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Document 61993CC0439

    Conclusões do advogado-geral Elmer apresentadas em 21 de Fevereiro de 1995.
    Lloyd's Register of Shipping contra Société Campenon Bernard.
    Pedido de decisão prejudicial: Cour de cassation - França.
    Convenção de Bruxelas - Artigo 5.º, ponto 5 - Litígio relativo à exploração de uma sucursal.
    Processo C-439/93.

    Colectânea de Jurisprudência 1995 I-00961

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1995:50

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

    MICHAEL B. ELMER

    apresentadas em 21 de Fevereiro de 1995 ( *1 )

    Introdução

    1.

    Nos termos do artigo 5.o, ponto 5, da Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, uma pessoa que tenha domicílio no território de um Estado contratante pode ser demandada num outro Estado contratante se se tratar de um litígio relativo à exploração de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento, perante o tribunal do lugar da sua situação.

    A questão sobre a qual o Tribunal de Justiça se tem que pronunciar neste processo prejudicial vindo da Cour de cassation, Paris, é a de saber se o demandante apenas pode fazer uso desta regra de competência especial nos casos em que o litígio incide sobre uma obrigação que deve ser cumprida no Estado em que a filial, a agência ou um outro estabelecimento estão situados.

    Tal limitação geográfica não resulta da letra da disposição. Contudo, uma asserção contida no acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Novembro de 1978 no processo Somafer ( 1 ), pode ser entendida no sentido de que se verifica tal limitação do âmbito de aplicação territorial de disposição.

    Matéria de facto do processo

    2.

    A sociedade por acções francesa Campenon Bernard foi encarregada em 1985 pelo Ministério das Obras Públicas do Koweit de construir uma auto-estrada entre o porto de Koweit e a fronteira iraquiana. O aço a ser utilizado para o betão armado deveria, nos termos do caderno de encargos do dono da obra, preencher os requisitos de uma norma técnica americana denominada ASTM A 615.

    A Campenon Bernard encomendou o aço à sociedade francesa Fercometal, que subcontratou a encomenda com uma sociedade espanhola.

    Com vista a certificar-se de que o aço estava em conformidade com o caderno de encargos do dono da obra, a Campenon Bernard dirigiu-se ao escritório em Paris da sociedade inglesa Lloyd's Register of Shipping (a seguir «Lloyd's Register»), que por contrato datado de 3 de Dezembro de 1985, enviado à Campenon Bernard por carta de 9 de Dezembro de 1985, se encarregou de controlar se o aço estava em conformidade com as normas estipuladas. Nos termos do contrato, o controlo seria efectuado pelo subempreiteiro espanhol da filial espanhola da Lloyd's Register e o pagamento seria feito em pesetas.

    Após o escritório espanhol da Lloyd's Register ter emitido, em 17 e 24 de Janeiro de 1986, certificados de conformidade do aço com as normas técnicas, a Campenon Bernard pagou o preço do respectivo serviço à Fercometal e mandou transportar o aço para o Koweit.

    Contudo, em Maio de 1986, o dono da obra no Koweit rejeitou o aço por o mesmo não estar em conformidade com as normas exigidas.

    Na sequência, a Campenon Bernard accionou judicialmente a Lloyd's Register através do escritório desta em Paris, no tribunal de commerce de Paris, pedindo uma indemnização.

    3.

    No tribunal de commerce de Paris e depois na cour d'appel de Paris, a Lloyd's Register pediu que a acção fosse julgada inadmissível com fundamento em que o artigo 5.o, ponto 5, da Convenção de Bruxelas não atribui competência aos tribunais franceses para julgar a acção. Tendo a Lloyd's Register interposto recurso da decisão da cour d'appel de Paris de 5 de Junho de 1991 para a Cour de cassation, esta submeteu ao Tribunal de Justiça a seguinte questão:

    «Tendo em conta as disposições do artigo 5.o, ponto 1, da Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, o conceito ‘litígio relativo à exploração de uma sucursal...’, contido no artigo 5.o, ponto 5, da mesma convenção, pressupõe necessariamente que as obrigações litigiosas assumidas pela sucursal em nome da casa-mãe devam ser cumpridas no Estado contratante em que a sucursal está situada?»

    Convenção de Bruxelas

    4.

    A regra principal relativa à competência judicial é o artigo 2.o, primeiro parágrafo, da Convenção de Bruxelas, que dispõe:

    «Sem prejuízo do disposto na presente convenção, as pessoas domiciliadas no território de um Estado contratante devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado.»

    5.

    O artigo 5.o, que está incluído no título II, secção 2 da convenção, com a epígrafe «Competências especiais», enumera uma série de regras de competência especiais que o demandante quando for caso disso pode escolher alternativamente ao recorrer a este artigo.

    «Artigo 5.o

    O requerido com domicílio no território de um Estado contratante pode ser demandado num outro Estado contratante:

    1)

    em matéria contratual, perante o tribunal do lugar onde a obrigação que serve de fundamento ao pedido foi ou deva ser cumprida;

    ....

    2)

    ...

    3)

    em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu o facto danoso;

    4)

    ...

    5)

    se se tratar de um litígio relativo à exploração de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento, perante o tribunal do lugar da sua situação;

    6)

    ...

    7)

    ...»

    6.

    No acórdão de reenvio, a Cour de cassation remete para o acórdão Somafer, já referido. Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que

    «... se o artigo 5.o prevê atribuições de competência especiais cuja escolha depende de uma opção do autor, tal deve-se à existência, em determinadas hipóteses bem determinadas, de um elemento de conexão particularmente forte entre um litígio e o órgão jurisdicional que pode ser chamado a conhecer dele, tendo em vista uma útil organização do processo.

    ... tendo em conta o facto de uma multiplicidade de esferas de competência para o mesmo litígio não ser de molde a favorecer a segurança jurídica e a eficácia da protecção jurisdicional no conjunto dos Estados que compõem a Comunidade, insere-se nos objectivos da convenção evitar uma interpretação extensiva e multiforme das excepções à regra geral de competência enunciada no artigo 2.o» (n.o 7),

    e

    «A extensão e os limites da faculdade reservada ao autor pelo artigo 5.o, ponto 5, dependem da apreciação de factores especiais que, quer nas relações entre a administração principal e as suas sucursais, agências ou outros estabelecimentos, quer nas relações entre uma destas últimas entidades e terceiros, justificam, em derrogação do artigo 2.o, a opção atribuída ao referido autor...» (n.o 8).

    Mais adiante, o Tribunal de Justiça declarou:

    «... esse elemento de conexão especial respeita em primeiro lugar aos indícios materiais que permitem facilmente reconhecer a existência da sucursal, da agência ou do estabelecimento e, em segundo lugar, à relação que há entre a entidade assim determinada e o objecto do litígio iniciado contra a administração principal estabelecida noutro Estado contratante» (n.o 11).

    No presente processo, o que reclama atenção é a definição feita pelo Tribunal de Justiça da expressão «exploração» de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento. A este respeito, o acórdão Somafer enuncia o seguinte: —

    «... este conceito de exploração compreende, por um lado, os litígios relativos aos direitos e obrigações contratuais ou não contratuais relativos à gestão propriamente dita da agência, sucursal ou do próprio estabelecimento, tal como os relativos ao arrendamento do imóvel em que essas entidades se encontram instaladas ou à contratação local do pessoal que lá trabalha.

    Por outro lado, o mesmo conceito compreende também os litígios relativos aos compromissos assumidos pelo centro de operações acima descrito em nome da administração principal e que devem ser executados no Estado contratante em que esse centro de operações se encontra estabelecido, bem como os litígios não contratuais que tenham origem nas actividades que a sucursal, agência ou qualquer outro estabelecimento, no sentido acima descrito, desenvolvem no local em que se encontram estabelecidos, por conta da administração principal...» (n.o 13, sublinhado meu).

    7.

    A afirmação do Tribunal de Justiça de que o conceito exploração também abrange as obrigações que a filial, a agência ou qualquer outro estabelecimento assumiu por conta da administração principal deu lugar, no que se refere à frase «que devem ser executados no Estado contratante em que este centro de operações se encontra estabelecido», a comentários críticos tanto na doutrina ( 2 ) como nas conclusões do advogado-geral Sir Gordon Slynn no processo Schotte ( 3 ).

    Processo no Tribunal de Justiça

    8.

    Nas observações escritas apresentadas no Tribunal de Justiça, aderiram àquelas críticas tanto a Campenon Bernard como o Reino Unido e o Governo helénico, assim como a Comissão.

    Ressalta dessas observações que a letra do artigo 5.o, ponto 5, não contém qualquer limitação geográfica de expressão «exploração», que é um conceito meramente económico.

    Se o artigo 5.o, ponto 5, apenas fosse aplicável aos litígios relativos a obrigações que devem ser cumpridas no Estado em que a filial, a agência ou qualquer outro estabelecimento estão situados, o significado prático autónomo da disposição seria aliás extremamente reduzido. Nos termos do artigo 5.o, ponto 1, o tribunal do lugar de cumprimento já é competente em matéria contratual e nos termos do artigo 5.o, ponto 3, o tribunal do lugar onde ocorreu o facto danoso é competente em matéria extracontratual. Com tal limitação, o artigo 5.o, ponto 5, ficaria na realidade reduzido a abranger casos de opção entre circunscrições judiciais dentro de um único Estado contratante, o que não pode ter sido a intenção da disposição.

    Daqui resulta que a disposição do artigo 5.o, ponto 5, tem em vista proteger os interesses do terceiro que contrata com a sucursal ou agência da empresa principal e o interesse deste terceiro é o mesmo independentemente do lugar onde o contrato deva ser cumprido.

    Finalmente, o Reino Unido alega que o artigo 8.o, n.o 2 (em materia de seguros), e o artigo 13.o, n.o 2 (em materia de consumidores), utiliza a mesma terminologia da disposição controvertida do artigo 5.o, ponto 5. Desta forma, na opinião do Reino Unido, as disposições devem ser interpretadas de forma idêntica ( 4 ). O efeito prático do artigo 8.o, n.o 2, e do artigo 13.o, n.o 2, ficariam contudo extremamente reduzidos se estas disposições devessem ser interpretadas de forma tão restritiva como o foi o artigo 5.o, ponto 5, no acórdão Somafer.

    9.

    O Governo francês, nas suas observações, discorda de uma interpretação rigorosamente literal da exigência estabelecida no acórdão Somafer. Sobretudo tendo em conta a posterior decisão do Tribunal de Justiça no processo Schotte ( 5 ), este governo advoga uma solução segundo a qual se deve exigir uma conexão material entre o litígio e o Estado no qual aquele deve ser julgado, de forma a que pelo menos um dos elementos do contrato seja executado nesse Estado.

    10.

    A Lloyd's Register, nas suas observações, insiste para que o Tribunal de Justiça mantenha na totalidade a limitação geográfica do artigo 5.o, ponto 5, tal como foi declarada no acórdão Somafer e, a este propósito, alega que a razão da disposição é uma consideração de natureza prática processual no sentido de permitir decidir o litígio no próprio local. O advogado-geral Reischl, nas suas conclusões no processo Blanckaert & Willems ( 6 ), também interpreta o acórdão Somafer da forma seguinte:

    «... Por outro lado, o referido acórdão permite deduzir que para efeitos do artigo 5.o, ponto 5, da convenção sobre competência judiciária não são suficientes certas restrições da independência de um representante e certas possibilidades de influência da casa-mãe. No caso de uma agência, deve antes tratar-se de algum modo de uma parte descentralizada da empresa, que no essencial tem competências comerciais semelhantes às da casa-mãe, mas limitadas naturalmente ao território do E stado-Membro em que se encontra. Isto é exigido, em minha opinião, pela já referida formulação e especialmente pela expressão ‘centro de operações comerciais’(sublinhado meu)».

    Segundo a Lloyd's Register, esta exigência relativa ao lugar de cumprimento não dá lugar a qualquer restrição do alcance da disposição incompatível com a sua letra.

    Apreciação

    11.

    Segundo jurisprudência constante, as regras de competência especial da convenção — que constituem excepções à regra principal do artigo 2.o, primeiro parágrafo, do domicílio do demandado — devem ser interpretadas restritivamente ( 7 ).

    12.

    Pode à primeira vista afigurar-se duvidoso se, no que se refere ao presente processo, é de atribuir importância ao que foi declarado no acórdão Somafer sobre o conceito de exploração.

    Em primeiro lugar, a decisão contém no n.o 13 uma indicação do que está abrangido pelo conceito de exploração, mas nada vem indicado sobre o que não está abrangido por este conceito, como se vê das expressões «este conceito de exploração compreende, por um lado...» e «por outro lado, o mesmo conceito compreende também...». O Tribunal de Justiça não teve aqui qualquer oportunidade de se pronunciar sobre a questão da introdução de uma limitação geográfica no artigo 5.o, ponto 5. O litígio que constituía o objecto do processo no tribunal a quo dizia respeito nomeadamente a um caso que também estava abrangido por aquela disposição mesmo que se admitisse como válida tal limitação e, conforme resulta das alegações das partes, nem sequer foi discutida a questão de uma limitação geográfica.

    Em segundo lugar, deve salientar-se que a declaração do Tribunal de Justiça de que o conceito de exploração também abrange «os litígios relativos aos compromissos assumidos pelo centro de operações acima descrito em nome da administração principal e que devem ser executados no Estado contratante em que esse centro de operações se encontra estabelecido» tem a natureza de um «obiter dictum». Com efeito, não era um litígio dessa natureza que constituía o objecto do processo, mas sim um litígio relativo a obrigações «não contratuais que tenham origem nas actividades que a sucursal, agência ou qualquer outro estabelecimento, no sentido acima descrito, desenvolvem no local em que se encontram estabelecidos, por conta da administração principal».

    Remete-se para o n.o 2 do acórdão, segundo o qual o processo diz respeito a uma questão de competência do tribunal alemão

    «... para conhecer de uma acção intentada por uma empresa alemã contra uma empresa francesa cuja sede social se situa em território francês, mas que possui no território da República Federal da Alemanha um escritório ou ponto de contacto designado no seu papel timbrado como ‘Vertretung für Deutschland’, e destinada ao reembolso das despesas efectuadas pela empresa alemã com o objectivo de proteger as condutas de gás que lhe pertencem dos danos que poderiam resultar dos trabalhos de demolição que a empresa francesa executava nas proximidades, por conta do Land de Sarre».

    Tem pois que se admitir que o Tribunal de Justiça, através desta declaração, não tomou posição sobre uma questão de aplicação do artigo 5.o, ponto 5 num caso como o que agora se apresenta.

    13.

    Observação análoga pode ser feita relativamente ao processo Blanckaert & Willems ( 8 ). Este tinha como objecto a competência de um tribunal alemão para decidir um litígio relativo à representação da demandada no Rhein-Ruhr/Eifel/Süd-Westfalen. A observação do advogado-geral Reischl ( 9 ), segundo a qual as competências comerciais estão naturalmente limitadas ao território do Estado contratante, situava-se num contexto em que não era necessário analisar as consequências da concepção oposta.

    14.

    No acórdão de 9 de Dezembro de 1987, processo Schotte ( 10 ), o Tribunal de Justiça não se pronunciou sobre a questão de saber em que medida está contida no artigo 5.o, ponto 5, uma limitação geográfica, questão que, como acima foi dito ( 11 ), foi debatida pelo advogado-geral Sir Gordon Slynn. Não foi propriamente submetida uma questão prejudicial quanto a este aspecto, mas resulta claramente dos autos que os vaporizadores de perfume a que o processo se refere não iam ser fornecidos no Estado contratante em que a filial, a agência ou outro estabelecimento estavam situados (Alemanha) mas, pelo contrário, no Estado contratante em que a empresa-mãe demandada estava situada (França).

    Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 5.o, ponto 5, pode ser aplicável numa situação «em que duas sociedades têm o mesmo nome e dispõem de uma direcção comum e em que uma delas, embora não sendo uma sucursal ou agência da outra, desprovida de autonomia, conclui, apesar disso, negócios por conta da outra, agindo assim como um seu prolongamento nas relações comerciais» (n.o 13).

    Sublinha-se além disso no acórdão que a empresa alemã «não teve apenas intervenção na negociação e celebração do contrato, mas que se ocupou igualmente, na fase da execução do contrato, da recepção dos fornecimentos acordados e do pagamento das facturas» (n.o 14).

    O litígio dizia respeito «à execução de certas encomendas relativas à entrega... à sociedade francesa de vaporizadores...».

    O Tribunal indicou, assim, expressamente que se tratava de um fornecimento a uma empresa em França sem referir a questão de uma limitação geográfica na aplicação do artigo 5.o, ponto 5, num caso em que esta limitação possivelmente teria conduzido ao resultado contrário ( 12 ).

    15.

    É certo que não posso aderir ao ponto de vista do Reino Unido de que deve ser dada a mesma interpretação às disposições de idêntica formulação do artigo 5.o, ponto 5, por um lado, e do artigo 8.o, segundo parágrafo, e artigo 13.o, segundo parágrafo, por outro ( 13 ). Em minha opinião, este argumento é enfraquecido em significativo grau, designadamente pela finalidade específica das duas últimas disposições citadas: proteger, respectivamente, o tomador do seguro (artigo 8.o, segundo parágrafo) e o consumidor (artigo 13.o, segundo parágrafo), que por definição são as partes fracas nas relações contratuais em causa. A isto acresce a significativa diferença que reside no facto de o artigo 5.o, ponto 5, ser aplicável quando o demandado tem o seu domicílio no território de um Estado contratante, ao passo que os artigos 8.o, segundo parágrafo, e 13.o, segundo parágrafo, visam expressamente a situação em que o segurador ou a parte que contrata com o consumidor não têm domicílio no território do Estado contratante. Concordo naturalmente que as duas últimas disposições citadas dificilmente podem ser aplicáveis com uma limitação geográfica como a que é objecto do litígio no presente processo. Mas isto não conduz a que se possa directamente daí deduzir que esta limitação não pode ser mantida no que respeita ao artigo 5.o, ponto 5.

    16.

    Em contrapartida, é de atribuir uma importância decisiva ao facto de o artigo 5.o, n.o 5, ficar praticamente destituído de conteúdo autónomo se apenas fosse de aplicar a litígios relativos a obrigações que devessem ser cumpridas no Estado contratante em que se situa a sucursal, a agência ou qualquer outro estabelecimento. Com efeito, o tribunal do lugar de cumprimento já é competente em matéria contratual nos termos do artigo 5.o, ponto 1, e o tribunal do lugar onde ocorreu o facto danoso já é competente em matéria de responsabilidade extracontratual, nos termos do artigo 5.o, ponto 3. Como foi sublinhado pela Campenon Bernard, pelo Reino Unido, pelo Governo helénico bem como pela Comissão, o artigo 5.o, ponto 5, com tal limitação, ficaria na realidade reduzido a apenas se aplicar ao caso de escolha entre várias circunscrições judiciais no interior do Estado contratante em causa.

    17.

    Se fosse de interpretar genericamente o conceito económico de «exploração» do artigo 5.o, ponto 5, no sentido de que o mesmo continha uma limitação geográfica, tal conduziria a significativas dificuldades de interpretação e, portanto, a uma consequente insegurança jurídica. Será de excluir, por exemplo, a aplicação desta disposição na hipótese de um — apenas um — elemento do contrato dever ser executado fora do território do Estado contratante? A proposta do Governo francês, segundo a qual se deve poder exigir que no mínimo um dos elementos do contrato seja executado no interior do Estado contratante, suscita a mesma dificuldade, ainda que de sinal contrário. Pode-se por exemplo exigir que este- elemento do contrato seja substancial? Poderá o co-contratante vir a subtrair-se à justiça fazendo cumprir fora do Estado contratante determinadas partes da obrigação que assumiu, por exemplo, encarregando um subcontratante, e terá importância, quanto a este ponto, que exista um acordo segundo o qual se possa recorrer a (um determinado) subcontratante para o cumprimento da obrigação? E que diferenças eventualmente derivarão deste critério conforme se trate de um fornecimento de mercadorias ou de uma prestação de serviços?

    Em vez de clarificar a situação, uma limitação geográfica como a aqui controvertida suscita uma série de problemas e é desta forma fonte de insegurança jurídica.

    18.

    Acresce que o artigo 5.o, ponto 5, visa dois objectivos:

    por um lado, facilitar o direito de acção do demandante no caso de existir «um centro de operações que se manifesta exteriormente de forma duradoura, como o prolongamento de uma sede, dotado de uma direcção e materialmente equipado de modo a poder celebrar negócios com terceiros, de tal modo que estes, cientes de que uma eventual relação jurídica se irá estabelecer com a administração principal cuja sede é no estrangeiro, ficam dispensados de se dirigir a esta e podem celebrar negócios com o centro de operações que constitui um prolongamento da primeira» (acórdão Somafer, n.o 12);

    por outro, como foi referido nas observações do Reino Unido, aproximar a situação acima descrita do ponto de partida definido no artigo 2.o, primeiro parágrafo, da convenção, sobre a competência geral do tribunal do domicílio do demandado. Com efeito, relativamente a representações como as enunciadas no artigo 5.o, ponto 5, — destituídas de personalidade jurídica — não existe, por definição, fixação de competência judicial em função do domicílio.

    Desta forma, em minha opinião, o artigo 5.o, ponto 5, deve ser interpretado em conformidade com a sua clara formulação, que não contém qualquer limitação geográfica.

    Conclusão

    19.

    Pelos fundamentos expostos, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à questão colocada da forma seguinte:

    «O conceito de ‘litígio relativo à exploração de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento...’ contido no artigo 5.o, ponto 5, da Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, não contém nenhuma exigência no sentido de que as obrigações que uma filial assumiu em nome da casa-mãe devam ser cumpridas no Estado contratante em que a filial está estabelecida.»


    ( *1 ) Língua original: dinamarquês.

    ( 1 ) 33/78, Recueil, p. 2183.

    ( 2 ) V. Gotliot c Holleaux: La convention de Bruxelles, 1985, p. 56. Dicey and Morris: On the Conßict of Laws, London 1987, p. 348. V. também: H. Tebbens: Compétence judiciaire et exécution des jugements en Europe, Butterwortlis, 1993, p. 99.

    ( 3 ) Acórdão dc 9 dc Dezembro dc 1987 (218/86, Colect., p. 4905).

    ( 4 ) V. também as conclusões do advogado-geral Darmon no processo Shearson Lehman Hutton, acórdão de 19 de Janeiro de 1993 (89/91, Colect., p. I-139).

    ( 5 ) V. nota 3.

    ( 6 ) Acórdão de 18 de Março de 1981 (139/80, Recueil, p. 819).

    ( 7 ) V. por exemplo o acórdão de 27 de Setembro de 1988, Kailelis (189/87, Colect., p. 5565, n.o 19) c acórdão de 17 de Junho de 1992, Handte (C-26/91, Colect., p. I-3967, n.o 14).

    ( 8 ) V. nota 6.

    ( 9 ) V. conclusões do advogado-geral, pp. 835 e 836.

    ( 10 ) V. nota 3.

    ( 11 ) V. o ponto 7 das presentes conclusões.

    ( 12 ) No acórdão de 6 de Outubro de 1976, De Bloos (14/76, Recueil, p. 1497), o artigo 5.o n.o 5, não tem aplicação por outras razões, e portanto a questão não ć abordada.

    ( 13 ) O teor das disposições è o seguinte:

    Artigo 8.o, segundo parágrafo: «O segurador que, não tendo domicílio no território cie um Estado contratante, possua sucursal, agencia ou qualquer outro estabelecimento num Estado contratante, sent considerado, quanto aos litígios relativos à exploração daqueles, como tendo domicílio no território desse Estado.»

    Artigo 13.o, segundo parágrafo: «O co-contratante do consumidor que, não tendo domicílio no território de um Estado contratante, possua sucursal, agencia ou qualquer outro estabelecimento num Estado contratante será considerado, quanto aos litígios relativos it exploração daqueles, como tendo domicílio no território desse Estado.»

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