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Document 61994TJ0348

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção Alargada) de 14 de Maio de 1998.
Enso Española SA contra Comissão das Comunidades Europeias.
Concorrência - Artigo 85.º, n.º 1, do Tratado CE - Direito a um tribunal independente e imparcial - Direitos de defesa - Fundamentação - Coima - Determinação do montante - Método de cálculo - Circunstâncias atenuantes - Princípio da igualdade de tratamento - Principio da proporcionalidade.
Processo T-348/94.

Colectânea de Jurisprudência 1998 II-01875

ECLI identifier: ECLI:EU:T:1998:102

61994A0348

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção Alargada) de 14 de Maio de 1998. - Enso Española SA contra Comissão das Comunidades Europeias. - Concorrência - Artigo 85.º, n.º 1, do Tratado CE - Direito a um tribunal independente e imparcial - Direitos de defesa - Fundamentação - Coima - Determinação do montante - Método de cálculo - Circunstâncias atenuantes - Princípio da igualdade de tratamento - Principio da proporcionalidade. - Processo T-348/94.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página II-01875


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Direito comunitário - Princípios - Direitos fundamentais - Respeito garantido pelo juiz comunitário - Tomada em consideração da Convenção Europeia dos Direitos do Homem

(Tratado da União Europeia, artigo F, n._ 2)

2 Concorrência - Procedimento administrativo - Inaplicabilidade do artigo 6._ da Convenção Europeia dos Direitos do Homem - Respeito das garantias processuais pela Comissão - Controlo jurisdicional efectivo das decisões da Comissão - Jurisdição independente e imparcial - Competência de plena jurisdição

(Tratado CE, artigos 85._ e 86._; Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 17._; Decisão 88/591 do Conselho)

3 Direito comunitário - Princípios - Direitos de defesa - Respeito no âmbito dos procedimentos administrativos

4 Concorrência - Procedimento administrativo - Comunicação de acusações - Conteúdo necessário

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 19._, n._ 1; Regulamento n._ 99/63 da Comissão, artigo 4._)

5 Actos das instituições - Fundamentação - Obrigação - Alcance

(Tratado CE, artigo 190._)

6 Processo - Petição inicial - Exigências de forma - Identificação do objecto do litígio - Exposição sumária dos fundamentos invocados

[Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 44._, n._ 1, alínea c)]

7 Concorrência - Cartéis - Participação em reuniões de empresas com objectivos anticoncorrenciais - Circunstância que, na falta de distanciação em relação às decisões tomadas, permite concluir pela participação no subsequente cartel

(Tratado CE, artigo 85._, n._ 1)

8 Concorrência - Cartéis - Acordos e práticas concertadas constitutivos de uma infracção única - Empresas que podem ser acusadas de uma infracção que consiste na participação num acordo global - Critérios

(Tratado CE, artigo 85._, n._ 1)

9 Concorrência - Cartéis - Infracção que tem por objecto uma restrição da concorrência num mercado geográfico determinado - Definição prévia do mercado geográfico - Inexistência da obrigação

(Tratado CE, artigo 85._, n._ 1)

10 Actos das instituições - Fundamentação - Obrigação - Alcance - Decisão que aplica coimas a várias empresas por uma infracção às regras de concorrência

(Tratado CE, artigo 190._; Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)

11 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade das infracções - Circunstâncias agravantes - Dissimulação do cartel - Prova resultante da inexistência de notas sobre as reuniões das empresas participantes no cartel

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)

12 Concorrência - Regras comunitárias - Infracções - Realização deliberada - Conceito

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)

13 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade das infracções - Circunstâncias atenuantes - Comportamento divergente do acordado no cartel - Apreciação

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)

14 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade das infracções - Circunstâncias atenuantes - Situação financeira da empresa em causa - Exclusão

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._, n._ 2)

15 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade das infracções - Circunstâncias atenuantes - Falta de medidas de controlo da aplicação do cartel - Exclusão

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._, n._ 2)

16 Concorrência - Coimas - Montante - Métodos de cálculo - Conversão em ecus do volume de negócios do ano de referência das empresas com base na taxa de câmbio média do mesmo ano - Admissibilidade

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)

17 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade e duração das infracções - Elementos de apreciação - Possibilidade de elevar o nível das coimas para reforçar o seu efeito dissuasor

(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._, n._ 2)

Sumário


18 Os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça. Para este efeito, o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância inspiram-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do homem em que os Estados-Membros colaboraram ou a que aderiram. A Convenção Europeia dos Direitos do Homem reveste, quanto a isto, um significado particular.

19 A Comissão, quando aplica as disposições do direito comunitário da concorrência, não pode ser qualificada como «tribunal» na acepção do artigo 6._ da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Assim, uma decisão de aplicação das regras comunitárias da concorrência não pode ser ilegal pelo simples facto de ter sido adoptada no âmbito de um sistema no qual a Comissão acumula as funções de acusação e de decisão. No entanto, importa salientar que, no procedimento administrativo na Comissão, esta deve respeitar as garantias processuais previstas pelo direito comunitário.

O direito comunitário confere à Comissão uma missão de fiscalização que inclui a tarefa de perseguir as infracções aos artigos 85._, n._ 1, e 86._ do Tratado. O Regulamento n._ 17 atribui-lhe, além disto, o poder de aplicar, mediante decisão, sanções pecuniárias às empresas e associações de empresas que cometeram, deliberadamente ou por negligência, uma infracção àquelas disposições.

A exigência de uma fiscalização jurisdicional efectiva de qualquer decisão da Comissão que declare e reprima uma infracção às regras comunitárias da concorrência mencionadas constitui um princípio geral de direito comunitário que decorre das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros. Este princípio não é violado desde que esse controlo seja efectuado, nos termos da Decisão 88/591 do Conselho, por uma jurisdição independente e imparcial como o Tribunal de Primeira Instância, que pode, nos termos dos fundamentos invocados pela pessoa singular ou colectiva em causa em apoio do seu pedido de anulação, apreciar a correcção, tanto de direito como de facto, de qualquer acusação feita pela Comissão no domínio da concorrência e que, em conformidade com o artigo 17._ do Regulamento n._ 17, é competente para apreciar se a sanção pecuniária aplicada é proporcional à gravidade da infracção verificada.

20 O respeito dos direitos de defesa em qualquer processo susceptível de levar à aplicação de sanções, nomeadamente coimas ou sanções pecuniárias compulsórias, constitui um princípio fundamental do direito comunitário, que deve ser respeitado mesmo se se trata de um procedimento de carácter administrativo.

21 A comunicação de acusações, que tem por objectivo fornecer às empresas perseguidas em aplicação das regras de concorrência todos os elementos necessários para lhes permitir que se defendam efectivamente antes de a Comissão tomar uma decisão definitiva, deve ser redigida em termos que, embora sucintos, sejam suficientemente claros para permitir que os interessados tomem efectivamente conhecimento dos comportamentos de que a Comissão os acusa.

22 O dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade permitir ao juiz comunitário exercer a fiscalização da legalidade da decisão e fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se a decisão é fundada ou se está eventualmente afectada por um vício que permita contestar a sua validade, esclarecendo-se que o alcance dessa obrigação depende da natureza do acto em causa e do contexto em que o mesmo foi adoptado.

Embora, por força do artigo 190._ do Tratado, a Comissão seja obrigada a mencionar os elementos de facto e de direito de que depende a justificação legal da decisão e as considerações que a levaram a adoptá-la, não se exige que discuta todos os pontos de facto e de direito suscitados no procedimento administrativo.

23 Por força do artigo 44._, n._ 1, alínea c), do Regulamento de Processo, a petição deve indicar o objecto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para que o demandado possa preparar a sua defesa e o Tribunal decidir a acção, eventualmente, sem mais informações em seu apoio. A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que a acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta, resultem, pelo menos sumariamente, mas de uma maneira coerente e compreensível, do texto da própria petição.

24 O facto de uma empresa não respeitar os resultados de reuniões de carácter manifestamente anticoncorrencial não a isenta de culpa, decorrente da sua participação no cartel, uma vez que não se distanciou publicamente do respectivo conteúdo. Mesmo admitindo que o comportamento da recorrente no mercado não tenha sido conforme ao comportamento acordado, isso em nada afecta a sua responsabilidade na violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

25 Para que a Comissão possa considerar cada uma das empresas visadas por uma decisão de aplicação das regras de concorrência, responsável, durante determinado período, por um acordo global incluindo diversos comportamentos anticoncorrenciais, deve demonstrar que cada uma delas concordou com a adopção de um plano global que abranja os elementos constitutivos do cartel ou participou directamente, ao longo desse período, em todos os seus elementos. Uma empresa pode igualmente ser considerada responsável por um acordo global, mesmo que se prove que apenas participou num ou em diversos elementos constitutivos desse acordo, desde que soubesse, ou tivesse necessariamente a obrigação de saber, por um lado, que a colusão na qual participava se inscrevia num plano global e, por outro, que esse plano global abrangia a totalidade dos elementos constitutivos do cartel. Quando assim é, o facto de a empresa em causa não ter participado directamente em todos os elementos constitutivos do acordo global não a isenta da responsabilidade pela infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Tal circunstância pode, porém, ser tomada em consideração ao apreciar a gravidade da infracção de que é acusada.

26 Quando a Comissão verifica uma infracção que tem por objectivo uma restrição da concorrência num mercado geográfico determinado, a verificação dessa restrição da concorrência não exige qualquer definição prévia do mercado geográfico.

27 O dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade permitir ao juiz comunitário exercer a fiscalização da legalidade da decisão e fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se a decisão é fundada ou se está eventualmente afectada por um vício que permita contestar a sua validade, esclarecendo-se que o alcance dessa obrigação depende da natureza do acto em causa e do contexto em que o mesmo foi adoptado.

No que respeita a uma decisão que aplica coimas a diversas empresas por uma infracção às regras comunitárias da concorrência, há que determinar o alcance da obrigação de fundamentação, tendo em conta, designadamente, que a gravidade das infracções deve ser apreciada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasor das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração.

Além disso, ao fixar o montante de cada coima, a Comissão dispõe de um poder de apreciação e não pode ser obrigada a aplicar, para esse efeito, uma fórmula matemática precisa.

Por fim, a fundamentação de uma decisão deve figurar no próprio corpo dessa decisão e explicações posteriores fornecidas pela Comissão não podem, salvo circunstâncias excepcionais, ser tomadas em consideração.

Quando a Comissão conclui, numa decisão, pela existência de uma infracção às regras de concorrência e aplica coimas às empresas que nela participaram, a Comissão deve, se tiver sistematicamente tomado em conta certos elementos de base para fixar o montante das coimas, indicar esses elementos no corpo da decisão, a fim de permitir aos destinatários desta verificar as razões que levaram à fixação do nível da coima e apreciar a existência de uma eventual discriminação.

28 O facto de as empresas que participaram numa colusão sobre os preços terem orquestrado o anúncio do aumento dos preços concertados e de terem sido dissuadidas de tomar notas sobre essas reuniões prova que estavam conscientes da ilegalidade do seu comportamento e que adoptaram medidas de dissimulação da colusão. A Comissão pode considerar essas medidas como circunstâncias agravantes na apreciação da gravidade da infracção.

Quanto a isto, a inexistência de actas oficiais e a inexistência quase total de notas internas sobre as referidas reuniões podem constituir, atendendo ao seu número, à sua duração e à natureza das discussões em causa, uma prova suficiente da alegação da Comissão segundo a qual os participantes eram dissuadidos de tomar notas.

29 Para que uma infracção possa ser considerada como tendo sido cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de violar a proibição do artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Basta que não pudesse ignorar que a conduta imputada tinha por objectivo ou efeito restringir a concorrência no mercado comum.

30 O facto de uma empresa, cuja participação numa concertação com os seus concorrentes em matéria de preços foi demonstrada, não se ter comportado no mercado de um modo conforme ao convencionado com os seus concorrentes não constitui necessariamente um elemento que deva ser tomado em consideração, como circunstância atenuante, aquando da determinação do montante da coima a aplicar. Com efeito, uma empresa que prossegue, apesar da concertação com os seus concorrentes, uma política mais ou menos independente no mercado pode simplesmente tentar utilizar o acordo em seu benefício.

31 Na determinação do montante da coima a aplicar por infracção às regras comunitárias da concorrência, a Comissão não é obrigada a ter em conta a situação deficitária da empresa interessada enquanto circunstância atenuante. O reconhecimento dessa obrigação equivaleria a dar uma vantagem concorrencial não justificada às empresas menos adaptadas às condições do mercado.

32 Se a existência de medidas de controlo de aplicação de um cartel pode ser tida em conta enquanto circunstância agravante para a fixação das coimas, a falta de tais medidas não constitui, em si, uma circunstância atenuante.

33 Quando aplica coimas a várias empresas por infracção às regras comunitárias da concorrência, nada impede a Comissão de expressar o montante da coima em ecus, unidade monetária convertível em moeda nacional. De resto, isso permite às empresas comparar mais facilmente os montantes das coimas aplicadas. Além disso, a conversão possível do ecu em moeda nacional diferencia esta unidade monetária da «unidade de conta» mencionada no artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17, que o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente que, não sendo um meio de pagamento, implicava necessariamente a determinação do montante da coima em moeda nacional.

No cálculo da coima, a Comissão pode validamente utilizar um método que consiste em converter em ecus o volume de negócios do ano de referência de cada uma das empresas com base nas taxas de câmbio médias do mesmo ano, e não com base nas taxas de câmbio na data da adopção da decisão.

Antes de mais, com efeito, a Comissão deve normalmente utilizar um único e mesmo método de cálculo das coimas aplicadas às empresas sancionadas por terem participado na mesma infracção. Em seguida, a fim de poder comparar os diferentes volumes de negócios comunicados, expressos nas moedas nacionais respectivas das empresas em causa, a Comissão deve converter esses volumes de negócios numa única e mesma unidade monetária como o ecu, cujo valor é determinado em função do valor de cada moeda nacional dos Estados-Membros.

Por um lado, a tomada em consideração do volume de negócios realizado por cada uma das empresas no decurso do ano de referência, isto é, o último ano completo do período de infracção objecto da decisão, permitiu à Comissão apreciar a dimensão e o poder económico de cada empresa bem como a extensão da infracção cometida por cada uma delas, sendo estes elementos pertinentes para apreciar a gravidade da infracção cometida por cada empresa. Por outro lado, a tomada em consideração, para efeitos da conversão em ecus dos volumes de negócios em causa, das taxas de câmbio médias do ano de referência considerado, permitiu à Comissão evitar que as eventuais flutuações monetárias ocorridas desde a cessação da infracção afectassem a apreciação da dimensão e o poder económico relativos das empresas, bem como a extensão da infracção cometida por cada uma delas e, portanto, a apreciação da gravidade da infracção. A apreciação da gravidade da infracção deve, efectivamente, ter em conta a realidade económica tal como existia na época em que a infracção foi cometida.

Consequentemente, o método de cálculo da coima que consiste em utilizar a taxa de câmbio média do ano de referência permite evitar os efeitos aleatórios das alterações dos valores reais das moedas nacionais que podem ocorrer, e neste caso ocorreram de facto, entre o ano de referência e o ano de adopção da decisão. Se este método pode significar que determinada empresa deve pagar um montante, expresso em moeda nacional, nominalmente superior ou inferior ao que pagaria na hipótese de ser aplicada a taxa de câmbio da data de adopção da decisão, isso é apenas a consequência lógica das flutuações dos valores reais das diferentes moedas nacionais.

34 A determinação do montante da coima por infracção às regras comunitárias da concorrência é função da gravidade e da duração da infracção. Quanto a isto, a gravidade das infracções deve ser determinada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasor das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração.

Na sua apreciação do nível geral das coimas, a Comissão tem o direito de tomar em conta o facto de as infracções manifestas às regras comunitárias da concorrência serem ainda relativamente frequentes e, portanto, tem perfeitamente legitimidade para aumentar o nível das coimas a fim de reforçar o seu efeito dissuasor. Consequentemente, o facto de a Comissão ter aplicado, no passado, coimas de certo nível a determinados tipos de infracções, não a priva da possibilidade de aumentar esse nível, nos limites indicados no Regulamento n._ 17, se isso for necessário para assegurar a execução da política comunitária da concorrência.

Além disto, quando fixa o nível geral das coimas, a Comissão pode nomeadamente ter em conta a longa duração e o carácter manifesto da infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado, que foi cometida apesar da advertência que deveria ter constituído a prática decisória anterior da Comissão.

Partes


No processo T-348/94,

Enso Española, SA, sociedade de direito espanhol, com sede em Castellbisbal, Barcelona (Espanha), representada inicialmente por Antonio Creus Carreras e Xavier Ruiz Calzado, advogados no foro de Barcelona, José Ramón García-Gallardo, advogado no foro de Burgos, e Bonifacio García Porras, advogado no foro de Salamanca, depois por Antonio Creus Carreras, Xavier Ruiz Calzado e Eva Contreras Ynzenga, advogada no foro de Madrid,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por Francisco Enrique González Díaz e Richard Lyal, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, depois por Richard Lyal, assistido por Ricardo Garcia Vicente, advogado no foro de Madrid, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CE (IV/C/33.833 - Cartão) (JO L 243, p. 1),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS

(Terceira Secção Alargada),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. P. Briët, P. Lindh, A. Potocki e J. D. Cooke, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vistos os autos e após a audiência que teve lugar entre 25 de Junho e 8 de Julho de 1997,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


Factos na origem do litígio

1 O presente processo tem por objecto a Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CE (IV/C/33.833 - Cartão) (JO L 243, p. 1), rectificada, antes da sua publicação, por uma decisão da Comissão de 26 de Julho de 1994 [C(94) 2135 final] (a seguir «decisão»). A decisão aplicou coimas a dezanove produtores fornecedores de cartão na Comunidade, com fundamento em violações do artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

2 O produto objecto da decisão é o cartão. Três tipos de cartão, designados como pertencendo às qualidades «GC», «GD» e «SBS», são mencionados na decisão.

3 O cartão da qualidade GD (a seguir «cartão GD») é um cartão de interior cinzento (papéis reciclados) que serve habitualmente para a embalagem de produtos não alimentares.

4 O cartão da qualidade GC (a seguir «cartão GC») apresenta uma superfície exterior branca e serve habitualmente para a embalagem de produtos alimentares. O cartão GC é de qualidade superior ao cartão GD. No período abrangido pela decisão, verificou-se geralmente entre estes dois produtos uma diferença de preço de cerca de 30%. Em menor escala, o cartão GC de alta qualidade tem igualmente utilizações gráficas.

5 A sigla SBS designa o cartão inteiramente branco (a seguir «cartão SBS»), produto cujo preço é cerca de 20% superior ao do cartão GC. Serve para embalar alimentos, cosméticos, medicamentos e cigarros, mas destina-se principalmente a utilizações gráficas.

6 Por carta de 22 de Novembro de 1990, a British Printing Industries Federation, organização profissional que representa a maioria dos impressores de cartão do Reino Unido (a seguir «BPIF»), apresentou uma denúncia informal à Comissão. Alegou que os produtores de cartão que fornecem o Reino Unido haviam introduzido uma série de aumentos de preços simultâneos e uniformes e solicitou que a Comissão investigasse a eventual existência de uma infracção às regras comunitárias da concorrência. Por forma a garantir que seria dada publicidade à sua iniciativa, a BPIF emitiu um comunicado de imprensa. O conteúdo desse comunicado foi apresentado pela imprensa profissional especializada no decurso do mês de Dezembro de 1990.

7 Em 12 de Dezembro de 1990, a Fédération française du cartonnage apresentou igualmente uma denúncia informal à Comissão, na qual apresentou alegações, relativamente ao mercado francês do cartão, em termos semelhantes aos utilizados na denúncia da BPIF.

8 Em 23 e 24 de Abril de 1991, agentes da Comissão, actuando ao abrigo do n._ 3 do artigo 14._ do Regulamento n._ 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de aplicação dos artigos 85._ e 86._ do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir «Regulamento n._ 17»), efectuaram investigações simultâneas sem aviso prévio nas instalações de diversas empresas e associações comerciais do sector do cartão.

9 Na sequência dessas investigações, a Comissão pediu informações e documentos a todos os destinatários da decisão, em aplicação do artigo 11._ do Regulamento n._ 17.

10 Os elementos obtidos no âmbito destas investigações e pedidos de informações e de documentos levaram a Comissão a concluir que as empresas em causa tinham participado, entre meados de 1986 e Abril de 1991, pelo menos (na maior parte dos casos), numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

11 Em consequência, decidiu dar início a um procedimento em aplicação desta última disposição. Por carta de 21 de Dezembro de 1992, enviou uma comunicação de acusações a cada uma das empresas em causa. Todas as empresas destinatárias responderam por escrito. Nove das empresas pediram para ser ouvidas. A sua audição teve lugar entre 7 e 9 de Junho de 1993.

12 No termo do procedimento, a Comissão adoptou a decisão, que inclui as seguintes disposições:

«Artigo 1._

As empresas Buchmann GmbH, Cascades SA, Enso-Gutzeit Oy, Europa Carton AG, Finnboard-the Finnish Board Mills Association, Fiskeby Board AB, Gruber & Weber GmbH & Co KG, Kartonfabriek `de Eendracht' NV (com denominação comercial `BPB de Eendracht'), NV Koninklijke KNP BT NV (anteriormente Koninklijke Nederlandse Papierfabrieken NV), Laakmann Karton GmbH & Co KG, Mo Och Domsjö AB (MoDo), Mayr-Melnhof Gesellschaft mbH, Papeteries de Lancey SA, Rena Kartonfabrik A/S, Sarrió SpA, SCA Holding Ltd [anteriormente Reed Paper & Board (UK) Ltd], Stora Kopparbergs Bergslags AB, Enso Española SA (anteriormente Tampella Española SA) e Moritz J. Weig GmbH & Co KG infringiram o disposto no n._ 1 do artigo 85._ do Tratado CE ao participarem:

- no caso da Buchmann e da Rena desde, aproximadamente, Março de 1988 até, pelo menos, final de 1990,

- no caso da Enso Española desde, pelo menos, Março de 1988 até, pelo menos, final de Abril de 1991,

- no caso da Gruber & Weber desde, pelos menos, 1988 até finais de 1990,

- noutros casos, a partir de meados de 1986 até, pelo menos, Abril de 1991,

num acordo e prática concertada com início em meados de 1986, através do qual os fornecedores de cartão na Comunidade:

- se reuniram regularmente numa série de reuniões secretas e institucionalizadas para debater e acordar um plano comum do sector destinado a restringir a concorrência,

- acordaram aumentos de preços regulares para cada qualidade do produto em cada moeda nacional,

- planearam e aplicaram aumentos de preços simultâneos e uniformes em toda a Comunidade,

- chegaram a um acordo quanto à manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais,

- adoptaram, principalmente a partir do início de 1990, medidas concertadas por forma a controlar o fornecimento do produto na Comunidade e a assegurar a aplicação dos referidos aumentos concertados de preços,

- procederam ao intercâmbio de informações comerciais sobre os fornecimentos, preços, suspensões de actividade, cadernos de encomendas e taxas de utilização das máquinas em apoio às medidas supracitadas.

...

Artigo 3._

São aplicadas as seguintes coimas às empresas a seguir designadas relativamente à infracção referida no artigo 1._:

...

xviii) Enso Española SA, coima de 1 750 000 ecus;

...»

13 Nos termos da decisão, a infracção foi praticada no âmbito de um organismo denominado «Product Group Paperboard» (Grupo de estudos do produto cartão, a seguir «PG Paperboard»), composto por diversos grupos ou comités.

14 Em meados de 1986, foi criado, no âmbito deste organismo, um «Presidents Working Group» (grupo de trabalho dos presidentes, a seguir «PWG»), de que fazem parte representantes de alto nível dos principais produtores de cartão da Comunidade (cerca de oito).

15 O PWG tinha nomeadamente como actividades a discussão e a concertação sobre os mercados, as quotas de mercado, os preços e a utilização das capacidades. Em especial, adoptou decisões gerais relativamente ao calendário e ao nível dos aumentos de preços a pôr em prática pelos fabricantes.

16 O PWG apresentava relatórios à «President Conference» (a seguir «PC» ou «conferência de presidentes»), na qual participava (mais ou menos regularmente) a quase totalidade dos directores executivos das empresas envolvidas. A PC reuniu-se duas vezes por ano durante o período em causa.

17 No fim do ano de 1987, foi criado o «Joint Marketing Committee» (comité conjunto de marketing, a seguir «JMC»). A sua principal atribuição consistia, por um lado, em determinar se os aumentos de preços podiam entrar em vigor e, em caso afirmativo, de que modo e, por outro, em fixar as modalidades de aplicação das iniciativas em matéria de preços decididas pelo PWG relativamente a cada país e aos principais clientes, com o objectivo de atingir um sistema de preços equivalente na Europa.

18 Finalmente, o Comité Económico (a seguir «COE») debatia sobre matérias como as flutuações de preços nos mercados nacionais e os cadernos de encomendas e apresentava as suas conclusões ao JMC ou, até finais de 1987, ao predecessor do JMC, o Marketing Committee. O COE era composto pelos directores comerciais da maior parte das empresas em causa e reunia-se várias vezes por ano.

19 Além disso, resulta da decisão que a Comissão considerou que as actividades do PG Paperboard eram apoiadas por um intercâmbio de informações por intermédio da sociedade de auditores Fides, com sede em Zurique (Suíça). Segundo a decisão, a maior parte dos membros do PG Paperboard fornecia à Fides relatórios periódicos sobre as encomendas, a produção, as vendas e a utilização das capacidades. Estes relatórios eram tratados no quadro do sistema Fides e os dados resultantes eram enviados aos participantes.

20 A recorrente Enso Española SA (a seguir «Enso Española»), antiga Tampella Española SA, participou, segundo a decisão, em algumas reuniões do JMC (entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991), da PC (de Maio de 1988 a Maio de 1989), e do COE (de Fevereiro de 1987 a Maio de 1989).

Tramitação processual

21 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 18 de Outubro de 1994, a recorrente interpôs o presente recurso.

22 Dezasseis das outras dezoito empresas consideradas responsáveis pela infracção recorreram igualmente da decisão (processos T-295/94, T-301/94, T-304/94, T-308/94, T-309/94, T-310/94, T-311/94, T-317/94, T-319/94, T-327/94, T-334/94, T-337/94, T-338/94, T-347/94, T-352/94 e T-354/94).

23 A recorrente no processo T-301/94, Laakmann Karton GmbH, desistiu da instância por carta entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Junho de 1996, tendo o processo sido cancelado no registo do Tribunal por despacho de 18 de Julho de 1996, Laakmann Karton/Comissão (T-301/94, não publicado na Colectânea).

24 Quatro empresas finlandesas, membros do grupo profissional Finnboard e, por esse facto, consideradas solidariamente responsáveis pelo pagamento da coima aplicada ao grupo, recorreram igualmente da decisão (processos apensos T-339/94, T-340/94, T-341/94 e T-342/94).

25 Finalmente, foi interposto um recurso pela associação CEPI-Cartonboard, não destinatária da decisão. No entanto, esta desistiu da instância por carta apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Janeiro de 1997, tendo o processo sido cancelado no registo do Tribunal por despacho de 6 de Março de 1997, CEPI-Cartonboard/Comissão (T-312/94, não publicado na Colectânea).

26 Por carta de 5 de Fevereiro de 1997, o Tribunal de Primeira Instância convidou as partes a participarem numa reunião informal, na qual se deveriam pronunciar, designadamente, sobre a eventual apensação dos processos T-295/94, T-304/94, T-308/94, T-309/94, T-310/94, T-311/94, T-317/94, T-319/94, T-327/94, T-334/94, T-337/94, T-338/94, T-347/94, T-348/94, T-352/94 e T-354/94, para efeitos da fase oral. Nessa reunião, que teve lugar em 29 de Abril de 1997, as partes aceitaram a apensação.

27 Por despacho de 4 de Junho de 1997, por razões de conexão, o presidente da Terceira Secção Alargada do Tribunal de Primeira Instância ordenou a apensação dos referidos processos para efeitos da fase oral, nos termos do artigo 50._ do Regulamento de Processo, tendo deferido um pedido de tratamento confidencial apresentado pela recorrente no presente processo T-334/94.

28 Por despacho de 20 de Junho de 1997, deferiu um pedido de tratamento confidencial apresentado pela recorrente no processo T-337/94, relativamente a um documento apresentado em resposta a uma pergunta escrita do Tribunal.

29 Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção Alargada) decidiu iniciar a fase oral e adoptou medidas de organização do processo, tendo pedido às partes para responderem a certas perguntas escritas e para apresentarem certos documentos. As partes deram satisfação a estes pedidos.

30 Foram ouvidas as alegações das partes nos processos mencionados no n._ 26 e as suas respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal na audiência que teve lugar entre 25 de Junho e 8 de Julho de 1997.

Pedidos das partes

31 A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- anular total ou parcialmente a decisão na medida em que lhe diz respeito;

- a título subsidiário, anular a coima que lhe foi aplicada;

- a título mais subsidiário, reduzir substancialmente o montante da coima;

- condenar a Comissão nas despesas, incluindo as despesas e os juros decorrentes da constituição de uma garantia bancária ou do pagamento eventual da totalidade ou de parte da coima.

32 A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- negar provimento ao recurso; - condenar a recorrente nas despesas.

Pedido de anulação da decisão

A - Fundamento baseado em violação do direito fundamental a um tribunal independente e imparcial

Argumentos das partes

33 A recorrente defende que a acumulação das funções de instrução e de decisão da Comissão viola o direito fundamental a um tribunal independente e imparcial.

34 Este fundamento articula-se em duas partes. Numa primeira parte, a recorrente alega que o direito fundamental invocado consta do artigo 6._ da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 4 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH»). Numa segunda parte, defende que está consagrado nas tradições constitucionais dos Estados-Membros.

35 Quanto à primeira parte do fundamento, recorda que uma jurisdição que conhece de uma acusação em matéria penal, na acepção do artigo 6._ da CEDH, deve ser imparcial. A instrução do processo de condenação e a adopção da decisão que põe termo a esse processo devem ser feitas por instâncias ou pessoas diferentes (acórdãos do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 1 de Outubro de 1982, Piersack, série A, n._ 53, e de 26 de Outubro de 1984, De Cubber, série A, n._ 86). A Comissão Europeia dos Direitos do Homem qualificou como acusação em matéria penal as decisões relativas ao direito da concorrência (decisão de 9 de Fevereiro de 1990, M & Co./Alemanha, n._ 13258/87, vol. 64, p. 138, e parecer no processo Stenuit/Estado francês, n._ 11598/85, relatório de 30 de Maio de 1991, série A, n._ 232-A).

36 As garantias enunciadas no artigo 6._ da CEDH devem ser respeitadas por três razões.

37 Antes de mais, a decisão da Comissão assume um carácter penal (parecer da Comissão Europeia dos Direitos do Homem nos processos Stenuit/Estado francês e M & Co./Alemanha, já referidos). A natureza penal das coimas decorre do respectivo carácter repressivo, o que se prova pela publicidade feita pela Comissão com um objectivo dissuasivo.

38 Em seguida, admitindo que a coima aplicada não tem um carácter penal, as garantias penais deviam ter sido aplicadas a um procedimento administrativo repressivo tal como o procedimento administrativo na Comissão. A qualificação formal dada às sanções em direito interno e, no caso concreto, em direito comunitário não são, a este respeito, importantes.

39 Invocando os acórdãos do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (acórdãos de 8 de Junho de 1976, Engel e o., série A, n._ 22, de 21 de Fevereiro de 1984, Öztürk, série A, n._ 73, e de 28 de Junho de 1984, Campbell e Fell, série A, n._ 80), a recorrente considera que o direito fundamental a um processo equitativo pode ser aplicado no caso em apreço não obstante o facto de a Comissão não ter sido equiparada a um tribunal na acepção do artigo 6._ da CEDH (acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Outubro de 1980, Van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.os 79 a 91, e de 7 de Junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80, 101/80, 102/80 e 103/80, Recueil, p. 1825).

40 Por fim, a parcialidade da Comissão pode ser reparada pela possibilidade de interpor posteriormente um recurso numa instância jurisdicional que goze de um poder de plena jurisdição (acórdão De Cubber, já referido). Este não é, no entanto, o que se passa no caso em apreço, uma vez que a fiscalização exercida pelo Tribunal de Primeira Instância nos termos dos artigos 172._ e 173._ do Tratado não é de modo algum uma fiscalização de plena jurisdição que permita verificar todas as apreciações de facto e de direito, na acepção do acórdão De Cubber, já referido.

41 A via de recurso instituída pelo artigo 173._ do Tratado não habilita o Tribunal de Primeira Instância a apreciar a situação de facto ou as circunstâncias económicas tidas em consideração para adoptar as decisões ou formular as recomendações controvertidas, excepto quando a Comissão é acusada de desvio de poder ou de ter manifestamente desrespeitado as disposições do Tratado ou qualquer outra norma de direito relativa à sua aplicação. Baseando-se em dois acórdãos do Tribunal de Justiça (acórdãos de 11 de Julho de 1985, Remia e o./Comissão, 42/84, Colect., p. 2545, n._ 34, e de 15 de Junho de 1993, Matra/Comissão, C-225/91, Colect., p. I-3203, n._ 23), a recorrente considera que a fiscalização jurisdicional das decisões da Comissão com base no artigo 173._ do Tratado é uma simples fiscalização de legalidade que não preenche as exigências da fiscalização de plena jurisdição.

42 Quanto ao controlo das coimas previsto no artigo 172._ do Tratado, é textualmente um controlo de plena jurisdição e constitui uma extensão dos poderes de fiscalização do juiz comunitário no âmbito do recurso de anulação (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Junho de 1958, Meroni & Co. Industrie Metallurgiche/Alta Autoridade, 9/56, Colect. 1954-1961, p. 175).

43 No entanto, essa fiscalização não é de plena jurisdição na acepção da CEDH, uma vez que o Tribunal de Primeira Instância só a pode exercer nos casos de iniquidade manifesta (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Dezembro de 1957, ALMA/Alta Autoridade, 8/56, Recueil, pp. 179, 192, Colect. 1954-1961, p. 163) ou de erro significativo de direito ou de facto (conclusões do advogado-geral J. P. Warner no acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 1979, BMW Belgium e o./Comissão, 32/78, 36/78 a 82/78, Recueil, pp. 2435, 2484).

44 Admitindo mesmo que essa fiscalização é considerada como fiscalização de plena jurisdição, não incide sobre todos os elementos da decisão impugnada, como o exige o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Com efeito, a única consequência possível dessa fiscalização é a alteração da sanção aplicada, sem que se examinem os factos e apreciações de facto em que se baseou a Comissão para elaborar a base jurídica em que assentou a referida sanção.

45 Na segunda parte do fundamento, a recorrente afirma que o direito fundamental a um tribunal independente e imparcial é reconhecido pelas tradições dos Estados-Membros.

46 O artigo F, n._ 2, do Tratado da União Europeia impõe a aplicação dos direitos fundamentais tais como resultam das tradições constitucionais dos Estados-Membros. Ora, o direito fundamental a um tribunal imparcial é garantido nos Estados-Membros nos dois tipos de processos de fiscalização das violações do direito da concorrência, tal como distinguidos no acórdão De Cubber, já referido.

47 O primeiro tipo de processo separa, desde o princípio, as fases de instrução e de decisão. Diferentes sistemas nacionais de controlo da concorrência, isto é, os sistemas francês, grego, belga, português, espanhol, dinamarquês, austríaco, finlandês e sueco aplicam esta distinção entre instrução e decisão. Alguns deles, por exemplo os sistemas belga, português, espanhol, dinamarquês e sueco, permitem mesmo, numa fase posterior, uma fiscalização de plena jurisdição. Ao invés, o processo de aplicação do direito da concorrência no Reino Unido, na Irlanda, no Luxemburgo e nos Países Baixos não autoriza os órgãos responsáveis pela protecção da livre concorrência a imporem coimas.

48 O segundo tipo de processo, em vigor na Alemanha e em Itália, não distingue as fases de instrução das de decisão, mas prevê, em seguida, um verdadeiro recurso de plena jurisdição cujas características o tornam conforme ao artigo 6._ da CEDH.

49 Tendo em conta estes elementos, as tradições constitucionais dos Estados-Membros garantem melhor o direito a um tribunal imparcial do que a interpretação de minimis feita pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem do artigo 6._ da CEDH. Assim, admitindo que o Tribunal de Primeira Instância considera que a decisão respeita o direito a um tribunal imparcial em conformidade com as regras enunciadas pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, não poderá declarar que garante o direito a um tribunal imparcial definido nas tradições constitucionais dos Estados-Membros e que se reflecte nos processos que estes instituíram para a aplicação do direito da concorrência.

50 A Comissão considera, em primeiro lugar, que o direito comunitário da concorrência não decorre do conceito de matéria penal e não está portanto, por isto, submetido ao artigo 6._, n._ 1, da CEDH.

51 Em segundo lugar, defende que não pode ser qualificada como tribunal na acepção do artigo 6._ da CEDH.

52 Em terceiro lugar, considera que a recorrente interpreta de forma errada o artigo 173._ do Tratado e a jurisprudência relativa alegando que é impossível aplicar a jurisprudência De Cubber do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no contexto comunitário devido à falta de recurso posterior para um órgão jurisdicional competente para analisar e rever cada um dos elementos de facto da decisão bem como a apreciação que a Comissão fez destes elementos.

53 Com efeito, o artigo 173._ do Tratado habilita o juiz comunitário, através da fiscalização do erro de facto e de direito, a uma revisão exaustiva tanto da constatação como da apreciação dos factos pela Comissão. Em seguida, se o juiz comunitário não pode substituir a sua apreciação à do autor da decisão, a Comissão deverá no entanto adoptar as medidas que implicam a execução de uma eventual decisão de anulação, em conformidade com o artigo 176._ do Tratado (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, SIV e o./Comissão, T-68/89, T-77/89 e T-78/89, Colect., p. II-1403). Por fim, a Comissão Europeia dos Direitos do Homem considerou ela própria que o artigo 173._ constitui um exemplo de fiscalização limitada mas normal na acepção do artigo 6._ da CEDH (relatório de 17 de Julho de 1980, processo Kaplan, DR, vol. 21, p. 66).

54 Tratando-se da revisão da sanção prevista no artigo 172._ do Tratado, a prática do juiz comunitário ultrapassa a fiscalização de iniquidade manifesta (acórdão ALMA/Alta Autoridade, já referido) ou de erro significativo (conclusões do advogado-geral J. P. Warner no acórdão BMW Belgium e o./Comissão, já referidos), uma vez que o juiz comunitário verifica, nomeadamente, se a coima é proporcional à gravidade da infracção (acórdãos do Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 1962, Acciaierie Ferriere e Fonderie di Modena/Alta Autoridade, 16/61, Recueil, pp. 547, 576 e 581, Colect. 1962-1964, p. 127, e de 6 de Março de 1974, Istituto Chemioterapico Italiano e Commercial Solvents/Comissão, 6/73 e 7/73, Colect., p. 119).

Apreciação do Tribunal

55 Segundo jurisprudência constante, os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça (v., nomeadamente, parecer do Tribunal de Justiça de 28 de Março de 1996, parecer 2/94, Colect., p. I-1759, n._ 33, e acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Maio de 1997, Kremzow, C-299/95, Colect., p. I-2629, n._ 14). Para este efeito, o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância inspiram-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do homem em que os Estados-Membros colaboraram ou a que aderiram. A CEDH reveste, quanto a isto, um significado particular (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n._ 18, e Kremzow, já referido, n._ 14). Além disto, nos termos do artigo F, n._ 2, do Tratado da União Europeia, «A União respeitará os direitos fundamentais tal como os garante a [CEDH] e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário».

56 É igualmente jurisprudência constante que a Comissão não pode ser qualificada como «tribunal» na acepção do artigo 6._ da CEDH (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n._ 7). Assim, não é pertinente o argumento da recorrente de que a decisão é ilegal pelo simples facto de ter sido adoptada no âmbito de um sistema no qual a Comissão acumula as funções de acusação e de decisão. No entanto, importa salientar que, no procedimento administrativo na Comissão, esta deve respeitar as garantias processuais previstas pelo direito comunitário.

57 A recorrente alega ainda que, no estado actual do direito comunitário, a parcialidade da Comissão não pode ser reparada pela possibilidade de interpor, da decisão que a Comissão adoptou, recurso num órgão jurisdicional dotado de competência de plena jurisdição, contrariamente às exigências que decorrem do respeito da CEDH.

58 A este respeito, importa recordar que o direito comunitário confere à Comissão uma missão de fiscalização que inclui a tarefa de perseguir as infracções aos artigos 85._, n._ 1, e 86._ do Tratado.

59 O Regulamento n._ 17 atribui-lhe, além disto, o poder de aplicar, mediante decisão, sanções pecuniárias às empresas e associações de empresas que cometeram, deliberadamente ou por negligência, uma infracção àquelas disposições.

60 A exigência de uma fiscalização jurisdicional efectiva de qualquer decisão da Comissão que declare e reprima uma infracção às regras comunitárias da concorrência mencionadas constitui um princípio geral de direito comunitário que decorre das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Junho de 1995, Guérin automobiles/Comissão, T-186/94, Colect., p. II-1753, n._ 23).

61 No caso em apreço, este princípio geral de direito comunitário não foi violado.

62 Em primeiro lugar, o Tribunal é uma jurisdição independente e imparcial, criado pela Decisão 88/591/CECA, CEE, Euratom do Conselho, de 24 de Outubro de 1988, que institui um Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (JO L 319, p. 1, rectificativos no JO 1989, L 241, p. 4). Como se conclui do terceiro considerando da referida decisão, o Tribunal foi criado para melhorar a protecção judiciária dos interessados em acções que exijam um exame aprofundado de factos complexos.

63 Em segundo lugar, o Tribunal é competente, por força do artigo 3._, n._ 1, alínea c), da mesma decisão, para exercer a competência conferida ao Tribunal de Justiça pelos Tratados que instituem as Comunidades e pelos actos adoptados em sua execução, nomeadamente, «nas acções intentadas contra uma Instituição das Comunidades por pessoas singulares ou colectivas, ao abrigo do segundo parágrafo do artigo 173._ do Tratado... que digam respeito à aplicação das regras de concorrência aplicadas às empresas». No âmbito dessas acções baseadas no artigo 173._ do Tratado, a fiscalização da legalidade de uma decisão da Comissão que declara uma infracção às regras da concorrência e que, por isso, aplica uma coima à pessoa singular ou colectiva em causa deve ser considerada uma fiscalização jurisdicional efectiva do acto em questão. Com efeito, os meios susceptíveis de serem invocados pela pessoa singular ou colectiva em causa em apoio do seu pedido de anulação são susceptíveis de permitir ao Tribunal apreciar a correcção, tanto de direito como de facto, de qualquer acusação feita pela Comissão no domínio da concorrência.

64 Em terceiro lugar, em conformidade com o artigo 17._ do Regulamento n._ 17, o Tribunal decide «com plena jurisdição, na acepção do artigo 172._ do Tratado, os recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada uma multa ou uma adstrição [e] pode suprimir, reduzir ou aumentar a multa ou a adstrição [sanção pecuniária compulsória] aplicadas». Daqui resulta que é competente para apreciar se a sanção pecuniária aplicada é proporcional à gravidade da infracção verificada.

65 Tendo em conta o que precede, o fundamento deve ser considerado improcedente.

B - Fundamento baseado numa violação dos direitos de defesa

Argumentos das partes

66 A recorrente alega que a comunicação de acusações não contém qualquer descrição de mercado geográfico em que foi acusada de praticar infracções ao direito da concorrência. Nesse documento, o mercado espanhol foi referido uma única vez e os mercados irlandês, português e grego nunca foram mencionados.

67 A recorrente deduziu desses elementos que os mercados espanhol, irlandês, português e grego não estavam abrangidos pelo inquérito. Não considerou portanto dever defender-se das violações alegadas pela Comissão nesses mercados geográficos.

68 Contrariamente ao que defende a Comissão nos seus documentos escritos apresentados ao Tribunal, a comunicação de acusações não cobriu «claramente os mercados espanhol e irlandês e, cobriu parcialmente, os mercados português e grego (pelo menos no que se refere ao sistema de intercâmbio de informações)». Através desta declaração, a Comissão reconheceu aliás implicitamente que o cartel não abrangia os mercados grego e português.

69 Mais precisamente, no que se refere à cobertura dos mercados espanhol e irlandês, a remissão pela Comissão para certos anexos à comunicação de acusações (anexos 5, 6, 18, 20 a 22, 55, 56, 60, 71, 80, 81, 109, 110, 111 e 118) não é pertinente, uma vez que nenhum desses anexos contém a mais pequena indicação segundo a qual os mercados em causa estão cobertos pela infracção censurada. Em especial, os anexos 5, 6, 55, 56, 60 e 71 não se referem à Irlanda.

70 Quanto à alegada cobertura parcial dos mercados português e grego, a própria Comissão reconhece que as reuniões do PG Paperboard não abordavam questões relativas a esses mercados. Além disto, os numerosos anexos invocados pela Comissão não se referem a esses mercados.

71 Em qualquer caso, os indícios que provam que os mercados espanhol, irlandês, grego e português não estavam abrangidos pela comunicação de acusações são muito mais conclusivos do que os indícios contrários, nomeadamente e sobretudo porque a Comissão não retomou nenhum destes quatro países na sua análise muito pormenorizada das sete iniciativas em matéria de preços, exposta na referida comunicação de acusações.

72 Uma comparação dos quadros recapitulativos das iniciativas em matéria de preços, quadros que figuram em anexo à comunicação de acusações e à decisão, mostram o aditamento, em quadros anexos à decisão, de duas notas sucintas relativas aos aumentos de preços em Espanha no que se refere às iniciativas de Outubro de 1989 (iniciativa E) e de Janeiro de 1991 (iniciativa G). Ora, apenas a segunda dessas notas visava a recorrente.

73 Nenhum dos quatro mercados mencionados consta da decisão a propósito da aplicação das decisões do PG Paperboard em matéria de preços nos mercados nacionais.

74 Na falta de indicação clara do mercado geográfico em causa, a Comissão violou a obrigação de definição adequada do mercado em questão, exigência que está, contudo, consagrada enquanto princípio geral pelo Tribunal de Primeira Instância (acórdão SIV e o./Comissão, já referido, n._ 159).

75 A decisão indica que o inquérito e a infracção abrangeram toda a Comunidade excepto Portugal e a Grécia (n._ 138 dos considerandos) não obstante a comunicação de acusações poder levar a crer que a Espanha e a Irlanda também não estavam abrangidas pelas acusações formuladas. Ao formular na decisão acusações relativamente às quais a recorrente não teve oportunidade para dar a conhecer o seu ponto de vista, a Comissão violou o artigo 4._ do Regulamento n._ 99/63/CEE da Comissão, da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 19._ do Regulamento n._ 17 do Conselho (JO L 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62, a seguir «Regulamento n._ 99/63»).

76 A Comissão considera que a comunicação de acusações, termo que designa tanto o texto de base como os seus anexos, abrange claramente os mercados espanhol e irlandês relativamente a todos os aspectos da infracção, e, parcialmente, os mercados português e grego, na medida em que as provas da concertação relativas a esses dois mercados se referem unicamente ao sistema de intercâmbio de informações. Segundo ela, não se pode contudo deduzir desta última circunstância que o cartel não abrangia toda a Comunidade. Pode simplesmente admitir-se que não existem provas formais de que o cartel se alargava a esses mercados.

77 Tratando-se da dimensão geográfica da infracção, a Comissão remete para os anexos 5, 6, 18, 20 a 22, 49, 55, 56, 58, 60, 65, 71, 80, 81, 86, 88, 109, 110, 111, 117 e 118 à comunicação de acusações. Tendo em conta estes documentos, conclui que a opção da recorrente de não se defender quanto a este ponto durante o procedimento administrativo não lhe é imputável.

78 No que se refere às iniciativas em matéria de preços, a Comissão considera que a análise comparativa dos quadros recapitulativos apresentada pela recorrente nos seus documentos escritos é manifestamente incorrecta, uma vez que as informações relativas aos aumentos de preços de Outubro de 1989 e de Janeiro de 1991 lhe foram comunicadas antes da adopção da decisão.

79 Quanto à necessidade de definir o mercado geográfico em causa antes de examinar a legalidade de um dado comportamento face ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado, considera que essa definição não é de modo nenhum necessária no âmbito da apreciação de uma restrição da concorrência, quando é evidente, como no caso em apreço, que a participação da quase totalidade das empresas que operam no mercado em causa no território geográfico da Comunidade exclui qualquer eventual aplicação da regra de minimis à infracção. Em seu entender, esta análise não é contrariada pelo acórdão SIV e o./Comissão, já referido.

Apreciação do Tribunal

80 O respeito dos direitos de defesa em qualquer processo susceptível de levar à aplicação de sanções, nomeadamente coimas ou sanções pucuniárias compulsórias, constitui um princípio fundamental do direito comunitário, que deve ser respeitado mesmo se se trata de um procedimento de carácter administrativo (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Fevereiro de 1979, Hoffmann-La Roche/Comissão, 85/76, Recueil, p. 461, n._ 9).

81 Em aplicação deste princípio, o artigo 19._, n._ 1, do Regulamento n._ 17 e o artigo 4._ do Regulamento n._ 99/63 impõem à Comissão que só tenha em conta na sua decisão final acusações relativamente às quais as empresas em causa tenham tido oportunidade de se pronunciar.

82 O artigo 1._, sétimo travessão, da decisão, acusa as empresas mencionadas nessa disposição de terem planeado e aplicado aumentos de preços simultâneos e uniformes «em toda a Comunidade».

83 Defendendo a recorrente que a comunicação de acusações não se referia a essa colusão sobre os preços em quatro Estados-Membros da Comunidade, isto é, a Espanha, a Irlanda, a Grécia e Portugal, é necessário verificar se, neste caso, a comunicação de acusações foi redigida em termos que, embora sucintos, eram suficientemente claros para permitir que os interessados tomassem efectivamente conhecimento da dimensão geográfica da referida colusão. É só com esta condição que a comunicação de acusações podia ter desempenhado a sua função, nos termos dos regulamentos comunitários, que é fornecer às empresas todos os elementos de informação necessários para lhes permitir que se defendam efectivamente antes de a Comissão tomar uma decisão definitiva (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1993, Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, C-89/85, C-104/85, C-114/85, C-116/85, C-117/85 e C-125/85 a C-129/85, Colect., p. I-1307, n._ 42).

84 A comunicação das acusações dirigida à recorrente inclui o documento de base, os anexos, e as circunstâncias específicas relativas à recorrente. O documento de base não inclui dispositivo, mas contém um «resumo da infracção». Este resumo relata, nomeadamente, que os fabricantes fornecedores de cartão na Comunidade «planearam e aplicaram aumentos de preços simultâneos e uniformes em toda a Comunidade», em infracção ao disposto no artigo 85._ do Tratado, em conivência ou em cumplicidade. Indica expressamente que deve ser visto à luz das acusações pormenorizadas comunicadas no resto do documento.

85 Uma leitura de conjunto da comunicação de acusações confirma que, segundo a Comissão, a infracção alegada se alargou a todo o território da Comunidade. A este respeito, a análise das alegações adiantadas na comunicação de acusações relativas à dimensão geográfica dos comportamentos anticoncorrenciais não pode ser limitada à colusão sobre os preços, uma vez que se conclui da comunicação de acusações (pp. 83 a 88) que as principais características do alegado sistema de «preço em detrimento da tonelagem» tinham por objectivo uma restrição da concorrência no interior do mercado comum.

86 No que se refere à análise dos factos, a comunicação de acusações indica (p. 37) no que se refere ao papel do JMC na colusão sobre os preços:

«O JMC discutiu a aplicação pormenorizada, mercado por mercado, das decisões em matéria de preços adoptadas pelo PWG. A sua função principal consistia `em determinar, por um lado, se os aumentos de preços podiam ser aplicados e, em caso afirmativo, definir os modos de o fazer e, por outro, em tentar estabelecer um sistema de preços equivalentes (isto é, uniformes) na Europa'.»

87 Quanto à colusão sobre as quotas de mercado, indica (p. 51) que o acordo sobre as quotas de mercado «se referia às quotas detidas no mercado da Europa ocidental no seu conjunto».

88 Quanto a este ponto, refere-se às declarações da Stora, segundo as quais (anexo 43 à comunicação de acusações, n._ 1.1):

«Tiveram lugar no PWG discussões sobre as quotas de mercado em termos de tonelagem. As qualidades de fibra virgem (qualidades GC e UC) e as qualidades de fibra reciclada (qualidades GD e UD) foram examinadas separadamente. As discussões incidiam sobre os níveis para a Europa no seu conjunto e para cada país visto individualmente. Para efeitos de discussão, a `Europa' referia-se aos países da Comunidade Europeia e da Associação Europeia de Comércio Livre.»

89 Relativamente à colusão sobre os preços, afirma (p. 69):

«Os documentos indicam [...] que foram aplicados sistemas de preços ditos `equivalentes' ou `europeus', tendo sido previstos simultaneamente em toda a Europa preços de catálogo do mesmo nível.»

90 No que se refere à apreciação jurídica, enuncia nomeadamente (p. 83), na parte intitulada «natureza da infracção»:

«As principais características do sistema do `preço em detrimento da tonelagem' eram as seguintes:

[...]

- Aplicação periódica de iniciativas concertadas em matéria de preços que consistiam na aplicação por todos os produtores de aumentos de preços simultâneos e uniformes nos diferentes mercados nacionais;

- realização de um sistema uniforme de fixação dos preços à escala europeia;

[...]»

91 Por fim, na parte intitulada «efeito sobre os intercâmbios entre Estados-Membros», a comunicação de acusações sublinha (p. 88):

«No caso em apreço, o carácter universal dos acordos colusórios, que abrangiam praticamente o conjunto das vendas de um produto industrial de primeira importância em toda a Comunidade (e noutros países da Europa ocidental) era forçosamente susceptível de desviar as correntes de intercâmbios da orientação que teriam seguido de outro modo.»

92 As indicações relativas à dimensão geográfica da infracção alegada, que constam do próprio corpo da comunicação de acusações, são confirmadas nesse documento pelos principais elementos de prova invocados pela Comissão, nomeadamente as declarações da Stora. Segundo estas, a dimensão geográfica dos comportamentos anticoncorrenciais em matéria de preços abrangia, pelo menos, todo o território da Comunidade. A título de exemplo, a propósito de duas iniciativas de aumentos de preços adoptadas em 1988, a Stora declara que «foi celebrado um acordo sobre a introdução (em 1988) de dois aumentos de preços em todo o mercado comunitário» (anexo 39 à comunicação de acusações, n._ 4). De igual modo, como já se recordou (v. supra n._ 88), a Stora declara que a colusão sobre as quotas de mercado se referia à Europa no seu conjunto.

93 Nestas condições, deve considerar-se que a comunicação de acusações satisfaz a obrigação de clareza recordada anteriormente no que se refere à dimensão geográfica das colusões em todo o território da Comunidade. Daqui resulta que o mero facto de alguns países da Comunidade não terem sido expressamente mencionados não é pertinente.

94 No caso em apreço, a Comissão também não estava obrigada a definir previamente à verificação da restrição da concorrência o mercado geográfico no qual esta teve lugar (v. infra n.os 231 e segs.).

95 No entanto, na medida em que se conclui das indicações dadas pela recorrente em resposta a uma pergunta escrita do Tribunal que a maioria das suas vendas era realizada no mercado espanhol, importa verificar que vários documentos mencionados na comunicação de acusações e anexos a esta se referem expressamente ao mercado espanhol (anexos 109, 110, 111, 117 e anexos técnicos E e G).

96 Em especial, na comunicação de acusações (p. 55), o anexo 109 está comentado nestes termos:

«Os produtores presentes na reunião [do JMC de 16 de Outubro de 1989...] fizeram o ponto da situação sobre a aplicação, nos diferentes mercados nacionais, do aumento de preços cuja entrada em vigor fora anunciada (para a maior parte dos países) para 1 de Outubro de 1989».

97 Ora, o mercado espanhol figura expressamente entre os mercados nacionais mencionados no anexo 109:

«c) Espanha

O aumento de preços é notificado e a sua aplicação não se confronta com nenhuma dificuldade de maior [...]»

98 Além disto, o anexo técnico E, que se refere às iniciativas em matéria de preços de Outubro de 1989, comenta e reproduz parcialmente o anexo 111 à comunicação de acusações, constituído por uma lista de preços obtida na Rena. É certo que esta lista foi identificada enquanto anexo 110 à comunicação de acusações, mas um leitor atento não poderia ignorar que se tratava na realidade do anexo 111.

99 Os dados reproduzidos referem-se aos preços por qualidade de cartão por país bem como à data do anúncio do aumento de preços e constam expressamente neste documentos dados relativos ao mercado nacional espanhol.

100 Por fim, o anexo técnico E precisa:

«Os pormenores dos aumentos de preços de cada fabricante estão indicados no quadro E.

(N.B.: a Finnboard, a Feldmühle e a Kopparfors aumentaram os seus preços para Espanha nas proporções indicadas no anexo 117)».

101 Apesar de a remissão para o anexo 117 à comunicação de acusações constituir um erro lamentável, uma vez que o anexo visado é, na realidade, o anexo 111, há que verificar que o mercado nacional espanhol está expressamente visado pelo anexo técnico E.

102 Por fim, o anexo técnico G (p. 4), que se refere às iniciativas em matéria de preços de Janeiro de 1991, contém a informação seguinte:

«Os pormenores dos aumentos de preços de cada fabricante estão indicados no quadro G.

Os principais produtores que abastecem o mercado espanhol (Cascades, Finnboard, Iggesund, Tampella Española, Feldmühle) anunciaram todos um aumento de 5 PTA/kg.»

103 Em definitivo, à luz das considerações precedentes, a recorrente não pode invocar uma violação dos seus direitos de defesa.

104 O fundamento deve portanto ser considerado improcedente.

C - Fundamento baseado em violação do artigo 190._ do Tratado

Argumentos das partes

105 Invocando o carácter relativo da exigência de fundamentação (conclusões do advogado-geral M. Van Gerven no acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Junho de 1994, Comissão/BASF e o., C-137/92 P, Colect., pp. I-2555, I-2559, I-2572), a recorrente defende que é preciso interpretar estritamente a obrigação de fundamentar uma decisão que inclui a aplicação de coimas, sobretudo porque a decisão da Comissão vai sensivelmente mais longe do que as decisões precedentes (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 1975, Groupment des fabricants de papiers peints de Belgique e o./Comissão, 73/74, Colect., p. 503).

106 No caso em apreço, a Comissão não apresentou, no que se refere à recorrente, de forma clara e coerente na decisão as considerações de facto e de direito que a levaram a adoptar a referida decisão. Nem a recorrente nem o Tribunal estão portanto em condições de conhecer os elementos do seu raciocínio. Isto vale em especial no que se refere à definição do mercado geográfico em causa e à apreciação da participação da recorrente nas pretensas infracções.

107 Por fim, a Comissão violou a obrigação de fundamentação relativamente à determinação do montante das coimas.

108 A Comissão alega que o fundamento deve ser rejeitado uma vez que não se baseia numa invocação geral do artigo 190._ do Tratado. De qualquer modo, é desprovido de fundamento uma vez que a decisão está suficientemente fundamentada.

Apreciação do Tribunal

109 Segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade permitir ao juiz comunitário exercer a fiscalização da legalidade da decisão e fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se a decisão é fundada ou se está eventualmente afectada por um vício que permita contestar a sua validade, esclarecendo-se que o alcance dessa obrigação depende da natureza do acto em causa e do contexto em que o mesmo foi adoptado (v., nomeadamente, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Dezembro de 1996, Van Megen Sports/Comissão, T-49/95, Colect., p. II-1799, n._ 51). Embora, por força do artigo 190._ do Tratado, a Comissão seja obrigada a mencionar os elementos de facto e de direito de que depende a justificação legal da decisão e as considerações que a levaram a adoptá-la, não se exige que discuta todos os pontos de facto e de direito suscitados no procedimento administrativo (v., nomeadamente, acórdão Van Landewyck e o./Comissão, já referido, n._ 66).

110 No caso em apreço, a decisão contém referências directas à recorrente no contexto da descrição dos aumentos concertados de preços (n.os 77 e 89 dos considerandos). Além disto, os pontos da decisão em que são descritas as discussões com objecto anticoncorrencial efectuadas no JMC (nomeadamente, n.os 44 a 46, 58, 71, 73, 84, 85 e 87 dos considerandos) visam necessariamente a recorrente, que não contesta ter participado em reuniões desse órgão. Por fim, a decisão expõe de modo claro o raciocínio seguido pela Comissão para considerar que a recorrente participou num acordo global (n.os 116 a 119 dos considerandos).

111 Nestas condições, a fundamentação da decisão deu à recorrente uma indicação suficiente para conhecer os principais elementos de facto e de direito que estavam na base do raciocínio que levou a Comissão a considerá-la responsável por uma infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

112 Tratando-se da fundamentação relativa ao mercado geográfico visado pela decisão, basta verificar que não apenas o dispositivo (artigo 1._), mas também os seus fundamentos (nomeadamente n._ 2, primeiro parágrafo, terceiro e quinto travessões, n._ 44, segundo parágrafo, segundo travessão, n._ 52 e n._ 76, primeiro parágrafo, dos considerandos) visam comportamentos anticoncorrenciais em todo o território da Comunidade.

113 Nestas condições, o argumento da recorrente baseado em fundamentação insuficiente neste ponto não pode ser acolhido.

114 Por fim, no que se refere à violação alegada da obrigação de fundamentação relativa à determinação do montante das coimas, há que verificar que essa violação, admitindo-a provada, só poderia afectar a legalidade do artigo 3._ da decisão, que aplica uma coima à recorrente. Os argumentos em causa devem portanto ser examinados com os fundamentos suscitados em apoio do pedido de anulação da coima ou de redução do seu montante (v. infra n.os 238 e segs.).

115 Daqui resulta que o fundamento deve ser julgado improcedente.

D - Fundamento baseado em aplicação errada do artigo 85._, n._ 1, do Tratado aos actos da recorrente

Argumentos das partes

116 Este fundamento divide-se em quatro partes.

117 Na primeira parte, a recorrente contesta qualquer participação num plano global de restrição da concorrência.

118 Recorda que reconheceu, na sua resposta à comunicação de acusações, que foi membro do PG Paperboard e que participou nas reuniões de alguns órgãos do PG Paperboard bem como no sistema de intercâmbio de informações da Fides. No entanto, ignorava o efeito restritivo, sobre a concorrência, das informações prestadas.

119 A sua adesão a um plano global de restrição da concorrência não pode ser deduzida da sua participação limitada nos órgãos do PG Paperboard e no intercâmbio de informações no seio desta estrutura. Além disto, a Comissão equipara erradamente a sua participação nos órgãos do PG Paperboard a uma participação do próprio cartel invocando, na sua contestação, os «órgãos do cartel».

120 A Comissão não apresentou provas credíveis e conclusivas que permitam relacionar a recorrente com o sistema comum. Com efeito, a recorrente não é mencionada em nenhum dos documentos invocados como prova na decisão pelo que só se pode considerar provado uma simples assistência a reuniões e uma participação no intercâmbio de informações. Quanto a isto, a recorrente insiste na diferença existente entre fazer parte de um plano global de restrição da concorrência e participar em certas acções susceptíveis de constituírem infracções menos graves no âmbito desse plano (assistência a reuniões e participação nos intercâmbios de informações).

121 A recorrente, após ter desenvolvido o teste utilizado pela Comissão para determinar a participação no cartel de cada um dos destinatários da decisão (n.os 116 a 121 dos considerandos da decisão), conclui que a aplicação desse teste à sua situação individual conduz a verificar a sua não participação no sistema comum alegado. Com efeito, nenhum dos elementos de prova invocados na decisão é susceptível de estabelecer um nexo entre a recorrente e a colusão.

122 Na segunda parte do fundamento, a recorrente alega que não participou nos aumentos de preços acordados na reunião do JMC de 6 de Setembro de 1990 (n._ 89 dos considerandos da decisão). Como já expôs na sua resposta à comunicação de acusações (n._ 5.2.2, nomeadamente n._ 5.2.2.1), não ficou provada a sua participação nas concertações sobre os preços e respectiva aplicação.

123 Além disto, nem a decisão nem a comunicação de acusações incluem o menor indício que permita concluir pela sua participação no controlo de execução dos aumentos de preços.

124 Na sua réplica, precisa que, quando afirma não ter participado em concertações de preços, é preciso entender antes de mais que não tinha nenhum compromisso de aplicar um determinado nível de preços, o que não significa que não estivesse ao corrente da existência de acordos que os grandes produtores tinham adoptado quanto a isto, provavelmente nas reuniões do PWG. É preciso compreender em seguida que, em cada instante, a sua política comercial seguia regras diferentes das aplicadas pelos seus concorrentes.

125 Numa terceira parte do fundamento, a recorrente alega que não participou numa colusão sobre a regulação dos volumes de produção nem numa colusão sobre as quotas de mercado.

126 Verifica que, segundo a decisão (n.os 51 e segs. dos considerandos), foi elaborado no PG Paperboard um mecanismo de regulação dos preços e dos volumes de produção, baseado numa alegada política de «preço em detrimento da tonelagem». Pretendeu-se também (n._ 58 dos considerandos) que os pequenos produtores de cartão, apesar de não terem estado a par das discussões pormenorizadas relativas às quotas de mercado realizadas no âmbito do PWG, estavam, enquanto participantes na política de «preço em detrimento da tonelagem» que todos haviam subscrito, conscientes do acordo geral entre os principais produtores no sentido de manterem níveis constantes de fornecimento e da necessidade de adaptarem o seu próprio comportamento a essa situação.

127 No entanto, não existe prova alguma dessa afirmação no que se refere à recorrente. Pelo contrário, a sua política comercial, explicitada na resposta à comunicação de acusações, consistiu sempre em aumentar a quantidade de produtos no mercado, mesmo em detrimento das margens realizadas nos preços obtidos.

128 Além disto, a Comissão imputa-lhe erradamente uma participação na colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento e na colusão sobre as quotas de mercado. Reconhece, com efeito, no n._ 116 dos considerandos da decisão que apenas os grandes produtores concluíram acordos sobre os volumes de produção e as quotas de mercado.

129 A acusação de repartição dos mercados também não está provada nem mesmo apresentada na decisão. De qualquer modo, a evolução das vendas da recorrente nos mercados comunitários basta para demonstrar que, no que lhe diz respeito, esta acusação é infundada.

130 Por fim, na quarta parte do fundamento, a recorrente alega que a ausência, na comunicação de acusações, de dados concretos relativos ao mercado geográfico em causa (v. supra n.os 66 e segs.) se repete na decisão. Com efeito, a única passagem desta que precisa os limites desse mercado geográfico é o n._ 138 dos considerandos, no qual se reconhece que as infracções não foram cometidas nos mercados português e grego. A recorrente salienta no entanto uma incoerência entre este número dos considerandos e o n._ 61 dos considerandos, onde se sublinha que o sistema de intercâmbio de informações da Fides abrangia toda a Europa ocidental.

131 Esta questão da definição do mercado geográfico em causa é essencial para apreciar a existência ou não de uma infracção, bem como a gravidade e o alcance desta. A recorrente apenas participou na infracção de uma forma muito marginal, uma vez que os mercados espanhol, português, grego e irlandês, onde exerceu a maior parte das suas actividades, não estão abrangidos pelo processo.

132 Além disto, os mercados espanhol e irlandês parecem ser considerados como abrangidos pelo mercado geográfico em causa (n._ 72 dos considerandos da decisão), apesar de a maior parte das provas apresentadas pela decisão não se referirem, de modo algum, a esses mercados nacionais. Em especial, as provas invocadas pela Comissão com o objectivo de demonstrar a existência de um acordo sobre os aumentos de preços só se referem aos mercados espanhol e irlandês a título dos aumentos de preços de Outubro de 1989, Abril de 1990 e Janeiro de 1991.

133 A Comissão contesta a admissibilidade dos argumentos apresentados pela recorrente na sua resposta à comunicação de acusações, uma vez que não está determinada a respectiva pertinência para pôr em causa a decisão impugnada.

134 Em seguida, tratando-se da primeira parte do fundamento, sublinha que, num caso como o em apreço, a abordagem correcta consiste em demonstrar a existência e o funcionamento bem como as principais características do cartel no seu conjunto, depois a determinar a existência de provas credíveis e conclusivas que permitam relacionar os diferentes produtores com o sistema comum e, para cada um deles, o período de participação. Neste contexto, invoca o n._ 116, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão, segundo o qual a colusão sobre os preços e o controlo dos volumes constituíam aspectos indissociáveis do mesmo plano global.

135 A Comissão presume que qualquer produtor que era membro do PG Paperboard e que participava nos seus diferentes comités participou no cartel, uma vez que o PG Paperboard tinha, em si, um objectivo principalmente ilegítimo. O PWG e o JMC ocuparam-se quase exclusivamente com a fixação dos preços e da partilha do mercado.

136 Além disto, numerosas provas directas demonstram a participação da recorrente na infracção, como o indicam a decisão e os anexos à comunicação de acusações. A recorrente é citada em documentos-chave que provam a existência do cartel no seu conjunto ou das suas diferentes manifestações.

137 Tratando-se da segunda parte do fundamento, a Comissão alega que está provada a participação da recorrente numa colusão sobre os preços. Com efeito, a sua resposta à comunicação de acusações não faz mais do que confirmar a sua participação na colusão sobre os preços, uma vez que a sua participação nos órgãos do cartel a impediriam de justificar a alegada diferença temporal no anúncio dos preços por motivos de adaptação inteligente às condições do mercado.

138 No que se refere à terceira parte do fundamento, a Comissão salienta que a recorrente não nega a sua participação nos principais órgãos do cartel, com excepção do PWG, e que, no que se refere a estes órgãos, foi provada a existência do acordo e da prática concertada imputada à recorrente (v., nomeadamente, n.os 111 a 113 dos considerandos da decisão). No entanto, não será necessário dispor de provas directas de que todos os alegados participantes tenham expressamente dado o seu consentimento ou abertamente cometido algum acto em apoio de um ou de todos os aspectos ou manifestações do cartel durante o período da sua existência. Este tipo de abordagem fragmentada não é possível devido a razões de direito material e a aspectos práticos uma vez que a infracção consistia, no essencial, na reunião dos produtores, ao longo dos anos, numa acção ilícita conjunta com um objectivo comum (mesmo número dos considerandos).

139 Mesmo se os grandes produtores discutiam sozinhos, nomeadamente, as quotas de mercado e os períodos de suspensão no âmbito do PWG, isto não significa que os pequenos produtores não estivessem implicados nesta parte da infracção. Com efeito, estes últimos estavam a par e aceitaram a política de repartição dos mercados no âmbito do PWG (n._ 58 dos considerandos da decisão), facilitaram a aplicação do sistema de controlo dos volumes de vendas e das quotas de mercado fornecendo informações úteis à Fides, e foram informados dos planos de suspensão da produção no âmbito do JMC (n._ 71 dos considerandos).

140 A Comissão conclui que também não deve ser acolhida a quarta parte do fundamento.

141 Quanto a isto, refere-se, no essencial, aos argumentos anteriormente apresentados (v. supra n.os 76 e segs.). Salienta no entanto que o n._ 138 dos considerandos da decisão enuncia que não existem elementos de prova fidedignos em matéria de acordos de fixação de preços na Grécia e em Portugal, e não que não houve infracções nestes países. Refuta também a alegada incoerência mencionada pela recorrente entre a cobertura europeia do intercâmbio de informações no âmbito da Fides, por um lado, e a falta de provas do acordo sobre os preços na Grécia e em Portugal, por outro.

Apreciação do Tribunal

142 Há, antes de mais, que examinar em conjunto as três primeiras partes do fundamento baseadas na falta de participação da recorrente na infracção verificada no artigo 1._ da decisão. O quarto fundamento baseado na falta de definição suficientemente precisa do mercado geográfico em causa será examinado separadamente.

Quanto às três primeiras partes do fundamento baseadas na falta de participação da recorrente na infracção verificada no artigo 1._ da decisão

143 A título liminar, importa recordar que, por força do artigo 44._, n._ 1, alínea c), do Regulamento de Processo, a petição deve indicar o objecto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para que o demandado possa preparar a sua defesa e o Tribunal decidir a acção, eventualmente, sem mais informações em seu apoio. A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que a acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta, resultem, pelo menos sumariamente, mas de uma maneira coerente e compreensível, do texto da própria petição (v., nomeadamente, despacho do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Novembro de 1993, Koelman/Comissão, T-56/92, Colect., p. II-1267, n._ 21).

144 No caso em apreço, há que considerar que, quando se refere aos argumentos avançados na sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente não invoca nem um fundamento nem um argumento distinto dos apresentados na petição inicial. A referência, na petição, a alguns desenvolvimentos incluídos na resposta à comunicação de acusações só visa apoiar e completar, em pontos específicos, o próprio corpo da petição. Nestas condições, os argumentos invocados pela recorrente no âmbito do presente fundamento devem ser considerados admissíveis.

145 Convém examinar em primeiro lugar a questão de saber se a Comissão provou a participação da recorrente num infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado no que se refere ao período entre o mês de Março de 1988 até Fevereiro de 1989, data a partir da qual a recorrente admite ter começado a participar nas reuniões do JMC. Em segundo lugar, será examinada a questão de saber se a Comissão provou a participação da recorrente numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado no que se refere ao período restante, isto é de Fevereiro de 1989 a Abril de 1991.

1. Período entre o mês de Março de 1988 e o mês de Fevereiro de 1989

146 O n._ 162, quarto parágrafo, dos considerandos da decisão enuncia:

«A Enso Española começou a participar regularmente em reuniões de um dos grupos do PG Paperboard (o comité económico) em 1987, tendo assistido pela primeira vez a uma conferência de presidentes em 25 de Maio de 1988. A empresa alega ter começado a participar no JMC apenas em Fevereiro de 1989. Contudo, não participou na primeira iniciativa em matéria de preços de 1988, podendo considerar-se que a sua participação efectiva na infracção se iniciou próximo dessa data.»

147 Para provar a participação da recorrente numa infracção às regras comunitárias da concorrência durante o período em análise, a Comissão baseia-se na participação desta empresa nas reuniões da PC de 25 de Maio e de 17 de Novembro de 1988 (quadro 3 anexo à decisão), na sua participação na reunião do COE de 3 de Maio de 1988 (quadro 6 anexo à decisão) e, por fim, no comportamento efectivo da recorrente em matéria de preços.

148 Deve analisar-se cada um destes elementos de prova pela ordem mencionada.

a) Participação da recorrente em algumas reuniões da PC

149 No que respeita à participação da recorrente em duas reuniões bem determinadas da PC, a Comissão não invoca nenhum elemento de prova em relação ao objectivo destas. Por conseguinte, quando se refere a esta participação como elemento de prova da participação da empresa numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado, a Comissão baseia-se necessariamente numa descrição geral, contida na decisão, do objectivo das reuniões deste órgão, bem como nos elementos de prova invocados na decisão para sustentar a referida descrição.

150 A este propósito, afirma-se na decisão: «... Tal como esclareceu o grupo Stora, uma das funções do PWG consistia em explicar à conferência de presidentes as medidas necessárias para disciplinar o mercado... Deste modo, os directores executivos que participavam nas conferências de presidentes eram informados das decisões adoptadas pelo PWG e das instruções que deveriam dar aos seus departamentos de vendas por forma a executar as iniciativas em matéria de preços acordadas» (n._ 41, primeiro parágrafo, dos considerandos). A Comissão sublinha igualmente: «O PWG reunia-se invariavelmente antes das conferências de presidentes e, visto que a mesma pessoa presidia a ambas as reuniões, era sem dúvida essa pessoa que comunicava o resultado das deliberações do PWG aos restantes `presidentes' que não eram membros do círculo mais restrito» (n._ 38, segundo parágrafo, dos considerandos).

151 O grupo Stora indica que os participantes nas reuniões da PC foram informados das decisões adoptadas pelo PWG (anexo 39 à comunicação de acusações, n._ 8). No entanto, a exactidão desta afirmação é contestada por diversas empresas que participaram nas reuniões da PC. Em particular, é implicitamente contestada pela recorrente, na medida em que esta contesta a sua participação numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Consequentemente, as declarações do grupo Stora relativas ao papel da PC não podem, sem outros elementos de prova, ser consideradas prova suficiente do objectivo das reuniões do referido órgão.

152 É certo que os autos contêm um documento - uma declaração de 22 de Março de 1993 de um antigo membro da administração da Feldmühle (Sr. Roos) - que corrobora, à primeira vista, as afirmações do grupo Stora. O Sr. Roos indica nomeadamente: «O conteúdo das discussões no âmbito do PWG era transmitido às empresas que não estavam representadas nesse grupo, por ocasião da conferência dos presidentes que tinha lugar imediatamente depois ou, se a conferência dos presidentes não tivesse imediatamente lugar, por ocasião do JMC.» Todavia, embora este documento não seja expressamente invocado na decisão em apoio das alegações da Comissão relativas ao objectivo das reuniões da PC, não pode deixar de ser considerado uma prova suplementar que acresce às declarações do grupo Stora. Efectivamente, sendo essas declarações uma síntese das respostas fornecidas por cada uma das empresas controladas pelo grupo Stora durante o período de infracção, entre as quais a Feldmühle, o antigo membro da administração desta última empresa constitui necessariamente uma das fontes das declarações do próprio grupo Stora.

153 A Comissão defende na decisão que o anexo 61 à comunicação de acusações, nota encontrada nas instalações do agente comercial da Mayr-Melnhof no Reino Unido que se refere a uma reunião que decorreu em Viena, em 12 e 13 de Dezembro de 1986, confirma «a declaração do grupo Stora, segundo a qual a conferência de presidentes debateu, de facto, uma colusão em matéria de política de preços» (n.os 41, terceiro parágrafo, e 75, segundo parágrafo, dos considerandos). Este documento contém a seguinte informação:

«Política de preços no Reino Unido

O representante da Weig participou numa recente reunião da Fides. Declarou que pensava que 9% era demasiado elevado para o Reino Unido e que tinham acordado em 7%! Enorme desilusão, visto que significa um `nível de negociação' para todos os outros. A política de preços no Reino Unido será confiada à RHU, com o apoio da [Mayr-Melnhof], mesmo que isso provoque uma redução temporária da tonelagem, enquanto nos esforçamos por manter o objectivo dos 9% (o que se verá). O [grupo Mayr-Melnhof/FS] prossegue uma política de crescimento no Reino Unido, mas a diminuição dos lucros é séria, pelo que nos devemos bater para retomar o controlo dos preços. A [Mayr-Melnhof] não contesta que o facto de se saber que o grupo aumentou em 6 000 toneladas a sua tonelagem na Alemanha não ajudou propriamente a resolver a situação!»

154 A reunião Fides, a que é feita referência no início do excerto citado, é provavelmente, segundo a Mayr-Melnhof (resposta a um pedido de informações, anexo 62 à comunicação de acusações), a reunião da PC de 10 de Novembro de 1986, na qual a recorrente não esteve presente nos termos do quadro 3 anexo à decisão.

155 Observe-se que o documento analisado comprova que a Weig reagiu fornecendo indicações sobre a sua futura política em matéria de preços no Reino Unido relativamente a um nível inicial de aumentos de preços.

156 No entanto, não se pode considerar que tal documento comprova que a Weig reagiu em relação a um nível determinado de aumentos de preços acordado entre as empresas reunidas no quadro do PG Paperboard numa data anterior a 10 de Novembro de 1986.

157 Efectivamente, a Comissão não invoca nenhum elemento de prova neste sentido. Além disso, a referência da Weig a um aumento de preços de «9%» pode explicar-se pelo anúncio de um aumento de preços, no Reino Unido, da Thames Board Ltd, em 5 de Novembro de 1986 (anexo A-12-1). Este anúncio foi tornado público muito rapidamente, como resulta de um artigo de jornal (anexo A-12-3). Finalmente, a Comissão não apresentou nenhum documento susceptível de constituir uma prova directa de que discussões sobre os aumentos de preços tenham tido lugar nas reuniões da PC. Nestas condições, não se pode excluir que as afirmações da Weig, tal como relatadas no anexo 61 à comunicação de acusações, tenham sido feitas à margem da reunião da PC de 10 de Novembro de 1986, como a Weig referiu por diversas vezes ao longo da audiência.

158 A Comissão defende também na decisão que «A documentação encontrada pela Comissão na empresa FS-Karton (parte do grupo M-M) vem confirmar que, no final de 1987, tinha sido concluído um acordo nos dois grupos de presidentes quanto às questões, relacionadas entre si, da regulação do volume e da disciplina em matéria de preços» (n._ 53, primeiro parágrafo, dos considerandos). Refere-se quanto a isto, ao anexo 73 da comunicação de acusações, nota confidencial de 28 de Dezembro de 1988 enviada pelo director comercial responsável pelas vendas do grupo Mayr-Melnhof na Alemanha (Sr. Katzner) ao director geral da Mayr-Melnhof na Áustria (Sr. Gröller) e que tinha por objecto a situação no mercado.

159 O autor do documento evoca, em jeito de introdução, a cooperação mais estreita a nível europeu no «círculo dos presidentes» («Präsidentenkreis»), expressão interpretada pela Mayr-Melnhof como visando simultaneamente o PWG e a PC num contexto geral, ou seja, sem referência a um acontecimento ou a uma reunião especial (anexo 75 à comunicação de acusações, n._ 2.a).

OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC: 694A0348.1

160 Embora não se conteste no âmbito do presente processo que o anexo 73 à comunicação de acusações constitui uma prova que corrobora as afirmações do grupo Stora relativas à existência de uma colusão sobre as quotas de mercado entre as empresas admitidas no «círculo dos presidentes» e de uma colusão sobre os períodos de suspensão entre as mesmas empresas, a Comissão não apresenta, no entanto, nenhum outro elemento de prova que confirme que a PC teve como objectivo, nomeadamente, debater a colusão sobre as quotas de mercado e a regulação dos volumes de produção. Consequentemente, a expressão «círculo dos presidentes» («Präsidentenkreis»), utilizada no anexo 73 à comunicação de acusações, não pode, não obstante as explicações fornecidas pela Mayr-Melnhof, ser interpretada no sentido de que comporta uma referência a outros órgãos para além do PWG.

161 Tendo em conta o que precede, a Comissão não provou que as reuniões da PC, à margem das actividades lícitas, tenham assumido um carácter anticoncorrencial. Daqui resulta que a Comissão não podia deduzir dos elementos de prova invocados que as empresas que participaram nas reuniões desse órgão incorreram numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

162 Há portanto que concluir que a participação da recorrente em duas reuniões da PC não prova que tenha infringido o artigo 85._, n._ 1, do Tratado, durante o período entre o mês de Março de 1988 e o mês de Fevereiro de 1989.

b) Participação da recorrente numa reunião do COE

163 É ponto assente que a recorrente participou, durante o período entre o mês de Março de 1988 e o mês de Fevereiro de 1989, numa única reunião do COE, isto é, a de 3 de Maio de 1988. Não tendo a Comissão invocado qualquer elemento de prova relativo a esta reunião, há que examinar, de modo mais geral, se as reuniões do COE tinham um objectivo anticoncorrencial.

164 Segundo a decisão, «O `tema central' das discussões no comité económico era a análise e a avaliação da situação do mercado do cartão nos diversos países» (n._ 50, primeiro parágrafo, dos considerandos). O COE «... discutia (inter alia) a evolução dos preços nos mercados nacionais e as encomendas em carteira e comunicava as suas conclusões ao JMC (ou, antes do final de 1987, ao seu antecessor, o comité de marketing)» (n._ 49, primeiro parágrafo, dos considerandos).

165 Segundo a Comissão, «... As discussões sobre as condições de mercado não tinham um carácter genérico: as discussões sobre a situação de cada mercado nacional devem ser avaliadas no contexto das iniciativas em matéria de preços previstas, incluindo a necessidade de suspensão temporária de actividade por forma a apoiar os aumentos de preços» (n._ 50, primeiro parágrafo, dos considerandos). Além disso, a Comissão considera: «... O comité económico poderá ter tido uma participação menos directa na fixação de preços enquanto tal, mas não é plausível que os participantes nesse comité não tivessem conhecimento de que as informações que conscientemente forneciam ao JMC seriam utilizadas para objectivos ilícitos» (n._ 119, segundo parágrafo, dos considerandos).

166 Em apoio das suas alegações segundo as quais as discussões no COE tinham objectivos anticoncorrenciais, a Comissão faz referência a um único documento, uma nota confidencial redigida por um representante da FS-Karton (do grupo Mayr-Melnhof) relativa aos pontos essenciais da reunião do COE de 3 de Outubro de 1989 (anexo 70 à comunicação de acusações).

167 Na decisão, a Comissão resume o conteúdo deste documento da seguinte forma:

«... para além de uma análise pormenorizada da procura, da produção e das encomendas pendentes em cada mercado nacional, a reunião abordara os seguintes temas:

- forte resistência dos clientes relativamente ao último aumento de preços da qualidade GC, que entrara em vigor em 1 de Outubro,

- situação dos cadernos de encomendas dos produtores das qualidades GC e GD, incluindo posições individuais,

- relatórios sobre as suspensões de actividade levadas a cabo e previstas,

- problemas específicos da aplicação dos aumentos de preços no Reino Unido e seus efeitos sobre o diferencial de preços necessário entre as qualidades GC e GD

e

- comparação entre o orçamento e as encomendas entradas de cada grupo nacional» (n._ 50, segundo parágrafo, dos considerandos).

168 Há que admitir que esta descrição do conteúdo do documento é, no essencial, correcta. Todavia, a Comissão não invoca nenhum elemento de prova em apoio da sua afirmação de que o anexo 70 à comunicação de acusações pode ser considerado «... como indicativ[o] da verdadeira natureza das deliberações deste órgão» (n._ 113, último parágrafo, dos considerandos da decisão). Além disso, o grupo Stora declara: «O JMC foi criado em finais de 1987 e teve a sua primeira reunião no início de 1988, assumindo, a partir dessa data, uma parte das funções do Comité Económico. As outras funções do Comité Económico foram assumidas pelo Comité Estatístico» (anexo 39 à comunicação de acusações, n._ 13). Pelo menos no que respeita ao período iniciado no princípio de 1988, único período em que a recorrente foi considerada como tendo cometido uma infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado, as declarações do grupo Stora não contêm, portanto, nenhum elemento que corrobore a alegação da Comissão relativamente ao pretenso objectivo anticoncorrencial das deliberações deste órgão. Finalmente, a Comissão também não invoca elementos de prova que permitam considerar que os participantes nas reuniões do COE eram informados da natureza exacta das reuniões do JMC, órgão ao qual o COE apresentava relatórios. Por conseguinte, não se pode excluir que participantes nas reuniões do COE, que não participavam simultaneamente nas reuniões do JMC, não tenham tido conhecimento da utilização precisa, pelo JMC, dos relatórios preparados pelo COE.

169 Consequentemente, o anexo 70 à comunicação de acusações não esclarece a verdadeira natureza das discussões havidas nas reuniões do COE.

170 Convém acrescentar que a própria Comissão parece considerar que a participação nas reuniões do COE não constitui uma prova suficiente de uma qualquer infracção, uma vez que a recorrente, que assistiu a reuniões do COE em 1987, não foi considerada como tendo cometido uma infracção às regras da concorrência antes de Março de 1988.

171 Tendo em conta o que precede, o facto de a recorrente ter, no período em causa, participado numa reunião do COE não prova a sua participação numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

c) Comportamento efectivo da recorrente em matéria de preços

172 No que se refere ao período em causa (Março de 1988 até Fevereiro de 1989), conclui-se do quadro B anexo à decisão que a Comissão verificou que a recorrente aplicou, respectivamente em 1 de Março e 1 de Abril de 1988, aumentos de preços em França e no Reino Unido, isto é, em datas que correspondem às alegadamente acordadas no âmbito dos órgãos do PG Paperboard. A Comissão, segundo o mesmo quadro, não constatou aumentos dos preços da recorrente noutros mercados nacionais por ocasião da iniciativa de aumentos de preços de Março/Abril de 1988.

173 Além disto, segundo o quadro C anexo à decisão, a Comissão não dispõe de nenhuma informação relativa a eventuais aumentos de preços da recorrente por ocasião da iniciativa de aumentos de preços de Outubro de 1988.

174 Nestas condições, o comportamento efectivo em matéria de preços da recorrente, tal como provado pela Comissão, não corrobora a sua afirmação de que a recorrente tenha participado numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

d) Conclusão relativa ao período em causa

175 Tendo em conta as considerações precedentes, os elementos de prova invocados pela Comissão, mesmo vistos no seu conjunto, não provam uma participação da recorrente numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado durante o período entre o mês de Março de 1988 e o mês de Fevereiro de 1989.

2. Período entre o mês de Fevereiro de 1989 e o mês de Abril de 1991

176 Nos termos do artigo 1._ da decisão, as empresas visadas nesta disposição infringiram o disposto no n._ 1 do artigo 85._ do Tratado ao participarem, no caso da recorrente desde, pelo menos, Março de 1988 até, pelo menos, final de Abril de 1991, num acordo e numa prática concertada com início em meados de 1986, através dos quais os fornecedores de cartão na Comunidade, nomeadamente, «acordaram aumentos de preços regulares para cada qualidade do produto em cada moeda nacional» e «planearam e aplicaram aumentos de preços simultâneos e uniformes em toda a Comunidade», «chegaram a um acordo quanto à manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais» e «adoptaram, principalmente a partir do início de 1990, medidas concertadas por forma a controlar o fornecimento do produto na Comunidade e a assegurar a aplicação dos referidos aumentos concertados de preços».

177 Daqui resulta que, segundo a decisão, cada uma das empresas mencionadas no seu artigo 1._ infringiu o artigo 85._, n._ 1, do Tratado, ao participar numa única infracção constituída por colusões em três domínios diferentes, mas que prosseguem um objectivo comum. Essas colusões devem ser consideradas elementos constitutivos do acordo global.

178 Nestas condições há que examinar separadamente se a recorrente participou em cada uma das colusões em causa.

a) Quanto à participação da recorrente numa colusão sobre os preços

179 Segundo a Comissão, o principal objectivo do JMC era, desde o seu início:

«- determinar se os aumentos de preços podiam entrar em vigor e, em caso afirmativo, de que modo, e apresentar as suas conclusões ao PWG,

- fixar as modalidades da aplicação das iniciativas em matéria de preços decididas pelo PWG, relativamente a cada país e aos principais clientes, com o objectivo de atingir um sistema de preços equivalente (isto é, uniforme) na Europa...» (n._ 44, último parágrafo, dos considerandos da decisão).

180 Mais concretamente, a Comissão defende, no n._ 45, primeiro e segundo parágrafos, dos considerandos da decisão:

«... Este comité discutia o modo como, em cada mercado, os aumentos de preços acordados no PWG deveriam ser aplicados por cada produtor. Os aspectos práticos da entrada em vigor dos aumentos de preços propostos eram abordados em `mesas redondas', tendo cada participante a oportunidade de se pronunciar sobre o aumento proposto.

As dificuldades na aplicação dos aumentos de preços decididos pelo PWG, ou a recusa ocasional de cooperação, eram comunicados ao PWG, que (segundo o grupo Stora) `tentaria então alcançar o nível de cooperação considerado necessário'. O JMC elaborava relatórios separados para as qualidades GC e GD. Se o PWG alterava uma decisão em matéria de política de preços com base nos relatórios apresentados pelo JMC, as medidas necessárias para aplicar essa alteração seriam discutidas na reunião seguinte do JMC.»

181 Deve reconhecer-se que a Comissão faz correctamente referência, em apoio das indicações relativas ao objecto das reuniões do JMC, às declarações do grupo Stora (anexos 35 e 39 à comunicação de acusações).

182 Além disso, embora não disponha de nenhuma acta oficial de uma reunião do JMC, a Comissão obteve da Mayr-Melnhof e da Rena certas notas internas relativas às reuniões de 6 de Setembro de 1989, 16 de Outubro de 1989 e 6 de Setembro de 1990 (anexos 117, 109 e 118 à comunicação de acusações). Essas notas, cujo conteúdo é descrito nos n.os 80, 82 e 87 dos considerandos da decisão, relatam as discussões pormenorizadas havidas no decurso dessas reuniões sobre as iniciativas concertadas em matéria de preços. Constituem, portanto, elementos de prova que corroboram claramente a descrição das funções do JMC feita pelo grupo Stora.

183 A este propósito, remeta-se, a título de exemplo, para a nota obtida junto da Rena sobre a reunião do JMC de 6 de Setembro de 1990 (anexo 118 à comunicação de acusações) e na qual se indica, nomeadamente:

«O aumento de preços será anunciado na próxima semana, em Setembro.

França 40 FF Países Baixos 14 Alemanha 12 DM Itália 80 LIT Bélgica 2,50 BFR Suíça 9 FS Reino Unido 40 UKL Irlanda 45 IRL

Todas as qualidades deveriam ser objecto do mesmo aumento, GD, UD, GT, GC, etc.

Um único aumento de preços por ano. Para os fornecimentos a partir de 7 de Janeiro. O mais tardar em 31 de Janeiro. Carta de 14 de Setembro com aumento de preços (Mayr-Melnhof). 19 de Setembro, envio pela Feldmühle da sua carta. Cascades antes do fim de Setembro. Todos devem enviar as respectivas cartas antes de 8 de Outubro.»

184 Como explica a Comissão nos n.os 88 a 90 dos considerandos da decisão, foi-lhe possível obter, além disso, documentos internos que permitem concluir que as empresas, nomeadamente as citadas expressamente no anexo 118 à comunicação de acusações, anunciaram efectivamente e levaram a efeito os aumentos de preços acordados.

185 Tratando-se do anexo 117 à comunicação de acusações, nota que incide sobre a reunião do JMC de 6 de Setembro de 1989, a Comissão defende que constitui uma prova da colusão sobre a iniciativa de aumento dos preços de Outubro de 1989. Indica nomeadamente que esta nota «revela pormenores dos aumentos de preços que tinham sido anunciados em cada moeda e avalia as reacções dos clientes e os progressos já alcançados no sentido da aplicação dos aumentos em cada mercado nacional» (n._ 80, quinto parágrafo, dos considerandos da decisão). A recorrente, que participou na reunião do JMC de 6 de Setembro de 1989 (quadro 4 anexo à decisão), não contesta que o anexo 117 à comunicação de acusações se refere a esta reunião. Também não contesta a descrição do conteúdo deste documento constante da decisão.

186 No que se refere, em seguida, à afirmação da Comissão de que as empresas visadas no artigo 1._ da decisão fiscalizaram a aplicação dos aumentos de preços (n._ 82 dos considerandos da decisão), ela refere-se ao anexo 109 à comunicação de acusações, que diz respeito à reunião do JMC de 16 de Outubro de 1989. Ora, a recorrente não contesta a descrição, que consta da decisão, do conteúdo deste documento.

187 Embora os documentos invocados pela Comissão digam unicamente respeito a um reduzido número de reuniões do JMC realizadas ao longo do período abrangido pela decisão, todas as provas documentais disponíveis corroboram a indicação do grupo Stora, segundo a qual o objectivo principal do JMC era determinar e planificar a aplicação dos aumentos de preços acordados, bem como fiscalizar a sua aplicação efectiva. A este propósito, a quase total inexistência de actas, oficiais ou internas, das reuniões do JMC deve ser considerada prova suficiente da alegação da Comissão de que as empresas que participaram nas reuniões procuraram dissimular a verdadeira natureza das discussões no âmbito deste órgão (v., designadamente, n._ 45 dos considerandos da decisão). Nestas circunstâncias, o ónus da prova inverteu-se e incumbia às empresas destinatárias da decisão, que participaram nas reuniões deste órgão, provar que o objecto deste era lícito. Não tendo tal prova sido feita pelas empresas, a Comissão considerou correctamente que as discussões entre as empresas, ao longo destas reuniões, tinha um objectivo principalmente anticoncorrencial.

188 No que se refere à situação individual da recorrente, a sua participação em nove reuniões do JMC, e nomeadamente na de 6 de Setembro de 1989, deve, à luz do que precede, ser considerada como constituindo uma prova suficiente da sua participação na colusão sobre os preços.

189 Na medida em que a recorrente defende que o seu comportamento efectivo no mercado não é conciliável com as afirmações da Comissão relativas à sua participação numa colusão sobre os preços, este argumento não pode ser acolhido.

190 Em primeiro lugar, a existência da colusão sobre os preços não pode ser confundida com a aplicação dos aumentos de preços acordados. Com efeito, as provas apresentadas pela Comissão têm um tal valor probatório que as informações relativas ao comportamento efectivo da recorrente no mercado não podem afectar as conclusões da Comissão sobre a sua participação na colusão sobre os preços. As alegações da recorrente podem, no máximo, tender a demonstrar que o seu comportamento não seguiu o acordado entre as empresas reunidas no PG Paperboard.

191 Em segundo lugar, é jurisprudência assente que o facto de uma empresa não respeitar os resultados de reuniões de carácter manifestamente anticoncorrencial não a isenta de culpa, decorrente da sua participação no cartel, uma vez que não se distanciou publicamente do respectivo conteúdo (v., por exemplo, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Tréfileurope/Comissão, T-141/89, Colect., p. II-791, n._ 85). Mesmo admitindo que o comportamento da recorrente no mercado não tenha sido conforme ao comportamento acordado, isso em nada afecta a sua responsabilidade na violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado, na medida em que não se distanciou publicamente do conteúdo das reuniões em que tomou parte.

192 Tendo em conta as considerações precedentes, a Comissão provou que a recorrente participou na colusão sobre os preços durante o período entre o mês de Fevereiro de 1989 e o mês de Abril de 1991.

b) Quanto à participação da recorrente numa colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento

193 Segundo a decisão, as empresas presentes nas reuniões do PWG participaram, a partir de finais de 1987, numa colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento das instalações, tendo estes períodos de suspensão sido efectivamente aplicados a partir de 1990.

194 Com efeito, conclui-se do n._ 37, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão que a verdadeira tarefa do PWG, tal como descrita pela Stora, consistia nomeadamente em «discussões e concertação sobre os mercados, quotas de mercado, preços, aumentos de preços e capacidades». Além disto, referindo-se ao «acordo alcançado no âmbito do PWG durante 1987» (n._ 52, primeiro parágrafo, dos considerandos), a Comissão afirma que visava nomeadamente a manutenção de «níveis constantes de fornecimento» (n._ 58, primeiro parágrafo, dos considerandos).

195 Quanto ao papel do PWG na colusão sobre o controlo do abastecimento, que caracterizava a análise dos períodos de suspensões de funcionamento, a decisão afirma que o PWG desempenhou um papel determinante na instituição de tais períodos quando, a partir de 1990, se verificou um aumento das capacidades de produção e uma diminuição da procura: «... a partir do início de 1990, os líderes da indústria... consideraram oportuno concertarem-se, no âmbito do PWG, sobre a necessidade de procederem a suspensões de funcionamento. Os principais produtores concluíram que não poderiam aumentar a procura através de uma diminuição dos preços e que o prosseguimento da produção a 100% iria simplesmente originar uma descida dos preços. Em teoria, o período de suspensão necessário para reequilibrar a oferta e a procura podia ser calculado através dos relatórios relativos às capacidades...» (n._ 70 dos considerandos da decisão).

196 A decisão sublinha também: «Todavia, o PWG não definiu formalmente o período de `suspensão' a ser praticado por cada produtor. Segundo o grupo Stora, existiam dificuldades práticas para estabelecer um plano coordenado relativo aos períodos de suspensão que abrangesse todos os produtores. O Stora afirma que por estas razões apenas `existia um sistema de incentivo flexível'» (n._ 71 dos considerandos da decisão).

197 Convém salientar que o grupo Stora explica (anexo 39 à comunicação de acusações, n._ 24): «Com a adopção pelo PWG da política do preço em detrimento da tonelagem e a instituição progressiva de um sistema de preços equivalentes a partir de 1988, os membros do PWG reconheceram que era necessário respeitar períodos de suspensão de funcionamento a fim de manter os preços face a uma crescente diminuição da procura. Se os fabricantes não tivessem recorrido às suspensões de funcionamento, ter-lhes-ia sido impossível manter os níveis de preços acordados face a um crescente aumento dos excedentes de produção.»

198 No número seguinte da sua declaração, acrescenta: «Em 1988 e 1989, a indústria podia funcionar praticamente a 100% das suas capacidades. Os períodos de suspensão de funcionamento além dos períodos normais de encerramento para reparações e férias tornaram-se necessários a partir de 1990... Mais tarde, afigurou-se necessário proceder a suspensões de funcionamento quando o fluxo de encomendas estagnava, a fim de manter a política do preço em detrimento da tonelagem. Os períodos de suspensão a respeitar pelos produtores (para garantir a manutenção do equilíbrio entre a produção e o consumo) podiam ser calculados com base nos relatórios sobre as capacidades. O PWG não indicava formalmente o período de suspensão a respeitar, embora existisse um sistema de incentivo flexível...»

199 A Comissão baseia também as suas conclusões no anexo 73 à comunicação de acusações (v. supra n._ 158).

200 Segundo este documento, referido nos n.os 53 a 55 dos considerandos da decisão, a cooperação mais estreita no «círculo dos presidentes» («Präsidentenkreis»), decidida em 1987, fez «vencedores» e «vencidos».

201 As razões fornecidas pelo autor para explicar que considera a Mayr-Melnhof um «vencido» na época da redacção da nota constituem elementos de prova importantes da existência de uma colusão entre os participantes nas reuniões do PWG sobre os períodos de suspensão de funcionamento.

202 Efectivamente, o autor afirma:

«4) É quanto a este ponto que a concepção das partes interessadas sobre o objectivo prosseguido começa a divergir.

...

c) Todos os departamentos de vendas e agentes europeus foram isentos do seu orçamento em termos de volume, tendo sido seguida, quase sem excepções, uma política de preços rígida (os nossos colaboradores nem sempre compreenderam a mudança da nossa atitude em relação ao mercado - anteriormente, a única exigência era a tonelagem; daí em diante, passou a contar unicamente a disciplina em matéria de preços, com o risco de uma suspensão do funcionamento das máquinas).»

203 A Mayr-Melnhof defende (anexo 75 à comunicação de acusações) que a passagem acima reproduzida visa uma situação interna da empresa. No entanto, analisado à luz do contexto mais geral da nota, este excerto comprova a instituição, ao nível das equipas comerciais, de uma política rigorosa decidida no «círculo dos presidentes». Assim, o documento deve ser interpretado no sentido de que significa que os participantes no acordo de 1987, ou seja, pelo menos os participantes nas reuniões do PWG, mediram indiscutivelmente as consequências da política adoptada, na hipótese de esta ser aplicada com rigor.

204 Com base no que precede, deve concluir-se que a Comissão provou a existência de uma colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento entre os participantes nas reuniões do PWG.

205 Nos termos da decisão, as empresas que participaram nas reuniões do JMC, entre as quais a recorrente, participaram igualmente nessa colusão.

206 A este propósito, a Comissão indica nomeadamente:

«Para além do sistema da Fides, que fornecia dados globais, nas reuniões do JMC os produtores comunicavam habitualmente as suas encomendas em carteira aos seus concorrentes.

A informação relativa ao número de encomendas pendentes convertidas em dias de trabalho era importante por dois motivos:

- para decidir se existiam as condições adequadas para introduzir um aumento de preços acordado,

- para determinar o período de suspensão necessário por forma a manter o equilíbrio entre a oferta e a procura...» (n._ 69, terceiro e quarto parágrafos, dos considerandos da decisão).

207 Sublinha igualmente:

«As notas não oficiais relativas a duas reuniões do JMC, uma em Janeiro de 1990 (v. considerando 84) e a outra em Setembro de 1990 (considerando 87), bem como outros documentos (considerandos 94 e 95) confirmam [...] que os principais produtores mantinham os seus concorrentes de menores dimensões informados de forma completa e permanente, a nível do PG Paperboard, quanto aos seus planos de recorrer a suspensões adicionais como alternativa à descida de preços» (n._ 71, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão).

208 As provas documentais relativas às reuniões do JMC (anexos 109, 117 e 118 da comunicação de acusações) confirmam que discussões relativas à questão dos períodos de suspensão tiveram lugar no contexto da preparação dos aumentos de preços acordados. Em especial, o anexo 118 à comunicação de acusações, nota da Rena datada de 6 de Setembro de 1990 (v. também supra, n._ 87), menciona os montantes dos aumentos de preços em vários países, as datas dos anúncios futuros desses aumentos, bem como a situação dos cadernos de encomendas expressos em dias de trabalho para diversos fabricantes. O autor do documento assinala que certos fabricantes previam períodos de suspensão de funcionamento, o que exprime, por exemplo, da seguinte maneira:

«Kopparfors 5-15 dias 5/9 suspenderá o seu funcionamento durante cinco dias.»

209 Além disso, embora os anexos 117 e 109 à comunicação de acusações não contenham directamente indicações sobre os períodos de suspensão previstos, a verdade é que revelam que o estado das encomendas em carteira e o das entradas de encomendas foram discutidos no decurso das reuniões do JMC de 6 de Setembro de 1989 e de 16 de Outubro de 1989. Ora, recorde-se que a recorrente participou na reunião do JMC de 6 de Setembro de 1989 (v. supra n._ 185).

210 Estes documentos, lidos em conjugação com as declarações do grupo Stora, constituem prova suficiente da participação dos fabricantes, representados nas reuniões do JMC, na colusão sobre os períodos de suspensão. Efectivamente, as empresas que participaram na colusão sobre os preços estavam necessariamente conscientes de que a análise da situação das encomendas em carteira e as entradas de encomendas, bem como as discussões sobre os eventuais períodos de suspensão, não tinham como único objectivo determinar se as condições do mercado eram propícias a um aumento concertado dos preços, mas igualmente determinar se se impunha recorrer aos períodos de suspensão do funcionamento das instalações para evitar que o nível de preços acordado fosse comprometido por um excedente de oferta. Em especial, resulta do anexo 118 à comunicação de acusações que os participantes na reunião do JMC, de 6 de Setembro de 1990, concordaram em aumentar os preços a curto prazo, embora diversos fabricantes tenham declarado que se preparavam para interromper a produção. Mais tarde, as condições do mercado foram tais que a aplicação efectiva de um futuro aumento dos preços imporia, segundo tudo indica, o recurso a períodos de suspensão (suplementares), o que constitui, portanto, uma consequência aceite, pelo menos implicitamente, pelos fabricantes.

211 Deste modo, e sem que seja necessário analisar os outros elementos de prova invocados pela Comissão na decisão (anexos 102, 113, 130 e 131 à comunicação de acusações), deve considerar-se que a Comissão provou que as empresas que participaram nas reuniões do JMC e na colusão sobre os preços participaram numa colusão sobre os períodos de suspensão.

212 Importa rejeitar, neste contexto, o argumento da recorrente de que a sua não participação na colusão sobre os períodos de suspensão é demonstrada pelo facto de nunca ter efectuado suspensões da produção.

213 Em primeiro lugar, a Comissão admite na decisão que foram os principais produtores que chamaram a si a responsabilidade de reduzir a produção para manter os níveis de preços (n._ 71, segundo parágrafo, dos considerandos).

214 Em segundo lugar, admitindo mesmo que se prova que a recorrente utilizou as suas capacidades de produção no máximo e que tal utilização não estava em conformidade com o que tinha acordado com os seus concorrentes no JMC, isto não é susceptível de permitir a sua participação na colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1991, Enichem Anic/Comissão, T-6/89, Colect., p. II-1623, n._ 165).

215 A recorrente deve portanto ser considerada como tendo participado, durante o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991, numa colusão sobre os períodos de suspensão.

c) Quanto à participação da recorrente numa colusão sobre as quotas de mercado

216 A recorrente contesta ter participado numa colusão sobre as quotas de mercado sem no entanto contestar a afirmação, constante da decisão, de que os produtores que participaram nas reuniões do PWG concluíram um acordo prevendo «o `congelamento' das quotas de mercado da Europa Ocidental dos principais produtores nos níveis já existentes, não devendo ser feita qualquer tentativa no sentido de adquirir novos clientes ou alargar as actividades existentes através de uma política de preços agressiva» (n._ 52, primeiro parágrafo, dos considerandos).

217 Nestas condições, saliente-se que, no que se refere às empresas que não participaram nas reuniões do PWG a Comissão afirma:

«Apesar de os pequenos produtores de cartão que assistiam às reuniões da JMC não estarem a par das discussões pormenorizadas relativas às quotas de mercado realizadas no âmbito do PWG, estavam, enquanto participantes na política de `preço em detrimento da tonelagem' que todos haviam subscrito, conscientes do acordo geral entre os principais produtores no sentido de manterem `níveis constantes de fornecimento' e tinham indubitavelmente conhecimento da necessidade de adaptarem o seu comportamento a essa situação» (n._ 58, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão).

218 Embora tal não resulte expressamente da decisão, a Comissão confirma, neste ponto, as declarações do grupo Stora, segundo as quais:

«Outros fabricantes que não participavam no PWG não eram, em geral, informados em detalhe sobre as discussões relativas às quotas de mercado. No entanto, no quadro da política do preço em detrimento da tonelagem, na qual participavam, deveriam ter tido consciência do acordo entre os principais fabricantes, no sentido de não baixar os preços graças à manutenção de níveis de oferta constantes.

No que respeita à oferta [de cartão] GC, as quotas dos fabricantes que não participavam no PWG eram de qualquer forma tão pouco significativas que a sua participação ou não participação nos acordos sobre as quotas de mercado não tinha praticamente nenhuma relevância num sentido ou noutro» (anexo 43 à comunicação de acusações, n._ 1.2).

219 Por conseguinte, a Comissão baseia-se principalmente, tal como o grupo Stora, na suposição de que, mesmo na falta de provas directas, as empresas que não assistiram às reuniões do PWG, mas que se provou terem subscrito os outros elementos constitutivos da infracção descritos no artigo 1._ da decisão, devem ter tido consciência da existência da colusão sobre as quotas de mercado.

220 Este raciocínio não pode ser acolhido. Em primeiro lugar, a Comissão não invoca nenhum elemento de prova susceptível de demonstrar que as empresas que não assistiram às reuniões do PWG subscreveram um acordo geral prevendo, nomeadamente, o congelamento das quotas de mercado dos principais produtores.

221 Em segundo lugar, o simples facto de as referidas empresas terem participado numa colusão sobre os preços e na colusão sobre os períodos de suspensão não prova que tenham igualmente participado numa colusão sobre as quotas de mercado. A este propósito, a colusão sobre as quotas de mercado não estava, contrariamente ao que parece afirmar a Comissão, intrinsecamente ligada à colusão sobre os preços e/ou à colusão sobre os períodos de suspensão. Basta ter presente que a colusão sobre as quotas de mercado dos principais produtores reunidos no quadro do PWG tinha como finalidade, segundo a decisão (v., supra, n.os 78 a 80), manter as quotas de mercado a níveis constantes, com modificações ocasionais, mesmo nos períodos em que as condições do mercado, nomeadamente o equilíbrio entre a oferta e a procura, fossem tais que nenhuma regulação da produção fosse necessária para garantir a aplicação efectiva dos aumentos de preços acordados. Daqui resulta que a eventual participação na colusão sobre os preços e/ou na colusão sobre os períodos de suspensão não demonstra que as empresas que não assistiram às reuniões do PWG participaram na colusão sobre as quotas de mercado, nem que tenham tido ou devessem necessariamente ter tido conhecimento de tal colusão.

222 Finalmente, em terceiro lugar, importa assinalar que, no n._ 58, segundo e terceiro parágrafos, dos considerandos da decisão, a Comissão invoca, como elemento de prova suplementar da afirmação em causa, o anexo 102 à comunicação de acusações, nota obtida junto da Rena e que diz respeito, segundo a decisão, a uma reunião especial do Nordic Paperboard Institute realizada em 3 de Outubro de 1988. A este propósito, basta ter presente, por um lado, que a recorrente não era membro do Nordic Paperboard Institute e, por outro, que a referência, neste documento, à eventual necessidade de aplicar períodos de suspensão, não pode, pelas razões já evocadas, constituir prova de uma colusão sobre as quotas de mercado.

223 Ora, para que a Comissão possa considerar cada uma das empresas visadas por uma decisão, como a decisão controvertida, responsável, durante determinado período, por um acordo global, deve demonstrar que cada uma delas concordou com a adopção de um plano global que abranja os elementos constitutivos do cartel ou participou directamente, ao longo desse período, em todos os seus elementos. Uma empresa pode igualmente ser considerada responsável por um acordo global, mesmo que se prove que apenas participou num ou em diversos elementos constitutivos desse acordo, desde que soubesse, ou tivesse necessariamente a obrigação de saber, por um lado, que a colusão na qual participava se inscrevia num plano global e, por outro, que esse plano global abrangia a totalidade dos elementos constitutivos do cartel. Quando assim é, o facto de a empresa em causa não ter participado directamente em todos os elementos constitutivos do acordo global não a isenta da responsabilidade pela infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Tal circunstância pode, porém, ser tomada em consideração ao apreciar a gravidade da infracção de que é acusada.

224 No caso em apreço, há que constatar que a Comissão não provou que a recorrente sabia, ou devia necessariamente saber, que o seu próprio comportamento ilícito se inscrevia num plano global que abrangia, além da colusão sobre os preços e da colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento em que participou efectivamente, uma colusão sobre as quotas de mercado dos principais produtores.

225 Tendo em conta o que precede, a Comissão não provou que a recorrente participou numa colusão sobre as quotas de mercado durante o período entre o mês de Março de 1989 e o mês de Abril de 1991.

d) A participação da recorrente num plano comum do sector de restrição da concorrência

226 A argumentação da recorrente deve ser interpretada no sentido de que a Comissão violou o artigo 85._, n._ 1, do Tratado na medida em que considerou que lhe bastava demonstrar a existência e o funcionamento bem como as principais características do cartel no seu conjunto e demonstrar, em seguida, a existência de provas credíveis e conclusivas que permitam relacionar os diferentes produtores ao sistema comum e, para cada um deles, o período de participação nesse sistema (n._ 116, dos considerandos da decisão).

227 Já se verificou que a Comissão provou a participação da recorrente, durante o período em questão, na colusão sobre os preços e na colusão sobre os períodos de suspensão, mas não numa colusão sobre as quotas de mercado.

228 Nessas condições, o plano comum do sector de restrição da concorrência, em que a recorrente participou segundo o artigo 1._ da decisão, só abrangeu, quanto a si, a colusão sobre os preços e a colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento.

e) Conclusões sobre o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991

229 À luz de tudo o que precede, importa anular, relativamente à recorrente, o artigo 1._, oitavo travessão, da decisão segundo o qual o acordo e a prática concertada em que participou teve por objecto a «manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais».

230 Quanto ao resto, a Comissão provou a participação da recorrente na infracção verificada no artigo 1._ da decisão durante o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991.

Quanto à quarta parte do fundamento baseada na falta de definição do mercado geográfico em causa

231 Nos termos do artigo 85._, n._ 1, do Tratado, são proibidos «todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum».

232 No caso em apreço, a Comissão considerou que a recorrente participou num acordo e numa prática concertada que tinham por objectivo restringir a concorrência no interior do mercado comum e que afectava o comércio entre os Estados-Membros (n.os 133 a 138 dos considerandos da decisão). Como já se viu (v. supra n._ 112), conclui-se dos fundamentos da decisão que a Comissão considerou que as colusões entre as empresas abrangeram todo o território da Comunidade. Na medida em que a Comissão verificou portanto uma infracção que tinha por objectivo uma restrição da concorrência em todo o território da Comunidade, a verificação dessa restrição da concorrência não exige qualquer definição prévia do mercado geográfico (v., no mesmo sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/94, Colect. 1965-1968, p. 423, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Fevereiro de 1995, SPO e o./Comissão, T-29/92, Colect., p. II-289, n._ 74).

233 A recorrente não pode defender que, tendo em conta o n._ 138 dos considerandos, os comportamentos anticoncorrenciais não incidiram sobre os mercados português e grego. No referido ponto dos fundamentos, a Comissão salienta o carácter universal dos acordos colusórios que abrangiam praticamente o conjunto das vendas de um produto industrial de primeira importância em toda a Comunidade. Quanto a isto, a nota de pé de página segundo a qual «os únicos Estados-Membros relativamente aos quais não existem elementos de prova fidedignos em matéria de acordos de fixação de preços são Portugal e a Grécia, países que não possuem qualquer produtor nacional de cartão» deve, à luz do conjunto dos fundamentos da decisão e do seu dispositivo, ser entendida no sentido de que, segundo a Comissão, a infracção verificada visava todo o mercado comunitário, apesar de não existirem provas directas no que se refere aos mercados português e grego.

234 Daqui decorre que a Comissão não defendeu que os comportamentos anticoncorrenciais alegados na decisão não abrangiam os mercados grego e português. Assim, a contradição interna na decisão denunciada pela recorrente (v. supra n._ 130) não existe, devendo este argumento ser afastado.

235 A quarta parte do fundamento não deve portanto ser acolhida.

236 Conclui-se do que precede que é conveniente anular o artigo 1._ da decisão relativamente à recorrente, na medida em que esta disposição enuncia que a recorrente participou numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado antes do mês de Fevereiro de 1989. Além disto, importa anular, relativamente à recorrente, o artigo 1._, oitavo travessão, da decisão, segundo o qual o acordo e a prática concertada em que participou tinham por objectivo «a manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais».

237 Quanto ao restante, o fundamento deve ser julgado improcedente.

Pedido de anulação da coima ou de redução do seu montante

A - Fundamento baseado em violação do artigo 190._ do Tratado relativo às coimas

Argumentos das partes

238 A recorrente invoca uma violação da obrigação de fundamentação no que diz respeito ao modo de cálculo do montante da coima, nomeadamente na medida em que a Comissão não indicou nem o exercício de referência escolhido para aplicar a percentagem do volume de negócios, nem a percentagem do volume de negócios escolhida como taxa de base antes da tomada em consideração das circunstâncias atenuantes e agravantes, nem mesmo do volume de negócios escolhido. De igual modo, a simples enumeração das circunstâncias que a Comissão teve alegadamente em conta para determinar o montante das coimas não constitui uma fundamentação suficiente.

239 O direito a uma fiscalização jurisdicional efectiva exige que as empresas possam verificar que não foi cometida qualquer discriminação entre empresas acusadas conjuntamente de participar numa infracção colectiva, única e contínua. Ao considerar inadmissível que os particulares devam interpor um recurso para conhecer pormenorizadamente o modo de cálculo do montante da coima (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Tréfilunion/Comissão, T-148/89, Colect., p. II-1063, n._ 142), o Tribunal erigiu em princípio geral a colocação à disposição dos interessados das informações adequadas que lhe permitam compreender o modo de cálculo utilizado. Essas informações devem portanto a fortiori ser fornecidas durante o processo jurisdicional.

240 A recorrente insiste na distinção entre o poder discricionário da Comissão quanto à determinação do montante das coimas a aplicar e a obrigação de fundamentar as suas decisões. O poder discricionário da Comissão não pode prevalecer sobre o direito a uma protecção jurisdicional efectiva. Assim, a Comissão deve fornecer as explicações pormenorizadas sobre a maneira como obtém a percentagem final do volume de negócios seleccionado para fixar cada coima, o que não viola o carácter secreto das deliberações da Comissão e também não implica uma divulgação de segredos de negócios das empresas. Com efeito, os volume de negócios realizados pelas empresas destinatárias da decisão não são nem secretos nem confidenciais.

241 A Comissão contesta a interpretação que a recorrente faz do acórdão Tréfilunion/Comissão, já referido. Nesse acórdão, o Tribunal considerou que a acusação baseada em insuficiência de fundamentação não podia ser acolhida, na medida em que se deviam considerar suficientes os elementos de fundamentação contidos na decisão em causa. Ora, também no caso em apreço, a Comissão fundamentou suficientemente a coima aplicada à recorrente, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça na matéria (n.os 167 a 172 dos considerandos da decisão).

242 Tratando-se da afirmação da recorrente de que a indicação da percentagem do volume de negócios utilizada para fixar o montante da coima não constitui um meio de aceder às informações confidenciais das empresas que participaram no cartel, a Comissão assinala que essas informações são normalmente publicadas sob forma agregada o que não permite que os concorrentes conheçam com exactidão o volume de negócios da empresa em causa num sector determinado da sua actividade económica e ainda menos num mercado de produtos determinado.

Apreciação do Tribunal

243 O objectivo da obrigação de fundamentar uma decisão individual já foi recordado (v. supra n._ 109).

244 No que respeita a uma decisão que, como no presente caso, aplica coimas a diversas empresas por uma infracção às regras comunitárias da concorrência, há que determinar o alcance da obrigação de fundamentação, tendo em conta, designadamente, que a gravidade das infracções deve ser apreciada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração (despacho do Tribunal de Justiça de 25 de Março de 1996, SPO e o./Comissão, C-137/95 P, Colect., p. I-1611, n._ 54).

245 Além disso, ao fixar o montante de cada coima, a Comissão dispõe de um poder de apreciação e não pode ser obrigada a aplicar, para esse efeito, uma fórmula matemática precisa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Martinelli/Comissão, T-150/89, Colect., p. II-1165, n._ 59).

246 Na decisão, os critérios tomados em conta para determinar o nível geral das coimas e o montante das coimas individuais figuram, respectivamente, nos n.os 168 e 169 dos considerandos. Além disso, no que respeita às coimas individuais, a Comissão explica, no n._ 170 dos considerandos, que as empresas que participaram nas reuniões do PWG foram, em princípio, consideradas líderes, ao passo que as outras empresas foram consideradas «membros normais» deste. Finalmente, nos n.os 171 e 172 dos considerandos, indica que os montantes das coimas aplicadas à Rena e ao grupo Stora devem ser substancialmente reduzidos, a fim de ter em conta a sua cooperação activa com a Comissão, e que oito outras empresas, entre as quais a recorrente, podem igualmente beneficiar de uma redução, numa proporção inferior, pelo facto de, na resposta que apresentaram à comunicação de acusações, não terem negado as principais alegações de facto em que a Comissão baseava as suas acusações.

247 Nas peças processuais apresentadas ao Tribunal e na resposta que deu a uma pergunta escrita deste, a Comissão explicou que as coimas foram calculadas com base no volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias da decisão, no mercado comunitário do cartão, em 1990. Coimas de um nível de base de 9 ou de 7,5% deste volume de negócios individual foram assim aplicadas, respectivamente, às empresas consideradas líderes do cartel e às outras empresas. Finalmente, a Comissão tomou em consideração a eventual atitude cooperante de certas empresas ao longo do procedimento administrativo. Duas empresas beneficiaram, por esse facto, de uma redução de dois terços do montante das suas coimas, enquanto outras empresas beneficiaram de uma redução de um terço.

248 De resto, resulta de um quadro fornecido pela Comissão, e que contém indicações quanto à fixação do montante de cada uma das coimas individuais, que, embora não tenham sido determinadas aplicando de forma estritamente matemática apenas os dados numéricos acima mencionados, os referidos dados foram sistematicamente tomados em conta para efeitos do cálculo das coimas.

249 Ora, a decisão não precisa que as coimas foram calculadas com base no volume de negócios realizado por cada uma das empresas, no mercado comunitário do cartão, em 1990. Além disso, as taxas de base de 9 e de 7,5% aplicadas para calcular as coimas a pagar, respectivamente, pelas empresas consideradas líderes e pelos «membros normais», não figuram na decisão. Também não constam da decisão as taxas das reduções concedidas à Rena e ao grupo Stora, por um lado, e a oito outras empresas, por outro.

250 No caso vertente, importa considerar, em primeiro lugar, que, interpretados à luz da exposição pormenorizada que é feita, na decisão, das alegações de facto formuladas em relação a cada destinatário da decisão, os n.os 169 a 172 dos considerandos desta contêm uma indicação suficiente e pertinente dos elementos de apreciação tomados em consideração para determinar a gravidade e a duração da infracção cometida por cada uma das empresas em causa (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1991, Petrofina/Comissão, T-2/89, Colect., p. II-1087, n._ 264). De igual modo, o n._ 168 dos considerandos, que deve ser lido à luz das considerações gerais sobre as coimas que constam do n._ 167, contém uma indicação suficiente dos elementos de apreciação tidos em conta para determinar o nível geral das coimas.

251 Em segundo lugar, quando o montante de cada coima é, como no presente caso, determinado com base na tomada em consideração sistemática de certos dados precisos, a indicação, na decisão, de cada um desses factores permite às empresas apreciar mais correctamente se a Comissão cometeu algum erro ao fixar o montante da coima individual e se o montante de cada coima individual se justifica relativamente aos critérios gerais aplicados. No caso vertente, a indicação, na decisão, dos factores em causa, isto é, o volume de negócios de referência, o ano de referência, as taxas de base consideradas e a taxa de redução do montante das coimas, não incluiu a divulgação implícita do volume de negócios preciso das empresas destinatárias da decisão, divulgação que poderia ter constituído uma violação do artigo 214._ do Tratado. Efectivamente, o montante final de cada coima individual não resulta, como a própria Comissão sublinhou, de uma aplicação estritamente matemática dos referidos factores.

252 Aliás, a Comissão reconheceu, na audiência, que nada a impediu de indicar, na decisão, os factores tomados sistematicamente em conta e que tinham sido divulgados numa conferência de imprensa que teve lugar no dia em que a decisão foi adoptada. A este propósito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação de uma decisão deve figurar no próprio corpo dessa decisão e que explicações posteriores fornecidas pela Comissão não podem, salvo circunstâncias excepcionais, ser tomadas em consideração (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Julho de 1992, Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, T-61/89, Colect., p. II-1931, n._ 131, e, no mesmo sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão, T-30/89, Colect., p. II-1439, n._ 136).

253 Não obstante o que acaba de se afirmar, deve sublinhar-se que a fundamentação relativa à fixação do montante das coimas, contida nos n.os 167 a 172 dos considerandos da decisão, é, pelo menos, tão pormenorizada como as constantes das decisões anteriores da Comissão sobre infracções semelhantes. Ora, embora o fundamento baseado num vício de fundamentação seja de ordem pública, no momento da adopção da decisão, nenhuma crítica tinha ainda sido feita pelo juiz comunitário quanto à prática seguida pela Comissão em matéria de fundamentação das coimas aplicadas. Só no acórdão de 6 de Abril de 1995, Tréfilunion/Comissão, já referido (n._ 142), e em dois outros acórdãos proferidos no mesmo dia, Société métallurgique de Normandie/Comissão (T-147/89, Colect., p. II-1057, publicação sumária), e Société des treillis et panneaux soudés/Comissão, (T-151/89, Colect., p. II-1191, publicação sumária), é que o Tribunal de Primeira Instância sublinhou, pela primeira vez, ser desejável que as empresas pudessem conhecer em pormenor o modo de cálculo da coima que lhes foi aplicada, sem serem obrigadas, para tal, a interpor um recurso jurisdicional contra a decisão da Comissão.

254 Daqui resulta que, quando uma decisão conclui pela existência de uma infracção às regras da concorrência e aplica coimas às empresas que nela participaram, a Comissão deve, se tiver sistematicamente tomado em conta certos elementos de base para fixar o montante das coimas, indicar esses elementos no corpo da decisão, a fim de permitir aos destinatários desta verificar as razões que levaram à fixação do nível da coima e apreciar a existência de uma eventual discriminação.

255 Nas circunstâncias excepcionais salientadas no n._ 253, supra, e tendo em conta que a Comissão se mostrou disposta a fornecer, na fase contenciosa do processo, qualquer informação pertinente relativa ao modo de cálculo das coimas, a falta de fundamentação específica, na decisão, quanto ao modo de cálculo das coimas, não deve, neste caso, ser considerada uma violação da obrigação de fundamentação, susceptível de justificar a anulação total ou parcial das coimas aplicadas.

256 Consequentemente, o presente fundamento não pode ser acolhido.

B - Fundamento baseado numa apreciação incorrecta dos critérios de determinação da coima indicados na decisão

Argumentos das partes

257 A recorrente contesta em primeiro lugar, a afirmação da Comissão de que as empresas destinatárias da decisão cometeram uma infracção com todo o conhecimento de causa e tentaram dissimular a existência do cartel (n._ 167 dos considerandos da decisão). Os documentos dos autos não incluem a menor prova nem o menor indício de uma implicação da recorrente quanto a isto.

258 Em segundo lugar, a recorrente deveria ter tido em conta o facto de a actividade da recorrente estar concentrada nos mercados português, grego, irlandês e espanhol, isto é, em mercados nacionais não abrangidos pela decisão.

259 Em terceiro lugar, não aplicou correctamente face à recorrente o critério relativo ao papel desempenhado por cada empresa nos acordos de colusão (n._ 169, primeiro parágrafo, primeiro travessão, dos considerandos da decisão). Com efeito, não apenas não pretendeu conhecer o grau exacto da participação e de intervenção de cada empresa no cartel, mas limitou-se à distinção, demasiado global entre os líderes e as outras empresas. Esta distinção constituiu o critério de aplicação das duas taxas de coimas de 9% e de 7,5%. A primeira foi aplicada aos líderes que, segundo as informações fornecidas à imprensa pelo membro da Comissão responsável pelas questões da concorrência, foram as empresas que decidiram e impuseram os acordos. A segunda foi aplicada às restantes empresas, entre as quais a recorrente. No entanto, estas duas taxas não reflectem convenientemente o papel desempenhado por cada empresa nos acordos de colusão. A diferença entre as duas percentagens é proporcionalmente muito inferior à escolhida nos processos semelhantes anteriores. Quanto a isto, a recorrente recapitula num quadro as diferentes coimas, expressas em percentagens, impostas às empresas que pertencem respectivamente à categoria de líderes e à das outras empresas, no presente processo e em processos semelhantes anteriores.

260 A Comissão defende que a recorrente não pode seriamente pretender ter ignorado o carácter ilícito dos seus actos num caso de violação das normas de concorrência tão flagrante como o em apreço. Além disto, está provada a supressão dos traços documentais das actividades do PWG e do JMC para esconder o comportamento ilícito.

261 Quanto ao alcance geográfico da infracção, a Comissão remete para os argumentos já invocados (v. supra n.os 76 e segs. e n._ 141).

262 Por fim, considera ter tido suficientemente em conta o papel desempenhado pelas diferentes empresas no cartel distinguindo as categorias de participantes (n._ 170 dos considerandos da decisão).

Apreciação do Tribunal

263 Nos termos do n._ 167, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão, «Um aspecto particularmente grave da infracção consiste no facto de, na sua tentativa de dissimular a existência do cartel, as empresas terem chegado a orquestrar antecipadamente a data e a sequência dos anúncios dos novos aumentos de preços a serem feitos por cada grande produtor.» A decisão salienta também que «... os produtores poderiam, através deste elaborado esquema de fraude, atribuir a série de aumentos de preços uniformes, regulares e a nível de todo o sector do cartão, ao fenómeno do `comportamento em oligopólio' (n._ 73, terceiro parágrafo, dos considerandos). Finalmente, segundo o n._ 168, sexto travessão, dos considerandos, na determinação do nível geral das coimas, a Comissão tomou em consideração o facto de «[terem sido] adoptadas medidas complexas no sentido de dissimular a verdadeira natureza e extensão da colusão (ausência de quaisquer actas oficiais ou documentação do PWG e do JMC; os participantes eram dissuadidos de tomar notas; encenação das datas e ordenação do anúncio dos aumentos de preços por forma a que pudesse ser alegado que tais aumentos `seguiam' o primeiro, etc.)».

264 Há que reconhecer que a Comissão concluiu acertadamente dos elementos de prova recolhidos que as empresas programaram as datas e a ordem das cartas que anunciavam os aumentos de preços, a fim de tentarem dissimular a existência da concertação sobre os preços. Esta programação resulta sobretudo de declarações do grupo Stora (anexo 39 à comunicação de acusações, n._ 30): «Não existia um processo normal quanto a saber quem anunciaria em primeiro lugar um aumento de preços e quem se seguiria. O PWG discutia e chegava a acordo quanto à identidade do fabricante que anunciaria em primeiro lugar cada aumento de preços e quanto às datas em que os outros principais produtores anunciariam os seus aumentos. O esquema não era sempre o mesmo.» A sua existência é igualmente corroborada pela nota da Rena relativa à reunião do JMC de 6 de Setembro de 1990 (anexo 118 à comunicação de acusações). Este documento contém indicações precisas sobre as datas de anúncio dos aumentos de preços de Janeiro de 1991 para certas empresas membros do PWG (Mayr-Melnhof, Feldmühle e Cascades), datas que correspondem exactamente às datas em que as empresas enviaram realmente as respectivas cartas de anúncio (v. n.os 87 e 88 dos considerandos da decisão).

265 A inexistência de actas oficiais e a inexistência quase total de notas internas sobre as reuniões do PWG e do JMC constituem, atendendo ao seu número, à sua duração e à natureza das discussões em causa, uma prova suficiente da alegação da Comissão segundo a qual os participantes eram dissuadidos de tomar notas.

266 Resulta de quanto precede que as empresas que participaram nas reuniões destes órgãos não só estavam bem conscientes da ilegalidade do seu comportamento como adoptaram medidas de dissimulação da colusão. Por conseguinte, ao apreciar a gravidade da infracção, a Comissão considerou com razão que estas medidas constituíam circunstâncias agravantes.

267 Tratando-se em seguida do argumento da recorrente de que a Comissão deveria ter tido em conta o facto de a actividade da recorrente se concentrar nos mercados português, grego, irlandês e espanhol, basta concluir que decorre da decisão que esses mercados nacionais estavam abrangidos pelas colusões celebradas entre as empresas (v. supra n._ 112). Nestas condições, a Comissão não cometeu um erro de interpretação ao atender, para efeitos da determinação do montante da coima, ao volume de negócios realizado por cada uma das empresas no mercado comunitário do cartão em 1990.

268 Por fim, no que se refere ao argumento da recorrente de que a Comissão não apreciou correctamente o papel que desempenhou nos acordos de colusão, importa recordar que a Comissão provou que, devido à sua participação nas reuniões do JMC, a recorrente participou na colusão sobre os preços e na colusão sobre os períodos de suspensão durante o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991.

269 Ao invés, admitiu-se que a recorrente não podia ser considerada responsável por uma colusão sobre as quotas de mercado.

270 Não obstante esta última conclusão, o Tribunal considera, no exercício da sua competência de plena jurisdição, que a infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado de que é acusada a recorrente é de tal modo grave que não há que reduzir o montante da coima.

271 Quanto a isto, importa salientar que a recorrente não participou nas reuniões do PWG e não foi, portanto, penalizada enquanto líder do cartel. Não tendo, segundo os próprios termos da Comissão, desempenhado um papel de incentivadora do cartel (n._ 170, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão), o nível da coima que lhe foi aplicada eleva-se a 7,5% do seu volume de negócios comunitário realizado no sector do cartão em 1990. Ora, esse nível geral das coimas é justificado (v. infra n.os 349 e segs.).

272 Além disto, ainda que a Comissão tenha considerado incorrectamente que os produtores não representados no PWG estavam «conscientes» da colusão sobre as quotas de mercado (n._ 58, primeiro parágrafo, dos considerandos), a verdade é que se conclui da própria decisão que foram as empresas reunidas no PWG que se concertaram a propósito do «congelamento» das quotas de mercado (nomeadamente, n._ 52 dos considerandos) e que não houve qualquer discussão sobre as quotas de mercado detidas pelos produtores que não estavam aí representados. Aliás, como a Comissão declarou no n._ 116, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão «devido às suas próprias características, os acordos de partilha de mercado (principalmente o congelamento das quotas descrito nos considerandos 56 e 57) [envolveram] em primeiro lugar os principais produtores». A colusão sobre as quotas de mercado erradamente imputada à recorrente só revestiu, segundo a própria Comissão, um carácter acessório quanto, nomeadamente, à colusão sobre os preços.

273 Na medida em que a recorrente defende que a coima aplicada é excessiva em relação às coimas aplicadas aos líderes há que sublinhar que a Comissão considerou justamente que as empresas que participaram nas reuniões do PWG deveriam ser particularmente responsabilizadas pela infracção (n._ 170 dos considerandos da decisão). Seguidamente, fez uma justa apreciação da gravidade da infracção cometida respectivamente pelos líderes do acordo e pelos «membros normais» considerando, para efeitos do cálculo das coimas aplicadas a estas duas categorias de empresas, percentagens de base de 9% e de 7,5% do volume de negócios relevante.

274 Deve ser sublinhado, neste contexto, que a recorrente não invocou elementos precisos susceptíveis de apoiar a sua afirmação segundo a qual as percentagens de base consideradas para efeitos do cálculo das coimas não reflectiam correctamente a responsabilidade especial que recai sobre as empresas que participaram nas reuniões do PWG.

275 Tendo em conta o que precede, o fundamento não pode ser acolhido. C - Fundamento baseado no facto de a recorrente não ter cometido a infracção deliberadamente ou por negligência

276 A recorrente defende que a coima deve ser declarada injustificada pelo facto de não ter cometido as infracções deliberadamente nem por efeito de uma negligência não desculpável. É necessário deduzir da redacção do artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17 que existe uma terceira categoria de comportamentos que são isentos de imposição de coimas, isto é, as acções desenvolvidas pelas empresas por ignorância ou involuntariamente.

277 Este fundamento não pode ser acolhido. Com efeito, resulta de jurisprudência constante que, para que uma infracção possa ser considerada como tendo sido cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de violar a proibição do artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Basta que não pudesse ignorar que a conduta imputada tinha por objectivo ou efeito restringir a concorrência no mercado comum (v., acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1989, Belasco e o./Comissão, 246/86, Colect., p. 2117, n._ 41, e acórdão Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, já referido, n._ 157).

278 No caso em apreço, a Comissão provou que, devido à sua participação nas reuniões do JMC, a recorrente participou numa colusão sobre os preços e numa colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento durante o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991. Tendo em conta a natureza dos comportamentos verificados, a recorrente não podia ignorar que tinham por objectivo restringir a concorrência.

D - Fundamento baseado num cálculo incorrecto da coima

Argumentos das partes

279 Este fundamento articula-se em duas partes.

280 Numa primeira parte, a recorrente alega que a Comissão não deveria ter tido em conta, para efeitos da determinação do montante da coima, o volume de negócios realizado pela recorrente nos mercados não abrangidos pela infracção segundo a comunicação de acusações, isto é, os mercados espanhol, irlandês, grego e português. De igual modo, a recorrente ignorava se a Comissão utilizou os volumes de trocas correspondentes ao volume líquido das vendas.

281 Numa segunda parte, a recorrente invocou várias circunstâncias susceptíveis de atenuarem a gravidade da infracção que não terão sido convenientemente tidas em conta pela Comissão.

282 Em primeiro lugar, a Comissão deveria ter tido em consideração a atitude da recorrente no cartel (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1970, Buchler/Comissão, 44/69, Recueil, p. 733, Colect. 1969-1970, p. 501, n._ 56), atitude caracterizada por uma falta de política protectora do mercado nacional e por um aumento da sua penetração noutros mercados.

283 Em segundo lugar, a participação limitada ou passiva da recorrente no PG Paperboard não merecia ser penalizada com uma coima ou, mereceria, pelo menos, uma coima ínfima [v. Decisão 73/109/CEE da Comissão, de 2 de Janeiro de 1973, relativa a um processo de aplicação dos artigos 85._ e 86._ do Tratado CEE (IV/26.918 - Indústria europeia do açúcar, JO L 140, p. 17), e Decisão 84/405/CEE da Comissão, de 6 de Agosto de 1984, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CEE (IV/30.350 - Zinc Producer Group, JO L 220, p. 27)].

284 O seu papel de «outsider» é visível nos quadros anexos à decisão, que mostram que apenas lhe são censuradas quatro das sete alegadas iniciativas em matéria de preços. Com efeito, a Comissão só acusa a recorrente de ter participado nas iniciativas em matéria de preços num ou dois dos seis mercados implicados. Além disto, a recorrente não é acusada relativamente às diferentes qualidades de cartão.

285 Em terceiro lugar, não aplicou as decisões alegadamente tomadas. Em especial, o facto de ter aumentado consideravelmente as suas exportações [Decisão 69/240/CEE, da Comissão, de 16 de Julho de 1969, relativa a um processo nos termos do artigo 85._ do Tratado (IV/26.623 - Acordo internacional do quinino, JO L 192, p. 5)] e o facto de não ter participado num aumento de preços num dos mercados objecto das concertações [Decisão 69/243/CEE da Comissão, de 24 de Julho de 1969, relativa a um processo nos termos do artigo 85._ do Tratado CEE (IV/26.267 - Matérias corantes, JO L 195, p. 11)] deveria ser tido em conta pela Comissão.

286 Além disto, esta não apresentou provas suficientes do comportamento efectivo da recorrente.

287 Em quarto lugar, a falta de intenção de cometer uma infracção deveria, pelo menos, implicar uma redução da coima. Em especial, no que se refere ao sistema de intercâmbio de informações, a recorrente teve um conhecimento recente das normas comunitárias da concorrência devido à adesão do Reino de Espanha à Comunidade em 1986. Este conhecimento não seria comparável ao, mais antigo, das outras empresas.

288 Em quinto lugar, o facto de as práticas serem declaradas pela primeira vez contrárias ao direito da concorrência justificaria uma redução do montante da coima. Isto aplica-se, no caso em apreço, à qualificação, nova, de infracção às regras de concorrência dada aos intercâmbios de informações.

289 Em sexto lugar, a Comissão e o Tribunal de Justiça sempre consideraram como circunstância atenuante a situação de crise ou de recessão contínua do sector em questão.

290 Acresce que, a recorrente considera que a sua própria situação de défice, durante os anos abrangidos pelo alegado cartel, também deveria ser tida em conta.

291 Em sétimo lugar, a dimensão reduzida da recorrente relativamente ao conjunto dos produtores europeus deveria ser tida em conta no momento de avaliar o montante das coimas em termos económicos. Quanto a isto, o simples reenvio para o n._ 169 dos considerandos da decisão não é suficiente para saber se este elemento foi efectivamente tido em consideração para a determinação da coima.

292 Em oitavo lugar, a recorrente considera que a inexistência de medidas de controlo de aplicação do alegado cartel (n.os 82 e 136 dos considerandos da decisão) constitui também um motivo de redução da coima.

293 Por fim, considera sem fundamento o pedido da Comissão de que o Tribunal aumente num terço o montante da coima que lhe foi aplicado. Considera, com efeito, não ter mudado de posição relativamente à adoptada durante o procedimento na Comissão.

294 A Comissão alega que a utilização do volume de negócios realizado na Comunidade pelas empresas que participaram na infracção é abrangida pela margem de apreciação que lhe confere o artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17.

295 Quanto às circunstâncias atenuantes invocadas defende que nem a decisão da recorrente de aumentar a capacidade de produção na perspectiva de um aumento da procura nem a sua alegada política de exportação acrescida podem ser consideradas como incompatíveis com os objectivos do cartel nem com a sua participação activa neste.

296 Considera que apreciou correctamente o papel da recorrente no cartel ao não classificá-la na categoria dos líderes. Além disto, apreciou correctamente os actos da recorrente face ao artigo 85._, n._ 1.

297 No que se refere à circunstância atenuante que decorre do intercâmbio de informações enquanto infracção inédita, a Comissão afirma que a utilização de um sistema de intercâmbio de informações como mecanismo de apoio de um cartel não pode ser considerada como uma infracção nova ao direito da concorrência.

298 Contesta que a situação do sector justifique uma redução do montante da coima. Além disto, não é obrigada a atender à situação financeira das empresas para a fixação da coima (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 1983, IAZ e o./Comissão, 96/82 a 102/82, 104/82, 105/82, 108/82 e 110/82, Recueil, p. 3369, n._ 55).

299 Quanto à dimensão reduzida da recorrente, trata-se de um elemento devidamente tido em conta, uma vez que foi considerada a importância respectiva de cada empresa no sector para determinar o montante da coima (n._ 169 dos considerandos da decisão).

300 Por fim, quanto à alegada inexistência de medidas de controlo de aplicação do cartel, conclui-se dos n.os 82 e 136 dos considerandos da decisão que os membros do cartel procediam, no seio do JMC, nomeadamente ao acompanhamento das iniciativas em matéria de preços, das vendas e dos cadernos de encomendas, o que lhes permitiu controlar e disciplinar as empresas que não seguiam o comportamento acordado.

301 A Comissão conclui que este fundamento é desprovido de qualquer justificação. Pede também ao Tribunal, no exercício da sua competência de plena jurisdição em matéria de coimas, que aumente a coima aplicada à recorrente em pelo menos um terço, proporção correspondente à redução da coima de que beneficiou pelo facto de não ter, na sua resposta à comunicação de acusações, contestado as principais alegações de facto sobre as quais a Comissão baseou as suas acusações. Tendo a recorrente contestado no Tribunal todos os aspectos da infracção, excepto a sua participação nas reuniões, a redução da coima deixou de ter, na realidade, uma verdadeira justificação.

Apreciação do Tribunal

302 Já se verificou que, sendo os mercados português, grego, irlandês e espanhol, visados pela decisão, a Comissão não cometeu um erro de apreciação ao ter em conta, para efeitos da determinação do montante da coima, o volume de negócios realizado por cada uma das empresas no mercado comunitário do cartão em 1990, incluindo nos mercados nacionais em causa (v. infra n._ 267).

303 As três primeiras circunstâncias invocadas pela recorrente, baseadas respectivamente na sua atitude no cartel, na sua participação limitada e passiva nos órgãos do PG Paperboard e na ausência de aplicação dos aumentos de preços acordados no PG Paperboard, visam todas contestar a apreciação feita pela Comissão do papel desempenhado pela recorrente no cartel.

304 A este respeito, a Comissão provou que, devido à sua participação nas reuniões do JMC, a recorrente participou numa colusão sobre os preços e numa colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento durante o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991. Além disto, como já se verificou, o facto de a infracção cometida pela recorrente não incluir uma colusão sobre as quotas de mercado não justifica uma redução do montante da coima aplicada.

305 No caso em apreço, a recorrente não pode alegar ter desempenhado no cartel um papel menos activo que as outras empresas consideradas como «membros normais» deste. Com efeito, conclui-se do quadro 4 anexo à decisão que ela foi, durante o período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991, um participante regular nas reuniões do JMC.

306 Além disto, o facto de uma empresa, cuja participação numa concertação com os seus concorrentes em matéria de preços foi demonstrada, não se ter comportado no mercado de um modo conforme ao convencionado com os seus concorrentes não constitui necessariamente um elemento que deva ser tomado em consideração, como circunstância atenuante, aquando da determinação do montante da coima a aplicar. Com efeito, uma empresa que prossegue, apesar da concertação com os seus concorrentes, uma política mais ou menos independente no mercado pode simplesmente tentar utilizar o acordo em seu benefício.

307 No caso em apreço, os elementos fornecidos pela recorrente não permitem considerar que o seu comportamento real no mercado tenha sido susceptível de contrariar os efeitos anticoncorrenciais da infracção verificada. Em especial, na sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente alegou que ela não tinha anunciado aumentos de preços aos clientes, mas que tinha unicamente fornecido as novas tarifas aos seus agentes para que eles as utilizassem durante as negociações individuais com os clientes. Quanto a isto, invocou os gráficos (pp. 37 e 39 da sua resposta à comunicação de acusações) que, em seu entender, demonstravam que os preços obtidos tinham sido inferiores aos preços solicitados e que esteve em condições de aumentar as suas quotas de mercado em vários mercados de exportação.

308 No entanto, na decisão, a Comissão admite que os preços de transacção não foram sempre idênticos aos preços anunciados. Afirma nomeadamente: «Mesmo que todos os produtores estivessem decididos a aplicar o aumento total, as possibilidades de os clientes optarem por uma qualidade menos onerosa, implicavam que o fornecedor tivesse que fazer algumas concessões aos seus clientes tradicionais em matéria de datas ou dar alguns incentivos suplementares sob a forma de descontos relacionados com a tonelagem ou com o volume da encomenda para que aceitassem a totalidade do aumento do preço de base. A aplicação dos aumentos de preços era, assim, inevitavelmente morosa» (n._ 101, sétimo parágrafo, dos considerandos). Deste modo, a recorrente não provou que os seus preços de transacção se afastaram sensivelmente dos dos outros participantes na infracção verificada.

309 Além disso, há que sublinhar que a recorrente não sustenta ter sido objecto de pressões exercidas pelas outras empresas que participaram no cartel. Também não sustenta que se distanciou publicamente das decisões adoptadas, aquando das reuniões em que participou, a respeito dos aumentos de preços.

310 Nestas circunstâncias, a Comissão estava no direito de não considerar, como circunstância atenuante, o comportamento da recorrente no mercado, pretensamente divergente do convencionado no seio do PG Paperboard.

311 A recorrente não pode, por outro lado, invocar uma falta de intenção de cometer a infracção. Recorde-se que, atendendo à natureza dos comportamentos verificados, a recorrente não podia ignorar que tinham por objectivo restringir a concorrência (v. supra n.os 277 e 278).

312 A recorrente invoca também o carácter novo da qualificação de infracção às normas de concorrência do intercâmbio de informações.

313 No entanto, recorde-se que, segundo o artigo 1._ da decisão, as empresas visadas por esta disposição infringiram o artigo 85._, n._ 1, do Tratado ao participarem num acordo e numa prática concertada através das quais as empresas, nomeadamente, «procederam ao intercâmbio de informações comerciais sobre os fornecimentos, preços, suspensões de actividade, cadernos de encomendas e taxas de utilização das máquinas em apoio às medidas supracitadas», isto é, uma colusão sobre os preços, uma colusão sobre as quotas de mercado, e uma colusão sobre os períodos de suspensão de funcionamento.

314 A Comissão só considerou portanto o intercâmbio de informações contrário ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado enquanto suporte do cartel verificado. Seguidamente, o argumento da recorrente é desprovido de fundamento.

315 A recorrente não demonstrou, aliás, que o sector do cartão se encontrava, durante o período visado pela decisão, numa situação de crise susceptível de justificar uma redução do montante das coimas.

316 Não pode defender que a sua situação financeira deficitária deveria ter constituído uma circunstância atenuante. Com efeito, o reconhecimento de tal obrigação implicaria dar uma vantagem concorrencial injustificada às empresas menos adaptadas às condições do mercado (acórdão IAZ e o./Comissão, já referido, n._ 55).

317 Quanto à dimensão reduzida da recorrente, é forçoso verificar que este elemento foi tido em conta pela Comissão, na medida em que se baseou, para efeitos da determinação do montante das coimas, no volume de negócios realizado por cada uma das empresas no mercado comunitário do cartão em 1990.

318 Quanto à última circunstância invocada pela recorrente, isto é, a pretensa ausência de medidas de controlo de aplicação do cartel, há que salientar que, se a existência de medidas de controlo de aplicação de um cartel pode ser tida em conta enquanto circunstância agravante para a fixação das coimas, a falta de tais medidas não constitui, em si, uma circunstância atenuante. Aliás, a própria recorrente se refere nomeadamente ao n._ 136 dos considerandos da decisão, donde se conclui (último parágrafo deste número) que «a documentação demonstra claramente que a aplicação das iniciativas em matéria de preços era estritamente controlada e que a não cooperação era objecto de discussões no âmbito do JMC, sendo os retardatários instados pelos líderes do mercado a apoiarem os aumentos de preços». Não tendo a recorrente contestado a correcção desta conclusão, nada permite considerar que a Comissão devesse ter tido em conta, enquanto circunstância atenuante, a falta de medidas de controlo da aplicação do cartel.

319 Por fim, no que se refere ao pedido da Comissão de que o Tribunal aumente a coima aplicada, basta verificar que a instituição, em resposta a uma questão do Tribunal colocada na audiência, não esteve em condições de indicar as contestações avançadas pela recorrente nas suas observações que não foram suscitadas na sua resposta à comunicação de acusações. Perante esta única conclusão, não pode ser acolhido o pedido da Comissão.

320 Considerando o que precede, há que rejeitar o presente fundamento bem como o pedido formulado pela Comissão de aumento da coima aplicada à recorrente.

E - Fundamento baseado em violação do princípio da igualdade de tratamento

Primeira parte do fundamento baseada na não consideração da desvalorização da peseta espanhola

Argumentos das partes

321 A recorrente defende que o facto de não ter tido em conta os efeitos das desvalorizações sofridas por certas moedas europeias, no caso em apreço a peseta espanhola, constitui uma discriminação entre pessoas que se encontram na mesma situação.

322 Entre Janeiro de 1991 e Julho de 1994, a peseta espanhol sofreu grandes desvalorizações relativamente ao ecu. A taxa de câmbio PTA/ecu era, em Julho de 1990 de 1 ecu por 127,29 PTA, enquanto em Julho de 1994, era de 1 ecu por 157,32 PTA. O impacto económico do pagamento da coima expresso em ecus é, portanto, proporcionalmente muito mais importante para as empresas que realizam a maior parte do seu volume de negócios em moedas que sofreram desvalorizações relativamente ao ecu.

323 Nos processos de sanção colectiva, as diferenças entre as coimas aplicadas às empresas deveriam justificar-se por razões objectivas relacionadas com a atitude e/ou o comportamento subjectivo de cada uma delas. Ora, no caso em apreço, a decisão não contém qualquer justificação da discriminação de facto resultante da expressão da coima em ecus. A Comissão actuou, portanto, com negligência e violou o princípio da igualdade de tratamento.

324 Para chegar ao montante da coima aplicada, a Comissão converteu em ecus o volume de negócios realizado durante o exercício social de referência, isto é, o exercício de 1990, utilizando a taxa média relativa a esse ano. Determinou, em seguida, o montante da coima aplicando a percentagem previamente escolhida isto é, no seu caso, a taxa de base de 7,5%, que foi antes reduzida de 33,3%, pelo facto de a recorrente não ter contestado a materialidade dos factos, depois de uma percentagem suplementar, para ter em conta a curta duração da sua participação na infracção. A recorrente afirma que, em moeda nacional, deveria hoje desembolsar um montante de cerca de 275 milhões de PTA para pagar a coima. Ora, se a Comissão tivesse aplicado a taxa de câmbio actual para converter em ecus o volume de negócios relativo às vendas de cartão da recorrente no interior da Comunidade em 1990, o montante da coima elevar-se-ia a 1,42 milhões de ecus, isto é, à taxa de câmbio actual, aproximadamente 225 milhões de PTA. A recorrente sofreu portanto um aumento do montante da coima de 50 milhões de PTA.

325 A afirmação da Comissão de que é necessário converter em ecus dois volumes de negócios expressos em divisas diferentes para os comparar e garantir assim a igualdade de tratamento, é totalmente incorrecta. A conversão do volume de negócios em ecus não é necessário para respeitar o princípio da igualdade, uma vez que esse princípio será respeitado se, para duas empresas cuja infracção é da mesma gravidade e da mesma duração, se aplicarem percentagens idênticas aos volumes de negócios correspondentes a exercícios financeiros idênticos. Esta conclusão não é contrariada pelo acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, já referido).

326 A discriminação efectuada pela Comissão encontraria a sua origem na expressão das coimas em ecus, o que iria contra a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual não é necessária a conversão em ecus. Nenhuma regra de direito primário ou derivado exigiria essa conversão, que também não se justifica de um ponto de vista da realidade económica (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Março de 1977 Société anonyme générale sucrière e o./Comissão, 41/ 73, 43/73 e 44/73 - interpretação, Recueil, p. 445, Colect., p. 153, n.os 12 a 15, 25 e 26). Nas suas conclusões neste acórdão, o advogado-geral J. P. Warner afirmou a necessidade de a Comissão ter em conta a realidade dos fenómenos monetários no cálculo das sanções em ecus para não suscitar distorções indesejáveis. Declarou que a Comissão deve, antes de mais, decidir em que moeda exprimirá a coima para efeitos da execução e em seguida determinar o seu montante adequado tendo em conta o valor real dessa moeda.

327 Noutros domínios, o Tribunal de Justiça preconizou que as despesas de saúde sejam reembolsadas aos funcionários comunitários, residentes em diversos países, em divisas nacionais para evitar qualquer discriminação entre eles (acórdão de 13 de Fevereiro de 1980, Misenta/Comissão, 256/78, Recueil, p. 219). Fiscalizou o respeito pelo princípio de não discriminação nos litígios que incidem sobre os efeitos das flutuações monetárias, nomeadamente nos domínios da política comercial comum (acórdãos do Tribunal de Justiça de 3 de Junho de 1980, Gedelfi Großeinkauf, 135/79, Recueil, p. 1713, e de 3 de Fevereiro de 1982, Gebrüder Glunz, 248/80, Recueil, p. 197) e da política agrícola comum (acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Julho de 1985, Maizena e o., 39/84, Colect., p. 2115, e de 3 de Outubro de 1985, Nordgetreide, 46/84, Colect., p. 3127).

328 O Regulamento n._ 17 não impõe a utilização do ecu nem para calcular nem para exprimir o montante da coima previsto no artigo 15._, n._ 2. Ao incluir a possibilidade de infligir uma coima que possa atingir até 10% do volume de negócios realizado pela empresa culpada da infracção durante o último exercício social decorrido, o regulamento estabelece manifestamente um nexo entre o montante e o benefício que a empresa retirou da infracção. Esse rendimento reflecte-se principalmente no volume de negócios realizado, que é calculado em moeda nacional e não ecus.

329 Por fim, a utilização do ecu não é prática. Com efeito a coima é paga em moeda nacional e, na falta de pagamento, a Comissão procederá à execução forçada em moeda nacional.

330 A Comissão considera que, quando se trata de coimas aplicadas a empresas estabelecidas nos diferentes Estados-Membros e cujo volume de negócios se exprime em divisas diferentes, o princípio da igualdade de tratamento exige que seja possível compará-las. A única maneira de comparar divisas distintas consiste em convertê-las numa mesma unidade, no caso em apreço o ecu. O Tribunal de Justiça reconheceu que as coimas devem ser comparáveis. Decidiu que, na medida em que se justifique basear-se no volume de negócios das empresas implicadas numa mesma infracção para determinar as relações entre as coimas a aplicar, convém delimitar o período a ter em conta de modo a que os números obtidos sejam tão comparáveis quanto possível (acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, já referido, n._ 122).

331 No caso em apreço, a escolha da Comissão, isto é, um cálculo das coimas baseado no volume de negócios de 1990 convertido em ecus à taxa de câmbio média do ano de 1990, é perfeitamente justificada. Não apenas essa escolha representa uma prática bem estabelecida da Comissão, não censurada pelo juiz comunitário, mas reflecte também, de forma precisa, a totalidade dos eventuais lucros retirados da infracção (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Fevereiro de 1994, CB e Europay/Comissão, T-39/92 e T-40/92, Colect., p. II-49).

332 No que se refere ao acórdão Société anonyme générale sucrière e o./Comissão, já referido, ele inscreve-se num contexto muito preciso e não pode portanto concorrer para apoiar as pretensões da recorrente. Resulta deste acórdão, tal como interpretado no seu contexto factual, que a Comissão deve fixar o montante das coimas em ecus, enquanto o momento e o banco de pagamento determinam a moeda e a taxa de câmbio.

333 Por fim, a utilização do ecu para calcular e fixar o montante das coimas permite evitar, graças à estabilidade relativa do ecu, a discriminação entre empresas que poderia decorrer das flutuações monetárias. Este sistema permite à Comissão fiscalizar que as coimas representam efectivamente uma percentagem determinada do valor real do volume de negócios de uma empresa durante o ano de referência escolhido.

Apreciação do Tribunal

334 O artigo 4._ da decisão dispõe que as coimas aplicadas são pagáveis em ecus.

335 Nada impede a Comissão de expressar o montante da coima em ecus, unidade monetária convertível em moeda nacional. De resto, isso permite às empresas comparar mais facilmente os montantes das coimas aplicadas. Além disso, a conversão possível do ecu em moeda nacional diferencia esta unidade monetária da «unidade de conta» mencionada no artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17, que o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente que, não sendo um meio de pagamento, implicava necessariamente a determinação do montante da coima em moeda nacional (acórdão Société anonyme Générale sucrière e o./Comissão, já referido, n._ 15).

336 Quanto à legalidade do método da Comissão, que consiste em converter em ecus o volume de negócios de referência das empresas, à taxa de câmbio média do ano em causa (1990), as críticas formuladas pela recorrente não podem ser acolhidas.

337 Em primeiro lugar, a Comissão deve normalmente utilizar um único e mesmo método de cálculo das coimas aplicadas às empresas sancionadas por terem participado na mesma infracção (v. acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n._ 122).

338 Em seguida, a fim de poder comparar os diferentes volumes de negócios comunicados, expressos nas moedas nacionais respectivas das empresas em causa, a Comissão deve converter esses volumes de negócios numa única e mesma unidade monetária. Sendo o valor do ecu determinado em função do valor de cada moeda nacional dos Estados-Membros, a Comissão agiu correctamente ao converter em ecus o volume de negócios de cada uma das empresas.

339 Também procedeu correctamente ao basear-se no volume de negócios do ano de referência (1990) e ao converter esse volume de negócios em ecus, com base nas taxas de câmbio médias do mesmo ano. Por um lado, a tomada em consideração do volume de negócios realizado por cada uma das empresas no decurso do ano de referência, isto é, o último ano completo do período de infracção objecto da decisão, permitiu à Comissão apreciar a dimensão e o poder económico de cada empresa bem como a extensão da infracção cometida por cada uma delas, sendo estes elementos pertinentes para apreciar a gravidade da infracção cometida por cada empresa (v. acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.os 120 e 121). Por outro lado, a tomada em consideração, para efeitos da conversão em ecus dos volumes de negócios em causa, das taxas de câmbio médias do ano de referência considerado, permitiu à Comissão evitar que as eventuais flutuações monetárias ocorridas desde a cessação da infracção afectassem a apreciação da dimensão e o poder económico relativos das empresas, bem como a extensão da infracção cometida por cada uma delas e, portanto, a apreciação da gravidade da infracção. A apreciação da gravidade da infracção deve, efectivamente, ter em conta a realidade económica tal como existia na época em que a infracção foi cometida.

OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC: 694A0348.2

340 Consequentemente, o argumento segundo o qual o volume de negócios do ano de referência deveria ter sido convertido em ecus, com base na taxa de câmbio à data da adopção da decisão, não pode ser acolhido. O método de cálculo da coima que consiste em utilizar a taxa de câmbio média do ano de referência permite evitar os efeitos aleatórios das alterações dos valores reais das moedas nacionais que podem ocorrer, e neste caso ocorreram de facto, entre o ano de referência e o ano de adopção da decisão. Se este método pode significar que determinada empresa deve pagar um montante, expresso em moeda nacional, nominalmente superior ou inferior ao que pagaria na hipótese de ser aplicada a taxa de câmbio da data de adopção da decisão, isso é apenas a consequência lógica das flutuações dos valores reais das diferentes moedas nacionais.

341 Importa acrescentar que diversas empresas destinatárias da decisão possuem fábricas de cartão em mais de um país (v. n.os 7, 8 e 11 dos considerandos da decisão). Além disso, as empresas destinatárias da decisão exercem geralmente as suas actividades em mais do que um Estado-Membro, por intermédio de representantes locais. Operam, assim, em diversas divisas nacionais. A própria recorrente realiza mais de um terço do seu volume de negócios nos mercados de exportação. Ora, quando uma decisão, como a decisão controvertida, aplica sanções em relação a violações do artigo 85._, n._ 1, do Tratado e as empresas destinatárias da decisão exercem geralmente as suas actividades em diversos Estados-Membros, o volume de negócios do ano de referência, convertido em ecus à taxa de câmbio média utilizada nesse ano, é composto pela soma dos volumes de negócios realizados em cada um dos países em que a empresa actua. Por conseguinte, exprime perfeitamente a realidade da situação económica das empresas em causa ao longo do ano de referência.

342 A primeira parte do fundamento deve portanto ser rejeitada.

Segunda parte do fundamento baseada no facto de o nível das coimas ser superior ao escolhido pela Comissão em processos comparáveis

Argumentos das partes

343 A recorrente alega que a Comissão deve respeitar o princípio da igualdade relativamente ao nível das coimas aplicadas noutras decisões comparáveis, como aliás a própria Comissão já reconheceu (pergunta escrita n._ 2296/85, JO 1986, C 123, p. 26).

344 No caso em apreço, o princípio da igualdade de tratamento foi violado, uma vez que a percentagem do volume de negócios utilizada para determinar a coima se elevava a 9% para as empresas consideradas principais responsáveis do cartel. Este nível da coima é consideravelmente superior ao das decisões anteriores semelhantes [nomeadamente Decisão 89/515/CEE da Comissão, de 2 de Agosto de 1989, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CEE (IV/31 553 - Rede electrossoldada para betão, JO L 260, p. 1), e Decisão 94/215/CECA da Comissão, de 16 de Fevereiro de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 65._ do Tratado CECA relativo a acordos e práticas concertadas entre produtores europeus de vigas, JO L 116, p. 1)]. Em especial, a recorrente sustenta que, no ano de 1994, a Comissão adoptou em menos de cinco meses duas decisões nitidamente diferentes perante um mesmo tipo de cartel pan-europeu, sem verdadeiramente fundamentar a sua alteração de atitude. Há portanto que concluir que houve uma discriminação ou um tratamento desigual em circunstâncias semelhantes.

345 A Comissão não pode utilizar o seu poder discricionário para cometer violações flagrantes ao princípio da igualdade de tratamento.

346 De igual modo, mesmo que o Tribunal de Justiça considere que uma correcta aplicação das regras comunitárias da concorrência exige que a Comissão possa, a qualquer momento, adaptar o nível das coimas às necessidades da política da concorrência, isto não significa que a Comissão possa aumentar e diminuir o nível geral das coimas de uma infracção para outra sem apresentar razões objectivas suficientes.

347 A recorrente considera por fim, invocando a Decisão 94/815/CEE da Comissão, de 30 de Novembro de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CE (IV/33.126 e 33.322 - Cimento, JO L 343, p. 1), que existe, relativamente ao presente processo, uma violação flagrante do princípio da igualdade e uma desproporção evidente na determinação da percentagem global do volume de negócios escolhido para determinar o montante das coimas.

348 A Comissão entende que, tendo em conta a gravidade, o alcance geográfico e a duração da infracção verificada, o nível da coima escolhido é perfeitamente justificado.

Apreciação do Tribunal

349 Nos termos do n._ 2 do artigo 15._ do Regulamento n._ 17, a Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas coimas de mil ecus, no mínimo, a um milhão de ecus, podendo este montante ser superior desde que não exceda dez por cento do volume de negócios realizado, durante o exercício anterior, por cada uma das empresas que tenha participado na infracção, sempre que, deliberada ou negligentemente, cometam uma infracção ao n._ 1 do artigo 85._ do Tratado. Para determinar o montante da coima, deve tomar-se em consideração, além da gravidade da infracção, a duração da mesma. Como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a gravidade das infracções deve ser determinada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração (despacho SPO e o./Comissão, já referido, n._ 54).

350 No caso vertente, a Comissão determinou o nível geral das coimas tomando em conta a duração da infracção (n._ 167 dos considerandos da decisão) bem como as seguintes considerações (n._ 168 dos considerandos):

«- a colusão em matéria de preços e a repartição de mercados constitui, por si só, uma grave restrição à concorrência,

- o cartel abrangia praticamente todo o território da Comunidade,

- o mercado do cartão da Comunidade é um importante sector industrial que representa anualmente cerca de 2 500 milhões de ecus,

- as empresas que participaram na infracção abrangem praticamente a totalidade do mercado,

- o cartel funcionou sob a forma de um sistema de reuniões regulares institucionalizadas com o objectivo de regular expressamente e em pormenor o mercado do cartão na Comunidade,

- foram adoptadas medidas complexas no sentido de dissimular a verdadeira natureza e extensão da colusão (ausência de quaisquer actas oficiais ou documentação do PWG e do JMC; os participantes eram dissuadidos de tomar notas; encenação das datas e ordenação do anúncio dos aumentos de preços por forma a que pudesse ser alegado que tais aumentos `seguiam' o primeiro, etc.),

- o cartel alcançou com êxito os seus objectivos».

351 É ponto assente que as coimas de um nível de base de 9% ou de 7,5% do volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias da decisão no mercado comunitário do cartão em 1990, respectivamente, às empresas consideradas líderes do cartel e às outras empresas.

352 Importa sublinhar, em primeiro lugar, que, na sua apreciação do nível geral das coimas, a Comissão tem o direito de tomar em conta o facto de as infracções manifestas às regras comunitárias da concorrência serem ainda relativamente frequentes e, portanto, tem perfeitamente legitimidade para aumentar o nível das coimas a fim de reforçar o seu efeito dissuasivo. Consequentemente, o facto de a Comissão ter aplicado, no passado, coimas de certo nível a determinados tipos de infracções, não a priva da possibilidade de aumentar esse nível, nos limites indicados no Regulamento n._ 17, se isso for necessário para assegurar a execução da política comunitária da concorrência (v., nomeadamente, acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.os 105 a 108, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, ICI/Comissão, T-13/89, Colect., p. II-1021, n._ 385).

353 Em segundo lugar, a Comissão considerou com razão que, na audiência, dadas as circunstâncias próprias do caso em discussão, não se pode fazer uma comparação entre o nível geral das coimas adoptado na presente decisão e os adoptados na prática decisória anterior da Comissão, em especial, na Decisão 86/398/CEE da Comissão, de 23 de Abril de 1986, relativa a um processo para aplicação do artigo 85._ do Tratado CEE (IV/31.149 - Polipropileno, JO L 230, p. 1, a seguir «decisão polipropileno»), considerada pela própria Comissão como a mais comparável ao presente caso. De facto, contrariamente à situação que deu origem à decisão polipropileno, nenhuma circunstância atenuante geral foi tomada em conta neste caso para determinar o nível geral das coimas. Por outro lado, como o Tribunal já declarou, as medidas complexas adoptadas pelas empresas para dissimular a existência da infracção constituem um aspecto particularmente grave da própria infracção, que a caracteriza em relação às infracções anteriormente detectadas pela Comissão.

354 Em terceiro lugar, importa sublinhar a longa duração e o carácter manifesto da infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado, que foi cometida apesar da advertência que deveria ter constituído a prática decisória anterior da Comissão, designadamente, a decisão polipropileno.

355 Com base nestes elementos, deve considerar-se que os critérios descritos no n._ 168 dos considerandos da decisão justificam o nível geral das coimas fixado pela Comissão.

356 Finalmente, ao fixar o nível geral das coimas, a Comissão não se afastou da sua prática decisória anterior de um modo tal que justificasse uma obrigação de fundamentar de forma mais circunstanciada a sua apreciação da gravidade da infracção (v., nomeadamente, o acórdão Groupement des fabricants de papiers peints de Belgique e o./Comissão, já referido, n._ 31).

357 A segunda parte do fundamento também deve ser rejeitada.

358 Tendo em conta o que precede, o fundamento deve ser rejeitado na sua totalidade.

F - Fundamento baseado em violação do princípio da proporcionalidade

359 A recorrente alega que o princípio da proporcionalidade foi desrespeitado no caso em apreço, uma vez que a situação de crise em que vive actualmente o sector foi totalmente ignorada no momento da avaliação da sanção. O mesmo se diga quanto à diferença de tratamento verificada no presente processo relativamente à sorte reservada a outras empresas em processos semelhantes na Comissão.

360 A coima aplicada à empresa Tetra Pak, por uma infracção particularmente grave e longa, correspondente a 2,2% do volume de trocas (Decisão 92/163/CEE da Comissão, de 24 de Julho de 1991, relativa a um processo de aplicação do artigo 86._ do Tratado CEE (IV/31.043 - Tetra Pak II, JO 1992, L 72, p. 1) foi muito menos elevada do que a aplicada à recorrente, apesar de as infracções de que é acusada serem de muito menor duração e gravidade do que as censuradas à empresa Tetra Pak.

361 Uma outra expressão manifesta da violação do princípio da proporcionalidade é constituída pela desproporção entre as taxas de base escolhidas relativamente aos líderes do cartel e aos seus «membros normais».

362 Importa salientar que a recorrente não demonstrou que o sector do cartão se encontra actualmente numa situação de crise. Também não explicou por que motivo uma tal situação, admitindo-a demonstrada, deveria ser tida em conta no momento no momento da fixação as coimas.

363 Quanto ao restante, limita-se a repetir, em apoio do presente fundamento, argumentos já invocados em apoio de outros fundamentos que visam a anulação da coima ou a redução do seu montante.

364 Tendo estes argumentos sido rejeitados, o presente fundamento não pode ser acolhido.

365 Atendendo ao que precede, importa anular o artigo 1._ da decisão relativamente à recorrente na medida em que essa disposição enuncia que a recorrente participou numa infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado antes de Fevereiro de 1989. Além disto, importa anular, quanto a si, o artigo 1._, oitavo travessão, da decisão segundo o qual o acordo e a prática concertada em que participou tinham por objectivo a «manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais».

366 Tratando-se do montante da coima aplicada, importa ter em conta o facto de a recorrente não poder ser considerada responsável por uma infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado a não ser no período entre Fevereiro de 1989 e Abril de 1991. Ao invés, como já se verificou (v. supra n.os 269 e segs.), o facto de a infracção cometida pela recorrente não incluir uma colusão sobre as quotas de mercado não justifica uma redução do montante da coima aplicada.

367 Tendo os outros fundamentos invocados pela recorrente em apoio do seu pedido de anulação da coima ou de redução do seu montante sido rejeitados, o Tribunal de Primeira Instância, no exercício da sua competência de plena jurisdição, fixa o montante desta coima em 1 200 000 ecus.

368 Quanto ao restante, deve ser negado provimento ao recurso.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

369 Nos termos do artigo 87._, n._ 3, do Regulamento de Processo, o Tribunal de Primeira Instância pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas se cada parte obtiver vencimento parcial. Uma vez que o recurso só foi parcialmente acolhido, o Tribunal faz uma justa apreciação das circunstâncias da causa decidindo que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

370 A recorrente concluiu pedindo que a Comissão fosse condenada nas despesas, incluindo os custos e juros relativos à constituição de uma garantia bancária ou ao pagamento eventual da coima. No entanto, resulta de jurisprudência assente que as despesas provocadas pela constituição de uma garantia bancária para evitar a execução da decisão não constituem despesas suportadas para efeitos do processo, na acepção da alínea b) do artigo 91._ do Regulamento de Processo (v. despacho do Tribunal de Justiça de 20 de Novembro de 1987, Krupp/Comissão, 183/83, Colect., p. 4611, n._ 10 e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Julho de 1994, Parker Pen/Comissão, T-77/92, Colect., p. II-549, n._ 101). O mesmo se aplica às despesas ocasionadas por um eventual pagamento da coima.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

(Terceira Secção Alargada)

decide:

371 O artigo 1._ da Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85._ do Tratado CE (IV/C/33.833 - Cartão), é anulado em relação à recorrente na medida em que a data do início da infracção que lhe é censurada foi fixada antes do mês de Fevereiro de 1989.

372 O artigo 1._, oitavo travessão, da Decisão 94/601 é anulado em relação à recorrente.

373 O montante da coima aplicada à recorrente pelo artigo 3._ da Decisão 94/601 é fixado em 1 200 000 ecus.

374 Quanto ao restante, é negado provimento ao recurso.

375 Cada parte suportará as suas próprias despesas.

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