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Document 61993CJ0412

    Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 9 de Fevereiro de 1995.
    Société d'importation Edouard Leclerc-Siplec contra TF1 Publicité SA e M6 Publicité SA.
    Pedido de decisão prejudicial: Tribunal de commerce de Paris - França.
    Publicidade televisiva - Livre circulação de mercadorias e de serviços.
    Processo C-412/93.

    Colectânea de Jurisprudência 1995 I-00179

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1995:26

    61993J0412

    ACORDAO DO TRIBUNAL (SEXTA SECCAO) DE 9 DE FEVEREIRO DE 1995. - SOCIETE D'IMPORTATION EDOUARD LECLERC-SIPLEC CONTRA TF1 PUBLICITE SA E M6 PUBLICITE SA. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: TRIBUNAL DE COMMERCE DE PARIS - FRANCA. - PUBLICIDADE TELEVISIVA - LIVRE CIRCULACAO DE MERCADORIAS E SERVICOS. - PROCESSO C-412/93.

    Colectânea da Jurisprudência 1995 página I-00179


    Sumário
    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Decisão sobre as despesas
    Parte decisória

    Palavras-chave


    ++++

    1. Questões prejudiciais ° Competência do Tribunal ° Limites ° Questões gerais ou hipotéticas ° Verificação pelo Tribunal da sua própria competência ° Realidade do litígio principal ° Conceito

    (Tratado CEE, artigo 177. )

    2. Livre circulação de mercadorias ° Restrições quantitativas ° Medidas de efeito equivalente ° Conceito ° Obstáculos resultantes de disposições nacionais que regulamentam de modo não discriminatório as modalidades de venda ° Inaplicabilidade do artigo 30. do Tratado ° Legislação que proíbe a publicidade televisiva no sector da distribuição ° Disposições do Tratado relativas à concorrência ° Inaplicabilidade

    (Tratado CEE, artigos 3. , alínea f), 5. , 30. , 85. e 86. )

    3. Livre prestação de serviços ° Actividades de radiodifusão televisiva ° Directiva 89/552 ° Faculdade dos Estados-membros de derrogar as disposições relativas à publicidade ° Alcance ° Legislação que proíbe a publicidade televisiva no sector da distribuição ° Admissibilidade

    (Directiva 89/552 do Conselho, artigo 3. , n. 1)

    Sumário


    1. No âmbito do processo previsto no artigo 177. do Tratado, o juiz nacional, único a ter conhecimento directo dos factos da causa, é quem está melhor colocado para apreciar, à luz das particularidades desta, a necessidade de uma questão prejudicial para proferir a sua decisão. Consequentemente, quando as questões submetidas pelo juiz nacional incidam sobre a interpretação de uma disposição de direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar-se.

    Todavia, compete ao Tribunal, para verificar a sua própria competência, examinar as condições em que é consultado. Com efeito, o espírito de colaboração que deve presidir ao funcionamento do reenvio prejudicial implica que, pelo seu lado, o juiz nacional tenha em consideração a função cometida ao Tribunal de Justiça, que é a de contribuir para a administração da justiça nos Estados-membros e não a de formular opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas.

    A este respeito, não põe em causa a realidade de um processo principal relativo à compatibilidade, com o direito comunitário, da recusa oposta por uma das partes à outra com base numa disposição do direito nacional o facto de as partes estarem de acordo quanto ao resultado a obter.

    2. Não é apta para entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio entre os Estados-membros, a aplicação, a produtos provenientes de outros Estados-membros, de disposições nacionais que limitam ou proíbem certas modalidades de venda, desde que se apliquem a todos os operadores abrangidos que exerçam a sua actividade no território nacional, e desde que afectem da mesma forma, de facto e de direito, a comercialização dos produtos nacionais e dos provenientes de outros Estados-membros. Com efeito, estando preenchidas estas condições, a aplicação de regulamentações desse tipo à venda de produtos provenientes de outro Estado-membro e que correspondam às normas impostas por esse Estado não é susceptível de impedir o seu acesso ao mercado ou de dificultar esse acesso mais do que dificulta o acesso dos produtos nacionais. Tais regulamentações não são, pois, abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 30. do Tratado.

    Daqui resulta que o artigo 30. deve ser interpretado no sentido de que não se aplica à situação em que um Estado-membro, por via legislativa ou regulamentar, proíbe a transmissão de publicidade televisiva a favor do sector económico da distribuição. Tal medida diz respeito, com efeito, a modalidades de venda, uma vez que proíbe uma certa forma de promoção de um determinado método de comercialização de produtos, e, aplicando-se sem distinção consoante os produtos a todos os operadores económicos no sector da distribuição, não afectam a comercialização dos produtos provenientes de outros Estados-membros de maneira diferente dos produtos nacionais.

    Os artigos 85. e 86. , conjugados com os artigos 3. , alínea f), e 5. do Tratado, não são aplicáveis a tais medidas.

    3. A Directiva 89/552, que visa assegurar a livre difusão das emissões televisivas conformes com as normas mínimas nela previstas, e que para esse efeito impõe aos Estados-membros de origem que velem pelo respeito das suas disposições e aos Estados-membros de recepção que assegurem a liberdade de recepção e de retransmissão, concede, no artigo 3. , n. 1, aos Estados-membros a faculdade, no que respeita aos organismos de radiodifusão televisiva sob a sua jurisdição, de prever normas mais rigorosas ou mais pormenorizadas nos domínios abrangidos pela directiva. Esta faculdade, conferida por uma disposição geral da directiva e cujo exercício não é susceptível de comprometer a livre difusão das transmissões televisivas conformes com as exigências mínimas que a directiva pretende assegurar, não se limita, em matéria de publicidade, às circunstâncias definidas nos artigos 19. e 20.

    É por isso que a directiva deve ser interpretada no sentido de que não se opõe a que, por via legislativa ou regulamentar, um Estado-membro proíba a transmissão de publicidade ao sector económico da distribuição pelos organismos de radiodifusão televisiva estabelecidos no seu território.

    Partes


    No processo C-412/93,

    que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo tribunal de commerce de Paris, destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

    Société d' importation Édouard Leclerc-Siplec

    e

    1) TF1 Publicité SA,

    2) M6 Publicité SA,

    uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 30. , 85. , 86. , 5. e 3. , alínea f), do Tratado CEE e da Directiva 89/552/CEE do Conselho, de 3 de Outubro de 1989, relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (JO L 298, p. 23),

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

    composto por: F. A. Schockweiler, presidente de secção, P. J. G. Kapteyn (relator), G. F. Mancini, C. N. Kakouris e J. L. Murray, juízes,

    advogado-geral: F. G. Jacobs

    secretário: H. von Holstein, secretário adjunto

    vistas as observações escritas apresentadas:

    ° em representação da Leclerc-Siplec, por Bruno Cavalié, advogado no foro de Paris,

    ° em representação de TF1 Publicité, por Louis Bousquet, advogado no foro de Paris,

    ° em representação de M6 Publicité, por Pierre Deprez e Philippe Dian, advogados no foro de Paris,

    ° em representação do Governo francês, por Jean-Louis Falconi, secretário dos Negócios Estrangeiros na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e por Catherine de Salins, subdirectora na mesma direcção, na qualidade de agentes,

    ° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Richard Wainwright, consultor jurídico principal, na qualidade de agente, assistido por Hervé Lehman, advogado no foro de Paris,

    visto o relatório para audiência,

    ouvidas as alegações da Leclerc-Siplec, representada por Bruno Cavalié; de TF1 Publicité, representada por Olivier Sprung, advogado no foro de Paris; de M6 Publicité, representada por Didier Théophile, advogado no foro de Paris; do Governo francês, representado por Jean-Louis Falconi, e da Comissão, representada por Richard Wainwright, assistido por Hervé Lehman, na audiência de 7 de Julho de 1994,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 24 de Novembro de 1994,

    profere o presente

    Acórdão

    Fundamentação jurídica do acórdão


    1 Por despacho de 27 de Setembro de 1993, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 4 de Outubro seguinte, o tribunal de commerce de Paris submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, uma questão prejudicial relativa à interpretação dos artigos 30. , 85. , 86. , 5. e 3. , alínea f), do Tratado CEE, e da Directiva 89/552/CEE do Conselho, de 3 de Outubro de 1989, relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (JO L 298, p. 23, a seguir "directiva").

    2 Essa questão foi submetida no âmbito de um litígio que opõe a société d' importation Édouard Leclerc-Siplec (a seguir "Leclerc-Siplec") às sociedades TF1 Publicité (a seguir "TF1") e M6 Publicité (a seguir "M6") relativamente à recusa destas últimas de emitirem publicidade da distribuição de combustível nos supermercados Leclerc, pelo facto de o artigo 8. do Decreto n. 92-280, de 27 de Março de 1992, adoptado para dar aplicação ao n. 1 do artigo 27. da lei de 30 de Setembro de 1986 relativa à liberdade de comunicação e que fixa os princípios gerais do regime aplicável à publicidade e ao patrocínio (JORF de 28.3.1992, p. 4313, a seguir "decreto"), excluir da publicidade televisiva o sector da distribuição.

    3 A Leclerc-Siplec, que demandou a TF1 e a M6 perante o tribunal de commerce de Paris, e que considera que o artigo 8. do decreto viola diversas disposições do Tratado e da directiva, propôs ao tribunal nacional que interrogasse o Tribunal de Justiça sobre essa questão. A TF1 e a M6, apesar de serem demandadas, defendem uma posição idêntica à da Leclerc-Siplec. Além disso, a TF1 sustentou que a tomada de posição do Tribunal de Justiça deveria ter carácter geral e abranger não só a distribuição, mas todos os sectores excluídos do acesso à televisão pelo decreto.

    4 O tribunal de reenvio, após ter constatado que diversos organismos consultados, como o secrétariat d' État à la Communication, o Conseil supérieur de l' audiovisuel (a seguir "CSA" e o Bureau de vérification de la publicité, confirmavam a interpretação da TF1 e da M6 segundo a qual a publicidade em causa era abrangida pela proibição contida no artigo 8. do decreto, suspendeu a instância e solicitou ao Tribunal de Justiça

    "que se pronuncie a título prejudicial sobre a questão de saber se os artigos 30. , 85. , 86. , 5. e 3. , alínea f), do Tratado CEE, bem como a Directiva 89/552/CEE de 3 de Outubro de 1989, devem ser interpretados no sentido de proibirem que um Estado-membro possa, por via legislativa ou regulamentar, excluir da publicidade televisiva determinados sectores da actividade económica, designadamente o da distribuição, e, mais genericamente, se o artigo 8. do decreto de 27 de Março de 1992 pode ser considerado compatível com as disposições acima referidas."

    5 Por força do artigo 8. do decreto, é proibida "a publicidade de produtos cuja publicidade televisiva seja objecto de proibição legislativa, e dos produtos e sectores económicos seguintes:

    ° bebidas que contenham mais de 1,2 graus de álcool;

    ° edição literária;

    ° cinema;

    ° imprensa;

    ° distribuição, excepto nos departamentos e territórios ultramarinos e nas colectividades territoriais de Mayotte e de Saint-Pierre-et-Miquelon."

    6 O artigo 21. do decreto dispõe que a fiscalização da sua aplicação é exercida pelo CSA.

    7 Resulta das decisões do CSA que os anúncios dos "produtores distribuidores", a quem não se aplica a proibição de publicidade televisiva para o sector económico da distribuição, não devem fazer referência aos circuitos de distribuição dos produtos.

    Quanto à competência do Tribunal de Justiça

    8 A Comissão começa por observar que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível. A seu ver, resulta do despacho de reenvio que não está pendente qualquer litígio no órgão jurisdicional nacional, uma vez que o pedido apresentado pela Leclerc-Siplec visaria simplesmente obter uma decisão prejudicial. De qualquer modo, quando, por sugestão da TF1, aquele órgão jurisdicional alargou a questão proposta pela Leclerc-Siplec a sectores da actividade económica que não o da distribuição, que era objecto do pedido, o juiz de reenvio teria submetido uma questão prejudicial respeitante a um litígio que não existe, mesmo em estado latente, entre as partes.

    9 Há que recordar, antes de mais, que, nos termos do artigo 177. do Tratado, quando seja suscitada perante um órgão jurisdicional de um Estado-membro uma questão de interpretação do Tratado ou dos actos derivados adoptados pelas instituições da Comunidade, aquele órgão jurisdicional pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal de Justiça que sobre ela se pronuncie.

    10 No âmbito desse processo de reenvio, o juiz nacional, único a ter conhecimento directo dos factos da causa, é quem está melhor colocado para apreciar, à luz das particularidades desta, a necessidade de uma questão prejudicial para proferir a sua decisão (v. acórdãos de 29 de Novembro de 1978, Pigs Marketing Board, 83/78, Recueil, p. 2347, de 28 de Novembro de 1991, Durighello, C-186/90, Colect., p. I-5773, e de 16 de Julho de 1992, Meilicke, C-83/91, Recueil, p. I-4871, n. 23).

    11 Consequentemente, quando as questões submetidas pelo juiz nacional incidam sobre a interpretação de uma disposição de direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar-se (v. acórdão de 8 de Novembro de 1990, Gmurzynska-Bscher, C-231/89, Colect., p. I-4003, n. 20).

    12 Todavia, o Tribunal recordou que lhe competia, para verificar a sua própria competência, examinar as condições em que era consultado pelo juiz nacional. Com efeito, o espírito de colaboração que deve presidir ao funcionamento do reenvio prejudicial implica que, pelo seu lado, o juiz nacional tenha em consideração a função cometida ao Tribunal de Justiça, que é a de contribuir para a administração da justiça nos Estados-membros e não a de formular opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas (acórdão de 3 de Fevereiro de 1983, Robards, 149/82, Recueil, p. 171, e acórdão Meilicke, já referido, n. 25).

    13 Foi tendo presente essa missão que o Tribunal entendeu não poder pronunciar-se sobre uma questão prejudicial suscitada perante um órgão jurisdicional nacional quando a interpretação do direito comunitário não tem qualquer relação com a realidade ou o objecto do litígio no processo principal.

    14 No caso vertente, não parece de modo algum contestável que, como observou o Governo francês, o objecto do litígio principal seja, para a Leclerc-Siplec, obter do tribunal de reenvio a declaração de que é incompatível com o direito comunitário a recusa de emitir uma mensagem publicitária sobre a distribuição de combustível, que lhe foi oposta pela TF1 e pela M6, com base no artigo 8. do decreto. O facto de as partes no processo principal estarem de acordo quanto ao resultado a obter em nada diminui a realidade desse litígio.

    15 Daqui resulta que a questão submetida, na medida em que se prende com esse objecto, corresponde a uma necessidade objectiva inerente à resolução do litígio principal. Em contrapartida, não é esse o caso no que respeita à proibição de emitir publicidade televisiva a favor de outros produtos ou sectores económicos.

    16 Resulta das considerações que antecedem que há que responder à questão submetida, na medida em que ela se prende com a exclusão da publicidade televisiva do sector económico da distribuição.

    Quanto à interpretação das disposições referidas na questão prejudicial

    17 A questão submetida, assim delimitada, limita-se a suscitar a interrogação sobre se, respectivamente, o artigo 30. do Tratado, os artigos 85. e 86. conjugados com os artigos 3. , alínea f), e 5. do Tratado, e a directiva devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que, por via legislativa ou regulamentar, um Estado-membro proíba a emissão de publicidade a favor do sector económico da distribuição pelos organismos de radiodifusão televisiva estabelecidos no seu território.

    Sobre o artigo 30. do Tratado

    18 Segundo jurisprudência constante, constitui medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa qualquer medida susceptível de entravar, directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário (acórdão de 11 de Julho de 1974, Dassonville, 8/74, Recueil, p. 837, n. 5).

    19 Uma medida legislativa ou regulamentar como a que está em causa no processo principal, que proíbe a publicidade televisiva no sector da distribuição, não visa regular o comércio de mercadorias entre os Estados-membros. Além disso, essa proibição não afecta a possibilidade de os distribuidores utilizarem outras formas de publicidade.

    20 É certo que tal proibição é susceptível de restringir o volume de vendas e, por conseguinte, o volume de vendas dos produtos provenientes de outros Estados-membros, na medida em que priva os distribuidores de uma certa forma de promoção dos produtos distribuídos. Todavia, há que perguntar se essa eventualidade basta para qualificar a proibição em causa como medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação, na acepção do artigo 30. do Tratado.

    21 A este respeito, deve recordar-se que não é apta para entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio entre os Estados-membros, na acepção da já referida jurisprudência Dassonville, a aplicação, a produtos provenientes de outros Estados-membros, de disposições nacionais que limitam ou proíbem certas modalidades de venda, desde que se apliquem a todos os operadores abrangidos que exerçam a sua actividade no território nacional, e desde que afectem da mesma forma, de facto e de direito, a comercialização dos produtos nacionais e dos provenientes de outros Estados-membros. Estando preenchidas estas condições, a aplicação de regulamentações desse tipo à venda de produtos provenientes de outro Estado-membro e que correspondam às normas impostas por esse Estado não é susceptível de impedir o seu acesso ao mercado ou de dificultar esse acesso mais do que dificulta o acesso dos produtos nacionais. Tais regulamentações não são, pois, abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 30. do Tratado (v. acórdãos de 24 de Novembro de 1993, Keck e Mithouard, C-267/91 e C-268/91, Colect., p. I-6097, n.os 16 e 17, e de 15 de Dezembro de 1993, Huenermund e o., C-292/92, Colect., p. I-6787, n. 21).

    22 Ora, quanto a uma disposição como a que está em causa no processo principal, há que notar que ela diz respeito a modalidades de venda, uma vez que proíbe uma certa forma de promoção (publicidade televisiva) de um determinado método de comercialização (distribuição) de produtos.

    23 Além disso, essas disposições, que se aplicam sem distinção consoante os produtos a todos os operadores económicos no sector da distribuição, ainda que sejam simultaneamente produtores e distribuidores, não afectam a comercialização dos produtos provenientes de outros Estados-membros de maneira diferente dos produtos nacionais.

    24 Assim sendo, há que responder que o artigo 30. do Tratado deve ser interpretado no sentido de que não se aplica à situação em que um Estado-membro, por via legislativa ou regulamentar, proíbe a transmissão de publicidade televisiva a favor do sector económico da distribuição.

    Sobre os artigos 85. e 86. conjugados com os artigos 3. , alínea f), e 5. do Tratado

    25 Há que observar a este respeito que, em si, os artigos 85. e 86. do Tratado apenas dizem respeito ao comportamento das empresas e não visam medidas legislativas ou regulamentares emanadas dos Estados-membros. Resulta contudo de jurisprudência constante do Tribunal que os artigos 85. e 86. , conjugados com o artigo 5. do Tratado, impõem que os Estados-membros não adoptem ou mantenham em vigor medidas, mesmo de natureza legislativa ou regulamentar, susceptíveis de eliminar o efeito útil das regras de concorrência aplicáveis às empresas. É o que acontece, por força da mesma jurisprudência, quando um Estado-membro impõe ou favorece a celebração de acordos contrários ao artigo 85. ou reforça o efeito desses acordos, ou ainda quando retira à sua própria regulamentação o carácter estatal, delegando em operadores privados a responsabilidade de tomar decisões de intervenção em matéria económica (v. acórdão de 21 de Setembro de 1988, Van Eycke, 267/86, Colect., p. 4769, n. 16, e, em último lugar, acórdão de 2 de Junho de 1994, Tankstation 't Heukske e Boermans, C-401/92 e C-402/92, Colect., p. I-2199, n. 16).

    26 No caso vertente, nenhum elemento dos autos permite concluir que as disposições nacionais em causa impõem ou favorecem comportamentos anticoncorrenciais, nem reforçam os efeitos de um acordo já existente.

    27 Assim, há que responder que os artigos 85. e 86. , conjugados com os artigos 3. , alínea f), e 5. do Tratado, não são aplicáveis a disposições nacionais dessa natureza.

    Sobre a Directiva 89/552

    28 O principal objectivo da directiva, que foi adoptada com base nos artigos 57. , n. 2, e 66. do Tratado, consiste em assegurar a livre difusão das transmissões televisivas.

    29 Para esse efeito, ela estabelece, como resulta dos seus décimo terceiro e décimo quarto considerandos, as disposições mínimas a respeitar pelas transmissões provenientes da Comunidade e destinadas a serem captadas no interior desta, e designadamente pelas transmissões destinadas a outro Estado-membro.

    30 Para realizar esse objectivo, a directiva, no capítulo II, dedicado às disposições gerais, impõe, por um lado, aos Estados-membros de origem das transmissões que velem pelo respeito, pelos organismos de radiodifusão televisiva sob a sua jurisdição, das disposições da directiva (artigo 3. , n. 2), e por outro lado, aos Estados-membros de recepção que assegurem a liberdade de recepção e não coloquem entraves à retransmissão no seu território de programas provenientes de outros Estados-membros por razões que caiam dentro dos domínios coordenados pela directiva, sem prejuízo da sua faculdade de suspender provisoriamente transmissões em determinados casos bem determinados (artigo 2. , n. 2).

    31 Nos termos do artigo 3. , n. 1, contido no mesmo capítulo, os Estados-membros têm a faculdade, no que respeita aos organismos de radiodifusão televisiva sob a sua jurisdição, de prever normas mais rigorosas ou mais pormenorizadas nos domínios abrangidos pela directiva.

    32 Pertencem aos domínios coordenados pela directiva as disposições mínimas a respeitar em matéria de publicidade televisiva pelos Estados de origem das transmissões, disposições essas que constam do capítulo IV.

    33 Dois artigos constantes do capítulo IV autorizam os Estados-membros de origem das transmissões a introduzir derrogações a algumas disposições relativas às condições em que a publicidade pode ser transmitida.

    34 Em primeiro lugar, o artigo 19. permite-lhes prever normas mais rigorosas que as do artigo 18. para o tempo de antena e as regras de transmissão televisiva dos organismos de radiodifusão televisiva sob a sua jurisdição.

    35 Em segundo lugar, o artigo 20. , sem prejuízo do artigo 3. , autoriza-os, no respeito pelo direito comunitário, a prever condições diferentes das estabelecidas no artigo 11. , n.os 2 a 5, e no artigo 18. para as emissões exclusivamente destinadas ao território nacional e que não possam ser captadas, directa ou indirectamente, num ou vários outros Estados-membros.

    36 É pacífico que nem o artigo 19. nem o artigo 20. podem servir de fundamento para um Estado-membro proibir a publicidade televisiva no sector económico da distribuição.

    37 Põe-se, assim, a questão de saber se essa proibição pode basear-se no artigo 3. , n. 1, da directiva.

    38 Para determinar o alcance do artigo 3. , n. 1, da directiva, deve examinar-se antes de mais a questão de saber se os Estados-membros podem, ao abrigo dessa disposição, impor aos organismos de radiodifusão televisiva que dependem da sua jurisdição normas mais rigorosas que as previstas no capítulo IV e fora das circunstâncias definidas pelos artigos 19. e 20.

    39 Embora resulte já da redacção do artigo 20. que esta disposição se aplica sem prejuízo do artigo 3. , não existe, em contrapartida, igual esclarecimento no artigo 19. da directiva.

    40 Todavia, não se pode concluir daí que a faculdade que os Estados-membros têm de impor normas mais rigorosas em matéria de publicidade televisiva e de patrocínio esteja limitada às circunstâncias definidas no artigo 19. da directiva.

    41 Tal interpretação equivaleria a privar de objecto o artigo 3. , n. 1, da directiva, enquanto disposição geral, num domínio essencial abrangido pela directiva.

    42 Ora, não resulta nem dos considerandos, nem do objectivo da directiva que o artigo 19. deva ser interpretado no sentido de privar os Estados-membros da faculdade que lhes foi reconhecida pelo seu artigo 3. , n. 1.

    43 Efectivamente, o vigésimo sétimo considerando faz referência em termos gerais, e sem a limitar às condições definidas no artigo 19. , à faculdade que os Estados-membros têm de fixar normas mais rigorosas ou mais pormenorizadas que as normas mínimas e critérios a que a publicidade televisiva está sujeita por força da directiva.

    44 Além disso, a realização do objectivo da directiva que consiste em assegurar a livre difusão das transmissões televisivas conformes com as normas mínimas por ela previstas não é de modo algum afectada quando os Estados-membros impõem normas mais rigorosas aos organismos de radiodifusão que dependem da sua jurisdição em circunstâncias diferentes das definidas no artigo 19.

    45 Em seguida, quanto à finalidade do artigo 3. , n. 1, da directiva, a TF1 e a M6 sustentaram que resulta do vigésimo sétimo considerando que só o interesse do consumidor pode justificar a instituição de normas mais rigorosas e que, ao excluir da publicidade televisiva a distribuição devido a determinados interesses económicos, o decreto vai mais longe que a directiva.

    46 Este argumento não pode ser acolhido.

    47 Embora pareça ser sugerida por aquele considerando, esta interpretação não encontra fundamento na redacção do artigo 3. , n. 1, que não contém qualquer restrição quanto aos interesses que os Estados-membros podem tomar em consideração. Seja como for, o mesmo considerando não exclui que tais restrições possam ser justificadas pela protecção de outros interesses que não os dos consumidores.

    48 À luz de todas as considerações que antecedem, há que responder à questão submetida que os artigos 30. , 85. , 86. , 5. e 3. , alínea f), do Tratado e a Directiva 89/552 devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que, por via legislativa ou regulamentar, um Estado-membro proíba a transmissão de publicidade ao sector económico da distribuição pelos organismos de radiodifusão televisiva estabelecidos no seu território.

    Decisão sobre as despesas


    Quanto às despesas

    49 As despesas efectuadas pelo Governo francês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

    Parte decisória


    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

    pronunciando-se sobre a questão que lhe foi submetida pelo tribunal de commerce de Paris, por despacho de 27 de Setembro de 1993, declara:

    Os artigos 30. , 85. , 86. , 5. e 3. , alínea f), do Tratado CEE e a Directiva 89/552/CEE do Conselho, de 3 de Outubro de 1989, relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que, por via legislativa ou regulamentar, um Estado-membro proíba a transmissão de publicidade ao sector económico da distribuição pelos organismos de radiodifusão televisiva estabelecidos no seu território.

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