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Document 61997CC0301

Conclusões apensas do advogado-geral Léger apresentadas em 13 de Março de 2001.
Reino dos Países Baixos contra Conselho da União Europeia.
Processo C-301/97.
Nederlandse Antillen contra Conselho da União Europeia.
Processo C-452/98.
Regime de associação dos países e territórios ultramarinos - Importação de arroz originário dos países e territórios ultramarinos - Medidas de protecção - Regulamento (CE) n.º 1036/97 - Recurso de anulação.

Colectânea de Jurisprudência 2001 I-08853

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2001:159

61997C0301

Conclusões apensas do advogado-geral Léger apresentadas em 13 de Março de 2001. - Reino dos Países Baixos contra Conselho da União Europeia. - Processo C-301/97. - Nederlandse Antillen contra Conselho da União Europeia. - Processo C-452/98. - Regime de associação dos países e territórios ultramarinos - Importação de arroz originário dos países e territórios ultramarinos - Medidas de protecção - Regulamento (CE) n.º 1036/97 - Recurso de anulação.

Colectânea da Jurisprudência 2001 página I-08853


Conclusões do Advogado-Geral


1 Pelos presentes recursos, ex artigo 173._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230._ CE), o Reino dos Países Baixos e as Nederlandse Antillen (1) pedem ao Tribunal de Justiça que anule o Regulamento (CE) n._ 1036/97 do Conselho, de 2 de Junho de 1997, que institui medidas de protecção relativas à importação de arroz originário dos países e territórios ultramarinos (2), e que condene o Conselho nas despesas.

I - Quadro jurídico e processual dos processos C-301/97 e C-452/98

O Tratado CE

2 Nos termos do artigo 3._, alínea r), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3._, n._ 1, alínea s), CE], a acção da Comunidade implica a associação com países e territórios ultramarinos (a seguir «PTU»), para incrementar as trocas comerciais e prosseguir em comum o esforço de desenvolvimento económico e social.

3 Nos termos do artigo 227._, n._ 3, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 299._, n._ 3, CE), os PTU constantes do anexo IV do Tratado, onde se incluem as Antilhas Neerlandesas, são objecto do regime de associação.

4 Em conformidade com o artigo 131._, segundo parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 182._, segundo parágrafo, CE), a associação tem por finalidade promover o desenvolvimento económico e social dos PTU e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto.

5 O artigo 132._, n._ 1, do Tratado CE [actual artigo 183._, n._ 1), CE] precisa que os Estados-Membros aplicarão às suas trocas comerciais com os PTU o regime que aplicam entre si por força do Tratado.

6 O artigo 133._, n._ 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 184._, n._ 1, CE) dispõe que as mercadorias originárias dos PTU beneficiarão, ao entrarem nos Estados-Membros, da eliminação total dos direitos aduaneiros que se deve progressivamente realizar entre os Estados-Membros, em conformidade com as disposições do Tratado.

7 O artigo 134._ do Tratado CE (actual artigo 185._ CE) prevê que se o nível dos direitos aplicáveis às mercadorias provenientes de um país terceiro, ao entrarem num país ou território, for, em consequência da aplicação do n._ 1 do artigo 133._, de ordem a provocar desvios de tráfego em prejuízo de um dos Estados-Membros, este pode pedir à Comissão que proponha aos outros Estados-Membros as medidas necessárias para sanarem tal situação.

8 Nos termos do artigo 136._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 187._ CE), o Conselho fixa as modalidades e o processo de associação entre os PTU e a Comunidade. As últimas disposições na matéria figuram na Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (3).

A decisão PTU

9 Nos termos do artigo 101._, n._ 1, da decisão PTU, os produtos originários dos PTU podem ser importados na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente.

10 Por força do artigo 1._ do anexo II da decisão PTU, consideram-se originários dos PTU os produtos que tenham sido inteiramente obtidos ou suficientemente transformados nos PTU.

11 O artigo 2._, n._ 1, alínea b), do anexo II da decisão PTU precisa que se consideram inteiramente obtidos nos PTU «os produtos do reino vegetal neles colhidos».

12 Segundo o artigo 3._, n._ 1, do referido anexo, as matérias não originárias são consideradas como tendo sido suficientemente trabalhadas ou transformadas sempre que o produto obtido for classificado numa posição pautal diferente daquela em que são classificadas todas as matérias não originárias utilizadas no seu fabrico.

13 O artigo 3._, n._ 3, do anexo II da decisão PTU contém uma lista de complementos de fabrico ou transformações considerados insuficientes para conferir o carácter originário a um produto proveniente dos PTU.

14 O artigo 6._, n._ 2, do referido anexo estabelece:

«Quando produtos inteiramente obtidos na Comunidade ou nos Estados ACP sejam objecto de complementos de fabrico ou de transformações nos PTU, são considerados como tendo sido inteiramente obtidos nos PTU» (regra do «cúmulo de origem ACP/PTU»).

15 O artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU permite que a Comissão tome ou autorize um Estado-Membro a tomar medidas de protecção, se da aplicação da decisão resultarem perturbações graves num sector da actividade económica da Comunidade ou de um ou mais Estados-Membros ou o comprometimento da sua estabilidade financeira externa ou ainda se surgirem dificuldades que ameacem deteriorar um sector de actividade da Comunidade ou de uma das suas regiões. A Comissão é então obrigada a seguir o procedimento determinado no anexo IV da decisão PTU.

16 Segundo o artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU, devem escolher-se prioritariamente as medidas que provoquem o mínimo de perturbações no funcionamento da associação e da Comunidade, medidas essas que não devem exceder o estritamente indispensável para sanar as dificuldades que se tenham manifestado.

17 Nos termos do artigo 1._, n.os 5 e 7, do anexo IV da decisão PTU, qualquer Estado-Membro pode submeter à apreciação do Conselho a decisão da Comissão de instituir medidas de protecção no prazo de dez dias úteis após a data de comunicação desta decisão. Nesse caso, o Conselho, deliberando por maioria qualificada, pode tomar uma decisão diferente no prazo de vinte e um dias úteis.

O Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 (4)

18 O artigo XIX, alínea a), do GATT 1994 dispõe que, se em consequência da evolução imprevista das circunstâncias, um produto for importado no território de uma parte contratante em quantidades e condições tais que cause ou ameace causar um prejuízo grave aos produtores nacionais de produtos similares ou de produtos directamente concorrentes, esta parte tem a faculdade de impor medidas de salvaguarda.

O Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda

19 O Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda (5) é um dos acordos multilaterais relativos ao comércio de mercadorias concluído no âmbito da Organização Mundial do Comércio (6). Dispõe no seu artigo 7._, n._ 5, que nenhuma medida de salvaguarda será de novo aplicada à importação de um produto que tenha sido objecto de tal medida, adoptada após a data de entrada em vigor do Acordo OMC, durante um período igual àquele em que essa medida tenha sido anteriormente aplicada, na condição de o período de não aplicação ser de, pelo menos, dois anos.

O Regulamento (CE) n._ 764/97 (7)

20 Em 23 de Abril de 1997, a Comissão, considerando que as graves perturbações verificadas no mercado do arroz da Comunidade e o risco de importante deterioração deste sector de actividade económica que tinham tornado necessária a adopção do Regulamento (CE) n._ 304/97 (8) ainda não tinham sido sanados, adoptou o Regulamento n._ 764/97.

21 Por força do Regulamento n._ 764/97, o arroz originário dos PTU, do código NC 1006, podia ser importado com isenção de direitos aduaneiros na Comunidade, durante o período compreendido entre 1 de Maio e 30 de Setembro de 1997, até ao limite de:

a) 10 000 toneladas de arroz originário de Montserrat e das ilhas Turks e Caicos, e

b) 59 610 toneladas de arroz originário de outros PTU. Este contingente respeita, na sua maior parte, às Antilhas Neerlandesas.

O Regulamento n._ 1036/97

22 O regulamento controvertido substitui e revoga o Regulamento n._ 764/97.

23 Foi adoptado pelo Conselho na sequência dos recursos interpostos pelos Governos espanhol e do Reino Unido, em conformidade com o artigo 1._, n._ 5, do anexo IV da decisão PTU. De acordo com estes recursos, era pedida uma alteração da decisão da Comissão em benefício nomeadamente dos PTU com a economia menos desenvolvida.

24 O Conselho acedeu a estes pedidos tendo procedido a uma repartição diferente do volume, que permaneceu globalmente idêntico, dos contingentes entre os PTU em causa. O artigo 1._ do regulamento controvertido prevê com efeito que as importações na Comunidade de arroz originário dos PTU, do código NC 1006, que beneficiam da isenção de direitos aduaneiros, são limitadas, durante o período de 1 de Maio a 30 de Novembro de 1997, aos seguintes volumes:

a) 13 430 toneladas de arroz originário de Montserrat e das ilhas Turks e Caicos,

e b) 56 180 toneladas de arroz originário de outros PTU.

25 Segundo o seu artigo 8._, o Regulamento n._ 1036/97 entra em vigor no dia da sua publicação no Jornal Oficial das Comunidades Europeias e é aplicável a partir de 1 de Maio e até 30 de Novembro de 1997.

26 O Reino dos Países Baixos interpôs, em 20 de Agosto de 1997, um recurso de anulação do Regulamento n._ 1036/97.

27 Paralelamente, em 11 de Junho de 1997, a recorrente interpôs um recurso de anulação do referido regulamento no Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias. Por despacho de 16 de Novembro de 1998, o Tribunal de Primeira Instância declinou a sua competência em benefício do Tribunal de Justiça.

II - Contexto factual dos processos C-301/97 e C-452/98

O mercado do arroz na Comunidade

28 Existem principalmente três variedades de arroz: o arroz de grão redondo, o arroz de grão médio (também denominado Japonica) e o arroz de grão longo (também denominado Indica). Só o arroz Japonica e o arroz Indica é que são consumidos na Comunidade.

29 Na Comunidade, os países produtores de arroz são essencialmente a França, a Espanha e a Itália. A variedade de arroz aí cultivada é essencialmente a Japonica. Esta produção é excedentária. Em contrapartida, a Comunidade não produz arroz Indica suficiente para satisfazer as suas próprias necessidades. Foi por esta razão que a Comunidade incitou os produtores comunitários a desenvolverem a cultura do arroz Indica através de uma ajuda temporária ao hectare.

30 Para poderem ser consumidas, as diferentes variedades de arroz devem ser transformadas. Existem quatro estádios de transformação. Em cada um deles o valor unitário do arroz aumenta. Assim, o estádio de transformação é sempre indicado com o preço ou com a imposição que incide sobre o arroz.

31 Distinguem-se geralmente quatro estádios de transformação:

- o arroz Paddy: trata-se do arroz como colhido, ainda impróprio para consumo;

- o arroz pardo (9): trata-se do arroz cuja casca foi eliminada, próprio para consumo, mas que é igualmente susceptível de transformação ulterior;

- o arroz semibranqueado (10): trata-se do arroz a que se retirou uma parte do pericarpo. É um produto semiacabado geralmente vendido para ser transformado e não para ser consumido;

- o arroz branqueado (11): trata-se do arroz inteiramente transformado a que se eliminou totalmente a casca e o pericarpo.

32 A Comunidade só produz arroz branqueado. Em contrapartida, as Antilhas Neerlandesas só produzem arroz semibranqueado. O arroz semibranqueado proveniente das Antilhas Neerlandesas deve portanto ser objecto de uma última transformação para ser consumido na Comunidade.

III - Admissibilidade do pedido de intervenção do Reino de Espanha e do recurso das Antilhas Neerlandesas no processo C-452/98

33 Os fundamentos e pretensões da recorrente no processo C-452/98 são sensivelmente análogos aos deduzidos pelo Governo neerlandês no processo C-301/97. Tendo as Antilhas Neerlandesas suscitado a questão da admissibilidade do pedido de intervenção do Reino de Espanha e do seu próprio recurso, examinarei em primeiro lugar estes pontos que, de qualquer forma, devem ser examinados ex officio pelo juiz comunitário.

Argumentos da recorrente

34 A título preliminar, a recorrente sustenta que o pedido de intervenção do Reino de Espanha deve ser julgado inadmissível porque o Tratado de adesão do Reino de Espanha só foi ratificado pelo Reino dos Países Baixos em relação à sua parte europeia. Daqui resulta que não existe qualquer vínculo de direito comunitário entre as Antilhas Neerlandesas e o Reino de Espanha.

35 No que respeita ao seu próprio recurso, a recorrente alega que o mesmo é admissível, por um lado, nos termos das disposições do artigo 173._, segundo, terceiro e quarto parágrafos, do Tratado, e, por outro, nos termos da declaração feita pelo Governo neerlandês no anexo VIII da decisão PTU (12).

36 A título principal, considera que a sua qualidade de PTU lhe permite pedir a anulação do regulamento controvertido com fundamento no artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado sem ter que demonstrar que o mesmo lhe diz directa e individualmente respeito.

37 Em sua opinião, o Tratado confere directamente direitos e obrigações às Antilhas Neerlandesas, na qualidade de PTU citado no anexo IV do Tratado. É ao abrigo destas prerrogativas que a recorrente reivindica o direito de agir em juízo, com fundamento no artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado.

38 A recorrente sustenta que, nos termos do preâmbulo do Estatuto para o Reino dos Países Baixos, as Antilhas Neerlandesas e Aruba adoptaram uma ordem jurídica «em que defendem de modo independente os interesses próprios» (13). A recorrente observa que os interesses do Reino dos Países Baixos nem sempre estão em consonância com os seus (14). Por esta razão, dever-lhe-ia ser reconhecido o direito de interpor recurso com fundamento no disposto no artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado, independentemente do direito existente na esfera do Governo neerlandês.

39 De igual modo, a recorrente alega que a existência da sua legitimidade para agir com fundamento no artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado, é demonstrada pelo facto de que, ao abrigo do artigo 1._, n._ 5, do anexo IV da decisão PTU, só os Estados-Membros, com exclusão dos PTU, têm a faculdade de pedir ao Conselho a revisão das medidas de protecção adoptadas pela Comissão.

40 Além disso, em sua opinião, o facto de a declaração reconhecer às Antilhas Neerlandesas uma autonomia especial dentro do Reino dos Países Baixos é um argumento no sentido da existência de um direito autónomo que lhe seria concedido para interpor recursos judiciais contra medidas tomadas ao abrigo das disposições da referida decisão.

41 Considera, por fim, que seria possível aplicar por analogia o acórdão de 22 de Maio de 1990, Parlamento/Conselho (15). Com efeito, tal como o Parlamento no referido processo, pretende, com a sua actuação, proteger prerrogativas que lhe foram reconhecidas pelo Tratado - como o seu direito de livre acesso ao mercado comunitário e a protecção dos interesses de um sector importante da sua economia.

42 A título subsidiário, a recorrente pede que o seu recurso seja declarado admissível ao abrigo do disposto no artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado.

43 Em sua opinião, estas disposições só impõem como condição ser dotado de personalidade jurídica (16). Esta condição encontra-se satisfeita já que o direito interno neerlandês lhe reconhece essa personalidade bem como a capacidade para agir em juízo a fim de defender os seus próprios interesses.

44 A recorrente alega que o regulamento controvertido lhe diz directa e individualmente respeito.

45 A existência de um prejuízo directo causado pelo regulamento controvertido é demonstrada pelo facto de que o mesmo não deixa aos Estados-Membros qualquer margem de apreciação para a sua execução e submete a sérias restrições um importante sector da economia das Antilhas Neerlandesas - ou seja, o sector da transformação industrial do arroz que representou 0,9% do seu produto nacional bruto em 1996.

46 Além disso, o regulamento controvertido afecta-a individualmente porque tem por efeito restringir o tráfego de mercadorias dos PTU para a Comunidade. Na medida em que as Antilhas Neerlandesas são citadas no anexo IV do Tratado no âmbito dos PTU abrangidos pelas disposições da parte IV do Tratado (17), os artigos 227._, n._ 3, e 131._, n._ 1, do Tratado, bem como a decisão PTU são-lhes aplicáveis. Daí a recorrente conclui que os PTU constituem um grupo restrito de sujeitos de direito.

47 Além do mais, em sua opinião, resulta das disposições do artigo 109._ da decisão PTU, em que se funda o regulamento controvertido, que a Comissão deve ter em conta as consequências que o acto previsto pode ter na economia dos PTU. Uma vez que as Antilhas Neerlandesas exportam de longe a quantidade mais importante de arroz originário dos PTU para a Comunidade e que, no momento em que o regulamento foi adoptado, o Conselho sabia que praticamente todo o arroz originário dos PTU provinha das Antilhas Neerlandesas, daí se deve concluir que o regulamento controvertido diz individualmente respeito às Antilhas Neerlandesas.

48 Na audiência, a recorrente alegou que, por acórdão de 10 de Fevereiro de 2000, Nederlandse Antillen/Comissão (18), o Tribunal de Primeira Instância, em processos similares (19), julgou admissível o recurso das Antilhas Neerlandesas com fundamento no artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado. Pede assim que sejam acolhidos os seus fundamentos e argumentos desenvolvidos tanto no Tribunal de Primeira Instância, como aqui, em apoio da admissibilidade do seu recurso. Se assim não for, convida o Tribunal de Justiça a subscrever o raciocínio do Tribunal de Primeira Instância no referido processo.

Apreciação

Quanto à admissibilidade do pedido de intervenção do Reino de Espanha

49 Em conformidade com o disposto no artigo 37._, primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, os Estados-Membros podem intervir nas causas submetidas ao Tribunal de Justiça. Este direito é-lhes reconhecido em razão da sua qualidade de partes no Tratado. Assim, têm interesse em agir para defender os termos do acordo a que aderiram. Esta qualidade de recorrente «privilegiado» permite-lhes assim beneficiar de uma presunção inilidível de interesse e de legitimidade para agir.

50 Não se pode assim subscrever a posição das Antilhas Neerlandesas - ou seja, julgar que o Reino de Espanha não tem legitimidade para agir num processo que opõe as Antilhas Neerlandesas à Comunidade já que o Tratado de adesão do Reino de Espanha só foi ratificado pelo Reino dos Países Baixos em relação à sua parte europeia não privando de efeito o artigo 37._, primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça. Com efeito, a adopção de tal raciocínio equivaleria a permitir que disposições de direito interno limitem o exercício de um direito que resulta do Tratado.

51 Penso assim que o Tribunal de Justiça deve julgar admissível o pedido de intervenção do Reino de Espanha.

Quanto à admissibilidade do recurso das Antilhas Neerlandesas fundado no artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado

52 Recorde-se, antes de mais, que o artigo 173._ do Tratado enumera de modo limitativo:

- a natureza dos actos em relação aos quais é possível um recurso de fiscalização da legalidade bem como as instituições que os adoptaram (primeiro parágrafo) (20);

- as pessoas habilitadas a interpor um recurso de fiscalização da legalidade destes actos e as condições de admissibilidade do mesmo (segundo parágrafo (21), terceiro (22) e quarto (23) parágrafos);

- os fundamentos que podem ser invocados para o efeito (segundo parágrafo);

- o prazo de preclusão (quinto parágrafo).

53 Resulta da redacção do artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado, que só aos Estados-Membros, ao Conselho e à Comissão é reconhecida de um modo automático e geral a legitimidade e o interesse para interporem um recurso de anulação. Por outras palavras, estes recorrentes «privilegiados» não têm que demonstrar nem a sua legitimidade nem o seu interesse em pedirem a anulação dos actos adoptados por instituições comunitárias destinados a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros. Beneficiam de uma presunção inilidível de interesse em agir (24). Parece natural reconhecer este privilégio a estes recorrentes. Com efeito, sendo os Estados-Membros partes no Tratado, é manifesto o seu interesse em defenderem os termos de um acordo a que aderiram. O interesse da Comissão é igualmente evidente atendendo às suas funções de «guardiã do Tratado» (25) que lhe são por este atribuídas, nos termos do disposto no artigo 155._ do Tratado CE (actual artigo 211._ CE). De igual forma, o Conselho, enquanto autoridade encarregada da realização dos objectivos fixados pelo Tratado, em conformidade com o disposto no artigo 145._ do Tratado CE (actual artigo 202._ CE) tem de jure um interesse no respeito da legalidade comunitária.

54 Daqui há que concluir que, para terem direito à aplicação das disposições do artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado, as Antilhas Neerlandesas devem demonstrar que são um Estado-Membro ou uma das instituições comunitárias que têm legitimidade para agir de modo geral e automático - ou seja, o Conselho e a Comissão.

55 É patente que as Antilhas Neerlandesas não são uma instituição da Comunidade.

56 Por outro lado, a qualidade de «Estado-Membro», na acepção do Tratado e, em especial, das disposições relativas às acções e aos recursos jurisdicionais, só abrange as autoridades governamentais dos Estados-Membros das Comunidades Europeias com exclusão dos governos de regiões ou de comunidades autónomas, independentemente da extensão das competências que lhes sejam reconhecidas (26).

57 Com efeito, segundo o Tribunal de Justiça, «[a]dmitir o contrário afectaria o equilíbrio institucional previsto pelos Tratados, que determinam, nomeadamente, as condições em que os Estados-Membros, quer dizer, os Estados partes nos Tratados institutivos e nos Tratados de adesão, participam no funcionamento das instituições comunitárias. As Comunidades Europeias não podem, com efeito, ter um número de Estados-Membros superior ao número dos Estados pelos quais foram instituídas» (27).

58 No recente acórdão de 8 de Fevereiro de 2000, Emesa Sugar (28), o Tribunal de Justiça excluiu expressamente que os PTU possam ser considerados um Estado-Membro na acepção do Tratado. Com efeito, o Tribunal de Justiça afirmou que, «ainda que os PTU sejam países e territórios associados por laços especiais com a Comunidade, não fazem parte desta última e encontram-se em relação a ela na mesma situação que os países terceiros » (29).

59 Sendo as Antilhas Neerlandesas um PTU, não podem ser qualificadas de Estado-Membro na acepção do Tratado (30).

60 Quanto ao argumento da recorrente assente nas normas institucionais internas que lhe confeririam uma ampla autonomia em relação ao Reino dos Países Baixos e lhe permitiriam assim interpor um recurso ex artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado, independentemente do recurso que poderia eventualmente ser interposto pelo Governo neerlandês, recorde-se que a repartição das competências previstas pelas regras institucionais nacionais escapa à apreciação do Tribunal de Justiça (31). Por outras palavras, não compete às instituições comunitárias pronunciarem-se sobre a repartição das competências decorrente das normas institucionais de cada Estado-Membro e sobre as obrigações que, respectivamente, podem incumbir às autoridades do poder central do Estado e às das outras colectividades territoriais (32). Os diferendos que possam surgir em matéria de apreciação da extensão das respectivas competências e dos direitos e obrigações mútuos são assim da competência exclusiva dos Estados-Membros.

61 O argumento da recorrente assente nas normas institucionais internas é assim inoperante em sede de admissibilidade de um recurso ex artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado.

62 Do que precede resulta que a recorrente não pode interpor um recurso ao abrigo do artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado.

Quanto à admissibilidade do recurso das Antilhas Neerlandesas com fundamento na declaração

63 A recorrente alega igualmente que a declaração lhe reconhece o direito de agir em juízo para pedir a anulação das medidas tomadas por força da referida decisão.

64 Recorde-se, a este respeito, que as disposições de uma declaração só podem ter carácter jurídico na medida em que o conteúdo dessas disposições tenha expressão no texto de direito derivado que suscitou a sua adopção (33).

65 A declaração em causa foi elaborada pelo Governo neerlandês na sequência da decisão PTU.

66 Assim, para que esta declaração tenha carácter jurídico, seria necessário que as disposições da decisão PTU tivessem por objecto regular as modalidades processuais das acções e recursos judiciais contra as medidas tomadas em aplicação da referida decisão.

67 Resulta da sistemática geral da decisão PTU que a mesma se destina a dar execução às disposições do Tratado relativas ao regime de associação PTU/Estados-Membros, mas não a regular as modalidades processuais das acções e recursos judiciais movidos pelos Estados-Membros e pelos PTU contra os actos eventualmente adoptados por força da decisão PTU.

68 Resulta além disso da sistemática geral da decisão PTU que os Estados-Membros são os interlocutores privilegiados das instituições comunitárias no processo de adopção e de revisão das medidas tomadas em aplicação da referida decisão.

69 Assim, nos termos do artigo 1._, n.os 5 e 7, do anexo IV da decisão PTU, só os Estados-Membros podem submeter à apreciação do Conselho a decisão da Comissão de instaurar medidas de protecção no prazo de dez dias úteis seguintes ao dia da comunicação desta decisão.

70 Do que precede resulta que, mesmo que essa declaração conferisse às Antilhas Neerlandesas o direito de recorrer ao Tribunal de Justiça pedindo a apreciação da legalidade dos actos adoptados pelas instituições comunitárias por força da decisão PTU, dever-se-ia recusar-lhe qualquer carácter jurídico na medida em que a decisão PTU não tem por objecto definir as modalidades processuais das acções e recursos judiciais contra as medidas adoptadas em aplicação da referida decisão.

71 Todavia, a fim de ser exaustivo, acrescentarei que não penso que, com esta declaração, o Governo neerlandês tenha pretendido conferir tal direito às Antilhas Neerlandesas.

72 Com efeito, essa declaração prevê o seguinte:

«O Governo do Reino dos Países Baixos chama a atenção para a estrutura constitucional do Reino, tal como decorre do Estatuto de 29 de Dezembro de 1954, e nomeadamente para a autonomia dos países do Reino relativamente às disposições da decisão e para o facto de que esta decisão foi, por conseguinte, tomada em cooperação com os Governos das Antilhas Neerlandesas e de Aruba, de acordo com os procedimentos constitucionais vigentes no Reino.

O governo declara que, por esse facto e sem prejuízo dos direitos e obrigações para si resultantes do Tratado e da decisão, os Governos das Antilhas Neerlandesas e de Aruba cumprirão as obrigações decorrentes desta decisão.»

73 Resulta expressamente do teor destas disposições que a declaração não tem por objecto derrogar as regras do Tratado ou da decisão PTU.

74 Como já foi visto, a decisão PTU não prevê qualquer regra relativa às modalidades processuais das acções e recursos judiciais movidos pelos Estados-Membros e pelos PTU contra os actos eventualmente adoptados por força da decisão PTU.

75 E mais, o Tratado não confere aos PTU qualquer direito específico em matéria de recurso contencioso, mas apenas nos domínios económico, social e cultural (34).

76 Além disso, do próprio teor das disposições dessa declaração, resulta que o Governo neerlandês não reconheceu às Antilhas Neerlandesas e a Aruba direitos especiais - e a fortiori não lhe reconheceu direitos em matéria de recurso contencioso -, mas quis recordar aos governos desses PTU que deviam cumprir as obrigações resultantes da decisão.

77 Assim, as disposições da declaração não podem ser interpretadas como concedendo às Antilhas Neerlandesas direitos específicos em matéria de recurso contencioso.

78 Do que precede resulta que são aqui aplicáveis as disposições de direito comum relativas aos recursos contenciosos previstas pelo Tratado, ou seja, o disposto no artigo 173._ do Tratado.

Quanto à admissibilidade do recurso das Antilhas Neerlandesas com fundamento no artigo 173._, terceiro parágrafo, do Tratado

79 A recorrente pede a aplicação por analogia do acórdão Parlamento/Conselho, já referido. Considera que o seu recurso na medida em que visa a protecção das prerrogativas que lhe foram reconhecidas pelo Tratado deve ser declarado admissível com fundamento no artigo 173._, terceiro parágrafo, do Tratado.

80 Não sou dessa opinião. Com o acórdão Parlamento/Conselho, já referido, o Tribunal de Justiça pretendeu resolver um problema processual sobre as condições de admissibilidade das acções e dos recursos movidos pelas instituições comunitárias que não o Conselho e a Comissão (35). Esse acórdão visa fazer respeitar o equilíbrio institucional, mas não tem por objecto reconhecer a legitimidade para agir às pessoas singulares e colectivas que se julguem lesadas por um acto de carácter geral adoptado por uma instituição comunitária (36).

81 O terceiro parágrafo do artigo 173._ do Tratado, inserido no Tratado no seguimento desse acórdão, mais não faz do que reproduzir os termos desta jurisprudência.

82 É manifesto que as Antilhas Neerlandesas não são uma das instituições da Comunidade que participa na elaboração dos actos comunitários destinados a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros. Não podem portanto invocar o acórdão Parlamento/Conselho, já referido.

83 Do que precede resulta que o recurso das Antilhas Neerlandesas fundado no artigo 173._, terceiro parágrafo, do Tratado é inadmissível.

Quanto à admissibilidade do recurso das Antilhas Neerlandesas com fundamento no artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado

84 Nos termos do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado, qualquer pessoa singular ou colectiva pode interpor recurso das decisões de que seja destinatária e das decisões que, embora tomadas sob a forma de regulamento ou de decisão dirigida a outra pessoa lhe digam directa e individualmente respeito.

85 Não sendo o regulamento impugnado uma decisão dirigida às Antilhas Neerlandesas, na acepção do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado, há que verificar se o mesmo constitui um acto de carácter geral ou se deve ser considerado uma decisão tomada sob a forma de um regulamento.

86 Para determinar o carácter geral ou não de um acto, há que apreciar a sua natureza e os efeitos jurídicos que o mesmo pretende produzir ou que produz efectivamente (37).

87 Com o Regulamento n._ 1036/97 o Conselho adoptou medidas normativas indistintamente aplicáveis à generalidade dos operadores económicos presentes no sector de actividade do negócio de arroz originário dos PTU com a Comunidade. O regulamento controvertido tem por objecto e por efeito limitar as importações na Comunidade de arroz originário do conjunto dos PTU.

88 Portanto, pela sua própria natureza, este regulamento tem carácter geral e não constitui uma decisão na acepção do artigo 189._ do Tratado CE (actual artigo 249._ CE).

89 No entanto, é possível que um acto, apesar do seu carácter geral, possa dizer directa e individualmente respeito a certas pessoas singulares ou colectivas (38). Há assim que examinar se as Antilhas Neerlandesas satisfazem estas duas condições.

90 Segundo uma jurisprudência constante (39), o Tribunal de Justiça declarou que uma pessoa singular ou colectiva só pode pretender ser individualmente afectada por um acto de carácter geral adoptado por uma instituição comunitária, se for afectada, pelo acto em causa, em função de certas qualidades que lhe são próprias ou de uma situação de facto que a individualiza relativamente a qualquer outra pessoa. Nesta qualidade, a pessoa singular ou colectiva é considerada uma «pessoa interessada», ou seja, que demonstra pertencer a um círculo restrito de pessoas afectadas na sua posição jurídica em razão de uma situação de facto que as caracteriza em relação a qualquer outra pessoa e as individualiza de um modo análogo ao de um destinatário (40).

91 A recorrente alega que satisfaz estas duas condições.

92 Em sua opinião, o regulamento impugnado diz respeito à globalidade dos PTU. Daí conclui que os PTU constituem um grupo restrito de sujeitos de direito.

93 Sustenta, além disso, que as Antilhas Neerlandesas são pessoas colectivas «interessadas», na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça, nestas medidas.

94 Em primeiro lugar, as Antilhas Neerlandesas têm qualidades que lhes são específicas em relação aos outros PTU. A recorrente sustenta a este respeito que o regulamento controvertido sujeita a grandes restrições um importante sector da sua economia.

95 Resulta das observações da recorrente que o sector da transformação industrial do arroz só representou 0,9% do produto nacional bruto das Antilhas Neerlandesas em 1996. Parece-me pelo menos duvidoso, tendo em conta os números adiantados, que se possa considerar este sector um sector especialmente importante da economia das Antilhas Neerlandesas. A minha apreciação poderia ser diversa se o sector económico afectado pelo acto controvertido tivesse representado uma parte muito mais consequente do produto nacional bruto do PTU em causa. Há assim que concluir que a recorrente não demonstrou que o regulamento impugnado a afecta devido a qualidades que a distinguem de outros PTU igualmente visados pelo referido regulamento.

96 Em segundo lugar, a recorrente afirma que as Antilhas Neerlandesas se encontram numa situação de facto que as caracteriza em relação a qualquer outra pessoa e as individualiza de modo análogo ao de um destinatário na acepção da jurisprudência Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referida. A este respeito, alega que exporta, de longe, a quantidade mais importante de arroz originário dos PTU para a Comunidade e que, no momento em que o regulamento foi adoptado, o Conselho sabia desta situação específica, mas não a teve em conta para avaliar o impacte das futuras medidas de protecção sobre a economia das Antilhas Neerlandesas.

97 É incontestável que o facto de as instituições comunitárias, para tomarem uma decisão, serem obrigadas, por força de disposições específicas, a ter em conta as repercussões negativas que a sua decisão pode ter na economia de um Estado ou para as empresas interessadas pode ser susceptível de identificar estas diferentes pessoas (41). Todavia, o Tribunal de Justiça tem considerado reiteradamente que tal só podia ser o caso desde que o Estado ou as empresas em causa provassem além disso encontrar-se numa situação de facto que as distingue de qualquer outra pessoa (42). Assim, o Tribunal de Justiça julgou que o artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU continha uma obrigação desta natureza (43).

98 Desta forma, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que esta obrigação que incumbe a uma instituição comunitária só constitui um indício permitindo às pessoas colectivas demonstrarem o seu interesse específico, individual e pessoal em agir com fundamento no artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado contra um acto de carácter geral. Ao agir deste modo, se estas pessoas fizessem tal prova, deviam ser consideradas pertencer a círculo restrito de «pessoas interessadas», na acepção do acórdão Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referido.

99 No caso sub judice, a recorrente invocou o acórdão Nederlandse Antillen/Comissão, já referido, que, em circunstâncias similares, julgou admissível o seu recurso ex artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado.

100 Todavia, penso que não poderei seguir o raciocínio da recorrente neste domínio em razão de uma aplicação errada pelo Tribunal de Primeira Instância da jurisprudência Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referida.

101 No acórdão de 14 de Setembro de 1995, Antillean Rice Mills e o./Comissão, dito «ARM-1» (44), o Tribunal de Primeira Instância fez uma aplicação correcta da jurisprudência Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referida. Assinalava, em primeiro lugar, que a decisão PTU continha uma obrigação, que incumbia às instituições comunitárias, de tomada em consideração do impacte das decisões previstas na situação jurídica das pessoas identificadas ou identificáveis (45). Sublinhava, em segundo lugar, que as pessoas que beneficiavam deste direito deviam provar que se encontravam numa situação de facto que as caracteriza em relação a qualquer outra pessoa (46). Indicava, em terceiro lugar, que a existência de contratos concluídos antes da adopção das medidas de protecção em causa cuja execução fora impedida, no todo ou em parte, pela adopção das referidas medidas constituía um «indício susceptível de delimitar o círculo restrito das empresas interessadas, podendo ser igualmente utilizados para esse efeito outros indícios» (47). Declarava, em quarto lugar, que, no processo submetido à sua apreciação, as recorrentes tinham demonstrado encontrar-se numa «situação de facto, [permitindo] que se considere que as requerentes [...] são [pessoas] interessadas» (48). Concluía, em último lugar, que «[devia] ser rejeitada a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão» (49).

102 O Tribunal de Primeira Instância considerou portanto que a obrigação, que incumbe às instituições comunitárias, de terem em conta o impacte das medidas de protecção previstas na economia dos PTU ou quanto às empresas interessadas só constitui um indício permitindo-lhe provar o seu interesse específico, individual e pessoal em pedir a anulação de um acto de carácter geral adoptado por uma instituição comunitária.

103 Em contrapartida, no acórdão Nederlandse Antillen/Comissão, já referido, o Tribunal de Primeira Instância não faz nem esta análise nem este exame. Nesse acórdão, o Tribunal de Primeira Instância fez da obrigação, que incumbe às instituições comunitárias, de terem em conta o impacte que as medidas de protecção previstas podem ter na economia de um PTU uma condição suficiente permitindo às pessoas que beneficiavam do direito correspondente ser consideradas «pessoas interessadas» na acepção do acórdão Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referido (50). Ao agir deste modo, inverteu o raciocínio do Tribunal de Justiça no acórdão Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referido.

104 A este respeito, o n._ 57 do acórdão Nederlandse Antillen/Comissão, já referido, é especialmente eloquente. Com efeito, no mesmo, o Tribunal de Primeira Instância esclarece que:

«É verdade que, como sublinha a Comissão, não basta para se concluir que um acto comunitário diz individualmente respeito a uma colectividade regional de um Estado-Membro que esta demonstre que a aplicação, ou a execução, do acto é susceptível de afectar as condições socioeconómicas no seu território [...]. Todavia, no caso em apreço, os regulamentos recorridos dizem individualmente respeito à recorrente dado que a Comissão, quando se propunha aprová-los, era obrigada a ter em conta especificamente a situação da recorrente, nos termos do n._ 2 do artigo 109._ da decisão PTU» (51).

105 Daqui resulta que o Tribunal de Primeira Instância fundou a admissibilidade do recurso das Antilhas Neerlandesas apenas na obrigação que incumbe às instituições comunitárias de tomarem em conta o impacte das medidas previstas na economia do PTU em causa, ao passo que, nos acórdãos Piraiki-Patraiki e o./Comissão, Plaumann/Comissão e ARM-1, já referidos, esta obrigação só constitui um indício que deve ser confirmado pela prova de que as pessoas interessadas são afectadas, pelo acto em causa, em razão de certas qualidades que lhes são específicas ou de uma situação de facto que as caracteriza em relação a qualquer outra pessoa.

106 Resulta das considerações precedentes (52) que, para respeitar as condições exigidas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, as Antilhas Neerlandesas são obrigadas a demonstrar, além da obrigação do Conselho, que estão numa situação de facto que as caracteriza e as individualiza em relação a qualquer outro PTU.

107 A este respeito, a recorrente alega que exporta, de longe, a maior quantidade de arroz originário dos PTU para a Comunidade e que, no momento em que o regulamento foi adoptado, o Conselho tinha conhecimento desta situação especial, mas não a teve em conta para avaliar o impacte das futuras medidas de protecção na economia das Antilhas Neerlandesas.

108 Considero que a situação factual invocada pela recorrente não é susceptível de a distinguir dos outros PTU. Com efeito, a recorrente limita-se a assinalar importantes consequências socioeconómicas que podem resultar da aplicação do regulamento impugnado no seu território.

109 Ora, segundo jurisprudência constante (53), «não basta, para se concluir que um acto comunitário diz individualmente respeito a uma colectividade regional de um Estado-Membro, que esta demonstre que o seu cumprimento ou execução é susceptível de afectar as condições socioeconómicas no seu território» (54).

110 E mais, há que assinalar que, no caso sub judice, a actividade económica em causa afectada pelo referido regulamento, ou seja, uma actividade de transformação no território das Antilhas Neerlandesas do arroz originário de países terceiros, é uma actividade comercial que, em qualquer momento, pode ser exercida por qualquer pessoa, e que não é portanto susceptível de caracterizar as Antilhas Neerlandesas relativamente a qualquer outro PTU (55).

111 Além disso, tendo em conta que as mercadorias em proveniência de países terceiros só recebem um diminuto valor acrescentado no território dos PTU, o sector económico afectado pelo regulamento impugnado só pode contribuir de forma reduzida para o desenvolvimento dos PTU. De resto, a recorrente precisa que o sector da transformação industrial do arroz só representava, em 1996, 0,9% do produto nacional bruto das Antilhas Neerlandesas. A recorrente não tem assim razão quando pretende que o regulamento controvertido tem graves consequências num importante sector da sua economia.

112 Tendo em conta estes diferentes elementos, verifica-se que a recorrente não demonstrou ter sido afectada pelo regulamento controvertido devido a qualidades que lhe são específicas ou a uma situação de facto que a caracteriza em relação a qualquer outro PTU.

113 Não tendo demonstrado que o regulamento controvertido lhe dizia individualmente respeito, é assim inútil examinar se o mesmo lhe diz directamente respeito.

114 Do que precede resulta que a recorrente não pode ser considerada uma «pessoa interessada» na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça. Proponho assim que o seu recurso seja julgado inadmissível.

115 Fica assim sem objecto o exame em sede de mérito.

IV - Fundamentos e pretensões do Governo neerlandês no processo C-301/97

116 O Governo neerlandês invoca sete fundamentos em apoio do seu recurso, assentes em:

- violação do princípio da segurança jurídica; - violação das regras do GATT;

- violação do artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU;

- violação do artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU;

- existência de um desvio de poder;

- violação do processo de revisão das medidas de protecção do anexo IV da decisão PTU, e por fim

- violação do artigo 190._ do Tratado CE (actual artigo 253._ CE).

V - Discussão

Quanto ao primeiro fundamento assente na violação do princípio da segurança jurídica

Argumentos

117 Com este primeiro fundamento, o Governo neerlandês sustenta que o Conselho violou o princípio da segurança jurídica ao não determinar a situação jurídica das empresas interessadas e dos PTU depois do esgotamento do contingente pautal previsto no artigo 1._ do regulamento impugnado. Em sua opinião, esta precisão era necessária na medida em que seriam assim possíveis duas situações jurídicas diametralmente opostas. Numa primeira hipótese, uma vez esgotado o contingente, os PTU ficariam privados do direito à importação de arroz na Comunidade; numa segunda hipótese, a importação de arroz seria possível, mas apenas se fossem pagos os direitos aduaneiros relativos a essa operação. Esta incerteza seria incompatível com o princípio da segurança jurídica.

118 O Conselho, a Comissão e os Governos espanhol e italiano contestam tal alegação.

Apreciação

119 O princípio da segurança jurídica constitui um princípio fundamental do direito comunitário (56), que exige nomeadamente que uma regulamentação que impõe encargos aos seus destinatários seja clara e precisa, a fim de que estes possam conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações (57).

120 No caso sub judice, quanto à situação jurídica dos operadores económicos abrangidos quando do esgotamento do contingente pautal, ou seja, os exportadores de arroz originário dos PTU, o sentido do regulamento controvertido e as consequências da sua aplicação são inequívocos se bem que as consequências não sejam expressamente enunciadas.

121 Com efeito, o artigo 1._ do regulamento controvertido limita a quantidade do arroz originário dos PTU do código NC 1006 (58) que pode ser importada com isenção dos direitos aduaneiros, mas não tem por objecto proibir as importações de mercadorias originárias dos PTU. A imposição de um contingente pautal significa necessariamente a contrario que toda e qualquer quantidade de produto para além do contingente fica sujeita aos direitos aduaneiros normalmente aplicáveis.

122 A leitura desta disposição é confirmada pelo objectivo do regulamento controvertido, conforme precisado no seu preâmbulo. O regulamento tem em vista obviar às perturbações verificadas no mercado do arroz comunitário, causadas pela importação em massa de arroz originário dos PTU. Para tal, o legislador comunitário adoptou medidas de protecção, em conformidade com o disposto na decisão PTU. Estas medidas consistem numa limitação das importações do arroz originário dos PTU com isenção dos direitos aduaneiros, mas não numa proibição destas importações. Uma medida que proibisse toda e qualquer importação de mercadorias originárias dos PTU na Comunidade seria aliás contrária às disposições do artigo 131._ do Tratado. Com efeito, este artigo prevê que a associação se destina a estabelecer relações económicas estreitas entre os PTU e a Comunidade. Ora, uma proibição das importações de mercadorias originárias dos PTU violaria o artigo 131._ do Tratado e o artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU que prevê que a medida de protecção escolhida deve respeitar o princípio da proporcionalidade.

123 No acórdão Emesa Sugar (59), já referido, o Tribunal de Justiça confirmou esta interpretação e declarou que a introdução de uma medida de protecção como um contingente pautal significa que «os produtos em causa só podem ser importados para além do contingente mediante pagamento dos direitos aduaneiros».

124 Em consequência, contrariamente ao alegado pelo Governo neerlandês, o Conselho não violou o princípio da segurança jurídica ao não indicar expressamente a situação jurídica das empresas interessadas e dos PTU depois do esgotamento do contingente pautal previsto pelo artigo 1._ do regulamento impugnado. Assim, a primeira parte do primeiro fundamento é improcedente.

Quanto ao segundo fundamento assente na violação do artigo 7._, n._ 5, do Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda

Argumentos

125 O Governo neerlandês sustenta que o Conselho violou o disposto no artigo 7._, n._ 5, do Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda ao adoptar o Regulamento n._ 1036/97 no decurso de um período de dois anos depois do termo do Regulamento n._ 304/97.

126 Em sua opinião, o artigo 7._, n._ 5, do Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda, que enuncia uma obrigação clara, precisa e incondicional, tem efeito directo.

127 Além disso, seria aplicável às relações entre a Comunidade e os PTU visto que estes últimos são considerados países terceiros no que diz respeito ao Acordo que institui a OMC (60).

Apreciação

128 A questão de saber se os acordos concluídos no quadro do GATT 1994 figuram entre as normas ao abrigo das quais o Tribunal de Justiça deve fiscalizar a legalidade dos actos comunitários foi decidida pelo acórdão de 23 de Novembro de 1999, Portugal/Conselho (61).

129 Nesse processo, a República Portuguesa pedia a anulação da Decisão 96/386/CE do Conselho, de 26 de Fevereiro de 1996, relativa à celebração de memorandos de acordo entre a Comunidade Europeia e a República Islâmica do Paquistão e entre a Comunidade Europeia e a República da Índia sobre acordos em matéria de acesso de produtos têxteis ao mercado (62), porque a mesma violava certas normas e princípios fundamentais da OMC, nomeadamente os do GATT.

130 O Tribunal de Justiça não se baseou na existência ou na ausência de efeito directo das disposições dos acordos, mas numa análise da situação específica criada na ordem internacional pela execução destes acordos.

131 O Tribunal de Justiça assinalou que cabe a cada uma das partes num acordo determinar os meios jurídicos adequados para garantir a integral execução dos seus compromissos, salvo se o acordo, interpretado à luz do seu objecto e da sua finalidade, especificar ele próprio esses meios.

132 Quanto aos meios na ordem comunitária, a única consideração que na realidade o Tribunal de Justiça considera pertinente é a reciprocidade na execução do acordo. O Tribunal de Justiça assinalou que os órgãos jurisdicionais dos parceiros comerciais mais importantes da Comunidade não fiscalizam a legalidade das normas de direito interno à luz dos acordos OMC e portanto que a condição de reciprocidade não se encontra, de modo geral, satisfeita.

133 Assim, o Tribunal de Justiça deduziu daí que, «tendo em atenção a sua natureza e a sua economia, os acordos OMC não figuram, em princípio, entre as normas tomadas em conta pelo Tribunal de Justiça para fiscalizar a legalidade dos actos das instituições comunitárias» (63).

134 Além disso, o Tribunal de Justiça precisou que «[s]ó no caso de a Comunidade ter decidido cumprir uma obrigação determinada assumida no quadro da OMC ou de o acto comunitário remeter, de modo expresso, para disposições precisas dos acordos OMC, é que compete ao Tribunal de Justiça fiscalizar a legalidade do acto comunitário em causa à luz das regras da OMC» (64).

135 No presente caso, é manifesto que o regulamento controvertido tem por objecto aplicar o artigo 109._ da decisão PTU e não se destina a garantir a execução na ordem jurídica comunitária de uma obrigação específica assumida no âmbito da OMC, como também não remete expressamente para disposições precisas dos acordos OMC.

136 Assim, em conformidade com a jurisprudência Portugal/Conselho, já referida, convido o Tribunal de Justiça a declarar que o Reino dos Países Baixos não tem razão quando sustenta que o regulamento impugnado foi adoptado em violação de determinadas regras e de certos princípios fundamentais da OMC e nomeadamente do artigo 7._, n._ 5, do Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda.

Quanto ao terceiro fundamento assente na violação do artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU

Este fundamento decompõe-se em duas partes.

Primeira parte do terceiro fundamento

Argumentos

137 Com a primeira parte deste fundamento, o Governo neerlandês sustenta que resulta das disposições do artigo 132._ do Tratado que os benefícios atribuídos aos PTU no âmbito da realização por etapas da associação já não podem ser postos em causa por razões relacionadas com as quantidades ou o nível dos preços dos produtos importados dos PTU.

138 O Governo neerlandês sublinha que a decisão PTU visa, nos termos do artigo 131._ do Tratado, promover o desenvolvimento económico e social dos PTU e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade. Em conformidade com o artigo 133._ do Tratado, a eliminação total dos direitos aduaneiros em benefício das mercadorias originárias dos PTU à sua entrada nos Estados-Membros constitui um dos instrumentos que permitem alcançar os objectivos atrás enunciados.

139 Em sua opinião, a realização destes objectivos pressupõe que o volume ou os preços dos produtos originários dos PTU não podem justificar a adopção de medidas de protecção. Se se admitisse que tais motivos podiam justificar a adopção de tais medidas, a realização das finalidades do regime dos PTU, entre as quais figura, de acordo com o artigo 3._, alínea r), do Tratado, o incremento das trocas comerciais, ficaria irremediavelmente comprometida. As medidas de protecção teriam assim por efeito reduzir a zero o desenvolvimento natural das trocas comerciais que constitui o objectivo do Tratado.

140 O Governo neerlandês admite que podem ser adoptadas medidas de protecção, mas unicamente para fazer face a problemas imprevisíveis ou quando estejam satisfeitas as condições enunciadas no artigo 134._ do Tratado. Decidir em sentido contrário equivaleria a pôr em causa o princípio da liberalização das trocas comerciais entre a Comunidade e os PTU.

141 O Conselho, a Comissão e os Governos espanhol e italiano contestam os argumentos do Governo neerlandês.

Apreciação

142 Quando da apreciação do recurso do Governo neerlandês no processo C-110/97, propus ao Tribunal que rejeitasse este fundamento por improcedente (65). Sendo os argumentos desenvolvidos pelo Governo neerlandês em apoio da primeira parte deste terceiro fundamento estritamente idênticos aos enunciados no processo C-110/97, remeto para o que então foi exposto (66).

143 Proponho ao Tribunal de Justiça que, em conformidade com os motivos no processo C-110/97, declare que, contrariamente ao que o Governo neerlandês defende, o artigo 132._ do Tratado não pode ser interpretado no sentido de que os benefícios atribuídos aos PTU no quadro da realização por etapas da associação não podem ser postos em causa por razões relacionadas com as quantidades ou o nível dos preços dos produtos importados dos PTU. Assim, a primeira parte do terceiro fundamento é improcedente.

Segunda parte do terceiro fundamento

Argumentos

144 Com a segunda parte deste terceiro fundamento, o Governo neerlandês alega que o Conselho não demonstrou que a quantidade ou o nível dos preços do arroz originário dos PTU perturbaram ou correm o risco de perturbar de modo importante o mercado comunitário.

145 Segundo ele, a tese do Conselho segundo a qual as quantidades importadas de arroz proveniente dos PTU constituiriam sempre um factor de ameaça de perturbação do mercado comunitário do arroz é inexacta.

146 Alega a este respeito que a produção comunitária de arroz Indica não é suficiente para satisfazer as necessidades da Comunidade. Assinala que este défice estrutural existente em matéria de arroz Indica só pode ser compensado pelas importações de arroz originário dos PTU. Acrescenta que a adesão do Reino da Suécia, da República da Finlândia e da República da Áustria à União Europeia veio agravar uma situação já de si delicada.

147 O Governo neerlandês contesta além disso a existência de um nexo causal entre as importações de arroz originário dos PTU e a perturbação iminente do mercado comunitário. Afirma que a perturbação verificada no mercado comunitário tem a sua causa nas importações em massa de arroz originário de países terceiros, nomeadamente dos Estados Unidos da América e do Egipto, tornadas possíveis pelo Regulamento (CE) n._ 1522/96 do Conselho, de 24 de Julho de 1996, relativo à abertura e modo de gestão de determinados contingentes pautais de importação de arroz e de trincas de arroz (67).

148 Por último, no que respeita ao preço pretensamente inferior do arroz originário dos PTU relativamente ao preço do arroz comunitário, fundando-se nos elementos já adiantados no processo C-110/97, o Governo neerlandês alega que o preço do arroz PTU é manifestamente mais elevado que o do arroz comunitário.

Apreciação

149 Cabe assinalar que, no presente processo, o Governo neerlandês reproduz fielmente os argumentos aduzidos no processo C-110/97. Além disso, para apoiar a sua demonstração, retoma os mesmo elementos factuais que os adiantados no referido processo (68).

150 No processo C-110/97 desenvolvi amplamente por que motivos considero não ter sido produzida pelo Governo neerlandês a prova de um erro manifesto de apreciação cometido pelo Conselho (69).

151 Assim, proponho que o Tribunal de Justiça declare que não foi produzida prova de um erro manifesto de apreciação cometido pelo Conselho na aplicação do artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU. Assim, a segunda parte do terceiro fundamento deve por este motivo ser considerada improcedente.

Quanto ao quarto fundamento assente na violação do artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU

Este fundamento decompõe-se em cinco partes a examinar sucessivamente.

Primeira parte do quarto fundamento

Argumentos

152 Com a primeira parte do quarto fundamento, o Governo neerlandês pretende que o Conselho não respeitou a ordem de preferência do regime de associação CE/PTU/ACP/países terceiros instaurada pelo Tratado, porque o regulamento impugnado torna o arroz PTU mais caro que o arroz proveniente de países terceiros ou dos Estados ACP.

153 A este respeito, o Governo neerlandês alega que a Comunidade limitava a importação de arroz equivalente descascado sem direitos aduaneiros em proveniência dos PTU a 69 610 toneladas durante o período compreendido entre 1 de Maio e 30 de Novembro de 1997 inclusive, ao passo que em paralelo, durante este mesmo período, a aplicação do Regulamento n._ 1522/96 permitia uma importação muito superior de arroz originário de países terceiros.

154 Ao agir deste modo, em sua opinião, o Conselho teria colocado os PTU numa posição económica desfavorável em relação aos países terceiros. Daí o Governo neerlandês conclui assim que a ordem de preferência CE/PTU/ACP/países terceiros prevista pelo regime especial de associação da quarta parte do Tratado (70) foi violada.

Apreciação

155 Na medida em que o Governo neerlandês invoca os mesmos argumentos de facto (71) e de direito que no processo C-110/97, convido o Tribunal de Justiça a ter em conta os meus desenvolvimentos precedentes (72).

156 Em conformidade com as razões que expus quando do processo C-110/97, concluo que a aplicação do Regulamento n._ 1036/97 não colocou os países ACP e os países terceiros numa posição concorrencial manifestamente mais vantajosa que a dos PTU.

Segunda parte do quarto fundamento

Argumentos

157 Com a segunda parte deste quarto fundamento, o Governo neerlandês sustenta que o Conselho não examinou se as medidas de protecção adoptadas podiam ter efeitos negativos na economia das Antilhas Neerlandesas e de Aruba.

158 A este respeito, o Governo neerlandês afirma saber de modo oficial que, mesmo antes da reunião do comité competente, conforme o disposto no anexo IV da decisão PTU (73), realizada em 11 de Abril de 1997, a Comissão tinha já adoptado a sua decisão de instaurar novas medidas de protecção no termo das previstas pelo Regulamento n._ 304/97.

159 O Governo neerlandês indica que a prova do que afirma pode ser encontrada no relatório do grupo de trabalho do Conselho de 27 de Maio de 1997 (74).

Apreciação

160 Como no processo C-110/97 (75), o Governo neerlandês não acompanhou as suas afirmações de qualquer elemento probatório (76).

161 Assim, a segunda parte do quarto fundamento é improcedente.

Terceira parte do quarto fundamento

Argumentos

162 Nos termos da terceira parte deste fundamento, o recorrente alega que o Conselho violou o princípio da proporcionalidade ao escolher, como medida de protecção, um contingente pautal em vez de um preço mínimo.

163 A este respeito, alega que a escolha de um preço mínimo teria sido mais adequada para realizar o objectivo prosseguido pelo Conselho - ou seja, evitar a produção excessiva de arroz originário das Antilhas Neerlandesas (77) e permitir compensar o défice de produção do arroz Indica no mercado comunitário. Além disso, o Governo neerlandês indica que a instauração de um preço mínimo teria evitado às empresas afectadas terem de cessar completamente as suas exportações de arroz para a Comunidade.

Apreciação

164 No processo C-110/97 desenvolvi as razões pelas quais considero que o Governo neerlandês não fez prova de um erro manifesto de apreciação cometido pelo Conselho (78). Na medida em que o Governo neerlandês invoca os mesmos elementos factuais e jurídicos convido o Tribunal de Justiça a reportar-se às minhas considerações anteriores (79).

165 Além disso, como já indiquei (80), a instauração das medidas controvertidas não proíbe de forma alguma a exportação de arroz antilhense para a Comunidade uma vez esgotado o contingente. Assim, a crítica assente na instauração de uma medida de proibição das exportações de arroz para a Comunidade em detrimento das empresas das Antilhas Neerlandesas carece de fundamento.

166 Em consequência, considero que o Governo neerlandês não prova que a instauração de um preço mínimo teria implicado menos perturbações para a economia dos PTU, e nomeadamente das Antilhas Neerlandesas e de Aruba, e teria sido igualmente eficaz para alcançar os objectivos prosseguidos pelo legislador comunitário como a medida criticada.

167 Resulta das considerações anteriores que a terceira parte do quarto fundamento é improcedente.

Quarta parte do quarto fundamento

Argumentos

168 Através da quarta parte deste fundamento, o recorrente considera que o regulamento impugnado viola o artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU na medida em que o montante da garantia pedida aos importadores torna inaplicável a legislação relativa às modalidades especiais de aplicação do regime dos certificados de importação no sector do arroz (81).

169 Em apoio deste fundamento, o Governo neerlandês alega que o montante da garantia pedida não é proporcionado ao objectivo prosseguido pela decisão PTU. Considera, com efeito, que é anormal que o montante da garantia aplicável às importações provenientes dos PTU seja igual aos direitos aduaneiros aplicáveis aos países terceiros.

Apreciação

170 Os argumentos adiantados em apoio da quarta parte deste quarto fundamento são idênticos aos desenvolvidos pelo Governo neerlandês no processo C-110/97.

171 Assim, pelas razões desenvolvidas no processo C-110/97 (82), concluo que o Governo neerlandês não provou que o Conselho, ao adoptar a medida controvertida, violou o princípio da proporcionalidade. Proponho, assim, que o Tribunal de Justiça declare a quarta parte do quarto fundamento improcedente.

Quinta parte do quarto fundamento

Argumentos

172 Por fim, com a quinta e última parte do quarto fundamento, o Governo neerlandês sustenta que o Conselho violou o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU, na medida em que, ao adoptar sucessivamente os Regulamentos n.os 304/97 e 1036/97, as suas acções já não podiam ser consideradas excepcionais e temporárias.

Apreciação

173 Recorde-se que, em conformidade com uma jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (83), no quadro da aplicação das disposições do artigo 109._ da decisão PTU, o Conselho dispõe de um amplo poder de apreciação. Só o carácter manifestamente inadequado de uma medida em relação ao objectivo prosseguido pode afectar a legalidade de tal medida (84).

174 A Comissão decidiu prorrogar os efeitos das primeiras medidas de protecção adoptadas pelo Regulamento n._ 304/97 depois de ter verificado a existências de graves perturbações no mercado comunitário do arroz. Ora, não foi feita prova de que não estavam reunidas as condições de fundo exigidas para a adopção do regulamento controvertido. Assim, a Comissão não pode ser criticada por ter sido diligente tomando as medidas necessárias ao bom funcionamento da política agrícola comum.

175 A crítica assente no respeito do carácter excepcional destas novas medidas não me parece, no caso sub judice, procedente. Com efeito, o Governo neerlandês não provou que, nesta fase, as instituições comunitárias tinham por hábito resolver os desequilíbrios verificados no mercado comunitário do arroz adoptando sucessivamente regulamentos destinados a limitar as importações do arroz originário dos PTU (85). Em contrapartida, perante uma sucessão de regulamentos visando essa limitação, também não se encontraria satisfeita a obrigação de as instituições comunitárias só excepcionalmente recorrerem a este tipo de medidas.

176 De igual modo, sendo as medidas introduzidas pelo Regulamento n._ 1036/97 limitadas no tempo, não se pode considerar que as acções do Conselho não são temporárias.

177 Sugiro, por conseguinte, que o Tribunal de Justiça declare improcedente a quinta parte do quarto fundamento.

178 Resulta das considerações anteriores que o quarto fundamento assente na violação do artigo 109._, n._ 2, da decisão PTU deve ser julgado improcedente.

Quanto ao quinto fundamento assente em desvio de poder

Argumentos

179 Com o seu quinto fundamento, o Governo neerlandês considera que o Conselho e a Comissão cometeram um desvio de poder na medida em que usaram as competências que lhe são atribuídas pelo artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU para fins diversos daqueles para que as mesmas foram atribuídas.

180 Segundo o Governo neerlandês, é manifesto que, com a adopção destas medidas de protecção sucessivas, a Comissão e o Conselho pretendiam restringir as importações de arroz originário dos PTU. Por esta razão, deviam ter recorrido ao processo de revisão da decisão PTU. Todavia, para chegar à revisão desejada, é exigido o acordo unânime dos Estados-Membros, incluindo, necessariamente, o do Reino dos Países Baixos. O recurso às medidas de protecção previstas pelo artigo 109._, n._ 1, da decisão PTU teria assim sido utilizado onde se impunha o recurso à revisão da decisão PTU.

Apreciação

181 Os argumentos adiantados em apoio deste quinto fundamento são idênticos aos desenvolvidos pelo Governo neerlandês no processo C-110/97.

182 Pelas razões que desenvolvi quando da análise do processo C-110/97 (86), concluo que o Governo neerlandês não provou que o Conselho, ao adoptar a medida controvertida, cometeu um desvio de poder. Proponho, assim, que o quinto fundamento seja julgado improcedente.

Quanto ao sexto fundamento assente na violação do processo de revisão das medidas de protecção previsto pelo anexo IV da decisão PTU

183 Em apoio deste fundamento, o Governo neerlandês alega que o Conselho não consultou o comité conforme imposto pelo artigo 1._, n._ 2, do anexo IV da decisão PTU. Considera, além disso, que o Conselho e a Comissão não ouviram as Antilhas Neerlandesas e Aruba sobre a medida prevista. Por fim, pretende que o artigo 1._, n._ 7, do anexo IV da decisão PTU foi violado. Examinarei sucessivamente as três partes deste fundamento.

Primeira parte do sexto fundamento

Argumentos

184 Com a primeira parte do sexto fundamento, o Governo neerlandês considera que o anexo IV da decisão PTU foi violado na medida em que o comité não foi consultado em conformidade com o processo previsto no artigo 1._, n._ 2, desse anexo. Este artigo dispõe que «[q]uando, a pedido de um Estado-Membro ou por iniciativa própria, a Comissão considerar que é conveniente aplicar medidas de protecção em conformidade com o artigo 109._ da decisão:

[...]

- consultará um comité constituído por representantes dos Estados-Membros e presidido por um representante da Comissão».

185 Indica que, para a consulta dos Estados-Membros no contexto deste anexo, o comité aprovou, em 11 de Janeiro de 1993, um regulamento interno (87). Observa que o artigo 3._, primeiro parágrafo, deste regulamento interno dispõe que «[a] convocatória, a ordem do dia, bem como os documentos de trabalho são transmitidos pelo presidente aos membros do comité de acordo com o processo previsto no artigo 8._, segundo parágrafo: estes documentos incluem nomeadamente a documentação recebida do Estado-Membro que pediu à Comissão a aplicação de medidas de protecção».

186 Defende que, no caso sub judice, a reunião do comité, de 11 de Abril de 1997, realizou-se em violação do artigo 3._ do regulamento interno na medida em que, quando da sua convocatória, por carta de 4 de Abril de 1997, não foi fornecida qualquer documentação ao Governo neerlandês. Considera que o artigo 3._ do regulamento interno serve precisamente para permitir informar previamente os Estados-Membros do pedido de medidas de protecção, da opinião provisória da Comissão quanto à sua razoabilidade e das modalidades das medidas previstas. Declara que só dispondo destas informações é que os Estados-Membros podem cumprir adequadamente a tarefa que lhes é imposta pelo anexo IV da decisão PTU.

187 O Conselho e a Comissão respondem que foi por sua própria iniciativa, e não a pedido de um Estado-Membro, que a Comissão convocou o comité. Afirmam que a crítica feita pelo recorrente carece assim de fundamento jurídico. Alegam, além disso, que os números sobre a situação em que se encontrava o sector comunitário do arroz foram efectivamente fornecidos durante a reunião de 11 de Abril, e que o Reino dos Países Baixos não submeteu o regulamento da Comissão à apreciação do Conselho nos termos do artigo 1._, n._ 5, do anexo IV da decisão PTU, nem fez menção, quando do exame do regulamento pelo Conselho, de qualquer erro processual eventualmente cometido durante o iter da Comissão.

Apreciação

188 Resulta da sistemática das disposições relativas ao comité que a consulta deste órgão tem por finalidade permitir aos seus membros conhecer a opinião das instituições comunitárias sobre a necessidade de adoptar medidas de protecção e os elementos factuais em que as mesmas se fundam. Resulta expressamente do preâmbulo do Regulamento n._ 764/97 que a Comissão decidiu proceder à adopção de novas medidas tendo em conta a situação no mercado comunitário do arroz (88). Ora, os dados estatísticos sobre a situação do sector em causa foram fornecidos ao comité e a inexactidão dos mesmos não foi demonstrada.

189 É um facto que a documentação entregue pelo Governo italiano não foi transmitida ao comité. No entanto, não foi demonstrado que tal elemento tivesse sido susceptível de melhor esclarecer o comité sobre as intenções da Comissão e sobre os elementos de facto na sua origem.

190 Resulta do que precede que a primeira crítica em apoio do sexto fundamento é improcedente.

Segunda parte do sexto fundamento

Argumentos

191 Com a segunda parte do sexto fundamento, o Governo neerlandês considera que o processo através do qual a Comissão decidiu medidas de protecção não se desenrolou em conformidade com o direito comunitário na medida em que a Comissão não ouviu os PTU ou, pelo menos, as Antilhas Neerlandesas e Aruba sobre a medida de protecção prevista. Alega que o Conselho também não o fez quando o Regulamento n._ 1036/97 foi introduzido. Em sua opinião, embora esta exigência não conste já expressamente do anexo IV da decisão PTU, as normas processuais devem ser interpretadas de modo a tornar o anexo IV da decisão PTU conforme ao princípio do contraditório, que faz parte dos princípios gerais do direito comunitário.

192 A Comissão considera que a alegação relativa à pretensa violação do artigo 1._, n._ 2, do anexo IV da decisão PTU é inadmissível. Esta crítica deve ser considerada um novo fundamento adiantado na fase da réplica, o que não é permitido nesta fase da instância em conformidade com o artigo 42._, n._ 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

193 A Comissão sustenta, além disso, que esta alegação carece de fundamento. Com efeito, as Antilhas Neerlandesas foram ouvidas, a seu pedido, durante uma reunião de concertação de parceria.

Apreciação

194 Contrariamente à Comissão, não penso que haja que declarar a segunda parte do sexto fundamento inadmissível.

195 A alegação relativa à pretensa violação do artigo 1._, n._ 2, do anexo IV da decisão PTU não constitui, em minha opinião, um fundamento novo adiantado na fase na réplica proibido nesta fase da instância pelo artigo 42._, n._ 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, mas sim um argumento novo em apoio de um fundamento já suscitado na fase do pedido inicial, ou seja, a violação do processo de revisão previsto pelas disposições do anexo IV da decisão PTU.

196 O argumento e o fundamento são dois conceitos jurídicos distintos (89). Este novo argumento em nada modifica o objecto do litígio, constituindo apenas o desenvolvimento de um dos fundamentos jurídicos enunciados pelo recorrente desde o início da instância. Os direitos da defesa não foram, assim, violados.

197 Quanto ao mérito, considero que a segunda parte deste fundamento é improcedente.

198 Com efeito, contrariamente às alegações do Governo neerlandês, parece que os PTU, e nomeadamente as Antilhas Neerlandesas e Aruba, foram consultados sobre as medidas previstas (90).

199 Do que precede resulta que a segunda parte deste sexto fundamento é improcedente.

Terceira parte do sexto fundamento

Argumentos

200 Com a terceira parte deste fundamento, o Governo neerlandês pretende que o artigo 1._, n._ 7, do anexo IV da decisão PTU foi violado.

201 Este artigo prevê a possibilidade de o Conselho tomar uma decisão diferente se um Estado-Membro submeter a decisão da Comissão à apreciação do Conselho.

202 O Governo neerlandês alega que a natureza do processo de revisão do anexo IV implica que, se bem que o Conselho não seja obrigado a tomar uma nova decisão, deve, se decidir fazê-lo, proceder de modo autónomo ao exame exigido e às verificações necessárias. Sustenta que, no caso vertente, o Conselho não o fez. O Governo neerlandês considera que o Conselho se baseou apenas nas afirmações da Comissão segundo as quais as condições constantes do artigo 109._ da decisão PTU se encontravam satisfeitas, mas que não dispunha de elementos permitindo-lhe controlar a exactidão de tais conclusões.

203 Pretende, além disso, que o regulamento controvertido violou o princípio de não retroactividade previsto no artigo 1._, n._ 4, do anexo IV da decisão PTU.

Apreciação

204 Os argumentos avançados em apoio da terceira parte deste sexto fundamento são idênticos aos desenvolvidos pelo Governo neerlandês no processo C-110/97 (91).

205 Assim, pelos motivos que desenvolvi no exame do processo C-110/97 (92), concluo que o Governo neerlandês não provou que o Conselho, ao adoptar a medida controvertida, violou o processo de revisão das medidas de protecção previsto pelo anexo IV da decisão PTU. Proponho, assim, que se declare o sexto fundamento improcedente.

Quanto ao sétimo fundamento assente na violação do artigo 190._ do Tratado

206 Com este sétimo e último fundamento, o Governo neerlandês considera que o Regulamento n._ 1036/97 não foi devidamente fundamentado como imposto pelo artigo 190._ do Tratado.

Argumentos

207 A este respeito, o Governo neerlandês alega que a fundamentação do regulamento controvertido consiste apenas em generalidades enunciadas em termos de tal modo abstractos que são quase sempre exactos independentemente dos factos que ocorreram e que não basta para justificar uma medida específica de protecção.

208 O Governo neerlandês afirma que as falhas da fundamentação não podem ser compensadas pelo facto de que, envolvido na execução da decisão impugnada, teria disposto de informações que lhe teriam permitido sanar ele próprio as lacunas de fundamentação.

Apreciação

209 Já examinei as exigências da jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de respeito das disposições do artigo 190._ do Tratado em processos similares (93). Resumindo, segundo o Tribunal de Justiça, a fundamentação deve pôr em evidência de modo claro e inequívoco o raciocínio da autoridade comunitária, autora do acto, de modo a permitir que os interessados conheçam as justificações da medida tomada e ao Tribunal de Justiça exercer o seu controlo (94).

210 Num caso similar (95), o Tribunal de Justiça julgou que «compete ao Conselho apreciar se, em função dos resultados conseguidos com a aplicação da regulamentação que edita, há que alterar certos elementos. Assim, contrariamente ao que defende o Governo recorrente, o Conselho não era obrigado a apresentar na fundamentação uma evolução das circunstâncias que levaram à fixação do primeiro contingente» (96). O Tribunal de Justiça sublinhou igualmente que «tendo o Conselho apresentado os objectivos prosseguidos, não tinha que justificar as escolhas técnicas efectuadas, e nomeadamente a importância do aumento do contingente controvertido» (97).

211 No presente caso, há que assinalar que o regulamento controvertido é um acto de aplicação geral e que o mesmo se insere numa série de regulamentos adoptados pelas instituições comunitárias a fim de executar e conciliar duas políticas complexas, a prosseguida pela política agrícola comum no mercado do arroz e a prosseguida pela política económica elaborada no quadro do regime de associação com os PTU.

212 Além disso, os fundamentos do regulamento controvertido precisam a situação de conjunto que levou à sua adopção.

Assim, é indicado no segundo considerando que as perturbações graves no mercado comunitário do arroz e o risco de perturbação importante deste sector de actividade continuam a persistir apesar da adopção das medidas de protecção anteriormente adoptadas. É além disso explicado que o mercado comunitário do arroz se caracteriza por uma situação frágil provocada por anos de seca durante as campanhas de 1994/1995 e 1995/1996 e por uma produção deficitária em matéria de arroz Indica (98).

213 Os fundamentos do regulamento controvertido revelam igualmente os objectivos gerais que o mesmo se propõe alcançar.

É nomeadamente afirmado que as perturbações verificadas no mercado comunitário do arroz Indica provocadas pelas importações de arroz originário dos PTU correm o risco de pôr em causa os esforços desenvolvidos pelo legislador comunitário consistentes em incitar, através de medidas de ajuda temporária ao hectare, os agricultores comunitários a produzirem arroz Indica (99) e que há assim que adoptar medidas de protecção para evitar que estas perturbações se agravem e que fiquem comprometidos os esforços de reconversão da política agrícola comum no domínio do arroz.

214 Há que concluir que o Conselho pôs em evidência de forma clara e inequívoca o raciocínio que seguiu para a adopção do regulamento controvertido.

215 Daqui resulta que este último fundamento deve ser rejeitado.

Conclusão

216 Pelas razões expostas, proponho ao Tribunal de Justiça:

1) No processo C-301/97

- negar provimento ao recurso;

- condenar o Reino dos Países Baixos a suportar as suas próprias despesas bem como as do Conselho da União Europeia;

- declarar que o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana e a Comissão das Comunidades Europeias suportarão as suas próprias despesas.

2) No processo C-452/98

- julgar o recurso inadmissível;

- condenar as Nederlandse Antillen a suportar as suas próprias despesas bem como as do Conselho da União Europeia;

- declarar que o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana, o Reino dos Países Baixos e a Comissão Europeia suportarão as suas próprias despesas.

(1) - A seguir «recorrente» ou «Antilhas Neerlandesas».

(2) - JO L 151, p. 8 (a seguir também «regulamento controvertido» ou «regulamento impugnado»).

(3) - JO L 263, p. 1 (a seguir «decisão PTU»).

(4) - Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994) (JO L 336, p. 1, a seguir «GATT 1994»).

(5) - Negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994) - anexo 1 - anexo 1 A - Acordo sobre as Medidas de Salvaguarda (OMC-GATT 1994) (JO L 336, p. 184).

(6) - A seguir «OMC».

(7) - Regulamento da Comissão, de 23 de Abril de 1997, que instaura medidas de protecção relativas à importação de arroz originário dos países e territórios ultramarinos (JO L 112, p. 3).

(8) - Regulamento do Conselho, de 17 de Fevereiro de 1997, que instaura medidas de protecção relativamente à importação de arroz originário dos países e territórios ultramarinos (JO L 51, p. 1). Este regulamento foi objecto de dois recursos de anulação que examinei e relativamente aos quais foram hoje apresentadas conclusões comuns (processos C-110/97 e C-451/98).

(9) - Também denominado «arroz descascado», «arroz cargo» ou «arroz integral».

(10) - Também denominado «arroz parcialmente polido».

(11) - Também denominado «arroz polido».

(12) - A seguir «declaração».

(13) - Ponto 26 da réplica da recorrente.

(14) - A título de exemplo, recorda que, em 6 de Outubro de 1997, o Reino dos Países Baixos aprovou a alteração da decisão PTU que limita a importação de arroz antilhense a 160 000 toneladas por ano contra a vontade expressa das Antilhas Neerlandesas.

(15) - C-70/88, Colect., p. I-2041.

(16) - Réplica, ponto 24.

(17) - Que define o regime de associação dos PTU.

(18) - T-32/98 e T-41/98, Colect., p. II-201.

(19) - Tratava-se de um recurso de anulação de dois regulamentos da Comissão instaurando medidas de protecção específicas destinadas a restringir as importações de arroz originário dos PTU, do código NC 1006.

(20) - Este parágrafo dispõe que «[o] Tribunal de Justiça fiscaliza a legalidade dos actos adoptados em conjunto pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, dos actos do Conselho, da Comissão e do BCE, que não sejam recomendações ou pareceres, e dos actos do Parlamento Europeu destinados a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros».

(21) - Que prevê que «[para] o efeito, o Tribunal de Justiça é competente para conhecer dos recursos com fundamento em incompetência, violação de formalidades essenciais, violação do presente Tratado ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação, ou em desvio de poder, interpostos por um Estado-Membro, pelo Conselho ou pela Comissão».

(22) - Que indica que «[o] Tribunal de Justiça é competente, nas mesmas condições, para conhecer dos recursos interpostos pelo Parlamento Europeu e pelo Banco Central Europeu com o objectivo de salvaguardar as respectivas prerrogativas».

(23) - Este parágrafo prevê que «[q]ualquer pessoa singular ou colectiva pode interpor, nas mesmas condições, recurso das decisões de que seja destinatária e das decisões que, embora tomadas sob a forma de regulamento ou de decisão dirigida a outra pessoa, lhe digam directa e individualmente respeito».

(24) - Neste sentido, v. Canedo, M., «L'intérêt à agir dans le recours en annulation du droit communautaire», Revue trimestrielle de droit européen, juillet-septembre 2000, p. 451.

(25) - V., nomeadamente, acórdãos de 15 de Setembro de 1994, KYDEP/Conselho e Comissão (C-146/91, Colect., p. I-4199, n._ 30); de 11 de Agosto de 1995, Comissão/Alemanha (C-431/92, Colect., p. I-2189, n.os 21 e 22); e de 21 de Janeiro de 1999, Comissão/Bélgica (C-207/97, Colect., p. I-275, n._ 24).

(26) - V., nomeadamente, despachos do Tribunal de Justiça de 21 de Março de 1997, Région Wallone/Comissão (C-95/97, Colect., p. I-1787, n._ 6), e de 1 de Outubro de 1997, Regione Toscana/Comissão (C-180/97, Colect., p. I-5245, n._ 6).

(27) - Ibidem.

(28) - C-17/98, Colect., p. I-675.

(29) - Ibidem, n._ 29.

(30) - Em aplicação desta jurisprudência, o Tribunal de Primeira Instância julgou recentemente, no âmbito de um recurso de anulação interposto pelo Governo das Antilhas Neerlandesas contra um regulamento da Comissão instaurando medidas de protecção à importação do arroz originário dos PTU, que as Antilhas Neerlandesas não podiam agir com fundamento no artigo 173._, segundo parágrafo, do Tratado (acórdão Nederlandse Antillen/Comissão, já referido, n._ 43).

(31) - V., nomeadamente, acórdão de 12 de Junho de 1990, Alemanha/Comissão (C-8/88, Colect., p. I-2321, n._ 13), ou ainda despacho Région Wallonne/Comissão, já referido, n._ 7.

(32) - Despacho Région Wallonne/Comissão, já referido, n._ 7.

(33) - Acórdão de 26 de Fevereiro de 1991, Antonissen (C-292/89, Colect., p. I-745, n._ 18).

(34) - V. artigos 131._ a 136._ do Tratado.

(35) - N.os 23 e 24.

(36) - Ibidem, n.os 25 a 27.

(37) - V., nomeadamente, acórdão de 6 de Outubro de 1982, Alusiusse Italia/Conselho e Comissão (307/81, Recueil, p. 3463, n._ 8).

(38) - V., nomeadamente, acórdão de 18 de Maio de 1994, Codorniu/Conselho (C-309/89, Colect., p. I-1853, n._ 19).

(39) - V. acórdãos de 15 de Julho de 1963, Plaumann/Comissão (25/62, Colect. 1962-1964, p. 279); de 17 de Janeiro de 1985, Piraiki-Patraiki e o./Comissão (11/82, Recueil, p. 207, n._ 11); e Codorniu/Conselho, já referido, n._ 20.

(40) - V., nomeadamente, acórdãos Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referido, n.os 17 e 28, e de 11 de Fevereiro de 1999, Antillean Rice Mills e o./Comissão (C-390/95 P, Colect., p. I-769, n._ 28).

(41) - Acórdão Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referido, n._ 28.

(42) - V., nomeadamente, acórdãos Plaumann/Comissão e Piraiki-Patraiki e o./Comissão, n._ 28, já referidos.

(43) - Acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, n.os 25 a 30.

(44) - T-480/93 e T-483/93, Colect., p. II-2305.

(45) - N._ 72.

(46) - Ibidem, n._ 73.

(47) - Ibidem, n._ 74.

(48) - Ibidem, n._ 76.

(49) - Ibidem, n._ 80.

(50) - N.os 55 a 57.

(51) - O sublinhado é nosso.

(52) - V. n.os 97 a 101 das presentes conclusões.

(53) - V., nomeadamente, despachos de 16 de Junho de 1998, Comunidad Autónoma de Cantabria/Conselho (T-238/97, Colect., p. II-2271, n.os 21 e 22), e de 23 de Outubro de 1998, Regione Puglia/Comissão e Espanha (T-609/97, Colect., p. II-4051, n.os 21 e 22).

(54) - Acórdão Nederlandse Antillen/Comissão, já referido, n._ 57.

(55) - V., por analogia, acórdão Plaumann/Comissão, já referido.

(56) - V., neste sentido, acórdão de 21 de Setembro de 1983, Deutsche Milchkontor e o. (205/82 a 215/82, Recueil, p. 2633).

(57) - V., nomeadamente, acórdãos de 9 de Julho de 1981, Gondrand Frères e Garancini (169/80, p. 1931); de 22 de Fevereiro de 1989, Comissão/França e Reino Unido (92/87 e 93/87, Colect., p. 405, n._ 22); e de 13 de Fevereiro de 1996, Van Es Douane Agenten (C-143/93, Colect., p. I-431, n._ 27).

(58) - Ou seja, o arroz semibranqueado originário dos PTU que beneficia da regra do cúmulo de origem.

(59) - N._ 45.

(60) - V., a este respeito, parecer 1/94, de 15 de Novembro de 1994 (Colect., p. I-5267).

(61) - C-149/96, Colect., p. I-8395.

(62) - JO L 153, p. 47.

(63) - Acórdão Portugal/Conselho, já referido, n._ 47.

(64) - Ibidem, n._ 49.

(65) - V. n.os 64 a 69 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(66) - Ibidem.

(67) - JO L 190, p. 1. Este regulamento foi adoptado na sequência dos acordos negociados ao abrigo do GATT.

(68) - V., a este respeito, os dados fornecidos pelo Reino dos Países Baixos no n._ 79 da sua petição.

(69) - V. n.os 83 a 103 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(70) - Evocada no acórdão ARM-1, n._ 142.

(71) - V. n.os 83 e 84 da sua petição.

(72) - V. n.os 112 a 115 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(73) - Nos termos do artigo 1._, n._ 2, do anexo IV da decisão PTU, esse comité é constituído por representantes dos Estados-Membros e presidido por um representante da Comissão. A sua missão é consultiva. A Comissão deve, com efeito, nos termos do n._ 3 do referido artigo, obter o seu parecer antes de adoptar as medidas de protecção. O seu parecer não vincula a Comissão.

(74) - N._ de documento 8498/97 (Limite, PTU 23, fin 173). V. n.os 89 e 114 da petição do Governo neerlandês.

(75) - V. n.os 120 a 122 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(76) - Assim, o relatório do grupo de trabalho do Conselho, de 27 de Maio de 1997, não figura entre os documentos submetidos à apreciação do Tribunal de Justiça.

(77) - Igualmente chamado «arroz antilhense».

(78) - N.os 129 a 134 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(79) - Ibidem.

(80) - N.os 119 a 124 das presentes conclusões.

(81) - Regulamento (CE) n._ 1162/95 da Comissão, de 23 de Maio de 1995, que estabelece normas de execução especiais do regime dos certificados de importação e de exportação no sector dos cereais e do arroz (JO L 117, p. 2).

(82) - N.os 139 a 143 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(83) - V. acórdãos Piraiki-Patraiki e o./Comissão, já referido, n._ 40, e Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, n._ 48.

(84) - V. acórdão Emesa Sugar, já referido, n._ 53.

(85) - Com efeito, o regulamento controvertido só constitui, recorde-se, a segunda medida de protecção.

(86) - N.os 146 a 150 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(87) - Comité consultivo sobre as medidas de protecção no âmbito da associação dos países e territórios ultramarinos (PTU) à Comunidade Europeia, relatório da reunião de 11 de Janeiro de 1993, VIII/112/93, de 13 de Janeiro de 1993.

(88) - Terceiro considerando.

(89) - V., nomeadamente, acórdão de 12 de Junho de 1958, Compagnie des Hauts Fourneaux de Chasse/Alta Autoridade (2/57, Recueil, p. 131, Colect. 1954-1961, p. 233): «o Tribunal julga ser necessário distinguir entre a apresentação de fundamentos novos no decurso da instância e, por outro lado, a apresentação de determinados novos argumentos. No presente caso, o Tribunal considera que a recorrente não apresentou fundamentos novos, tendo simplesmente desenvolvido os que constavam da sua petição recorrendo a um certo número de argumentos, os quais alguns foram apresentados pela primeira vez na réplica. Nestas condições, nada se opõe a que o Tribunal os examine». Para um acórdão mais recente, v., nomeadamente, acórdão de 29 de Maio de 1997, De Rijk/Comissão (C-153/96 P, Colect., p. I-2901, n._ 19).

(90) - Esta reunião realizou-se em 15 de Abril de 1997, como o Governo neerlandês precisa no n._ 46 da sua petição.

(91) - V. n.os 151 a 157 das minhas conclusões hoje apresentadas nesse processo.

(92) - Ibidem, n.os 158 a 165.

(93) - Ibidem, n.os 169 a 175.

(94) - V., nomeadamente, acórdão de 13 de Outubro de 1992, Portugal e Espanha/Conselho (C-63/90 e C-67/90, Colect., p. I-5073, n._ 16).

(95) - V. acórdão de 19 de Novembro de 1998, Espanha/Conselho (C-284/94, Colect., p. I-7309, n._ 30). Tratava-se de o Tribunal de Justiça apreciar se o Conselho, ao adoptar o Regulamento (CE) n._ 1921/94, de 25 de Julho de 1994, que altera o Regulamento (CE) n._ 519/94 relativo ao regime comum aplicável às importações de certos países terceiros (JO L 198, p. 1), não tinha violado o disposto no artigo 190._ do Tratado.

(96) - Ibidem, n._ 34.

(97) - Ibidem, n._ 35.

(98) - Sétimo e oitavo considerandos.

(99) - Oitavo considerando.

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