uma remissão para os considerandos relevantes, observou que «a Comissão limitou-se a afirmar pura e simplesmente que o auxílio falseava ou ameaçava falsear a concorrência na Comunidade, sem indicar minimamente como chegou a essa conclusão. Esta afirmação geral não é fundamentada, nem se baseia nos factos» (acórdão Leeuwarder, loc. cit. p. 812).

(55) - Acórdão já referido na nota 22, n._ 51.

(56) - N._ 53.

(57) - Embora no que diz respeito ao transporte de mercadorias a versão francesa da decisão de 1997 faça referência às mercadorias «provenant des États membres» (provenientes dos Estados-Membros) e transportadas para a Sardenha e às mercadorias transportadas da Sardenha «vers les États membres» (para os Estados-Membros), no que se refere ao tráfico turístico faz menção ao comércio «entre le continent et la Sardaigne» (entre o continente e a Sardenha).

(58) - No acórdão Vlaams Gewest/Comissão, já referido na nota 40, o Tribunal de Primeira Instância declarou, citando, entre outros, o acórdão Brewer Vulkan que, «aplicado à qualificação de uma medida de auxílio», o artigo 190._ do Tratado exige «mesmo nos casos em que resulte das circunstâncias em que o auxílio foi concedido que o mesmo pode afectar as trocas comerciais entre Estados-Membros e falsear ou ameaçar falsear a concorrência, compete à Comissão, pelo menos, invocar essas circunstâncias na fundamentação da sua decisão». Na aplicação deste princípio, o Tribunal de Justiça adquiriu a convicção, com base nas informações contidas na decisão impugnada, que a apreciação pela Comissão «dos efeitos do auxílio em causa sobre a concorrência e as trocas intracomunitárias não foi abstracta» (n._ 65, sublinhado meu).

(59) - A cabotagem refere-se, essencialmente, à «gestão lucrativa no interior de um país de meios de transporte pertencentes a outro país, sendo a actividade gerada no país de gestão» [tradução livre]; v. Glossário das Comunidades Europeias, 5.° edição, 1990, p. 205.

(60) - O artigo 1._ do Regulamento n._ 3577/92 confere aos armadores da Comunidade a liberdade de prestação de «serviços de transporte marítimo dentro de um Estado-Membro (cabotagem marítima)» com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1993. Todavia, a «cabotagem insular no Mediterrâneo» foi inicialmente excluída até 1 de Janeiro de 1999 pelo artigo 6._, n._ 2. O artigo 2._, n._ 1, define «cabotagem insular» como «o transporte por mar de passageiros ou mercadorias entre: - portos do continente e de uma ou mais ilhas de um mesmo Estado-Membro, - portos situados nas ilhas de um mesmo Estado-Membro...».

(61) - V. Decisão 97/270/CE da Comissão, de 22 de Outubro de 1996, relativa ao regime de crédito fiscal instituído pela Itália no sector do transporte rodoviário de mercadorias por conta de outrem (JO 1997, L 106, p. 22); Decisão 98/182/CE da Comissão, de 30 de Julho de 1997, relativa aos auxílios concedidos pela região Friuli-Venezia Giulia (Itália) às empresas de transporte rodoviário de mercadorias da região (JO 1998, L 66, p. 18), e Decisão 98/693/CE da Comissão, de 1 de Julho de 1998, relativa ao regime espanhol de auxílios à aquisição de veículos comerciais «Plan Renove Industrial» (Agosto de 1994-Dezembro de 1996) (JO L 329, p. 23).

(62) - Na minha opinião, isto resulta implicitamente do artigo 93._, n._ 2, do Tratado e do dever expresso de cooperação imposto pelo artigo 5._ do Tratado CE (actual artigo 10._ CE). V., a este respeito, igualmente acórdãos SFEI e o., já referido na nota 9, n._ 43, e de 14 de Fevereiro de 1990, França/Comissão (C-301/87, Colect., p. I-397, n._ 22, a seguir «acórdão Boussac»).

(63) - V., a este respeito, acórdão de 26 de Setembro de 1996, França/Comissão (C-241/94, Colect., p. I-4551, n.os 32 a 37, a seguir «acórdão Kimberly Clark»).

(64) - Acórdão de 9 de Agosto de 1994 (C-44/93, Colect., p. I-3829, a seguir «acórdão Namur»).

(65) - Ibidem, n._ 77 das suas conclusões.

(66) - Refere o acórdão de 21 de Novembro de 1991, Fédération nacional du commerce extérieur des produits alimentaires e Syndicat nacional des négociants et transformateurs de Saumon (C-354/90, Colect., p. I-5505, n._ 14).

(67) - A Comissão faz referência, na suas contestações nos dois processos, às alterações introduzidas pelos artigos 99._ e 100._ da lei regional de 1988, que são descritos nos n.os 4 e 5 supra.

(68) - V. quinto parágrafo da parte III da decisão (com um termo por mim sublinhado) e o quinto parágrafo do ofício de abertura I. A versão italiana autêntica da decisão refere «alterada de modo substancial», enquanto no ofício de abertura I se trata de «substancialmente alterada» (sublinhado por mim).

(69) - Acórdão já referido na nota 64, n._ 23.

(70) - Ibidem, n._ 28.

(71) - Acórdão Namur, n._ 33. Parece que, a este respeito, a necessidade da segurança jurídica aumentou com a adopção recente, com base no artigo 94._ do Tratado CE (actual artigo 89._ CE), do Regulamento (CE) n._ 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93._ do Tratado CE (JO L 83, p. 1). O seu artigo 1._, alínea b), inclui na definição de «auxílio existente», os auxílios assim considerados «por se poder comprovar que não constituíam auxílios no momento da sua execução, tendo-se subsequentemente transformado em auxílios devido à evolução do mercado comum e sem terem sido alterados pelo Estado-Membro».

(72) - N._ 77 das suas conclusões (sublinhado meu). Nessa citação, quando se faz referência a que «a alteração de um auxílio pressupõe uma modificação material desse regime», o termo «material» deve ser entendido como significando «substancial», segundo o sentido dado à palavra «material» pelo advogado-geral Lenz em alemão.

(73) - Acórdão já referido, n._ 5 das suas conclusões (sublinhado meu).

(74) - Acórdão de 10 de Dezembro de 1991 (C-179/90, Colect., p. I-5889, n.os 11 a 13, a seguir «acórdão Porto di Genova»).

(75) - N._ 77 das suas conclusões, citado integralmente no n._ 65 supra; o sublinhado é meu. Nessa citação, deve ler-se «modificação substancial» em vez de «modificação material», v. nota 72 supra.

(76) - V. acórdãos Heineken, já referido, n._ 14; Boussac, já referido na nota 62, n._ 17; Cenemesa, já referido, n._ 16, e Italgrani, já referido, n._ 24. Seria igualmente contrário à fundamentação subjacente ao acórdão de 17 de Junho de 1999, Piaggio (C-295/97, Colect., p. I-3735), em que o Tribunal de Justiça confirmou que a Comissão não tinha o poder de qualificar de auxílio existente medidas adoptadas após a entrada em vigor do Tratado CE, quando as medidas em questão não lhe foram notificadas; v. n.os 44 a 49.

(77) - Acórdão de 20 de Março de 1990, Du Pont de Nemours Italiana (C-21/88, Colect., p. I-889, n._ 20). V., igualmente, acórdão de 24 de Novembro de 1982, Comissão/Irlanda (249/81, Colect., p. 4005, a seguir «acórdão Buy Irish»), no qual o Tribunal de Justiça afirmou que (n._ 18) «o facto de uma parte substancial da campanha em litígio ser financiada pelo Governo irlandês e os artigos 92._ e 93._ do Tratado poderem ser aplicáveis a esse modo de financiamento, não implica que a campanha possa, enquanto tal, escapar às proibições previstas no artigo 30._».

(78) - Processo pendente no Tribunal de Justiça (C-156/98, conclusões apresentadas em 27 de Janeiro de 2000, n._ 43).

(79) - 290/83, Recueil, p. 439.

(80) - Acórdão já referido, n._ 17 (sublinhado meu). V. igualmente as conclusões do advogado-geral Mancini, Recueil, pp. 439, 443 e 444.

(81) - V. acórdão Philip Morris, já referido, n._ 24. V., igualmente, acórdãos Hytasa, já referido na nota 41, n._ 51; de 15 de Outubro de 1996, Ijssel-Vliet (C-311/94, Colect., p. I-5023, n._ 27); de 29 de Fevereiro de 1996, Bélgica/Comissão, já referido na nota 44, n._ 11, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, AIUFASS e AKT/Comissão (T-380/94, Colect., p. II-2169, n._ 56).

(82) - V., por exemplo, acórdão AIUFASS e AKT/Comissão, já referido, n._ 50, que por dele ter sido interposto recurso, está pendente no Tribunal de Justiça; v. despacho de 6 de Outubro de 1997, AIUFASS e AKT/Comissão (C-55/97 P, Colect., p. I-5383, n.os 22 a 26).

(83) - V. acórdão Hytasa, já referido, n.os 51 a 58.

(84) - V. Decisão 94/629/CE da Comissão, de 29 de Julho de 1994, relativa ao estabelecimento do quadro comunitário de apoio para as intervenções estruturais comunitárias nas regiões de Itália abrangidas pelo objectivo n._ 1, a saber, Abruzos, Basilicata, Calábria, Câmpania, Molise, Púglia, Sardenha e Sicília (JO L 250, p. 21).

(85) - SEC (89) 921 final.

(86) - JO 1997, C 205, p. 5.

(87) - V. acórdão de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão (C-313/90, Colect., p. I-1125, n.os 36 e 44 e segs.).

(88) - V. acórdão Alcan, referido na nota 30, n._ 22. V., igualmente, despacho de 6 de Fevereiro de 1986, Deufil/Comissão (310/85, Colect., p. 24), e acórdão Hytasa, referido na nota 41, n._ 78. Vários anos antes da adopção da lei regional de 1988, a Comissão informou muito claramente «os beneficiários potenciais de auxílios estatais do carácter precário dos auxílios que lhes fossem ilegalmente concedidos, no sentido de que cada beneficiário de um auxílio concedido ilegalmente, ou seja, sem que a Comissão tenha chegado a uma decisão definitiva sobre a sua compatibilidade, pode ser levado a restituir o auxílio» (JO 1983, C 318, p. 3).

(89) - Acórdão Alcan, já referido, n._ 25. O Tribunal de Justiça acrescentou, no mesmo número, que «um operador económico diligente deve normalmente estar em condições de se assegurar de que esse processo foi respeitado».

(90) - JO L 319, p. 1; EE 08 F2 p. 41.

(91) - V. acórdão de 15 de Setembro de 1998, BFM e EFIM/Comissão (T-126/96 e T-127/96, Colect., p. II-3437, n.os 67 e 68).

(92) - Já referido na nota 71.

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