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Document 61997CJ0039

Acórdão do Tribunal de 29 de Setembro de 1998.
Canon Kabushiki Kaisha contra Metro-Goldwyn-Mayer Inc., anteriormente Pathe Communications Corporation.
Pedido de decisão prejudicial: Bundesgerichtshof - Alemanha.
Direito de marca - Risco de confusão - Semelhança entre produtos ou serviços.
Processo C-39/97.

Colectânea de Jurisprudência 1998 I-05507

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1998:442

61997J0039

Acórdão do Tribunal de 29 de Setembro de 1998. - Canon Kabushiki Kaisha contra Metro-Goldwyn-Mayer Inc., anteriormente Pathe Communications Corporation. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesgerichtshof - Alemanha. - Direito de marca - Risco de confusão - Semelhança entre produtos ou serviços. - Processo C-39/97.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-05507


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Aproximação das legislações - Marcas - Directiva 89/104 - Registo de uma nova marca - Existência de produtos ou serviços idênticos ou semelhantes com uma marca semelhante - Risco de confusão com a marca anterior - Apreciação da semelhança dos produtos ou serviços - Carácter distintivo ou notoriedade da marca - Incidência

[Directiva 89/104 do Conselho, artigo 4._, n._ 1, alínea b)]

2 Aproximação das legislações - Marcas - Directiva 89/104 - Registo de uma nova marca - Existência de produtos ou serviços idênticos ou semelhantes com uma marca semelhante - Risco de confusão com a marca anterior - Semelhança dos produtos ou serviços - Apreciação - Critérios

[Directiva 89/104 do Conselho, artigo 4._, n._ 1, alíneas a) e b)]

3 Aproximação das legislações - Marcas - Directiva 89/104 - Registo de uma nova marca - Existência de produtos ou serviços idênticos ou semelhantes com uma marca semelhante - Risco de confusão com a marca anterior - Equívoco do público quanto à origem dos produtos ou serviços - Apreciação - Critérios

[Directiva 89/104 do Conselho, artigos 2._ e 4._, n._ 1, alínea b)]

Sumário


4 O artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, deve ser interpretado no sentido de que o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, deve ser tomado em consideração para apreciar se a semelhança entre os produtos ou os serviços designados pelas duas marcas é suficiente para dar lugar a um risco de confusão.

O risco de confusão deve ser apreciado globalmente atentos todos os factores relevantes do caso em apreço. Essa apreciação global implica uma certa interdependência entre os factores tomados em conta, nomeadamente a semelhança das marcas e dos produtos ou serviços designados. Assim, um reduzido grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados pode ser compensado por um elevado grau de semelhança entre as marcas, e inversamente. Por outro lado, como o risco de confusão é tanto mais elevado quanto o carácter distintivo da marca anterior se reconhece como importante, as marcas que tenham um carácter distintivo elevado, intrinsecamente ou em razão do conhecimento destas no mercado, gozam de uma protecção mais ampla do que aquelas cujo carácter distintivo é mais reduzido.

Daqui decorre que, para efeitos do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva, pode ter que se recusar o registo de uma marca, apesar de um menor grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados, quando a semelhança das marcas é grande e o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, é elevado. Mesmo que tal interpretação tenha por efeito prolongar sensivelmente o processo de registo, importa, em qualquer circunstância, por razões de segurança jurídica e de boa administração, garantir que as marcas cuja utilização poderia ser contestada com êxito nos órgãos jurisdicionais não sejam registadas.

5 Para efeitos da aplicação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, é necessário, mesmo na hipótese de existir identidade com uma marca cujo carácter distintivo seja particularmente elevado, fazer prova da existência de uma semelhança entre os produtos ou os serviços designados. Com efeito - e contrariamente ao que está por exemplo previsto no artigo 4._, n._ 1, alínea a), que visa expressamente os casos em que os produtos ou serviços não são semelhantes -, o artigo 4._, n._ 1, alínea b), estabelece que um risco de confusão pressupõe uma identidade ou semelhança entre os produtos ou serviços designados. Para apreciar a semelhança entre os produtos ou serviços em causa, importa tomar em conta todos os factores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos ou serviços. Estes factores incluem, em especial, a sua natureza, destino, utilização, bem como o seu carácter concorrente ou complementar.

6 Um risco de confusão existe na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, quando o público pode ser induzido em erro quanto à origem dos produtos ou dos serviços em causa. Efectivamente, por um lado, resulta do artigo 2._ da directiva que uma marca deve ser adequada a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas e, por outro, o décimo considerando da directiva indica que o objectivo da protecção conferida pela marca consiste nomeadamente em garantir a sua função de origem. A função essencial da marca é garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto ou serviço que exibe a marca, permitindo-lhe distinguir, sem confusão possível, aquele produto ou serviço de outros que tenham proveniência diversa. Por outro lado, para que a marca possa desempenhar o seu papel de elemento essencial do sistema de concorrência leal que o Tratado pretende criar e manter, deve constituir a garantia de que todos os produtos que a ostentam foram fabricados sob o controlo de uma única empresa à qual possa ser atribuída a responsabilidade pela respectiva qualidade.

Por conseguinte, pode existir um risco de confusão na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva mesmo quando, para o público, os produtos ou os serviços em causa têm locais de produção diferentes. Em contrapartida, a existência de tal risco está excluída se não se concluir que o público pode ser levado a supor que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas economicamente ligadas.

Partes


No processo C-39/97,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, pelo Bundesgerichtshof (Alemanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Canon Kabushiki Kaisha

e

Metro-Goldwyn-Mayer Inc., anteriormente Pathe Communications Corporation,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, C. Gulmann (relator), H. Ragnemalm, M. Wathelet e R. Schintgen, presidentes de secção, P. J. G. Kapteyn, J. L. Murray, D. A. O. Edward, G. Hirsch, P. Jann e L. Sevón, juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Canon Kabushiki Kaisha, por Götz Jordan, advogado em Karlsruhe,

- em representação da Metro-Goldwyn-Mayer Inc., anteriormente Pathe Communications Corporation, por Wolf-W. Wodrich, advogado em Essen,

- em representação do Governo francês, por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Philippe Martinet, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo italiano, por Umberto Leanza, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Oscar Fiumara, avvocato dello Stato,

- em representação do Reino Unido, por Lindsey Nicoll, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente, e Daniel Alexander, barrister,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Jürgen Grunwald, consultor jurídico, e Berend Jan Drijber, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Canon Kabushiki Kaisha, representada por Axel Rinkler, advogado em Karlsruhe, da Metro-Goldwyn-Mayer Inc., anteriormente Pathe Communications Corporation, representada por Wolf-W. Wodrich e Joachim K. Zenz, Patentanwalt em Essen, do Governo francês, representado por Anne de Bourgoing, encarregada de missão na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, do Governo italiano, representado por Oscar Fiumara, do Governo do Reino Unido, representado por Daniel Alexander, e da Comissão, representada por Jürgen Grunwald, na audiência de 20 de Janeiro de 1998,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 2 de Abril de 1998,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 12 de Dezembro de 1996, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de Janeiro de 1997, o Bundesgerichtshof submeteu ao Tribunal, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, uma questão prejudicial relativa à interpretação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1, a seguir «directiva»).

2 Esta questão foi suscitada no âmbito de um litígio que opõe a sociedade japonesa Canon Kabushiki Kaisha (a seguir «CKK») à sociedade americana Metro-Goldwyn-Mayer Inc., anteriormente Pathe Communications Corporation, (a seguir «MGM»), em consequência da apresentação por esta última na Alemanha, em 1986, de um pedido de registo da denominação «CANNON» para designar os produtos e serviços seguintes: «filmes gravados em videocassetes (cassetes de vídeo); produção, aluguer e exibição de filmes para salas de cinema e estações de televisão».

3 Referindo-se ao § 5, n._ 4, ponto 1, da Warenzeichengesetz (antiga lei relativa às marcas, a seguir «WZG»), a CKK deduziu oposição a este pedido junto do Deutsches Patentamt (organismo alemão das patentes), com o fundamento de que estava em conflito com a sua designação anterior «Canon», registada na Alemanha, nomeadamente, para os seguintes produtos: «câmaras e projectores para fotografia e cinema; aparelhos de recepção e de gravação de televisão, aparelhos de transmissão de televisão, aparelhos de captação e reprodução de televisão, incluindo aparelhos de fita ou de discos para gravação e reprodução de televisão».

4 O primeiro examinador da Deutsches Patentamt concluiu que existia identidade entre as duas marcas e, em consequência, recusou o registo com o fundamento de que os produtos e serviços respectivos eram semelhantes na acepção do § 5, n._ 4, ponto 1, da WZG. O segundo examinador anulou esta decisão e indeferiu a oposição por considerar não existir semelhança.

5 O Bundespatentgericht negou provimento ao recurso interposto pela CKK desta última decisão, declarando não existir semelhança, na acepção do § 5, n._ 4, ponto 1, da WZG, entre os produtos e serviços em causa. Considerou que tal semelhança só pode ser admitida se os produtos ou serviços apresentarem, em razão da sua importância económica e do seu modo de utilização, pontos comuns tão próximos, nomeadamente no que respeita aos respectivos locais de fabrico e de venda habituais, que, no espírito do comprador médio, possa nascer a convicção de que provêm da mesma empresa, na medida em que são utilizados sinais distintivos coincidentes ou como tal entendidos. Segundo aquele órgão jurisdicional, esta condição não estava preenchida no caso em análise.

6 A CKK interpôs recurso para o Bundesgerichtshof da decisão do Bundespatentgericht.

7 No despacho de reenvio, o Bundesgerichtshof sublinha, a título preliminar, que o processo que lhe cabe decidir deve ser julgado com base na Markengesetz (nova lei alemã relativa às marcas), entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1995, que transpôs a directiva para o direito alemão e cujo § 9, n._ 1, ponto 2, corresponde ao artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva.

8 Esta última disposição prevê:

«1. O pedido de registo de uma marca será recusado ou, tendo sido efectuado, o registo de uma marca pode ser declarado nulo:

...

b) se, devido a sua identidade ou semelhança com a marca anterior, e devido a identidade ou semelhança dos produtos ou serviços a que as duas marcas se destinam, existir, no espírito do publico, um risco de confusão que compreenda o risco de associação com a marca anterior.»

9 Seguidamente, a fim de esclarecer o contexto e a importância da questão submetida, o Bundesgerichtshof deu as seguintes indicações:

- no caso vertente, as duas designações «CANNON» e «Canon» pronunciam-se da mesma maneira e a marca «Canon» é uma marca conhecida; por outro lado, como observou o Bundespatentgericht, o público é de opinião que os «filmes gravados em videocassetes (cassetes de vídeo)» e os «aparelhos para gravação e reprodução de bandas vídeo (gravadores vídeo)» não provêm do mesmo fabricante;

- o Bundespatentgericht, dando como assentes os princípios decorrentes da WZG, não deu importância, na sua decisão, nem à identidade das designações nem à notoriedade da sociedade oponente;

- como há que aplicar actualmente a Markengesetz, importa determinar os critérios a utilizar para interpretar o conceito de «semelhança dos produtos ou serviços a que as duas marcas se destinam», na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva;

- se, no caso vertente, não for tida em conta a notoriedade da marca anterior para avaliar o risco de confusão no caso de não existir semelhança entre os produtos ou os serviços que as duas marcas designam, o recurso interposto pela sociedade oponente não pode obter vencimento com base nas conclusões a que chegou o Bundespatentgericht;

- no entanto, é perfeitamente concebível interpretar o artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva no sentido de que a notoriedade da marca anterior pode não só reforçar o carácter distintivo inerente à marca enquanto tal, mas igualmente levar a não ter em conta a ideia que o público faz da proveniência («Herkunfsstätte») dos referidos produtos ou serviços ao apreciar a semelhança dos produtos ou dos serviços designados;

- segundo a doutrina, ao proceder à apreciação do risco de confusão na acepção da Markengesetz, pode ter que se proceder a uma conjugação entre a semelhança dos produtos, por um lado, e o grau de semelhança dos sinais respectivos e, por outro, o carácter distintivo da marca a proteger de modo que a semelhança dos produtos possa ser tanto mais frágil quando os sinais sejam mais próximos um do outro e o carácter distintivo da marca que requer a protecção seja mais forte.

10 Finalmente, o Bundesgerichtshof sublinha que a importância prática que reveste a interpretação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva é reforçada pelo facto de o motivo relativo à recusa de registo previsto no § 9, n._ 1, ponto 3, da Markengesetz - que transpõe o artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre a possibilidade de os Estados-Membros preverem uma protecção mais ampla no caso de marcas que gozam de notoriedade, derrogando a exigência de semelhança dos produtos ou serviços - não poder ser invocado no quadro do processo nacional de oposição mas apenas perante os órgãos jurisdicionais ordinários no quadro de uma acção de anulação ou de uma acção por violação do direito de marca.

11 Tendo em conta estas considerações, o Bundesgerichtshof suspendeu a instância para submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Ao apreciar a semelhança dos produtos ou serviços que designam as duas marcas pode ter-se em consideração o carácter distintivo, especialmente o nível de notoriedade da marca com prioridade anterior (até à data relevante para efeitos de determinação da prioridade da marca posterior), e em particular de forma a que se possa afirmar que existe risco de confusão, na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/104/CEE, mesmo quando, para o público, os produtos ou serviços em quetsão têm origens diferentes?»

12 Através da primeira parte da sua questão, o Bundesgerichtshof pergunta, no essencial, se o artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva deve ser interpretado no sentido de que o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, deve ser tomado em consideração para apreciar se a semelhança entre os produtos ou os serviços designados pelas duas marcas é suficiente para dar lugar a um risco de confusão.

13 A CKK, os Governos francês e italiano bem como a Comissão concordam, no essencial, em responder afirmativamente a esta questão.

14 Em contrapartida, a MGM e o Governo do Reino Unido consideram que a semelhança entre os produtos e os serviços deve ser apreciada de modo objectivo e autónomo e, por conseguinte, abstraindo do carácter distintivo da marca anterior, especialmente da sua notoriedade.

15 A este propósito, importa recordar, em primeiro lugar, que o décimo considerando da directiva enuncia que «a protecção conferida pela marca registada, cujo objectivo consiste nomeadamente em garantir a função de origem da marca, é absoluta em caso de identidade entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços; que a protecção é igualmente válida em caso de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços; que é indispensável interpretar a noção de semelhança em relação com o risco de confusão; que o risco de confusão, cuja avaliação depende de numerosos factores e nomeadamente do conhecimento da marca no mercado, da associação que pode ser feita com o sinal utilizado ou registado, do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços designados, constitui a condição específica da protecção».

16 Em segundo lugar, importa observar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o risco de confusão no espírito do público, que condiciona a aplicação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva, deve ser apreciado globalmente atentos todos os factores relevantes do caso em apreço (acórdão de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C-251/95, Colect., p. I-6191, n._ 22).

17 A apreciação global do risco de confusão implica uma certa interdependência entre os factores tomados em conta, nomeadamente a semelhança das marcas e dos produtos ou serviços designados. Assim, um reduzido grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados pode ser compensado por um elevado grau de semelhança entre as marcas, e inversamente. A interdependência entre estes factores encontra efectivamente expressão no décimo considerando da directiva, segundo o qual é indispensável interpretar o conceito de semelhança em relação com o risco de confusão cuja apreciação, por seu turno, depende nomeadamente do conhecimento da marca no mercado e do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços designados.

18 Por outro lado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o risco de confusão é tanto mais elevado quanto o carácter distintivo da marca anterior se reconhece como importante (acórdão SABEL, já referido, n._ 24). Por conseguinte, como a protecção de uma marca registada depende, nos termos do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva, da existência de um risco de confusão, as marcas que tenham um carácter distintivo elevado, intrinsecamente ou em razão do conhecimento destas no mercado, gozam de uma protecção mais ampla do que aquelas cujo carácter distintivo é mais reduzido.

19 Daqui decorre que, para efeitos do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva, pode ter que se recusar o registo de uma marca, apesar de um menor grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados, quando a semelhança das marcas é grande e o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, é elevado.

20 Contra esta interpretação, a MGM e o Governo do Reino Unido objectaram que a tomada em consideração do carácter distintivo mais ou menos acentuado da marca anterior no âmbito da apreciação da semelhança entre os produtos ou os serviços designados comporta o perigo de prolongamento do processo de registo. Em contrapartida, o Governo francês afirmou que, segundo a sua experiência, a tomada em conta deste factor no quadro da apreciação da semelhança entre os produtos ou os serviços designados não tem por efeito aumentar indevidamente a duração ou complicar o processo de registo.

21 A este propósito, importa ter presente que, mesmo supondo que a interpretação preconizada tenha por efeito prolongar sensivelmente o processo de registo, isso não pode ser determinante para a interpretação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva. De qualquer forma, por razões de segurança jurídica e de boa administração, há que garantir que as marcas cuja utilização poderia ser contestada com êxito nos órgãos jurisdicionais não sejam registadas.

22 No entanto, importa sublinhar que, para efeitos da aplicação do artigo 4._, n._ 1, alínea b), continua a ser necessário, mesmo na hipótese de existir identidade com uma marca cujo carácter distintivo seja particularmente sensível, fazer prova da existência de uma semelhança entre os produtos ou os serviços designados. Com efeito - e contrariamente ao que está por exemplo previsto no artigo 4._, n._ 1, alínea ), que visa expressamente os casos em que os produtos ou serviços não são semelhantes -, o artigo 4._, n._ 1, alínea b), estabelece que um risco de confusão pressupõe uma identidade ou semelhança entre os produtos ou serviços designados.

23 Para apreciar a semelhança entre os produtos ou serviços em causa, importa, como recordaram os Governos francês e do Reino Unido, bem como a Comissão, tomar em conta todos os factores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos ou serviços. Estes factores incluem, em especial, a sua natureza, destino, utilização, bem como o seu carácter concorrente ou complementar.

24 Tendo em conta as considerações que precedem, há que responder à primeira parte da questão prejudicial que o artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva deve ser interpretado no sentido de que o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, deve ser tomado em consideração para apreciar se a semelhança entre os produtos ou os serviços designados pelas duas marcas é suficiente para dar lugar a um risco de confusão.

25 Na segunda parte da sua questão, o Bundesgerichtshof pergunta, em substância, se pode existir um risco de confusão na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva mesmo quando, para o público, os produtos ou os serviços em causa têm proveniências («Herkunftsstätten») diferentes.

26 A este propósito, há que ter presente que um risco de confusão existe na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva quando o público pode ser induzido em erro quanto à origem dos produtos ou dos serviços em causa.

27 Efectivamente, por um lado, resulta do artigo 2._ da directiva que uma marca deve ser adequada a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas; por outro, o décimo considerando da directiva indica que o objectivo da protecção conferida pela marca consiste nomeadamente em garantir a sua função de origem.

28 Importa, além disso, recordar que, segundo jurisprudência constante, a função essencial da marca é garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto que exibe a marca, permitindo-lhe distinguir, sem confusão possível, aquele produto de outros que tenham proveniência diversa e que, para que a marca possa desempenhar o seu papel de elemento essencial do sistema de concorrência leal que o Tratado pretende criar e manter, deve constituir a garantia de que todos os produtos que a ostentam foram fabricados sob o controlo de uma única empresa à qual possa ser atribuída a responsabilidade pela qualidade daqueles (v., nomeadamente, o acórdão de 17 de Outubro de 1990, HAG II, C-10/89, Colect., p. I-3711, n.os 14 e 13).

29 Por conseguinte, constitui um risco de confusão na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva o risco de que o público possa crer que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente (v., neste sentido, o acórdão SABEL, já referido, n.os 16 a 18). Consequentemente, como observou o advogado-geral no n._ 30 das suas conclusões, a fim de demonstrar a existência do referido risco de confusão, não basta demonstrar simplesmente a inexistência de risco de confusão no espírito do público quanto ao local de produção dos produtos ou serviços em causa.

30 Assim, há que responder à segunda parte da questão submetida que pode existir um risco de confusão na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da directiva mesmo quando, para o público, os produtos ou os serviços em causa têm locais de produção diferentes. Em contrapartida, a existência de tal risco está excluída se não se concluir que o público pode ser levado a supor que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas economicamente ligadas.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

31 As despesas efectuadas pelos Governos francês, italiano e do Reino Unido, e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre a questão submetida pelo Bundesgerichtshof, por despacho de 12 de Dezembro de 1996, declara:

O artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, deve ser interpretado no sentido de que o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, deve ser tomado em consideração para apreciar se a semelhança entre os produtos ou os serviços designados pelas duas marcas é suficiente para dar lugar a um risco de confusão.

Pode existir um risco de confusão na acepção do artigo 4._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/104 mesmo quando, para o público, os produtos ou os serviços em causa têm locais de produção diferentes. Em contrapartida, a existência de tal risco está excluída se não se concluir que o público pode ser levado a supor que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas economicamente ligadas.

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