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Document 61993CC0306

Conclusões do advogado-geral Gulmann apresentadas em 13 de Julho de 1994.
SMW Winzersekt GmbH contra Land Rheinland-Pfalz.
Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Mainz - Alemanha.
Reenvio prejudicial - Apreciação de validade - Designação dos vinhos espumantes - Proibição de referência ao método de elaboração dito 'méthode champenoise'.
Processo C-306/93.

Colectânea de Jurisprudência 1994 I-05555

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:291

61993C0306

Conclusões do advogado-geral Gulmann apresentadas em 13 de Julho de 1994. - SMW WINZERSEKT GMBH CONTRA LAND RHEINLAND-PFALZ. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: VERWALTUNGSGERICHT MAINZ - ALEMANHA. - REENVIO PREJUDICIAL - APRECIACAO DA VALIDADE - DESIGNACAO DOS VINHOS ESPUMANTES - PROIBICAO DE REFERENCIA AO METODO DE ELABORACAO DITO "METHODE CHAMPENOISE". - PROCESSO C-306/93.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-05555


Conclusões do Advogado-Geral


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Senhor Presidente,

Senhores Juízes,

1. O Verwaltungsgericht Mainz submeteu ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial sobre a validade do artigo 6. , n. 5, do Regulamento (CEE) n. 2333/92 do Conselho, de 13 de Julho de 1992, que estabelece as regras gerais para a designação e a apresentação dos vinhos espumantes e dos vinhos espumosos (1). As disposições deste artigo determinam que a menção "méthode champenoise" ° após o termo de um período transitório ° só possa ser utilizada para os vinhos espumantes que tenham direito à denominação controlada "Champagne". O Verwaltungsgericht duvida da validade destas disposições, atendendo ao direito fundamental do livre exercício de uma actividade profissional e ao princípio da não discriminação.

O processo perante o Verwaltungsgericht opõe o Land Rheiland-Pfalz à empresa SMW Winzersekt GmbH, que é uma associação de viticultores que produz vinho espumante a partir de vinhos da região de cultivo Moselle-Sarre-Ruwer e que comercializa os seus produtos sob a denominação "Sekt" e com uma das duas menções "Flaschengaerung im Champagneverfahren" (fermentação em garrafa pelo método champanhês) ou "Klassische Flaschengaerung ° méthode champenoise" (fermentação clássica em garrafa ° método champanhês). Na sequência das presentes conclusões referir-nos-emos a estas menções simplesmente por "méthode champenoise". As disposições mencionadas têm por efeito que a Winzersekt deixará de poder utilizar estas menções depois de 31 de Agosto de 1994. A associação contestou a legalidade dessas disposições.

2. O pano de fundo e os factos do processo são os seguintes: desde os anos 20, os vinhos espumantes alemães, que podiam antigamente ser comercializados sob o nome de "Champagner", deixaram de poder utilizar esse nome devido à protecção concedida à denominação francesa "Champagne", sendo, em seguida, comercializados sobretudo sob a denominação "Sekt". A protecção concedida ao "champagne" não impedia, contudo, nem os produtores alemães, nem a outros produtores franceses, de utilizarem nos seus produtos a menção "méthode champenoise".

3. Esta menção refere-se a um determinado processo de fabrico, cujos contornos são imprecisos mas que, segundo as informações disponíveis, se distingue normalmente de outros processos de fabrico do vinho espumante pelos dois elementos seguintes:

° a fermentação do vinho para o tornar espumante ° o que se designa por segunda fermentação ° é feita em garrafa, e

° a separação das borras do vinho é feita por escoamento.

4. Em 1985, o legislador comunitário procedeu à regulamentação da designação e apresentação dos vinhos espumantes e adoptou, com esse fim, o Regulamento (CEE) n. 3309/85, que foi em seguida revogado pelo regulamento acima referido. As disposições do artigo 6. , n. 5, do regulamento de 1985 eram practicamente idênticas às que constituem o objecto do presente processo e tinham igualmente por efeito proibir no final de um período transitório, até 1 de Setembro de 1994, a utilização da menção "méthode champenoise" nos vinhos espumantes que não tivessem direito à denominação "Champagne". A anulação dessas disposições foi pedida por um produtor alemão, Deutz und Geldermann, que se encontrava na mesma situação da Winzersekt. O Tribunal de Justiça rejeitou o pedido por inadmissível, por acórdão de 24 de Fevereiro de 1987, Deutz und Geldermann/Conselho (2).

5. A Winzersekt começou por interpor recurso para o Verwaltungsgericht Mainz para que fosse declarado que a associação tinha direito, até 31 de Agosto de 1994, a utilizar a menção "méthode champenoise" e, por acórdão de 2 de Fevereiro de 1989, o Verwaltungsgericht deu provimento ao recurso. Em seguida, a Winzersekt solicitou à administração do Land Rheinland-Pfalz um "parecer vinculativo" sobre a legalidade de utilizar essa menção também depois de 31 de Agosto de 1994. Por decisão de 15 de Janeiro de 1992, a administração comunicou à Winzersekt que a associação deixaria de ter direito de utilizar essa menção depois de 31 de Agosto de 1994, após o que a Winzersekt interpôs recurso para o Verwaltungsgericht para que declarasse a ilegalidade dessa decisão, de forma a permitir à associação a utilização da menção "méthode champenoise" também após essa data. Considerando que o resultado do recurso dependia da legalidade ou não do artigo 6. , n. 5, do Regulamento n. 2333/92, o Verwaltungsgericht submeteu ao Tribunal de Justiça a seguinte questão:

"A regulamentação contida nos segundo e terceiro parágrafos do n. 5 do artigo 6. , do Regulamento (CEE) n. 2333/92 do Conselho, de 13 de Julho de 1992... é inválida na medida em que determina que a partir de Setembro de 1994 deixa de ser admitida a referência ao método de produção denominado 'méthode champenoise' , em conjunto com uma menção equivalente relativa a este método de elaboração, nos vinhos espumantes de qualidade produzidos em região determinada que não tenham direito à denominação de origem 'Champagne' "?

6. A Winzersekt, o Conselho, o Governo francês e a Comissão apresentaram observações ao Tribunal de Justiça.

7. A título preliminar, temos que nos debruçar brevemente sobre a proposta de resposta apresentada a título principal pelo Governo francês nas observações escritas, no sentido de que o Tribunal de Justiça declare o pedido inadmissível. A argumentação subjacente a esta proposta é a de que, na época dos factos referidos no processo principal, o regulamento em vigor não era o referido na questão submetida, mas o Regulamento n. 3309/85. Por conseguinte, a questão não seria pertinente. Na audiência, o Governo francês exprimiu, além disso, dúvidas sobre se o litígio subjacente ao processo principal tem existência real.

8. Em nossa opinião, deve afastar-se esta proposta de resposta, porque é indiscutível que as disposições em causa, salvo diferenças menores de redacção, são idênticas nos dois regulamentos, não tendo sido posto em dúvida, nem sequer pelo Governo francês, que a resposta do Tribunal à questão colocada permitirá ao Verwaltungsgericht resolver o processo que lhe foi submetido. Quanto à realidade do litígio, limitar-nos-emos a observar que nada permite duvidar do interesse da Winzersekt em poder continuar a utilizar a menção em causa e, além disso, que não faria qualquer sentido obrigar a associação a esperar pelo termo do período transitório para poder esclarecer a situação jurídica. Por consequência, consideramos útil examinar a legalidade do n. 5 do artigo 6. do Regulamento n. 2333/92.

9. Quanto ao mérito, é oportuno realçar, em primeiro lugar, o enquadramento regulamentar em que se inserem as disposições do n. 5 do artigo 6. O Regulamento n. 2333/92, bem como o seu antecessor, o Regulamento n. 3309/85, estabelecem regras para a designação e a apresentação dos vinhos espumantes, tendo as regras comunitárias relativas à definição e à produção sido estabelecidas, nomeadamente, pelo Regulamento (CEE) n. 822/87 do Conselho, de 16 de Março de 1987 (3), e pelo Regulamento (CEE) n. 2332/92 do Conselho, de 13 de Julho de 1992 (4). Neles se estabelece uma distinção fundamental entre três tipos de vinho espumante: os "vinhos espumantes de qualidade produzidos numa região determinada" (veqprd), cuja qualidade é considerada como sendo a melhor, e os "vinhos espumantes de qualidade", cuja qualidade é tida por superior à dos "vinhos espumantes".

10. O Regulamento n. 2333/92 formula definições nos seus dois primeiros artigos, dividindo-se, em seguida, em três títulos, o primeiro respeitante à designação, o segundo à apresentação, sendo que o terceiro contém disposições gerais. O primeiro título abrange os artigos 3. a 8. Dos artigos 3. a 5. constam as disposições relativas às menções que devem obrigatoriamente figurar na etiquetagem. Resulta, entre outras coisas, do n. 2 do artigo 5. , que as denominações "Sekt" e "Sekt bestimmter Anbaugebiete" são reservadas, respectivamente, aos vinhos espumantes de qualidade e aos vinhos espumantes de qualidade produzidos numa região determinada. O artigo 6. diz respeito às menções facultativas, o artigo 7. refere as línguas em que as menções devem ser feitas e o artigo 8. prevê obrigações relativas à conservação dos registos e dos diversos documentos. O artigo 13. , integrado no título terceiro, prevê, de forma geral, que a designação, a apresentação, bem como toda a publicidade relativa aos vinhos espumantes não devem apresentar erros de natureza a criar confusões ou a induzir em erro.

11. O n. 1 do artigo 6. diz respeito à utilização de nomes de unidades geográficas, o n. 2 à utilização dos nomes das variedades de casta e o n. 3 à indicação da menção "fermentação em garrafa". O n. 4 refere-se à indicação das menções "fermentação em garrafa segundo o método tradicional", ou "método tradicional", "método clássico" e "método tradicional clássico" ° a seguir, referiremos estas menções sob a designação única de "método tradicional". O n. 5 prevê a utilização de termos derivados de nomes de unidades geográficas em ligação com as menções relativas a um processo de fabrico, donde resulta que a denominação "Champagne" é reservada aos vinhos que têm direito à denominação controlada do mesmo teor, e o n. 6 refere-se à menção "Winzersekt" ° que é reservada aos vinhos espumantes de qualidade produzidos numa região determinada da Alemanha que preencham certas condições ° bem como à menção "crémant" ° reservada a vinhos espumantes de qualidade produzidos numa região determinada de França ou do Luxemburgo que preencham certas condições estabelecidas pelo respectivo legislador nacional (5). Por último, os n.os 7 a 11 dizem respeito a outras menções e o n. 12 trata das questões que podem ser objecto de ulterior regulamentação através de normas de execução.

12. Assim, a regulamentação que enquadra o n. 5 do artigo 6. é bastante pormenorizada, cabendo observar que as menções autorizadas remetem para elementos bastante precisos, por forma a revestirem grande valor informativo para os meios interessados. Deve igualmente notar-se que as menções champagne, Winzersekt e crémant são especiais, no sentido de que deve ser especialmente elevada a qualidade dos vinhos espumantes que as podem conter, pelo facto de terem de preencher condições suplementares em relação às exigidas para que um vinho possa ser qualificado de vinho espumante de qualidade produzido numa região determinada.

13. O n. 5 do artigo 6. determina:

"A indicação de uma menção relativa a um método de produção que inclua o nome de uma região determinada ou de uma outra unidade geográfica, ou de um termo derivado de um destes nomes, só pode ser utilizada para a designação:

° de um veqprd,

° de um vinho espumante de qualidade,

...

Esta menção só é permitida para a designação de um produto que tenha direito a uma indicação geográfica referida no primeiro parágrafo.

Contudo, a referência ao método de produção dito 'méthode champenoise' , desde que de uso tradicional, poderá ser utilizada em conjunto com uma menção equivalente relativa a este método de produção durante cinco campanhas vitícolas, a partir de 1 de Setembro de 1989, para os vinhos que não têm direito à denominação controlada 'Champagne' .

Além disso, a utilização de uma menção referida no terceiro parágrafo só será permitida desde que as condições referidas no segundo parágrafo do n. 4 sejam respeitadas".

14. O n. 4, segundo parágrafo, estabelece que os vinhos espumantes de qualidade e os vinhos espumantes de qualidade produzidos numa região determinada podem conter a menção "método tradicional" em determinadas condições, ou seja, no caso de o vinho em causa

"ter sido tornado espumante por segunda fermentação alcoólica em garrafa;

ter-se encontrado sem interrupção nas borras durante, pelos menos, nove meses na mesma empresa desde a constituição do vinho de base, (e)

tiver sido separado das borras por escoamento".

15. A remissão feita no último parágrafo do n. 5 para o segundo parágrafo do n. 4 implica, assim, que a utilização da menção "méthode champenoise" está sujeita, durante o período transitório, às mesmas condições que a da menção "método tradicional"; quer dizer, que estas duas menções se referem a um processo de fabrico; é precisamente este ponto que constitui a base da fundamentação do Verwaltungsgericht e da argumentação da Winzersekt.

16. A Winzersekt expôs longamente a importância de que a menção "méthode champenoise" se reveste para a sua actividade comercial, na medida em que lhe permite dar a conhecer ao público o seu processo de fabrico. A associação referiu que este processo a distingue da grande maioria dos produtores alemães de vinho espumante, que utilizam como processo de fabrico quer o método designado de cuba fechada, quer o método de transfega. Destes dois métodos, o da cuba fechada é de longe o mais corrente na Alemanha. O primeiro consiste em que a fermentação, para tornar o vinho espumante, é feita em cuba, enquanto que o segundo implica que, à semelhança do método champanhês, a fermentação seja feita em garrafa, e que, diversamente do método champanhês, a separação das borras se faça por transfega e filtração numa cuba.

17. A Winzersekt referiu que, quando a fermentação é feita em cuba, o processo de fabrico é consideravelmente mais curto, menos oneroso e mais industrial, relativamente ao método champanhês, e que, por esse facto, os produtores que utilizam o método dito de cuba fechada estão em condições de propor os seus produtos aos consumidores a preços bastante mais interessantes do que a Winzersekt. A forma de chamar a atenção dos consumidores para os vinhos espumantes da associação ° que se caracterizam, além disso, pela delicadeza do seu espumante e que chegam aos consumidores através de uma rede comercial diferente da dos espumantes produzidos em cuba ° consiste em utilizar a menção "méthode champenoise". A associação ficará prejudicada em termos de concorrência e a sua existência será mesmo posta em perigo se não puder continuar a utilizar essa menção. A menção "método tradicional" ° que, na óptica da regulamentação, visa substituir a que está em causa, de que seria equivalente ° não apresenta de modo algum o mesmo atractivo, sendo que a única forma de restabelecer o equilíbrio das relações concorrenciais consistiria em impor aos produtores de vinhos espumantes produzidos por fermentação em cuba a obrigação de designar os seus produtos com a menção "obtido por fermentação em cuba".

18. A Winzersekt alega ser insustentável que "a 'méthode champenoise' , enquanto método de fabrico, remeta para o Champagne... (e que) a noção de 'méthode champenoise' se dissociou completamente e a 100% da noção de área geográfica...". A utilização de uma menção que apenas se refere ao processo de fabrico do vinho espumante e que no espírito do consumidor de modo algum induz em erro, não pode deixar de ser lícita. A proibição de tal menção prejudica, portanto, a liberdade económica da Winzersekt (6).

19. As razões que levaram o Verwaltungsgericht a ter dúvidas sobre a legalidade das disposições em causa, à luz do princípio da liberdade de exercício de uma actividade profissional, são referidas no despacho de reenvio da seguinte forma:

As disposições do n. 5 do artigo 6. , "limitam o exercício da actividade da recorrente (Winzersekt). Com efeito, impõem-lhe que, no futuro, deixe de comercializar os seus produtos com a menção até então admitida...

O objectivo destas disposições é... o de impedir que seja criada a impressão errada de que um vinho espumante provém de uma unidade geográfica, quando esta é utilizada juntamente com uma indicação quanto ao seu processo de fabrico.

Tal risco de confusão não parece existir, contudo, com a menção 'méthode champenoise' e 'Champagnerverfahren' . Com efeito, ela é utilizada há cerca de um século exclusivamente para caracterizar um processo de fabrico, adquirindo entretanto um significado de tal forma autónomo que a sua utilização não está ligada à ideia de que o vinho espumante assim designado provém da região de Champagne...

O risco de confusão é tanto menor quanto a origem dos vinhos espumantes produzidos pela recorrente é claramente precisada pela indicação da região determinada Moselle-Sarre-Ruwer.

Com base no que precede, as disposições do n. 5 do artigo 6. , segundo e terceiro parágrafos, do Regulamento (CEE) n. 2333/92 não se revelam necessárias na medida definida relativamente aos objectivos fixados. Por conseguinte, constituem uma violação desproporcionada, portanto ilegal, do livre exercício de uma actividade profissional".

20. O Conselho, o Governo francês e a Comissão sustentaram que as disposições em causa são lícitas, alegando, no essencial, que são necessárias quer para assegurar a protecção do consumidor e a concorrência leal, quer para proteger o nome de um produto prestigiado como o é o champanhe. Com efeito, a utilização de um termo não relacionado com a noção de área geográfica, tal como "méthode", não é suficiente para evitar que, face a um produto que tenha a menção "méthode champenoise", o consumidor não possa enganar-se quanto à sua origem e, em qualquer caso, tal termo é susceptível de criar a impressão de que as qualidades intrínsecas deste produto estão ao mesmo nível das do champanhe.

21. Nomeadamente o Conselho e Comissão referiram, para justificar as disposições em causa, o décimo terceiro considerando do preâmbulo do Regulamento n. 2333/92, que está redigido da seguinte forma:

"considerando que, tendo em conta as obrigações internacionais da Comunidade e dos Estados-membros em matéria de protecção das denominações de origem ou de indicações de proveniência geográfica dos vinhos, é conveniente prever que a utilização de menções relativas a um método de produção não possa referir-se ao nome de uma unidade geográfica a não ser que o produto em causa possa ser designado por esse nome".

As duas instituições defenderam que as disposições em causa se integram perfeitamente numa rede de acordos internacionais, quer multilaterais, quer bilaterais, que visam a protecção das denominações de origem e das indicações de proveniência, bem como no resto da regulamentação comunitária com o mesmo objectivo, no que se refere ao facto de as denominações de origem e as indicações de proveniência não serem apenas protegidas relativamente às menções directamente enganosas, como também relativamente às menções que contenham termos que visem anular a referência geográfica, tais como "imitação", "género", "tipo", "marca", "método". Com efeito, tais menções têm por objectivo aproveitar-se do prestígio de uma denominação de origem ou de uma indicação de proveniência.

22. Além disso, o Conselho remeteu para o facto de, no acórdão de 10 de Novembro de 1992, Expotur (7), o Tribunal de Justiça ter já admitido a procedência, em direito comunitário, de uma política destinada a proteger as denominações de origem e as indicações de proveniência.

Por último, o Conselho alega que, ao adoptar esta regulamentação, não excedeu os limites da sua margem discricionária.

23. Consideramos ser útil recordar a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual

"... tanto o direito de propriedade como o livre exercício de actividades profissionais fazem parte dos princípios gerais do direito comunitário. No entanto, tais princípios não constituem prerrogativas absolutas, mas devem ser tomados em consideração tendo presente a sua função na sociedade. Consequentemente, podem ser introduzidas restrições à utilização do direito de propriedade e ao livre exercício de uma actividade profissional, designadamente no âmbito de uma organização comum de mercado, desde que tais restrições respondam efectivamente a objectivos de interesse geral prosseguidos pela Comunidade e não constituam, à luz do objectivo prosseguido, uma intervenção desproporcionada e intolerável que afecte a própria essência dos direitos desse modo garantidos" (8).

24. É claro que as disposições em causa não afectam a própria essência do direito ao livre exercício de uma actividade profissional. A questão que se coloca é, pois, a de saber se as disposições prosseguem objectivos de interesse geral e se não afectam de forma desproporcionada a situção da Winzersekt.

25. A protecção dos consumidores e a salvaguarda de uma concorrência leal são certamente objectivos de interesse geral. O mesmo sucede no que se refere à protecção das denominações controladas.

26. O núcleo da questão reside, portanto, em saber se a supressão da menção "méthode champenoise" é necessária para se atingirem estes objectivos e, assim, se não é uma medida desproporcionada. O Conselho e a Comissão consideram que esta questão deve ser apreciada à luz das obrigações internacionais contraídas pela Comunidade e pelos Estados-membros e de outras disposições da regulamentação comunitária.

27. Nem o Conselho nem a Comissão foram, contudo, capazes de indentificar o tratado multilateral de que resultava para a Comunidade ou para os Estados-membros a obrigação de proibir a menção "méthode champenoise". As duas instituições referiram-se, nomeadamente, a uma resolução da assembleia geral do Secretariado Internacional do Vinho (9). Trata-se da resolução n. 7 da sexagésima primeira assembleia geral do Conselho de 7 de Setembro de 1981, em que a Comissão participou (10). É certo que esta resolução refere as expressões que visam anular a referência geográfica, mas prevê simultaneamente a possibilidade de encontrar "acordos destinados a regular alguns casos especiais usuais". Não é de forma alguma possível sustentar que desta resolução decorrem obrigações concretas e precisas; independentemente também do facto de, segundo as informações disponíveis, os compromissos assumidos no âmbito do Secretariado Internacional do Vinho não poderem ser qualificados como obrigações de direito internacional.

28. Quanto aos acordos bilaterais celebrados pela Comunidade, trata-se de disposições gerais, das quais não se pode concluir que a Comunidade decidiu proibir a menção "méthode champenoise" (11) para proteger os consumidores do Estado terceiro em causa.

29. Dentre os acordos bilaterais celebrados pelos Estados-membros, o Conselho e a Comissão referiram-se, nomeadamente, ao estabelecido entre a República Francesa e a República Federal da Alemanha, relativo à protecção das indicações de proveniência, denominações de origem e outras denominações geográficas, de 8 de Março de 1960 (12). Os artigos 2. e 3. deste acordo determinam que as denominações constantes dos anexos A e B do acordo são exclusivamente reservadas quer para os produtos franceses, quer para os produtos alemães. Em seguida, o artigo 4. dispõe que a utilização destas denominações em contravenção do disposto nos artigos 2. e 3. deve ser reprimida. Ambas as instituições se referiram ao n. 2 do artigo 4. deste acordo, que prevê que a utilização de menções que contenham termos que visem anular a referência geográfica deve ser igualmente reprimida, e, com esta base, a Comissão argumenta que a menção "méthode champenoise" parece ser contrária ao acordo. A Comissão prossegue, assim, nas suas observações escritas: "Esta tese é confirmada pelo artigo 5. do acordo, em conjugação com o artigo 3. , ponto c) do protocolo anexo, que considera a expressão 'méthode champenoise' como uma indicação das características essenciais exclusivamente dos produtos franceses; aqui, a proibição de induzir em erro diz respeito unicamente à utilização ° única autorizada ° de tais menções nos produtos franceses."

30. Temos dificuldade em subscrever esta leitura do acordo. É certo que a disposição acima mencionada do protocolo anexo ao acordo inclui o "méthode champenoise" na enumeração a que procede das indicações relativas às qualidades essenciais, no que se refere aos vinhos franceses, mas o artigo 5. do acordo não estabelece a proibição de utilização dessa menção, limitando-se à repressão "das indicações falsas ou enganosas quanto... às qualidades essenciais dos produtos ou mercadorias" (sublinhado nosso). Sendo pacífico que, antes da regulamentação comunitária, a única definição legal do processo de fabrico abrangido pela menção "méthode champenoise" era a constante do artigo 161. do code du vin francês que, para a utilização da menção, apenas exigia que os vinhos se tivessem "tornado espumantes pela fermentação natural em garrafas", e que, em consequência, a menção era também correntemente utilizada por produtores franceses de fora da região de Champagne, tendemos a considerar ° do mesmo modo que o Verwaltungsgericht Mainz na referida decisão de 2 de Fevereio de 1989 ° não ser possível acusar-se o produtor alemão, que utilizava este processo de produção e a menção, de que estava a utilizar indicações falsas ou enganosas, na acepção do artigo 5. do acordo.

31. Quanto à referência feita pelo Conselho e pela Comissão à restante regulamentação comunitária, é indiscutível existirem disposições comunitárias relativas à utilização de menções que contêm termos que visam anular a referência geográfica, como o artigo 40. do Regulamento (CEE) n. 2392/89 que estabelece as regras gerais para a designação e apresentação dos vinhos e mostos de uvas (13), e o artigo 13. do Regulamento (CEE) n. 2081/92 relativo à protecção das indicações geográficas e das denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (14). Estas disposições referem-se a termos gerais e proíbem, de forma geral, no respectivo âmbito de aplicação, os termos que visem anular a referência geográfica, semelhantes aos do artigo 13. do regulamento em causa, cujo teor é o seguinte:

"A designação e a apresentação dos produtos referidos no n. 1 do artigo 1. bem como toda a publicidade relativa aos mencionados produtos não devem apresentar erros de natureza a criar confusões ou a induzir em erro as pessoas a que os mesmos se destinam, nomeadamente no que se refere:

° às indicações previstas nos artigos 3. e 6. ; esta disposição aplica-se igualmente desde que estas indicações sejam utilizadas numa tradução ou com uma referência à proveniência efectiva ou que tenham derivado de menções tais como 'género' , 'tipo' , 'método' , 'imitação' , 'marca' ou outras menções similares.

° ..."

32. Em nosso entender, a referência a disposições deste género noutros regulamentos comunitários nada faz avançar a discussão sobre a proporcionalidade do n. 5 do artigo 6. do Regulamento n. 2333/92, seria, em qualquer caso, necessário examinar a proporcionalidade dessas outras disposições. Além disso, consideramos que a existência de uma disposição como o artigo 13. no regulamento em causa constitui, antes, um elemento contra a tese defendida pelo Conselho e pela Comissão. Se a menção "méthode champenoise" tivesse sido entendida como referida a qualquer outra coisa que não um processo de fabrico, estaria, pelo contrário, abrangida pela proibição geral estabelecida no artigo 13. ; as disposições específicas do n. 5 do artigo 6. não teriam sido necessárias.

33. A necessidade de suprimir a menção "méthode champenoise" não decorre, assim, nem de obrigações internacionais, nem de outros diplomas comunitários. Trata-se, antes, de uma "nova" repressão estabelecida pelo Conselho com o fim de reforçar a protecção até então concedida ao champagne e de evitar qualquer risco de induzir os consumidores em erro quanto às qualidades do vinho espumante, e a questão continua a ser a de saber se é desproporcionado suprimir, com estes fundamentos, uma menção de uso tradicional.

34. Não nos deteremos longamente sobre o risco de o consumidor ser induzido em erro quanto à origem de um vinho espumante, pelo facto de constar da garrafa a menção "méthode champenoise". Consideramos este risco em geral mínimo e ainda menor no caso da Winzersekt, cujas garrafas têm uma rotulagem de que resulta claramente, entre outras coisas, que a denominação de venda é "Sekt", que o vinho provém da região Moselle-Sarre-Ruwer e que foi produzido em Trier, na Alemanha.

35. Pelo contrário, não nos parece evidente afastar o argumento de que a menção "méthode champenoise" é susceptível de induzir em erro quanto às qualidades do produto em causa, não sendo também possível negar que esta menção se aproveita, de forma indevida, da fama do champagne. É certo que o consumidor esclarecido saberá que a menção apenas se refere a um processo de fabrico, mas existe o risco de o consumidor não esclarecido acreditar, devido à menção, que o vinho espumante tem a qualidade do champagne, pouco importando, aliás, a qualidade do vinho espumante em concreto. Neste contexto, deve, por outro lado, dar-se importância ao facto de o regulamento em casusa estabelecer um regime rigoroso de menções autorizadas e de condições a que está sujeita a sua utilização, e que a menção "méthode champenoise" pode ser considerada desinformativa, uma vez que o processo de fabrico utilizado no champagne se compõe de diversos outros elementos ° que provavelmente são até decisivos no fabrico do champagne ° para além daqueles a que a menção em causa se refere.

36. O que é, além disso, importante é que a regulamentação fornece uma alternativa, que fica à disposição dos produtores que até então utilizaram a menção ° "método tradicional" ° e essa alternativa permitir-lhes-á dar a conhecer ao mercado ° que, a julgar pelas informações prestadas pela Winzersekt, parece ser distinto do dos produzidos por fermentação em cuba ° o processo de produção dos seus vinhos espumantes. Além disso, a Winzersekt teve, durante um período transitório de oito anos, a possibilidade de habituar a sua clientela à ideia de que "méthode traditionnelle" será equivalente a "méthode champenoise" e de, desta forma, evitar eventuais prejuízos.

O Conselho tentou, assim, encontrar um justo equilíbrio entre, por um lado, os interesses dos produtores que utilizavam tradicionalmente a menção em causa e, por outro, o objectivo de reforçar a protecção da denominação controlada "champagne", bem como dos consumidores.

37. Com base nestas considerações, pensamos que este equilíbrio não se traduziu numa intervenção desproporcionada do Conselho na situação da Winzersekt.

38. Resta a questão de saber se as disposições em causa violam o princípio de não discriminação.

39. É jurisprudência constante que este princípio implica que situações idênticas não podem ser objecto de tratamento diferente a menos que essa diferença se justifique objectivamente (15).

É pacífico que a proibição de utilizar a menção em causa se aplica a todos os produtores de vinho espumante da Comunidade, excepto aos que produzem vinho espumante com direito à denominação de origem "champagne". O facto de se dispor ou não desta denominação de origem parece ser um elemento completamente objectivo susceptível de justificar uma diferença de tratamento; as disposições em causa não comportam, assim, qualquer violação do princípio de não discriminação.

40. O acórdão Codorniu/Conselho não é susceptível de alterar esta análise (16). Neste processo, estava em causa uma menção que fora reservada a determinado grupo de entre o conjunto dos produtores que tradicionalmente a utilizavam, sem que o legislador comunitário tivesse justificado a sua proibição relativamente a outros utilizadores tradicionais. No caso presente, são todos os utilizadores tradicionais da menção "méthode champenoise" que ficam proibidos de a usar.

O facto de alguns conhaques poderem continuar a usar menções que contenham a palavra "champagne", como "fine champagne", "petite champagne", etc. também não é susceptível de alterar as conclusões a que chegámos.

41. Propomos, assim, que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma à questão submetida pelo Verwaltungsgericht Mainz:

"O exame da questão submetida não revelou elementos susceptíveis de afectar a validade dos segundo e terceiro parágrafos do n. 5 do artigo 6. do Regulamento (CEE) n. 2333/92 do Conselho."

(*) Língua original: francês.

(1) ° JO L 231, p. 9.

(2) ° 2/86, Colect., p. 941.

(3) ° JO L 84, p. 1.

(4) ° JO L 231, p. 1.

(5) ° Quanto à menção crémant , o Tribunal de Justiça anulou a correspondente disposição do Regulamento n. 3309/85, por acórdão de 18 de Maio de 1994 no processo C-309/89, Codorniu, com o fundamento de que constituía violação do princípio de não discriminação.

(6) ° A Winzersekt alega, também, que as disposições em causa violam o direito fundamental de protecção da propriedade, na medida em que comportam a expropriação da menção, que é o cerne do sucesso comercial da associação e que faz parte do seu activo patrimonial. Não entraremos na discussão desta tese, visto que a apreciação da legalidade das disposições em causa à luz deste direito fundamental não foi solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio, perante o qual, aliás, a associação tinha já defendido esta tese que, à primeira vista, não procede.

(7) ° C-3/91, Colect., p. I-5529.

(8) ° Acórdão de 11 de Julho de 1989, Schraeder (265/87, Colect., p. 2237, n. 15). V. também acórdão de 8 de Outubro de 1986, Keller (234/85, Colect., p. 2897, n.os 8 e 9).

(9) ° Além disso, as duas instituições referiram a convenção de Paris para a protecção da propriedade industrial de 20 de Março de 1883 (revista em Estocolmo em 14 de Julho de 1967), o acordo de Madrid relativo à repressão das falsas indicações de proveniência (revisto em Lisboa em 31 de Outubro de 1958) e o acordo de Lisboa relativo à protecção das denominações de origem e ao seu registo internacional de 31 de Outubro de 1958 (revisto em Estocolmo em 14 de Julho de 1967).

(10) ° O teor desta resolução é o seguinte:

A assembleia geral decide, em matéria de denominações de origem e indicações geográficas e para facilitar a sua aplicação prática, que a protecção das denominações de origem ou indicações de proveniência geográfica de determinados vinhos, estabelecidas pelas autoridades nacionais competentes, implica o abandono das denominações ou designações de proveniência para designar produtos do sector vitivinícola ou produtos similares que não provenham dos locais indicados ou que não correspondam às condições, ainda que sejam acompanhadas de menções que visam anular a referência geográfica ou de palavras como género, tipo, modo, sabor ou outra expressão análoga, sem prejuízo, contudo, de acordos para regular alguns casos especiais usuais; do mesmo modo, em relação aos referidos produtos, não podem ser utilizadas menções que contenham esses nomes (denominações de origem ou indicações precisas de proveniência geográfica) ou palavras, partes de palavras, sinais, ou ilustrações susceptíveis de criar risco de confusão quanto à origem geográfica do produto.

(11) ° O Conselho e a Comissão remeteram, nomeadamente, para os acordos celebrados com a Áustria, a Bulgária, a Hungria, a Roménia, bem como com a Austrália. Entre estes acordos apenas há que ter em conta um ° o celebrado com a Áustria ° uma vez que os demais são posteriores à adopção do Regulamento n. 3309/85, cujos considerandos continham já a referência às obrigações internacionais. O texto do Acordo de 23 de Dezembro de 1988, celebrado com a Áustria, relativo ao controlo e à protecção recíproca dos vinhos de qualidade, bem como do vinho retsina , consta do JO 1989, L 56, p. 2.

(12) ° O texto do acordo foi publicado no Bundesgesetzblatt, 1961, parte II, p. 23, bem como no Journal officiel de la République française, de 3.6.1961, p. 5022.

(13) ° JO L 232, p. 13.

(14) ° JO L 208, p. 1.

(15) ° V., entre outros, acórdão de 19 de Outubro de 1977, Moulins de Pont-à-Mousson (124/76 e 20/77, Recueil, p. 1795, n. 17).

(16) ° Acórdão de 18 de Maio de 1994, Codorniu/Conselho (C-309/89, Colect., p. I-1879).

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